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SUMÁRIO

Prefácio

Um – A Terceira Pessoa

Dois – O Doador da Vida

Três – O Advogado

Quatro – O Santificador

Cinco – Aquele que unge

Seis – O Iluminador
SINOPSE

Voltando aos Fundamentos sobre o Espírito Santo!


O assunto do Espírito Santo desperta muito interesse em nossos dias – e também
muita confusão. Muitos hoje buscam entender melhor a pessoa e obra do Espírito
Santo -e como ele opera no tempo e no espaço – mas essa busca deve ser pautada
por um sério exame das Escrituras.

Neste livro da série “Questões Cruciais”, o Dr. R. C. Sproul elimina as confusões


recorrendo à Bíblia. Ele estabelece o ensino bíblico sobre a identidade do Espírito
– ele é uma das pessoas da Trindade, junto do Pai e do Filho – e então ele passa
a tratar de algumas das importantes obras realizadas pelo Espírito, como a
regeneração, a santificação, o fortalecimento e consolo, o ensino e unção para o
ministério.
PREFÁCIO

Quando me tornei um cristão em setembro de 1957, eu me encontrei num


sério dilema. Eu estava noivo, e quando contei à minha noiva sobre minha
conversão, ela achou que eu havia enlouquecido. E como se não bastasse, eu
estava aprendendo ainda que não deveria me casar com uma descrente, e
comecei a me perguntar se algum dia poderia me casar com a mulher que eu
amava. Muitos meses se passaram, e nada desse dilema ser resolvido.
Finalmente, as férias da primavera se aproximavam. Minha noiva estava
na faculdade e planejava ir para casa em Pittsburgh, e eu a persuadi a passar
aonde eu estudava, assistir um estudo bíblico comigo no campus, e passar a noite
no dormitório feminino de lá. Sinceramente não me lembro de outra ocasião em
que orei tanto como aquela. No dia anterior à sua chegada, passei praticamente
o dia inteiro de joelhos, pedido a Deus que trabalhasse na vida dela. Concluí que
se ela não se tornasse cristã, teria que romper o noivado, por mais que eu não
quisesse isso.
Fomos ao estudo bíblico naquela noite e ela assistiu a tudo sem dizer uma
palavra. Depois, eu a acompanhei ao dormitório feminino, e ela permanecia em
silencio. Contudo, na manhã seguinte, quando fui encontrá-la, ela estava
diferente. Ela me contou que teve uma noite difícil porque algo tinha acontecido.
Ela acordou várias vezes durante a noite, beliscando a si mesma e perguntando,
“Eu ainda o tenho?” E a cada vez ela dizia “Sim, eu ainda o tenho” e voltava a
dormir. Ela se converteu a Cristo através do estudo da Escritura que fomos
naquela noite.
Uma de minhas mais claras memórias daquela manhã maravilhosa é o
momento quando entramos no meu carro. Enquanto me contava sua experiência,
ela me olhou com grande empolgação e disse “Agora eu sei quem é o Espírito
Santo.” É claro, ela frequentava a igreja a anos. Ela ouviu sobre o Espírito Santo
várias vezes e várias vezes ouviu a benção pronunciada em nome do Pai, do Filho
e do Espírito Santo. Mas agora, pela primeira vez, ela entendeu sobre que o
Espírito realmente é.
Aquela frase da minha noiva, que hoje é minha esposa, foi muito
significante. Perceba que ela disse “Agora eu sei quem é o Espírito Santo” e não
“Agora eu sei o que é o Espírito Santo”. Em sua conversão, ela transitou de um
entendimento abstrato do Cristianismo para um relacionamento pessoal com
Deus. E uma das primeiras verdades que ela captou foi que o Espírito Santo é
uma pessoa, e não uma coisa.
É extremamente importante que os cristãos saibam quem é o Espírito
Santo e sobre Seu papel vital em nossas vidas. Foi por isso que escrevi este livreto.
Claro, o ensino bíblico sobre o Espírito Santo é extenso demais para ser
completamente exposto num único volume. Meu propósito nesse livreto é
simplesmente fornecer a resposta mais básica à questão “Quem é o Espírito
Santo” e mencionar brevemente algumas das funções mais importantes que Ele
opera nas vidas dos crentes. Para um ensino mais completo, eu lhe encorajo a ler
meu livro O MISTÉRIO DO ESPÍRITO SANTO.
Oro para que este pequeno tratado sobre o Espírito te motive, atraia e
direcione a um relacionamento mais profundo com o Deus que você ama e serve,
o Pai, Filho, e Espírito Santo.
CAPÍTULO 1
A TERCEIRA PESSOA

Como cristãos, adotamos uma formula histórica a respeito de Deus.


Dizemos: “Deus é um em essência, e três em pessoa”. Em outras palavras, Deus
é trino. Ele é uma trindade. Isto significa que há três pessoas na Divindade. Estas
pessoas são entendidas na teologia como distintas. As diferenças entre os três – o
Pai, o Filho e o Espírito Santo – são diferenças reais, não são diferenças de
essência. Em outras palavras, há uma única essência na Divindade, e não três.
Em nossa experiencia como seres humanos, cada pessoa que conhecemos é um
ser separado. Uma pessoa significa um ser, e vice-versa. Mas, na Divindade, há
um ser em três pessoas. Temos de manter esta distinção para não cairmos numa
forma de politeísmo, vendo as três pessoas da Divindade como três seres, que
são três deuses separados.
Nenhum de nós pode sondar exaustivamente as profundezas da Trindade,
mas podemos dar alguns passos para entende-la melhor. As palavras existência
e subsistência podem nos ajudar nisto.

EXISTÊNCIA E SUBSISTÊNCIA

Uma das brincadeiras que eu gostava de fazer com meus alunos de seminário era
perguntar-lhes: Deus existe? Eles respondiam: “É claro que Deus existe”. Então,
eu dizia: não, Deus não existe. E sempre era divertido ver a feição de horror que
aparecia no rosto deles, quando começavam a se perguntar se o seu professor
havia abandonado o cristianismo e renunciado a sua fé. Mas logo eu tinha
misericórdia deles e explicava que estava fazendo uma pequena brincadeira
filosófica, ao afirmar que Deus não existe.
A palavra existir vem do latim existere, que significa “estar fora de”.
Portanto, a palavra existir significa, literalmente, “estar fora de”. A pergunta
óbvia é: do que um ser existente está fora?
A ideia de existência tem suas raízes na filosofia antiga, quando os
filósofos se preocupavam muito com a questão do ser. Nós também nos
preocupamos com esta questão. De fato, quando fazemos a distinção entre Deus
e nós mesmos, nós o identificamos como o Ser Supremo, e a nós mesmo, como
seres humanos. Entretanto, essa distinção é, de certo modo, enganadora. Ambas
as descrições usam a palavra ser; por isso, buscamos adjetivos qualificadores para
estabelecer a diferença entre Deus e nós mesmos: ele é Supremo, e nós somos
humanos. Na realidade, a grande diferença entre Deus e o homem é o próprio
ser. Deus é um ser puro, um ser que tem sua vida em e por si mesmo,
eternamente. Um ser humano é uma criatura, um ser cuja própria existência
depende, de momento a momento, do poder do Ser Supremo. O ser de Deus não
depende de nada, nem se deriva de nada. Ele tem o poder de ser em e por si
mesmo.
Quando os filósofos antigos falavam sobre existência, usando a palavra
latina que significa “estar fora de”, pretendiam dizer que existir significa estar
fora do ser. O que isso significa? Imagine dois círculos que não se sobrepõem. O
primeiro circulo é “ser”, e o segundo é “não ser”, um termo requintado que
corresponde a “nada”. Agora imagine um boneco palito entre os dois círculos,
com seus braços estendidos. Um braço se estende e penetra o circulo intitulado
“ser”, e o outro braço chega até dentro do círculo intitulado “não ser”. Isto é uma
figura da humanidade. Participamos do ser, mas, ao mesmo tempo, estamos
sempre a um passo da aniquilação. A única maneira de podermos continuar
existindo é mantermos nossa conexão com o circulo intitulado “ser”, porque esse
circulo representa Aquele em quem, como o apóstolo Paulo disse, “vivemos, e
nos movemos, e existimos” (At 17:28) – ou seja, Deus. Mas, embora participemos
desse ser e sejamos sustentados por ele, estamos apenas a um passo do não ser.
Nosso boneco palito imaginário é uma ilustração do que os filósofos
tinham em mente, quando falavam sobre “estar fora” do ser. Podemos dizer que
os humanos estão num estado de “tornar-se”. Passamos por mudança. O que
somos hoje é diferente do que éramos ontem e do que seremos amanhã, se, ao
passarmos de um dia para outro, envelhecemos 24 horas. É esta faceta do ser
humano, a mudança, que define existência. Mudança, geração, decadência,
crescimento e envelhecimento são todas características de nossas vidas. Deus,
porém, é eternamente constante. Ele é o mesmo ontem, hoje e sempre.
Em resumo, quando os filósofos falavam em existência, estavam definindo
o que significa ser uma criatura. Portanto, quando fiz a brincadeira com meus
alunos de seminário, quando afirmei que Deus não existe, não pretendia dizer
que não há Deus. Queria dizer apenas que Deus não é uma criatura. Ele não está
preso a espaço e tempo, sujeito a mudança, geração ou decadência. Deus é
sempre e eternamente o que ele é. Deus é o “EU SOU”.
Quando falamos sobre as pessoas da Divindade, não usamos tipicamente
a palavra existência, usamos a palavra subsistência. Qual é a diferença entre
estas palavras? Usamos a palavra subsistência em nosso vocabulário, quando
falamos sobre alguém que vive na pobreza. Falamos sobre uma renda de
subsistência, que é um salário deficiente, ou uma dieta de subsistência, que provê
somente os nutrientes básicos. Observe, porém, que esta palavra inclui o prefixo
sub, que significa “sob”. Portanto, subsistência é existência que está sob alguma
outra coisa. Esta ideia está implícita no conceito da Trindade. Deus é um ser com
três subsistências, com três pessoas distintas. Elas subsistem dentro do ser de
Deus.
A NATUREZA PESSOAL DO ESPÍRITO

