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IV Encontro Nacional da Anppas

4,5 e 6 de junho de 2008


Brasília - DF – Brasil
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Análise de Projetos de Educação Ambiental a partir dos


seus princípios

Luiz Vasconcelos da Silva Filho (UFPR - Curitiba)


Tecnólogo em Saneamento Ambiental, Mestrando em Engenharia de Recursos Hídricos e
Ambiental
luizcwb@onda.com.br

Paula Espindola Mielke (UNESP – Rio Claro)


Tecnóloga em Saneamento Ambiental, Mestranda em Educação
pemiellke@yahoo.com.br

Sandro Tonso (CESET/UNICAMP)


Doutor em Geociências, Professor/Pesquisador UNICAMP
sandro@unicamp.br

Resumo

A Educação Ambiental que tem como base o questionamento sobre as relações entre ser
humano e ambiente, e entre os próprios seres humanos, traz uma revisão da práxis e um
re-posicionar-se sobre questões e problemas presentes no cotidiano. Revisão esta que
promove uma reflexão sobre o distanciamento entre teoria e prática quando não há um
aprofundamento dos seus princípios. O presente trabalho propôs analisar qualitativamente
a relação entre teoria e prática em projetos de Educação Ambiental, na procura por se
estabelecer o grau de relação existente entre estes dois campos. A análise baseou-se na
adoção de seis conceitos relacionados à Educação Ambiental, sendo eles: autonomia,
complexidade, representação social, interdisciplinaridade, diálogo e criticidade. Com base
no estudo destes conceitos foram estabelecidos parâmetros que permitiram identificar as
maneiras com que cada conceito era concretizado nas práticas dos projetos analisados. A
busca por se realizar uma análise qualitativa sobre o desenvolvimento dos projetos de
Educação Ambiental, promoveu o encontro do que seria a essência de cada conceito
utilizado. Desta forma, a relação estabelecida entre prática e teoria nos projetos analisados
apresentou uma classificação das formas de Educação Ambiental desenvolvidas em cada
projeto/atividade, como também uma análise da proximidade ou distanciamento sobre o
que foi inicialmente proposto nos projetos e do que foi efetivamente desenvolvido.

Palavras-chave
Educação Ambiental, princípios, análise de projetos.
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Análise de Projetos de Educação Ambiental a partir dos seus princípios

1. Introdução

1.1. Os problemas ambientais como propulsores de uma “nova educação”


Os problemas ambientais tomaram grandes proporções nas últimas décadas, não apenas devido
à maior divulgação de informações sobre o desequilíbrio ambiental global, como também pelo
aumento da percepção das pessoas sobre os problemas ambientais locais. Esse quadro
possibilitou e possibilita uma reflexão e discussão bastante complexa sobre as causas dessa
degradação, o que potencializa a identificação e o conhecimento sobre as diversas influências
existentes que promovem e desenvolvem esse desequilíbrio.

De acordo com WORSTER (citado por GRÜN, 1996) os seres humanos adquiriram
autoconsciência da possibilidade de destruição do planeta com a primeira bomba H e com as
bombas de Hiroshima e Nagazaki, o que acabou plantando “as primeiras sementes do
ambientalismo contemporâneo” (WORSTER apud GRÜN 1996, p.16).

Um dos marcos da propagação do alerta sobre os problemas advindos do modelo de


desenvolvimento econômico adotado foi o livro “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson,
publicado em 1962, que reuniu uma série de fatos sobre o desequilíbrio ambiental, alertando a
comunidade internacional para o problema (GRÜN, 1996).

Nessa época, o Brasil estava na contramão de todo esse processo. Como os demais países em
desenvolvimento, havia uma grande procura e incentivo à industrialização e aos grandes
empreendimentos, como as Usinas Hidrelétricas (GUIMARÃES, 2003).

