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O inventário dos bens acautelados pelo Condephaat ligados aos domínios da paisagem
e do patrimônio natural revela que o uso do tombamento para preservar tipologias de bens
como serras, morros, maciços e demais elementos geológicos pouco considerados no cenário
da preservação do patrimônio cultural foi uma prática recorrente do órgão paulista
considerando os 37 bens dessa natureza tombados entre 1970 e 2005 (CRISPIM, 2014:52)
(SCIFONI, 2008:113).
A expressão “áreas naturais” foi o principal termo utilizado por técnicos e conselheiros
da instituição nos processos de tombamento analisados pela pesquisa. Essa característica foi
fundamental para a compreensão da construção do olhar do Condephaat para o mundo
paulista daquele período tendo em vista que para muito além de uma suposta beleza ou
monumentalidade, a paisagem foi lida enquanto patrimônio ambiental paulista, desdobrando o
valor cultural para os domínios da geografa e da ecologia política num movimento talvez
inédito entre as instituições de preservação do patrimônio cultural brasileiras.
Licenciado em História pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) – Campos Assis (2010). Mestre em
História pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) - Campus Guarulhos (2014). Aluno especial do
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP) e historiógrafo
no Arquivo Público do Estado de São Paulo.
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Ver CRISPIM 2014. A dissertação de mestrado foi orientada pelo Pro Dr. Odair da Cruz Paiva no Programa de
Pós Graduação em História da UNIFESP com o financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoas
em Nível Superior (CAPES).
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Em viés semelhante Anne Cauquelin (2007) faz um balanço das formas pelas quais a
paisagem tornou-se uma categoria de pensamento no ocidente problematizando a formação de
representações e atitudes cognitivas em relação às concepções paisagísticas:
(...) de um lado, restituir a paisagem como única forma de torna-la visível (logo de
transforma-la por intermédio do trabalho paisagístico) de outro lado desdobra-la em direção
ao principio inalterável da natureza, apagando então a ideia de sua possível construção.
Confusão bem marcada no fluxo de noções de “sítio”, de “meio-ambiente”, de
“ordenamento” ou de “integração”. Pois os mesmos que querem salvaguardar a natureza da
paisagem como dado primitivo se dedicam também a proteger os “sítios” depositários de uma
certa memória, histórica e cultural. Ora o “sítio”, o que permanece ali”, designa tanto o
monumento (esse arco, essa cidade antiga, esse vestígio) quanto a forma geológica singular
que intervém num meio natural.(CAUQUELIN, 2007:40)
No século XVI no se conhecia a paisagem no sentido moderno, mas o país, algo equivalente ao
que é para nós hoje o território e para os franceses o environnement, lugar ou espaço
considerado do ponto de vista de suas características físicas, à luz de suas formas de
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É importante ponderar que a Lista do Patrimônio Mundial foi criada poucos meses depois do Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) na Declaração de Estocombo da ONU ocorrida em julho de
1972. Do mesmo modo a criação da categoria Paisagem Cultural em 1992 é contemporânea a Conferência das
Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92. Não existem estudos que possam informar
sobre possíveis aproximações e influências entre as duas esferas internacionais de preservação.
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Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a
tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e
proteger pela feição notável com que tenham sido dota dos pela Natureza ou agenciados pela
indústria humana. (RIBEIRO, 2007:72)
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Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) até 1937; Departamento do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (DPHAN) em 1946; IPHAN em 1970; Secretaria do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (SPHAN) em 1979 quando dividiu atribuições com a Fundação Nacional Pró Memória
(FNpM); Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural (IBPC) em 1990 e finalmente Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) a partir de 1994,
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Na inexistência de uma política cultural que pudesse inseri-lo num ideário de ações
mais amplo, a instituição do patrimônio paulista operou entre a tradição e a modernidade
tendo tombado em seus primeiros anos remanescentes da memória das antigas oligarquias do
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Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo; Serviço de Museus Históricos, Instituto dos Arquitetos do Brasil;
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional; Instituto de Pré-História e Departamento de História
ambos da Universidade de São Paulo; Cúria Metropolitana de São Paulo; Instituto Histórico e Geográfico de São
Paulo e seu congênere de Guarujá-Bertioga. (Rodrigues, 2000)
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autoria de Aziz Ab’ Saber foi oferecido ao Conselho para a proposição de um inventário das
áreas naturais ameaçadas do estado:
Para além da Serra do Mar a proposta de Ab’ Saber consistia no mapeamento das
reservais naturais paulistas a partir de três níveis de prioridade: as consideradas “áreas críticas
e ecologicamente estratégicas”, as “áreas de exceção” e em terceiro plano as “paisagens de
substituição” que considerava próprias para o aproveitamento turístico.
Mar, a Serra do Japi, o Maciço da Juréia, a Serra da Cantareira ou mesmo a Serra de Atibaia e
Itapetininga todas tombadas pelo Condephaat entre 1979 e 1985. A expressividade desses
dessas ações se dá pela proteção de valores ambientais ligados a agenda das políticas de meio
ambiente por meio do tombamento, figura jurídica de reconhecimento dos valores culturais.
(CRISPIM, 2014).
Nos anos de 1980 a preservação de paisagens ganhou folego entre os técnicos do
Condephaat com a criação da Equipe de Áreas Naturais como núcleo de trabalhos do Serviço
Técnico de Conservação e Restauro (STCR), grupo que congregou profissionais de diversas
áreas entre geógrafos, biólogos e engenheiros agrônomos - principal indício de um acúmulo
de experiência com relação às áreas naturais. Nesse sentido o documento “Subsídios para um
plano sistematizador das paisagens naturais do estado de São Paulo” conhecido como Ordem
de Serviço n.1/82 correspondeu ao principal meio de atuação da equipe técnica em processos
de tombamento de áreas naturais partindo de uma conceituação própria de paisagem para na
operacionalização dos trabalhos:
Referências Bibliográficas:
AB’ SABER. Diretrizes para uma política de preservação das Reservas Naturais do Estado de
São Paulo. São Paulo. In: Instituto de Geografia/USP. Geografia e Planejamento n.30: 1977
BESSE, Jean Marc. Ver a Terra, seis ensaios sobre a paisagem e a geografia. São Paulo:
Perspectiva, 2006.
BEM, Sueli Ferreira de. Conversas de Patrimônio em Jundiaí., São Paulo: Edusp ,2014
CRISPIM, Felipe B. Entre a Geografia e o Patrimônio, estudo das ações de preservação das
paisagens paulistas pelo Condephaat (1969-1989).Dissertação de Mestrado. Pós Graduação
em História, Universidade Federal de São Paulo, 2014
MENESES, Ulpiano T.B. A paisagem como fato cultural. In: Yázigi, Eduardo (Org.) Turismo
e Paisagem. Campinas: Contexto, 2002.
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HOBSBAWM, Eric. Nações e Nacionalismos desde 1780. São Paulo: Paz e Terra, 2011.