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EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DE

JOVENS E ADULTOS: PARA ALÉM


DA FUNÇÃO SOCIAL E ESCOLAR,
A CONSTRUÇÃO DE UM PROJETO
EMANCIPATÓRIO.

Roberto Martins de Souza1, Luciana Maestro Borges2, Sandra Campos de Lima3 Elvis
Canteri de Andrade4, Cintia de Souza Batista Tortato5

RESUMO

Este artigo compõe uma síntese reflexiva oriunda de registros e relatos acumulados em quase dez anos de
ações educativas desenvolvidas no âmbito do PROEJA no Campus Paranaguá, Instituto Federal do Paraná
(IFPR). Iniciamos a memória das experiências com a oferta dos cursos PROEJA Técnico integrados à
educação básica, em 2009, até o período atual. Especificamente, nos interessa neste texto, apresentamos e
debatemos criticamente a reconfiguração que emerge desde 2013 e suas principais estratégias pedagógicas.
Nesse breve circuito de reflexões adotamos a concepção de EJA baseada na educação popular, momento em
que reconfiguramos o PROEJA sob a forma de cursos FIC/EJA, que tem como ponto de partida e referencial
as vivências, identidades, lutas e saberes construídos pelos sujeitos da EJA nas relações sociais, culturais e
políticas vivenciadas nos espaços sociais que reivindicam tempos de direitos humanos nas periferias de
Paranaguá e outros territórios sociais de abrangência das ações EJA/EPT.

PALAVRAS CHAVES: PROEJA, EJA, ações educativas.

1
Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná (2010). Professor do IFPR Campus Paranaguá – Eixo Proeja e Cursos
FIC. E-mail: roberto.souza@ifpr.edu.br
2
Doutora em Agronomia. Professora do IFPR Campus Paranaguá – Coordenadora Eixo Proeja e Cursos FIC. E-mail:
luciana.borges@ifpr.edu.br
3
Pedagoga - Eixo Proeja e Cursos FIC.
4
Mestre em Computação Aplicada. Professor do IFPR Campus Paranaguá. E-mail: elvis.andrade@ifpr.edu.br
5
Doutora em Tecnologia e Sociedade. Professora IFPR Campus Paranaguá. E-mail: cintia.tortato@ifpr.edu.br
Revista Científica Interdisciplinar - Instituto Federal do Paraná - IFPR Paranaguá, v4, n. 1. julho, 2018.
INTRODUÇÃO

Este artigo compõe síntese de experiências e registros acumulados em quase dez anos de ações
educativas desenvolvidas no âmbito da Educação de Jovens e Adultos integrado à Educação Profissional no
Campus Paranaguá, do Instituto Federal do Paraná (IFPR).
Especificamente, neste texto, apresentamos e discutimos as estratégias construídas pela equipe de
coordenação do Eixo PROEJA e cursos FIC, ao longo das experiências de oferta da modalidade FIC/EJA,
concomitante à educação básica, para assegurar o atendimento ao público matriculado na EJA ofertado pela
rede pública estadual, visando a elevação da escolarização articulada à profissionalização técnica, tendo em
vista atender as demandas de milhares de trabalhadores e trabalhadoras que não concluíram a educação
básica em Paranaguá6.
Nos interessa neste artigo apresentar o significado em construção, da concepção FIC/EJA e sua
configuração construída a partir de 2014, para além do Programa de Educação Básica Integrado à Educação
Profissional – PROEJA - instituído pelo Decreto nº 5.840/2006 e iniciado no Campus Paranaguá em 2009. A
importância dessa norma reside em ampliar as possibilidades de oferta do Programa, cujo acolhimento pelas
instituições da Rede Federal de Educação Tecnológica e Profissional passou a ser obrigatório, repercutindo
no Plano de Metas dos Institutos Federais (IFs), que deveria atender anualmente, no mínimo, 10% das vagas
com matrículas no PROEJA, em distintas modalidades. Desse modo, os gestores dos IFs teriam várias
“portas” de ingresso aos trabalhadores/as a partir de arranjos que permitiram um amoldamento da escola ao
mundo do trabalho, desde que, não se perca de vista, seus fundamentos emancipatórios.
Nesse circuito de reflexões recordamos as distintas experiências que construíram o PROEJA ou os
cursos FIC/EJA nos 10 anos do Campus Paranaguá. Para tanto, procedemos a coleta e análise de relatos de
docentes e estudantes, amparado em documentos (PPCs) e na vivência direta a partir da coordenação do
PROEJA e Cursos FIC no Campus desde 2014. Objetivamos dialogar criticamente com distintas

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Em Paranaguá, registra-se, segundo o IBGE (2010) cerca de 34% da população ocupada sem ensino fundamental concluído, ou
em números absolutos, atualizados para estimativa populacional do IBGE (2017), o equivalente a cerca de 51.000 pessoas.

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configurações, significados e objetivos, considerando este curto espaço de tempo, a mesma instituição e
Campus.
Desenvolvemos a discussão apresentando a construção da identidade EJA/EPT no Campus desde
2014, seus limites, avanços e desafios em um momento que se avança na expansão e no reconhecimento
público7 do Campus na oferta dessa modalidade, conquanto corra-se o risco de desperdiçar-se o acúmulo
dessas experiências, devido ao improviso, voluntarismo e indefinições que demostram a necessidade de uma
maior responsabilidade pública do IFPR com a política de Educação de Jovens e Adultos articulada à
Educação Profissional.

