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Módulo I: Contextualização

Unidade 2: A Atenção Psicossocial

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área demandante do curso.

Ficha Catalográfica

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MINAS GERAIS. Canal Minas Saúde. Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Curso de
Extensão Novo Olhar para a Saúde Mental - Módulo I: Contextualização - Unidade 2: Atenção
Psicossocial. Belo Horizonte, Minas Gerais, 2013.

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Olá! Este é o seu Material de Referência que contempla todo o conteúdo da
Unidade de forma mais aprofundada. Nosso intuito é agregar mais conhecimento à sua
aprendizagem, por isso, leia-o com atenção!

Mas, antes de iniciar, conheça os objetivos de aprendizagem previstos para esta


Unidade. Boa leitura!

Objetivos de Aprendizagem

Conhecer o campo da atenção psicossocial, seus


fundamentos e aspectos históricos.

Identificar o atual contexto das redes de atenção


psicossocial.

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Introdução

Nesta Unidade, a Atenção Psicossocial é apresentada enquanto marco teórico da


atual política de atenção em saúde mental, álcool e outras drogas. Serão destacados seus
aspectos históricos e teórico-conceituais com o objetivo de promover uma compreensão do
campo de práticas estruturadas sob esse novo modelo assistencial. Espera-se que, ao final
da Unidade, o cursista seja capaz de identificar o atual contexto das redes de atenção
psicossocial.

1. Aspectos Históricos da Atenção Psicossocial

A Atenção Psicossocial em saúde mental, álcool e outras drogas hoje é nomeada


como campo de práticas profissionais e sociais que se desenvolvem em torno do cuidado
de sujeitos com sofrimento mental ou em uso abusivo de álcool e outras drogas. Trata-se
de um campo emergente, em que se fazem presentes vários saberes disciplinares e
socioculturais que dialogam entre si. Busca-se novas formas de atenção pautadas no
respeito à singularidade e na cidadania de sujeitos segundo suas particularidades,
histórias de vida e formas de fazer laços sociais.

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Importante

A Atenção Psicossocial implica no desenvolvimento


de estratégias e ações que envolvem políticas, ideologia,
teorias e técnicas em articulação com novos territórios
de práticas e que estão voltadas para liberdade e
autonomia dos sujeitos. Daí advém a sua complexidade.

Seu nascimento, no contexto das políticas, decorre das experiências de novas


práticas de cuidado da loucura em busca de rompimento com o modelo assistencial
denominado historicamente como modelo asilar, pautado na determinação orgânica dos
transtornos mentais e no tratamento voltado para a cura da doença, para o isolamento e a
tutela.

O desenvolvimento das práticas da atenção psicossocial se deve a diferentes


movimentos sociais e científicos que se confrontaram com o modo asilar e sua tecnologia
de cuidado. Inspirou-se em experiências de serviços de base comunitária que se
mostraram alternativas ao modelo asilar vigente e em concepções teóricas que valorizaram
as diferentes formas de existência humana atravessadas por conflitos e contextos
históricos e culturais.

De uma forma geral, as propostas de criação de redes de atenção no suporte às


políticas públicas têm sido progressivamente adotadas nas últimas três décadas para
superar o modelo burocrático e hierárquico de organização da assistência à saúde
(Mendes, 2011).

No Brasil, a Atenção Psicossocial surge no contexto do movimento de reforma


psiquiátrica e vem se configurando como o novo modelo da assistência à saúde mental,
álcool e outras drogas em que os sujeitos são reconhecidos como participantes ativos no
processo de cuidado. Inicialmente, a expressão foi utilizada para nomear os novos
dispositivos institucionais substitutivos ao hospital, integrando as dimensões psíquica e

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social. Na atualidade, Atenção Psicossocial configura-se como campo de práticas
substitutivas ao modelo asilar com abertura para inovações.

Nesse novo modelo assistencial, os gestores e trabalhadores de saúde são


chamados para atuar na construção de redes de serviços e desenvolver novas formas de
trabalho em equipes interdisciplinares que aproximem os cuidados dos sujeitos, famílias
e comunidades e seus respectivos protagonismos.

Finalmente, é preciso considerar que no horizonte da atenção psicossocial há uma


maneira de cuidar que reconhece a complexidade do sujeito em sua relação com o social e
o cultural.

2. Delimitação do Campo da Atenção Psicossocial

2.1 Fundamentos da Atenção Psicossocial

A palavra fundamento vem do latim fundamentu e significa base, alicerce. Por


fundamentos da atenção psicossocial compreende-se o conjunto de princípios mais gerais
que constituem as bases sobre as quais são produzidas as práticas de cuidado nesse
campo.

São princípios da Atenção Psicossocial:

1. O cuidado em liberdade, em que a atenção acontece em serviços abertos que


constroem espaços de sociabilidade.
2. A produção de saúde a partir das demandas dos sujeitos da valorização da
escuta e em direção a sua emancipação social ou autonomia.
3. A cidadania através da elevação dos usuários dos serviços ao estatuto de
sujeitos de direito.
4. A singularidade de cada sujeito diante da experiência do sofrimento mental e da
própria vida, considerando o que há de único na forma como ele se situa frente ao
desejo do outro e aos seus próprios sintomas.

