História Eclesiástica I Pr. André dos Santos Falcão Nascimento Blog: http://prfalcao.blogspot.com Email: goldhawk@globo.com Seminário Teológico Shalom A Igreja e o Império O Império Romano passava por momentos atribulados no início do séc. IV. Após um período de estabilidade entre 31 a.C. e 192, o Império viveu um século de revolução, entre 192 e 284. Um ano depois, com a ascensão de Diocleciano, buscou-se reorganizar o Império em bases mais autocráticas, tomadas de empréstimo dos despotismos orientais, de forma a garantir a cultura greco- romana. Como o cristianismo ameaçava esta cultura, Diocleciano tentou destruí-lo, sem sucesso, entre 303 e 305. Mais astuto, seu sucessor, Constantino, resolveu que o melhor seria usar a Igreja como um aliado para salvar a cultura clássica. O processo em que Igreja e Estado chegaram a um acordo começou quando Constantino conseguiu o controle completo do Estado. Embora dividisse oficialmente o poder com Licínio entre Constantino Constantino (c. 274-337), filho ilegítimo do líder militar Constâncio com uma bela mulher livre e cristã do Oriente, de nome Helena, foi eleito imperador do oeste pelo seu exército em 306, após a morte de seu pai, antigo líder da parte ocidental do Império Romano. Nesta época, o Império tinha seu poder dividido em uma tetrarquia, com dois imperadores (Augustos) e dois sub-imperadores (Césares) dividindo o Império em Ocidental e Oriental. Com as lutas internas, o Império chegou a ter seis governantes (5 Augustos e 1 César) em 307, mas Constantino, através de manobras políticas (casamento com a filha de um dos Augustos, Maximiano, e irmã do único César, Maxêncio) e vitórias em batalhas (contra seu cunhado Licínio), levaram-no a se tornar o único imperador romano, com poder inconteste até sua morte, em 337. Constantino A história de sua associação com o cristianismo vem de uma batalha, em 312, onde parecia que seria derrotado. Então, viu uma cruz no céu, com a frase “Com este sinal, vencerás” em latim. Tomando como bom presságio, perseverou e venceu a batalha da ponte Mílvia, sobre o rio Tibre. Independente da visão, é fato que ele teve iniciativa de associar o cristianismo ao Império, e o fato de ter protelado seu batismo até pouco antes da morte e ter mantido sua posição de Pontifex Maximus, sacerdote principal da religião pagã do Estado, parece apoiar a ideia. Além disso, sua postura de ordenar a execução de um jovem que poderia reivindicar seu trono não condiz com a conduta de um cristão sincero. Por isso, a associação Igreja-Estado pode ter sido oriunda de uma mistura de superstição e sagacidade em sua estratégia de governo. Constantino Outra contribuição para a história foi a construção da cidade de Constantinopla, em 330, de onde passou a reinar. Este ato ajudou a dividir Oriente e Ocidente e abriu o caminho para o Cisma de 1054. Contudo, isso providenciou um paraíso para a cultura greco- romana quando Roma caiu no séc. V. Constantinopla eventualmente tornou-se o centro do poder político do Oriente, e quando Roma caiu em 476, o bispo de Roma acabou sendo deixado com o poder político sobre a cidade, além do espiritual. Os filhos diretos de Constantino continuaram sua política de favorecimento da Igreja, colocando o paganismo na defensiva quando os sacrifícios pagãos e a frequência aos templos foi proibida. Um pequeno retrocesso aconteceu com a ascensão de Juliano, em 361, ao trono imperial. O retrocesso sob Juliano Juliano (332-363), novo imperador de Roma, havia sido forçado a aceitar o Cristianismo formalmente, porém a morte de parentes nas mãos do governo cristão e o estudo da filosofia ateniense o levaram a se tornar um seguidor do neoplatonismo.