O fato de que o Espírito Santo é uma pessoa pode ser visto de muitas maneiras
na Escrita. Uma das evidências básicas é que a Bíblia usa pronomes pessoais,
repetida e consistente, para se referir ao Espírito Santo. Ele é referido
frequentemente com o pronome masculino “ele”. Além disso, o Espírito Santo
faz coisas que associamos com personalidade. Ele ensina, inspira, guia, conduz,
se entristece, nos converte de pecado e outras coisas mais. Objetos impessoais
não se comportam desta maneira. Somente uma pessoa pode fazer estas coisas.
Mas o Espírito Santo é visto, na Escritura, não apenas como uma pessoa,
mas também como plenamente divino. Vemos isto numa história interessante do
livro de Atos dos Apóstolos:

Entretanto, certo homem, chamado Ananias, com sua mulher Safira, vendeu
uma propriedade, mas, em acordo com sua mulher, reteve parte do preço e,
levando o restante, depositou-o aos pés dos apóstolos. Então, disse Pedro:
Ananias, por que encheu Satanás teu coração, para que mentisses ao Espírito
Santo, reservando parte do valor do campo? Conservando-o, porventura,
não seria teu? E, vendido, não estaria em teu poder? Como, pois, assentaste
no coração este desígnio? Não mentiste aos homens, mas a Deus.
(At 5:1-4 ARA)

O pecado de Ananias e Safira foi que eles fingiram que sua doação à igreja
era maior do que realmente era. Mentiram sobre a natureza da dádiva que
estavam ofertando para Deus. Acho que Pedro se preocupou mais com o estado
da alma deles do que com a quantia de dinheiro que contribuíram. Observe,
porém, as palavras de repreensão que Pedro dirigiu a Ananias e Safira. Ele
começou perguntando: “Ananias, por que encheu Satanás teu coração, para que
mentisses ao Espírito Santo?” Mas concluiu dizendo: “Não mentiste aos homens,
mas a Deus”. Portanto, a mentira que Ananias falou ao Espírito Santo, ele falou
realmente a Deus. A implicação clara é que o Espírito Santo é Deus.

ATRIBUTOS E OBRA DE DEUS

Além disso, o Novo Testamento descreve, muitas vezes, o Espírito Santo como
possuindo atributos que são claramente divinos. Por exemplo, o Espírito Santo é
eterno (Hb 9:14) e onisciente (1 Co 2:10-11). Estes são, ambos, atributos de Deus.
Além disso, são atributos incomunicáveis de Deus, atributos de Deus que não
podem ser compartilhados pelos homens.
Vemos, na Escritura, que o Espírito participa das obras trinitárias de
criação e redenção. Gênesis 1, mostra que o Pai ordenou que o mundo viesse à
existência. O Novo Testamento nos diz que o agente por meio do qual o Pai
trouxe o universo à existência foi o Logos, a segunda pessoa da Trindade, nosso
Senhor Jesus Cristo. “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e, sem ele,
nada do que foi feito se fez” (Jo 1:3). No entanto, o Espírito estava envolvido na
criação: “O Espírito de Deus pairava por sobre as águas” (Gn 1:2). Por meio da
obra energizadora da parte do Espírito, a vida foi trazida à existência.
E, muito especialmente, a redenção é uma obra trinitária. O Pai enviou o
Filho ao mundo (1 Jo 4:14). O Filho realizou toda a obra que era necessária para
a nossa salvação – vivendo uma vida de obediência perfeita, e morrendo para
fazer uma santificação perfeita (Fp 3:9; 1 Co 15:3). Mas nenhuma destas coisas
nos será benéfica, se não nos for aplicada de maneira pessoal. Por conseguinte, o
Pai e o Filho enviam o Espírito Santo ao mundo para aplicar a salvação a nós (Jo
15:26; Gl 4:6). No Novo Testamento, o papel do Espírito Santo é principal e
fundamentalmente, aplicar a obra de Cristo aos crentes.
Você sabe quem é o Espírito Santo? Entende o Espírito Santo, em termos
de um relacionamento pessoal? Ou o Espírito Santo continua sendo, para você,
um conceito vago, obscuro e abstrato ou uma força ilusória e amorfa? Forças são,
em si e por si mesma, impessoais. Mas o Espírito Santo não é uma força abstrata.
Ele é uma pessoa, que capacita o povo de Deus para viver a vida cristã. Nos
capítulos seguintes, consideraremos algumas das maneiras como o Espírito Santo
realiza esta missão.
CAPÍTULO 2
O DOADOR DA VIDA

Durante a campanha para Presidência dos Estados Unidos de 1976, Jimmy


Carter, em seu discurso, falou sobre ter “nascido de novo”. Mais ou menos no
mesmo período, Charles Colson, que havia sido conselheiro do Presidente Nixon,
lançou um livro sobre sua conversão a Cristo. O titulo era simplesmente Nascido
de Novo. De repente, esse termo que só era comum no meio evangélico se tornou
conhecido nacionalmente.
Desde então, o termo “nascer de novo” tem sido adotado para vários tipos
de usos que nada tem a ver com a conversão espiritual que Carter e Colson
tinham em mente. Por exemplo, um atleta que experimenta uma reviravolta em
sua carreira pode dizer que “nasceu de novo” com respeito às suas habilidades.
Num senso, o verdadeiro sentido deste termo tem sido obscurecido por seu
frequente uso e desuso.
A ideia de nascer de novo, de experimentar um renascimento espiritual, vem
diretamente dos ensinos de Jesus. Achamos esse ensinamento no capítulo 3 do
Evangelho de João, onde João recorda um encontro entre Jesus e um líder judeu
chamado Nicodemus.
João escreve: Havia, entre os fariseus, um homem chamado Nicodemos, um
dos principais dos judeus. Este, de noite, foi ter com Jesus e lhe disse: Rabi,
sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes
sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele” (versos 1-2). Nicodemos foi a
Jesus à noite, aparentemente porque não queria ser visto com Ele, mas ele foi com
adulação chamando Jesus de “Mestre vindo da parte de Deus”. Contudo, Jesus
lhe deu um corte seco e disse “Em verdade, em verdade te digo que, se alguém
não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus” (verso 3). Jesus disse que um
renascimento era uma condição necessária para entrar no reino de Deus. É o sine
qua non. Se você não é regenerado, não pode entrar no reino de Deus.
Me angustia um pouco ouvir alguém dizer, “Eu sou um cristão nascido de
novo.” O que há de errado com essa fala? Bem, por acaso existe algum que não
seja? Se renascer é absolutamente essencial para se entrar no reino de Deus, como
Jesus disse, não é possível que exista um cristão não-nascido de novo. Dizer
“Cristão nascido de novo” é o mesmo que dizer “Cristão cristão”. É uma
redundância.
Por outro lado, é possível ser um “nascido de novo não-cristão”? Já ouvi
pessoas dizerem, “Sou um muçulmano nascido de novo” ou “Sou um budista
nascido de novo.” Um dia quero dizer-lhes que, se eles são nascidos de novo no
sentido do Novo Testamento, então eles não são mais muçulmanos ou budistas.
Os únicos que são nascidos de novo são cristãos.

DA MORTE ESPIRITUAL PARA A VIDA

É muito importante termos uma compreensão precisa do entendimento da obra


do Espírito Santo no renascimento espiritual. Uma das melhores referências de
onde podemos adquirir entendimento é do capítulo 2 da carta de Paulo aos
Efésios. Lá nós lemos:

Ele vos deu vida, estando vos mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais
andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da
potestade do ar, do espirito que agora atua nos filhos da desobediência; entre os
quais também todos nós andamos outrora, segundo às inclinações da nossa
carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos, por natureza,
filhos da ira, como também os demais. Mas Deus, sendo rico em misericórdia,
por causa do grande amor com que nos amou, e estando nos mortos em nossos
delitos , nos deu vida juntamente com Cristo – pela graça sois salvos, e,
juntamente com ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais
em Cristo jesus (versos 1-6 ARA)

A linguagem e retórica usadas pelo apóstolo tem a ver com a vida e a


morte. Ele declara que cristãos “receberam vida”. Mas se agora estão vivos, como
estavam anteriormente? Estavam “mortos em delitos e pecados.” Então, Paulo
está falando de algum tipo de ressurreição, uma transformação de pessoas
mortas em vivas.
Precisamos entender a que tipo de morte Paulo fala aqui. Paulo não falou
de uma ressurreição física porque não se referiu a uma morte física. Aqueles que
receberam vida pelo Espírito Santo, já eram seres biológicos que andavam e
respiravam. Antes de eu me tornar cristão, eu já tinha vida biologicamente – meu
coração batia, meus pulmões se enchiam de ar, e meu cérebro estava são (embora
meus professores às vezes questionavam isso). Mas espiritualmente, eu estava
morto. Estava morto para as coisas de Deus porque eu vivia somente e
completamente no que Jesus e os apóstolos chamam de “na carne.”
Em Sua conversa com Nicodemos, depois de lhe explicar que ninguém
entra no reino de Deus sem ter nascido da água e do Espírito, Jesus disse: “O que
é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te admires
de eu te dizer: importa-vos nascer de novo. O vento sopra onde quer, ouves a sua
voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido
no Espírito” (Jo 3:6-8).
Aqui Jesus distingue entre o poder do Espírito Santo e o poder da carne
humana. Ele disse, “O que é nascido da carne é carne.” Ele estava falando de
pessoas, e não apenas que seres humanos nasciam com corpos físicos, mas
nasciam caídos. Significa que lhes faltava vida espiritual. Ou seja, eram
espiritualmente mortos.
Talvez não haja nada mais repugnante ao homem moderno, do que essa
afirmação de que todo ser humano é nascido num estado espiritual de morte.
Essa ideia é repugnante até para grande parte dos cristãos. A maioria dos cristãos
professos reconhecem que há defeitos na raça humana, que todos somos
pecadores e que nenhum de nós é perfeito. Mas nem um cristão em cada cem
realmente acredita que cada ser humano é espiritualmente morto no momento
que ele ou ela chegam ao mundo. Até mesmo Billy Graham costumava falar sobre
o homem natural sendo mortalmente doente, ao ponto de dizer que ele mesmo
estava 99 por cento morto, mas não chegaria a 100 por cento. É tão sutil a rejeição
a essa ideia, que alguns dos maiores lideres do cristianismo estão dispostos a
contradizê-la. Eles não aceitam a ideia de total morte espiritual.
Mas, Paulo diz exatamente o oposto. Chegamos ao mundo em morte
espiritual – não apenas fracos, doentes ou em coma. Chegamos mortos: o coração
espiritual está morto, os pulmões espirituais estão mortos, o cérebro espiritual
está morto, e assim permaneceremos – a menos que o Espírito Santo nos torne
vivos.

