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EDITORIAL

Se procurarmos sinónimos para a palavra “relação”, encontramos Na rubrica Saber+ é apresentado um exercício que vai ajuda-lo/a a
“ligação, associação, enlace, vínculo, elo, correlação, junção, alian- compreender como estão as suas relações interpessoais. Fecha-
ça”. É disto que vamos falar neste segundo número da Psiquili- mos com a rubrica Destaques com as imagens do lançamento do
brios em Revista: de relações. A relação tanto pode referir-se aos livro “Como promover as competências sociais e emocionais das
vínculos afetivos que acontecem entre os seres humanos, como, crianças” em Coimbra.
por exemplo, a relação de casal ou de amizade, como pode aludir
à relação terapêutica, aquela que acontece entre o psicólogo e o Deixo-vos com um cheiro de verão e com a certeza de que vão
seu cliente. apreciar muito este número.
De um modo geral, as relações fazem-nos aprender e crescer, mes-
mo aquelas que, de alguma forma, ou por qualquer motivo, nos
Vera Ramalho
fazem sofrer.
Relacionarmo-nos com outras pessoas é algo intrínseco aos se- FICHA TÉCNICA
res humanos e envolve, entre outras coisas, respeito, reconheci-
mento e amor, através da amizade, da família, da fratria, da filia- Título
ção e do casal. Psiquilíbrios em Revista
As nossas primeiras relações, com os nossos pais ou cuidadores, Número II
ainda quando éramos bebés, são, em parte, definidoras do que 2018
somos. John Bowlby, um psiquiatra britânico, através dos seus ISSN 2184-2299
estudos ajudou-nos a compreender a importância das primeiras
relações que estabelecemos. Na verdade, precisamos que cuidem Diretora executiva
de nós, que nos deem carinho e atenção, sob pena de não nos de- Vera Ramalho
senvolvermos adequadamente e, mais tarde, termos dificuldades Edição
nos relacionamentos que estabelecemos com os outros. Psiquilíbrios
Neste número da Psiquilibrios em Revista, João Amorim, psicólo-
go no Psiquilibrios e investigador das relações românticas na ida- Projeto gráfico e design
de adulta, fala-nos de relações de casais e das suas descobertas digiUP - creative solutions
e (des)encontros. No nosso segundo artigo, Eugénia Ribeiro, au-
tora do Psiquilibrios Edições, professora da Escola de Psicologia Sede
da Universidade do Minho e investigadora na área dos processos Av Alfredo Barros, 20. Braga
relacionais em psicoterapia, apresenta uma visão de fácil com-
preensão sobre a aliança terapêutica. Dito de uma forma simples, Assinaturas
a aliança terapêutica é a qualidade da interação desenvolvida en- Psiquilibrios@gmail.com
tre terapeuta e cliente no âmbito do processo terapêutico, sendo
que a relação terapêutica é um fator que explica uma parte da va- Créditos do autor da capa:
riância dos resultados terapêuticos. ©Toninho Cunha. Artista Barcelense e convidado da Bienal Ponte de
Este número inclui, ainda, uma entrevista com Miguel Gonçalves, Lima Leths Art.
autor do Psiquilibrios Edições e investigador da Universidade do
Minho, que tem procurado compreender como é que a mudança CONTEÚDOS E PROTEÇÃO DE PROPRIEDADE
acontece em psicoterapia. A não perder! https://www.psiquilibrios.pt/wp-content/uploads/2018/06/Politica-de-
Este número II da Psiquilibrios em Revista conta com uma nova -Privacidade-termos-e-condiçoes-.pdf
rubrica, Escola & Família, escrita pela Sílvia Fernandes, professora
do ensino básico e secundário e revisora dos livros do Psiquilibrios A Psiquilibrios em Revista é uma publicação que pretende distinguir-se
Edições. Aqui vamos conhecer a opinião de quem se relaciona há pela elevada qualidade dos seus colaboradores e conteúdos. Todas
muitos anos com crianças e adolescentes e tem uma visão de as opiniões serão bem-vindas e servirão para a nossa reflexão e
dentro da escola para nos dar. crescimento.
Na rubrica Experiências damos a conhecer uma história de vitória As ideias apresentadas são meramente informativas e não pretendem
da mãe e de uma criança que foram atendidas no Psiquilibrios. impor comportamentos nem substituir a consulta de um profissional.

