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Protocolo de Orientação Clínica em Protocolo

Obstetrícia do Centro Hospitalar do Algarve nº17


PREVENÇÃO DE Nº págs: 8
TROMBOEMBOLISMO VENOSO

1. Introdução

O tromboembolismo venoso (TEV) constitui uma causa significativa de


morbilidade e mortalidade materna nos países desenvolvidos1. Neste estão
incluídos a trombose venosa profunda (TVP) e o tromboembolismo pulmonar
(TEP). Embora a TVP seja mais frequente (75-80% dos casos de TEV na gravidez
e puerpério1,2), o TEP constitui a segunda causa mais frequente de morte
materna, responsável por 11% dos casos3. Cerca de 2/3 dos casos de TEV
poderão ser evitados se adoptadas medidas profilácticas adequadas3.

2. Definições/Evidências

A gravidez constitui um estado de hipercoagulabilidade , pensando-se que possa


estar fisiologicamente associado à prevenção da hemorragia intra e pós-parto1.
No entanto, esta adaptação fisiológica torna a gravidez e puerpério (6 semanas
pós-parto) uma fase da vida com risco acrescido de TEV, mesmo em mulheres
saudáveis. Vários outros factores de risco (pessoais ou familiares),
independentes da gravidez, têm sido identificados (ver tabela "Factores de risco
para TEV" abaixo). Apesar de todos apresentarem evidência de estar associados
a um risco aumentado de TEV, esse risco não é o mesmo para todos eles. Como
características com maior risco associado (factores de risco major) incluem-se o
TEV recorrente e antecedentes de TEV não associado a factores de risco ou
associado a estrogénios (gravidez ou CHC), seguidos de antecedentes de TEV
com factores de risco associados, trombofilia, co-morbilidades ou cirurgia major
(inclui cesariana em trabalho parto). Os restantes factores de risco (factores de
risco minor), quando isolados, representam um risco ligeiramente acrescido, no
entanto, quando conjugados podem constituir um elevado risco de TEV. Neste
grupo estão incluídos: idade ≥ 35 anos, obesidade (IMC≥30Kg/m2), história
familiar de TEV, paridade ≥ 3, tabagismo, imobilização, infecção sistémica, pre-
eclâmpsia, veias varicosas exuberantes, desidratação, hiperemese, síndrome de
hiperestimulação ovárica, gravidez gemelar, técnicas de procriação medicamente
assistida, hemorragia pós-parto superior a 1L ou com necessidade de transfusão,
trabalho de parto > 24h e cesariana electiva. Assim, recomenda-se actualmente
que todas as mulheres grávidas sejam sujeitas, o mais precocemente possível, a
uma avaliação individual de risco tromboembólico (nível de evidência C) para
estabelecer a eventual necessidade de implementação de profilaxia
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farmacológica. Quando indicada, esta deverá ser iniciada de imediato (nível de


evidência B), idealmente com heparina de baixo peso molecular (HBPM) (nível
de evidência A). A profilaxia com HBPM durante a gravidez deve ser efectuada
em todas as mulheres com antecedentes de TEV recorrente, TEV não associado a
factores de risco/associado a estrogénios ou episódio único de TEV associado a
trombofilia/história familiar (nível de evidência C) e pode ser considerada para
qualquer mulher com 3 ou mais factores de risco (nível de evidência C).
A re-avaliação de risco deverá ser feita em todas as consultas e intercorrências
da gravidez (nível de evidência C). Apenas as mulheres com antecedentes de
tromboembolismo associado a factores de risco transitórios, não estrogénio-
dependente, deverão ser sujeitas a estudo de trombofilias uma vez que, apenas
nestas, o estudo poderá implicar uma mudança de atitude (nível de evidência C).

3. Descrição do Protocolo

PREVENÇÃO DE TROMBOEMBOLISMO VENOSO (TEV) NA GRAVIDEZ

1) AVALIAÇÃO DO RISCO

 Todas as mulheres grávidas ou que estejam a considerar engravidar


devem ser avaliadas relativamente ao risco tromboembólico
 Risco deve ser reavaliado a cada nova intercorrência (ex. internamento,
parto, puerpério imediato ou perante complicações da gravidez)
 Mulheres com antecedentes de TEV associado a factores de risco
transitórios minor (ex. viagem prolongada) devem fazer rastreio de
trombofilias. Quando associado a factores de risco transitórios major (ex.
trauma ou cirurgia major, cancro) não têm indicação

