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1. Denominação
Embora o Código Penal utilize a expressão relação de causalidade, também se fala em nexo de
causalidade e nexo causal.
2. Conceito
Relação de causalidade é o vínculo que se estabelece entre a conduta e o resultado
naturalístico, e por meio do qual se apura se a conduta foi responsável pela produção do
resultado.
ATENÇÃO: não utilizar a expressão elo de ligação para definir a relação de causalidade, dada
a sua incorreção gramatical.
3. Aplicabilidade
O estudo da relação de causalidade se relaciona apenas aos crimes materiais, nos quais o tipo
penal é formado por conduta e resultado naturalístico, e exige a ocorrência desse resultado
para a consumação.
CP, Artigo 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem
lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
Questiona-se, a partir da leitura do artigo 13, caput, 1ª parte, do CP, quais crimes dependem
do resultado para existir? Somente os crimes materiais, uma vez que os formais e os de mera
conduta se aperfeiçoam com a prática da conduta.
4. Teorias
CP, Artigo 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem
lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
Inicialmente desenvolvida por Glaser, foi aperfeiçoada por Von Buri e Stuart Mill no ano de
1873, e corresponde à regra geral do Código Penal (artigo 13, caput).
Causa é todo e qualquer acontecimento que contribui para a produção do resultado, quando e
como ocorreu, não existindo diferença entre causa, condição e ocasião. Em outros termos, tudo
que concorre de qualquer modo para o resultado final é tido como causa deste.
Aula 6.2
5. A relevância da omissão
Art. 13 (...), § 2º, do Código Penal - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e
podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
5.1. Aplicabilidade
Tem aplicação unicamente aos crimes omissivos impróprios, espúrios ou comissivos por
omissão, em relação aos quais o tipo penal descreve uma ação, mas a inércia/omissão do agente
que descumpre seu dever de agir conduz à produção do resultado naturalístico.
Nos crime omissivos próprios ou puros, a omissão vem descrita no próprio tipo penal, e
sempre é relevante.
iii. Misto: o legislador fornece parâmetros mínimos para que o juiz realize a análise, no caso
concreto, acerca da existência do dever de agir.
ATENÇÃO: Nas relações de trabalho o dever de agir subsiste enquanto o agente se encontra no
local de trabalho, ainda que encerrado o horário do seu expediente.
Nos delitos omissivos impróprios o agente pode responder a título de dolo ou de culpa, bem
como figurar como autor ou como partícipe. Ex.: policial militar que acompanha a distância a
prática do crime de estupro contra a esposa de um desafeto, pretendendo ver o sofrimento deste
- responde como partícipe do crime de estupro -. Isto porque, detentor do dever de agir, com a
sua omissão concorreu para o resultado final, ajustando-se portanto sua conduta à figura do
partícipe, enquanto o estuprador responde como autor.
6. Concausas
6.1. Conceito
É a convergência de uma causa estranha à conduta do agente que colabora para a produção do
resultado. Em outros termos, é a concorrência de causas.
6.2. Espécies
i. Dependentes. São aquelas que não são capazes de produzir, por si sós, o resultado final.
Dependem da conduta do agente para a produção do resultado final.
ii. Independentes. São aquelas capazes de produzir, por si sós, o resultado final. Absolutas ou
relativas, distinguem-se, no entanto, quanto à origem.
a. Absolutas. São desvinculadas, não guardam qualquer relação com a conduta do agente e
podem ser preexistentes, concomitantes ou supervenientes.
Preexistentes são aquelas que antecedem a conduta do agente. Ex.: após ser alvejado com três
tiros por um desafeto, A é encaminhado ao hospital, onde verifica-se que a causa da morte foi a
anterior ingestão de veneno ministrado por sua esposa. Portanto, a causa da morte -
envenenamento - é anterior e absolutamente independente da conduta do agente.
Supervenientes são aquelas que ocorrem após a conduta do agente. Ex.: após ser atingida
por um tiro em alto mar vindo de outra embarcação, a vítima, que estava em um pequeno barco,
morre afogada em decorrência de um tsunami. Trata-se o tsunami de uma concausa
superveniente absolutamente independente à conduta do agente, que por si só causou a morte
do agente.
Preexistentes são aquelas que antecedem a conduta do agente. Ex.: agente, conhecedor da
condição de hemofilia da vítima, pretendendo matá-la, a atinge com um tiro de raspão no braço,
vindo a vítima ao óbito. Nesse exemplo, a doença apenas se manifestou em razão da conduta do
agente; a morte não teria ocorrido quando e como ocorreu.
Supervenientes
i. Que não produzem por si sós o resultado. Ex.: Alvejada por tiro, a vítima é encaminhada ao
hospital e, durante a cirurgia para a remoção do projétil, por imperícia médica, ou após a
cirurgia, por infecção hospitalar, vem a falecer.
Em ambos exemplos temos concausas supervenientes relativamente independentes que não
produzem por si sós o resultado. Tanto a imperícia quanto a infecção hospitalar podem matar,
mas não teriam causado a morte da vítima se o tiro não tivesse sido disparado contra ela.
EFEITO → As concausas supervenientes relativamente independentes não rompem o nexo
causal, respondendo o agente pelo resultado.
Aula 6.4
TIPICIDADE
1. Conceito
Elemento do fato típico presente em todo e qualquer crime, assim como a conduta. O resultado
naturalístico e a relação de causalidade só existem nos crimes materiais consumados.