2 Psiquilíbrios em revista
ÍNDICE

Entrevista com... 4
4 6 - Miguel Gonçalves

Psicologia & 6
Psicoterapias
- À descoberta das relações de casal
- Aliança terapêutica: um processo
relacional promotor de mudança
em terapia

Experiências 10
8 10
Livros e outras 11
notas
- Aliança Terapêutica: da Teoria
à Prática Clínica

Escola & Família


Quando o autoritarismo levou
12
consigo a autoridade

11 12 Saber+:
Como estão as suas relações
13
interpessoais?

Destaques
Evento do lançamento do livro:
14
Como promover as competências
sociais e emocionais das crianças

13 14

Psiquilíbrios em revista 3
Entrevista com...
Miguel Gonçalves

Miguel Gonçalves é Sócio Fundador do Psiquilíbrios e coor- nha (e.g. esquizofrenia, perturbação bipolar) e a psicoterapia
denador científico do Psiquilibrios Edições. É psicólogo, psi- pode ser usada como coadjuvante
coterapeuta e Professor Catedrático Escola de Psicologia da b. O envolvimento do paciente é absolutamente fundamental
Universidade do Minho. Foi Diretor do Centro de Investigação para o sucesso da psicoterapia e é provavelmente a variável
em Psicologia da Universidade do Minho e Vice-Presidente da mais importante.
Escola de Psicologia entre 2013 e 2017. Tem publicado interna- c. Apesar de uma percentagem significa de pessoas melhorar
cionalmente sobre o processo de mudança narrativa em psico- com a psicoterapia, temos uma taxa de desistência do tra-
terapia, estando neste momento a desenvolver um programa tamento que é (aceitando que os estudos internacionais se
de investigação que analisa os processos narrativos que con- aplicam a Portugal) em média de 20%.
duzem à mudança em diversos modelos psicoterapêuticos. É d. Há uma percentagem significativa de pessoas que não me-
autor de quatro livros do Psiquilibrios Edições: Terapia narrativa lhora, ou melhora pouco, com a psicoterapia.
da ansiedade, em co-autoria com Margarida R. Henriques; Pôr o e. Os terapeutas têm uma enorme variabilidade de resultados
Medo a fugir; Terapia Centrada nas Soluções; Terapia Narrativa terapêuticos. Há terapeutas que sistematicamente têm me-
da Re-autoria. lhores resultados, há terapeutas que têm resultados pobres e
a maioria situa-se no meio destes extremos.
O que é a Psicoterapia? f. Sabemos muito mais que a psicoterapia funciona e em que
A psicoterapia é uma forma de tratamento psicológico cujo ob- situações funciona melhor, do que os mecanismos através
jetivo é melhorar o ajustamento das pessoas face a problemas dos quais funciona.
psicológicos e psiquiátricos. Idealmente a psicoterapia contri-
buiu para o desaparecimento dos sintomas (ou diminuição sig- É possível explicar, com base nos seus estudos, como a mu-
nificativa) e para a melhoria da qualidade de vida dos pacientes. dança em psicoterapia acontece?
É precisamente uma parte deste processo que eu e a minha
Quem pode beneficiar de psicoterapia? equipa de investigação temos procurado compreender. Basi-
Sabemos através de estudos epidemiológicos que uma per-
centagem muito significativa de pessoas sofre de problemas
psiquiátricos ao longo da vida, sendo os mais frequentes a de-
pressão e as perturbações de ansiedade. A psicoterapia é útil
para estas perturbações de intensidade moderada (e.g. depres-
são moderada, pânico, ansiedade social), sendo igualmente útil
como coadjuvante ao tratamento psiquiátrico de perturbações
mais sérias (e.g. esquizofrenia, depressão severa). Para além
disso, a psicoterapia pode ser útil em situações em que não
havendo perturbação psiquiátrica, há sofrimento psicológico
resultante de múltiplos factores (e.g. gestão inadequada do
stress, mudanças súbitas e indesejadas na vida das pessoas).

