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Fabricio Moraes
Boa tarde, Gostaria de agradecer ao professor Raphael Amaral Vaz pelo convite e pela
organização desta IV Jornada.
A psicologia analítica é uma abordagem ampla e heterogênea, que comporta uma
diversidade pensamentos. No Brasil, temos uma presença mais clara do pensamento
clássico e da psicologia arquetípica. Contudo, gostaria de trazer para vocês hoje uma
reflexão pautada no pensamento inglês, na chamada escola desenvolvimentista – que tem
como expoente o analista inglês Michael Fordham, cujo pensamento vem sendo uma
influência muito importante para o CEPAES.
A Escola Desenvolvimentista recebeu essa nomenclatura dada por Andrew Samuels por
enfatizar os processos de desenvolvimento, isto é, a infância, e seus desdobramentos na
vida adulta e nos processos transferenciais e manejo clinico.
Assim, nossa proposta é falar das defesas do Self e a Experiência traumática dentro desse
enquadre teorico, para tanto precisamos fazer algumas contextualizações refletir acerca do
Self no processo desenvolvimento das relações com o ambiente.
O Self e o desenvolvimento
Jung definiu o Self como o arquétipo da totalidade e centralidade, isto é, como sendo o
centro e a totalidade da psique, juntamente com o atributo de ser o centro organizador da
psique. Como o trabalho de Jung se direcionou aos processos do desenvolvimento adulto,
em especial, da meia idade onde os processos integrativos do Self se manifestavam de
forma intensa e simbólica, ao que Jung denominou, o processo de individuação e, assim a
realização do Self.
Os estudos de Jung acerca do Self, tomaram novos contornos quando aplicados ao
processo de desenvolvimento na infância. Um dos pioneiros da análise de crianças foi
Michael Fordham, que em 1935 começou o atendimento de crianças na Inglaterra, que
eram vítimas dos traumas de guerra (crianças evacuadas das cidades), crianças psicóticas
e com transtorno do espectro autista . Deve-se notar, que Fordham desenvolveu seu
trabalho em paralelo com o trabalho de Melaine Klein e do Middle group da sociedade
psicanalítica de Londres, com pensadores como Winnicott, Fairbain, Bion dentre outros,
com os quais Fordham se relacionou e ampliou as discussões teóricas.
Em sua prática, Fordham observou que havia uma autonomia na atividade inconsciente,
que impelia a criança ao desenvolvimento desde que houvesse um ambiente adequado ou
um ambiente suficiente bom. Observando que a tese defendida por Jung de que as
neuroses ou transtornos infantis eram uma derivados das neuroses dos pais era uma visão
parcial e limitada, pois, as crianças tinham conflitos infantis próprios da criança e assim
como derivados o ambiente (na relação com os pais), por outro lado, observou que
independente de grandes mudanças na dinâmica parental ou na neurose dos pais haveria
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sim uma melhora significativa da criança e de seus processos de amadurecimento ou de
individuação. A atividade do self seria ativa e intensa desde a vida intra-uterina.
Em 1957, Fordham publicou o livro “New Developments in Analytical Psychology”,
prefaciado por Jung, onde ele apresentou as bases de sua teoria acerca do
desenvolvimento e do Self. Para Fordham, a criança na primeira infância não teria uma
experiência propriamente psíquica, a experiência compreendida como psicossomática, com
um Self integrado, onde não haveria uma distinção entre corpo e Psique, nem ainda haveria
um Ego, a esse Self original, manifesto como uma unidade psicossomática, ele chamou de
Self primário (que correspondia ao que Neumann viria a chamar de "fase uriborica" ou self
corporal).
Como unidade psicossomática, os processos do Self primário do bebe, estão associados a
processos fisiológicos, que seja pela necessidade (fome, saciedade, frio, incomodo tátil,
incomodo intestinal) ou por estimulação do meio (luz, som, movimentação, cuidado)
estariam ativariam diferentes aspectos Self, a ativação a possibilidade arquetípica de
reconhecimento e ter respostas (de satisfação ou insatisfação) Fordham chamou de
“deintegração” a essa ativação de diferentes aspectos do Self– com o processo de
descanso, sono, essa atividade do Self seria reintegrada, formando as bases para o
processo de desenvolvimento.
Ainda não há uma consciência capaz de sustentar imagens, representações, nem distinção
de realidade interior ou exterior. Para a criança, a mãe não é percebida em totalidade ou
como outro, a mãe é uma experiência que supre suas necessidades. Por esse motivo, por
não haver distinções, nem representações, logo, nem símbolos, falamos de objetos.
Essas locais e situações que ativam o processo de deintegração-reintegração do Self, são
chamados de primeiros objetos do Self, ainda indiferenciados, apenas elementos onde a
atividade a energia ou libido se direciona, com o tempo objetos do Self, em formam em si
pequenas ilhas de consciência, núcleos esparsos de consciência, as representações do
Self, com o processo de amadurecimento e a atividade integradora do Self, esses núcleos
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ou representações do Self, vão se integrar dando origem, ao longo de um longo período da
primeira infância ao Ego.