Atualmente fala-se em tipicidade penal, formada pela soma da tipicidade formal com a
tipicidade material.
Tipicidade formal é o mero juízo de adequação, juízo de subsunção do fato à norma. Deve ser
apurado se o fato praticado na vida real se amolda ao modelo de infração penal descrita na lei
penal.
Tipicidade material é a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.
Princípio da insignificância constitui causa supralegal de exclusão da tipicidade, porque
embora presente a tipicidade formal, inexiste a tipicidade material.
2. Evolução doutrinária
No Direito Romano trabalhava-se com a ideia de corpus delicti, isto é, o crime era entendido a
partir dos vestígios materiais. Inexistia a preocupação de um estudo fragmentado do Direito
Penal.
Muitos anos após, já na Alemanha, em 1906, Ernst von Beling foi o primeiro a abandonar o
corpus delicti, passando a dividir o crime em elementos, na chamada fase da independência do
tipo.
Posteriormente, em 1915, Max Ernst Mayer, aprimorando a teoria de Beling, inaugura a fase
da ratio cognoscendi ou teoria indiciária da tipicidade. A tipicidade passa a ser compreendida
como um indício da ilicitude.
Todo fato típico se presume também ilícito. Entretanto, trata-se de uma presunção relativa –
iuris tantum -, admitindo prova em sentido contrário. Tem essa teoria, como efeito prático, a
inversão do ônus da prova no tocante às excludentes da ilicitude. À acusação cabe apenas a
prova de que o fato é típico, sendo a ilicitude presumida. Ex.: quem mata alguém se presume
que mata de forma ilícita e, se a defesa arguir uma excludente da ilicitude, tem o ônus da prova
de sua alegação. Esta é a teoria preferida desde então até os dia de hoje.
Ainda na Alemanha, no ano de 1931, Edmund Mezger, desenvolveu a teoria da ratio essendi,
identificando a tipicidade como essência da ilicitude. Há o surgimento da ilicitude tipificada,
com a afirmação de que a tipicidade não pode existir sem a ilicitude - ao contrário do afirmado
pela teoria indiciária. Nessa fase, surge a figura do injusto penal, caracterizado pela união entre
fato típico e ilícito.
Aula 6.5
4. Tipicidade conglobante
Criada pelo penalista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni, entende a tipicidade conglobante
como a junção da tipicidade legal - equivalente à nossa tipicidade formal - com a
antinormatividade.
Antinormatividade é a relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico
em geral. Assim, não basta a violação da norma, sendo necessária a violação do ordenamento
jurídico como um todo. Ex.: concedida ordem de busca e apreensão pelo juiz, o oficial de
justiça comparece na residência do devedor e apreende o veículo, com posterior entrega a um
depositário. Esse oficial de justiça está praticando o tipo penal do furto, subtraindo para
outrem - credor - uma coisa alheia móvel, porém acobertado por uma excludente da ilicitude -
estrito cumprimento do dever legal -. E, para o referido autor, essa afirmação é inadmissível,
pois não se pode admitir que o oficial de justiça, cumprindo a lei veiculada por meio de uma
ordem judicial, esteja praticando um fato típico porém lícito. Embora possa haver a violação
da norma penal, sua conduta está em conformidade com o restante do ordenamento jurídico.
Aqui está presente a ideia da antinormatividade: não basta violar a norma penal, é preciso
ofender o ordenamento jurídico de forma global. Em outros termos, a teoria da tipicidade
conglobante antecipa a análise da ilicitude para o mesmo instante de verificação da tipicidade.
i. Art. 14, inc. II, do Código Penal: "tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente".
No crime tentado, a conduta do agente não se subsume diretamente ao tipo penal. É preciso
invocar a norma de extensão constante do artigo 14, inciso II, do CP.
Trata-se de norma de extensão temporal da tipicidade, porque permite a aplicação da lei penal a
momento anterior à consumação. E, na denúncia/sentença, devem ser detalhadamente
descritas as circunstâncias alheias à vontade do agente que impediram a consumação do delito.
ii. Art. 29, caput, do Código Penal: "Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide
nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Norma de extensão pessoal da tipicidade aplicável apenas à participação, não à coautoria, eis
que o coautor realiza diretamente o núcleo do tipo penal. É dita pessoal porque permite a
aplicação da lei penal a pessoas diversas dos autores do delito.
Note-se que a participação pode ocorrer por três formas distintas: induzimento e instigação
(ambas participação moral) e auxílio (participação material). Tais formas de participação
devem ser minuciosamente descritas na denúncia e na sentença (forma + descrição da
conduta).
iii. Art. 13 (...) , § 2º, do Código Penal - A omissão é penalmente relevante quando o omitente
devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
Omissão penalmente relevante é norma de extensão da própria conduta, ou seja, para quem
tem o dever de agir, aquela conduta que originariamente só era praticada por ação pode
também ser praticada por omissão. Ex.: a mãe que causa a morte do bebê deixando de
alimentá-lo responde como incursa no artigo 121, caput, combinado com o artigo 13, § 2º,
alínea a, ambos do CP.
Da mesma forma, na denúncia e na sentença devem estar descritos o dever de agir, a omissão
correspondente e o poder de agir, obrigatoriamente.