Pode explicar como os seus estudos têm demonstrado que a


psicoterapia é eficaz?
Talvez seja melhor responder a esta questão enunciando algu-
mas coisas que sabemos com toda a certeza, ao fim de várias
décadas de investigação:
a. A psicoterapia é eficaz, sendo comparável na maioria das
perturbações ao tratamento farmacológico (e.g. depressão).
Nalgumas perturbações a psicoterapia deve ser a primeira
linha de intervenção e a medicação pode ser usada como
coadjuvante (e.g. perturbação de pânico, insónia), noutras a
medicação é absolutamente fundamental como primeira li-

4 Psiquilíbrios em revista
camente, temos procurado perceber como ocorrem pequenas
mudanças na vida das pessoas que podem ser amplificadas de
tal modo que contribuem para mudanças mais significativas.
As pessoas que tenham interesse em saber mais sobre isto
podem consultar https://www.psi.uminho.pt/pt/investigacao/
Processos_de_Mudanca_em_Psicoterapia

Sabemos que quanto mais grave for a problemática relacionada


com uma pessoa, mais rígida ela pode ser. É possível ajuda-la
com psicoterapia?
Depende de múltiplas variáveis: vontade de mudar e envolvi-
mento do paciente, qualidade da terapia que é oferecida, apoio
externo (família, amigos) para a mudança, etc. Às vezes casos
que nos parecem difíceis à partida melhoram muito mais do
que seria de esperar e o contrário também acontece: casos que
pareciam muito simples, revelam-se muito complicados.

A maior parte das pessoas que nos procura quer mudar, mas,
muitas vezes, devido a vários fatores podem hesitar e “boico-
tar” a terapia. Isto é ambivalência. É possível ajudar as pessoas
nestes momentos?
Eu não diria que as pessoas querem boicotar a psicoterapia.
As pessoas muitas vezes hesitam se mudar é ou não uma boa
ideia. Resolver esta dúvida ou hesitação, que pode até nem ser
muito consciente para a pessoa, é muito importante no proces-
so de mudança. Dou um exemplo fácil de entender: alguém que
é excessivamente perfeccionista habitualmente sofre imenso
com isso, mas se a pessoa tem sucesso na vida é fácil atribuir
o sucesso ao seu modo perfeccionista de funcionar. Quando
fica evidente que o perfeccionismo é responsável por muito
sofrimento, a pessoa pode hesitar se faz sentido abandonar o
perfeccionismo, tendo em conta a sua crença de que este modo
de funcionar foi responsável pelo seu sucesso.

Nem sempre as pessoas estão preparadas para fazer psicotera-


pia, o terapeuta tem ferramentas para ajuda-las mesmo assim?
Temos ferramentas, não quer dizer que tenhamos necessaria-
mente sucesso. Mais uma vez depende de imensas variáveis.

Psiquilíbrios em revista 5
Psicologia e Psicoterapias
À descoberta das relações de casal