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Factores de risco para TEV

Factores de risco pré- Factores de risco Factores de risco


existentes obstétrico transitórios
Infecção sistémica actual (ex.
TEV prévio recorrente (>1) Pré-eclâmpsia infecção de sutura,
pielonefrite, pneumonia)
TEV prévio sem factores de risco Desidratação, Hiperemese ou
ou associado a estrogénios Sínd. hiperestimulação Imobilização (≥3 dias)
(gravidez e CHC) ovárica

TEV prévio na sequência de Gravidez múltipla ou


Procedimento cirúrgico na
factores de risco transitórios (até gravidez obtida por técnicas
gravidez ou até 6 semanas
3 meses após cirurgia major, de procriação medicamente
pós-parto
imobilização, fractura, trauma) assistidas

Antecedentes familiares de TEV CST Viagens longas (> 4horas)


Internamento hospitalar ou
Trombofilia Fórceps (rotação/médios)
puerpério
Comorbilidades (ex. doenças
cardíacas, pulmonares,
inflamatórias, LES, cancro, Trabalho parto > 24h
síndrome nefrítico, anemia
falciforme, uso de drogas ev)
Hemorragia periparto > 1L
Idade > 35 anos
ou necessidade transfusão
IMC >30Kg/m2 (pré-gravidez ou
gravidez inicial)
Paridade ≥ 3
Tabagismo
Insuficiência venosa profunda
(sintomática, afecção acima do
joelho ou associada a flebite,
edema ou alterações cutâneas)

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Classificação dos grupos de risco

Factores de Risco Grupo

TEV prévio recorrente


ou
TEV prévio sem factores de risco/associado a estrogénios
ou
Alto Risco
TEV prévio + trombofilia/história familiar
ou
Défice antitrombina/trombofilia com
homozigotia/heterozigotia composta (>1 mutação)

≥ 3 factores de risco (excepto critérios para grupo alto risco)


ou
TEV prévio na sequência de factores de risco transitórios
(excepto associado a estrogénios)* Risco Intermédio
ou
Trombofilia sem outros factores de risco
ou
* Baixo risco de recorrência na
Algumas co-morbilidades isoladamente (ex. próteses
ausência de factor de risco etiológico
valvulares mecânicas) prévio

< 3 factores de risco (excepto critérios para grupo alto risco ou


Baixo Risco
risco intermédio)

2) PROFILAXIA

Grupo Medidas profilácticas


o Grávidas devem ser avisadas de sinais e sintomas de TEV e da
importância de procurar apoio médico
o Profilaxia com HBPM (podendo ser necessárias altas doses
Alto Risco profilácticas ou 75% de dose terapêutica) e uso de meias de
compressão durante a gravidez e 6 semanas pós-parto ou até
retomarem anticoagulante oral, se medicadas previamente à
gravidez (normalmente 7 dias após o parto, quando risco
hemorrágico diminui)

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o Grávidas devem ser avisadas de sinais e sintomas de TEV e da


importância de procurar apoio médico
o Eventual profilaxia com HBPM de acordo com avaliação individual
multidisciplinar , embora não esteja recomendada na maioria dos
casos
o Profilaxia pós-parto com HBPM durante 7 dias. Caso persistam ≥ 3
factores de risco prolongar até às 6 semanas pós-parto ou até
desaparecerem factores de risco transitórios (ex. infecção)
o Recomendar a utilização de meias de compressão durante a
gravidez e puerpério.
o Casos de TEV prévio na sequência de factores de risco transitórios
que já não estão presentes (excepto associados a estrogénios) têm
indicação apenas para profilaxia pós-parto durante 6 semanas com
HBPM e vigilância apertada durante a gravidez para avaliar
Risco Intermédio regularmente a presença de novos factores de risco que, caso
surjam, passam a constituir indicação para profilaxia durante a
gravidez
o Em casos de trombofilia sem outros factores de risco associados
deve ser considerada profilaxia pós-parto durante 7 dias com
HBPM e vigilância apertada da gravidez para avaliação regular de
novos factores de risco que, caso surjam, podem constituir indicação
para profilaxia durante a gravidez. Nesses casos deve ser mantida
profilaxia pós-parto durante 6 semanas
o Casos de co-morbilidades com indicação para anticoagulação oral
prévia à gravidez, profilaxia deve ser mantida durante a gravidez e
pós-parto, sendo obrigatoriamente feita com HBPM durante o 1º
trimestre, após o qual, havendo indicação médica de outra
especialidade, poderá retomar a anticoagulação oral com risco
minor dose-dependente para o feto (idealmente até 5mg/d
varfarina). Substituir varfarina por HBPM ou HNF às 36 semanas

o Evitar imobilização prolongada e desidratação


o Utilizar meias de compressão em viagens com duração > 4 h
o Em casos de presença de anticoagulante lúpico ou anticorpos anti-
fosfolípidos persistentes sem síndrome antifosfolipídico nem outros
Baixo Risco
factores de risco pode ser considerada profilaxia pós-parto com
HBPM durante 7 dias
o Se IMC ≥40Kg/m2 sem outros factores de risco deve ser considerada
profilaxia pós-parto durante 7 dias com HBPM