SEGUINDO UM CURSO E UM PRÍNCIPE

Paulo diz aos Efésios, “Vocês estavam mortos em delitos e pecados, seguindo o
curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar” (2:1). Ele se endereçou
aos cristãos, mas todos os cristãos em certo ponto de suas vidas são não-cristãos,
e todos os não-cristãos manifestam um padrão de comportamento. Paulo diz que
todos aqueles mortos espiritualmente seguem um curso e um príncipe.
Em Romanos 3, Paulo escreve: “Não há justo, nem um sequer, não há quem
entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram
inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer” (versos 10b-12). Ele diz
que todos se “extraviaram”, se desviaram do caminho. Se por natureza nós não
buscamos a Deus, é de surpreender que nos afastemos do caminho para Deus? É
fascinante para mim que no Novo Testamento, os seguidores de Cristo não se
referem a si mesmos como “cristãos”. A primeira vez em que foram chamados
de cristão foi em Antioquia (At 11:26), mas acredita-se que o termo foi criado por
não-cristãos para zombar deles. A palavra ou frase que os cristãos usavam para
se descreverem inicialmente era como pessoas “do Caminho” (At 19:9, 23),
porque eles ouviram que Cristo falava sobre dois caminhos, um estreito e outro
largo (Mt 7:13-14). A grande maioria das pessoas está trilhando o caminho
errado. De fato, todos nós começamos no caminho errado, pois o caminho largo
é o curso deste mundo. Paulo diz, “também todos nós andamos outrora” (veja
Efésios 2:3). Ser espiritualmente morto é ser mundano. É adotar e seguir
servilmente os valores e costumes da cultura secular.
Os mortos espiritualmente não somente seguem o curso deste mundo, eles
seguem “o príncipe da potestade do ar” (verso 2). Alguma dúvida sobre a quem
Paulo se refere aqui? Esse é um titulo dado por Paulo a Satanás, “o espirito que
agora atua nos filhos da desobediência” (verso 2). Todos aqueles que são
espiritualmente mortos seguem as vontades de Satanás em rejeitar a Deus e Seus
justos caminhos.
Esse, então, é nosso estado natural. Esse é o cenário que a teologia chama
de pecado original, o estado de corrupção mortal, de morte espiritual, em que
todos nós nascemos.

UMA OBRA DE RE-CRIAÇÃO

O ministério e obra do Espírito Santo é ir até aqueles que estão mortos


espiritualmente, que estão andando segundo o curso deste mundo e segundo o
príncipe da potestade do ar, satisfazendo os desejos da carne e da mente, e recriá-
los através da Regeneração.
Regeneração é uma obra que o Espírito Santo faz diretamente na alma das
pessoas. Quando digo “imediatamente”, não significa “rapidamente”, mas “sem
a necessidade de intervenção alguma.” Ele aplica uma medicação regular; o
Espírito faz brotar vida espiritual de onde havia morte. Vemos essa obra imediata
expressada nas palavras que o anjo Gabriel disse à Maria: “Descerá sobre ti o
Espírito Santo, e o poder do Altíssimo te envolverá” (Lc 1:35). Nesse prisma, a
vida de Jesus foi gerada imediatamente e diretamente, não envolvendo um
processo reprodutivo normal.
Nesse sentido, vemos uma espécie de recapitulação na redenção do poder
do Espírito Santo manifesto na criação. O mesmo Deus que criou o mundo,
redime o mundo. A obra da criação foi Trinitária assim como a obra da redenção
é Trinitária. Isso é claro em Gênesis 1, onde lemos: “No princípio, criou Deus os
céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a face
do abismo” (Gn 1-2a). Estes são as primeiras frases da sagrada Escritura.
Imediatamente depois desses versos, lemos uma breve descrição da ação de Deus
em meio a essas trevas, essa terra sem forma e vazia: “E o Espírito de Deus
pairava por sobre a águas” (verso 2b). O Espírito Santo é mostrado no Novo
Testamento em forma de pomba; aqui Ele possivelmente está sendo mostrado
como se fosse uma mãe-pássaro pairando sobre seus filhotes para protege-los.
Jesus quis dizer algo nesse sentido quando Ele lamenta sobre Jerusalém e diz:
Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram
enviados! Quantas vezes quis eu reunir teus filhos como a galinha ajunta os do
seu próprio ninho debaixo das asas, e vós não quisestes!” (Lc 13:34). O Espírito
pairou sobre a criação para guia-la e protege-la, e assim o faz na obra de
regeneração.
A Bíblia deixa claro que uma das coisas que Deus e apenas Ele pode fazer
é trazer vida da morte e criar algo do nada. Em seguida ao relato do Espírito
pairando, Deus cria a luz: “Disse Deus: Haja luz; e houve luz” (Gn 1:3). Deus não
precisou ligar um interruptor ou esfregar os pauzinhos para acender uma faísca
e criar a luz. Seu comando soberano criou a luz. Da mesma forma, Seu divino
poder traz vida onde não há vida.
Jesus certa vez, ficou de frente à tumba de Lázaro, que estava morto fazia
quatro dias, e exclamou em alta voz: “Lázaro, vem para fora!” (Jo 11:43). Ao dizer
estas palavras, o coração de Lázaro voltou a bater e bombear sangue. O cérebro
foi novamente ativado. A vida retornou ao corpo, e ele saiu daquela tumba. É
exatamente o que nos acontece em nosso renascimento. O mesmo Espírito que
criou vida em meio ao abismo em Gênesis e trouxe Lázaro de volta da sepultura,
nos ergue da morte espiritual ao nos fazer nascer uma segunda vez.
CAPÍTULO 3
O ADVOGADO

No século 19, dois filósofos na Europa causaram um grande impacto em


sua cultura e na história. Ambos sabiam muito bem da corrupção que assolava a
civilização ocidental. Ambos descrevem aquele século na Europa como sendo
decadente. Mas cada um deles viu diferentes razões para essa decadência e
propuseram soluções bem diferentes um do outro.
Um deles foi Søren Kierkegaard (1813-55), um filosofo dinamarquês. Ele
argumentou que a razão para a decadência da civilização de sua época foi que
houve um fracasso em aplicar o cristianismo de maneira vital à vida cotidiana.
Ele acreditava que o cristianismo havia claramente se tornado uma ortodoxia
morta, desvalorizada e removida dos assuntos diários. Segundo ele, sua era havia
se tornado vil, miserável, desprezível. Por isso, ele ansiava pelo retorno da paixão
à vida cristã. Quando chegou o momento em que se sentiu desencorajado sobre
o assunto, ele começou a vasculhar o Antigo Testamento, pois lá ele encontrou
pessoas que pareciam mais reais. Santos e pecadores, cujos quais não havia
nenhuma falsidade, nenhum embuste, nem nada artificial a respeito deles. Deus
realmente havia trabalhado em suas vidas, e eles, em resposta, eram apaixonados
por Ele.
Um professor certa vez me perguntou, “Como você avalia a força da igreja
nos nossos dias?” Eu respondi que havia se tornado muito claro para mim que
muitas pessoas na igreja tem uma fé vibrante, creem nas doutrinas centras da
Escritura, e etc., mas que poucos deles vêem a fé cristã como sendo uma missão,
como sendo algo enraizado em suas vidas, que era exatamente o que Kierkegaard
ansiava em ver.
O outro filósofo que declarou a morte da civilização foi Friedrich
Nietzsche (1844-1900), um alemão. Contudo, Nietzsche acreditava que o grande
problema da civilização ocidental era a maligna influência do cristianismo. Ele
estava convencido de que a ética do cristianismo, com suas virtudes de mansidão
e bondade, havia castrado e afeminado a raça humana. Ele sentia que o
cristianismo negava a mais básica paixão humana – o poder. A vida, segundo
Nietzsche, era uma guerra por poder. Todos nós estamos engajados num
empreendimento competitivo – a vida - buscando dominar sobre outros.
Então, Nietzsche falava sobre um novo tipo de civilização que surgiria
através de uma nova classe de seres humanos, um novo tipo de herói existencial,
que ele chamava de Übermensch, o “super-homem.” Ele descrevia o super-
homem como um ser que ergueria sua casa nas encostas do Monte Vesúvio. E,
deveria erguer seu lar em um lugar onde poderia ser destruído a qualquer
momento, se o vulcão entrasse em erupção. Igualmente, ele velejaria por mares
desconhecidos. Ele poderia enfrentar monstros marinhos ou tempestades que
virariam seu barco e o matariam nessas viagens, mas isso não seria problema
para o super-homem.
De acordo com o conceito de Nietzsche, o super-homem é principalmente
um conquistador e sua principal virtude é a coragem, pois Nietzsche acreditava
que a coragem era o fator mais ausente da cultura do século 19. Mas quando
Nietzsche falou sobre coragem, ele foi muito estranho. Ele falava de uma
“coragem dialética”. Na filosofia, a palavra dialética tem a ver com um estado
de contradição, em que algo serve de antítese a alguma coisa. Ou seja, coisas que
nunca podem chegar a uma solução. O que é então, coragem dialética? Nietzsche
chegou a conclusão de que a vida é niilista ou sem significado. Ele acreditava que
Deus estava morto, e já que não havia Deus, não existiam coisas como verdade
absoluta nem bondade. Não há nenhum significado objetivo para a existência
humana; apenas o significado que conseguimos dar. Portanto, devemos
manifestar coragem num mundo que é mais indiferente do que hostil, e essa é a
atividade de um super-homem. Isso é coragem dialética – coragem em face à
indiferença do universo. Nietzsche estava dizendo, em essência: “A vida não tem
sentido; então, seja corajoso. Sua coragem é sem sentido, mas tenha mesmo
assim”.