Nas últimas décadas tem sido possível constatar a ocorrência dimensão ocupa neste contexto. Efetivamente, é frequente os
de modificações significativas na instituição casamento e nos casais apresentarem a comunicação como uma das principais
modelos conjugais, assistindo-se, na atualidade, a uma vasta fontes de insatisfação no seio da relação.
diversidade na forma como a conjugalidade pode ser vivida.
Não obstante as exigências inerentes à construção e manuten- Quando se fala de dificuldades desta natureza no âmbito de
ção de uma relação de casal, a maioria dos indivíduos adultos uma relação de casal, deve ter-se em consideração que, para
almeja o estabelecimento de uma relação romântica duradoura, além da ausência de comunicação em si, o problema reside
estável e satisfatória. muitas vezes na ineficácia e/ou inadequação dos processos
comunicacionais que, frequentemente, refletem outro tipo de
O estabelecimento de uma relação conjugal pode ser um pro- problemas inerentes à dinâmica e vivência relacional e que
cesso bastante desafiante, na medida em que pressupõe que podem variar de casal para casal. Assim, casais disfuncionais
os dois elementos do casal sejam capazes de negociar uma podem apresentar padrões comunicacionais marcados pela
realidade quotidiana na qual, para além do Eu e do Tu, passem não objetividade, por exemplo, na expressão de sentimentos e
também a incluir e a estruturar um Nós. Efetivamente, sabe-se necessidades individuais e relacionais, dificultando desta for-
que a natureza do contexto relacional que é estabelecido por ma que o outro possa adotar comportamentos que visem a sa-
ambos os elementos de um casal é dos fatores que mais in- tisfação de tais necessidades. Para além disto, tal sinalização
fluencia a segurança e estabilidade conjugal. Por sua vez, o al- e expressão de necessidades pode ser efetuada sob a forma
cance do equilíbrio entre a individualidade de cada um dos ele- de protesto, crítica e com considerável tonalidade emocional
mentos envolvidos na relação e a construção de uma vivência negativa, o que, por sua vez, pode conduzir a uma escalada de
a dois com necessidades e projetos comuns, pode afigurar-se conflito onde ambos os elementos do casal se culpabilizam um
como um grande desafio para o casal. Neste sentido, uma rela- ao outro, ou à adoção de posturas de retraimento e defensivida-
ção pautada por uma dinâmica que constrange a expressão e de por parte do elemento do casal que é criticado. Em qualquer
a satisfação das necessidades individuais dos seus elementos
e que, por isso, não se apresenta como um contexto promotor
de desenvolvimento pessoal, pode levar a que os indivíduos
envolvidos em tal relação a percebam como não satisfatória,
potenciando o surgimento de problemas conjugais.

Ao longo do ciclo desenvolvimental de uma relação, os casais


podem ser confrontados com uma variedade de desafios e difi-
culdades inerentes a transições no ciclo de vida familiar, como
por exemplo, parentalidade, relações com a família de origem,
desafios profissionais, e questões financeiras. Ainda que tais
desafios possam constituir-se como fatores de risco para o sur-
gimento de problemas na relação, tal não tem necessariamente
de ocorrer, podendo até afigurarem-se como oportunidades de
desenvolvimento pessoal e da própria relação. O modo como es-
tes desafios e os possíveis conflitos a eles inerentes são geridos
e resolvidos é significativamente influenciado não apenas pelo
facto de os elementos do casal procurarem (ou não) negociar a
resolução dos mesmos alcançando uma solução minimamente
satisfatória para ambos, bem como pela forma como expressam
as suas necessidades pensamentos e sentimentos, durante e
após este processo. Falamos, portanto, de comunicação. João Amorim é psicólogo do Psiquilibrios, mestre em
Psicologia clínica e da saúde pela Faculdade de Educação
No âmbito das relações amorosas, é praticamente incontor- e Psicologia da Universidade Católica Portuguesa.
nável não se falar de comunicação, tal a importância que esta

6 Psiquilíbrios em revista
dos casos, tais padrões comunicacionais reforçam apenas o
distanciamento emocional e a hostilidade entre os elementos
do casal.

Em determinado momento, as dessincronias e os conflitos


numa relação amorosa são praticamente inevitáveis, podendo
ser potenciados por uma vasto leque de fatores intrínsecos e/
ou extrínsecos ao próprio casal. Porém, é importante que os
elementos do casal reconheçam quando não estão a ser capa-
zes de, sozinhos, manterem um ambiente relacional saudável
e funcional, afigurando-se a terapia de casal como um recurso
importante nestas situações.

©Ylanite Koppens

Psiquilíbrios em revista 7
Psicologia e Psicoterapias
Aliança terapêutica: um processo relacional
promotor de mudança em terapia