Por conta de suas novas descobertas, retirou da Igreja Cristã os
privilégios e restaurou a liberdade plena de culto, com facilidades sendo dadas para ajudar no avanço da filosofia e da religião pagã. O período de provação da igreja durou apenas 2 anos, porém, e Juliano, conhecido como “o Apóstata”, apenas interrompeu momentaneamente o processo de institucionalização da Igreja Cristã. A Igreja Institucional Graciano: Renuncia ao título de Pontifex Maximus. Teodósio I: Promulga em 380 e 381 um edito tornando o cristianismo a religião exclusiva do Estado. Qualquer pessoa que seguisse outra forma de culto receberia a punição do Estado. 392: O Edito de Constantinopla estabelece a proibição do paganismo. 529: Justiniano determina o fechamento da escola de filosofia de Atenas, dando mais um golpe no paganismo. A Igreja e os bárbaros A partir do final do séc. IV, iniciou-se um processo de migração de povos “bárbaros” (não-romanos) em direção ao território imperial. Este processo gerou enormes problemas para o Império, terminando com várias invasões e saques a Roma e outras cidades importantes. Com o aparecimento destes povos, surgiu um novo problema: Como levar o evangelho para eles e levá-los a conhecer a Cristo. Ao longo dos séculos seguintes, muitos homens se colocaram à disposição para a obra, levando o evangelho a cada um destes novos povos. Em alguns casos, novas igrejas foram formadas, com liturgias próprias da região. Em outros casos, povos inteiros se converteram ao cristianismo assim que seu líder tomou a decisão de seguir o Caminho. Contudo, muitas destas conversões em massa eram políticas e não demonstraram grandes transformações de vida. A Igreja e os bárbaros Os godos foram os primeiros a aparecer na fronteira do Danúbio, acossados pelas tribos mongóis. Receberam permissão das autoridades romanas para entrar no Império. O avanço rápido gerou atritos e levou a uma batalha em Adrianópolis, em 378, que resultou na morte do imperador Valente e na entrada dos visigodos (godos do Ocidente) na região oriental do Império. Muitos atravessaram o Danúbio e começaram a pilhar as cidades imperiais, eventualmente saqueando Roma em 410 e fundando um reino na Espanha em 426. Os vândalos, seguidores do arianismo (controvérsia que trabalharemos mais tarde), do leste do Reno, se fixaram no norte da África, enquanto os ostrogodos, também arianos, assumiram a liderança do decadente Império Romano. A Igreja e os bárbaros Os lombardos, os borgonhenses arianos e os francos pagãos cruzaram o Reno e fixaram-se no que hoje é a França. Já os anglo-saxões fixaram-se na Inglaterra. Os hunos de Átila propiciaram uma enorme ameaça à igreja, porém acabaram derrotados em Chalons, em 451. Mesmo com avanços na evangelização dos pagãos, outras dificuldades surgiram no séc. VI, com novas ameaças vindas dos lombardos arianos, e no séc. VII, com o surgimento do Islamismo. A evangelização dos bárbaros Armênia: Gregório, o Iluminador, levou o evangelho ao rei Tiridates, que se converteu e se batizou por volta de 300. A Bíblia foi traduzida para o armênio em 433 e tornou-se o primeiro Estado a tornar-se oficialmente cristão. Etiópia: Frumêncio (c.300-c.380) e seu irmão, por conta de um naufrágio, chegaram ao local, pregando ali. Atanásio de Alexandria o consagrou chefe da Igreja Etíope, sob a proteção de Alexandria, subordinação que durou séculos até sua independência, em 1957. Godos: Começou antes da travessia do Danúbio. Úlfilas (c. 311-383), cristão ariano, pregou a este povo, vivendo toda sua vida como bispo deste povo. Sua obra foi tão boa que muitos godos viveram como cristãos. Codificou a língua dos godos em escrita, criando um alfabeto e dando-lhes a Bíblia em seu idioma, exceto o livro de Reis, pois o