O Princípio dos Cursos PROEJA no IFPR e no Campus


A busca por configurar a identidade e a especificidade dos cursos PROEJA ofertados nestes 10 anos
de atuação do Campus Paranaguá nos levaram a identificar e caracterizar distintas experiências curriculares
e concepções educativas no recente período de constituição da Educação Profissional de Jovens e Adultos
no IFPR. Não obstante, essa curta construção se equipara as fragilidades e descontinuidades de sua trajetória
histórica no âmbito nacional: indefinições, voluntarismos e desestruturação.
O ponto de partida dessa retomada institucional inicia em 2006, com a publicação do PROEJA pelo
Decreto n° 5.840 (SETEC/MEC, 2006). Esse impulso legal aportou significativos recursos financeiros para
implantação de cursos PROEJA, sobretudo, na Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica no
período de 2007 a 20108, o que promoveu a abertura de três cursos presenciais na modalidade Proeja
Técnico integrado ao ensino médio, uma oferta na modalidade educação à distância e um PROEJA-FIC
concomitante ao ensino fundamental, este presencial. Os campi ofertantes foram Paranaguá, Curitiba9
(EAD) e Foz do Iguaçu. No seu início (2009), o IFPR disponibilizou cursos PROEJA em habilitações nas
quais os docentes da antiga Escola Técnica da UFPR possuíam formação profissional ou atendiam políticas

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Em 2017 o Curso EJA/FIC Gestão dos Territórios Tradicionais foi premiado com a Medalha Paulo Freire pelo MEC, que
reconheceu o curso como uma das cinco mais importantes experiências de EJA no âmbito nacional.
8
O MEC investiu significativos recursos em editais para alavancar a oferta dos cursos Proeja no período de 2007 a 2010. Após o
término desses investimentos percebe-se a brusca queda e o desestímulo da abertura de novos cursos, além da falta de apoio
institucional que passa a empregar esforços na abertura e consolidação dos cursos médios integrados e no PRONATEC.
9
Em Curitiba, o Campus EAD, oferta o curso Proeja Técnico em Pesca e Aquicultura a partir de 2010 na modalidade a distância
(telecentros) para quase 50 polos em todo o país. O curso a distância encerrou suas atividades em 2012 e viabilizou acesso à
escolarização e formação profissional de aproximadamente 2 mil estudantes pescadores artesanais, aquicultores e ribeirinhos
em todo território nacional. Sua coordenação foi exercida pelo Prof. Otávio Bezerra. O Campus Foz do Iguaçu ofertou em 2010,
de forma presencial, o curso PROEJA Técnico em Aquicultura, encerrando suas atividades em 2013.

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públicas desenvolvimentistas visando subsidiar as “vocações” locais, através da abertura de cursos ligados
ao setor portuário (Paranaguá) e as atividades pesqueiras de caráter produtivistas (Foz do Iguaçu, Curitiba e
Paranaguá).
Na breve análise sobre os cursos presenciais oferecidos no Campus Paranaguá, os relatos dos
docentes e documentos oficiais informam que na medida de sua implementação percebeu-se as dificuldades
enfrentadas na permanência dos estudantes (forte evasão, perfil docente, currículo inadequado, ausência de
um diagnóstico detalhado da realidade social, dentre outros) e na concepção educacional empregada, de
perfil funcional. Os resultados desse contexto permitem explicar a descontinuidade de oferta dos cursos
PROEJA nos anos seguintes.
A reflexão crítica sobre as experiências iniciais dos cursos PROEJA Técnico em Paranaguá é
abordada a partir do esboço de sua configuração específica, adotando como objeto de análise a concepção
educativa contida em seu Projeto Pedagógico de Curso (PPC), bem como relatos de docentes e estudantes
que atuaram desde sua abertura a partir de 2009 - Proeja Técnico Eletromecânica/Logística.
Cabe lembrar que a abertura dos respectivos cursos se justificava em diretrizes institucionais e
orçamento específico desde a SETEC/MEC e alcança compromissos formais com toda a Rede Federal EPT,
portanto, baseava-se em uma política de produção de indicadores de caráter conjuntural, ao invés de uma
ação planejada e construída com os sujeitos coletivos da EJA, seus fóruns e a rede pública estadual e
municipal. No que se refere a gestão do Campus Paranaguá, naquele período, supomos que os gestores
perderam a oportunidade de intervir num cenário com importantes experiências acumuladas na oferta da
EJA no litoral, considerando as peculiaridades da região e do público potencialmente beneficiário.
Não obstante a falta de integração entre as políticas de EJA e EPT em diferentes níveis de governo,
os documentos e relatos informam alguns dos limites institucionais da proposta de Educação Profissional de
Jovens e Adultos integrado ao ensino médio no IFPR: falta de perfil formativo de parcela dos professores
para atuar com o público EJA; concentração do curso em três anos (carga horária/ano alta - 800 hs/ano);
currículo e material didático inadequado, além de laboratórios incompletos ou equipamentos ausentes, o que
dificultava a aprendizagem de atividades práticas.
Considerando que o Campus recém tinha sido inaugurado, muitos limites infraestruturais e de apoio
pedagógico podem ser relativizados e justificados para os resultados de alta evasão, do mesmo modo, o
perfil de parcela dos professores concursados/contratados que atuaram nessas turmas indicava carência
(segundo relatos) na formação pedagógica em EJA.