1.2. Educação Ambiental


A “Conferência de Estocolmo” (Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano), em
1972, reuniu representantes de 113 países e colocou a necessidade de “mudanças profundas nos
modelos de desenvolvimento, nos hábitos e comportamento dos indivíduos e da sociedade, e isso
só poderia ser atingido por meio da educação” (DIAS, 2003, p.74).

No entanto, a educação realizada na época não possuía possibilidade de fomentar essa mudança
devido à sua característica rígida e distanciada da realidade das sociedades. Desta forma, surgiu
a proposta de realizar uma Educação Ambiental (EA) como um “novo” processo educacional,
capaz de prover a mudança necessária (DIAS, 2003).
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Em Belgrado, Iugoslávia (1975), no Encontro Internacional de Educação Ambiental foram
formulados princípios, objetivos, conteúdos e métodos para uma EA, o que impulsionou a
elaboração da Carta de Belgrado (REIGOTA, 2002), na qual se expressava a “necessidade do
exercício de uma nova ética global, que proporcionasse a erradicação da pobreza, da fome, do
analfabetismo, da poluição e da dominação e exploração humana” (DIAS, 2003, p.80).

A discussão sobre o que viria a ser Educação Ambiental trouxe conceitos e abordagens diferentes
em função da posição dos países. Os países desenvolvidos apoiavam uma EA que não mostrasse
as “mazelas ambientais, sócio-econômicas, políticas, ecológicas, culturais e éticas” (DIAS, 2003,
p.82) que os modelos de desenvolvimento econômicos adotados produziam.

Em 1977, a Unesco organiza, em colaboração com o PNUMA – Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente, a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental.
Conhecida como Conferência de Tbilisi, que foi e ainda é um dos marcos da Educação Ambiental.
A Conferência além de colocar a necessidade dos Estados membros incluir em suas políticas de
educação medidas que visassem a incorporação de conteúdos, diretrizes e atividades em
Educação Ambiental (EA), e convidar as autoridades de cada país a incentivar as reflexões e
pesquisas nessa área, definiu princípios, objetivos e características da EA (DIAS, 2003).
Guimarães (2003) cita alguns princípios presentes, como:

§ Necessidade de um processo contínuo e permanente, que atingisse todos os níveis da


educação formal ou informal;

§ Análise dos problemas ambientais através de uma ótica global e equilibrada, utilizando
conteúdos de cada matéria, em uma perspectiva interdisciplinar;

§ Análise de questões locais, nacionais e internacionais, para que haja um conhecimento


sobre as condições ambientais de outras regiões;

§ Que os educandos participem dos processos de construção de conhecimento e tenham a


oportunidade de tomar decisões e de se responsabilizar pelas conseqüências;

§ Procura dos sintomas e das causas dos problemas ambientais;

§ Reconhecer a complexidade dos problemas e desenvolver um senso crítico para a sua


resolução;

§ Divulgar e receber conhecimentos sobre o ambiente e suas relações.

Os princípios da Conferência de Tbilisi têm influenciado a realização de diversas discussões a


respeito do rumo da educação ambiental, questionando a capacidade da educação formal em
formar pessoas capazes de enfrentar os problemas sócio-ambientais vivenciados pelas
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populações. Fica nítida a necessidade de uma mudança no processo educacional que incentive
uma abordagem qualitativa das situações e uma maior participação das pessoas na busca de uma
melhor qualidade de vida para a sociedade.

1.3 A prática e a teoria na Educação Ambiental


A educação, em grande parte, toma um rumo que aumenta a distância entre educandos e
educadores, entre teoria e prática, entre realidade e matérias curriculares, entre vontade e
obrigação, entre racionalidade e subjetividade.

“Há inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre saberes separados,
fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e, por outro lado, realidades ou
problemas cada vez mais polidisciplinares, multidimensionais, transnacionais, globais,
planetários”. (MORIN, 2004, p.13).

Esse caminhar baseado na fragmentação e compartimentação dos saberes e na quase


impossibilidade de mudanças, tornou-se algo comum na Educação Formal.