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5. A interdisciplinaridade em que o trabalho em equipe é produzido levando-se em
consideração os diversos saberes na produção do cuidado, rompendo com a
centralidade das ações profissionais individuais.

6. A intersetorialidade enquanto articulação de saberes e experiências que


englobam as dimensões das políticas sociais, mas também sua interface com
outras dimensões da cidade.
7. A noção de território enquanto espaço social onde são construídas as
referências de vida, redes de relações e histórias e são produzidos sentidos para
os lugares habitados, para além da noção de espaço geográfico.
8. O trabalho em rede como um modo de organização do trabalho que envolve um
conjunto de serviços de diferentes complexidades e níveis de atenção que
interagem na construção do cuidado compartilhado e sob a lógica da
corresponsabilização.

Pautada nos princípios acima elencados e diferentemente do modelo asilar


tradicional que atua sobre a doença e sua cura, a atenção psicossocial desenvolve uma
atenção integral ao sujeito. Leva-se em consideração sua complexidade que reúne
aspectos biológicos e psíquicos, seu contexto social, sua história de vida e preconceitos
decorrentes do estigma social que vivenciam os sujeitos na experiência da loucura e no
uso de drogas.

2.2 Estratégias e Dimensões da Atenção Psicossocial

A Atenção Psicossocial é um processo complexo que envolve a construção de


estratégias de intervenção em contextos diversos: nas produções científicas, na política,
nos serviços e na sociedade. Tais estratégias são necessárias para a consolidação de
novas práticas sociais de lidar com os sujeitos em conflito e precisam ser compreendidas
para clarear o papel dos serviços e dos trabalhadores de saúde que atuam na atenção em
saúde mental, álcool e outras drogas.

A partir de Amarante (2007), são identificadas quatro dimensões da atenção


psicossocial, a saber:

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1. A dimensão teórico-conceitual - pauta-se na produção de conhecimento
científico (pesquisas empíricas, estudos teóricos) que fundamentem a prática no
modo de atenção psicossocial voltada para a qualidade de vida e saúde.

2. A dimensão técnico-assistencial - implica na criação de novos dispositivos


assistenciais em busca de aproximar os serviços das necessidades e demandas
dos sujeitos em seus territórios e na produção de novas formas de cuidado que
respeite as singularidades e se pautem no atendimento múltiplo.

3. A dimensão jurídico-política - implica na necessidade de legislação específica


para proteção dos direitos humanos de pessoas com sofrimento mental e para o
estabelecimento de garantias sociais.

4. A dimensão sociocultural - traduz-se na necessidade de produzir novos


espaços sociais para a experiência da loucura e em extensão, para construção de
relações de respeito às diferenças nos modos de ser e existir que marcam a
condição humana.

Importante

As dimensões aqui reunidas implicam em considerar


que a assistência integra um conjunto de ações a serem
desenvolvidas no território. Neste contexto, cabe aos
trabalhadores repensarem suas práticas enquanto
agentes coletivos de produção de cuidados segundo o
ponto da rede de atenção psicossocial em que atuam.

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3. Redes de Atenção Psicossocial

Na atualidade, a palavra rede


tem sido fundamental para
estabelecer formas de comunicação
e organização. Fala-se em rede nas
ciências, na internet com suas novas
formas de interatividade virtual, em
telefonia e em organizações e
serviços, sejam eles educacionais,
de prestação de serviços e outros.

Na sua forma original, como é apresentada em dicionários, rede significa um


entrelaçamento de fios, cordas, etc., com aberturas fixadas por malhas e pontos, formando
uma espécie de tecido. A palavra rede pode endereçar dois sentidos: ela pode expressar
construções que fortalecem os sujeitos, como pode levá-los a situações, no mínimo,
embaraçosas. Daí a expressão cair na rede, expressando o deixar-se envolver de forma
que se torna difícil desvencilhar-se.

Ao se tratar de rede de serviços, pressupõe-se a construção de alternativas de


ofertas colocadas à disposição que possam aproximar os sujeitos, tentando captar
demandas.

Diante do processo de mudanças que vêm sendo operadas na política de saúde


mental, álcool e outras drogas, verifica-se, na atualidade, um deslocamento dos modelos
de redes de serviços em substituição à internação e ao isolamento como lugares
privilegiados para acolher as variadas formas de desinserção social. A nova rede em
construção propõe serviços de base territorial, em proximidade com os sujeitos, famílias e
comunidades, integrando ações de promoção da saúde, desenvolvendo o cuidado nas
crises, estabelecendo parcerias com outros setores e incluindo a participação cidadã.