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Na mesma perspectiva a gestão do Campus oferta em 2011 o curso PROEJA Técnico em Logística
integrado ao Ensino Médio, o que coloca ambos os cursos PROEJA voltados aos interesses formativos
vinculados ao arranjo produtivo local hegemônico (Porto de Paranaguá) numa concepção de educação
funcional.
A oferta dos cursos foram bem recebidas pelo público local embaladas por um cenário de boa
empregabilidade no setor portuário/empresarial, refletindo em uma procura considerável 10 de inscritos em
ambos os cursos PROEJA, mesmo com pouca divulgação. No entanto, ao que parece, a falta de
planejamento e diálogo com parcela precarizada da periferia, local onde se encontra o público da EJA por
meio de seus canais de comunicação e representação direta, encobriu a realidade do mundo do trabalho e
suas potencialidades produtivas, baseadas em grande medida, no mercado informal de trabalho.
A região onde o Campus está localizado concentra grande contingente de trabalhadores informais e
formas diversas de trabalho: catadores de papel, eletricistas, pedreiros, encanadores, diaristas, pessoal
empregado em serviços de alimentação, dentre outros, geram seu autoemprego como estratégia de
reprodução social, independente da disponibilidade de vagas no mercado de trabalho.
Em paralelo as experiências anteriores, nasce no segundo semestre de 2010, o curso PROEJA na
modalidade FIC, intitulado “Pesca e Aquicultura”, concomitante as séries iniciais do ensino fundamental,
ofertando vagas em sua maioria para o público de pescadores/as no município de Pontal do Paraná em
parceria com a Prefeitura Municipal/Secretaria Municipal de Educação. As aulas referentes às disciplinas da
educação básica foram ministradas pelos professores do município e os conteúdos da pesca e aquicultura
pelos professores do IFPR. O curso alcançou 3 anos de duração, ocorrendo 2 vezes por semana no período
vespertino. A experiência encerrou-se em 2012 registrando-se uma única turma em todo o período. Inúmeras
diferenças distinguem esse curso das experiências anteriores com o PROEJA Técnico, a começar pela
mudança de eixo tecnológico, de Processos Industriais para Recursos Naturais; a modalidade concomitante
ao ensino fundamental, ao invés da oferta integrada e exclusiva da educação básica pelo IFPR; o público são
em sua maioria mulheres pescadoras ou com vínculos na pesca artesanal sem a preocupação exclusiva de
formar para o mercado de trabalho; o curso é ofertado fora do campus, na escola municipal de Pontal do
Paraná e, por fim, tem-se um considerável êxito de formandos.

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Ambos os cursos iniciaram suas atividades com matriculas completas.

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No entanto, para fins desse texto, pouca informação e documentos se obteve à forma como ocorreu a
integração curricular entre a educação profissional e a educação básica, assim como não se tem informação
da realização de levantamento de diagnóstico sobre a realidade social local e suas demandas na pesca.
As experiências das turmas e modalidades distintas de PROEJA mencionadas, encerram-se no biênio
de 2011 e 2012 sem propostas de continuidade e abrindo um curto vácuo dessa modalidade no Campus
Paranaguá. Nessa nova fase, aos orientações da SETEC/MEC para a Rede Federal EPT direcionam o foco
para a consolidação dos cursos médios integrados e as licenciaturas, momento em que o PROEJA perde
espaço nos campi para o Pronatec, política de qualificação profissional lançada em 2012 pelo governo
federal.
O Pronatec assume um papel preponderante no IFPR com coordenação centralizada na reitoria,
coordenações remuneradas nos campi e recursos financeiros em abundância. A partir desse cenário não se
registra a abertura de nenhum curso PROEJA em todo IFPR, entre 2012 e 2013.

Uma Nova Construção Identitária EJA/EPT


A concepção do PROEJA adotado a partir de 2014 no Campus Paranaguá reconstrói-se a partir de
um olhar não exclusivamente escolarizado e, escapa dos limites de um “Programa” para assumir a histórica
identidade da EJA, agora articulada à EPT. A EJA/EPT no campo dos direitos e não da mera segunda
oportunidade, passa a ser pensada como criação de espaços pela educação continuada ao longo da vida, o
que nos facultou mudanças nas estruturas curriculares que os excluem do trabalho, da vida, da moradia, de
sua memória, cultura e identidade coletiva.
Essa nova configuração11 não deve a sua realização às diretrizes institucionais ou programas com
fartos recursos financeiros. Ao contrário, a iniciativa nasce de alguns educadores vinculados ao eixo de
recursos naturais, recém chegados ao campus, cuja as experiências com Educação de Jovens e Adultos do
Campo consigna a retomada da proposta com aval da direção do Campus.
Ao acionarmos o Decreto que cria o PROEJA, apostamos no marco legal da proposta de cursos na
modalidade PROEJA-FIC para propormos uma modalidade de EJA/EPT adaptada ao tempo do
trabalhador/a. Essa possibilidade de diversificar e flexibilizar a oferta da Educação Profissional – EP

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Participaram como coordenadores de sua construção e implementação nos anos de 2013 e 2014 os Profs. Ezequiel Antonio de
Moura e Roberto Martins de Souza. Ambos à época estavam lotados no Eixo de Recursos Naturais e haviam chegado no Campus
Paranaguá em abril de 2013, mediante processo de remoção do Campus Telêmaco Borba/Ortigueira.