povo era muito guerreiro. A evangelização dos bárbaros Ilhas Britânicas: Evangelho possivelmente levado por soldados e mercadores romanos, possíveis três bispos celtas representaram a Igreja britânica no Concílio de Arles, em 314. Pelágio, adversário de Agostinho, era da Igreja Celta e começou a ensinar sua heresia por volta de 410 naquela região. Não reconhecendo a jurisdição romana, adotou as práticas de datação pascal da Igreja Oriental, além de ter outras diferenças menores. Quando os soldados imperiais deixaram a região, no início do séc. V, ficaram indefesos e foram exterminados junto com o povo celta ou expulsos para as colinas do norte pelos povos pagãos anglos, saxões e jutos. A evangelização dos bárbaros Gália: Martinho de Tours (c.316-c.396) sentiu o chamado para pregar aos borgonheses que se estabeleceram no sul da região. Adotando táticas mais duras e pioneiras na comunicação do Evangelho, organizou monges guerreiros em grupos e os liderou na destruição dos bosques, onde aconteciam os cultos pagãos. Fracassou quando os borgonheses foram dominados pelos primos franceses que se estabeleceram na Gália. Gregório de Tours (c.538-c.594) descreve como os francos se converteram. No final do séc. V, o rei Clóvis casou-se com Clotilde, princesa cristã da Borgonha. A sua influência, junto com o que Clóvis entendeu ser uma ajuda divina numa luta, levou-o à conversão em 496. Com sua conversão, seu povo aceitou em massa o cristianismo. A Gália se tornaria, a partir daí, base para o envio de missionários para a Espanha árabe e ariana e envio de auxílio militar para salvar o bispo A evangelização dos bárbaros Irlanda: Patrício (c. 389-461) foi levado aos 16 anos por piratas da Bretanha para a Irlanda. Ali, viveu 6 anos cuidando de gado. Ao retornar, sentiu o desejo de ser missionário na Irlanda, trabalhando de 432 a 461 na região, pregando entre os celtas e derrotando os sacerdotes druidas. Organizou os cristãos em mosteiros nas áreas tribais. Escócia: Columba (c. 521-597) foi o seu apóstolo, fundando em Iona, em 563, um mosteiro que se tornou centro na evangelização da Escócia. Dali, Aidano levou o evangelho aos invasores anglo-saxões da Nortúmbria, um século mais tarde. O cristianismo celta, em ambos os países, tornou-se rival de Roma por conta da aliança dos anglo-saxões, a quem ambos haviam ajudado a trazer ao cristianismo. A formação da doutrina nos Concílios A Igreja, a partir do séc. IV, sofreu muito com os problemas doutrinários. Questões como a natureza de Cristo e sua relação com o Pai trouxeram inúmeras controvérsias que ameaçaram a estabilidade e a ortodoxia da nova Igreja Universal. Para resolver as questões, diversos Concílios, reuniões de bispos para decisão de assuntos, foram convocados, reunindo bispos do Ocidente e do Oriente. Os primeiros sete concílios da igreja são chamados de Concílios Ecumênicos, por serem aceitos pela maioria das igrejas cristãs. A partir deste, muitos outros pretensos concílios ecumênicos foram realizados pela Igreja Católica, porém com representatividade apenas ocidental, tenderam a formular doutrinas de interesse papal ou eclesiástico católico. Desta forma, tais concílios posteriores aos sete não são considerados como válidos pelas demais igrejas cristãs (ortodoxas e protestantes). Os Sete Concílios Ecumênicos Niceia (325): Tratou a controvérsia ariana. Constantinopla (381): Formulação do credo niceno e condenação do apolinarianismo. Éfeso (431): Condenação do nestorianismo. Calcedônia (451): Condenação do monofisismo II Constantinpla (553): Controvérsia dos Três Capítulos e tentativa de união com os monofisitas. III Constantinopla (681): Condenação do monotelismo. II Niceia (787): Tratou a questão das imagens na igreja. Niceia – A