FREIRE (1996) afirma:

“A ideologia fatalista, imobilizante, que anima o discurso neoliberal anda solta no mundo.
Com ares de pós-modernidade, insiste em convencer-nos de que nada podemos contra
a realidade social que, de histórica e cultural, passa a ser ou a virar quase natural” (p.19)

A Educação Ambiental, portanto, vem da necessidade de promover à população um maior


entendimento sobre as relações entre ser humano e ambiente, e numa visão mais abrangente,
das relações entre os próprios seres humanos. Necessidade clara frente à crise sócio-ambiental
presente. Desta forma, a EA configura-se em uma visão que busca através da reflexão e ação
crítica uma melhor qualidade de vida às populações.

Por meio da revisão da práxis proposta pela Educação Ambiental ocorre um re-posicionar-se
sobre questões e pontos de vista construídos histórica e culturalmente há séculos, porém na
emergência da problemática sócio-ambiental, percebe-se a ocorrência de um distanciamento
entre teoria e prática nos projetos de EA, quando não há uma reflexão aprofundada dos seus
princípios.

A grande dificuldade, portanto, é a construção de uma nova práxis exatamente a partir de


conceitos, metodologias e práticas que se está querendo questionar e, eventualmente,
desconstruir. Desta forma, o desafio posto é desenvolver uma práxis que se caracterize pelos
conceitos da Educação Ambiental, e que possibilite a visualização de novos desafios, no sentido
de um processo de aprendizagem que inclua as relações entre as diversas disciplinas e esferas
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de conhecimento, entre os participantes do processo e esse conhecimento, e entre os próprios
participantes.

A construção da relação dialógica e complexa, ao ser vivenciada na prática, traz


questionamentos sobre a relação entre a teoria do campo de Educação Ambiental, que está em
constante construção, e a aplicação desta teoria pela prática.

Estes questionamentos, como o aprofundamento de conceitos relacionados à Educação


Ambiental, bem como sobre a relação entre teoria e prática no Ensino Formal, fomentaram a
formulação de perguntas chave, como: (a) de que forma ocorre a relação entre teoria e prática nos
projetos de Educação Ambiental; e (b) como e quando os conceitos de Educação Ambiental
aparecem.

2. Avaliação de projetos de Educação Ambiental na Educação Formal

A presente pesquisa propôs analisar qualitativamente a relação entre teoria e prática em projetos
de Educação Ambiental, na procura por se estabelecer o grau e a forma de relação existente entre
estes dois campos.

Em um primeiro momento, buscou-se um aprofundamento dos princípios e conceitos da Educação


Ambiental para uma compreensão dos mesmos, para assim analisar a forma como os mesmos
aparecem nas práticas em educação formal. A busca por realizar uma análise qualitativa sobre o
desenvolvimento dos projetos de Educação Ambiental, promoveu o encontro do que seria a
essência de cada conceito utilizado, sem que as análises se tornassem excludentes a ponto de
questionar se as práticas constituíam-se ou não uma forma de Educação Ambiental.

A estruturação da análise baseou-se na adoção de seis conceitos relacionados à Educação


Ambiental, são eles: autonomia, complexidade, representação social, interdisciplinaridade, diálogo
e criticidade. Com base nestes conceitos, foram estabelecidos parâmetros que possibilitaram
identificar as diferentes maneiras que cada conceito era teorizado e vivenciado nos distintos
projetos analisados.

O aprofundamento sobre os princípios da Educação Ambiental e o estabelecimento dos


parâmetros mostram que, por ser uma prática educativa relacional, complexa e dialógica, os
temas aqui discutidos e desenvolvidos muitas vezes se tocam e interagem entre si, e desta forma
apresentam também que a divisão dos saberes além de ser imprópria é irreal.
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3. Conceitos de Educação Ambiental e os parâmetros

A busca por parâmetros que, de forma qualitativa, expressam as relações entre a teoria dos
conceitos presentes na Educação Ambiental e as práticas relacionadas às atividades de
Educação Ambiental, proporcionou a escolha de parâmetros relacionados aos contextos práticos
em que os conceitos são vistos e que se contrapõem aos conceitos estabelecidos pelas bases
positivistas.