“OUTRO AJUDADOR”

O que Kierkegaard e Nietzsche tem a ver com a obra do Espírito Santo? Na noite
antes de Sua crucificação, Jesus fez a Seus discípulos promessas importantes
sobre o Espírito. Ele lhes disse que Ele estava para partir e que eles não poderiam
segui-Lo, mas Ele prometeu “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Ajudador,
a fim de que esteja para sempre convosco” (Jo 14:16). Alguns tradutores usam a
palavra “Consolador” em vez de “Ajudador”. A palavra grega que é traduzida
como “Ajudador” ou “Consolador” é parakletos; é de onde vem a palavra em
português paracleto. Essa palavra possui o prefixo para-, que significa “ao lado”,
e uma raiz que é uma variação do verbo kletos, que significa “Aquele que é
chamado”. Então, um parakletos era alguém que era convocado para estar ao lado
de outra pessoa. É normalmente aplicado a um advogado, mas não a qualquer
advogado. Tecnicamente, o parakletos era o advogado da família que era um
retentor permanente. Sempre que surgia um problema na família, o parakletos era
chamado e deveria prestar assistência durante o período de crise. É assim que
funciona em nosso relacionamento com o Espírito Santo. Somos parte da família
de Deus, e o juiz da família é o próprio Espírito Santo. Ele está sempre presente
para estar ao nosso lado e nos ajudar em momentos de crise.
Eu creio que a maior parte das traduções do Novo Testamento em inglês
para parakletos, o fizeram pobremente, especialmente os que usaram a palavra
“consolador”. Essa tradução foge do sentido principal. Quando Jesus disse que
Ele pediria ao Pai para enviar aos discípulos outro Paracleto, Ele não falava de
Alguém que viria para curar suas feridas quando estivessem feridos. Claro, uma
das principais atividades do Espírito Santo é consolar os corações feridos; Ele é
um bálsamo de Gileade quando estamos em meio ao lamento e pesar. Mas
devemos nos lembrar do contexto em que Jesus prometeu enviar o Espírito – Ele
estava dizendo aos discípulos que Ele estava para deixá-los. Eles estavam para
seguir em frente sem Ele num mundo hostil, onde seriam odiados como Ele foi
odiado. Cada momento de suas vidas seria cheio de pressão, hostilidade e
perseguição da parte do mundo. Ninguém quer estar em um cenário desses sem
poder contar com alguma ajuda.
Os tradutores da Versão King James escolheram unir parakletos com a
palavra “Consolador” porque naquele tempo a língua inglesa era mais
intimamente conectada com suas raízes históricas do latim. Hoje, entendemos a
palavra conforto como sendo um alivio em meio aos problemas. Mas o sentido
original é outro. É derivado da palavra em latim comfortis, que consiste do prefixo
com-, que significa “com”) e uma raiz fortis, que significa “forte”. Então o sentido
é “com força” no original. Portanto, o Espírito Santo vem ao povo de Cristo não
para curar suas feridas após uma batalha, mas para fortalecê-los antes e durante
uma batalha. A ideia é que a igreja opera nem tanto como um hospital, mas como
um exército, e o Espírito vem para dar-lhes poder e força, para garantir a vitória
e conquista.

“MAIS QUE VENCEDORES”

Então, Nietzsche disse “A vida não tem sentido, mas tenha coragem assim
mesmo.” Jesus também convocou Seu povo a ser corajoso diante das
dificuldades, adversidades e hostilidade, mas Ele não os chamou a uma coragem
infundada. Como sabemos, Jesus disse “tende bom ânimo” (Jo 16:33). Contudo,
Ele não lhes pediu isso apenas por pedir. Ele deu a eles uma razão para se
manterem firmes e convictos na caminhada cristã. Ele disse “Eu venci o mundo.”
Nietzsche ansiava por um super-homem, um conquistador. Ele deveria ter
olhado para Cristo. Ele venceu o mundo, e Ele o fez no poder do mesmo Espírito
que Ele enviou ao Seu povo. O Espírito Santo veio para fortalecer e conceder
poder ao povo de Deus. Como resultado, as Escrituras dizem, “Somos mais que
vencedores, por meio daquele que nos amou” (Rm 8:37). Isso é um passo além das
ideias de Nietzsche.
A obra do Espírito Santo complementa a obra de Cristo. Cristo foi o
primeiro Paracleto, que veio para nos fortalecer por meio de Sua morte. Agora, o
poder para vivermos a vida que Cristo nos chama para viver vem do Espírito
Santo.
CAPÍTULO 4
O SANTIFICADOR

Você já se perguntou o motivo de o Espírito Santo ter esse nome, “Espírito


Santo”? Ele é santo, claro, mas Deus o Pai é também conhecido por Sua santidade
imaculada, e esta santidade é um atributo de Deus o Filho também. Não há um
porquê de o Espírito Santo possuir uma santidade em maior grau ou quantidade
do que os outros membros da Trindade, portanto, não é Sua superabundante
santidade que nos leva a chama-lo de Espírito Santo. Da mesma forma, o Espírito
ainda é espírito, Deus o Pai também é espírito e Deus o Filho é espírito em Seu
ser, como o Logos, a segunda pessoa da Trindade. Então, também não é o fato de
Ele ser um espírito que nos leva a chama-lo Espírito Santo.
Há algumas razões do porquê o chamamos de Espírito Santo. A primeira
razão é devida à obra particular que Ele desempenha em nossa redenção. Dentre
as pessoas da Trindade, o Espírito é o principal que trabalha para nossa
santificação, tornando o processo possível para que nos tornemos à imagem de
Cristo.
Alguns cristãos as vezes me perguntam “Qual a vontade de Deus para
minha vida?” Eles vêm com toda sorte de questões sobre porquê devem se casar,
que carreira devem buscar, dentre várias outras questões. Mas a Bíblia é muito
clara sobre a principal vontade de Deus para nossas vidas. O apóstolo Paulo
escreve “Essa é a vontade de Deus, a vossa santificação” (1 Ts 4:3a). Em alguns
momentos, ouço cristãos dizendo que foram guiados pelo Espírito a fazer algo.
Às vezes, o Espírito guia seu povo para destinos específicos, ou tarefas
específicas, mas a principal direção que Ele nos dá é rumo a santificação. Apenas
através de Seu poder em nós, é que podemos crescer em santidade. Devemos ser
muito cuidadosos e sempre irmos para a Bíblia e buscar sobre a vontade de Deus
e direção do Espírito, do que apenas ouvir ensinamentos da cultura cristã em que
vivemos. Então, a principal razão do Espírito Santo ter esse nome, é devido à sua
principal tarefa ser habilitar os seguidores de Cristo na busca pela santificação.
A segunda razão é porque existe mais de um tipo de espírito. As Escrituras
fazem uma distinção entre o espírito do homem e o Espírito de Deus. Mas mais
importante, a Bíblia fala de espíritos malignos, que não provém de Deus, que são
demoníacos e buscam impedir o progresso do cristão em sua busca pela
santificação. A diferença chave entre esses espíritos malignos e o Espírito Santo
é precisamente a questão da santidade. Espíritos malignos são profanos, ao
contrário do Espírito Santo. Devido à essa distinção, o apóstolo João nos alerta
“Amados, não deis credito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se
procedem de Deus” (1 Jo 4:1a).
JUSTIFICANDO NOSSO PECADO

Eu enfatizei esses dois pontos pelo seguinte: No meio cristão, muitos de


nós são mestres em inventar justificativas para seus pecados, e fazem isso
principalmente dizendo que foram guiados pelo Espírito a fazer isto e aquilo.
Não é o tipo de problema que vejo a cada 10 anos, mas com bastante frequência.
No mínimo uma vez por semana eu converso com um cristão professo que me
diz que ele ou ela está se divorciando sem nenhum respaldo bíblico, ou se
casando com alguém oposto às qualificações bíblicas para o casamento, ou
administrando um negócio seguindo a princípios não-bíblicos. E fazem isso e
aquilo e me dizem que se sentem livres para fazê-lo porque “eu orei sobre o
assunto e Deus me deu paz” ou “o Espírito Santo me direcionou a isso.”
Quando ouço esse tipo de justificativa para comportamentos
pecaminosos, percebo que elas realmente acreditam no que estão dizendo,
embora seja mentira. Estão falando baseadas em erro – um erro seríssimo. Sei
disso por dois motivos, e tais motivos estão fundamentados em duas designações
cruciais sobre o caráter do Espírito de Deus. O primeiro motivo é que Ele é o
Espírito Santo e o segundo é que Jesus repetidamente o chama de “Espírito da
verdade” (Jo 14:17; 15:26; 16:13). O Espírito Santo jamais nos leva a fazer algo que
não seja santo. Muito menos nos inclina a abraçar uma mentira.
Nos referimos à Bíblia como Palavra de Deus, e ela o é. A igreja tem
confessado sua fé de que as Escrituras são a Palavra de Deus, porque suas
palavras foram inspiradas pelo Espírito, entre outros motivos. A Bíblia nos ensina
que o Espírito Santo não apenas inspirou os livros bíblicos, Ele trabalha para
iluminar as Escrituras e aplica-las a nosso entendimento. Paulo escreve “Deus
não é Deus de confusão” (1 Cor 14:33ª), e isso inclui o Espírito Santo. Quer dizer
que Ele jamais nos ensina a fazer algo que Ele explicitamente proibiu nas
Escrituras.
Portanto, quando a Bíblia diz que devemos testar se os espíritos são de
Deus, como fazer tal coisa? Que tipo de teste devemos aplicar? Obviamente deve
ser um teste bíblico, porque nas Escrituras aprendemos com o Espírito da
verdade.
Assim sendo, se em algum momento eu tiver uma inclinação interna, um
palpite, ou um desejo e quiser associar isso ao Espírito Santo, mas ao mesmo
tempo vejo que essa inclinação em meu coração é claramente oposta ao que é
ensinado na Escritura, então a verdade é que estou confundindo luxúria, cobiça
ou algum sentimento com a direção do Espírito Santo. E isso é algo pavoroso,
sinistro de se fazer.
Nós quase não ouvimos falar desse assunto no meio cristão nos nossos
dias, porque os cristãos de hoje facilmente podem parecer espirituais ao dizerem
“Deus pôs isso ou aquilo em meu coração” ou “Deus me guiou para cá ou para
lá”. Toda vez que ouço tais coisas, quero dizer à pessoa: “Como você sabe que foi
Deus quem pôs isto em seu coração? Como sabe que isso não é uma manifestação
de sua própria ambição ou avareza?” Quero que a pessoa me mostre a base
bíblica para suas afirmações. Como eu disse antes, não duvido que o Espírito
Sano possa colocar um fardo sobre um crente e guia-lo de forma sobrenatural,
mas Ele sempre o fará com e através das Escrituras. Ele jamais irá contra Sua
própria revelação na Bíblia. Então, testemos os espíritos usando a verdade do
Espírito.