A investigação científica em psicoterapia tem apresentado evi- ao terapeuta (ex., confiando, evidenciando medo da rejeição,
dência consistente de uma relação positiva e significativa entre mostrando distancia emocional, etc) desafiando progressiva-
a qualidade da aliança terapêutica e os resultados da terapia, mente esse estilo do cliente, monitorizando a distância/proximi-
independentemente da modalidade terapêutica e do diagnósti- dade desejada pelo cliente e promovendo a sua transformação
co dos clientes (e.g. Horvath, 2011). Em termos gerais, a aliança ao longo do processo terapêutico. Desta forma, ao adaptar a
terapêutica refere-se à força e qualidade da relação colaborativa sua intervenção terapêutica ao estilo de vinculação do cliente,
que se estabelece entre o terapeuta e o cliente, e se desenvolve o terapeuta contribui para o formação de uma distância tera-
ao longo do processo terapêutico. Considerada numa perspecti- pêutica ótima (Daly & Mallinckrodt, 2009) e cria condições para
va transteórica (Bordin, 1979), a aliança terapêutica concretiza- emergência de uma aliança terapêutica positiva com impacto
-se na manifestação de três dimensões: o acordo entre terapeu- favorável à permanência em terapia e ao trabalho terapêutico
ta e cliente em relação aos objectivos da terapia, o acordo em de sucesso.
relação à tarefas terapêuticas consideradas como necessárias
ou relevantes para o atingir dos objetivos e o estabelecimen-
Eugénia Ribeiro
to de um vínculo afetivo entre ambos os elementos da díade.
Sendo a aliança terapêutica um fenómeno diádico e dinâmico,
importa conhecer quer os fatores do terapeuta e do cliente que Se quiser conhecer melhor a investigação da Profª Eugénia Ri-
contribuem para a formação de uma aliança terapêutica de beiro sobre como a aliança terapêutica contribui para a mudan-
qualidade, quer os processos que influenciam o seu desenvol- ça em psicoterapia, consulte: https://www.psi.uminho.pt/pt/
vimento ao longo da terapia. Entre os fatores mais estudados investigacao/Relacao_Terapeutica/
e consensualmente reconhecidos como tendo impacto na for-
mação da aliança, incluem-se fatores de natureza interpessoal
quer do terapeuta quer do cliente, como sejam a gravidade dos
problemas de natureza interpessoal do cliente e os estilos de
vinculação de ambos os elementos da díade. A capacidade e
a disponibilidade para confiar, estabelecer proximidade com o
outro, sentir conforto com a intimidade, expressar e regular emo-
ções são condições importantes para o estabelecimento do vín-
culo terapêutico facilitador da negociação de objetivos e tarefas
terapêuticas, no contexto de uma relação colaborativa da díade.

Cabe ao terapeuta reconhecer e gerir o impacto das fragilida-


des ou potencialidades com que o cliente chega à terapia, bem
como das suas próprias, na formação de uma aliança terapêu-
tica inicial de qualidade (Baldwin et al., 2007). Assumindo uma
perspectiva desenvolvimental, temos vindo a propor que na
gestão da qualidade da aliança inicial e do seu desenvolvimento
e transformação ao longo do processo, o terapeuta tenha em
atenção a disponibilidade e prontidão do cliente para aprofundar
ou elaborar sobre os problemas ou dificuldades que o trouxeram
à terapia, bem como para avançar e elaborar sobre as mudanças
desejadas e para as quais pede a ajuda do terapeuta (Ribeiro,
2009; Ribeiro et al, 2013). Nesta intervenção colaborativa e res-
ponsiva às necessidades do cliente, quer de compreensão quer Eugénia Ribeiro é autora do Psiquilibrios Edições, profes-
de incentivo à mudança, o terapeuta deverá assegurar de modo sora da Escola de Psicologia da Universidade do Minho
consistente e sensível um clima de segurança e confiança mú- e investigadora na área dos processos relacionais em
tua. Nesse sentido, poderá começar por sintonizar com o modo psicoterapia.
como o cliente demonstra estar (in)disponível para se vincular

8 Psiquilíbrios em revista
O conceito de aliança terapêutica referenciado na literatura re- A aliança refere-se à parceria colaborativa, mutuamente respei-
mete para a ideia de colaboração entre terapeuta e cliente. tadora que caracteriza a relação entre o terapeuta e o cliente.