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articulada à EJA correspondeu até o momento com a realidade local dos trabalhadores/as da periferia,
impossibilitados em sua maioria de frequentar uma proposta PROEJA Técnico12, em condições de pouca
estruturação, falta de pessoal capacitado e recursos de assistência estudantil no IFPR.
No entanto, outra mudança significativa se explicita ao adotarmos a concepção da EJA como
norteadora da ação educativa profissional e tecnológica, ao invés da perspectiva predominantemente
tecnicista e desenvolvimentista de perfil funcional, resgatamos à metodologia da educação popular de viés
cultural, centrada na formação humana e emancipatória. Nessa orientação, mudam-se os critérios de
definição para a oferta dos cursos profissionalizantes, uma vez que consideram-se as situações-problema
como definidoras principais das propostas de cursos de qualificação profissional e, não mais as demandas do
mercado do trabalho como prioridade.
Essa mudança formativa visa potencializar primeiramente o sentido da cidadania e dos direitos
básicos, além de fornecer status de dignidade aqueles que estão no mundo do trabalho informal em cenários
de baixa empregabilidade e escolaridade13. Não se trata de oferecermos o mínimo para quem teve negado
historicamente seus direitos básicos, mas importa criarmos um ambiente inicial que estimule e envolva os
sujeitos EJA à se reencontrar com a educação escolar e profissional e seu encantamento, a partir de sua
experiência de vida e no mundo do trabalho. Por isso, muitos estudantes EJA/FIC retornaram
definitivamente à escola para concluir a educação básica e continuamente permanecem buscando processos
seletivos no IFPR em novas modalidades, assim como seus familiares, desmitificando a imagem elitizada do
Campus.
Ao observar as situações-problema buscamos transformá-las em propostas pedagógicas que tem por
finalidade superar as contradições sociais locais: saneamento, energia elétrica, segurança alimentar, direito à
moradia, fortalecimento da cultura local, a comunicação popular, a inclusão digital e o direito das mulheres.
Nessa perspectiva o currículo FIC/EJA propõe a relação ensino-aprendizagem baseada no diálogo
com as experiências dos sujeitos da ação coletiva, colocando em destaque o protagonismo e auto-
organização dos estudantes como condicionante, tendo na compreensão crítica das trajetórias de vida, na
leitura das contradições locais, na valorização das experiências acumuladas no mundo do trabalho e na

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No decorrer do Programa Mulheres Mil, havíamos realizado levantamento da possibilidade das mulheres egressas
frequentarem um curso PROEJA Técnico. Na maioria dos casos as mulheres disseram não haver possibilidade em razão do
tempo comprometido e de não possuírem a escolarização exigida, além de outras motivações familiares e de trabalho.
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A cada ano menos 30% dos estudantes que procuram os cursos FIC/EJA no IFPR não concluíram as séries iniciais do ensino
fundamental.

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qualificação de seus conhecimentos práticos, os instrumentos metodológicos que atuam, em última instância
como alavanca da transformação das relações de poder no local onde se vive.
Vale frisar que nessa proposta a própria EP incorporara-se à EJA enquanto concepção educativa
articulada à totalidade do que chamamos de Educação Profissional de Jovens e Adultos, tendo como
referencial as vivências, identidades, lutas e saberes construídos pelos sujeitos da EJA nas relações sociais,
culturais e políticas vivenciadas nos espaços sociais, que reivindicam “tempos de direitos humanos” nas
periferias de Paranaguá, principalmente quando estes são negados historicamente. A bem da verdade, a
finalidade da formação, logo, não tem sido suprir exclusivamente carências de escolarização, mas estimular
por meio da vinculação da matrícula da EJA ao FIC, atendimento estudantil por meio de bolsas e
atendimento humanizado pela equipe dos cursos e todo Campus. O saldo educacional, no entanto, deve ser a
garantia ao acesso, permanência e êxito na EJA/EPT sintonizada com direitos específicos de um tempo e
situação especifica de vida.
Pretendendo a integração curricular a proposta se desenhou inicialmente na tentativa de diálogo com
a coordenação dos cursos EJA do Núcleo Regional de Educação de Paranaguá 14, e passou na prática a
concentrar-se na elaboração conjunta com a direção e equipe pedagógica do Colégio Estadual Porto Seguro
até o ano de 2016. A partir de 2017 as articulações EJA/EPT estenderam-se para o CEEBJA Paranaguá
(APEDs) e o Colégio Estadual Vidal Vanhoni, viabilizando um caminho de oferta invertido, ou seja, os
estudantes procuram os cursos FIC/EJA do IFPR e são encaminhados para matrícula na EJA ofertada pela
rede pública estadual e municipal. Essa parceria15 tem ampliado as turmas de APEDs e nas escolas
ofertantes, fortalecendo os cursos EJA em Paranaguá.
O diálogo institucional em torno da EJA, ocorre, portanto, mediado pela oferta dos cursos FIC/EJA
do IFPR, e se especializa no planejamento coletivo curricular através do curso de formação docente (40hs)
ofertado desde 2014 até 201716 aos professores ministrantes na EJA nas escolas estaduais.