3.1. Complexidade - Abrangência das inter-relações


Os sistemas nos quais nos encontramos (social, ambiental, cultural etc.) são sistemas complexos
por apresentarem infinitas interações e por serem sistemas interligados e interdependentes,
formando um tecido conjunto, no qual um elemento exerce influência sobre vários outros
elementos e contextos e assim por diante, de forma que o todo influi nas partes e as partes
influem no todo (PASCAL apud MORIN, 2004). Porém, o paradigma mecanicista, ao separar o
todo em partes quase que desconexas acabou por desconhecer essa complexidade “natural”. O
mundo, decomposto pela ciência clássica em unidades menores dotadas de existência
“independente” excluiu as características, relações e inter-relações de seus componentes
formativos, impossibilitando uma visão intrínseca da rede sistêmica (BRANDÃO, 2003).

O nosso sistema de ensino ao invés de procurar corrigir essas visões, acaba por repetir e a
obedecer a elas, de modo que “nos ensinam a isolar objetos (de seu meio ambiente), a separar as
disciplinas (em vez de reconhecer suas correlações), a dissociar os problemas, em vez de reunir e
integrar” (MORIN, 2004).

Diante desses fatos, a Educação Ambiental, por possuir “uma natureza interdisciplinar,
polifacetada e holística”, se mostra apta para resgatar essa complexidade, relacionando dessa
forma aspectos sociais, ambientais, culturais, políticos e econômicos. A EA procura reintegrar os
saberes e desenvolver a aptidão para contextualizar os mesmos, de maneira a “produzir um
pensamento no sentido em que situa todo acontecimento, informação e conhecimento em relação
de inseparabilidade com seu ambiente” (MORIN, 2004).

A análise da abrangência das inter-relações pode auxiliar a qualificação do projeto e das


atividades desenvolvidas quanto à sua complexidade.

3.2. Autonomia - Modo de construção do conhecimento


O conceito de autonomia é baseado na liberdade, que necessita ser assumida pelo sentido de
limite, pois quanto mais “criticamente a liberdade assuma o limite necessário, tanto mais
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autoridade tem ela, eticamente falando, para continuar lutando em seu nome” (FREIRE, 1996). A
liberdade supõe a capacidade cerebral ou intelectual de fazer escolhas e a possibilidade de operar
essas escolhas. A autonomia então, se funda na responsabilidade que é assumida.

Portanto, a autonomia se constrói na experiência das tomadas de decisões, e por isso tem de
estar “centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em
experiências respeitosas da liberdade” (FREIRE, 1996).

MORIN (2003) afirma que não existe autonomia em absoluto, mas sim em termos relacionais e
relativos, pois autonomia que não é relacional se transforma em domínio de um sobre outro, ou
sobre outros. Desta forma, a autonomia é baseada em relações.

O educando necessita exercitar a sua liberdade para assumir a responsabilidade de suas ações.
“É imprescindível, portanto, que a escola instigue constantemente a curiosidade do educando em
vez de ”amaciá-la” ou “domesticá-la”. É preciso que o educando vá assumindo o papel de sujeito
da produção de sua inteligência do mundo e não apenas o de recebedor da que lhe seja
transferida pelo professor” (FREIRE, 1996).

Nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se formando em reais sujeitos da


construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do
processo. Assim, a autonomia pode ser qualificada pelo modo de construção do conhecimento, se
o educador estimula essa autonomia e se os educandos desenvolvem isso.

3.3. Representação social - Respeito e utilização das representações


As representações sociais são reconhecidas por meio das percepções, dos conceitos e das visões
que as pessoas possuem sobre determinado assunto. “Não é possível respeitar os educandos [...]
se não se reconhece a importância dos “conhecimentos de experiência feitos” com que chegam à
escola” (FREIRE, 1996).