controvérsia ariana Controvérsia surgida na parte oriental da Igreja, surgiu de uma discussão provocada por Alexandre, bispo de Alexandria. Por volta de 318 ou 319, ele discutiu sobre “O Grande Mistério da Unidade na Trindade”, tentando explicar como três pessoas poderiam se unir em um Deus eterno. Um de seus presbíteros, Ário (c. 250-336), erudito asceta e pregador popular, discordou da mensagem, afirmando que era impossível haver uma distinção entre pessoas da Divindade, e como queria evitar o politeísmo, decidiu condenar a doutrina da divindade de Cristo. Para Ário, Jesus não era coeterno com Deus, mas era uma criatura de Deus, muito superior aos homens e criado antes da fundação do mundo, porém inferior ao Pai. Era o mais alto dos seres criados, não podendo ser comparado a eles, de substância diferente da divina. Niceia – A controvérsia ariana A questão abria uma brecha soteriológica: Como Cristo poderia salvar o homem se não fosse plenamente Deus, mas sim menor que Deus e de essência semelhante ou diferente do Pai? Condenado por Alexandre após um sínodo local, Ário foge para o palácio de Eusébio, bispo de Nicomédia. A controvérsia, centralizada na Ásia Menor, ameaçava a unidade do Império e da Igreja. Constantino, então, buscou resolver o problema. Inicialmente, enviou cartas ao bispo de Alexandria e a Ário, mas não obteve sucesso. Para por fim à questão, Constantino resolveu convocar os bispos da igreja para um concílio, de forma a solucionar de uma vez por todas a questão. Niceia – A controvérsia ariana O concílio se reuniu no verão de 325. Entre 250 e 300 bispos estavam presentes, apesar de nem 10 serem da parte ocidental. O concílio foi presidido e pago pelo imperador. Três partidos se formaram: Ário, apoiado por Eusébio de Nicomédia e uma minoria; Atanásio, defensor da interpretação ortodoxa; e Eusébio de Cesareia, líder do maior partido e que propôs uma interpretação conciliar entre os dois grupos. Niceia – A controvérsia ariana Ário e Eusébio de Questão tratada Atanásio Eusébio de Cesareia Nicomédia
Gerado antes da Gerado antes da
Geração de Jesus fundação do mundo Co-eterno fundação do mundo, do nada não do nada.
Substância de Essência diferente Essência igual Essência semelhante Jesus
Relação Pai e Filho Filho abaixo do pai Co-iguais Co-iguais
Niceia – A controvérsia ariana Apesar de Eusébio de Cesareia ter mais de 200 bispos seguindo suas ideias de início, a ortodoxia venceu temporariamente, com a afirmação da eternidade de Cristo e a identidade de sua substância com o Pai. O Credo criado neste concílio foi o Credo Apostólico, interrompido após a parte “E no Espírito Santo”. O restante foi adicionado no segundo concílio. A questão não se encerrou em Niceia. Entre 325 e 361, a ortodoxia teve que enfrentar uma reação que provocou sua derrota temporária e a vitória do Arianismo. A questão só seria resolvida no ano 381, quando Teodósio definiu como a fé dos verdadeiros cristãos as doutrinas ortodoxas apresentadas em Niceia, após a realização do Concílio de Constantinopla. I Constantinopla (381) O primeiro Concílio de Constantinopla, em 381, foi convocado para resolver algumas questões: Decidir, definitivamente, sobre a questão ariana. Gregório de Nissa (c. 330-c.394) e Gregório de Naziâncio (c. 330-390) foram os grandes expoentes da ortodoxia, pregando contra a posição ariana. Macedônio, bispo de Constantinopla entre 341 e 360, ensinava que o Espírito Santo era “ministro e servo” no mesmo nível dos anjos, sendo uma criatura subordinada ao Pai e ao Filho. Foi condenado, com o Credo de Constantinopla declarando que o Espírito era co-eterno e procedia do Pai. Apolinário (c. 310-c.390), bispo de Laodiceia, amigo de Atanásio e defensor da ortodoxia, pregou que Cristo tinha