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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE LETRAS E ARTES


FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO
DEPARTAMENTO DE ANÁLISE E REPRESENTAÇÃO DA FORMA

CADERNO DIDÁTICO
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA FORMA ARQUITETÔNICA


APRESENTAÇÃO

IDENTIFICAÇÃO DA DISCIPLINA:

Disciplina: ESTUDO DA FORMA ARQUITETÔNICA I (Obrigatória)


Código: FAR 112
Carga Horária por Período: mínimo 105 hs. / teórica (35 hs.) + prática (70 hs.)
Período: 2º Período
Créditos: 04 (Quatro)
Número de Aulas Previstas: mínimo 35 (Trinta e cinco)
Requisitos: não tem
Número de Turmas: 9 (nove) / máximo 17 alunos por turma
Número Médio de Alunos: 150 (cento e cinquenta) por período
Professores: Beatriz Santos de Oliveira
Giselle Arteiro Nielsen Azevedo
James Shoiti Miyamoto
José Barki
Maurício Lima Conde
EMENTA:
Introdução ao estudo da forma arquitetônica: Análise e sintaxe das formas, das relações
espaciais por elas criadas e dos estímulos perceptivos que suscitam. Referências para a formação
de um pensamento arquitetônico. Princípios de composição.

OBJETIVOS:
Ao final do curso o aluno será capaz de compreender as implicações de tamanho, medida,
forma, volume e espaço nas obras arquitetônicas. Saberá reconhecer os princípios básicos que
informam a estruturação e organização da forma e do espaço arquitetônico e aplicar tais princípios
em formas tridimensionais simples. Conhecerá obras arquitetônicas significativas, saberá analisá-
las e reconhecerá nelas relações de organização da forma. Estará capacitado a exprimir suas idéias
construtivas em modelos reduzidos tridimensionais.

PROGRAMA:
O programa será distribuido em trinta e cinco aulas de três tempos cada, e abrangendo os seguintes
assuntos:
1 Fundamentos: Percepção e Equilíbrio; Tamanho, Medida e Escala.
Unidades didáticas:
• Percepção visual da foma: aspectos estruturais e funcionais do campo perceptivo, figura e
fundo, percepção do espaço.
• Percepção, sentido de posição, espaço e movimento humano.
• Apropriação do espaço (Espaço e Existência).
• Tamanho, medida e escala.
2 Organização e Estruturação da Forma e do Espaços.
Unidades didáticas:
• Base geométrica da organização da forma arquiteônica.
• Composição da forma arquitetônica.
• Lógica e pensamento arquitetônico.
3 Proporção e Traçados Reguladores.
Unidades didáticas:
• Base geométrica da organização da forma arquiteônica.
• Composição da forma arquitetônica.
4 Pensamento Arquitetônico: Intenção Compositiva.
Unidades didáticas:
• Base geométrica da organização da forma arquiteônica.
• Composição da forma arquitetônica.
• Lógica e pensamento arquitetônico.

METODOLOGIA:
Estudo da Forma I é uma disciplina obrigatória para a graduação em arquitetura. Os
procedimentos metodológicos empregados procuram fundamentar a formação de uma lógica de
raciocínio e um pensamento arquitetônico. Para tal, utiliza exercícios diversificados que buscam
promover simultaneamente o desenvolvimento da habilidade manual e do pensamento criativo na
área do raciocínio espacial.
As aulas são teóricas, práticas e prático-teóricas. Quando teóricas, serão ministradas através
de transparências, slides, modelos, leituras dirigidas e quadro negro.
Quando práticas, serão feitas através de exercícios individuais que envolvem a realização de
modelos tridimensionais, análises gráficas e trabalhos escritos. As aulas práticas serão desenvolvidas
em ateliers equipados com mesas próprias para a execução de modelos tridimensionais. Os trabalhos
serão realizados em diferentes etapas sequenciais de maturação com o acompanhamento individual
do professor.

TRABALHOS PARA AVALIAÇÃO:


Serão elaborados cinco trabalhos de acordo com os assuntos do Programa:

1 Fundamentos: Percepção e Equilíbrio; Tamanho, Medida e Escala.

2 Organização e Estruturação da Forma e do Espaço: Análise de projetos de 4 edificações


significativas e Construção de 2 modelos (um obrigatório e outro de livre escolha).
3 Proporção e Traçados Reguladores.

4 Pensamento Arquitetônico: Intenção Compositiva.

5 Relatório Final
CRONOGRAMA BÁSICO:

AULA CONTEÚDO/ATIVIDADE OBSERVAÇÕES


1. Apresentação do Curso: programa, procedimentos didáticos e avaliação
Lista de material / Bibliografia
2. Técnicas e materiais básicos para execução dos trabalhos práticos
Trabalho Pr ático: Composições Bidimensionais
(quadrados, triângulos, linha s e pontos)
3. TEMA 01: Fundamentos: Percepção, Espaço, Medida e Escala
Discussão e análise das Composições Bidimensionais
Seminário: Equilíbrio
Materiais próxima aula: papel duplex; papel paraná
4. Elementos Primários da Forma: Ponto, Linha, Plano, Volume
Trabalho Pr ático: Pilar, Plano, Cubo
Materiais próxima aula: rolo de barbante
5. Seminário: Tamanho, Medida e Escala
Trabalho Pr ático: Medições com barbante
6. Seminário: Percepção da Forma
Próxima aula: material para protótipo
7. Trabalho Pr ático: Composições Tridimensionais - protótipo (7.0 cm)
8. Composições Tridimensionais: Desenvo lvimento (7,0 cm)
9. Entrega Composição Tridimensional - nível 7.0 cm
Desenvolvimento protótipo nível 21 cm
10. Conclusão e entrega - Composição Tridimensional - nível 21 cm
CONCLUSÃO TEMA I
11. TEMA 02: Organização e Estruturação da Forma e do Espaço;
Seminário: Organização e Estruturação da Forma e do Espaço
Apresentação do Trabalho Prático
12. Visita a campo
Próxima aula: papel manteiga; papel paraná
13. Desenvolvimento MODELO 1 / TEMA 2
Análises Gráficas (desenvolvimento)
14. Desenvolvimento MODELO 1
15. Desenvolvimento
16. Desenvolvimento
17. Conclusão e entrega MODELO 1
18. Desenvolvimento MODELO 2
Análises Gráficas
19. Desenvolvimento
20. Desenvolvimento
21. Conclusão e entrega MODELO 2 / Análises Gráficas
CONCLUSÃO TEMA 02
Próxima aula: material de desenho (compasso, esquadros, papel manteiga)
22. TEMA 03: Traçados Reguladores
Seminário e apresentação do Trabalho Prático
23. Traçados Reguladores
Desenvolvimento malhas
24. Desenvolvimento malhas
Definição do protótipo
25. Traçados Reguladores - desenvolvimento modelo
26. Conclusão e entrega do modelo e das malhas reguladoras
CONCLUSÃO TEMA 03
27. TEMA 04: Int enção Compositiva
Conceituação e a presentação do Trabalho Prático
28. Definição do protótipo
29. Slides
30. Desenvolvimento mode lo
31. Desenvolvimento mode lo
32. Conclusão e entrega modelo - Intenção Compositiva
CONCLUSÃO TEMA 04
33. Dicas para o RELATÓRIO - Exemplos de layouts / traçados de referência
34. Dúvidas RELATÓRIO
35. Conclusão e entrega do RELATÓRIO
AVALIAÇÃO:
O desempenho dos alunos será avaliado através da participação em aula, de 4 (quatro)
trabalhos práticos (execução de modelos) e do relatório final . Estes ítens serão aferidos por notas.
Será aprovado o aluno que, tendo um mínimo de 75 % de freqüência (oito faltas), obtiver média
aritmética maior ou igual a 5 (cinco).

BIBLIOGRAFIA BÁSICA:
• Caderno Didático Introdução ao Estudo da Forma Arquitetônica
• CHING, F. Arquitetura: Forma, Espaço e Ordem., Martins Fontes Editora, São Paulo 1998.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR:
• ARHEIM, R. Arte e Percepção Visual: Uma Psicologia da Visão Criadora. Livraria Pioneira
Ed. USP, São Paulo, 1980.
• BAKER, G. H. Analisis de La Forma. Gustavo Gili Ed., Barcelona, 1991.
• DOCZI, G. O Poder dos Limites: Harmonia e Proporções na Natureza, Arte e Arquitetura. Ed.
Mercuryo, São Paulo, 1990.
• DONDIS, D. A. La Sintaxis de la Imagen. Gustavo Gili Ed., Barcelona, 1976.
• DORFLES, D. Elogio da Desarmonia. Livraria Martins Fontes Ed., Lisboa, 1988.
• LASEAU, P. La Expresión Gráfica paraArquitectos y Diseñadores. Ediciones G. Gili, Mexico,
1982.
• RASSMUSSEN, S. E. Arquitetura Vivenciada. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1986.
• WONG, W. Fundamentos del Diseño Bi y Tridimensional. Gustavo Gili Ed., Barcelona, 1982.
• ZEVI, B. Archictetura in Nuce: Uma Definição de Arquitetura. Livraria Martins Fontes Ed.,
Lisboa, 1979.
• ZEVI, B. Saber Ver A Arquitectura. Arcádia Ed., Lisboa, 1966
CONTEÚDO DO CADERNO DIDÁTICO:

APRESENTAÇÃO
CAPÍTULO 1 TAMANHO, MEDIDA E ESCALA
CAPÍTULO 2 PERCEPÇÃO VISUAL DA FORMA
CAPÍTULO 3 EQUILÍBRIO
CAPÍTULO 4 ORGANIZAÇÃO DA FORMA E DO ESPAÇO ARQUITETÔNICO
CAPÍTULO 5 PROPORÇÃO: SEÇÃO ÁUREA E TRAÇADO REGULADOR

ANEXO 1 INICIAÇÃO ARQUITETÔNICA: TEXTO DE LUCIO COSTA


ANEXO 2 COMPOSIÇÃO DA FORMA ARQUITETÔNICA
ANEXO 3 ANÁLISE GRÁFICA
ANEXO 4 MONUMENTO AOS PRACINHAS: DEPOIMENTO DO ARQUITETO
ANEXO 5 ESQUEMAS PARA EXECUÇÃO DE MODELOS
ANEXO 6 PEQUENAS ENCADERNAÇÕES

NOTA:
Este Caderno Didático é um resultado da Pesquisa Integrada do Departamento de Análise
e Representação da Forma – FAU / UFRJ: “Contribuições para a Formação em Arquitetura:
Ensino de Fundamentos, Metodologia e Aplicação” (S.A.G.: 320.101.1003-0, código de registro
no SIGMA: 3674).
Participaram na sua elaboração os professores José Barki, James Shoiti Miyamoto, Beatriz
Santos de Oliveira, Ananias de Assis Godoy Filho, Giselle Arteiro Nielsen Azevedo e Maurício
Lima Conde.
A redação final, as ilustrações originais, a diagramação e a formatação foram realizadas
pelo professor José Barki.
Este Caderno Didático está disponível para download no formato PDF, documento
multiplataforma da aplicação ADOBE Acrobat Reader, na página da FAU: http://www.fau.ufrj.br/

BIBLIOGRAFIA GERAL SIMPLIFICADA

• ALEXANDER, C. Notes on Synthesis of the Form.


• ALEXANDER, C et alii. Timeless Way of Building.
• ALEXANDER, C. & CHERMAYEFF, S. Community and Privacy.
• ALEXANDER, C. et alii. A Pattern Language.
• AMERICAN INSTITUTE OF PLANNERS. “The Practice of Urban Design: Guide Lines for
The Visual Survey”. In Urban Design: The Architecture of Towns and Cities.
• AMERICAN INSTITUTE OF PLANNERS. “The Practice of Urban Design: Some Basic Prin-
ciples”. In Urban Design: The Architecture of Towns and Cities.
• ARHEIM, R. Arte e Percepção Visual: Uma Psicologia da Visão Criadora.
• ARNHEIM, R. “Buildings as Percepts”. In Via 6 Architecture and Visual Perception Journal of
The Graduate School of Fine Arts University of Pennsylvania.
• ARNHEIM, R. El Pensamiento Visual.
• ARNHEIM, R. La Forma Visual de la Arquitectura.
• ASHIHARA, Y. El Diseño de Espacios Exteriores.
• BACHELARD, G. A Poética do Espaço.
• BACON, E. N. Design of Cities.
• BARKER, G. H. Análisis de la Forma: Urbanismo y Arquitectura.
• BARKER, G. H. Le Corbusier an Analysis of Form.
• BLOOMER, K. C. & MOORE, C. W. Body, Memory and Architecture.
• BOUDIN, P. Sur L’Espace Architecturale.
• BROADBENT, G. Design in Architecture.
• BROADBENT, G. et al. (Ed.) Meaning and Behavior in the Built Environment.
• BUTTLAR, A. V. et al. “The Visual Value of Historic Architecture”. In CROSBY, T. (Ed.) How
to Play the Environment Game.
• CHING, F. D. K. Architecture: Form, Space & Order.
• CLARK, R. H. et alli. Arquitectura:Temas de Composicion.
• COELHO NETTO, J. T. A Construção do Sentido em Arquitetura.
• COLQUHOUN, A. Modernidad y Tradición Clásica.
• COUTINHO, E. O Espaço da Arquitetura.
• CULLEN, G. El Paisaje Urbano.
• DEL RIO, V. Introdução ao Desenho Urbano no Processo de Planejamento.
• DONDIS, D. A. La Sintaxis de la Imagen.
• DORFLES, D. Elogio da Desarmonia.
• DREXLER, A. The Architecture of the Ecole des Beaux - Arts.
• FOCILLON, H. La Vie des Formes.
• FRACCAROLI, C. A Percepção da Forma e sua Relação com o Fenômeno Artístico: O Problema
Visto Através da Gestalt (Psicologia da Forma).
• FUSCO, R. La Idea de Arquitectura.
• GIBBERD, F. Town Design.
• GIBSON, J. J. The Perception of the Visual World.
• GREGOTTI, V. El Territorio de la Arquitectura.
• GRILLO, P. J. Form, Function & Design.
• HALL, E. T. A Dimensão Oculta.
• HESSELGREN, S. El Lenguaje de la Arquitectura.
• HOCHBERG, J. “Visual Perception in Architecture”. In Via 6 Architecture and Visual Percep-
tion Journal of The Graduate School of Fine Arts University of Pennsylvania.
• KAUFMANN, E. Architecture in the Age of Reason.
• KEPES, G. Education of Vision.
• KEPES, G. Language of Vision.
• KOBERG, D. et alli. The Universal Traveler.
• LASEAU, P. La Expresión Gráfica paraArquitectos y Diseñadores.
• LYNCH, K. A Imagem da Cidade. (The Image of the City).
• LYNCH, K. Good City Form.
• LYNCH, K. Site Planning.
• MAHFUZ, E. C. Ensaio sobre a Razão Compositiva.
• MARCOLLI, A. Teoria del Campo: Corso de Educazione alla Visione, Corso di Metodologia
della Visione.
• MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção.
• MILLON, H e LAMPUGNANI, V. M. ed. Rinascimento da Bruneleschi a Michelangelo: La
rappresentazione Della’ Archetettura.(Catálogo Geral da mostra realizada em Veneza março/
novembro 1994).
• MOORE, C. W. & ALLEN, G. Dimensions: Space, Shape and Scale in Architecture.
• MULUCY, F. Graphic Perception of Space.
• MUNARI, B. Design e Comunicazione Visiva.
• NORBERG-SCHULZ, C. “El Significado en Arquitectura”. In JENCKS, C. & BAIRD, G.
(Ed.) El Significado en Arquitectura.
• NORBERG-SCHULZ, C. Existencia, Espacio y Arquitectura.
• NORBERG-SCHULZ, C. Intentions in Architecture.
• PANERAI, P. et al. Éléments D’Analyse Urbaine.
• PAULY, D. Ronchamp: Lecture d’une Architecture.
• PENNA, A. G. Percepção e Realidade.
• PENTEADO, O. Desenho Estrutural.
• PEVSNER, N. A History of Building Types.
• PROSHANSKY, H. M. et al. (Ed.) Environmental Psychology: Man and his Physical Setting.
• RAPOPORT, A. Aspectos Humanos de la Forma Urbana.
• RAPOPORT, A. The Meaning of the Built Environment: A Non-Verbal Aproach.
• RASMUSSEN, S. E. Arquitetura Vivenciada. (Experiencing Architecture).
• RISBERO, B. Modern Architecture & Design.
• ROSSI, A. Arquitetura da Cidade.
• ROWE, C The Mathematics of the IdeaL Villa and other Essays.
• ROWE, C. & KOETTER, F. Collage City.
• SCOLARI, M. “Thoughts and Aphorisms on Drawing”. In Rasegna Vol.VIII
• SENNET, R. La Conciencia del Ojo.
• SOMMER, R. Espaço Pessoal.
• TAFURI, M. Architecture and Utopia: Design and Capitalist Development.
• TUAN, Y. Espaço e Lugar: A Perspectiva da Experiência.
• TUAN, Y. Topophilia: A Study of Environmental Perceptions, Attitudes and Values.
• UNGERS, O. M. Architecture as Theme.
• WONG, W. Fundamentos del Diseño Bi y Tridimensional.
• ZEISEL, J. Inquiry by Design: Tools for Environment-Behavior Research.
• ZEVI, B. Archictetura in Nuce: Uma Definição de Arquitetura.
• ZEVI, B. Saber Ver A Arquitectura.
• ZEVI, B. The Modern Language of Architecture.
1
TAMANHO, MEDIDA E ESCALA