A necessidade em conhecer as representações sociais se deve ao fato de a Educação Ambiental


ser dialógica e procurar, por meio de suas práticas, a construção conjunta de conhecimentos, de
modo que as pessoas e suas representações sobre algum assunto têm de emergir e ser
trabalhadas conjuntamente. Essa visão é calcada na não supremacia de apenas um ponto de
vista, o que leva à ilusão e à perda da diversidade de idéias sobre um assunto.

A análise do respeito às diferentes representações sociais possibilita verificar se o processo de


Educação Ambiental é condizente com a realidade subjetiva e objetiva das pessoas envolvidas no
processo.
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3.4. Interdisciplinaridade - Grau de relação entre os conceitos disciplinares
A fragmentação da produção do conhecimento levou à fragmentação do ensino deste, tendo como
conseqüência as disciplinas. Porém, a percepção da complexidade das relações levou a uma
busca das relações entre os conceitos e as disciplinas.

Pode-se estabelecer algumas relações, normalmente dispostas de acordo com o grau de relação
entre as disciplinas (SANTOMÉ, 1998), como:

• disciplinaridade - não existem relações entre os conhecimentos. Estes são


compartimentados e “ensinados” por professores especialistas. Muitas vezes os
conhecimentos dispostos desta maneira não trazem relações com o contexto e o cotidiano
dos alunos e professores.

• multidisciplinaridade - simples justaposição de disciplinas, na qual não há uma real


interação entre os conhecimentos. Os pontos comuns entre as disciplinas são relacionados
aos alunos, porém não há uma transformação de métodos ou estabelecimento de reais
interações entre as disciplinas.

• transversalidade - comumente utilizando como método os temas transversais. Sendo estes


temas generalistas, como saúde e meio ambiente, que são abordados pelas disciplinas,
sem uma interação entre os conhecimentos destes e dos professores das diversas
disciplinas.

• interdisciplinaridade - neste grau de relação, as disciplinas interagem e se transformam


devido a esta interação entre conhecimentos e profissionais envolvidos. No ensino formal
pode-se citar como exemplo, a construção do conhecimento partindo da resolução de um
problema, onde cada disciplina e/ou cada professor contribui através do conhecimento da
sua especialidade.

• transdisciplinaridade - o mais elevado grau de interação entre o conhecimento. Neste as


divisões em disciplinas são superadas, e o conhecimento é construindo-se partindo do
saber e não das várias áreas do saber.

Na Educação Ambiental utiliza-se a interdisciplinaridade como princípio norteador, devido a


complexidade e dificuldade na implantação de um grau maior de interação entre as áreas do
conhecimento.
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3.5. Diálogo - Formas de interação entre os participantes
O diálogo, como instrumento da educação, media a busca do conhecimento, fazendo com que os
participantes deste se dispam dos seus preconceitos, reflitam sobre o assunto dialogado,
respeitem a participação do outro e revejam os seus conceitos.

No diálogo, a palavra conduz ao conhecimento do outro e do mundo, mediando a transformação


das realidades, através da interação entre os seus participantes.

Na educação formal, o diálogo é utilizado quando esta é uma educação dialógica,


problematizadora e investigativa, tendo como conseqüência a conscientização dos indivíduos.
Desta forma, se contrapõe a uma prática autoritária, na qual a interação ocorre entre dominador e
dominados, entre o detentor do conhecimento e aquele que não possui nenhum conhecimento,
onde conhecimento é sinônimo de poder.

3.6. Criticidade - Forma de interpretação do conhecimento


A criticidade, advinda da teoria crítica, se contrapõe ao pensamento tecnicista e mecanicista do
conhecimento. Propondo um permanente questionamento às “ideologias, dogmatismos,
totalitarismos, instrumentalismos, irracionalismos, manipulações e alienações planificadas”
(TESSER, 2001, p.86) busca a construção de uma sociedade mais participativa, discursiva e
democrática.