um corpo e alma reais, mas o espírito no homem foi substituído pelo logos, que passou a ser o elemento ativo em Cristo, dominando-o plenamente e minimizando sua humanidade. Foi condenado, com o concílio entendendo que as duas naturezas, humana e divina, estavam plenamente representadas na figura de Jesus Cristo. Éfeso (431) O Concílio de Éfeso foi convocado pelo imperador Teodósio II para resolver a questão nestoriana que assolava a igreja. Nestório (c. 381-c. 452), patriarca de Constantinopla a partir de 428, rejeitava o uso do termo theotokos (mãe de Deus) aplicado a Maria, por entender que isso a exaltaria indevidamente. Sugeriu o termo Christotokos (mãe do Cristo) como alternativa, para lembrar que ela foi apenas a mãe do lado humano de Cristo. Para explicar a questão, Nestório entendeu que as naturezas humana e divina estavam unidas de forma mecânica em Cristo, sendo apenas um homem perfeito moralmente associado à divindade, sendo mais portador de Deus do que homem-Deus. A doutrina foi condenada, de forma a enfatizar que Jesus era Deus desde a eternidade, porém o movimento nestoriano permaneceu como igreja, sendo Calcedônia (451) Êutico (c. 378-c. 455), monge em Constantinopla, ensinava que, após a Encarnação, as naturezas de Cristo, humana e divina, se fundiram em uma, a divina. Tal doutrina negava a verdadeira humanidade de Cristo. Inicialmente condenado em Éfeso e posteriormente em um sínodo regional em 448 pelo patriarca de Constantinopla, Êutico reagiu, acusando-o de nestorianismo, sendo reabilitado em um novo concílio em Éfeso, em 449. Este concílio, convocado por Dióscoro, patriarca de Alexandria e monofisita, foi condenado pelo papa Leão I, que escreveu um Tomo onde condenava as ideias de Êutico. O Patriarca de Constantinopla, Flaviano, foi condenado, surrado, pisado e morto dias depois, gerando o comentário de Leão de que aquele tinha sido um “Sínodo de Ladrões”. Finalmente convocado pelo imperador bizantino Marciano, o concílio condenou Êutico e Dióscoro e promulgou a teologia difisista, em que Cristo é “verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus”. Este concílio encerrou a questão das duas naturezas de Jesus Cristo, porém vários cristãos II Constantinopla (553) Convocado pelo imperador bizantino Justiniano I e com participação majoritária oriental, visava analisar algumas obras muito populares na igreja, mas que possuíam cunho supostamente nestoriano. As obras, escritas por Teodoro de Mopsuéstia, Teodoreto e Ibas de Edessa, ficaram conhecidas como “Três Capítulos”. O papa Vigílio demorou em condenar as obras e acabou aprisionado por Justiniano, após tentar levar o concílio para a Itália para ter a presença dos bispos ocidentais, e garantir números iguais de bispos ocidentais e orientais, algo negado pelo imperador. O concílio, mesmo convocando o papa sem sucesso para se explicar, condenou as três obras. O próprio papa enviou um documento assinado por si e outros 16 bispos ocidentais, condenando as ideias de Teodoro, mas poupando a sua pessoa e as pessoas e obras dos outros dois réus. III Constantinopla (680-681) Buscando resolver a questão monofisita, que havia segregado as igrejas egípcia e a síria, o imperador Heráclio buscou uma fórmula intermediária que aproximasse ambas. O resultado foram as doutrinas do monoergismo (Jesus tinha duas naturezas, mas uma energia, divina) e, a seguir, o monotelismo (duas naturezas, mas uma vontade, divina). Contestada pelo Patriarca de Jerusalém e pelo Papa, a doutrina foi combatida, gerando uma controvérsia na igreja. Quando Heráclio morreu, Constante II, seu neto, assumiu o trono e tentou acabar com a controvérsia impedindo suas discussões. Por conta disso, o Papa Martinho I e o monge Máximo, opositores do