Desde a mais tenra idade a criança se deparará com situações de imensa curiosidade no
relacionamento do seu próprio corpo com o mundo que a cerca. A experiência visual, a informação
auditiva e táctil e a consciência do próprio corpo possibilitar-lhe-ão um gradativo conhecimento do
espaço e a experimentação pessoal de todos os seus componentes. Pequenos movimentos dar-lhe-
ão a necessária confiança e coordenação para ações mais largas. Aos poucos, noções relacionais e
comparativas de tamanho (pequeno x grande), distância (perto x longe) e peso (leve x pesado)
representarão uma definitiva conexão com o mundo exterior. Este aprendizado tornará mais claro
seu grau de acessibilidade a um novo mundo que se descortina. Os planos nos quais poderá se
movimentar serão fundamentais para intuir a formação de abstrações, como “frente x atrás”, “alto
x baixo”, “esquerdo x direito”, que passarão a determinar sua compreensão do espaço e o seu
sentido de posição.
O espaço definido por esses três eixos, se limitados por planos perpendiculares, forma uma
“caixa” retangular onde o indivíduo toma consciência de sua posição:
Eixo frente x trás: é o eixo da nossa marcha e é reforçado por nossa visão frontal. Pode ser
associado a “passado” e “futuro”, “conhecido”e “desconhecido”.
Eixo alto x baixo: a gravidade nos dá consciência de um eixo vertical, de um alto e um
baixo, de uma direção paralela à principal direção do nosso corpo e oposta a linha do
horizonte.
Eixo esquerdo x direito: é paralelo à linha do horizonte e é importante em função da simetria
e do equilíbrio (o eixo estabilizador).

Esta “caixa” reflete a estrutura física e mental do ser humano e constitui uma espécie de
arquétipo. A partir dessas referências se formam alguns padrões de demarcação territorial, que
tendem a definir comportamentos e limites necessários ao pleno convívio social, porque procuramos
medir e organizar o mundo a partir da compreensão de nosso próprio corpo.
Ao traçar-se um paralelo entre o processo de desenvolvimento humano individual e a evolução
dos grupos humanos no universo social, nos deparamos com uma situação pontuada de aspectos
convergentes, particularmente no âmbito da arquitetura. As concepções e formas de ocupação do
espaço, sejam elas puramente intuitivas ou sofisticadamente racionais, obedecem a uma certa lógica
evolutiva.
Os homens dificilmente serão capazes de sobreviver num ambiente natural, pois não possuem
orgãos ou instintos adaptados ao meio circundante. Premidos pela necessidade de proteção e abrigo
em um ambiente natural adverso esses seres foram capazes de superar suas limitações. A fixação à
terra de grupos humanos que tinham um comportamento nômade e extrativista, trouxe a necessidade
de organização produtiva da agricultura e criação de animais.
O processo civilizatório é um processo contínuo de transformação que conduz a construção
de uma espécie de “segunda natureza”. Em tese, tudo que o homem cria é para adaptar o mundo às
suas necessidades e à sua própria “imagem”. O tamanho de tudo o que fabrica está intimamente
ligado ao tamanho de de seu próprio corpo. Assim, adotou durante muito tempo medidas de partes
de seu próprio corpo como unidade de medida.
A noção de territorialidade e demarcação espacial e a conseqüente fixação sedentária
ensejaram também a sofisticação das construções. Aos poucos, o empirismo na geração e organização
dos espaços ocupados pelo homem foi dando lugar ao domínio do processo construtivo e à
delimitação da propriedade fundiária. O perverso e irretroativo domínio da propriedade representou
a singular oportunidade de existência de uma classe dominante, opressora e com regalias
supostamente divinas. Assim, o surgimento dos rudimentos das unidades de medidas, se por um
lado, vai representar a possibilidade de uma organização humana ampla, racional e evolutiva, por
outro, enseja a oportunidade de contabilizar sofrimento e exploração.

MEDIDA

Se o conceito de tamanho vai necessariamente implicar em uma relação ou comparação


subjetiva com o nosso próprio corpo, devemos compreender o conceito de medida (ou dimensão)
como uma variável independente, não necessariamente geométrica, que se relaciona objetiva e
concretamente com alguma referência abstrata inventada pelos homens para não só compreender,
mas para melhor dominar o mundo que o cerca. A idéia de medida ou dimensão, no seu sentido
estrito, diz respeito a uma grandeza física mensurável de uma extensão (comprimento, altura, largura,
temperatura, massa, etc.) de um corpo ou objeto.
Se o espaço abrange tudo o que nos cerca, está também nos intervalos vazios entre corpos,
partes de um corpo, ou entre objetos. As primeiras unidades de medida foram concebidas a partir de
intervalos de espaço baseados no corpo humano: passadas, braços estendidos, pés, palmos e
polegares. No início era suficiente medir um espaço contando passos, por exemplo. Mas com o
tempo foi necessário estabelecer padrões definidos de medida que fossem comuns a todos. Os
padrões, em geral, obedeciam às dimensões do corpo de um rei ou imperador, que eram depois
reproduzidas em réguas a serem utilizadas por todos. Mais tarde, quando os homens se sentiram
senhores da natureza, os padrões passaram a tomar como referência as dimensões da Terra, ou seja,
passaram a se relacionar com o campo de ação dos indivíduos.
Em 1799, os revolucionários franceses estabeleceram o metro padrão. Convencionou-se
que seria igual a um décimo-milionésimo da distância do Pólo Norte ao Equador. Apesar desta
definição um tanto abstrata, o metro, dentre as muitas formas de medida inventadas pelos
revolucinários que caíram em desuso, talvez tenha se difundido como padrão universal de medida
devido ao fato de corresponder aproximadamente ao comprimento do braço esticado e ombro, uma
referência de dimensão que foi sempre muito usada para medir tecidos.
Devido a sua ampla utilização, o metro é normatizado como unidade mundial, ou seja, é
considerado um padrão do sistema internacional de medidas. No entanto, em países de língua inglesa
não é habitualmente utilizado.
Em 1960, o metro foi definido com grande precisão por meio de uma longitude de onda de
uma linha específica de um espectro atômico: “é 1.650.763,73 longitudes de onda em um vazio de
radiação correspondente a transição entre os níveis 2p 10 e 5d5 do átomo de kripton-86”. Em 1983,
na 17 a Conferência de Pesos e Medidas o definiram de um modo menos críptico: “longitude do
trajeto percorrida em um vazio pela luz durante 1/299.792.458 de segundo”.
Em textos de língua inglesa, a definição de metro é, por vezes, ridicularizada. O critério de
normatização da dimensão do metro, de fato, parece sofrer, pelo menos aos profissionais que não
lidam ou necessitam de um determinado grau de precisão superlativa, de um formalismo exagerado.
Contudo, devemos lembrar que as características do metro são, de certa forma, similares às do
cúbito. Durante milhares de anos o cúbito egípcio, concebido em 3000 a.C., foi uma unidade de
medida padrão. Um cúbito se extendia do cotovelo até a ponta dos dedos do faraó da época,
aproximadamente 524mm, e se subdividia em 28 partes. Ou seja, deriva de partes do corpo humano
e serviu, com estas características, convenientemente, por séculos, na medição, devido aos seus
apelos de invariabilidade e imediatismo, tanto quanto os tão propalados pé e polegada.
As primeiras unidades de medidas, em geral, se referenciavam inicialmente às ações humanas
ou às medidas reais. Mediam-se exageradas áreas e extensões que indivíduos cobriam ou percorriam
em uma dada relação de tempo, com a utilização de unidades, como acre e légua, e extensões de
objetos em função de partes dos corpos da realeza, como, palmo, pé e polegada.
Dentre estes “invariáveis e imediatos” sistemas de referência alguns caíram em relativo
desuso, outros permaneceram até os nossos dias. Por exemplo:

Acre: Superfície de terra que se pode ceifar em um dia de trabalho. O acre inglês e americano
eqüivale a 40,47 ares.
Are: Unidade de medida agrária equivalente a 100 m2.
Braça: Unidade de medida de comprimento equivalente a 10 palmos, ou 2,2 metros.
Cúbito: Comprimento do braço, medido da articulação do cotovelo até o final do dedo
médio da mão correspondente. Unidade de medida de comprimento equivalente a
aproximadamente 524 mm.
Légua: Originalmente, comprimento itinerário que se pode caminhar “normalmente” em 1
hora, continuamente. Unidade itinerária de percurso equivalente a 3.000 braças, ou 6.600
metros.
Palmo: Originalmente, comprimento aproximado do palmo do nobre (rei, imperador etc.)
em gestão. Unidade de medida de comprimento equivalente a 8 polegadas, ou 22 cm.
Pé: Originalmente, comprimento aproximado do pé do nobre (rei, imperador etc.) em gestão.
Unidade de medida de comprimento equivalente a 12 polegadas, ou 30,48 cm.
Polegada: Originalmente, comprimento aproximado da 2a falange do polegar do nobre (rei,
imperador etc.) em gestão. Unidade de medida de comprimento equivalente a 2,75 cm.
O mundo que temos ao alcance da mão — aproximadamente a escala de um metro — é o
mundo de quase todos os artefatos e das formas de vida mais conhecidas. Não existe nenhum
edifício que por si só ultrapasse a escala de um quilômetro e nenhuma forma arquitetônica, desde
as pirâmides, chega a ser tão grande. Limites semelhantes restringem igualmente os seres vivos. As
mais gigantescas árvores dificilmente ultrapassam os cem metros, não existem e nem nunca existiram
animais tão grandes. Os menores artefatos que podemos apreciar ou utilizar são da ordem do décimo
de milímetro. O domínio do familiar está coberto com seis ordens de magnitude.
A noção de medida é fundamental para a compreensão e definição do ambiente que nos
cerca. No entanto, faz-se necessário levantar alguns questionamentos quanto ao seu uso, no sentido
figurado, nas muitas disciplinas que tratam do ambiente físico. Tanto as ciências exatas como as
humanas ou sociais fazem uso das mais variadas representações para compreender o mundo real
através de construções culturais.
Na maioria das vezes — já que o argumento, advindo das ciências exatas, de que não podemos
conhecer algo a não ser que possamos dimensioná-lo, é muito forte e persuasivo — o real é
mensurável. Entretanto, continua sendo muito difícil encontrar esquemas analíticos racionais que
satisfatoriamente “meçam” aspectos perceptivos espaciais, a qualidade da vivência humana, de um
sentimento ou até mesmo de uma resposta estética. Quando comentamos que determinada
composição é “pesada” o conceito deve ser entendido no seu sentido figurado. Quando isto ocorre,
remetemo-nos a uma certa subjetividade de análise. O quão “pesada” é uma composição é algo
complexo demais para ser estabelecido: 10%? 20%? 30%? Para esclarecer um pouco mais vejamos,
por exemplo, outra questão que surge quando nos deparamos com uma planta baixa. Em termos
puramente gráficos, em geral, nos referimos a ela como um desenho bidimensional. Porém, a
representação informa uma série de situações que extrapolam a questão planimétrica. A riqueza do
espaço tridimensional não deve ser trivializada por uma despreocupação com as infinitas situações
de projeto e o foco perigosamente desviado para uma rígida e rotineira referência às coordenadas
X, Y e Z.
A capacidade de apreensão espacial compreende algumas limitações inerentes ao próprio
ser humano. O que significa que dentro de uma certa relação “distância-velocidade”, cuja referência
é obviamente, a escala humana, desenvolvemos comportamentos, avaliamos situações e prevemos
atitudes. Em linhas gerais, nos espaços urbanos conseguimos ter uma certa sensação de intimidade,
dentro de limites em que reconhecemos rostos e percebemos gestos. Dificilmente os espaços urbanos
excedem o limite de reconhecimento das ações humanas. Embora suas medidas variem de indivíduo
para indivíduo, o ser humano — sobretudo, sua altura — é compreendido como uma referência de
escala.

ESCALA

O sentido do termo escala é muito variável. Para o matemático, o meteorologista, o cartógrafo,