Bordin (1979) apresenta um conceito de aliança terapêutica Quando inicia a psicoterapia, o cliente não é apenas alguém que
onde inclui três dimensões: uma sobre a qualidade do vínculo apresenta um pedido de ajuda para resolver problemas ou difi-
que se estabelece entre o terapeuta e o cliente; e outras duas culdades correntes, mas alguém que traz uma história pessoal
orientadas para o trabalho terapêutico, o acordo em relação aos e relacional, alguém que traz expectativas de mudança, e cuja
objetivos terapêuticos e o acordo em relação às tarefas. disposição para colaborar com o terapeuta é mediada por vários
factores, como por exemplo, o funcionamento interpessoal do
O sucesso de qualquer terapia exige um compromisso do cliente cliente e o diagnóstico psicopatológico.
e do terapeuta com o trabalho terapêutico específico e uma rela-
ção de confiança mútua e de co-responsabilização pelo sucesso Fonte: Aliança Terapêutica: da Teoria à Prática Clínica;
na mudança do cliente. Eugénia Ribeiro (ccordenação), Psiquilibrios Edições

Psiquilíbrios em revista 9
Experiências
Intervenção cognitivo-comportamental com
uma criança com dificuldades alimentares.

Nesta rubrica damos a conhecer a opinião de alguém que co-


nhece o Psiquilibrios e tem uma história para contar. Envie-nos
a sua opinião sobre algum produto ou serviço do Psiquilibrios
(um livro, a sua experiência de psicoterapia no Psiquilibrios,
uma formação). As opiniões mais construtivas serão divul-
gadas nos próximos números da Psiquilibrios em Revista. Con-
tacte-nos para psiquilibrios@gmail.com.

Levei o meu filho André* ao Psiquilibrios porque li o artigo:


“Uma intervenção cognitivo-comportamental numa criança
com dificuldades alimentares: Pedro descobriu que gostava de
comer” e identifiquei-me muito. Se me permite contar, acontece
que tenho um filho de 5 anos que não queria mastigar a comida,
embora ele mastigasse algumas bolachas. Tenho uma depen-
dência muito forte com ele e vice-versa, pois o nascimento dele
acarretou a minha separação do seu pai. Tentei trocar a comida
líquida pela sólida, mas ele recusava tudo e o pior é que ele pode
ficar horas sem comer nada! Encontrei o artigo da Dra. Vera na
internet e decidi pedir ajuda porque eu já não conseguia fazer
nada dele. Algum tempo depois de começarmos as consultas
tudo mudou, eu mudei também. Acho que quem precisava das
consultas era eu.
Não foi fácil porque o André é muito teimoso e não aceitava
nada de novo, mas ensinei-o a provar aos poucos a comida e a
passar a gostar. Foi preciso muita paciência! Mas hoje entra no
carro a perguntar “mãe, o que é o almoço?”.

* nome fictício.

10 Psiquilíbrios em revista
Livros e outras notas
Aliança Terapêutica: da Teoria à Prática Clínica

Tomamos como figura central deste livro o conceito de aliança Ao longo deste livro procurámos realçar diferentes contornos
terapêutica, cuja natureza semântica do primeiro termo remete desta figura, a aliança terapêutica, perspectivando-a em dife-
para significados como união, compromisso, harmonia entre rentes fundos teórica e empiricamente relevantes: o enquadra-
(coisas) diferentes…, e a do segundo para cuidado, tratamento mento teórico, a díade terapêutica e o processo interativo.
orientado para a saúde e bem-estar. Tomando o enquadramento teórico como fundo, percebemos
que a aliança terapêutica assume configurações diversas, evi-
No contexto da literatura científica sobre psicoterapia, a aliança denciando compromissos específicos e equilíbrios distintos en-
terapêutica tem sido definida, em geral, como a colaboração en- tre papéis e responsabilidades do terapeuta e do cliente.
tre o terapeuta e o cliente orientada pelo objetivo de promover Ao longo do livro procura-se realçar diferentes contornos des-
a mudança deste último. Numa perspectiva pragmática esta ta figura, a aliança terapêutica, perspectivando-a em diferentes
colaboração supõe sempre alguma forma de união ou compro- fundos teórica e empiricamente relevantes: o enquadramento
misso, e subentende alguma harmonia entre (histórias, expe- teórico, a díade terapêutica e o processo interativo.
riências, saberes ou poderes…) diferentes, personificados no Para saber mais sobre o livro, consulte https://www.psiquili-
cliente e no terapeuta. Na verdade, será difícil imaginar-se uma brios.pt/produto/alianca-terapeutica/
psicoterapia sem envolvimento e compromisso mútuo, e será
ainda mais difícil imaginar-se que tal psicoterapia promova mu- Eugénia Ribeiro (ccordenação),
dança em quem a procura. Psiquilibrios Edições