A educação crítica media uma construção social e a contextualização do conhecimento,


analisando-o e integrando o sujeito ao contexto, para que este possa ser mediador de mudanças.
Uma prática de Educação Ambiental que considera estes princípios, permite uma leitura do
mundo mais complexa e sistêmica, levando à uma reflexão sobre as teorias e ações impostas por
um sistema social centrado no individualismo e na economia. E uma educação deve passar por
estes pressupostos para formar cidadãos críticos e transformadores de uma realidade ambiental

4. Análise dos projetos de Educação Ambiental

A pesquisa analisou projetos de Educação Ambiental realizados por Organizações Não-


Governamentais e atividades de um projeto de Iniciação Científica. A análise dos projetos ocorreu
por meio das propostas e relatórios de desenvolvimento destes, nos quais foram apresentados os
relatos dos educadores sobre o processo de cada projeto e os resultados obtidos.

O estudo de cada parâmetro nos projetos desenvolvidos procurou identificar os contextos práticos
em que os conceitos foram abordados nos projetos.
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A análise foi dividida em duas etapas. A primeira consistiu na análise de cada projeto
individualmente, no qual relacionou-se a prática relatada com o parâmetro estabelecido, enquanto
na segunda etapa foram estabelecidas as relações entre prática e parâmetros, partindo dos
resultados encontrados em cada projeto e verificando como os parâmetros apareceram de modo
geral. As respostas encontradas foram compiladas para uma visão geral das formas em que os
parâmetros estavam presentes. Posteriormente, as mesmas foram sistematizadas para que
fossem estabelecidas as formas como os princípios estavam explicitados nos projetos.

A metodologia utilizada na avaliação dos projetos de Educação Ambiental propôs uma análise que
identificou a abrangência dos conceitos utilizados nos projetos, bem como a relação entre a teoria
e prática adotada. Esta análise qualitativa dos projetos de Educação Ambiental trouxe uma
aproximação da relação entre a teoria dos conceitos e a prática.

4.1. Os Projetos de Educação Ambiental


Foram analisados ao todo 3 projetos de Educação Ambiental, dois de uma ONG’s e um projeto de
Iniciação Científica. O projeto da ONG realiza atividades com professores(as) para que estes(as)
“insiram” a Educação Ambiental nas escolas. Esta capacitação tem como fundamento uma
educação global, uma aprendizagem sistêmica e a valorização da cultura local. Nos cursos
oferecidos são apresentados o histórico do movimento ambientalista, as quatro dimensões que
devem ser trabalhadas: temporal, espacial, temática e humana, entre outros, tendo como
resultado um projeto de Educação Ambiental.

O projeto de Iniciação Científica foi realizado em uma escola do município de Campinas, e


promoveu uma série de atividades com alunos da quarta série do Ensino Fundamental. A escolha
do projeto se deu pelo fato deste possuir um estudo teórico anterior a execução do mesmo e por
ser um projeto de Educação Formal.

A análise de cada projeto ocorreu pela interpretação dos relatórios das atividades e das vivências
desenvolvidas relatadas pelos professores e pela estudante.

5. Resultados e Discussão

A análise dos projetos e atividades em questão foi realizada de forma a observar qualitativamente,
por meio dos relatos, os caminhos trilhados pelas professoras(es), que de acordo com suas
práticas demonstraram a abrangência dos conceitos de Educação Ambiental desenvolvidos.
Procurou-se compreender como esses conceitos são vivenciados na prática, tentando não
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estabelecer somente relações quantitativas classificatórias. O estudo dos conceitos realizado
inicialmente, foi utilizado para a identificação dos parâmetros e análise dos projetos.