o músico, o biólogo e outros, a palavra escala ganha diferentes significados. Em arquitetura, a
escala tem um sentido de relação. O arquiteto se refere à “escala do monumento” ou “este edifício
não está na escala”, ou ainda “ a escala de uma casa de cachorro é o cachorro”. No entanto, foi
observado através das definições de vários autores que a noção de escala em arquitetura é
freqüentemente confundida com a noção de proporção, sendo aquela explicada por esta e vice-
versa, portanto é necessário esclarecê-las.
Proporção, num sentido estritamente matemático, é uma relação de igualdade entre razões.
Em arquitetura, como veremos mais detalhadamente num outro capítulo, proporção é a relação
entre as medidas de um edíficio ou de uma parte dele com outras medidas do mesmo edifício. Neste
caso, a medida se efetua através do transporte do elemento de um espaço a outro elemento do
mesmo espaço, sendo o conjunto considerado como um sistema fechado.
As proporções de uma caixa de fósforos, sozinhas, não nos permitem conhecer o tamanho
de tal caixa. Para medí-la, é necessário o transporte de um elemento da caixa a um elemento exte-
rior a ela, cujo tamanho seja conhecido.
Escala, para os arquitetos, vai implicar numa relação entre as medidas de uma edificação
ou espaço construído com alguma referência dimensional externa àqueles objetos que
necessariamente também vão reconhecer o tamanho de uma figura humana e de suas possibilidades
de ação. Enquanto uma proporção se refere a uma relação de equivalência puramente matemática,
o conceito de escala deve ser compreendido como um recurso que pode nos dar noções razoavelmente
precisas de condições relacionais e comparativas de tamanho (pequeno x grande) e de distância
(perto x longe).
A necessidade de se fazer uso de uma escala surge quando os arquitetos passam a elaborar
o projeto de suas obras longe dos canteiros de construção. Ou seja, quando a concepção arquitetônica
precede a obra construída. Na elaboração do projeto da futura edificação o arquiteto terá que
necessariamente representar esta edificação. Em geral, as representações de que os arquitetos
fazem uso se relacionam àquelas fases reconhecidas como fundamentais para a operação projetual:
formação da imagem da edificação (croquis, esboços, gráficos, modelos e maquetes); comunicação
codificada (desenhos técnicos de precisão) visando uma correta execução.
Devido a impossibilidade e/ou inadequabilidade física de se representar determinado objeto,
através de recursos gráficos, representações virtuais e modelos tridimensionais, em suas dimensões
reais, utilizamos uma relação proporcional. Este termo aqui usado no seu sentido matemático,
converterá situações reais para dimensões compatíveis com as limitações do sistema de representação
que se pretenda utilizar. Ou seja, um quadrado que meça em valores absolutos 6cm x 6cm pode
representar um compartimento 50 vezes maior, que medirá 3m x 3m em valores reais, diremos
então que utilizamos uma escala de 1:50.
Pode-se reduzir ou ampliar determinado corpo ou objeto, conforme a conveniência de
comunicação ou visualização, que uma escala vai possibilitar à determinação das dimensões reais
deste corpo ou objeto ou de partes dele.
No entanto, alguns autores como Philip Boudon vão argumentar que para explicar os espaços
que os arquitetos concebem não é suficiente analisar o espaços físicos construídos ou de suas
representações. Um dos problemas centrais da arquitetura é a da relação entre um pensamento
abstrato e um espaço sensível, real. O que difere um quadrado que se encontra no pensamento do
arquiteto daquele que se encontra no pensamento do geômetra é o seu tamanho, portanto é uma
noção especificamente arquitetônica de escala que estabelece a diferença fundamental entre as
duas linhas de pensamento.
Analogicamente à escala do cartógrafo, que rege a passagem de um espaço real e existente
ao espaço de sua representação, com a conservação de suas proporções, a escala do arquiteto é a
regra de passagem entre dois tipos de espaço: um mental, o da concepção, e um físico, o da construção.
É a esse conjunto que que Boudon vai definir como espaço arquitetural.
Enquanto a proporção é medida em um sistema fechado e trata das relações das partes de
um edifício em um único espaço, a escala supõe dois tipos de espaços, com passagem de um a
outro, segundo uma regra de projeção.
De alguma maneira para os arquitetos, o conceito de escala também terá relação com a
percepção, pois é através desta ferramenta conceitual que o arquiteto encontra os meios para lidar
com o modo pelo qual as pessoas farão uso e se aproprirão dos espaços construídos. Provavelmente
os dois tipos de escala que mais ajudam na compreensão e caracterização dos espaços arquitetônicos
e urbanos são: a escala vinculada à circulação, ou seja a distância relacionada ao fluxo do movimento
e a escala vinculada à visão, ou seja o tamanho das coisas e de como essas coisas são relativamente
percebidas.O máximo de contato com um lugar é necessariamente atingido através do andar. As
limitações do andar são: a distância e velocidade.
A maior parte das pessoas no cumprimento de suas rotinas diárias, estão dispostas a andar
aproximadamente entre 500 e 1.000 metros, a uma velocidade média de 4 Km/h. É esta limitação
que define o tamanho dos principais agrupamentos ou áreas centrais em uma cidade. A área comercial
do centro, independente do tamanho da cidade é tão extensa, quanto a escala do andar permite. Os
centros e sub-centros de uma cidade, os grandes aeroportos internacionais, os “shopping centers” e
parques de diversão, estão sujeitos a este fato básico de escala urbana, quando o andar é o meio de
locomoção.
Como dito anteriormente, os espaços urbanos e arquitetônicos formam uma hierarquia de
tipos espaciais, baseados em seus tamanhos. Esta hierarquia estende-se desde o pequeno pátio
íntimo ao grande espaço urbano. Estas categorias de espaço urbano acabam por se estabelecer em
função não só da capacidade de deslocamento como também das possibilidades e limitações de
alcance da visão humana. Assim, um espaço urbano de até 30 metros pode transmitir uma sensação
de intimidade. Nessa distância um rosto humano ainda é reconhecível. Os grandes espaços urbanos
não podem exceder 180 metros sem parecerem grandes demais, a não ser que um elemento
intermediário seja introduzido para sustentar a característica do espaço. Esta é a distância que
limita o reconhecimento das ações das pessoas. Algumas poucas grandes avenidas e praças urbanas
excedem essa distância.

A FIGURA HUMANA REFERENCIAL

A fascinação de filósofos, artistas, teóricos e arquitetos pelas relações de medida no corpo


humano datam de muitos séculos. No único tratado completo de arquitetura que sobreviveu da
Antiguidade, Vitruvio, que viveu em Roma no século I A.C., definiu as primeiras relações de medida
do corpo humano e de suas implicações na construção. Séculos mais tarde, na Renascença, quando
este tratado foi redescoberto, Leonardo DaVinci realizou um famoso desenho que reproduz estas
relações de medida.
Para os exercícios práticos que iremos realizar na disciplina Estudo da Forma, utilizaremos
a ilustração a seguir a guisa de referência. É importante ressaltar que se trata de uma referência
genérica. Para aplicações específicas devemos recorrer a medidas antropomórficas mais precisas,
já que as dimensões reais das pessoas variam de acordo com a idade, o sexo, a etnia etc.
De qualquer forma deve-se sempre ter em mente dois limites básicos: o da passagem e o do
alcance. Para atendermos às necessidades da maioria das pessoas devemos considerar estas
diferenças. Ou seja, para solucionarmos problemas de projeto relativos a passagem devemos
considerar o limite das pessoas muito grandes, e analogamente para solucionarmos problemas de
projeto relativos ao alcance devemos considerar o limite das menores.

2,20 metros

1,76 metros

palmo

um metro
2
PERCEPÇÃO VISUAL DA FORMA

A pergunta que sempre nos fazemos quando apresentados a um novo campo de conhecimento
é sobre a relevância real de seu aprendizado para nossa vida. Sendo assim, por que estudar a percepção
visual?
Nós a estudamos para responder a perguntas que sempre se colocam para quem trabalha no
campo da criação das formas e da comunicação visual, tais como:
• Por que algumas formas agradam e outras não?
• Que fatores são determinantes para a legibilidade do que vemos e como usar estes fatores de
maneira a conseguir uma comunicação satisfatória do que queremos transmitir?

Estas perguntas começaram a ser respondidas de forma mais objetiva nos estudos realizados
por uma escola alemã de psicologia experimental, que iniciou-se com Wertheimer em 1910. A
Escola da Gestalt, como ficou conhecida, desenvolveu uma teoria da percepção com base em um
rigoroso método experimental que possibilitou a compreensão da maneira como se ordenam ou se
estruturam, no nosso cérebro, as formas que percebemos. Passaremos agora à exposição dos
princípios básicos ou leis de organização que, segundo os gestaltistas, explicam porque vemos as
coisas como vemos.
Anteriormente, a percepção foi conceituada como um processo interpretativo sobre dados
sensoriais. Distinguiam-se 2 fases:
1. Subordinada aos estímulos, esta primeira fase se daria em têrmos de apreensão de dados
isolados ou desconexos.
2. Sôbre estes dados operariam processos ditos perceptuais que, mobilizando a experiência
passada, os enriqueceriam dando-lhes sentido e organização.

A psicologia contemporânea, sob a influência da Gestalt em lugar de considerar sensação e


percepção como funções distintas, trata apenas da percepção, considera a sensação como conceito
que designa o conjunto de condições neurofisiológicas que se produz em nível periférico.

ORGÃO SENSORIAL
PERCEPÇÃO
COGNIÇÃO

ESTÍMULO
(Energia Física)

OBJETO
TERMINAIS NERVOSOS = SENSAÇÃO

A percepção será o processo mental que possibilitará a relação do homem com seu entorno.
Não deve ser entendida como um processo passivo de registro de estímulos, mas como um interesse
ativo da mente. A percepção é o meio pelo qual um indivíduo vai integrar aferições sensoriais para
construir uma representação, imagem ou esquema geral do mundo exterior adaptada ao seu esquema
corporal, ao seu sentido de orientação e posição, à sua capacidade de performance específica
(possibilidades de desempenho e comportamento) e à suas intenções de ação.
A percepção visual talvez seja o principal sentido na interação do homem com seu entorno.
Para uma melhor compreensão daquilo que é chamado de visão, é interessante que se tenha uma
idéia geral da maneira pela qual os sentidos processam estímulos luminosos. O olho funciona como
uma câmara fotográfica: a córnea é uma lente que projeta uma imagem bidimensional, reduzida e
invertida na retina. O processamento e transformação de estímulo luminoso em informação visual
tem sido objeto de intensas investigações nas mais diversas áreas do conhecimento. No entanto,
apesar de inúmeras pesquisas, questões básicas como distinção de cor, visão tridimensional, entre
outras, permanecem ainda sem uma resposta científica conclusiva.
A percepção visual por si só não é suficiente para conhecermos o mundo que nos cerca. A
apreensão da totalidade de um objeto ou situação terá que ser atingido por uma série de momentos
perceptuais acrescidos de outros atos do pensamento. Atribuir significado, registrar situações
significativas e grupá-las em classes segundo suas analogias, associar estas classes segundo relação
de acontecimentos, enriquecer programas de ação inatos, estabelecer experiência, selecionar dados,
imaginar, representar, simular, antecipar acontecimentos são funções ditas cognitivas. O termo
“cognição” vem do latim, “vir a saber”, e diz respeito aos processos de compreensão, de
entendimento, e ao produto (representação / imagem / sentido / significado) relativo à coisa conhecida.
É uma atividade mental distinta dos domínios da sexualidade e da afetividade.

PRINCÍPIOS BÁSICOS DA PERCEPÇÃO DA FORMA VISUAL

Para a teoria da Gestalt o fundamento básico da percepção visual é que qualquer padrão de
estímulo tende a ser visto de tal modo que, a estrutura resultante é tão simples quanto as condições
dadas permitem. Para a Gestalt, não percebemos estruturas difusas e confusas. Percebemos campos
estrutural e funcionalmente organizados, constituídos de figura e fundo, de tema e campo temático
ou, ainda, de formas e horizontes nos quais elas se recortam e em função dos quais se projetam
como unidades ou totalidades figurais.
As principais características da percepção visual podem ser resumidas da seguinte maneira:
• no processo perceptivo a assimilação é realizada em função de um contexto ou sistema de
referência, do qual se retiram algumas de suas propriedades;
• perceber pode implicar em decisão diante de uma situação marcada por um alto grau de
complexidade;
• a atividade perceptual fornece uma representação do mundo exterior empobrecida e orientada,
é uma forma de “simplificação” onde só aparece claramente aquilo que interessa ao indivíduo
em função de seu comportamento específico e de suas intenções.

ASPECTOS ESTRUTURAIS E FUNCIONAIS DO CAMPO PERCEPTIVO:

1. Só a figura possui forma sendo o fundo desprovido dela.


2. As linhas de contôrno que delimitam o componente figural do resto do campo pertencem à
figura.
3. Mesmo encoberto pela figura, o fundo parece continuar por detrás dela, sem se interromper
ou perder a unidade.
4. A figura é sempre percebida em plano mais próximo do perceptor
5. A figura constitui-se em componente privilegiado para evocação, pois é a parte mais bem
vista e dotada de maior condição de estabilidade.
6. No que concerne aos limites discriminatórios, as diferenças perceptíveis são maiores quando
produzidas sobre a figura.
7. Na superposição de 2 elementos de superfícies distintas e homogêneas e de tamanhos
diferentes, geralmente percebemos o menor elemento como figura.
8. Quando de dois campos de côres distintas e homogêneas, um é consideravelmente maior
que o outro e o encerra, o campo pequeno encerrado é geralmente percebido como figura

9. Se um contôrno divide um campo em parte superior e inferior, a parte inferior aparece mais
prontamente como figura.

10. As propriedades dos elementos figurais não são permanentes ou imutáveis (reversibilidade)

Albers, Structural Constellations


ORGANIZAÇÃO DE ESTRUTURAS PERCEPTUAIS
PREGNÂNCIA E BOA FORMA
Tôda nossa atividade perceptiva se subordina a um fator básico designado de Boa Forma
ou Pregnância. Uma figura pregnante é aquela que exprime uma característica qualquer, forte o
suficiente para destacar-se, impor-se e ser de fácil evocação.

Forma Forte = as partes não tem independência, são pregnantes, regulares e simétricas.

Forma Fraca = embora destacadas, são indecisas e as partes têm uma relativa autonomia.

FATÔRES COMPLEMENTARES DE COESÃO


Dada uma situação concreta, o ato de perceber absorve não só as unidades ou elementos que
a compõe, mas também, de modo imediato e em condições prioritárias as relações que entre elas se
estabelecem. Ao fatôr básico de Boa Forma se associam fatôres complementares que vão se constituir
nas condições através das quais têm consumação a forma privilegiada ou Pregnante.

• Fechamento ou Closura:
Tendência das formas incompletas para se completarem ou fecharam ganhando maior grau
de regularidade ou de estabilidade.

• Sequência ou Boa Continuidade:


Não obstante o entrecruzamento de linhas não se encontra dificuldade de destacá-las. A
nossa organização tende a se orientar para a continuidade da direção e movimento de uma unidade
linear, o que vai determinar a leitura de uma ou de duas figuras em determinadas organizações
formais lineares.

• Proximidade:
Tendência a perceber elementos reunidos a uma curta distância como um conjunto unificado.
• Semelhança:
Tendência a agrupar objetos ou caracteres, segundo sua igualdade ou semelhança,
estabelecendo grupos.

• Simetria:
Tendência a destacar elementos que guardam uma relação simétrica.

• Destino Comum:
Quando percebemos num campo objetos que se deslocam na mesma direção e com a mesma
velocidade, os apreendemos como um conjunto.

• Movimento:
Num campo constituido de estímulos inertes, a presença de um estímulo dotado de movimento
determina a instalaçãode um padrão que o favorece como elemento figural ou privilegiado.

PERCEPÇÃO DO ESPAÇO
• Direções Principais:
A largura e a altura são as principais dimensões de uma figura plana. O quadrado apoiado
sôbre seu vértice parece maior e com características distintas do que o outro que se apoia sôbre sua
aresta:

Nesta outra figura a linha vertical parece mais longa que a horizontal. A idéia desse
comprimento maior deve-se à dominância da vertical na estrutura do campo perceptual:

Experimentos feitos demonstraram que a linha vertical deveria ser 1/7 ou 1/8 mais curta que
a horizontal para serem percebidas igualmente.
• Linhas:
Linhas abertas e fechadas são limitadoras da forma. As fechadas não são percebidas como
entidades independentes de uma figura.
A percepção do comprimento de uma linha é um caso particular da percepção da magni-
tude. A percepção das partes não depende somente dos estímulos individuais. Ela é afetada pela
totalidade das relações que se estabelecem no campo perceptual.

• Superfícies:
A percepção de superfícies está condicionada à sua composição heterôgenea. Na ausência
dessa diferença de textura não se consuma a apreensão de superfície, vivendo-se um espaço diluído
e não localizável.

• Volume e Profundidade:
Superposição: se um objeto recobre parcialmente um outro, este é percebido mais distante e
outro mais próximo.

Tamanho: entre dois objetos de tamanhos diferentes, o maior parece mais próximo e o menor
mais afastado.

Paralaxe de movimento: os objetos mais distantes parecem acompanhar o movimento do


observador, enquanto os mais próximos se mostram dotados de movimento na direção oposta.
Nitidez relativa: entre 2 objetos que se mostram com graus diferentes de nitidez, o mais
nítido parece mais próximo.
Luz e Sombra: alguns padrões de luz e sombra convenientemente combinados fornecem
indicações de profundidade.

Perspectiva linear: o grau de convergência entre figuras correlaciona-se com a impressão de


distância.
Gradiente de tessitura ou textura: devido a geometria da situação espacial, uma tessitura
uniforme é projetada na retina de uma forma tal que, quanto maior a distância a que está da
retina, maior a densidade da tessitura na imagem na retina.