Psiquilíbrios em revista 11
Escola & Família
Quando o autoritarismo levou consigo
a autoridade

Houve uma fase em que o Autoritarismo imperava; recordamos Não se pretende com este pequeno texto acicatar consciências
anéis espessos, réguas, canas e afins, tudo numa relação muito adormecidas; constitui simplesmente uma prática pessoal. É
física, literalmente, no que se refere à relação professor-aluno, um texto aberto à opinião e, por isso, fico à espera de melhores
quando a aprendizagem e o comportamento não correspon- práticas. De teorias feitas à medida do umbrático… não preciso;
diam ao pretendido. tenho em casa uma biblioteca de dezenas de livros bastante
empoeirados na secção da pedagogia. Não é pó de antiguidade
Passa a referida época (não vou referir enquadramentos tempo- é mesmo de irrealidade pedagógica.
rais porque varia também em termos geográficos) e, por confu-
são, apaga-se também, porque se entende erradamente como
sinónimo, o termo Autoridade.
Fica então o professor entregue a situações de completo im-
pedimento sócio-ético-pedagógico no que se refere a regras
e a procedimentos para apelo à ordem na sala de aula. Surge,
então, neste tempo de nevoeiro psico-emocional o conceito de
“coitadinhas das crianças”. Coitadinhas porque são pobres,
coitadinhas porque são faladoras e devem ter traumas de in-
fância, coitadinhas porque os pais deixam-nas entregues a si
mesmas, coitadinhas porque os pais estão sempre a controlar,
coitadinhas porque são ricas. “Coitadinhas das crianças” pas-
sa, assim, a fazer parte do vocabulário pedagógico corrente,
engendram-se teorias comprovadíssimas em birrinhas e lingua-
gem imprópria das crianças (ninguém ouse chamar-lhe falta
de educação!!!) e são desculpadas todas as atuações menores
em termos de trabalho e obrigações escolares, bem como em
termos comportamentais. Trabalham pouco e quando querem,
não trazem o que lhes é pedido de casa (materiais) e têm direito
a terem dias maus muitas vezes, aliás, todos os dias, inibindo
também a aprendizagem dos restantes colegas, que tiveram a
má sorte de ter uma dessas crianças coitadinhas na turma. No
final do ano, mesmo que em posição de desmérito completo,
arranjam-se argumentos para que se enquadre na legislação ou
em qualquer regulamento interno de uma escola e transite de
ano não, por isso, porque se faz contas ao feito e ao bem feito,
mas ao imaginário do possível, ao potencial do quimérico. Ciclo
perfeito de desvalorização escolar completo!

Peço desculpa… (acho que tenho de pedir porque essa expres-


são de “coitadinhas das crianças” não faz parte do vocabulá-
rio). Uma criança que precisa de ajuda, por diversos motivos,
deve ter essa ajuda, não deve ser desculpada. Sinteticamente:
o trabalho de aula é um trabalho de grupo e, como tal, tem sem-
pre um líder. Um líder que orienta, que exige, que impõe, que
restringe atuações, que elogia. Nas minhas aulas o líder sou Sílvia Fernandes é professora de línguas no ensino bá-
eu! Uma aprendizagem pedagógica académica de 5 anos tem sico e secundário, presentemente a lecionar no Agru-
de dar algum crédito a quem se forma como professor. Não é pamento de Escolas D. Manuel de Faria e Sousa, e é
dado o mesmo crédito a um engenheiro que termina o seu cur- colaboradora do Psiquilibrios enquanto revisora.
so, apto para orientar construções?