Existem “lacunas” nas relações entre teoria e prática na Educação Ambiental e entre prática e o
relato das atividades desenvolvidas, o que dificultou uma compreensão real da abrangência em
que são encontrados os conceitos. Outro ponto a ser considerado é a limitação do relato trazer
somente atividades pontuais.

5.1. Modo de construção do conhecimento


Partindo dos modos observados durante a análise, estabeleceu-se duas formas de construção do
conhecimento que explicitam como a autonomia ocorre em uma atividade de Educação Ambiental.

A primeira maneira ocorre através do diálogo, no qual há a formulação de perguntas pelos


educandos que buscam as respostas. O estímulo ocorre quando estes se deparam com
observações de temas ou problemas significativos para eles.

A segunda ocorre quando através de uma explicação ou direcionamento/pergunta do


coordenador(a) da atividade, o estudante busca encontrar as respostas. Esta busca pode ocorrer
de duas maneiras de acordo com o posicionamento daquele que promove o estímulo: (1) tem-se o
professor como delimitador, ele é o fim da busca e o detentor do conhecimento; (2) o professor
aparece como mediador e estimulador dos educandos a buscarem outras fontes de
conhecimento, alcançando outros pontos de vista além do seu.

5.2. Abrangência das inter-relações


Por serem atividades de pequena duração e/ou separadas do currículo escolar, há uma
dificuldade em conseguir aprofundar as relações identificadas.

A abrangência das inter-relações está ligada à compreensão da complexidade destas. Quando as


relações estão vinculadas às conexões imediatas, que se situam próximas à ação analisada, as
relações identificadas e construídas acabam por não relacionar os diferentes aspectos envolvidos,
como o social, ambiental, político, cultural e econômico, a não ser os de causa e efeito. Isto exclui
uma maior conexão entre os elementos que se situam fora do contexto analisado.

Desta forma, a abrangência da busca pelas relações entre os elementos deve sair do círculo que
se insere, rompendo com uma análise simplista.

5.3. Respeito às representações sociais


As representações sociais ocorreram em dois momentos: em um primeiro momento foram
levantados os conhecimentos sobre o que o aluno sabe e o que é significativo para ele. Em um
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segundo momento, para a construção do conhecimento, ou as representações foram utilizadas
como ponto de partida ou o assunto foi direcionado sem considerá-las. A identificação das
representações e a utilização destas no processo de conhecimento demonstrou um respeito à
diversidade existente.

Uma das características da Educação Ambiental é realizar transformações sobre as


representações sociais dos atores envolvidos no processo. No entanto, nos projetos analisados,
não foi possível identificar se estas ocorreram, por não haver relatos de avaliações posteriores às
atividades.

5.4. Grau de relação entre os conceitos disciplinares


A busca por uma relação entre os conceitos disciplinares acaba por promover diferentes formas
de estabelecimentos destas relações. Essa busca é conseqüência de uma procura pelo real
significado da educação, uma ligação aos valores humanos e não aos valores das disciplinas, pois
na educação tradicional muitas vezes se estuda o conteúdo por ele mesmo, com final em si.

5.5. Forma de interação entre os participantes


O diálogo nos projetos analisados não é explicitado de forma que se conheça os dois pontos
importantes na relação entre os participantes: (1) como se dá a interação entre as perguntas e as
respostas e (2) como surgem as perguntas.

O primeiro ponto está relacionado com a abertura à reflexão sobre as perguntas que o professor
faz aos alunos, e as perguntas que estes formulam; e sobre as respostas que o professor dá e as
respostas que ele espera dos alunos. O segundo ponto está relacionado ao modo como o
professor estimula e promove a abertura para a formação destas perguntas.

A interação entre os participantes ocorre nesta relação entre perguntas e respostas e deste modo,
distingue-se dois modos de interação, que dependem de onde partem as perguntas, se do
professor ou do estudante, e como estas são formuladas, se são direcionadas ou reflexivas.

