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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Número do 1.0429.15.001583-3/001 Númeração 0015833-


Relator: Des.(a) Wilson Benevides
Relator do Acordão: Des.(a) Wilson Benevides
Data do Julgamento: 03/07/2018
Data da Publicação: 09/07/2018

REMESSA NECESSÁRIA - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE


FAZER - LOTEAMENTO IRREGULAR - INÉRCIA DO LOTEADOR - DEVER
DE REGULARIZAÇÃO PELO MUNICÍPIO - ART. 40, LEI 6.766/1979 -
DECLARAÇÃO DA ÁREA COMO ZONA HABITACIONAL DE INTERESSE
SOCIAL - IMPLANTAÇÃO DE INFRAESTRUTURA BÁSICA - ÔNUS DO
ENTE MUNICIPAL - CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA.

- Conquanto a Lei nº 6.766/1979 estabeleça ser do loteador a


responsabilidade pela elaboração do projeto de loteamento, bem como pelo
seu registro, após devidamente aprovado pelo ente municipal, assenta o
artigo 40, caput, da citada legislação, competir ao Município proceder à
regularização do loteamento não autorizado quando tal providência não for
atendida pelo loteador, depois de devidamente notificado.

- Segundo entendimento consolidado pela jurisprudência pátria, a


regularização do loteamento pelo ente municipal constitui poder-dever,
mormente porque, nos termos do artigo 30, VIII, da Constituição Federal de
1988, é de competência dos Municípios promover, no que couber, adequado
ordenamento territorial, mediante planejamento e controle de uso, do
parcelamento e da ocupação do solo urbano.

- Declarada a área como Zona Habitacional de Interesse Social, por meio da


Lei Municipal nº 790/2014, exsurge o dever do Município de garantir, ao
menos, a infraestrutura básica prevista no artigo 2º, §6º, da Lei nº 6.766/79.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0429.15.001583-3/001 - COMARCA DE

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MONTE AZUL - APELANTE(S): MUNICÍPIO DE MONTE AZUL -


APELADO(A)(S): MARIA ELVIRA CARDOSO DE OLIVEIRA AUGUSTO -
LITISCONSORTE: CEMIG DISTRIBUIÇÃO S/A

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de


Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em REMESSA NECESSÁRIA, CONFIRMAR A SENTENÇA, PREJUDICADO
O RECURSO VOLUNTÁRIO.

DES. WILSON BENEVIDES

RELATOR.

DES. WILSON BENEVIDES (RELATOR)

VOTO

Trata-se de Apelação interposta contra a sentença de f. 131/134,


integrada pela decisão de f. 141, proferida pelo MM. Juiz de Direito da
Comarca de Monte Azul, que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c
Indenização por Danos Materiais e Morais proposta por MARIA ELVIRA
CARDOSO DE OLIVEIRA AUGUSTO em face do MUNICÍPIO DE MONTE
AZUL e da CEMIG DISTRIBUIÇÃO S.A, julgou parcialmente procedente o
pedido inicial.

O Magistrado condenou o ente municipal a construir no loteamento


Cidade Nova, no prazo de 01 ano, vias de circulação; escoamento de águas
pluviais; rede para abastecimento de água potável e soluções para o
esgotamento sanitário e para a energia

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elétrica domiciliar, sob pena de multa diária de R$500,00, limitada a


R$20.000,00. A CEMIG, por sua vez, foi condenada ao fornecimento de
energia elétrica no loteamento Cidade Nova, no prazo de 01 ano, sob pena
de multa diária de R$500,00, limitada a R$20.000,00.

As custas e honorários foram rateadas entre as partes, na proporção de


70% para o autor e 30% para os réus, observada a suspensão de
exigibilidade do primeiro em razão da gratuidade judiciária que lhe foi
deferida. A verba honorária foi arbitrada em R$200,00 em favor do patrono
do demandante.

Inconformado, o ente municipal argui, nas razões recursais de f. 144/149,


a inépcia da inicial, eis que não foram apontadas as supostas irregularidades
de cada requerida e tampouco existe pedido de condenação subsidiária ou
solidária, o que dificulta o direito de defesa. Argumenta ser parte ilegítima
para figurar no polo passivo da demanda. Pontua que a autora não informou
na inicial quem é o proprietário do loteamento, o qual é responsável pela sua
infraestrutura.