HOSTILIDADE À DOUTRINA

Parte do nosso crescimento em santificação é o crescimento no


entendimento das coisas de Deus. Infelizmente, existe um movimento que parece
se espalhar no meio cristão que me causa sérias preocupações. Percebi que existe
uma sutil indiferença e até certa hostilidade ao estudo das doutrinas ou da
teologia. Já ouvi dizer que há dois tipos de pessoas na igreja, aqueles que pensam
que teologia é importante e os que pensam que teologia não tem importância.
Também já ouvi dizer que aqueles que se importam com teologia deixaram de
lado o amor, e que isso é um problema porque Deus está mais preocupado com
nosso amor do que o conhecimento da teologia.
Fiquei profundamente incomodado quando ouvi isso. É claro, já ouvi
inúmeras expressões de antipatia à doutrina antes, e sei que o estudo da doutrina
pode levar a uma ortodoxia morta em alguns casos. Creio que todos sabemos que
é totalmente possível estudar a doutrina como um exercício do intelecto e não ter
amor algum por Deus ou pelo próximo. Mas isso é apenas outra forma de
generalizar o problema e concluir que se buscamos aprender a teologia cristã, não
exercitamos o amor, então devemos evitar a teologia. Pare e pense nas
complicações disto. Tal conclusão afirma que a melhor maneira de exercitar o
amor é fugir do entendimento das coisas de Deus, de qualquer jeito. O estudo da
teologia é simplesmente um estudo do caráter de Deus, cuja principal virtude é
o amor. A verdadeira teologia nos ensina a importância central do amor e nos
inclina a amar o Deus das Escrituras e também ao nosso próximo.
Tal antipatia à doutrina é expressa no contexto de controvérsias teológicas.
Enquanto alguns podem ficar ranzinzas em ambos os lados das controvérsias
teológicas, outros fogem de qualquer controvérsia. Eles dizem “Não me interessa
esse debate e nem a doutrina em geral, penso apenas que devemos amar uns aos
outros”. Mas será que ser conivente com tamanho erro teológico significa amar?
Agiu Paulo sem amor quando discursava diariamente na sinagoga e na praça
sobre as coisas de Deus (At 17:17)? Agiu Jesus sem amor quando contradisse os
ensinos dos fariseus? Agiram sem amor os profetas da Antiga Israel quando
reprovavam e admoestavam os falsos profetas? Agiu Elias sem amor quando
desafiou os profetas de Baal (1 Re 18)? Eu não consigo imaginar que alguém em
meio à multidão no Monte Carmelo naquele dia tenha dito “Vocês aí podem
seguir Elias se quiserem, viu? Mas eu não vou. Talvez haja verdade em suas
ações, mas lhe falta amor. Vejam o que ele fez com os profetas de Baal! Que
crueldade!” Lutar pela verdade de Deus é um ato de amor, e não um sinal de
ausência dele. Se amamos a Deus, se amamos a Cristo, se amamos a igreja,
precisamos amar a verdade que define a essência do cristianismo.
Certa vez ouvi outro comentário incômodo: “Cristianismo é sobre
relacionamentos, e não sobre afirmações.” A pessoa ainda disse que o
cristianismo se preocupa com a verdade, mas essa segunda afirmativa não casa
com a primeira. Se a fé cristã não envolve afirmações, que tipo de verdade é esta?
Acredito que a influencia do existencialismo na cultura em geral e na igreja em
particular produziu uma coisa que não existia nos tempos passados: teologia
relacional. Falando claramente, teologia relacional é um sistema teológico cujo
conteúdo e propósito é determinado pelos relacionamentos. Ou seja, está a um
passo de se tornar puro relativismo. Esse tipo de teologia diz que se você acredita
que Deus é um, e eu acredito que Deus é três em um, o que realmente interessa é
nosso relacionamento pessoal – a verdade sendo determinada por
relacionamentos, e não por afirmações. Por exemplo, se eu digo que Jesus morreu
numa cruz sendo uma expiação e alguém diz que Sua morte não foi uma
expiação, não devemos discutir o assunto se isso for prejudicar nosso
relacionamento. Ou seja, o relacionamento deve ser preservado mesmo que a
verdade seja perdida.

O OBJETIVO DE SE CONHECER A DEUS

Emil Brunner, o teólogo suíço do século XX que é um dos pais da teologia


neo-ortodoxa, escreveu um livro chamado Truth as Encounter1. Sua tese é que
quando estudamos as coisas de Deus, não estamos estudando a verdade no
sentido abstrato. Não queremos apenas entender a teologia de forma que tiremos
10 na prova, mas queremos de fato conhecer a Deus, para que encontremos o
Deus vivo em Sua Palavra e aprofundemos nosso relacionamento pessoal com
Ele. Mas relacionamento profundo é impossível se não sabemos nada sobre a
pessoa. Então, as afirmações das Escrituras não são um fim em si mesmas, mas
um meio para esse fim. Contudo, são meios necessários para o fim. Então, dizer
que o cristianismo não envolve afirmações, mas apenas relacionamentos, é
estabelecer uma dicotomia extremamente perigosa e falsa. É insultar o próprio
Espírito da verdade, de onde tais afirmações surgem. Tais fatos devem ser nossa
comida e bebida diariamente pois definem a vida cristã.

1 Não encontrei a versão em PT, deve não haver tradução.


Recentemente eu li algumas cartas endereçadas ao editor de uma revista
cristã. Uma delas depreciava de tal forma os seminaristas. O escritor da carta
apontou que seminaristas deveriam gastar seu tempo estudando os escritos
antigos dos ensinamentos de Cristo, a fim de demonstrarem que Ele não queria
realmente dizer tudo que está escrito nas nossas traduções da Bíblia. É obvio que
isso foi um grave ataque contra qualquer estudo sério da Palavra de Deus.
Incrível é que existem seminaristas que são exatamente assim: estudam uma
palavra em seis línguas diferentes e ainda perdem seu real significado, porém
isso não é motivo para que deixemos de lado os esforços de estudar seriamente a
Palavra. Em outra carta que li, seu escritor afirmou veementemente que aqueles
que se engajam em estudar a doutrina não estão preocupados com a dor que as
pessoas experimentam neste mundo. Em minha experiencia, entretanto, é
virtualmente impossível experimentar a dor e não questionar a verdade. Todos
queremos saber a verdade sobre o sofrimento, e especialmente, onde está Deus
em meio à nossas dores. Isso é uma questão teológica. A Bíblia nos revela a
resposta, quando nos revela a mente do Próprio Deus através da agência do
Espírito Santo, que é chamado Espírito da verdade. Não podemos amar a Deus e
não amar Suas verdades.
Me entristece sobremodo que em nossa cultura ocidental sofisticada, as
pessoas estão mais familiarizadas com os doze signos do Zodíaco do que com as
doze tribos de Israel ou os doze apóstolos. Nosso mundo se gaba de ver a si
mesmo como sofisticado e tecnológico, mas permanece abarrotado de
superstição. Os cristãos não são imunes a isto. Nós, igualmente, podemos
sucumbir ao desejo pelo poder de manipular nosso ambiente. Não podemos
chegar ao ponto de aceitar a tola ideia de que o curso das estrelas determina
nossos destinos, nossa prosperidade, nossas conquistas e nosso sucesso. E da
mesma forma, igualar nossos sentimentos e inclinações com a direção do Espírito
Santo é uma superstição. Parece muito mais atraente aceitar um tipo de direção
livre e indiscriminada do Espírito Santo do que praticar a laboriosa disciplina em
aprender a manejar Sua Palavra. Isso vai além de todos os perigos. Se queremos
fazer a vontade do Pai, precisamos estudar a Palavra do Pai – e deixar a magia
para os astrólogos.
CAPÍTULO 5
AQUELE QUE UNGE

Ao longo do Antigo Testamento, o Espírito Santo é uma presença efêmera.