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Esse novo modelo de redes de serviços sob o paradigma da atenção psicossocial
apresenta três impasses diante das exigências de reformulação das práticas (GARCIA,
2001):

1. A distância entre a queixa e sua codificação por equipes, traduzida em


diagnósticos e encaminhamentos, e os impasses decorrentes do caso sempre
único.

2. As regras institucionais e os vínculos construídos pelos sujeitos com os


serviços e seus técnicos e os riscos de uniformização e segregação.

3. A necessidade de incluir uma nova clínica nos serviços que considere os


sujeitos em suas coordenadas sociológicas e que promova uma escuta
singular para além dos sintomas e suas formas.

As mudanças atuais no campo da política pública em direção à construção e


consolidação de redes sob o paradigma da atenção psicossocial busca integrar saberes,
serviços e instituições que possam produzir impactos sobre os sujeitos. Essas redes vêm
ganhando seus reforçadores através de portarias e programas governamentais.

Espera-se que as malhas ou nós dessas redes não aprisionem os sujeitos e os


capacitem em direção ao seu empoderamento para lidar com seus próprios conflitos,
acolhendo-os em sua singularidade, criando condições de possibilidades de saídas sempre
particulares.

3.1 Rede de Atenção Psicossocial no Município

Uma rede de atenção psicossocial se constrói e acontece no município, lugar que


mais aproxima os cidadãos do estado e suas ações. Uma rede também se constrói a partir
das formas locais de socialização e territorialidade e envolve vários atores sociais: usuários
e seus familiares, trabalhadores, gestores e prestadores de serviços.

Para construção da Rede de Atenção Psicossocial do município, faz-se necessário


percorrer alguns passos:

1. Conhecer a realidade que se materializa na realização de um diagnóstico local,


considerando: os principais problemas do cotidiano dos sujeitos, famílias e

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comunidade decorrentes do sofrimento mental ou do uso abusivo de álcool e
outras drogas, os recursos disponíveis de base territorial, suas capacidades e
potencialidades, os vazios assistenciais e a necessidades de serviços.
2. Conhecer a atual legislação em saúde mental, álcool, crack e outras drogas no
âmbito do Sistema Único de Saúde e suas diretrizes.
3. Construir parcerias com a sociedade e com as instâncias de controle social de
políticas públicas para elaboração de um plano local de Construção ou
Aprimoramento da Rede de Atenção Psicossocial.
4. Inclusão do plano local no plano de governo do gestor municipal, na agenda
do conselho municipal de saúde e no plano plurianual de saúde do
município.

5. Inclusão do plano local nas pactuações de microrregiões e macrorregiões de


saúde do Estado.
6. Buscar formas de financiamentos para projetos específicos, tais como as
supervisões de equipes de redes de atenção psicossocial e outras estratégias de
formação permanente.

7. Fomentar a criação de fóruns participativos que possam debater as questões,


produzir reivindicações e acompanhar os processos de tomada de decisões
locais.

Importante

Percorrer esses passos é tarefa para ser feita em


parceria. As parcerias podem ser feitas através de redes
colaborativas e de solidariedade. Contudo, cada um deve
dar seu passo e se tornar protagonista no processo. Uma
rede de atenção psicossocial se constrói a partir de sujeitos
ativos. Caso contrário, corre-se o risco de repetir velhas
práticas com roupagem nova.

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Conclusão

O campo da atenção psicossocial hoje representa a possibilidade de inovações nas


práticas de cuidados de sujeitos com sofrimento mental e em uso abusivo de álcool e
outras drogas em direção à construção de subjetividades. Nesse contexto, há lugar para
construção de relações horizontais entre profissionais e serviços, ampliação dos espaços
de cidadania e redes de serviços.

As várias dimensões da atenção psicossocial permitem uma maior compreensão das


ações a serem desenvolvidas na política, na sociedade e no fazer cotidiano de
trabalhadores para construção de redes de serviços articulados.

Tendo por princípio o cuidado de sujeitos singulares, espera-se que uma nova
clínica pautada na responsabilização e no acolhimento possa se estabelecer nesse campo.

Conteudista
Aparecida Rosângela Silveira

Referências

AMARANTE, P. Estratégias e dimensões do campo da saúde mental e atenção


psicossocial. In: AMARANTE, P. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro:
FIOCRUZ, 2007. p. 61-79.

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COSTA-ROSA, A. O Modo Psicossocial: um paradigma das práticas substitutivas ao modo
asilar. In: AMARANTE, P (org.). Ensaios: subjetividade, saúde mental e sociedade. Rio de
Janeiro: FIOCRUZ, 2006. p.141- 168

GARCIA, C. Redes das Redes. Jornal do Psicólogo, Belo Horizonte, ano 18, n. 69, mar.
2001.

MENDES, E. V. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da


Saúde, 2011. 549 p. Disponível em: http://apsredes.org/site2012/wp-
content/uploads/2012/03/Redes-de-Atencao-mendes2.pdf. Acesso em: 27 ago 2013.

YASUI, S. Rupturas e Encontros: desafios da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Rio de


Janeiro: FIOCRUZ, 2010. 314p.

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