No mérito, afirma que não existe na municipalidade qualquer aprovação


de loteamento no Bairro Cidade Nova, de modo que não pode ser compelido
a oferecer toda infraestrutura em loteamento que não lhe pertence. Assevera
que o Município não pode ser responsável pela infraestrutura em loteamento
irregular e pertencente a terceiros, sendo tal obrigação do proprietário da
área.

Ressalta que até o momento não foi apresentado projeto de loteamento,


planta baixa, croqui ou mesmo relatório fotográfico do local. Destaca que a
autora adquiriu propriedade não regularizada, tentando transferir a
responsabilidade pela sua estrutura para o Município.

Aponta ser dever do loteador a execução das obras de infraestrutura


previstas no artigo 18, V, da Lei dos Loteamentos. Acrescenta que a
segurança pública cabe ao Estado, não tendo como disponibilizar segurança
pública em local específico.

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Alega que a autora não é legítima proprietária da área em questão, sendo


tão somente possuidora, não podendo pleitear em juízo eventual direito
alheio.

Assim, requer o provimento do recurso, para reformar a sentença.

Devidamente intimado, o apelado apresentou contrarrazões às f.


151/155.

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça à f. 161, denegando a


intervenção do Parquet.

É, em síntese, o relatório.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e o


recebo em seus regulares efeitos.

Observa-se que o Magistrado a quo não determinou a remessa dos autos


para que se proceda ao reexame da sentença, embora o ente municipal
tenha sido condenado à obrigação de fazer.

Nesse espeque, com fulcro no artigo 496, I, do NCPC, conheço de ofício


da Remessa Necessária.

I - PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL

O Município de Monte Azul arguiu, tanto em contestação como no apelo,


preliminar de inépcia da inicial, ao argumento de que não foram apontadas
as irregularidades cometidas por cada uma das rés, apresentando-se
genérica.

Nos termos do art. 330, parágrafo primeiro, da novel legislação

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processual civil, considera-se inepta a petição inicial quando lhe faltar pedido
ou causa de pedir (inc. I); o pedido for indeterminado (inc. II); da narração
dos fatos não decorrer logicamente a conclusão (inc. III); ou contiver pedidos
incompatíveis entre si (inc. IV).

Notadamente quanto à formulação do pedido, convém destacar que o


artigo 322, §2º, do NCPC, assenta que a sua interpretação "considerará o
conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé.".

Desse modo, embora o pedido formulado pela autora seja confuso, haja
vista inexistir requerimento expresso de condenação dos réus a específica
obrigação de fazer, é possível extrair das razões as citadas irregularidades
as quais o apelante faz menção.

Nota-se que a requerente discorre sobre a ausência de segurança no


loteamento Cidade Nova, bem como da prestação de serviços básicos à
habitação urbana pelo ente municipal.

Logo, não se pode falar que inexiste pedido ou que ele é indeterminado,
bem como em ausência de causa de pedir. Da narração dos fatos é possível
chegar à conclusão e os pedidos são plenamente compatíveis entre si.

Com isso, rejeito a preliminar.

II - ILEGITIMIDADE PASSIVA

O Município réu aduz não deter legitimidade para figurar no polo passivo
desta demanda ao fundamento de que o responsável pela infraestrutura do
loteamento é do seu proprietário.

Ocorre que aludida tese confunde-se com o próprio mérito da

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lide, motivo pelo qual será examinada em momento oportuno.

III - MÉRITO

Na exordial, narra a demandante ter adquirido um lote no Município de


Monte Azul, tendo-lhe sido assegurado pela Administração Municipal que
seria realizada a urbanização daquele loteamento. Afirma, porém, que não foi
proporcionada a infraestrutura necessária para tornar o novo bairro, Cidade
Nova, habitável.

Argumenta ser precário o patrulhamento de policiais na região e que no


local não há esgotamento sanitário, fornecimento de água por via de
encanamento, iluminação pública, acesso por vias pavimentadas, praça de
lazer, posto de saúde, escolas, creches, etc.