14
O NRE de Paranaguá desiste da proposta e se ausenta das discussões antes do início do curso (2014) em razão da orientação
da SEED.
15
Neste contexto, o desafio do reencontro com a educação escolar não se viabiliza somente com a oferta de cursos
profissionalizantes, por isso temos nos empenhado na articulação com a Rede Estadual e Municipal ofertante da EJA, a fim de
pactuarmos a sincronização e organização dos calendários e abertura de turmas (APEDs) mais próximas as casas dos estudantes
dos cursos EJA/FIC e em horários noturnos para que não ocorra a sobreposição de aulas.
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O curso foi encerrado em 2017 devido a pressões do NRE de Paranaguá e SEED que não renovaram o convenio de formação
com o IFPR.

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O Currículo desde os Sujeitos da EJA
Para detalhar a construção curricular das propostas apresentadas no subitem acima, descrevemos
como se delineou a configuração específica dos cursos FIC/EJA a partir da resposta a uma questão básica:
quem são os sujeitos EJA/EPT em nossa periferia? Procede-se, então, para as atividades de levantamento e
prospecção da realidade local e as situações-problema que norteiam a construção dos PPCs. Nesse rumo
elaboramos sempre experimentalmente17 o currículo, as ementas, metodologia de ensino e temas geradores
para cada área específica. Colaboram para alavancar a experiência a realização de projetos de extensão na
periferia de Paranaguá e outras realidades diversas (pescadores artesanais, faxinalenses,...). A investigação
sobre os sujeitos da EJA ocorreu também com mais profundidade durante a realização das atividades do
Programa Mulheres Mil18, focado no público da periferia de Paranaguá, momento em que compreendemos
situações fundamentais que embasaram a elaboração das propostas dos cursos FIC/EJA desde 2014.
Assim, procedemos a metodologia de abordagem que inicialmente preconizou o contato direto com
os sujeitos da periferia em seus locais de moradia ou mediados por suas organizações, somados a reuniões e
visitas às escolas municipais e estaduais ofertantes da EJA, bem como o CRAS local. Essa busca ativa, nos
levou a um maior conhecimento sobre as condições sociais e econômicas precarizadas, revelando um
histórico de negligências e violações de direitos promovidos pela inação do poder público em suas diferentes
esferas, sobretudo, com o direito à moradia adequada e a insegurança alimentar.
Não obstante, as condições sociais refletirem a baixa escolaridade, essas informações eram
evidenciadas em entrevistas com jovens e adultos entre a população residente nas áreas de ocupação
irregular visitadas. Em que pese a oferta razoável de vagas na EJA em todas as modalidades do ensino
básico na região, observamos como limitações à escolarização: a ausência de programas de alfabetização,
distância das escolas ofertantes, falta de campanhas efetivas para EJA, alta taxa de evasão nas turmas e uso
de abordagens conteudistas e de viés supletivo.
Verificamos no imaginário social da população da periferia, amplo desconhecimento acerca das
possibilidades de ingresso nos cursos ofertados pelo IFPR, em qualquer das modalidades. Os relatos da
população local identificavam o Campus Paranaguá como uma “escola elitizada” de capital privado, uma

17
Todo ano as propostas pedagógicas sofrem revisões mediante avaliação das turmas e diálogo entre educadores participantes.
18
O Programa Mulheres Mil teve a coordenação da Profa Luciana Maestro Borges de 2014 e 2015, momento em que é
encerrado. Como os propósitos dos cursos são semelhantes, busca-se com os cursos FIC/EJA encaminhamento para
escolarização.

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vez que poucos sabiam da possibilidade de seus filhos ingressarem no ensino médio ou superior, e do
público da EJA em potencial, ter informações acerca da oferta de cursos que os atendesse.
No percurso de visitas e conversas pela periferia de Paranaguá, experimentamos conhecer para além
da situação social atual, as trajetórias de vida dos moradores da periferia local, o que nos levou interpretar o
contexto e identificar o foco da ação educativa, sempre atento as orientações colhidas no CRAS,
Associações e escolas, pastoral da Igreja católica e, quase uma dezena de bairros, dentre eles: Porto Seguro,
Vila Garcia, Conjunto Cominese, Jardim Ouro Fino, Jardim Esperança, Vila dos Comerciários, Parque
Agari, Jacarandá II, Jardim Paraná, Jardim Social, Jardim Vale do Sol, além de outras ocupações irregulares
localizadas na região leste e norte da cidade. Estima-se que cerca de 70 mil habitantes moram nas
localidades periféricas de Paranaguá, sendo 25 mil moradores no entorno imediato ao Campus do IFPR.
Parte significativa desses sujeitos sociais da periferia são oriundos de áreas de remoção compulsória
em razão da expansão do terminal portuário de Paranaguá, ou se deslocaram em razão do sobrepreço de
aluguéis e como resultado do descontrole da função social da terra urbana provocado pela especulação
imobiliária em determinadas regiões cobiçadas pela especulação imobiliária, razão direta da segregação
socioespacial derivada da ausência de planejamento urbano voltado para políticas de habitação de interesse
social. Característica evidenciada nessa região são as precárias condições de moradia e de urbanização
recorrentes em regiões periféricas das cidades.
Para além dos evidentes conflitos sociais, algumas identidades coletivas específicas nos chamaram
atenção entre o público da EJA: a presença de trabalhadores migrantes (da região nordeste do País e cidades
vizinhas), negros e mulheres em condições de desemprego e subemprego, catadores de papel e reciclados,
diaristas e biscateiros. Todos caracterizados pela concomitância entre o trabalho de manutenção da casa e da
família, por vezes em jornadas duplas ou triplas de trabalho, o que nos fez compreender os tempos e espaços
de vida, condição básica para ajustarmos os tempos escolares da EJA/FIC. Nas visitas e conversas junto a
população dos bairros e ocupações irregulares as principais demandas presentes no cotidiano dos moradores
se referia a ausência de regularização fundiária, indisponibilidade ou irregularidade de serviços públicos
essenciais (água, energia, coleta de lixo, arruamento, saneamento, etc), situações de violência doméstica,
insegurança alimentar, desemprego, dentre outros.
O olhar da dura e humilhante realidade social que vive a população da periferia coadunado com o
papel da escola e, sobretudo, da EJA, a todo instante nos remete a buscar em Arroyo (2007) o caminhos para
pensar nosso ofício, nosso lugar e compromissos como educadores. Para o autor a EJA tem que ser uma