A TEORIA DA PERCEPÇÃO E A ESTRUTURA DA IMAGEM DO ENTÔRNO

A IMAGEM DO ENTÔRNO
• Posição, sentido de orientação e apropriação do espaço:
Como já visto no capítulo anterior, um espaço físico retangular é a concretização do esquema
corporal dos indivíduos, do seu sentido de orientação e posição. Da mesma maneira, o espaço
urbano que construímos é a concretização dos esquemas de apropriação do espaço, das nossas
necessidades de Localização, Deslocamento, e Compartimentalização.

x
• Apropriação do Espaço:
Quando o homem define e estabelece um lugar, de fato, concretiza um esquema fundamen-
tal de apropriação espacial:
Ação e Comportamento = Percepção + Experiência + Antecipação
Com esse esquema os indivíduos solucionam suas necessidades mínimas de localização,
deslocamento, e compartimentalização adaptando-as à sua natureza e possibilidades. Para alguns
psicólogos ambientais o espaço é um ambiente constituído de lugares ou cenários de comportamento
e ação (Behavior Settings). Na maioria das vezes, os elementos físicos que ali se encontram e os
percursos que se estabelecem, indicam os tipos de atividades que ali tem lugar e são o registro de
uma estrutura estável que abriga comportamentos extraindividuais específicos àquele ambiente
(Proshanski et al. 1970).
Tôda organização espacial como compreedida pelos indivíduos está baseada nos princípios
fundamentais de:
PROXIMIDADE Localização
CONTINUIDADE Deslocamento
FECHAMENTO Compartimentalização
• Espaço Existencial:
Sob uma ótica arquitetônica deve-se entender o espaço como uma das dimensões da existência
humana. Para Cristhian Norberg-Schulz “…da mesma maneira que se diz que a existência é espacial,
pode-se dizer que o espaço é existencial”. O espaço arquitetônico-urbano é a concretização desse
espaço existencial. Tem centros e direções próprias e existência independente de um observador
casual. Assim, os lugares que o homem constrói revelam uma das dimensões da sua existência,
porque não se pode dissociar os indivíduos do espaço: todas as ações humanas precisam
necessariamente encontrar um espaço para que possam ser realizadas.
Para Norberg-Schulz os elementos fundamentais do Espaço Existencial são:

GRUPAMENTO PROXIMIDADE CENTRO/LUGAR

FILEIRA CONTINUIDADE EIXO/CAMINHO

ANEL FECHAMENTO REGIÃO/DOMÍNIO

• Legibilidade (Imagem do Entôrno):


Um lugar é, na maior parte das vezes, “lido” e “entendido” através de sua “imagem”, da
representação mental daquilo que se construiu: nas ruas, nas praças e nos parques. Esta imagem
arquitetônica e urbana está associada à escala, proporção, tamanho, forma, materiais, cor, iluminação
etc., que variam em função não só dos aspectos físicos como também de fatores culturais. A
elaboração de uma “imagem mental” que reproduza a “forma” do entorno é estruturada a partir da
necessidade de se encontrar a casa, o lugar de trabalho, os lugares de encontro e diversão e os
melhores acessos de um ponto a outro. No entanto, o tamanho do entorno é tão grande que os
indivíduos são cegos às geometrias sutis que podem ter inspirado seu desenvolvimento. De acordo
com Kevin Lynch apreendemos e “lemos” um dado lugar a partir de alguns elementos físicos do
espaço real representados numa imagem mental como: Nós, Pontos de Referência, Limites,
Caminhos e Distritos. Ou seja, nossa compreensão coletiva e leitura de um dado lugar é baseada
naqueles elementos fundamentais do Espaço Existencial:
CENTRO/LUGAR Nós e Pontos de Referência
EIXO/CAMINHO Limites e Caminhos
DOMÍNIO/REGIÃO Distritos

Para Lynch a legibilidade de um lugar é a clareza ou facilidade com que partes ou elementos
da paisagem urbana são identificáveis neste conjunto de elementos fundamentais.

• Vivência do Entôrno
Um espaço urbano apresenta sempre um potencial de informação muito além da nossa
capacidade de apreeensão e processamento. Nunca é totalizável e só pode ser compreendido ou
conhecido parcialmente através de longas seqüencias temporais. O acumulo de informações a partir
de uma série sucessiva de momentos perceptivos resulta na compreensão paulatina dos diversos
elementos físicos do entôrno e de sua esquematização como imagem mental.
Gordon Cullen no seu livro Townscape (Paisagem Urbana) propõe a noção de visão serial
para ilustrar a maneira complexa e fragmentada pela qual os cenários urbanos se revelam ao nosso
olhar.

ESTRUTURA DE SÓLIDOS E ESTRUTURA DE ESPAÇOS


Comparando a estrutura típica das cidades tradicionais européias com a estrutura proposta
pela arquitetura moderna Colin Rowe no seu livro Collage City conclui que: “elas se apresentam
como leituras reversíveis de um diagrama ilustrativo da Gestalt demonstrando as flutuações do
efeito figura e fundo. Uma é quase branca, a outra quase tôda preta: na primeira o arranjo de sólidos
num imenso vazio, na segunda um arranjo de vazios escavados num sólido. Nos dois casos o fundo
promove diferentes categorias de figura, na primeira o objeto, na segunda o espaço.”
A partir desta observação propõe uma metodologia de avaliação da qualidade da textura urbana
atrvés da utilização de desenhos de figura e fundo. Na estrutura de sólidos, o observador é livre
enquanto que numa estrutura de espaços as vistas tendem a ser controladas. Na estrutura de espaços,
os vazios são percebidos como “corpos espaciais”
Comparação entre o projeto de Saint-Dié (LeCorbusier) e a cidade de Parma.

Comparação entre Estrutura de Sólidos, com o observador livre, e


Estrutura de Espaços, com a praça Stanilas em Nancy tratada como um “corpo espacial”.
A ARTICULAÇÃO DE FACHADAS E DE ELEMENTOS CONSTRUTIVOS:
A IMPRESSÃO DE ALTURA, LARGURA E PROFUNDIDADE
Com base na teoria da percepção, o arquiteto pode utilizar recursos construtivos para
modificar a maneira pela qual os indivíduos percebem um determinado ambiente. Dependendo dos
elementos arquitetônicos que utiliza e da maneira como os articula, pode dar àquele lugar um
caráter monumental e grandioso ou ao contrário um caráter aconchegante; pode destacar uma
edificação ou contextualizá-la; pode, até mesmo, corrigir uma condição ambiental desfavorável
tornando o lugar mais agradável.
As ilustrações a seguir, propostas por Dieter Prinz no seu livro Städtbauliches Gestalten
(Configuração Urbana), demonstram como se pode alterar a impressão de altura, largura e
profundidade num espaço urbano.
• Articulação de Elementos que Acentuam ou Reduzem a Impressão de Altura:
• Articulação de Elementos que Acentuam ou Reduzem a Impressão de Largura:
• Articulação de Elementos que Acentuam ou Reduzem a Impressão de Comprimento:
O CAMPO VISUAL

10°

54°

10°

*d
h =D/2
27°

10°

*Cálculo da menor dimensão dos elementos de detalhe


d = menor dimensão
D≤ , ou seja d ≥ 0,000291 X D
tg1°

D = h (Detalhes da edificação)

D = 2h (Visão de conjunto da edificação)

D = 3h (Visão de conjunto da edificação + ambiente próximo)

A 1000m percebemos um indivíduo, a 25m o reconhecemos e a 5m vemos detalhes do seu rosto

Praças e espaços externos:


•25m na sua menor dimensão para ambientes íntimos e agradáveis
•50m na sua menor dimensão para manter a “escala humana”
•Dimensões máximas das praças nas cidades européias antigas = 50 X 150m (Camilo Sitte)
3
EQUILÍBRIO

O principal objetivo de se estudar as qualidades particulares da experiência visual é aprimorar


nossa sensibilidade inata e tentar educar o nosso olhar. Assim podemos alargar as possibilidades de
contato com a realidade que nos cerca, aprender a ver e a melhor perceber. Com isso, se espera
atingir condições adeqüadas ao desenvolvimento do nosso potencial criativo, o que nos permitirá
intervir nesta realidade com maior possibilidade de acerto.
Como já vimos no capítulo anterior, a experiência visual humana é fundamental no
aprendizado que nos permite compreender, reagir e intervir no meio ambiente. No entanto, a
capacidade para compreender analiticamente aquilo que “entendemos” através dos olhos está
normalmente adormecida, mas pode, e deve, ser despertada. Acontece com freqüência vermos
certas qualidades num objeto, numa edificação ou mesmo numa obra de arte sem poder traduzí-las
em palavras ou em desenhos. A razão da nossa dificuldade se dá porque sem uma certa “educação”
visual não conseguimos organizar analítica e racionalmente essas qualidades e características, que
são compreendidas visualmente, para poder expressá-las gráfica ou verbalmente.

DETERMINANTES DA LINGUAGEM VISUAL


A mais importante determinante física do ser humano, que de alguma forma define sua
estrutura psíquica e tem influência direta na experiência visual, resulta da sua necessidade existencial
por estabilidade e equilíbrio corporal. Precisamos ter os pés assentes em solo estável e com um
certo grau de certeza que vamos permanecer com a espinha ereta para podermos iniciar qualquer
ação ou movimento. Já foi visto que o constructo mental definido pelos eixos “frente x atrás”, “alto
x baixo” e “esquerdo x direito”, vai se constituir na relação básica do homem com o meio ambiente
ao determinar sua compreensão do espaço e o seu sentido de posição. A internalização psíquica da
verticalidade do corpo contra uma base estável paralela a um horizonte reconhecido, resulta na
noção de equilíbrio, provavelmente, a base consciente e a referência mais forte para o juízo visual.

A expressão deste determinante estabilizador, definido pelos eixos vertical e horizontal que
operam na determinação da “linguagem” visual das coisas produzidas pela inteligência humana,
vai representar o equivalente físico dos processos psicológicos que organizam os estímulos visuais.
DINÂMICA DA EXPERIÊNCIA VISUAL
Rudolf Arnheim é o autor de um importante, e muito citado, livro onde é bem sucedido na
aplicação da teoria da Gestalt para a interpretação e entendimento das chamadas artes visuais. No
texto de Art and Visual Perception (Arte e Percepção Visual), publicado pela primeira vez em 1962,
Arnheim está em busca da sintaxe desta linguagem visual como empregada nas obras de arte que o
homem produz.
Seu argumento fundamental parte da premissa que ver algo implica em determinar um
conjunto de relações no contexto de uma totalidade: localização, formato, orientação, disposição,
tamanho, cor, luminosidade, etc. Não se percebe nenhum objeto como único ou isolado, percebemos
totalidades, campos estruturalmente organizados constituídos de figura e fundo.
Noutras palavras, a experiência visual é dinâmica e todo ato de visão é um juízo visual de
relações espaciais. Não é preciso medir a figura abaixo para percebermos imediatamente que o
disco preto sobreposto ao quadrado branco está fora de centro: a posição excêntrica do disco é uma
das propriedades visuais do padrão reconhecido.

Não observamos primeiro o espaço entre o disco e a borda esquerda, e em seguida


transportamos essa apreeensão da imagem para o outro lado, comparando visualmente as duas
distâncias. Nossos olhos “simplificam” a figura numa totalidade.
Os aspectos que o olho capta não são unicamente locacionais ou topográficos. Ao olharmos
o disco, podemos observar que não só ocupa um determinado lugar, mas que também parece
manifestar uma espécie de impulso para uma direção particular. Ainda que fixo e incapaz de
movimento real, o disco, não obstante, exibe uma certa tensão em relação ao quadrado que o envolve.
Para Arnheim a idéia de equilíbrio físico — estado no qual duas forças, agindo sobre um
corpo, compensam-se quando forem de igual resistência e aplicadas em direções opostas — pode
ser analogamente aplicável para o equilíbrio visual. O que uma pessoa percebe não é apenas um
arranjo de cores e formas e tamanhos. Vê, antes de tudo, uma interação de tensões. Ou seja,
percebe tensões que existem como forças, já que possuem direção, intensidade e ponto de aplicação.
Arnheim acredita que estas tensões podem ser descritas também como forças psicológicas, porque
as “sentimos” psicologicamente na nossa experiência visual.
Se considerarmos o quadrado branco como fundo, o suporte material, e o disco preto como
figura, poderemos verificar que este fundo — que nas artes visuais foi também denominado de
plano básico — aparentemente vazio, oculta uma complexa estrutura. Podemos com o disco revelar
esta estrutura, tal como a limalha de ferro que revela as linhas de força de um campo magnético. Se
dispusermos o disco em diferentes lugares do plano básico, vamos notar em alguns pontos um
aparente repouso, e em outros um impulso em alguma direção. Sua situação pode aumentar a atenção
que damos à figura ou ao contrário, diminuí-la, pois há posições que determinam impulsos tão
equívocos e ambíguos que a vista parece não conseguir se decidir por uma direção particular, o que
produzirá um efeito incômodo e desagradável
Se além de um disco adicionarmos uma linha diagonal, vamos verificar que, para a maioria
dos observadores o disco da esquerda parece dotado de um impulso para cima, enquanto o da
direita parece se dirigir para baixo. Sem a linha o disco pareceria em repouso.

O entendimento desta dinâmica nos auxiliará a compreender a estrutura oculta do plano


básico, que é o suporte ordenador da figura, e servirá como referência para determinar o equilíbrio
da organização proposta.

O PLANO BÁSICO
Ao “esqueleto” desta estrutura oculta do plano básico denominamos mapa estrutural. O
centro é o ponto de maior estabilidade e repouso, onde todas as forças se anulam e se equilibram
(principal lugar de atração e repulsão). Em geral qualquer localização que coincida com uma linha
do mapa estrutural irá introduzir um fator de estabilidade.

O artista plástico Kandinsky — professor da BAUHAUS durante onze anos — resumindo a


essência da sua contribuição pedagógica concebeu, em seu livro Punkt und Linie zu Fläche (Ponto
e Linha sobre o Plano) de 1926, uma das primeiras teorias da criação da forma. Ainda que possa ser
criticável pelo seu hermetismo e subjetivismo, exerceu enorme influência nas proposições teóricas
surgidas posteriormente. Foi Kandinsky quem primeiro sugeriu um estudo específico do suporte
dos elementos figurais, que denominou de Grundfläche ou, como geralmente traduzido, plano
básico. Na sua proposta relaciona metaforicamente o suposto condicionamento da visão nas culturas
ocidentais pelo proceso de leitura da esquerda para direita e de cima para baixo.
Visualmente, a assimetria lateral manifesta-se numa distribuição desigual de importância e
num vetor dinâmico. Isto é facilmente observado nas pinturas: os quadros mudam a aparência e
perdem o significado quando são observados pela imagem que projetam num espelho; isto acontece
porque os quadros são também “lidos” da esquerda para a direita do campo visual.
Na atualidade alguns pesquisadores sugerem que esta seria uma tendência natural comum a
todos os seres humanos e anterior ao aprendizado da leitura. Estudos revelam que a visão do lado
direito é mais articulada, o que poderia explicar por que os objetos que aparecem ali são mais
visíveis. Por outro lado, a atenção aumentada para o que se desenrola à esquerda compensa essa
assimetria, e o olho se moveria naturalmente do ponto que primeiro chama a atenção para a área da
visão mais articulada.
Entrada

Saída

Kandinsky subdivide um plano básico objetivo, um quadrado, em quatro campos de força:


o superior (s), o inferior (i), o da esquerda (e) e o da direita (d) — ver figura a seguir. O campo
superior suscitaria a idéia de soltura moderada, a vinculação ou atração seria mínima. O campo
inferior suscitaria uma idéia oposta, de gravidade e a vinculação seria máxima. O campo da esquerda
teria características correspondentes ao campo superior em maior concentração. Analogamente, o
campo da direita teria características correspondentes ao campo inferior em menor concentração.
Kandinsky constata nos quatro limites condições de atração que diferem uma das outras por sua
eficácia, e graficamente vai representá-las com contornos de intensidade diferente.
s

e d

Depois de dividir o plano básico em quatro partes primárias, Kandinsky define um esquema
genérico de distribuição de “pressão” ou “atmosfera”. Neste esquema, as partes a e d encontram-se
em máxima oposição e a tensão resultante é chamada metaforicamente de “dramática”. Já as partes
c e b encontram-se em oposição moderada e a tensão resultante é, então, chamada de “lírica” — ver
figura a seguir.

a b

c d
A partir desta esquematização propõe o conjunto das principais direções compositivas:
(1) oposição “dramática”, (2) oposição“lírica”, (3) repouso “quente”, (4) repouso “frio”.

A discussão de posicionamento “superior x inferior” e “esquerda x direita” tem grande


valor nas decisões compositivas, já que diz respeito às diferentes impressões que podem ser sugeridas
pela localização distinta de elementos num campo visual. Além da influência exercida pelas relações
elementares do mapa estrutural, a dinâmica de uma composição pode ser atenuada ou aguçada por
determinadas posições.

PESO E DIREÇÃO
Para Arnheim dois outros fatores exercem influência significativa sobre o equilíbrio de uma
composição: o peso de cada elemento e a direção das forças visuais que o arranjo e configuração
destes elementos produz.
Na Física relaciona-se peso como a intensidade da força gravitacional que atrai objetos para
baixo. Nas artes visuais o significado de peso está relacionado com a importância do objeto e com
a sua capacidade de atrair o olhar, o que conseqüentemente vai influenciar o equilíbrio de uma
composição. As principais características que determinam o peso de um elemento são: posição,
orientação, formato, situação de isolamento, interesse intrínseco, cor e tamanho.
• Uma posição “forte” no mapa estrutural dará mais peso do que uma localizada fora do
centro ou fora das linhas estruturais;
• Elementos verticalmente orientados parecem mais pesados;
• Os formatos regulares e simples são, em geral, mais pesados que os irregulares;
• Uma forma isolada pesa mais do que outra de aparência semelhante circundada por outras
figuras;
• O interesse intrínseco de um elemento pode prender a atenção do observador, seja pela
complexidade formal ou por outras peculiaridades;
• As cores luminosas são mais pesadas que as escuras;
• Quando todos os outros fatores se equivalem, o maior elemento será o mais pesado
Várias características vão determinar a direção das forças visuais, dentre elas as mais
importantes são: a atração exercida pelo peso dos objetos vizinhos impondo uma direção a um
determinado elemento e a configuração dos objetos que pode definir uma direção ao longo do eixo
dominante de seu esquema estrutural.