Conclui, pois, que compete à Municipalidade executar as obras de


infraestrutura básica do loteamento, devendo a CEMIG responder, de igual
forma, solidariamente.

Em parecer, o Ministério Público manifestou-se no sentido de que, nos


termos do artigo 40, da Lei nº 6.766/79, constitui poder-dever do Município
regularizar loteamentos considerados irregulares, se, notificados os
loteadores e responsáveis, estes deixarem de proceder com as obras e
melhoramentos indicados pelo ente público.

Defendeu, pois, que o direito à moradia digna pleiteada pelo autor é, no


mínimo, a construção dos itens previstos no artigo 2º, §6º, da Lei nº 6.766/79.

O Magistrado, acolhendo o parecer ministerial, condenou o Município a


construir no referido loteamento, no prazo de 01 ano, i) vias de circulação; ii)
escoamento de águas pluviais; iii) rede para

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abastecimento de água potável e iv) soluções para o esgotamento sanitário e


para a energia elétrica domiciliar.

Pois bem.

Extrai-se do caderno processual que a demandante adquiriu uma porção


de terra em loteamento desprovido de projeto e, por conseguinte, de
autorização do Poder Público. Está-se diante, portanto, de um loteamento
irregular.

Acerca da temática, a Lei nº 6.766/1979, que dispõe sobre o


parcelamento do solo urbano e dá outras providências, estabelece ser do
loteador a responsabilidade pela elaboração do projeto de loteamento, bem
como pelo registro, após devidamente aprovado pelo ente municipal.

Ocorre que o próprio artigo 40, caput, da citada legislação, assenta


competir ao Município proceder à regularização do loteamento não
autorizado quando tal providência não for atendida pelo loteador, depois de
devidamente notificado. Isso com vistas a evitar lesão aos seus padrões de
desenvolvimento urbano e fundado na defesa dos direitos dos adquirentes de
lotes.

Confira-se:

Art. 40. A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, se


desatendida pelo loteador a notificação, poderá regularizar loteamento ou
desmembramento não autorizado ou executado sem observância das
determinações do ato administrativo de licença, para evitar lesão aos seus
padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes
de lotes.

In casu, verifica-se que, em 24/02/2015, o Município de Monte Azul


notificou o autor, Adilson Alves Moura, para que procedesse à regularização
do loteamento de sua propriedade, situado no bairro

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Cidade Nova, "principalmente no que se refere à aprovação municipal e


regularização escriturária, eletrificação das vias urbanas, esgotamento
sanitário e tubulação de água para a COPASA, dentre outras obrigações, no
prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento da presente, sob pena de
adoção de medidas legais e administrativas cabíveis" (f. 42).

No entanto, como bem ponderou o douto Representante do Ministério


Público, nenhuma medida foi adotada até a presente data, nem mesmo
aplicada eventual penalidade administrativa de modo a compelir o loteador a
regularizar o loteamento.

Nesse espeque, o Município de Monte Azul não pode se omitir de seu


dever de proceder à regularização do loteamento, ao simples argumento de
que o proprietário do local não o fez, até porque a legislação federal é clara
quanto à sua responsabilidade na hipótese do loteador se manter inerte.

A propósito, convém destacar que apesar de se inferir de uma leitura


literal do artigo 40, da Lei nº 6.766/1979, que a regularização do loteamento
se trata de uma faculdade do Poder Público Municipal, ao utilizar o verbo
"poder", a jurisprudência pátria consolidou o entendimento de que, na
verdade, tal ato constitui um poder-dever.

Isso porque, consoante determina o artigo 30, VIII, da Constituição


Federal de 1988, é de competência dos Municípios promover, no que couber,
adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle de uso,
do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

Nessa senda, exsurge para a Municipalidade o dever de regularizar o


uso, no parcelamento e na ocupação do solo, para assegurar o respeito aos
padrões urbanísticos e o bem estar da sociedade, haja vista que a
regularização decorre do interesse público e este é indisponível.