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se constituir a função transcendente e a elaboração simbólica. Para tanto, é necessária
uma relação adequada ou suficientemente boa com o ambiente, expresso nas relações
ambientais.
Os processos de constituição do Ego e das relações objetais vão caracterizar o processo
individuação na infância.
O Ambiente
O ser humano se torna humano mediante a relação com outro ser humano. Nosso ambiente
para além do ambiente natural é o ambiente simbólico. Assim, para a criança em seus
primeiros anos a mãe não é uma pessoa, mas, é o ambiente da criança. A relação com a
mãe vai mediar a relação com os objetos. Contudo, devemos compreender que a mãe é a
primeira experiência de ambiente, mas, estão se restringe a ela. Ao longo da infância a
relação com o ambiente relacional, familiar e social vai possibilitar a humanização do
potencial arquetípico fornecendo ao ego recursos que serão referência – seja participando
da organização, estabilidade e força do Ego ou na dinâmica dos complexos – para futuras
relações com o ambiente ou realidade.
As relações objetais irão compor os padrões de resposta que serão integrados tanto a
experiência de constituição do Ego quanto a experiência dos complexos. Quando falamos
num ambiente “materno suficientemente bom” na infância nos referimos a um ambiente de
segurança e nutrição, onde a criança poderá estabelecer relações e vínculos saudáveis e
uma capacidade simbólica que possibilita elaborar as adversidades sem um risco maior a
estrutura do Ego.
Ao longo da vida, as experiências com o ambiente, que podemos nomear aqui como
psicossociais, vão interferir diretamente nas relações que o ego estabelece tanto consigo
mesmo quanto com o ambiente. Essas experiências podem ser desde mudanças na família,
trabalho e idade, e implica no estabelecimento de uma nova possibilidade de
amadurecimento.
Apenas um aspecto fundamental: O ambiente é sempre relativo a uma realidade psíquica.
Ou seja, devemos compreender o ambiente em relação a quem indivíduo, isto é, ao ego
que está em relação com o ambiente. O Ambiente é sempre relacional.
As Defesas do Self
Em 1974, Fordham publicou um pequeno artigo chamado “Defences of The Self” onde, a
partir de uma discussão clínica acerca da transferência psicótica, apontou de forma mais
clara uma categoria de defesa que não se relacionava com defesas do Ego, mas, defesas
intensas que não distinguiam o objeto em si, mas, eram defesas totais, manifestas como
proteção contra a ameaça, abandono ou risco de destruição. Esse tipo de defesa,
promoveria uma forma de barreira de proteção contra total contra o objeto ou o ambiente
que é compreendido como nocivo ou ameaçador.
Fordham também utiliza uma analogia realizada pelo analista Leopold Stein, onde os
aspectos defensivos atuariam com ao sistema autoimune, e em determinados casos que
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poderiam se voltar contra própria a própria psique, impedindo o desenvolvimento de
relações objetais, da simbolização ou mesmo do processo de individuação.
Essas defesas do Self se caracterizam pela identificação projetiva, idealização, atuação
(act out), somatização e regressão (dentre outras).
Em si, as defesas do Self apontam para a autonomia e capacidade do Self, desde o início
do processo de desenvolvimento, em estabilizar, regular e manter a possibilidade de vida.
A questão é quando os processos de defesa se mantém tempo demais, ficando fixada e aí
assumem um caráter patológico.
Isso envolve um ataque à própria capacidade de experienciar a si mesmo, o
que significa “atacar os vínculos” entre imagem e afeto, a percepção e
pensamento, a sensação e conhecimento. O resultado é que essa experiência
se torna sem sentido, a memória coerente é “desintegrada” e a individuação
é interrompida.” (Kalsched, 2013 p. 76)
Algumas considerações
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Para finalizar, gostaria apenas de considerar alguns pontos
O modelo de desenvolvimento apontado por Fordham nos permite aprofundar nos quadros
clínicos graves e os aspectos destrutivos ou defensivos da psique, compreendendo sua
psicodinâmica dentro da uma perspectiva da individuação.
Na clínica é fundamental compreender a interação dialética com o ambiente – seja, ele
passado, presente e o ambiente terapêutico ou transferencial. Nesse sentido, a
compreensão do ambiente deve ser desde a perspectiva do indivíduo.
A reconstrução do eixo ego-self é um processo que precisa integrar as polaridades
dissociadas da experiência do indivíduo, para tanto é necessário um ambiente
suficientemente bom, isto é, um temenos capaz prover uma relação saudável que
possibilite o ego confrontar as defesas primitivas e abrir novas possibilidades de
experiências.
Referência bibliográfica
KALSCHED,D. Working with Trauma in Analysis, in STEIN, M(org) Jungian
Psychoanalysis, Chicago: Open Court, 2010
KALSCHED,D. O Mundo interior do Trauma, São Paulo:Paulus, 2010
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