5.6. Como se dá a interpretação do conhecimento


A criticidade está ligada a uma análise reflexiva sobre todos os aspectos ligados à construção do
conhecimento. Para que aconteça uma interpretação do conhecimento e não somente uma
reprodução de informação é necessário que haja essa criticidade. Na busca por respostas às
perguntas formuladas estas devem construir um conhecimento que está ligado a algo
interiorizado, que se faz significativo. Porém, se nesta procura houver somente uma reprodução
de informação não há apreensão do conhecimento.
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A construção das perguntas e das respostas observadas nos relatos foi realizada a partir de
reflexões sobre determinada pergunta/questionamento, ou por meio de uma busca simplista sobre
observações que caracterizaram uma curiosidade ingênua.

As observações que passaram de uma curiosidade ingênua para uma curiosidade crítica,
ocorreram quando houve uma busca de confirmação das hipóteses por meio da prática, pois a
teoria se confirma através desta.

6. Conclusão

O estudo de alguns conceitos presentes na Educação Ambiental permitiu um aprofundamento


destes, o que proporcionou realizar análises mais abrangentes sobre os projetos desenvolvidos.
Desta forma, foi possível a utilização de métodos qualitativos, no qual se buscou a essência de
cada conceito, não se detendo em uma análise superficial e classificatória.

Na busca por se entender os parâmetros, estabeleceu-se uma relação maior que os próprios
conceitos, o que acabou por construir uma relação dependente entre os parâmetros, resultando
num pensar sobre como a educação se dá.

A relação estabelecida entre prática e teoria nos projetos analisados apresentou uma classificação
das formas de Educação Ambiental desenvolvidas em cada projeto/atividade, como também uma
análise da proximidade ou distanciamento sobre o que foi inicialmente proposto nos projetos e do
que foi efetivamente desenvolvido. A metodologia utilizada na avaliação também identificou a
abrangência com que os conceitos são desenvolvidos nos projetos.

Desta forma, a análise realizada contribui na construção e desenvolvimento de projetos que


tenham uma abordagem mais abrangente e profunda de princípios como: complexidade,
interdisciplinaridade, cooperação, processo contínuo e permanente, participação, valorização das
experiências pessoais, construção do conhecimento, práxis – teoria e prática, empoderamento,
autonomia, identidade, pertencimento, diversidade e diálogo, princípios presentes em diversos
documentos sobre os quais se constroem uma Educação Ambiental crítica.

6. Bibliografia

ANDRADE, A. L. C. de.; LOUREIRO, C. F. B. Monitoramento e avaliação de projetos de Educação


Ambiental: uma contribuição para o desenvolvimento de estratégias. In: SANTOS, J. E. dos e
SATO, M. A contribuição da Educação Ambiental à Esperança de Pandora. São Carlos: RiMa,
2001.
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BRANDÃO, C. M. M. Arte – Educação Ambiental: na busca de uma cidadania ecológica. [on-
line]. Arte e meio ambiente - Educação Ambiental em Ação, 2003. Disponível em:
<http://www.revistaea.arvore.com.br> Acesso em: 12 nov. 2005.

BRASIL. Ministério da Educação. Inep apresenta relatório sobre práticas de educação


ambiental. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/. Acesso em: 23 nov.2005.

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 8 ed. São Paulo: Gaia, 2003.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29 ed. São


Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura)

GRÜN, M. Ética e educação ambiental: A conexão necessária. Campinas: Papirus, 1996.

GUIMARÃES, M. Educação Ambiental. 2 ed. Duque de Caxias: UNIGRANRIO Editora, 2003.

MORIN, E. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 9 ed. Rio de
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MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 8 ed. São Paulo: Cortez;
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REIGOTA, M. Meio ambiente e representações sociais. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2002.
(Questões da nossa época, v. 41)

SANTOMÉ, J. T. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Trad. Cláudia


Schilling. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul Ltda., 1998.

TESSER, G. J. Ética e educação: uma reflexão filosófica a partir da teoria crítica de Jürgen
Habermas. 2001. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade
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