ESTADO DE EQUILÍBRIO
Ao introduzirmos um segundo disco no quadrado, além das relações previamente observadas
outras irão surgir. Nos esquemas abaixo, se olhássemos os discos isoladamente, qualquer uma das
duas posições poderia parecer desequilibrada ou instável. Porém, juntos constituem um par, por sua
semelhança de configuração e tamanho, sua proximidade, direção visual e ainda, porque o conjunto
é o único “conteúdo” do quadrado: o par simetricamente localizado em relação ao centro do quadrado
imprime, então, um valor de estabilidade e equilíbrio à composição.

O mesmo par pode parecer demasiadamente desequilibrado, quando deslocado para uma
outra posição — ver figura a seguir. Como membros de um par, nossa tendência é percebê-los
simétricos, com valor e função equivalentes no todo. Contudo, a posição do disco inferior coincide
com o centro do quadrado, posição estável e proeminente, enquanto que a localização do disco
superior tem um valor menos estável. Assim, nossos olhos ficam em dúvida entre o julgamento
perceptivo da paridade dos discos e outro resultante dessa localização, que cria uma distinção de
peso entre os dois discos, e rompe com a direção visual.

Esse exemplo mostra que mesmo o mais simples padrão visual está fortemente relacionado
com a estrutura do espaço circundante, e que, o equilíbrio da composição pode ser ambígüo quando
a forma e a localização espacial entram em contradição.
Dispor objetos ou elementos figurais num dado espaço, significa estabelecer um conjunto
de relações de dependência, uma vez que a localização de cada um destes elementos vai conferir ao
todo um significado específico. Numa composição visual, esses elementos devem estar organizados
e distribuídos de tal modo que resulte num estado de equilíbrio.
Para Arnheim num arranjo equilibrado, todos os fatores como configuração, direção e
localização determinam-se mutuamente, de tal modo que nenhuma alteração parece possível, e a
totalidade é mais importante do que qualquer uma das partes Qualquer modificação poderá
comprometer a unidade, fragmentando a composição inicial. Já uma composição desequilibrada
parece acidental, gratuita e sem uma intenção compreensível, seus elementos apresentam uma
tendência para mudar de lugar ou forma a fim de conseguir alcançar um estado de equilíbrio,
tentando estabelecer uma relação de totalidade.
Nas composições equilibradas há uma relação de combinação entre tamanhos, proporções e
direções; as figuras se “prendem” umas às outras de tal modo que suas posições permanecem
imutáveis e cada uma delas é necessária para a compreensão do conjunto. Numa situação de
desequilíbrio, o olhar torna-se vacilante, não se pode ter certeza do que aquela figura quer transmitir.
É importante esclarecer que o equilíbrio não exige necessariamente uma condição de simetria
da composição. A simetria é apenas a maneira mais elementar de se conseguir equilíbrio.
Nas figuras abaixo a da esquerda é melhor equilibrada que a da direita. Cada elemento
permanece em seu lugar, todas as peças são necessárias, e não há posição ambígüa de nenhuma
delas que possa transmitir a sensação de instabilidade, de mudança de posição. Já na figura da
direita, as proporções baseiam-se em diferenças tão pequenas que deixam nos olhos a incerteza de
contemplar igualdade ou desigualdade, simetria ou assimetria, quadrado ou retângulo.

Equilibrar uma composição não é uma ciência, no entanto, seus determinantes básicos se
fazem mais evidentes quando são infringidos. Uma composição desequilibrada e desagradável chama
a atenção e é relativamente fácil explicar o porquê. Entretanto, é muito mais difícil explicar uma
boa composição.
Para qualquer relação espacial entre objetos há um arranjo apropriado ou “mais correto”,
que o olho pode estabelecer intuitivamente. Os arquitetos buscam constantemente esta “correção”
no arranjo das edificações e nos elementos que as compõem, procurando estabelecer uma distribuição
cuidadosamente equilibrada, agradável ao olhar. A maioria dos autores que tratam deste assunto
são unânimes ao afirmar que, embora todos os padrões visuais que podemos reconhecer tenham
um centro de atenção que pode ser teoricamente medido, nenhum método de cálculo conhecido é
tão imediato que possa substituir a noção de equilíbrio de um “olhar” treinado.
Mesmo assim, como veremos no próximo capítulo, os objetos produzidos pelo homem têm
uma organização ou estrutura interna sistematizada e racionalmente calculada que, na maioria da
vezes, está apenas implícita. Mas, ao atentarmos para seus limites, entendemos sua ordem oculta.
Na organização da forma arquitetônica, por exemplo, a geometria — que é um dos produtos
mais notáveis da capacidade de abstração e racionalização humana — terá uma presença inevitável
na ordenação de uma configuração geral e no interrelacionamento das partes.
4
ORGANIZAÇÃO DA FORMA E DO ESPAÇO ARQUITETÔNICO

Se for consultado algum dicionário, poderiam ser encontradas as seguintes definições para
os termos forma e espaço:
Forma Estrutura, organização e disposição das partes ou elementos de um corpo ou objeto.
Modo pela qual uma determinada coisa em um dado contexto se revela a nossa percepção.
São atributos de uma forma: sua configuração, seu tamanho, sua textura, sua côr e sua
localização.
Espaço Extensão do campo tridimensional que abrange tudo o que nos cerca. É onde as
coisas do mundo sensivel existem, e no qual nos deslocamos em três dimensões: esquerda
e direita, para frente e para trás e para cima e para baixo. Relacões de posição entre corpos.
Intervalo vazio entre corpos, partes de um corpo, ou entre objetos.
Estas definições não são suficientes para explicar a complexidade que esse tema tem para
os arquitetos. Da mesma maneira, este cápitulo não tem a pretensão de esgotar o assunto. Ao contrário,
estes apontamentos apenas vão introduzir alguns conceitos fundamentais da organização da forma
e do espaço arquitetônico e de suas implicações na concepção arquitetônica., que servirão para a
compreensão do livro texto recomendado para a disciplina: Arquitetura: Forma, Espaço e Ordem
de Francis D. K. Ching.
Além deste, recomenda-se a leitura dos seguintes livros: Saber Ver a Arquitetura de Bruno
Zevi, Arquitetura Vivenciada de Steen E. Rasmussen e LeCorbusier: Uma Análise da Forma de
Geoffrey Baker. Todos estes textos foram traduzidos para o português e estão publicados no Brasil.

A COMPREENSÃO DA FORMA: FORMAS REAIS E FORMAS IDEAIS


As formas reais são as coisas do mundo sensível e devem sua existência a causas físicas,
biológicas, funcionais e/ou finais, ou sócio-culturais. Neste universo real, forma e contexto são
interdependentes e complementares. Já as formas ideais são os modelos abstratos produzidos pela
imaginação humana. Estes modelos utópicos, inviáveis no mundo real, são perfeitamente regulares,
exatos em medida e contôrno, teoricamente fixos e estáveis e identicamente reproduzíveis. Formas
que independem do seu contexto, pois o espaço que ocupam ou delimitam é indefinível, infinito e
homogêneo.
Para compreender as coisas do mundo sensível e para intervir neste mundo se faz uso da
Geometria. Esta geometria, que chamamos de Euclidiana, é um dos produtos mais notáveis da
capacidade de abstração e racionalização humana. Registrada por Euclides por volta de 300 AC.nos
ELEMENTOS, síntese sistemática da geometria grega, objetivava ensinar a medir e demarcar regiões
ou partes do espaço real a partir do estudo de um espaço abstrato e de figuras espaciais ideais.
Própria para cálculos em superfícies planas – onde, por exemplo, os ângulos internos de um triângulo
somam sempre 180° e as linhas paralelas se mantêm à mesma distância uma das outras – foi o
principal instrumento até o século XIX para interpretar com rigor matemático coisas do mundo
sensível. Na verdade sua influência foi muito maior, pois seu magistral método de síntese – axiomas,
postulados , teoremas e provas – afetou profundamente o pensamento ocidental.
No século XIX, alguns matemáticos (Gauss, Lobatchevsky, Bolyai, Riemann)
compreenderam que são necessários diferentes tipos de geometria para descrever os equivalentes
de triângulos, de linhas paralelas e assim por diante em superfícies curvas. Foram então propostos
sistemas geométricos absolutamente novos, e, por mais abstratras e esotéricas que essas geometrias
parecessem na época, no princípio do século XX a chamada Geometria de Riemann viria a ser
encarada como mais verdadeira que a Geometria Euclidiana.
Hoje dispõem-se de novas maneiras para descrições convincentes de formas e superfícies
complexas. Disciplinas dedicadas ao estudo da matéria vital (e mbriologia, virologia, etc.) foram as
que mais demandaram este tipo de descrição geométrica. No entanto, a Geometria Euclidiana,
mesmo sendo incapaz de dar contas de uma realidade complexa, continua sendo um instrumento
indispensável, pois favorece um esclarecimento imediato da forma, quando aplicada em atividades
tais como a construção ou o projeto arquitetônico.
Ao procurar definir a arquitetura o arquiteto, e mais importante tratadista desse século,
LeCorbusier argumentou que a geometria seria de fato a linguagem do arquiteto. Seja como
instrumento de controle “neutro” e meio de representação ou como símbolo e modelo, como “filtro”
da forma ou como forma ela mesma; para a arquitetura a geometria é uma condição necessária e
essencial. No entanto, a concepção das formas e dos espaços arquitetônicos requer a construção
mental de um sistema de referência. O que difere um tetraedro que se encontra no pensamento do
arquiteto daquele que se encontra no pensamento do geômetra é o seu tamanho, diferença funda-
mental entre as duas linhas de pensamento. A geometria do espaço arquitetural concebida como
projeção do espaço do pensamento no espaço real requer uma regra de passagem: a escala (ver
capítulo 1).

LeCorbusier: Os monumentos da Roma antiga e sua geometria.


(conforme seu livro Vers une Architecture de 1923)

FUNDAMENTOS: IDEALIZAÇÃO E CONCEPÇÃO DA FORMA

Esta pequena ilustração de Paul Klee, professor da BAHAUS, faz parte das suas anotações
de aula sobre Teoria Plástica da Forma e define os elementos básicos para idealização e concepção
da forma:ponto, linha, plano e volume.
ELEMENTOS BÁSICOS
Ponto: um ponto marca uma posição num campo espacial, conceitualmente não possui dimensão e
é fixo, estático, sem direção.

ESTABILIDADE TENSÃO

Linha: um ponto extendido transforma-se em linha, conceitualmente tem comprimento e expressa


direção, movimento e crescimento.

Plano: uma linha extendida transforma-se num plano, conceitualmente tem comprimento e largura.

Volume: um plano extendido transforma-se num volume, conceitualmente tem comprimento, largura
e profundidade.

ESTRUTURA CONCEITUAL
LINHAS
CORPO PLANOS
VOLUMÉTRICO SUPERFÍCIES

VOLUME
ESPACIAL PONTOS

REDUÇÃO GEOMÉTRICA
FORMAS PRIMITIVAS

NATUREZA DAS FORMAS


Quanto a continuidade:

CONTÍNUAS
MISTAS
DESCONTÍNUAS

Quanto a direção:

CENTROIDAIS LINEARES

POLIEDROS REGULARES (SÓLIDOS PLATÔNICOS)

OCTAEDRO
TETRAEDRO

HEXAEDRO
DODECAEDRO
ICOSAEDRO

SÓLIDOS FUNDAMENTAIS
ARQUITETURA: FORMA E ESPAÇO
A Arquitetura se distingue pela sua forma construída e pela sua natureza espacial: a
delimitação e organização de lugares para atividades humanas. No entanto o autor Nicolaus Pevsner
vai argumentar que se toda Arquitetura é construção, nem toda construção é Arquitetura. Arquitetura
seria uma construção com uma intenção plástico-formal. É bem verdade que, sob um ponto de
vista antropológico, cujo alvo de interesse é a investigação de instituições sociais e de sistemas
culturais, a afirmação de Pevsner – datada de 1943 num texto que toma como exemplo da diferença
entre uma catedral e um abrigo de bicicletas – é, de certa maneira, insustentável. Sob esta ótica, as
duas edificações deixam de pertencer a universos distintos, passando então a situar-se em pólos
opostos de uma mesma dimensão dentro de um determinado contexto cultural. As construções, os
edifícios e os espaços urbanos passam a ser vistos como entidades físicas que emolduram atividades
humanas ao estabelecer cenários que cristalizam rituais ou ações e comportamentos repetidos.
A discussão do que vem a ser a forma e o espaço arquitetônico remonta a antigüidade
clássica. Marcus Vitruvius Pollio foi um arquiteto romano que escreveu o mais antigo tratado de
arquitetura conhecido: De Architectura Libri Decem. Composto no Século I AC. e esquecido du-
rante a Idade Média, foi redescoberto no mosteiro de Saint Gall em 1416. Vitruvio, como ficou
conhecido, tinha profundo conhecimento dos antigos textos gregos e romanos e procurou reunir
todo este saber em uma teoria normativa unificada. No entanto, os contornos fundamentais daquilo
que entendemos hoje como Arquitetura foram definidos no Século XV.
O maior tratadista de arquitetura do Renascimento Leon Battista Alberti (1404-1472) foi
fortemente influenciado pelo, então, recém descoberto texto de Vitruvio. Além de arquiteto, era um
grande estudioso com interesses em muitas áreas do conhecimento e foi dramaturgo e matemático.
Como encarregado do Papa pelas construções da igreja, teve ocasião de escrever um dos mais
completos tratados de arquitetura De Re Ædificatoria. A maior parte deste texto foi completada em
1452 e o seu todo impresso em 1485. Elaborado sobre a tradição de saber herdada de Vitruvio tinha
como propósito definir um ofício e uma arte e dar-lhes um conjunto de regras e normas. Como
Vitruvio, Alberti queria que seu texto incluisse tudo aquilo que fosse necessário para o concepção
(ver seção concepção dos espaços e da forma arquitetônica) e controle da construção de edificios e
procurou reunir todo o saber conhecido até aquele momento. De certa maneira pode ser considerado
um texto fundador da tradição arquitetônica. É a partir dele que a Arquitetura passa a constituir, de
fato, um ramo do conhecimento.
As três condições básicas que devem ser atendidas para a definição da forma e do espaço
arquitetônico, conforme postuladas por Alberti e parafraseadas até hoje pela maior parte do teóricos,
são: solidez, utilidade e beleza.
De qualquer maneira é importante notar que, como na arte, a intenção plástica da forma de
uma obra arquitetônica muitas vezes só pode ser entendida através de sua relação com formas
preexistentes. Não há invenção sem precedente. Além disso, obras de arte são, em muitos casos,
criadas como paralelo ou antítese de algum modelo anterior. A nova forma aparece não
necessariamente para expressar algum conteúdo novo mas para substituir uma forma que perdeu
vitalidade.

GERAÇÃO DA FORMA ARQUITETÔNICA


A geração da forma arquitetônica se caracteriza pela ampla liberdade de escolha e por
influências de ordem sócio-cultural, dada a baixa exigência de desempenho funcional. Ou seja,
para se gerar a forma de uma fuselagem de um avião deve-se reconhecer seu desempenho
aerodinâmico, sem o que este avião não poderá voar; da mesma maneira, para se gerar a forma do
casco de um navio deve-se reconhecer seu desempenho hidrodinâmico, sem o que este navio não
poderá flutuar. Esta condição é o que o autor Amos Rapopport define como performance critical
situation (situação crítica de desempenho).
No entanto, diferentemente de outros produtos cuja forma deriva em maior ou menor grau
de um desempenho funcional, a arquitetura, como toda construção edificada, mantém uma relação
simbiótica, integral e singular com o seu contexto físico. Para o autor Geoffrey Broadbent a forma
arquitetônica pode ser gerada de quatro formas básicas: Pragmática, Icônica, Canônica e Analógica
PRAGMÁTICA (FORMA ARQUITETÔNICA PRIMITIVA):
O processo construtivo se dá de maneira empírica, tentativa e êrro.