monotelismo, foram torturados, exilados e mortos. Com a morte de Constante, em 668, e a queda do Egito e da Síria para os muçulmanos, o debate ficou para ser resolvido por Constantino IV, que convidou todos os cinco patriarcas para debaterem sobre a questão. Após 10 meses de discussões, com a presença pessoal dos patriarcas de Constantinopla e Antioquia e de legados dos outros três, o monotelismo e seu defensor, Macário de Antioquia, foram condenados. O Concílio declarou que, em II Niceia (787) O uso de imagens/ícones nas igrejas cristãs havia se difundido ao longo dos séculos. Originalmente com cunho educativo, visando apresentar as histórias bíblicas aos iletrados, passou a gerar a veneração dos personagens que representavam, incluindo mártires da igreja. Buscando acabar com o que entendia como idolatria, o imperador Leão III e, posteriormente, seu filho Constantino V, resolveram tratar a questão. O primeiro baixou dois editos, em 726 e em 730, proibindo o uso de imagens nas igrejas, enquanto o segundo convocou um concílio em Hieria, que não contou com as igrejas ocidentais, e que chancelou a condenação. Este concílio foi anulado em 784, quando Tarásio, novo patriarca de Constantinopla, buscou uma reaproximação com Roma. Originalmente convocado para Constantinopla em 786, foi dissolvido e transferido para Niceia um ano depois, após protestos dos bispos ocidentais. Citando textos que falavam das imagens de querubins na Arca e no Templo, e com o apoio do imperador Controvérsia Antropológica Enquanto a igreja oriental dividia-se em crises especulativas, a igreja ocidental enfrentou um debate mais prático, sobre a possível ação humana na salvação. A controvérsia foi iniciada por Pelágio (c. 360 – c. 420), monge e teólogo britânico que chegou a Roma em 400 e começou a pregar sua teologia sobre a salvação. Como não passara pela luta interior pela qual Agostinho passou (como veremos adiante), Pelágio tendia a dar à vontade humana um papel no processo da salvação. Agostinho, que conheceu e discordou de Pelágio em 410, entendeu que a vontade humana era insuficiente para livrá- lo do pântano do pecado. Expulso de Roma em 418, Pelágio insistia que o homem é criado livre como Adão, com a capacidade de escolher entre o bem e o mal, pois cada alma é criação individual de Deus e, portanto, não herdeira da contaminação do pecado de Adão. A universalidade do pecado se explicaria pela fraqueza da Controvérsia Antropológica Agostinho de Hipona (354-430), por outro lado, entendia que isso era uma negação da graça de Deus, compreendendo que a regeneração era obra exclusiva de Deus e que o pecado de Adão atingiu a todos os homens, pois Adão era o pai da raça humana. Como sua razão estava totalmente corrompida pelo pecado, não era capaz de usar a sua vontade quanto à questão da salvação. Logo, a salvação viria somente para os eleitos através da graça de Deus em Cristo. As ideias de Pelágio foram condenadas no Concílio de Éfeso, mas as ideias de Agostinho também não foram bem aceitas. João Cassiano (c. 360 – c. 435) tentou uma solução conciliatória, onde vontade humana e divina cooperavam na salvação, pois a vontade humana era enfraquecida, mas não corrompida, pelo pecado. Essa ideia era para evitar que as doutrinas da eleição e da graça irresistível de Agostinho gerassem uma irresponsabilidade ética. A proposta de Cassiano foi condenada em 529 no Fontes Texto base: CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. 3 ed. Trad. Israel Belo de Azevedo e Valdemar Kroker. São Paulo: Vida Nova, 2008. Textos auxiliares: DREHER, Martin N. Coleção História da Igreja, 4 vols. 4 ed. São Leopoldo: Sinodal, 1996. GONZALEZ, Justo L. História ilustrada do cristianismo. 10 vols. São Paulo: Vida Nova, 1983