Ele aparece de tempos em tempos, porém sem nenhuma descrição detalhada de
Seu ministério. O único papel que Ele desempenhava repetidamente era
empoderar os lideres de Israel para cumprir tarefas dadas por Deus. Esses lideres
eram aqueles que recebiam a “ungida” incumbência de profetas, sacerdotes e
reis. O Espírito estava sobre esses homens, apesar de Sua companhia ser
temporária; Ele os ungiu para capacitá-los para tarefas específicas.
Há vários exemplos do Espírito ungindo líderes no Antigo Testamento:
“Veio sobre ele o Espírito do SENHOR [Otniel], e ele julgou a Israel” (Jz 3:10);
“Então, o Espírito do SENHOR veio sobre Jefté” (11:29a); “E o Espírito Santo se
apossou de Saul” (1 Sm 11:6a); “Tomou Samuel o chifre do azeite e o ungiu no
meio de seus irmãos; e daquele dia em diante, o Espírito do SENHOR se apossou
de Davi” (16:13a). Similarmente, vemos exemplos do Espírito repousando sobre
profetas quando recebiam seus chamados para falarem em nome de Deus (1 Re
17:2; Jr 1:4). E quando os sacerdotes eram ungidos pelo Espírito, o simbolismo era
a unção com óleo (Ex 29:21). De novo, contudo, esses exemplos mostram que a
unção do Espírito para o ministério era limitada. Mas o Antigo Testamento nos
dá indícios de que chegaria um dia em que a natureza da unção do Espírito seria
bem mais ampla. Um desses indícios está no livro de Números. Lá lemos:

E o populacho que estava no meio deles veio a ter grande desejo das comidas
dos egípcios; pelo que os filhos de Israel tornaram a chorar e também disseram:
Quem nos dará carne a comer? Lembremo-nos dos peixes, que, no Egito,
comíamos de graça; dos pepinos, dos melões, dos alhos silvestres, das cebolas
e dos alhos. Agora, porém, seca-se a nossa alma, e nenhuma coisa vemos senão
este maná. Era o maná como semente de coentro, e a sua aparência, semelhante
à de bdélio. Espalhava-se o povo, e o colhia, e em moinhos o moía ou num gral
o pisava, e em panelas o cozia, e dele fazia bolos; o seu sabor era como o de
bolos amassados com azeite. Quando, de noite, descia o orvalho sobre o arraial,
sobre este também caía o maná (11:4-9)

Deixe-me estabelecer o cenário aqui. Deus redimiu Israel do cativeiro no


Egito. Ao guiá-los pelo deserto rumo a Terra Prometida, Ele cuidou de suas
necessidades diárias, provendo miraculosamente do céu em forma de maná. No
início, o povo de Israel se regozijava de sua liberdade e da providência de comida
diária. Mas logo tornaram-se insatisfeitos. Se esqueceram dos chicotes, da
tortura, do suor e da miserabilidade de sua escravidão; fazendo com que seus
mais profundos desejos agora fossem tudo que comiam quando estavam no Egito
– os peixes, os melões, as cebolas, o alho, os pepinos. O povo ficou infeliz por ter
que comer sempre a mesma coisa, o maná, em cada refeição. Quando leio sobre
essa insatisfação do povo, não consigo me conter. Começo a rir. É incrível como
a grama do vizinho sempre parece mais verde, muitos pensam assim.
Como o relato de Números continua, lemos: “Então, Moisés ouviu chorar
o povo por famílias, cada um à porta de sua tenda; e a ira do SENHOR
grandemente se acendeu, e pareceu mal aos olhos de Moisés” (verso 10). Nesse
ponto, parece que todos estavam descontentes. Mas no caso de Moisés, a coisa
era bem mais intensa. Ele estava quase fora de si:

“Disse Moisés ao SENHOR: Por que fizeste mal a teu servo, e por que não
achei favor aos teus olhos, visto que puseste sobre mim a carga de todo este
povo? Concebi eu, porventura, todo este povo? Dei-o eu à luz, para que me
digas: Leva-o ao teu colo, como a ama leva a criança que mama, à terra que,
sob juramento, prometeste a seus pais? Donde teria eu carne para dar a todo
este povo? Pois chora diante de mim, dizendo: Dá-nos carne que possamos
comer. Eu sozinho não posso levar todo este povo, pois me é pesado demais.
Se assim me tratas, mata-me de uma vez, eu te peço, se tenho achado favor aos
teus olhos; e não de deixes ver a minha miséria. (versos 11-15)

Podemos ter uma noção da profundidade do desespero de Moisés


observando suas palavras em sua oração: “Deus, se tenho achado favor aos teus olhos,
mata-me de uma vez, porque eu não aguento mais”. Haviam dezenas de pessoas
gritando em seus ouvidos por algo que ele não lhes podia prover. Naquele ponto,
a morte parecia atraente ao invés de continuar liderando os israelitas.
A resposta de Deus definitivamente não foi o que Moisés esperava:

“Disse o SENHOR a Moisés: Ajunta-me setenta homens dos anciãos de


Israel, que sabes serem anciãos e superintendentes do povo; e os trarás perante
a tenda da congregação, para que assistiam ali contigo. Então, descerei e ali
falarei contigo; tirarei do Espírito que está sobre ti e o porei sobre eles; e
contigo levarão a carga do povo, para que não a leves tu somente. Dize ao
povo: Santificai-vos para amanhã e comereis carne; porquanto chorastes aos
ouvidos do SENHOR, dizendo: Quem nos dará carne a comer? Íamos bem no
Egito. Pelo que o SENHOR vos dará carne, e comereis. Não comereis um dia,
nem dois dias, nem cinco, nem dez, nem ainda vinte; mas um mês inteiro, até
vos sair pelos narizes, até que nos enfastieis dela, porquanto rejeitastes o
SENHOR, que está no meio de vós, e chorastes diante dele, dizendo: Por que
saímos do Egito?” (verso 16-20)

Creio que a lição aqui seja a seguinte: Muito cuidado com suas orações. O
povo clamava por carne, e Deus disse: “OK, se querem carne, então carne vocês
terão. Terão carne no café da manhã, no almoço, no jantar e no lanchinho da meia-
noite, e não apenas por um ou dois dias, mas por um mês inteiro, até que ela saia
pelas suas narinas.” Deus disse que lhes daria carne até que eles não aguentassem
nem olhar mais para ela.
Poderia parecer que Moisés se sentiria aliviado após essa fala de Deus.
Afinal, Ele estava dando ao povo o que eles queriam, aliando a carga de Moisés.
Poderia parecer lógico Moisés dizer: “Obrigado, Senhor, por cuidar da situação.
Muito agradecido, viu?” Mas não foi o que aconteceu. Moisés teve uma crise de
fé. Ele disse a Deus: “Seiscentos mil homens de pé é este povo no meio do qual
estou; e tu disseste: Dar-lhes-ei carne, e a comerão um mês inteiro. Matar-se-ão
para eles rebanhos de ovelhas e de gado que lhes bastem? Ou se ajuntarão para
eles todos os peixes do mar que lhes bastem?” (versos 21-22).
Quando Moisés cita os seiscentos mil homens de pé, ele se referia ao
tamanho do exército dos Israelitas, os homens aptos para a batalha. Essa menção
não incluiu os jovens, as crianças, os velhos, os enfermos, ou as mulheres. Moisés
provavelmente era responsável por dois milhões de pessoas. Por isso, ele não via
nenhuma forma possível para que Deus cumprisse Sua promessa de dar carne a
essa quantidade de pessoas por um mês.
Eu amo a resposta que Deus deu às perguntas de Moisés: “Ter-se-ia
encurtado a mão do SENHOR? Agora mesmo, verás se se cumprirá ou não a
minha palavra!” (verso 23). Basicamente, Deus perguntou a Moisés, “Sou Eu
Deus ou não?” Então Ele desafia Moisés a simplesmente esperar e ver o que Ele
faria.
Após ouvir isso, Moisés se cala. Ele fez o que Deus lhe ordenou: “Saiu,
pois, Moisés, e referiu ao povo as palavras do SENHOR, e ajuntou setenta
homens dos anciãos do povo, e os pôs ao redor da tenda. Então, o SENHOR
desceu na nuvem e lhes falou; e, tirando do Espírito que estava sobre ele, o pôs
sobre aqueles setenta anciãos; quando o Espírito repousou sobre eles,
profetizaram; mas, depois, nunca mais. (versos 24-25).

ASSISTENTES PARA MOISÉS

Ao iniciarmos uma exploração nesse importante incidente, é útil que


consideremos um evento anterior registrado em Êxodo 18. Lá vemos que depois
de Deus tirar o povo do Egito, o sogro de Moisés, Jetro, sacerdote de Midiã, foi
visita-lo no acampamento no Sinai. Durante a visita, Jetro viu que Moisés havia
se assentado para julgar as causas do povo desde a manhã ao pôr-do-sol (versos
1-13), aí lemos:

“Vendo, pois, o sogro de Moisés tudo o que ele fazia ao povo, disse: Que é isto
que fazes ao povo? Por que te assentas só, e todo o povo está em pé diante de
ti, desde a manhã até o pôr-do-sol? Respondeu Moisés a seu sogro: É porque
o povo me vem a mim para consultar a Deus; quando tem alguma questão,
vem a mim, para que eu julgue entre um e outro e lhes declare os estatutos de
Deus e as suas leis. O sogro de Moisés, porém, lhe disse: Não é bom o que
fazes. Sem dúvida, desfalecerás, tanto tu como este povo que está contigo; pois
isto é pesado demais para ti; tu só não o podes fazer. Ouve, pois, as minhas
palavras; eu te aconselharei, e Deus seja contigo; representa o povo perante
Deus, leva as suas causas a Deus, ensina-lhes os estatutos e as leis e faze-lhes
saber o caminho em que devem andar e a obra que devem fazer. Procura dentre
o povo homens capazes, tementes a Deus, homens de verdade, que aborreçam
a avareza; põe-nos sobre eles por chefes de mil, chefes de cem, chefes de
cinquenta e chefes de dez; para que julguem este povo em todo tempo. Toda
causa grave trarão a ti, mas toda causa pequena eles mesmos julgarão; será
assim mais fácil para ti, e eles levarão a carga contigo. Se isto fizeres, e assim
Deus to mandar, poderás, então, suportar; e assim também todo este povo
tornará em paz ao seu lugar. Moisés atendeu às palavras de seu sogro e fez
tudo quanto este lhe dissera. Escolheu Moisés homens capazes, de todo o
Israel, e os constituiu por cabeças sobre o povo: chefes de mil, chefes de cem,
chefes de cinquenta e chefes de dez. Estes julgaram o povo em todo tempo; e
causa grave trouxeram a Moisés e toda causa simples julgaram eles”
(versos 14-26).