ICÔNICA (FORMA ARQUITETÔNICA VERNACULAR):


O processo construtivo é dominado e o padrão formal obtido se torna uma constante e
adquire um valor icônico (imagem).

CANÔNICA (FORMA ARQUITETÔNICA ERUDITA):


A concepção arquitetônica precede a obra construída. No desenvolvimento da concepção, o
arquiteto passa a desenvolver um especial interêsse por padrões, modulação, ordenação, regularidade
e equilíbrio. Busca princípios elementares que definam uma lógica que facilite a concepção
arquitetônica. A unidade formal e a solução plástica da obra são então resolvidas por estes princípios.

ANALÓGICA (FORMA ARQUITETÔNICA ERUDITA):


A concepção arquitetônica precede a obra construída. No desenvolvimento da concepção, o
arquiteto proucura estabelecer referências analógicas, descobrindo princípios de semelhança entre
elementos distintos.
ORGANIZAÇÃO DA FORMA ARQUITETÔNICA
A definição da forma arquitetônica é basicamente determinada pela relação precisa entre
elementos construtivos que definirão lugares que servem como:
1. Lugares de uso ou destino;
2. Lugares de movimento e conexão.
Os arranjos formais em arquitetura, se fazem a partir de esquemas básicos que ordenam
esses elementos em função de uma idéia ou tema formal, um partido ou uma Intenção Compositiva
(ver Anexos 1 e 2) que reconhece as circunstâncias e limitações de um dado contexto ou situação e
as incorpora numa solução.
A natureza estrutural inerente à arquitetura implica numa ordenação de base geométrica;
logo, os esquemas básicos que vão relacionar os elementos fundamentais derivam dessa base
geométrica. Esquemas que visam estabelecer mais uma disciplina do que uma limitação: permitem
o crescimento, acomodam o movimento e podem ser elaborados de forma a encompassar variação
e complexidades infinitas.

ESQUEMAS DE ORDENAÇÃO DE ELEMENTOS


Os principais são: Centralizado, Modular, Linear, Agregado e Radial.

LINEAR

MODULAR

CENTRALIZADO

RADIAL
AGREGADO

ESQUEMAS DE COMBINAÇÃO DE 2 ELEMENTOS


Os principais são: por Absorção, Interpenetração, Justaposição e Conexão através de um
terceiro elemento.

ABSORÇÃO INTERPENETRAÇÃO JUSTAPOSIÇÃO

CONEXÃO ATRAVÉS DE
UM OUTRO ELEMENTO
ESQUEMAS DE MANIPULAÇÃO FORMAL
Os principais são: manipulação dimensional, subtrativa e aditiva.

DIMENSIONAL SUBTRATIVO ADITIVO

ESQUEMAS DE TRANSFORMAÇÃO
Os principais são: transformação por distorção, topológica, por inversão e ornamental.

DISTORÇÃO TOPOLÓGICA

INVERSÃO ORNAMENTAL

CONCEPÇÃO DOS ESPAÇOS E DAS FORMAS ARQUITETÔNICAS


A produção de edificações se institui hoje segundo fases distintas pelas quais a operação de
concepção se separa da atividade construtiva. A principal função de arquitetos e engenheiros no
atual contexto sócio-econômico não é o de produzir construções e sim idealizá-las. Intervêm
essencialmente na qualidade de projetistas. Um projeto se estabelece a partir de uma uma
representação que antecipa o que será uma futura edificação e enquanto documentada unicamente
no papel ou em modelos não é mais que um conjunto de intenções e promessas.
No seu sentido mais amplo e compreensivo, projeto significa antecipação. O objeto desta
antecipação não é necessariamente um dado ou evento material. No entanto, no seu uso corrente,
favorecido talvez pelo seu uso proeminente em arquitetura, o termo é efetivamente usado como
antecipação de um evento material.
O projeto enquanto antecipação, implica não só numa referência ao futuro mas também
numa condição de possibilidade de realização neste horizonte temporal. Considerar a capacidade
de projetar do homem é pressupor que o futuro não se determina de maneira unívoca, que o mundo
real é um campo onde se pode desenvolver uma criatividade humana. O ato de projetar envolve,
então, a capacidade de analisar e avaliar situações; a habilidade para antecipar eventos futuros e a
capacidade de um pensamento criativo com o qual desenvolve-se soluções adequadas.
Do ponto de vista construtivo, projetar é organizar e fixar construtivamente os elementos
formais que resultam de uma vontade ou intenção de transformar um dado ambiente ou lugar.Projetar
é um jogo criativo, que incluirá algum procedimento de avaliação restrita, que resultará na definição
das formas possíveis de alguma coisa e o “como” esta coisa será feita.
Embora tenha-se tentado reduzir a ação projetual à um processo de busca e síntese, será
sempre uma arte, uma mistura peculiar de racionalidade e irracionalidade.
Projetar significa lidar com qualidades, com conexões complexas, com paradoxos e
ambigüidades. A invenção de qualquer artefato pressupõe as habilidades de se abstrair e de se
antecipar. Estas faculdades existem, em maior ou menor grau, mesmo naqueles indivíduos mais
resistentes à aquisição formal de conhecimentos.
Para os arquitetos a concepção de projetos envolve as capacidades de abstração – sobre
dados de um programa de necessidades – e de antecipação – idealização e representação de soluções
plausíveis.

A FORMA ARQUITETÔNICA E SEU CONTEXTO:


SUBORDINAÇÃO E CONTRASTE
As ilustrações a seguir, propostas por Dieter Prinz no seu livro Städtbauliches Gestalten
(Configuração Urbana), demonstram como a forma arquitetônica pode se relacionar com seu contexto
nas duas maneiras básicas: subordinando-se a ele, ou destacando-se pelo contraste.

SUBORDINAÇÃO CONTRASTE
5
PROPORÇÃO: SEÇÃO ÁUREA E TRAÇADO REGULADOR

A concepção de uma obra arquitetônica depende de um variado conjunto de condicionantes.


O programa de necessidades, as particularidades do contexto físico, as diferentes alternativas técnicas,
as limitações econômicas, o meio sócio-cultural e, finalmente, as preferências plásticas conduzem
a um sem número de conclusões individuais. Um determinado espaço pode ter infinitas soluções
dimensionais, compatíveis com diferentes situações e ênfases projetuais diversas. O arquiteto, ao
estabelecer alguma forma de ordenação, começa a buscar dentro do universo das infinitas
possibilidades algo que atenda à sutil idéia de uma justa medida, uma relação proporcional necessária
ao objetivo final de uma definição espacial harmônica e bela.

PROPORÇÃO
Em arquitetura proporção é um conceito fundamental e importantes autores vêm, há muito,
fazendo uso deste termo até quando buscam definições para a própria arquitetura:
“A arquitetura não é senão a ordem, a disposição, a bela aparência, a proporção das
partes face ao todo, a proporção e a distribuição.”
Michelangelo Buonaroti
“A arquitetura serve-se do número, da forma, da grandeza e dos materiais, por via da
especulação, e serve-se ainda das proporções e das correspondências nos mesmos modos
por que o faz o matemático.”
Vincenzo Scamozzi
“Na arquitetura o belo consiste essencialmente nas proporções: somente corn a proporção
e sem qualquer ornamentos um edifício pode ser belo.”
G. Winckelmann
“A arquitetura é uma ciência intelectual e prática que visa estabelecer, com o raciocínio, o
bom uso e as proporções do que constrói.”
Carlo Lodoli
“A arquitetura, que de todas as artes é a mais submetida às condições materiais, econômicas
e sociais, é também aquela que graças às proporções e as formas geométricas exprime as
especulações mais abstratas do pensamento humano.”
Louis Hautecoeur

Para muitos teóricos é uma concepção que dá sentido, alicerça e consolida a própria ação
projetual. No entanto, como já observado anteriormente, algumas vezes a noção de escala é
confundida com a noção de proporção, sendo aquela explicada por esta e vice-versa, portanto é
necessário esclarecê-las novamente (ver capítulo 1).
Em termos matemáticos proporção é uma igualdade entre razões. Uma razão é o resultado
de uma divisão, de uma distribuição fracionária [ratio = rateio]. Quando essa distribuição não deixa
sobras diz-se que é exata. Não há disperdício ou desequilíbrio. Quando duas razões são iguais, diz-
se que são proporcionais. Ou seja, uma proporção refere-se a uma equivalência fracionária.
Em arquitetura grande parte das definições de proporção reconhecem uma relação
quantitativa, expressa numericamente, entre tamanhos de partes de um edíficio com a totalidade da
edificação ou com outras partes do mesmo edifício. Por exemplo, se dissermos que uma janela tem
de altura 2/3 de uma porta estaremos estabelecendo uma proporção. Neste caso, a relação se efetua
através do transporte dimensional de um elemento de uma dada edificação a outro elemento da
mesma edificação, sendo o conjunto (toda edificação) considerado como um sistema fechado.
No entanto, as relações de proporção de uma edificação, por si só, não nos permitem conhecer
as medidas de tal edificação. Para medí-la é necessário a utilização de uma referência dimensional
externa a esse conjunto fechado, como, por exemplo, o metro. Se agora dissermos que a altura da
porta será de 2,10m, aplicando-se a relação de proporção saberemos então que a janela terá 1,40m
de altura.
Como já visto anteriormente, necessariamente a noção de escala supõe, portanto, que as
medidas de um edifício, ou de parte dele, sejam relacionadas a uma referência dimensional exterior
à edificação. Para os arquitetos, esta referência vai levar em conta o tamanho do ser humano. Na
figura abaixo as duas fomas espaciais guardam a mesma proporção 2 : 1, no entanto se considerarmos
a figura humana as duas formas são distintas e por isso diferentes.

É importante ressaltar que esta abordagem pragmática da noção de proporção não é suficiente
para explicar a sutileza da sua aplicação pelos arquitetos na busca das medidas adequadas para os
elementos arquitetônicos numa composição harmônica ou bela. Uma compreensão mais ampla
daquilo que significa “a relação das partes de uma determinada composição entre si e das partes
com o conjunto” pouparia-nos de visões excessivamente reducionistas que possam eventualmente
transformar-se em dogmas.

PROPORÇÃO E O BELO ARQUITETÔNICO


A questão da busca do belo se caracteriza como uma das áreas de interesse humano mais
bem documentada desde a antigüidade. Os antigos textos examinam principalmente o belo
arquitetônico e dentre as tradições que perduram até os nossos dias está a da beleza como um
atributo das coisas. Os escritos de Platão sobre a beleza estão baseados na sua concepção de essência.
Argumenta que tudo o que sabemos pela experiência cotidiana é opinião e que se deve procurar um
saber real e permanente (episteme) que consistiria de essências. Uma dessas essências seria a da
beleza, propriedade permanente de todos os objetos belos e que permanece imutável
independentemente da admiração daquele objeto por algum indivíduo.
Um dos aspectos constantes dessa beleza permanente seria a proporção. Se atribui a Pitágoras
a primeira tentativa de utilizar a linguagem matemática para conceber uma abordagem para esta
idéia. Se crê que Pitágoras descobriu as relações dimensionais de proporção no comprimento das
cordas de instrumentos musicais que produzem a harmonia de tons. A partir daí a noção de harmo-
nia extraída da música passa ser aplicada a todo o cosmo: os números formam a essência de todas
as coisas.
Pitágoras, ainda, nutria certa admiração mística e sagrada pelo pentágono regular e pelo
pentagrama, o polígono regular estrelado de cinco pontas inscrito neste pentágono regular. Sobre
estas bases buscou explicar também a proporção geométrica ideal dos aspectos físicos das coisa
naturais, principalmente aquela de um corpo humano ideal, e de aplicá-la na arquitetura e na arte.
Definiu, então, uma relação de proporção particular que se encontra no pentágono regular e no
pentagrama, a da divisão de um segmento em média e extrema razão. Euclides iria definir esta
relação da seguinte maneira: “um segmento se divide em média e extrema razão quando todo o
segmento está para a parte maior como esta última esta para a menor”.
Aproximadamente
5

a b
b a
3
a+b : a :: a : b = Φ = 1,6180339…
Alguns historiadores, como Hugh Casson, vão afirmar que as regras de semelhança e
proporção matemática, se estabeleceram como forma eficiente de comunicar intenções arquitetônicas
e controlar a execução da construção, quando não existia um sistema de medida padronizado e a
transmissão de instruções construtivas era precária. No entanto, a tradição grega de proporção se
manteve na arquitetura romana clássica, e chegou até nossos dias através do texto, já citado, de
Vitruvio.
Vitruvio afirma que um edifício é belo não só quando a aparência da obra é de bom gosto e
agradável mas também quando seus elementos são proporcionados de acordo com com os principios
corretos de si-metria, aqui entendida no sentido original grego, como uma concordância correta ou
justa de medidas entre os elementos de uma mesma obra e de sua relação com o esquema geral do
conjunto e de uma certa parte, deste mesmo conjunto, eleita como módulo. Em geral, através da
unidade modular do diâmetro das colunas (“canon” ou cânone) de uma determinada ordem eram
definidas todas as medidas dos outros elementos que compunham as construções. As ordens (dóricas,
jônicas, coríntias e toscanas) eram para os gregos e romanos, na antigüidade, a forma mais perfeita
de expressão de beleza e harmonia.
Mesmo durante a Idade Média, onde os textos da antigüidade clássica não eram muito
utilizados, as proporções e relações geométricas e numéricas continuaram sendo consideradas
atributos importantes como se pode observar nestas páginas do caderno de esboços de Villard de
Honnecourt (Século XIII) célebre arquiteto e construtor de igrejas góticas.
O Renascimento ocasionou um novo interese pelos conhecimentos da antiguidade e reavivou
o estudo das proporções pitagóricas. Um estudo de Leonardo DaVinci mostra as relações de proproção
no rosto humano.

O maior tratadista de arquitetura do Renascimento Leon Battista Alberti, no seu texto fundador
De Re Ædificatoria, deu enorme enfâse aos aspectos formais dos edifícios principalmente com
relação a proporção, definindo-a da forma geral como a entendemos hoje: “a relação das partes de
uma determinada composição entre si e das partes com o conjunto”.
No entanto, o ressurgimento, no Renascimento, pelo interesse na divisão proporcional de
Pitágoras de média e extrema razão se deve ao matemático Lucca Pacciolli di Borgo. No seu livro
De Divina Proportione, apresentado em Veneza em 1509 e ilustrado por Leonardo DaVinci, vai
denominá-la proportio divinæ. Esta divisão proporcional veio, mais tarde a ser chamada de seção
áurea (veja a próxima seção) pelo próprio Leonardo DaVinci e continua sendo muito aplicada
ainda hoje com essa denominação:“Um segmento de reta está dividido de acordo com a seção
áurea quando é composto de duas partes desiguais, das quais a maior está para a menor assim
como o todo está para a maior”. Deriva deste conceito o que veio a se conhecer como retângulo de
ouro ou áureo: um retângulo cuja razão entre os lados maior e menor é equivalente ao chamado
número de ouro [Φ = 1,618...].
Depois do Renascimento a concepção platônica de beleza como atributo do objeto foi criticada
e alguns estudiosos começaram a adotar uma concepção mais ampla em que a beleza não é só
resultado das propriedades do objeto mas que depende também das circunstâncias que envolvem a
pareciação ou fruição deste objeto. Já na antigüidade nem todos os filósofos concordavam com a
posição de Platão. Epicuro foi um que apresentou uma teoria distinta argumentando que quando
um indivíduo aprecia a beleza entra em jogo um sentimento de prazer.
No entanto, de acordo com o modelo estabelecido pelos teóricos do Renascimento – Alberti,
Serlio, Vignola, Palladio entre outros – a partir do seculo XVII as novas normas para a boa arquitetura
que começaram a ser elaboradas, principalmente, por teóricos de escolas de arquitetura francesas,
nunca deixaram de incluir considerações sobre a proporção.
Viollet-le-Duc, um dos mais importantes teóricos do Século XIX, viu como missão
desenvolver uma concepção de arquitetura baseada, na mesma forma que a filosofia de Descartes,
na razão. De acordo com seu famoso Dictionnaire Raisonné de l’Architecture o termo proporção
vai ser definido como:
Por proporções, entendem-se as relações entre o todo e as partes, relações lógicas,
necessárias, que satisfazem ao mesmo tempo a razão e aos olhos. Deve-se estabelecer uma
distinção entre proporção e dimensão. As dimensões indicam simplesmente alturas, larguras
e superfícies enquanto que as proporções são relações entre as partes segundo uma lei.
Ao contrário do que é frequentemente pensado, as proporções, em arquitetura, não implicam
relações fixas entre as partes, mas relações variáveis, em vista de obter uma escala
harmônica. As proporções não derivam de um método cego nem de uma fórmula inexplicável,
mas de relações entre os cheios e os vazios, as alturas e as larguras, as superfícies e as
elevações; relações das quais a geometria cuida e cujo estudo demanda grande atenção e
varia segundo o lugar do objeto. O arquiteto, enfim, não é escravo de um sistema de
proporções fixo. Ele pode modificá-lo achando aplicações novas e relações proporcionais,
assim como acha aplicações variadas das leis da geometria. Com efeito, as proporções são
filhas da geometria. Em arquitetura, elas se estabeleceram primeiramente sobre as leis da
estabilidade e estas derivam da geometria. Um triângulo é uma figura inteiramente
satisfatória, perfeita, dá a idéia mais exata de estabilidade. Foi por meio dos triângulos que
os egípcios, os gregos e mais tarde os arquitetos da Idade Média estabeleceram suas regras
de proporção, para que estivessem submetidas às leis da estabilidade.