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modalidade de educação para sujeitos concretos, em contextos concretos, com histórias concretas, com
configurações concretas. Sendo que, qualquer tentativa de diluí-los em categorias amplas os desfigura.
Neste cenário, os levantamentos, mapas e informações da base de dados do CRAS corroboraram com
uma compreensão mais nítida acerca da realidade socioeconômica ao demonstrar ocorrências de situações
de vulnerabilidade e riscos sociais no território de abrangência da Unidade do CRAS da Vila Garcia. As
reuniões com os gestores locais permitiu ainda, informações mais específicas que retratam situações
localizadas de insegurança alimentar, acesso a moradia, violência doméstica, escolarização e renda das
famílias.
Ao partir desse capital de relações e conhecimentos compartilhados, identificamos ao longo desses
anos de aproximação diversas formas de solidariedade e organização social que perfazem desde ações
coletivas contingenciais (mutirões, festas comunitárias, arrecadações) até a presença de movimentos
objetivados em associações de moradores, comissões locais, pastorais, grupos de apoio evangélicos, que
administram “projetos sociais” e mantém ações “assistenciais” nos bairros. Em todas essas organizações o
protagonismo feminino se manifestou, indicando a pré-existência de rede local de apoio a superação ou
potencialização da ação do Estado, especialmente, à ação educativa. Tais redes de apoio operam de forma
contingencial e se caracterizam muitas vezes pelas relações de parentesco e laços de solidariedade
construídos em torno de uma necessidade coletiva ou individual.
Esse diagnóstico ampliado, agora relatado, apoiado em projetos de extensão e pesquisa dos
professores do EJA/EPT, qualificado, ano após ano, tem servido para o conhecimento prévio do cenário
social, econômico, educacional, do mundo do trabalho e da situação dos direitos humanos dos moradores
das periferias de Paranaguá. O conjunto de informações tem fornecido noções aproximadas da realidade
social que serviram para organizar projetos pedagógicos dos cursos a serem ofertados desde 2014, com
algumas inovações metodológicas e temáticas que reconfiguraram a especificidade da experiência a cada
ano.
Conhecer essas particularidades locais e suas contradições sociais, nos permitiu compreender a
heterogeneidade peculiar das identidades coletivas, tempos e espaços de vida e trabalho, violação de direitos
humanos a serem superadas e construir relações sociais com os sujeitos da periferia, pressuposto
fundamental da ação educativa. Tem-se, com isso, os elementos básicos para iniciar o delineamento da
configuração proposta à EJA/EPT, de forma mais adequada e apropriada ao planejamento da modalidade de
ensino, proposta curricular e metodologia a ser ofertada.

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Os Cursos EJA/EPT no Campus Paranaguá (2014 à 2018)
As condições objetivas de existência social, as trajetórias de vida, as experiências escolares e, a
vivência no mundo do trabalho, são fatores que nos levam a ofertar a modalidade FIC/EJA19 desde 2014,
pois a experiência anterior demostrou que, sem um corpo docente e servidores técnicos especializados em
EJA, uma sólida política de assistência estudantil, recursos financeiros para operacionalização das atividades
escolares diversas e, formação continuada de docentes, diminuem as possibilidades de garantir a
permanência e o êxito dos estudantes.
Pelo lado do estudante EJA a decisão de retornar à escola e reorganizar seu tempo de trabalho e
relações familiares não depende somente da proximidade da escola e moradia, na maioria das vezes a
barreira da distância entre a escola, o trabalho e a casa não significa o único obstáculo para o retorno ao
ambiente escolar. Os limites que se impõe a esse retorno são múltiplos, mas sem dúvidas iniciam na forma
de oferta do curso e, consequentemente, se estendem as condições objetivas de sua permanência, além de
fatores determinantes a sua reprodução social e física.
Essas variáveis operam de modo decisivo sobre as escolhas dentro de uma margem de manobra
sempre curta para o estudante a qual a equipe dos cursos FIC/EJA deve estar preparada ao propor o PPC dos
cursos. Por isso mais do que ofertar matrículas PROEJA a experiência nestes cinco anos dos cursos FIC/EJA
nos ensinou a moldar a escola à realidade social local e aos desafios dos sujeitos da EJA, mesmo quando os
cursos se realizam fora do Campus em unidades remotas.
Nestes casos estendemos desde 2015 os cursos FIC/EJA para outros municípios do Paraná, com o
objetivo de atender demandas formativas específicas de povos tradicionais e grupos sociais vulnerabilizados
(População de Rua, LGBT, Movimento Negro, dentre outros). A capilarização nos meandros da diversidade
étnico-cultural e interiorização pelo Estado do Paraná destas experiências tem se demostrado exitosa,
considerando tratarem-se de coletivos que encontram pela primeira vez a oferta de cursos profissionalizantes
públicos e relacionados a suas demandas.