Destarte, "se o Município omite-se no dever de controlar loteamentos e


parcelamentos de terras, o Poder Judiciário pode

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compeli-lo ao cumprimento de tal dever" (REsp 292.846/SP, Rel. Min.


Humberto Gomes de Barros, DJ 15.04.2002).

A propósito, é a jurisprudência:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO URBANÍSTICO. LOTEAMENTO


IRREGULAR. MUNICÍPIO. PODER-DEVER DE REGULARIZAÇÃO.

1. O art. 40 da lei 6.766/79 deve ser aplicado e interpretado à luz da


Constituição Federal e da Carta Estadual.

2. A Municipalidade tem o dever e não a faculdade de regularizar o uso, no


parcelamento e na ocupação do solo, para assegurar o respeito aos padrões
urbanísticos e o bem-estar da população.

3. As administrações municipais possuem mecanismos de autotutela,


podendo obstar a implantação imoderada de loteamentos clandestinos e
irregulares, sem necessitarem recorrer a ordens judiciais para coibir os
abusos decorrentes da especulação imobiliária por todo o País, encerrando
uma verdadeira contraditio in terminis a Municipalidade opor-se a regularizar
situações de fato já consolidadas. (...)

5. O Município tem o poder-dever de agir para que o loteamento urbano


irregular passe a atender o regulamento específico para a sua constituição.

6. Se ao Município é imposta, ex lege, a obrigação de fazer, procede a


pretensão deduzida na ação civil pública, cujo escopo é exatamente a
imputação do facere, às expensas do violador da norma urbanístico-
ambiental.

5. Recurso especial provido.

(REsp 448.216/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em


14/10/2003, DJ 17/11/2003, p. 204)

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PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL.


PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 211 E 7 DO STJ. LOTEAMENTO
IRREGULAR. REGULARIZAÇÃO. MUNICÍPIO. ART. 40 DA LEI N. 6.766/79.
(...) 4. O STJ, ao interpretar a regra disposta no art. 40 da Lei n. 6.766/79,
entende que o Município tem o poder-dever de agir para regularizar
loteamentos irregulares de sua propriedade, descabendo o pedido de
anulação do contrato. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa
parte, não-provido. (REsp 191507/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2005, DJ 13/06/2005 p.
219)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO


CIVIL PÚBLICA. LOTEAMENTO IRREGULAR. MUNICÍPIO. PODER-
DEVER. LEGITIMIDADE PASSIVA. ARTS. 30, VIII, DA CF, E 40 DA LEI
6.766/79. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL
PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, PROVIDO.

(...) 3. É pacífico o entendimento desta Corte Superior de que o Município


tem o poder-dever de agir para fiscalizar e regularizar loteamento irregular,
pois é o responsável pelo parcelamento, uso e ocupação do solo urbano,
atividade essa que é vinculada, e não discricionária. (...) 5. Recurso especial
parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (REsp 447433/SP, Rel.
Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
01/06/2006,DJ22/06/2006p.178)

Acrescente-se que, muito embora o ente municipal tente isentar-se da


responsabilidade quanto à existência desse loteamento irregular, de forma
contraditória, declarou a área, por meio da Lei Municipal nº 790/2014, como
Zona Habitacional de Interesse Social. Veja-se o que dispõe o artigo 1º, da
mencionada lei:

Art. 1º - Fica denominado o loteamento bairro Cidade Nova toda extensão


territorial urbana localizada a partir da Rua Dom Pedro I, próximo a sub-
estação, seguindo sentido horário até a MG-122, e por

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esta até o encontro com a estrada que vem de Cana Brava, daí seguindo até
a sub-estação da CEMIG, fechando o bairro na Rua Dom Pedro I,
novamente.

Parágrafo Primeiro: O loteamento acima transcrito, se comprova pela


denominação dos logradouros públicos, à Avenida Amália Moura; Rua João
de Oliveira Primo; Rua Maria Rodrigues de Oliveira; Rua Mário Rocha; Rua
Arlindo Gomes da Rocha; Rua Abílio de Paula Neto, e, por fim, Rua Manoel
de Elvira. Os logradouros públicos ora citados foram aprovados pela lei de nº
648/2009, pertencente ao município de Monte Azul - MG, e com a aprovação
da presente lei, fica considerada Zona Habitacional de Interesse Social.