A primeira abordagem arquitetônica mais independente da tradição formal da antiguidade


foi chamada de Art Noveau que começou a fazer uso de formas puras da geometria. A partir deste
movimento alguns dos arquitetos mas hábeis do nosso século passaram a propor formas particulares
de interpretar a questão da proporção.
Um dos primeiros foi LeCorbusier que propôs um sistema de medição proporcionada
denominado Modulor.

LeCorbusier acreditava que o seu sistema de medidas satisfaria tanto às exigências de beleza
– porque ser derivado da seção áurea – quanto às funcionais – porque adequado às dimensões
humanas. Para ele, este era um instrumento universal, fácil de empregar, e que podia ser usado no
mundo inteiro para obter beleza e racionalidade nas proporções de tudo o que é produzido pelo
homem”.
LeCorbusier, inicialmente, estabeleceu como estatura média do ser humano a medida de
1,75 m. No entanto, sob pretexto de considerar a média de altura dos policiais ingleses e ciente da
progressiva evolução da estatura do ser humano, ao menos na Europa, resolveu adotar 1,83 m,
como ponto de partida para o Modulor. Embora sob o prisma científico, as conclusões possam ser
consideradas questionáveis: pela inadequação na aplicação antropométrica geral; por desconsiderar
variações anatômicas individuais e por idealizar situações.
O grande mérito dessa análise, em que LeCorbusier, através de duas séries numéricas,
considera as alturas do ser humano e de seu braço erguido, é que possibilita a criação futura do
conceito de “desenho universal”. Apesar de não ter sido a intenção preliminar de LeCorbusier, com
a evolução do ideal de cidadania e os traumas das guerras recentes do século XX, este conceito, ao
invés da usual tendência de excludência do ser humano, procura possibilitar, ao contrário, o máximo
de acesso aos equipamentos, mobiliários, edificações etc., em geral, no âmbito público.

TRAÇADOS GEOMÉTRICOS

DIVISÃO DE UM SEGMENTO DE RETA EM MÉDIA E EXTREMA RAZÃO


2º M’ 2


M” √5
1

B C M A


a+b : a :: a : b = Φ = 1,6180339…

b a meios
extremos
CONSTRUÇÃO DE UM RETÂNGULO ÁUREO

E C B


Seja ABCD um quadrado,
ABEF é um retângulo áureo
3º 2º

F D M’ A
RELAÇÕES GEOMÉTRICAS NO RETÂNGULO ÁUREO:
DIAGONAIS, QUADRADOS GIRANTES E ESPIRAL DE CRESCIMENTO DINÂMICO
CONSTRUÇÃO DO PENTÁGONO DADO O SEU LADO


A B

6º 5º

CONSTRUÇÃO DO PENTÁGONO DADO O RAIO DO CÍRCULO CIRCUNSCRITO

2º 1


√5
2

RETÂNGULOS DINÂMICOS

Seja ABCD um quadrado de lado unitário

B C

√2

A D

1 √3

√2

1 √4

√3

1 √5

√4 = 2

1 √6

√5
e assim sucessivamente ...

Para Hambridge a decomposição de um arranjo em seus retângulos mais elementares é


suficiente para por em evidência o esquema harmônico de suas proporções.
Segundo este autor o que distingue um retângulo é a razão entre seus lados. De um retângulo
de razão h diz-se que tem módulo h. Partindo desta noção de módulo h, Hambridge vai agrupar os
retângulos em estáticos e dinâmicos.
Os retângulos estáticos são aqueles em que o módulo h é um número inteiro (1, 2, 3, 4 ...)
ou fracionário (3/4, 2/3, 5/8 ...). Os retângulos dinâmicos são aqueles em que o módulo η é um
número incomensurável. São retângulos que crescem em proporção descontínua, gerados pelos
rebatimentos das diagonais, cujos valores partem de √2, com incremento constante de 1 ao número
sob o radical

TRAÇADOS DE RETÂNGULOS COM BASE NA SÉRIE DE FIBONACCI


A seção de ouro apresenta importantes relações geométricas que, como anteriormente
apresentado, podem ser expressas graficamente através de diagramas e traçados geométricos. No
entanto, suas medidas se apresentam na forma de números incomensuráveis.
A solução algébrica da expressão [(a : b) = (a + b : a)] resulta numa equação de segundo
grau (× − × − 1= 0) cujas raízes são ± [( √5 + 1 ) : 2] = ± 1,618...= Φ
2

Na Idade Média o matemático Leonardo de Pisa (Fibonnacci) vai apresentar, baseado no


conhecimento matemático desenvolvido pelos árabes, uma série de números reais positivos, que
crescem em proporção contínua, onde cada número é o resultado da adição de seus dois atencedentes.
Esta série tem como peculiaridade o fato de cada número guardar com o seu antecedente uma razão
próxima ao número de ouro, bem como um certo par em relação ao par subseqüente. A Série de
Fibonnacci, como ficou conhecida, é um recurso para se obter uma proporção próxima a áurea,
sem a necessidade de se lidar com números incomensuráveis.
São eles: 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144, 233, 377, 610, 987, ..., etc. Assim, se a razão
3 : 2 = 1,5 ainda está longe do número de ouro [Φ = 1,618...], quanto mais esta razão cresce mais
vai se aproximar de Φ, ou seja 5 : 3 = 1,666...; 8 : 5 = 1,6; 13 : 8 = 1,625...; 55 : 34 = 1,617; etc.
Assim pode-se facilmente desenhar retângulos ditos estáticos, retângulos cuja razão entre
seus lados é inteira ou fracionária, que guardam uma relação de proporção muito próxima àquela
do retangulo áureo:
8 5

13

8
TRAÇADO REGULADOR
Na busca da boa proporção, artistas e arquitetos estabeleceram uma idealização abstrata-
geométrica denominada traçado regulador. Se pode definí-lo como um traçado geométrico com
uma lógica ou lei de formação proporcional que ordena e regula a disposição dos principais elementos
de uma composição arquitetônica. Este sistema de proporcionalidade procura estabelecer as linhas
gerais de uma espécie de esqueleto estrutural que determina o posicionamento e as relações
intrínsecas, no âmbito da plástica arquitetônica, de seus elementos geradores (linhas, planos e vol-
umes). Funciona como uma retícula ou grade imaginária que contribui para a organização dos
elementos da composição, segundo uma determinada regra geral, procurando unificar visualmente
múltiplos elementos, relacionando-os dentro de uma mesma família de proporções.
Não é um esquema geométrico fechado e rígido cujo uso pudesse ser rigorosamente prescrito,
como uma tabela de coeficientes matemáticos, mas um esquema geral que contempla diversas
possibilidades operativas permanecendo aberto à engenhosidade e à livre intuição do artista.
Este recurso compositivo é conhecido desde a antigüidade e vem sendo aplicado formalmente
por arquitetos desde Palladio, na Renascença , a LeCorbusier no século XX. Na ilustração a seguir
o autor Colin Rowe no seu artigo The Mathematics of the Ideal Villa compara a aplicação deste
recurso por Palladio na Villa Malcontenta e por LeCorbusier na Villa Garches.

LeCorbusier, considerava o traçado regulador “uma garantia contra o arbitrário”. No seu


livro Vers une Architecture (Por uma Arquitetura) faz uma apaixonada defesa pelo emprego deste
recurso de composição, e vai argumentar que:
O traçado regulador é uma satisfação de ordem espiritual que conduz à busca de relações
engenhosas e de relações harmoniosas [...] que traz essa matemática sensível que dá a
agradável percepção da ordem. A escolha de um traçado regulador fixa a geometria funda-
mental da obra; ele determina então uma das impressões fundamentais. A escolha de um
traçado regulador é um dos momentos decisivos da inspiração, é uma das operações capitais
da arquitetura.
EXEMPLO DE TRAÇADO REGULADOR
Na pesquisa histórica que serviu de base para a restauração do prédio que hoje abriga a Casa
França - Brasil, a professora Sandra Alvim sugere que o seu autor, o arquiteto Grandjean de Montigny,
tenha feito uso de um traçado regulador. A ilustração a seguir apresenta o esquema de
proporcionalidade que sugere-se ter sido empregado na elaboração do projeto desta edificação que
é considerada como uma importante manifestação do espírito do neoclassicismo francês no Rio de
Janeiro.
ANEXO 1
INICIAÇÃO ARQUITETÔNICA

Em 1972 alunos da FAU UFRJ organizaram uma série de palestras com arquitetos de renome.
Este grupo convidou o arquiteto Lucio Costa, o mais importante arquiteto brasileiro, aquele que
revolucionou a prática e o ensino desta profissão. Não podendo comparecer, Lucio Costa enviou
um depoimento escrito para ser lido e divulgado entre os alunos.
É um texto simples e conciso que estabelece uma abordagem muito precisa para os problemas
da arquitetura. Este documento interessa, sobremaneira, tanto aos estudantes de arquitetura, aos
arquitetos, como àqueles que desejam compreender o que vem a ser a arquitetura.
Foi mantida, nesta transcrição, a grafia e a sintaxe utilizadas no texto original. Abaixo uma
reprodução da página inicial.
1— Quando a arte está presente, a forma signif ica — tem carga latente
(lembrança de Clive Bell).
O traço é a procura sensível da forma.
Todo e qualquer “risco” deve significar.

— isto significa, é um nome.

— isto não é nada, é um rabisco


(lembrança de Portinari).

2— Ou a energia tende a liberar-se do cerne e expandir,

ou para ele converge e se concentra.


Num caso resultam, como expressão plástica, formas ditas abertas, de sentido dynamico,
no outro; formas fechadas, de sentido statico.

3— A arte em todos os tempos, e de um modo geral, sempre oscilou entre essas duas
tendencias oppostas, num movimento de pendulo: quando se esgota e satura num sentido,
tende ao outro (Eugenio D’ Orsi).

classico — romantico,
apolíneo — dyonisiaco,
mysticismo — racionalismo,
etc.

4— Os exemplos historicos mostram contudo que, além desse rythmo (no tempo),
corresponde (no espaço) um berço nativo comum a cada uma das duas concepções
formaes, staticas ou dynamicas.

Esta constatação inicial é importante, porque permitirá um melhor discernimento no


estudo da história da arte.
5— Já um aluno reagiu contra o “ensino” da arte, problema pessoal de cada um, alegando
caber apenas à escola fornecer a“ferramenta”, ou seja, a technologia da construcção.
Em parte está certo — O cerne, porém, é que a architectura não se limita à construcção
— é algo mais, e este “algo mais” tem sua technologia propria e como tal é, até certo
ponto, ensinável. A partir dahi, então sim, a auto-suficiencia de cada um dará o
seu recado. Ella, por si só, não basta.

6— Que vem a ser então architectura?

É antes de mais nada, de facto, construcção. Mas construcção concebida com o proposito
primordial de “organizar” e “ordenar” o espaço para determinada finalidade e com
uma determinada intenção. E nesse processo fundamental de organizar, ordenar e
expressar-se ella se revela igualmente arte plástica, porquanto nos inumeráveis
problemas com que se defronta o architecto desde a germinação do partido até a
conclusão effectiva da obra, ha sempre, para cada caso especifico, certa margem final
de opção entre os limites maximo e minimo — determinados pelo calculo, preconizados
pela technica, condicionados pelo meio, reclamados pela funcção ou impostos pelo
programa — cabendo então ao sentimento individual do architecto escolher na gradação
de valores contida entre taes limites extremos, a justa medida apropriada a cada
pormenor em vista da unidade final da obra idealizada.
A intenção plastica, deliberada ou subconsciente, que semelhante escolha subentende
é precisamente o que distingue a architectura — popular ou erudita — da simples
construcção.

Pode-se então definir a architectura como construcão concebida com a intenção de


organizar e ordenar plasticamente o espaço e os volumes decorrentes, em funcção de
uma determinada epoca, de um determinado meio, de uma determinada technica e
de um determinado programa.
Essa legitima e constante intervenção do sentimento no processo de elaboração
architectonica differencia no nascedouro o architecto do engenheiro.
7— Differenciação tanto mais accentuada porquanto nas tarefas do engenheiro o homem é
considerado, antes de mais nada, como ser collectivo, como numero; prevalece o criterio
de quantidade. Ao passo que nas tarefas do architecto o homem é considerado, antes
de mais, como ser individual, como pessoa; prevalece o criterio de qualidade.
E como, por outro lado, os interesses do homem como ser individual nem sempre
coincidem com os interesses do mesmo homem como ser collectivo, cabe ao urbanista
tentar resolver, na medida do possível, esta contradicção fundamental.

8— Mas o que interessa não é o “architecto” e sim a architectura.


O ensino da architectura não visa pois, fundamentalmente, criar novo ganha-pão para
determinados individuos, mas propiciar a occorrencia architectonica, ou seja, formar
profissionaes capazes de conceber e construir edificações — ou conjuntos de edificações
architectonicamente, isto é, de modo que resultem num todo organico e funccional
plasticamente integrado.

9— Para tanto o estudante de architectura deve ter sempre presente o seguinte:


architectura é coisa para ser exposta à intempérie;
architectura é coisa para ser encarada na medida das ideias e do corpo do homem;
architectura é coisa para ser concebida como um todo organico e funccional ;
architectura é coisa para ser pensada, desde o inicio, estructuralmente;
architectura é coisa para ser sentida em termos de espaço e volume;
architectura é coisa para ser vivida.

Em 1926, em Florença, num pequeno hotel à beira do Arno, uma velha senhora inglesa
ao me saber architecto, vira-se e diz: “eu também sou sensivel à altura e largura dos
cômodos e dos vãos.”
Nenhum professor, na Escola, me falara assim.

10— E deve também, desde cedo, ter uma perfeita noção do que seja proporção,
comodulação e modenatura:
proporção é a equivalencia, ou o equilibrio das partes;
comodulação é o confronto harmonico das partes entre si e com relação ao todo;
modenatura é o modo particular como é tratada, plasticamente, cada uma dessas
partes.

11— E noção ainda das differentes escalas. Assim, p. ex.: na escala plastica ou ideal, a
unidade de medida — o modulo — é uma determinada parte da coisa construida; na
escala humana, universal, a unidade de medida — a polegada, o palmo, o pé — é uma
determinada parte do corpo humano; na escala theorica, ou abstracta, a unidade de
medida — o metro — é a quadragésima milionésima parte do meridiano terrestre, ou
seja, uma abstracção, perdendo-se assim qualquer relação com o homem ou com a
coisa fabricada.
O modulor vinculando a escala plastica à escala humana, tornou possível restabelecer,
apesar do systema metrico, o perdido sentido de proporção.