Moisés levou a sério o conselho de Jetro e designou homens para servirem


de juízes, enquanto ele era o “chefe de justiça”, ouvindo os casos mais barra
pesada.
Em Números, Deus fez algo similar. Deus disse a Moisés para escolher
setenta homens entre os anciãos do povo e reuni-los no tabernáculo (11:16). Com
isso, Deus queria dizer “Irei aliviar o fardo da liderança sobre você. Lhe darei não
apenas um assistente, mas setenta.” Quando estavam reunidos, Deus pegou uma
porção do Espírito que estava sobre Moisés e depositou sobre os setenta. Com
isso, agora haviam setenta lideres ungidos no acampamento israelita.
Moisés foi ungido pelo Espírito Santo para atuar como um mediador da
velha aliança. Agora, Deus ungia mais setenta pessoas para compartilhar a tarefa.
É interessante notar que Deus não os ungiu de forma direta; mas pegou do
Espírito que estava sobre Moisés para ungir os setenta. Ao fazer isto, todos eles
começaram a profetizar de forma singular, tal como nunca houve nem jamais
haveria de novo. Essa manifestação externa mostrou que eles foram
empoderados pelo Espírito Santo.
Quase como se fosse uma nota de rodapé, lemos: “Porém, no arraial,
ficaram dois homens; um se chamava Eldade, e o outro, Medade. Repousou sobre
eles o Espírito, porquanto estavam entre os inscritos, ainda que não saíram à
tenda; e profetizavam no arraial. Então, correu um moço, e o anunciou a Moisés,
e disse: Eldade e Medade profetizam no arraial” (versos 26-27). Isso foi
escandaloso. O povo ainda não sabia que Deus havia distribuído do Espírito que
estava sobre Moisés entre os setenta anciãos. Quando viram Eldade e Medade
profetizando, ficaram horrorizados ao pensar que eles eram falsos profetas.
Então, o jovem correu para informar a Moisés.
Quando Moisés ouviu a informação, seu assistente, Josué, ficou
particularmente chateado: “Josué, filho de Num, servidor de Moisés, um dos seus
escolhidos, respondeu e disse: Moisés, meu senhor, proíbe-lho” (verso 28). Por
que Josué fez este pedido? Era ele contra o ato de profetizar? Era ele contra o
poder do Espírito Santo? Não, Josué estava apenas preocupado de aquilo ser uma
afronta à liderança de Moisés. Ele viu aquilo como um levante contra a
autoridade da igreja do Antigo Testamento.
A resposta de Moisés foi vital para nossa compreensão sobre a obra do
Espírito Santo. Lemos: “Porém Moisés lhe disse: Tens tu ciúmes por mim?
Tomara todo o povo do SENHOR fosse profeta, que o SENHOR lhes desse o seu
Espírito!” (verso 29). Enquanto Josué protestava contra a expansão da unção do
Espírito, Moisés se maravilhou com aquilo, ao ponto de expressar seu desejo de
que Deus derramasse seu Espírito em cada um do Seu povo.
Na Israel antiga, durante o tempo de Moisés, essa ideia de o Espírito estar
sobre cada crente era meramente uma esperança ou uma oração nos lábios de
Moisés. Mais tarde, contudo, essa esperança se tornou uma profecia. O profeta
Joel escreveu: “E acontecerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a
carne; vossos filhos e filhas profetizarão, vossos velhos sonharão, e vossos
jovens terão visões; até sobre os servos e sobre as servas derramarei o meu
Espírito naqueles dias” (versos 28-29). Sob inspiração do Espírito, Joel disse que
nos últimos dias, Deus derramaria Seu Espírito sobre “toda carne”, ou seja, em
todos aqueles que são parte do povo de Deus. O empoderamento do Espírito
Santo para o ministério não se limitaria a indivíduos isolados ou um seleto grupo
de pessoas, mas se estenderia a cada filho e filha de Deus.
ORAÇÃO RESPONDIDA E PROFECIA CUMPRIDA

A oração de Moisés e a profecia de Joel se tornou uma realidade histórica


no dia do Pentecostes, quando Deus pegou do Espírito que estava sobre Jesus, o
Mediador da nova aliança, e O distribuiu não apenas a setenta, mas a todos os
crentes.
Jesus disse aos discípulos que aquilo aconteceria. No livro de Atos, Lucas
escreveu: “E, comendo com eles, [Jesus] determinou-lhes que não se ausentassem
de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim
ouvistes. Porque João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis batizados
com o Espírito Santo, não muito depois destes dias” (1:4-5). Uma das ultimas
coisas que Jesus disse a Seus discípulos antes de ascender ao Pai foi que eles
deveriam permanecer um curto período em Jerusalém para que pudessem
receber o cumprimento da promessa que o Pai fez. Ele se referia à promessa de
batismo do Espírito Santo na profecia de Joel. Ele disse que isso aconteceria num
futuro próximo.
Lucas continua: “Então, os que estavam reunidos lhe perguntaram:
Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel? Respondeu-lhes: Não
vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou pela sua exclusiva
autoridade; mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis
minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até
os confins da terra” (versos 6-8). Aqui Jesus associa “batismo do Espírito” com
“poder para serem Suas testemunhas”.
Em todas as passagens que discutimos – Números 11, Joel 2, e
especialmente aqui em Atos 1 – a unção do Espírito Santo é associada a algum
tipo de dom, algo divino graciosamente concedido. A palavra grega para esse
tipo de dom é charisma. Por isso, os dons concedidos pelo Espírito são conhecidos
como “carismáticos” ou a charismata. O Espírito dá esses dons à igreja de Cristo
para habilitá-los a cumprir a missão que Cristo deu a Seu povo – serem Suas
testemunhas até as partes mais remotas da terra.
Então, essa era a promessa. No dia de Pentecostes, o Espírito veio sobre os
discípulos com poder:

“Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar;


de repente, veio do céu um som, como de um vento impetuoso, e encheu toda
a casa onde estavam assentados. E apareceram, distribuídas entre eles,
línguas, como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles. Todos ficaram
cheios do Espírito Santo e passaram a falar em outras línguas, segundo o
Espírito lhes concedia que falassem. Ora, estavam habitando em Jerusalém
judeus, homens piedosos, vindos de todas as nações debaixo do céu. Quando,
pois, se fez ouvir aquela voz, afluiu a multidão, que se possuiu de
perplexidade, porquanto cada um os ouvia falar na sua própria língua.
Estavam, pois, atônitos e se admiravam, dizendo: Vede! Não são, porventura,
galileus todos esses que aí estão falando? E como os ouvimos falar, cada um
em nossa própria língua materna? Somos partos, medos, elamitas e os
naturais da Mesopotâmia, Judéia, Capadócia, Ponto e Ásia, da Frígia, da
Panfília, do Egito e das regiões da Líbia, nas imediações de Cirene, e romanos
que aqui residem, tanto judeus como prosélitos, cretenses e arábios. Como os
ouvimos falar em nossas próprias línguas as grandezas de Deus?”
(At 2:1-11)

Pentecostes foi uma festa anual que acontecia em Jerusalém. Peregrinos


judeus de todo o mundo foram a Jerusalém para a festa de Pentecostes. Então,
havia uma gigantesca assembleia de Judeus de muitas regiões falando em várias
línguas. Mas a festa foi interrompida por um evento sobrenatural que foi
marcado por uma manifestação visível do Espírito Santo – línguas de fogo
repousaram sobre a cabeça dos discípulos – e uma manifestação audível – os
discípulos falaram sobre “as grandezas de Deus” nas línguas de todos os
presentes ali.
Martinho Lutero, o grande reformador alemão do século XVI, falou do
“sacerdócio de todos os crentes”. Alguns entendem esse termo como sendo que
não há distinção na igreja entre o clero e os leigos, mas não foi isso que Lutero
quis dizer. Ele estava dizendo que a obra do reino de Deus não é dada apenas
aos que possuem a vocação de pastores, mestres, diáconos ou anciãos. Cada
cristão é chamado a participar do ministério de Cristo e do ministério da igreja.
Isso pode ser intimidador, mas esse chamamento nunca vem sozinho. Vem com
o dom do Espírito Santo, que unge e capacita o povo de Cristo a servi-Lo.
CAPÍTULO 6
O ILUMINADOR

No meu primeiro ano como professor acadêmico, eu estava lecionando


numa faculdade no Oeste da Pennsylvania. Na primavera, num semestre, uma
estudante marco um horário comigo para discutir um problema pessoal. Ela
estava estressada porque experimentava algo que as vezes é chamado de
“senioritis” ( um termo americano coloquial usado para descrever quando um
aluno começa a perder sua motivação, quando está prestes a se formar). Ela
estava no último semestre, mas não era casada, não tinha namorado, e não tinha
planos para nenhum relacionamento. Era uma crente devota, e queria saber se
era errado orar pedindo ajuda a Deus para achar um namorado. Eu lhe disse que
não havia nada de errado em orar por isso, e a aconselhei a fazê-lo.
Duas semanas depois, ela veio me ver novamente, e estava toda alegre e
eufórica. Ela disse, “Estive orando por duas semanas para que Deus me desse um
marido, e Ele respondeu minhas orações”. Eu disse “Você conheceu alguém?”
Ela disse “Não, eu ainda não o conheci. Mas sei que vou muito em breve. Fui na
sorte.” Eu nunca tinha ouvido alguém dizer algo assim nesses assuntos. E
perguntei o que ela queria dizer. Ela disse “Eu estava orando, e minha Bíblia estava
comigo, e Lhe pedi que me desse um marido. Então fechei meus olhos, abri minha Bíblia
aleatoriamente e pus o dedo numa página. Quando abri os olhos, meu dedo estava em
Zacarias 9:9, que diz: Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém: eis que
aí te vem o teu Rei, justo e salvador, humilde, montado em jumento, num jumentinho,
cria de jumenta. Essa foi a resposta de Deus a minha oração. O Espírito me revelou que
eu vou me casar.”
Isso foi um exemplo de “exegese pneumática”, que é um termo chique
para o que ela fez. Tem a ver com interpretar a Bíblia usando um tipo de
maquinação espiritual. Não é algo que se restringe à superstição ou magia, mas
cruza esse limite. Aquela aluna havia adotado uma forma de interpretar a
Escritura que ofende gravemente a Deus o Espírito Santo. Tornar a Bíblia num
talismã mágico certamente não foi o intento do Espírito em Sua obra de inspirar
a Bíblia;