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Doses de HBPM

Peso (Kg) Enoxaparina Dalteparina


< 50 20 mg/d 2500 UI/d
50-90 40mg/d 5000 UI/d
91-130 60mg/d* 7500 UI/d*
131-170 80 mg/d* 10000 UI/d*
> 170 0,6mg/Kg/d* 75UI/Kg/d*
Alta dose profiláctica** 40mg 12/12h 5000 UI 12/12h
50-90 Kg
1mg/Kg 12/12h (gravidez) 100UI/Kg 12/12h (gravidez)
Dose terapêutica**
1,5mg/Kg/d (Puerpério) 200UI/Kg/d (Puerpério)
* Dose pode ser dividida em duas administrações
** Indicadas em doentes com Síndrome antifosfolipídico + antecedentes de TEV, doentes com
défice de antitrombina ou antecedentes de TEV/prótese valvular sob anticoagulantes orais
previamente a gravidez. Em casos de défice de antitrombina, dose deve ser ajustada de acordo
com teste laboratorial anti-Xa

Contraindicações para uso de HBPM (Consultar hematologista)


 Hemorragia anteparto e pós-parto
 Placenta prévia
 Diátese hemorrágica
 Trombocitopénia < 75x109/L
 Acidente vascular há menos de 4 semanas
 IRC
 DHC
 Hipertensão não controlada

3) PARTO

 Grávidas devem ser avisadas de que em caso de perdas hemáticas ou


suspeita de início do trabalho de parto não devem fazer toma habitual de
HBPM até consultar o médico
 Substituir varfarina por HBPM ou HNF às 36 semanas e, se possível,
suspender no mínimo 4-6h antes do parto
 Consultar anestesista relativamente à possibilidade de realizar
analgesia/anestesia loco-regional:
- Doses profilácticas de HBPM - 12h de intervalo desde a última toma
- Doses terapêuticas de HBPM - 24h de intervalo desde a última toma
- HNF endovenosa - 4 horas de intervalo desde última toma
- HNF subcutânea - Não contraindicada se plaquetas e aPTT normais

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 Doentes sob alta dose profiláctica/dose terapêutica - Reduzir para dose


profiláctica na véspera da indução do TP e, se possível, manter essa dose
 CST electiva - Fazer a última dose profiláctica entre 12-24h antes da CST
 Em mulheres com risco elevado de hemorragia (ideal seria suspender
HBPM) ou de TEV (ideal seria não suspender profilaxia por longos
períodos) pode-se optar por HNF - 5000 UI SC 12/12h até poder retomar
HBPM

4) Puerpério

 HBPM - Primeira dose pode ser administrada no mínimo 6 horas após


o parto ou 6 horas após remoção de cateter epidural, atendendo
sempre à hora da última toma. Caso a terapêutica seja reiniciada antes
da remoção do cateter, este só deve ser removido após 12 ou 24h da
última toma consoante se trate de dose profiláctica ou terapêutica,
respectivamente.
Se durante colocação de cateter se verificar uma punção hemática,
reinicio de terapêutica deve ser atrasada para 24 horas após punção
ou remoção de catéter
 HNF - Primeira dose pode ser administrada no mínimo 1 hora após o
parto ou remoção de cateter epidural. Se punção hemática durante
colocação de caterer, a administração deve ser adiada no mínimo até 6
horas. Caso a terapêutica seja reiniciada antes da remoção do cateter,
este só deve ser removido após 4 horas da última toma.

4. Bibliografia

1. Pregnancy-related venous thromboembolism: Risk and the effect


of thromboprophylaxis; Lussana F, Coppens M, Cattaneo M,
Middeldorp S; Thrombosis Research; 2012
2. Venous thromboembolism in pregnancy; Calderwood CJ,
Thanoon OI; Obstetrics, Gynaecology and Reproductive Medicine;
2013
3. Reducing the risk of thrombosis and embolism during pregnancy
and the puerperium; Green Top Guideline No. 37a; Royal College
of Obstetricians and Gynaecologists; 2009
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4. Guia Clínico de fármacos inibidores da hemostasia e anestesia


regional do neuroeixo; Sociedade Portuguesa de Anestesiologia;
2010

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