12 Psiquilíbrios em revista
Saber+
Como estão as suas relações interpessoais?

Ao longo do nosso desenvolvimento vamos construindo a nos- Numa situação de crise/dificuldade pode contar com a sua rede?
sa própria rede relacional, que vai ser composta por todas as Para quem liga quando se sente triste? Com quem costuma ir ao
relações interpessoais que percebemos como significativas ou cinema? Com quem sai habitualmente ao fim de semana? Quem
que definimos como diferenciadoras. Esta rede, composta por o confortará numa situação de luto?
familiares, amigos e colegas, contribui para o nosso próprio re- Tente compreender se está isolado ou se tem uma rede social
conhecimento enquanto indivíduos e para a nossa auto-estima. em quem pode confiar.
Além disso, faz parte da formação da nossa identidade contri-
buindo, ainda, para o nosso bem-estar, sentido de competência Se concluir que algo não está bem no seu mapa, procure pro-
e capacidade de adaptação às situações. mover mudanças qualitativas nas suas redes sociais. Pergunte
a si próprio: Será necessário aproximar-me de alguém? Posso
Todos nós conhecemos algumas pessoas que, por uma razão reatar amizades ou vínculos familiares antigos? O que tenho de
ou por outra, dedicaram-se quase exclusivamente ao seu per- fazer para por isso em marcha?
curso profissional, à família ou aos filhos, e, enredados nestas
tarefas, deixaram o tempo passar descuidando-se do investi- Procure aproximar-se das pessoas e invista em relações mais
mento ou aprofundamento da sua rede de relações, sobretudo duradouras que possam servir de amparo num momento difícil.
de amizade. O problema surge, quando, em momentos de difi- Não precisa ter muitos amigos, como às vezes acontece no fa-
culdade ou crise, estas pessoas não têm a quem recorrer por- cebook, basta serem verdadeiros.
que a sua rede social é reduzida. Os filhos cresceram, o marido/
mulher ocuparam-se com outras coisas, muitas vezes também
fruto da falta de investimento na relação a dois, e os amigos
distanciaram-se.

Para compreender a sua rede social, convidamo-lo a fazer um


exercício inspirado em Carlos Sluzki, um conhecido terapeuta
familiar que estudou a temática das redes sociais: Pense na
sua rede social (família, amigos, relações de trabalho e comu-
nidade), desde a relação mais próxima para a mais distante,
procure atender ao tipo de relação que mantêm com cada uma
das pessoas identificadas (profissional, amizade, amorosa). De
seguida, pegue numa folha de papel e desenhe três circunferên-
cias, umas no interior das outras: a mais interna representa as
relações íntimas (familiares com contato diário e amigos pró-
ximos); a intermédia representa as relações com menor grau
de intimidade (familiares menos próximos e relações sociais
ou profissionais sem intimidade); finalmente, o círculo externo
representa os familiares afastados, conhecidos, colegas de tra-
balho, vizinhos. Tente incluir as principais pessoas com quem
interage a maior parte do tempo.

Depois de pronto, observe o seu mapa em relação a alguns as-


pectos: número de pessoas incluídas na sua rede, relação entre
os elementos, distância geográfica entre si e as pessoas, que
tipo de apoio recebe dessas pessoas (emocional, ajuda funcio-
nal ou contacto sem qualquer envolvimento).

A partir daqui podem surgir muitas questões que o poderão


ajudar a compreender a sua rede: É suficiente? Tem qualidade?

Psiquilíbrios em revista 13
Destaques
Apresentação do livro: Como promover as
competências sociais e emocionais das crianças

Realizou-se no dia 9 de junho, na Faculdade de Psicologia e de


Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, a apresenta-
ção do livro intitulado “Como promover as competências sociais
e emocionais das crianças” apresentado pela Dra. Lúcia Santos,
vogal do Conselho de Administração da Fundação Bissaya Bar-
reto e responsável pela área de Educação de Infância na mesma
fundação.

As coordenadoras científicas da versão portuguesa do livro tam-


bém estiveram presentes, tal como a Dra. Vera Ramalho em re-
presentação do Psiquilibrios Edições.

14 Psiquilíbrios em revista
Psiquilíbrios

O Psiquilíbrios celebrou 20 anos de existência, mantendo, ao


longo destas duas décadas, um elevado padrão de qualidade.
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