COMO O ESPÍRITO USA A PALAVRA

Houve um episodio similar a este na vida de Agostinho, o grande teólogo


do primeiro milênio. Antes de sua conversão, Agostinho tinha uma reputação de
alguém que vivia uma vida licenciosa e desenfreada. Sua mãe, Monica, cristã,
orou intensamente por muito tempo para que seu filho viesse a Cristo. Um dia,
segundo Agostinho conta em seu livro de memórias chamado Confissões, ele
estava sentado no jardim meditando, tentando compreender a verdade em meio
as inúmeras confusões presentes nos sistemas filosóficos de sua época. Algumas
crianças brincavam num local próximo a ele, e Agostinho conseguiu ouvi-las
recitando um estranho refrão: “Tolle et lege, tolle et lege,” que significava, “Toma e
lê, toma e lê.” Agostinho encontrou uma cópia das Escrituras sagradas e começou
a ler da página que já estava aberta mesmo. Estava aberta no livro de Romanos,
onde Paulo dizia “Andemos dignamente, como em pleno dia, não em orgias e bebedices,
não em impudicícias e dissoluções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor
Jesus Cristo e nada disponhais para a carne no tocante às suas concupiscências” (Rm
13:13-14). Quando Agostinho leu esse texto, ele se sentiu como que golpeado pela
culpa e naquele momento foi desperto para as coisas de Deus. Ali, ele nascia de
novo pelo Espírito Santo.
Qual é a diferença entre a experiencia de Agostinho e a experiencia da
minha aluna de faculdade? Agostinho não tentou discernir a vontade de Deus
usando um processo magico. Ele simplesmente pegou a Bíblia e começou a lê-la
de um certo ponto. Mais importante, o texto lido por ele possuía o exato
significado que o Espírito Santo teve a intenção de dá-lo, a mesma intenção pelo
qual inspirou Paulo a escrevê-lo. Por isso, o Espírito tornou possível que
Agostinho entendesse o real significado do texto. Não houve mágica alguma no
processo.
Eu fui convertido a Cristo durante uma conversa no dormitório da
faculdade numa tarde de 1957. Um colega cristão estava me falando das coisas
de Deus e citando varias passagens da bíblia. A maior parte do que ele disse
entrou por um ouvido e saiu pelo outro e eu não me lembro. Mas aí ele começou
a me falar da sabedoria de Deus, e então ele abriu a bíblia em Eclesiastes e leu
alguns versos, incluindo este: “Caindo a árvore para o sul ou para o norte, no lugar
em que cair, aí ficará” (11:3b). Quando ouvi isso, subitamente fui tomado pelo
pensamento de que eu era uma árvore que havia caído e que estava inerte,
entorpecida, apodrecendo. Comecei a ver que essa era minha condição espiritual;
eu era uma árvore caída, e permaneceria caída, dormente e apodrecendo a menos
que Deus fizesse alguma coisa. Aquela minha conclusão não foi uma má
interpretação do texto. Creio que Deus o Espírito Santo usou aquele texto para
me despertar para a fé salvífica.
Esses são exemplos para o que chamamos de iluminação divina, que é
outra obra muito importante do Espírito Santo. Precisamos distinguir entre a Sua
obra de iluminação da Sua obra de revelação. O Espírito Santo inspirou a
revelação bíblica, a verdade de Deus que nos é manifesta e descoberta na bíblia.
Essas informações vêm diretamente da mente do próprio Deus. Iluminação, no
entanto, não traz nenhuma informação nova. Tem unicamente a ver com toda a
informação que o Espírito já nos deu através da bíblia. Quando o Espírito usou
aquele refrão cantado pelas crianças para levar Agostinho a ler o texto de
Romanos, Ele não lhe deu nenhuma informação inédita. Deus simplesmente o
direcionou a ler uma passagem da Escritura que estava lá disponível para que
qualquer um a lesse. Mas milhares de pessoas já leram aquele texto de Romanos
e não conseguiram se enxergar nele. Não foram convencidas pela Palavra, mas
permaneceram do mesmo jeito porque estavam cegas ao seu significado. Mas
Agostinho experimentou uma iluminação do Espírito. Em outras palavras, o
Espírito trabalhou em Agostinho a fim de ajuda-lo a entender a verdade de Deus
nas palavras que havia lido.

BUSCANDO “AS PROFUNDEZAS DE DEUS”

Os cristãos deviam de ser contados entre os Illuminati, aqueles que foram


iluminados – não por algum guru do Himalaia, mas pelo Espírito Santo,
aplicando a luz da Palavra de Deus. Vemos isso claramente na primeira epistola
de Paulo aos Coríntios, onde lemos:

“Entretanto, expomos sabedoria entre os experimentados; não, porém, a


sabedoria deste século, nem a dos poderosos desta época, que se reduzem a
nada; mas falamos a sabedoria de Deus em mistério, outrora oculta, qual Deus
preordenou desde a eternidade para a nossa gloria; sabedoria essa que nenhum
dos poderosos deste século conheceu; porque, se a tivesses conhecido, jamais
teriam crucificado o Senhor da gloria; mas, como está escrito: Nem olhos
viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que
Deus tem preparado para aqueles que o amam.
Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas
perscruta, até mesmo as profundezas de Deus” (2:6-10)

O que Paulo quis dizer em “O Espírito a todas as coisas perscruta, até


mesmo as profundezas de Deus”? Quando usamos a palavra perscruta,
normalmente nos referimos ao ato de tentar achar algo que queremos descobrir.
Se estou numa jornada por conhecimento, uma busca por conhecimento, estou
tentando aprender algo que até o momento eu não sei. Então, quando Paulo diz
que o Espírito perscruta as profundezas de Deus, dá a parecer que a terceira
pessoa da Trindade está em busca de algum conhecimento, algum entendimento
que Lhe falta. Mas se concluirmos que existem coisas que o Espírito Santo não
conhece e precisa aprender, isso destruiria nossa doutrina da Trindade. Se falta
conhecimento no Espírito, isso desqualificaria Sua divindade. Então, precisamos
fazer a pergunta abordando outra linha de raciocínio, aceitando o que a Escritura
ensina sobre o Espírito – que Ele é parte da divindade, e por isso, é onisciente.
Portanto Ele não sonda as profundezas de Deus buscando ampliar Seu próprio
conhecimento.
Pelo contrário, Paulo nos diz aqui que o Espírito Santo perscruta as
profundezas de Deus em nosso favor. O Espírito age como um holofote que
aponta sua luz diretamente no texto que estamos lendo, dando-nos a capacidade
de entender seu significado. Quando isso acontece, vemos as verdades de Deus
de forma intensa e acurada. Todos nós que somos cristãos já tiveram essa
experiencia em algum momento na vida. Um dia, ao lermos a Bíblia, subitamente
uma verdade em particular saltou aos nossos olhos e penetrou nossa alma. Essa
foi a obra iluminadora do Espírito em ação.
No ano 1734, um sermão que eu acredito ter sido um dos mais importantes
já pregados onde hoje é solo americano, foi pregado em Northampton,
Massachusetts. O pregador, Jonathan Edwards, é mais conhecido por outro
sermão, “Pecadores nas Mãos de um Deus Irado”, que ele pregou em Enfield,
Connecticut em 1741. Muitas antologias da literatura americana incluem
“Pecadores nas Mãos de um Deus Irado” como um exemplo representativo da forma
de escrita na Nova Inglaterra Colonial. Mas o sermão que considero no mesmo
nível de importância deste teve o titulo “Uma Luz Divina e Sobrenatural,
Imediatamente Concedida à Alma pelo Espírito de Deus, Mostrada como Doutrina Bíblica
e Racional”. Esse sermão não é muito conhecido ou divulgado, mas eu acho que
esse em especial concentrou toda a genialidade de Edwards. Aqui, Edwards falou
sobre a iluminação sobrenatural.
Ele define essa luz espiritual assim:

“Um verdadeiro senso da excelência suprema e divina das coisas cristãs: um


verdadeiro senso da excelência de Deus e de Jesus Cristo, e da obra da
redenção, e os caminhos e obras de Deus reveladas no evangelho. Há uma
divina e superlativa gloria nestas coisas, uma excelência que é do tipo muito
superior e natureza mais sublime do que em outras coisas, [e] tal gloria,
distinguindo-os grandemente de tudo que é terreno e temporal. Aquele que é
espiritualmente iluminado realmente aprende a ver isso, ou ter um senso
disso. Ele não apenas racionalmente acredita que Deus é glorioso, mas ele tem
um senso da magnificência de Deus em seu coração. Não é apenas uma crença
racional de que Deus é santo, e que santidade é algo bom, mas há um senso da
beleza da santidade de Deus.”

De acordo com Edwards, o principal efeito da obra de iluminação do


Espírito é nos despertar para um senso da divina excelência das coisas de Deus.
Existe o perigo de estarmos persuadidos de que Cristo é divino e ainda assim não
captarmos a doçura dessa afirmação, não haver afeto por Ele em nosso coração e
alma. O Espírito desperta em nós uma sensibilidade à excelência das coisas de
Deus. Mas Ele jamais opera de forma contrária a Palavra de Deus. O Espírito
opera na Palavra, com a Palavra, e através da Palavra. Em outras palavras, Ele
nos traz a revelação de Deus de tal forma que Ele vence nossa hostilidade natural
às verdades de Deus e nos mostra o amor contido nessas verdades. Assim com o
Ezequiel engoliu o livrinho e ele lhe foi doce como o mel (3:3), as palavras de
Deus se tornam doces para todos aqueles que as leram tendo por companhia a
luz do Espírito.

FIM

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