Parágrafo Segundo: A declaração constante no caput do artigo visa


especialmente ao atendimento de famílias de baixa renda, com edificações e
construções já realizadas, e proceder à divisão de solo nesta área.

Desta feita, a omissão do Poder Público Municipal quanto ao emprego de


medidas que visassem compelir o loteador a regularizar o loteamento, aliado
ao reconhecimento do local como Zona Habitacional de Interesse Social,
atrai para si o dever de garantir, ao menos, a infraestrutura básica prevista no
artigo 2º, §6º, da Lei nº 6.766/79, a saber:

Art. 2º. O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento
ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das
legislações estaduais e municipais pertinentes. (...)

§ 6o A infra-estrutura básica dos parcelamentos situados nas zonas


habitacionais declaradas por lei como de interesse social (ZHIS) consistirá,
no mínimo, de:

I - vias de circulação;

II - escoamento das águas pluviais;

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III - rede para o abastecimento de água potável;

IV - soluções para o esgotamento sanitário e para a energia elétrica


domiciliar.

Cumpre frisar, como bem destacou o Magistrado Primevo, que nada


obsta ao primeiro requerido que busque, pela via judicial, o levantamento de
eventuais prestações depositadas pelos adquirentes dos lotes, a título de
ressarcimento das importâncias despendidas com a regularização do
loteamento, como possibilita o §1º, do artigo 40.

Ou, ainda, que recorra ao loteador para que este suporte o montante
faltante, nos termos do §2º, do citado dispositivo legal.

Assim sendo, não se revela desarrazoada a condenação imposta na


origem ao ente federado réu consistente na promoção das obras constantes
no dispositivo legal acima transcrito.

De igual forma, o prazo de um ano mostra-se razoável e proporcional.


Até porque se a área foi declarada como zona habitacional urbana de
interesse social em 2014, o ente público, desde então, deveria ter iniciado as
obras para instalação de infraestrutura básica necessária no local.

Em caso envolvendo o mesmo loteamento, já decidiu este Eg. Tribunal


de Justiça:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL


- INOCORRÊNCIA - LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO
CONFIGURADA - LOTEAMENTO IRREGULAR - OMISSÃO ESTATAL -
OBRAS DE INFRAESTRUTURA - RESPONSABILIDADE DO PODER
PÚBLICO - RECURSO DESPROVIDO

- 1. Estando presentes na peça de ingresso todos os pressupostos

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legais e as condições da ação, não pode a mesma ser considerada inepta.

2. Legitimados ao processo são os sujeitos da lide, ou seja, os titulares do


direito material em conflito, cabendo a legitimação ativa ao titular do interesse
afirmado na pretensão, e a passiva, ao titular do interesse que se opõe ou
resiste à pretensão.

3. É dever do Município fiscalizar os loteamentos, desde a aprovação até a


execução de obras, sendo que a lei de uso e ocupação do solo (Lei nº
6.766/79) estabelece a solidariedade na responsabilidade pela inexecução
das obras de infraestrutura (artigo 40), cuja atividade é vinculada, e não
discricionária. (TJMG - Apelação Cível 1.0429.15.001571-8/001, Relator(a):
Des.(a) Edilson Olímpio Fernandes , 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em
30/01/2018, publicação da súmula em 09/02/2018)

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - LOTEAMENTO E
INFRAESTRUTURA - OBSERVAÇÃO DO ART. 40 DA LEI 6.766/79 -
SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Segundo entendimento
do Superior Tribunal de Justiça, o Município tem o poder-dever de agir para
fiscalizar e regularizar loteamento irregular, pois é o responsável pelo
parcelamento, uso e ocupação do solo urbano, atividade essa que é
vinculada." (AgRg no AREsp 446.051/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 27/03/2014, DJe 22/04/2014). (TJMG -
Apelação Cível 1.0429.15.001569-2/001, Relator(a): Des.(a) Audebert
Delage , 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/02/2018, publicação da
súmula em 07/03/2018)

No que diz respeito às astreintes, extrai-se do art. 537, do Código de


Processo Civil, que o juiz pode, de ofício ou a requerimento da parte, fixá-las,
com o propósito de assegurar o adimplemento da obrigação de fazer/não
fazer no prazo determinado, observada a aferição da proporcionalidade entre
o valor da medida cominatória e o conteúdo da obrigação a que se pretende
assegurar.