19O PROEJA Técnico Integrado ao Ensino Médio, ainda que essa seja uma perspectiva em nosso horizonte,
somente se viabiliza na medida em que a instituição forneça as condições materiais e humanas para sua execução.
Um importante passo foi a aprovação das Diretrizes para os Cursos EJA/EPT no IFPR em 2018.

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Tabela 01 – Cursos EJA/FIC ofertados de 2013 a 2018, Campus Paranaguá.
Ano Curso EJA/FIC CH Local Alunos Formandos
Matriculados
2014 Agente de Desenvolvimento 160 Paranaguá 40 20
Socioambiental
2015 Agente Cultural 240 Paranaguá 40 22
Pescadores Artesanais (EJA 160 Guaraqueçaba 25 18
Campo)
2016 Eletricista Residencial 160 Paranaguá 30 21
Economia Solidária 240 Paranaguá 30 20
2017 Auxiliar em Agroecologia 360 Paranaguá 30 22
Defensores Populares 160 Paranaguá 30 21
Inclusão Digital 200 Paranaguá 30 19
Gestão dos Territórios 160 Guaraqueçaba 25 16
Tradicionais – Pescadores
Artesanais (EJA Campo)
2018 Auxiliar em Agroecologia 360 Paranaguá 35 25*
Defensores Populares – 240 Paranaguá 35 22*
Paranaguá
Defensores Populares – 160 Curitiba 35 25*
Curitiba
Operador de Direitos Étnicos e 160 Pinhão e Turvo 30 22*
Coletivos – Faxinalenses (EJA
Campo)
Operador de Direitos Étnicos e 160 Guaíra, 30 18*
Coletivos – Ilhéus do Rio Querência do
Paraná (EJA Campo) Norte e
Umuarama
Operador de Direitos Étnicos e 160 Tomazina e 25 25*
Coletivos – Guarani (EJA Santa Amélia
Campo)
Total 470 179**/316***
* Prováveis formandos 2018. ** Formados 2014 à 2017. *** Prováveis Formandos 2014 à 2018.
Fonte: Arquivos autores, 2018.

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A que se considerar que esse atendimento diverso e muitas vezes distante do Campus Paranaguá tem-
se viabilizado em razão da criação do Eixo PROEJA e Cursos FIC no final de 2016. Apesar de contar com
somente dois docentes lotados nessa área, nota-se pela tabela 1 a ampliação da oferta de cursos em 2017 e
2018 como consequência de uma disponibilização maior de tempo dos docentes20 para organizar e executar
a política dos cursos FIC/EJA no Campus. Importa ressaltar que três a quatro docentes 21 do campus
colaboram em conteúdos específicos e outros cinco já colaboraram nos últimos anos. Além disso a parceria
com a Defensoria Pública do Estado e da União tem viabilizado a colaboração de seus quadros na formação
dos cursos de Defensores Populares.
Outrossim, a relação direta com as coordenações dos movimentos sociais tem possibilitado construir
coletivamente currículos, além de divulgar e selecionar os candidatos aos cursos, organizar os espaços e
tempos educativos nas comunidades onde se realizam, tornando-se parceiros fundamentais e imprescindíveis
na execução das propostas pedagógicas.
Para além da narrativa na defesa dos cursos FIC/EJA, os registros de acompanhamento dos efeitos
práticos dos cursos e os relatos dos estudantes egressos e seus coletivos informam que os objetivos estão
sendo alcançados de diversas formas dependendo do curso a que se referem: em agroecologia
multiplicaram-se as hortas para segurança alimentar nos bairros da periferia e a qualidade alimentar das
famílias envolvidas no curso; no FIC de defensores populares se contabilizam cerca de dez oficinas
populares sobre violência doméstica contra mulher além de uma prática constante de orientação a mulheres
em situação de violência; nos cursos ofertados nas comunidades tradicionais já foram publicados cartilhas e
documentos sobre direitos étnicos amplamente utilizados em ações judiciais e no cotidianos das relações
conflitivas a que estão submetidos os agentes sociais participantes dos cursos.
Por fim, tomando esses registros como reflexos de transformações práticas promovidas pela ação
educativa proposta pelos cursos FIC/EJA acrescidos ao público atendido, em especial, na periferia de
Paranaguá, podemos afirmar que para além do voluntarismo e do improviso que caracterizam a política da

20
Trata-se da Profa Luciana Maestro Borges e do Prof. Roberto Martins de Souza. Além disso, desde 2018 contamos com 2
estagiários para realização do trabalho administrativo e pedagógico Edilaine Aquino (2018) e Sandra Campos de Lima (desde
2015).
21
Os professores Elvis Canteri de Andrade (Eixo de Informática), Cintia Batista de Souza Tortato e Marcos Vinicius Pansardi (Área
de Ciências Humanas) e Lívia Maria (Eixo de Logística) colaboram desde 2017 com temáticas específicas nos diferentes cursos.
Além disso em outros anos já tivemos colaboração de outros professores do Eixo de Processos Industriais (Rubens Reis e Rafael
Kawano), Gislaine Seiberth, Elaine Mandelli Arns, Rosana Padilha e Antonio Galvão (Área de Linguagens), Everaldo Santos e
Ezequiel Antonio Moura (Eixo de Recursos Naturais).

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EJA no IFPR, podemos avançar efetivamente no atendimento ao direito à educação de jovens e adultos em
nossa instituição se cumpridos compromissos relacionados à contratação/concurso de educadore/as, apoio
orçamentário, formação de educadores em EJA, estruturação dos eixos EJA/EPT nos Campi. Somente com
responsabilidade política e compromisso com as diretrizes da EJA/EPT iremos avançar na direção das
funções sociais da EJA no IFPR, ou seja, ser reparadora, equalizadora e qualificadora, da imensa massa de
deserdados do direito à educação no Paraná.

Considerações Finais
O breve histórico dos cursos PROEJA e FIC/EJA no Campus Paranaguá nos permitiu conhecer e
refletir criticamente sobre uma trajetória caracterizada pelo improviso, voluntarismo e indefinições de uma
política pública que cobra maior responsabilidade pública dos gestores do IFPR como um dos principais
desafios da instituição. Essa afirmação corrobora com mais de cinco anos de contínuo esforço para manter a
proposta EJA/EPT minimamente funcionando para atender volumosa demanda reprimida do público em
potencial da EJA, sobretudo, em Paranaguá.
Os debates sobre as experiências não pretenderam uma explicação absoluta e finalística sobre o tema,
porém sinalizam formas muito distintas de se fazer o PROEJA com resultados diferenciados, devido as
abordagens pedagógicas e modalidades peculiares que redesenham as configurações, significados e
objetivos formativos que atravessam sua recente história no Campus e no IFPR.
Ante os diversos limites para operacionalizar propostas PROEJA apresentados neste artigo,
relatamos a prioridade em reconfigurarmos nossa ação educativa por uma proposta de EPT assentada na
concepção de EJA e na metodologia da educação popular, numa perspectiva que ultrapassa a carência
escolar, expandindo-se para o conceito de educação ao longo da vida de jovens, adultos e idosos. Por esse
motivo apresentamos a construção conceitual e operacional dos cursos FIC/EJA numa versão ainda
insuficiente para atender as reais demandas do público da EJA integrada à EPT. Todavia, estamos cientes de
que essa versão corresponde a proposta EJA/EPT atrofiada pelo limitado compromisso institucional com a
Educação Profissional e Tecnológica de Jovens e Adultos integrada à Educação Básica.
Ainda que deficitária essa escolha que adotamos tem permitido a “liberação” de parcela da demanda
reprimida entre o público da EJA, resultando em centenas de pessoas nos últimos anos à retornarem à
escolarização como condição para se matricularem nos cursos FIC/EJA pressionando a relação demanda-
oferta para a rede pública estadual e municipal de ensino.

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Destacamos também que uma das maiores potencialidades que dispomos em nossa ação educativa é
o capital das relações sociais com os movimentos sociais populares e instituições que atuam diretamente
com o público beneficiário do PROEJA, tendo nos projetos de pesquisa e extensão o princípio do diálogo de
saberes e um conhecimento aprofundado das contradições sociais e realidades localizadas que afetam os
sujeitos da EJA. A relação de confiança torna-se neste viés a construção dos cursos tarefa coletiva de
educadores e os sujeitos da EJA, motivo pelo qual mesmo em cenários adversos as propostas se realizam em
virtude das parcerias que amortecem as dificuldades financeiras e acentuam a necessidade de diálogo e
cooperação entre os participantes, sempre garantidas pelos grupos acolhedores dos cursos. Nessa esteira é
importante lembrar de parceiros externos como as defensorias públicas e professores de outras universidades
(Prof. Marcelo Varella e Profa. Leticia Duarte da UFPR Litoral) além do inestimável apoio e voluntarismo
de colegas docentes do campus Paranaguá e das estagiárias que muitas vezes cumprem papéis fundamentais
na efetivação das propostas.
Importante destacar, que este artigo se trata de um ensaio inicial da metodologia de educação popular
iniciado em 2013 alçou maturidade pedagógica e administrativa, o que viabilizou a ampliação dos cursos
com um menor índice de evasão e uma ação efetiva na formação do perfil profissional pretendido, bem
como no estímulo ao retorno à escolarização nos colégios estaduais e municipais ofertantes da EJA e, em
mudanças significativas nas situações-problema encontradas na periferia de Paranaguá e demais territórios
sociais onde os cursos se realizam.
Por fim, ao propor uma reflexão a respeito das trajetórias da EJA/EPT temos como mote central a
consideração da categoria trabalho na agenda pedagógica. A compreensão do mundo do trabalho, suas lutas
e seus desafios é essencial para a construção do currículo para a modalidade EJA/EPT, uma vez que a
agenda pedagógica deve ser modelada pela vida concreta dos sujeitos em luta para garantir o direito à
educação, tanto objetivamente no desafio que significa retornar a escola, quanto simbolicamente no meio
social, pela busca de sobrevivência e reconhecimento.

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