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Destarte, tanto para a doutrina quanto para a jurisprudência, o objetivo da


multa não é o de concretizá-la, mas justamente o contrário, a saber, que ela
não seja necessária ante o cumprimento voluntário e tempestivo do que foi
ordenado, captando, assim, a vontade do devedor.

Acerca do papel desempenhado pela multa cominatória, preleciona


Eduardo Talamini1:

A ordem emitida pelo juiz far-se-á acompanhar de mecanismos coercitivos.


Assim, o §4º do art. 461 autoriza expressamente a imposição de multa diária,
até de ofício, para o caso de descumprimento do comando judicial contido na
sentença ou na decisão que antecipe a tutela.

Trata-se de instrumento destinado a induzir o réu a cumprir o mandado. Não


tem caráter ressarcitório ou compensatório. Já não bastasse antes existir
sólida doutrina descartando-lhe a finalidade indenizatória, o §2º do art. 461
veio a confirmar essa orientação: 'a indenização por perdas e danos dar-se-á
sem prejuízo da multa'. Enquadra-se esta entre as 'medidas indutivas
negativas' (coercitivas) (...). Na dicção tradicional, é meio de 'execução
indireta'.

Outrossim, conforme sedimentado entendimento do col. STJ (AgRg no


Ag 995721 / RS, DJe 27/05/2014; AgRg no AREsp 283130 / MS, DJe
08/04/2014; RMS 43785 / GO, DJe 27/03/2014; AgRg nos EDcl no RMS
43316 / GO, DJe 02/05/2014), cabível a fixação da multa pecuniária em face
da Fazenda Pública.

In casu, o douto Magistrado fixou multa diária de R$500,00, limitada a


R$20.000,00, na hipótese de descumprimento da ordem judicial. Diante
disso, uma vez que as astreintes foram arbitradas observando-se os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não se vislumbram
razões para a reforma da sentença nesse aspecto.

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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Por derradeiro, em relação aos honorários advocatícios, estabelece o


artigo 85, §2º, do NCPC, que estes serão fixados observando-se o grau de
zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a
importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido
para o seu serviço.

Assenta, ainda, o §3º, do aludido dispositivo, que, nas causas em que a


Fazenda Pública for parte, deverão ser observados os percentuais previstos
nos incisos I a V, sem olvidar os critérios acima citados.

Ocorre que a aplicação de tais percentuais apenas se revela cabível


quando a sentença for líquida e certa. Nas hipóteses em que for inestimável
o proveito econômico obtido, como ocorre in casu, em que o ente municipal
foi condenado a obrigação de fazer, a legislação processual civil determina
que a verba honorária seja fixada por apreciação equitativa do juiz.

Quanto ao valor, constata-se que o Magistrado condenou os réus a pagar


ao patrono do autor a importância de R$200,00. Com efeito, tendo em vista
que os honorários devem ser arbitrados em montante hábil a remunerar
condignamente o labor do advogado, inviável se falar em redução.

Feitas tais considerações, após atenta análise dos autos e dos


fundamentos apresentados na sentença, entendo que esta deve ser mantida
incólume.

Tendo em vista que as teses levantadas pelo apelante foram abarcadas


na Remessa Necessária, dada a sua maior abrangência, fica prejudicada a
análise do apelo.

Isto posto, EM REMESSA NECESSÁRIA, CONFIRMO A SENTENÇA,


PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO.

Sem custas.

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DESA. ALICE BIRCHAL - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. BELIZÁRIO DE LACERDA - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "EM REMESSA NECESSÁRIA, CONFIRMAR A


SENTENÇA, PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO."

1 TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer e sua
extensão aos deveres de entrega de coisa. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003, p. 239-240.

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