12— Finalmente convirá accentuar a importancia da intenção, porquanto a expressão final


da obra dependerá do fiel e constante apêgo a essa intenção original. Assim, p. ex., as
chamadas ordens classicas — dorica, jonica e corinthia — correspondem a pura e
simplesmente à expressão plastica de intenções differentes, acrescidas àquela intenção
maior de sereno equilibrio, peculiar à arte grega: no dorico, força contida; no jonico,
graça e elegancia; no corinthio, requinte e riqueza.*
A titulo de curiosidade mostrarei como ainda hoje, mesmo em estructuras utilitarias de
viação urbana, afloram intenções equivalentes: o viaducto rectilineo de acesso ao Tunel
Rebouças (Humayta), com seu rythmado espaçamento de robustos suportes do guarda-
rodas, lembrando trygliphos, é de espiritu dorico; o bem lançado e gracioso viaducto
que liga Botafogo a Laranjeiras tem ar jonico; e as recurvadas nervuras estructuraes
da passarela do MAM, suggerindo gigantesca folha de acantho, tem toda a pinta de
corinthio.

13— E, para concluir, constata-se que ha duas maneiras distictas de se abordar um projecto
architectonico: pode-se proceder imbuhido do conceito organico-funccional, cujo ponto
de partida é a satisfação das determinações de natureza funccional, desenvolvendo-se
a obra como um organismo vivo onde a expressão architectonica do todo depende de
um rigoroso processo de selecção plastica das partes que o constituem e do modo
como são entrosadas; ou do conceito plastico-ideal, cuja norma de proceder implica
senão o estabelecimento de de formas a priori, às quaes se viriam ajustar, de modo
sábio e engenhoso, as necessidades funccionaes (academicismo), em todo caso, a
intenção preconcebida de ordenar racionalmente as conveniencias de ordem funccional,
visando à obtenção de formas livres ou de geometrias ideais, ou seja, plasticamente
puras.
No primeiro caso a beleza desabrocha, como numa flor, e o seu modelo historico mais
significativo é a architectura dita “gothica”; ao passo que no segundo ella se domina
e se contém, como num cristal lapidado, e a architetura chamada “classica” ainda é,
no caso, a manifestação mais credenciada.
Estas duas maneiras de conceber e projectar são validas e, no fundo, correspondem
àquelas duas tendencias plasticas fundamentaes assignaladas no inicio desta aula — a
statica e a dynamica: de uma parte a predominancia da disciplina formal; de outra a
deliberada quebra dessa contenção.

A tendencia agora é, contudo, no sentido da fusão desses dois conceitos tradicionalmente


antagonicos: o jogo das formas livremente delineadas ou geometricamente definidas
se processa espontaneo ou intencional — ora derramadas, ora contidas. Dahi as
possibilidades virtualmente ilimitadas da architectura actual.

A coexistencia é o signo dos tempos novos.

* Ordens estas a que os romanos acrescentaram a toscana, de intenção mais utilitaria, e,


em sentido opposto, a hyperbolica ostentação da ordem composita (corinthia + jonica)
ANEXO 2
COMPOSIÇÃO DA FORMA ARQUITETÔNICA

Atualmente o uso mais familiar e usual do termo composição se dá no contexto da música.


No entanto, seu uso – uma obra a qual nada pode ser acrescido ou retirado sem perda de sua
totalidade – está intimamente ligado à tradição arquitetônica desde a Renascença, quando a
arquitetura passa a constituir de fato um ramo do conhecimento. Os tratadistas, tendo necessidade
de explicar o belo, passaram a estabelecer as normas que iriam servir de base para a ação do artista
e assim estabeleceram as bases da noção de composição.
O conceito de composição no seu sentido contemporâneo é de origem recente, séculos
XVIII / XIX, quando teóricos de escolas de arquitetura francesas, principalmente da École des
Beaux Arts, passaram a influir na formulação de normas para a boa arquitetura. No entanto, o
conjunto de idéias as quais se devem sua origens tem raízes na antigüidade clássica. O autor Alan
Colquhoun vai definir o têrmo, conforme a tradição da École des Beaux Arts, da seguinte maneira:
Procedimento criativo que organiza ou ordena elementos formais de acordo com príncipios
universais de composição que são independentes de “estilos”, ou conforme leis de formação
geradas a partir da própria obra, ou mesmo a partir de certos princípios de estruturação
dos quais a forma resultaria automaticamente sem a participação do juízo consciente do
artista.

A composição como técnica de projeto e como método de ensino da École des Beaux Arts
se fundamenta numa interpretação conservadora das teorias renascentistas, de acordo com as quais
os elementos constituintes de uma edificação são subordinados a um aspecto principal (“principe”),
e tem como objetivo alcançar unidade e harmonia (ver glossário na próxima seção) na obra
arquitetônica. Método que é bastante claro e estabelecia precisamente quais seriam as ações
necessárias para se chegar a um projeto final: o primeiro momento é o desenvolvimento do partido
(“parti pris”), que é o esquema conceitual básico definido a partir de esquemas tipólogicos
tradicionais previamente catalogados; em seguida desenvolvia-se o “esquisse”, o estudo que definia
com maior precisão as características gerais da edificação; finalmente preparavam-se os desenhos
finais (“rendu”), tratados de forma requintada e fiéis ao “esquisse” original.
Hoje este procedimento não é tão rigoroso, já que a “… participação do juízo consciente do
artista” passou a ser muito valorizada — LeCorbusier vai defender o argumento de uma arquitetura
como ato “de vontade” do arquiteto — mas as lições da École des Beaux Art ainda influem na
prática e no ensino do projeto. Em geral, antes de se iniciar um projeto ocorre uma fase preliminar
em que se define um conjunto de demandas ou problemas. Esta definição resultaria da análise de
informações relativas à quatro imperativos: 1. necessidades objetivas (o programa), 2. tradição
cultural, 3. condicionantes locais (clima, sítio etc.) e 4. recursos materiais disponíveis. O processo
projetual se iniciaria quando estas informações fossem, então, interpretadas e organizadas de acordo
com uma escala de prioridades. A partir daí a operação projetual se apresenta tradicionalmente na
seguinte seqüência: croquis de estudo equivalente ao parti pris; estudo preliminar equivalente ao
esquisse e projeto básico, têrmo que recentemente vem substituindo o anteprojeto, que se pode
dizer equivalente ao rendu.
Apesar do uso continuado da noção de composição no seu sentido mais tradicional —
aquele que busca estabelecer relações formais de valor permanente — como a principal maneira de
abordagem projetual e método de ensino, tem surgido, ainda que timidamente, no contexto da
arquitetura contemporânea, uma nova tendência que passou a considerar as noções de sistema e
processo como uma atitude projetual mais adequada aos desafios impostos pela complexidade do
mundo contemporâneo.
Alguns dos exemplos desta tendência são a concepção de “listing” ou “elenco”, sugerida
pelo autor Bruno Zevi, e a concepção da “pattern-language” (linguagem de padrões) proposta pelo
autor Christopher Alexander. Essa atitude projetual vai implicar na rejeição crítica de princípios ou
convenções ditas clássicas ou acadêmicas — em outras palavras, pode significar o estabelecimento
de condições de possibilidade de uma Obra Aberta em oposição às limitações de uma Obra Fechada
— como mais adequadas a uma arquitetura a qual pode-se transformar com o uso, pode-se acresentar
ou eliminar sem a perda de sua singularidade.
O autor Bruno Zevi sugere que a edificação paradigmática dessa atitude projetual é o Mumers
Theatre concebido pelo arquiteto John Johansen em 1971 para a cidade de Oklahoma.
Dado que a noção de composição continua sendo muito importante como técnica de projeto
e como método de ensino, poderíamos sugerir como uma definição simplificada, mas abrangente,
que uma composição é uma organização ou arranjo ordenado de elementos formais com uma
intenção. Em outras palavras, o arquiteto adota um conjunto de princípios, uma lógica projetual,
para organizar, coerentemente, um conjunto de elementos construtivos.

PRINCÍPIOS COMPOSITIVOS E QUALIDADES FORMAIS DA COMPOSIÇÃO


GLOSSÁRIO DOS PRINCIPAIS TÊRMOS:
Apesar dos termos usualmente empregados estarem carregados de “perturbações” semânticas
e de se encontrarem certas discrepâncias entre diversos autores, sugerimos algumas definições,
simplificadas e elementares, para alguns desses princípios e qualidades:

Caráter: Diferencial semântico entre dois pólos paradigmáticos:


1. Apolíneo, Clássico ou Racional: Usualmente severo, rigoroso, rígido, estático.
Organizado de forma cartesiana ou abstrata.
2. Dionisíaco, Pintoresco ou Empírico: Usualmente dinâmico. Organizado de
maneira a propiciar uma experiência sensorial rica e variada.

Contraste: Destaque e contraposição de componentes, sem quebra da Unidade, com o


objetivo de reforçar a idéia temática básica da composição

Dominância: Acentuação ou relêvo de um aspecto formal.

Eixo: Linha imaginária de suporte que estabelece algum tipo de relação entre os
componentes.

Ênfase: Centro de interesse visual, ponto focal que prende a atenção.

Equilíbrio: Resolução ou anulação do conjunto de forças que atua numa organização de


elementos. Distribuição adequada de pesos e massas.

Escala Humana: O homem é o padrão e a medida de todas as coisas. Relação de dimensão


entre os componentes ou o conjunto e o homem.

Estrutura: Esqueleto ideal que dá suporte ao arranjo dos componentes.

Harmonia: Tratamento dado no arranjo de componentes de maneira a definir uma


totalidade. Qualidade pela qual todos os elementos são necesssários e nada
pode ser acrescido ou suprimido.

Hierarquia: Destaque e/ou ordenação de componentes por forma, tamanho ou disposição.


Malha: Rede ou grade dimensional que organiza o arranjo dos elementos.

Módulo: Entidade numérica, geométrica ou formal (módulo objeto) ordenada segundo


uma regra ou lei de formação.

Proporção: Relações de dimensão entre as partes do conjunto, e das partes com o conjunto.

Ritmo: Movimento regrado e medido. Disposição de elementos repetidos a intervalos


regulares. Sucessão cadenciada de elementos, podendo ser simples ou
composto.

Simetria: Têrmo que sofreu brusca mutação semântica desde a Renascença perdendo
seu sentido clássico de concordância com a medida. Pode ser definido, de
uma forma mais abrangente, como o produto de tranformações ou
movimentos, através dos quais uma entidade se transforma, elemento por
elemento, em outra. Estas tranformações podem se dar por translação (ou
simetria linear), rotação (ou simetria radial), dilatação ou reflexão (ou simetria
bilateral). Esta última é a mais difundida entre os arquitetos, já no século
XIX o autor Viollet-le-Duc iria argumentar que, na linguagem do arquiteto
simetria significava uma similitude de partes opostas, a reprodução exata, à
esquerda de um eixo, do que há na direita.

Traçado Regulador: Traçado de base geométrica, com uma lei de formação definida, que ordena
as partes da composição.

Unidade: O propósito de todo artista é exprimir uma idéia ou um tema formal (um
discurso, uma intenção compositiva). Toda composição tem um caráter de
ligação entre seus componentes. Compor é mais que justapor. Em uma
justaposição simples não existe a força de um discurso, de uma intenção, de
uma vontade, mas apenas a coleção, sem significado, de elementos isolados.
ANEXO 3
ANÁLISE GRÁFICA

Alguns autores alegam que provavelmente o homem primitivo registrou imagens, que de
alguma forma imitavam as coisas do mundo sensível, como uma forma ritual de “congelar” idéias
e acontecimentos. No entanto, o ato de reproduzir e criar um mundo de representação foi funda-
mental para o desenvolvimento do pensamento. O homem logrou separar o “aqui-e-agora” de
acontecimentos passados e daquilo que podia ser imaginado, simulado, ou até mesmo desejado.
Logrou formular idéias e propósitos que poderiam ser compartilhados. Logrou enxergar alternativas
de futuro.
Ao exibirmos a forma do mundo sensível através de imagens, gráficos e diagramas, mesmo
quando se tratam de recortes ou simplificações sintéticas do real, damos a estas representações
gráficas vida própria. São estes pensamentos exteriorizados que, lidando com uma grande quantidade
de informação, recriam uma dada realidade e permitem sua manipulação. O autor Paul Laseau
argumenta que, oferecendo-se de maneira clara e evidente à avaliação crítica, estas representações
abrem caminho para o inesperado, para o insólito, para a descoberta.
Como já visto anteriormente, antes de se iniciar um projeto ocorre uma fase preliminar em
que se define um conjunto de demandas ou problemas. A partir daí a operação projetual em
arquitetura, quanto a sua representação gráfica, se estabeleceria então através de duas fases
fundamentais: a formação da imagem da edificação e sua comunicação codificada visando uma
correta execução da obra. Para o autor Vitorio Gregotti Estas fases não são temporalmente sucessivas
nem logicamente causais. São funcionalmente independentes e se influenciam mutuamente ao longo
do desenvolvimento do projeto.

A EXPRESSÃO GRÁFICA DA ARQUITETURA


Tradicionalmente, a formação da imagem da edificação se dá através de croquis e esboços
e sua comunicação codificada se faz através de desenhos técnicos de precisão. Os passos entre
anotações gráficas e representações elaboradas não são em nada mecânicos, e implicam em
compromissos qualitativamente distintos. O valor de um desenho de arquitetura é, evidentemente,
independente do edifício que, eventualmente, poderá surgir dele. A qualidade gráfica de um desenho
não implica na qualidade arquitetônica do edifício representado e vice-versa. Muitas vezes os esboços
e croquis de grandes mestres, independentemente das edificações que deles derivam, podem se
transformar em veículos de busca de uma expressão formal mais geral que, de certa maneira, podem
influenciar toda uma produção arquitetônica.
O esboço ou croquis pode ser definido como um tipo de registro gráfico que, nascendo de
um processo rápido e espontâneo, acha-se pouco ligado a técnicas rígidas ou convenções. De caráter
ideogramático, desenvolve-se simultaneamente como desenho e como escrita. É talvez uma das
primeira das formas de expressão racional do pensamento. É também o veículo mais importante
para o estudo e para formação da imagem dos edifícios. Sendo o esboço uma forma de pensamento
exteriorizado e um instrumento para obtenção de conhecimento lida tanto com o geral como com o
específico.
Os principais sistemas de representação bidimensional rigorosa de objetos tridimensionais
são: perspectiva com fuga, perspectiva paralela (cavaleira, militar, axonométrica: isométrica,
dimétrica, trimétrica) e as projeções ortogonais (planta, corte e elevação). Vitruvio registrou as
primeiras definições que fazem o desenho de arquitetura universalmente inteligível. Na Renascença,
com Rafael, foi estabelecido o sistema ortogonal de representação organizado e codificado com
seu significado atual.
Fora da representação do desenho arquitetônico desenvolveu-se, a partir da Renascença, um
tipo de desenho que pode-se dizer precursor do desenho técnico de uma forma genérica. Antes de
ser desenho técnico só o desenho arquitetônico assumia, além da sua natureza construtiva, algum
compromisso com algum rigor dimensional e com alguma qualidade pictórica.
É só a partir de meados do século XVII que o desenho técnico começa a escapar da prática
exclusiva da arquitetura. No entanto, até meados do século XVIII, toda a atividade dos projetistas é
levada a cabo através de desenhos que, algumas vezes mesmo para a arquitetura, eram quase
inapresentáveis. O desenho tinha uma natureza predominantemente utilitária sem nenhum rigor
dimensional ou pictórico. Esta era a verdadeira natureza de um desenho quase técnico desenvolvido
fora das academias nos traçados antiperspécticos dos mapas dos agrimensores, engenheiros, e dos
funcionários das magistraturas. E se ao longo do século XVIII os desenhos dos exercícios da École
de Beaux Arts, apesar de cuidadosamente elaborados, não revelam, enquanto projetos, qualquer
tipo de preocupação quanto a sua exeqüibilidade; o desenho técnico como instrumento para a
comunicação de um projeto exeqüível adquirirá sua feição definitiva a partir dos desenhos, produzidos
principalmente pelos engenheiros saídos da École des Ponts-et-Chaussées, que inauguram o século
XIX.
Com o avanço da fotografia e com a informática, entre outros recursos, a representação
gráfica da arquitetura vem sofrendo transformações radicais. Os anos 90 assistem novos avanços
que prometem simulações gráficas que poderiam ser apreendidas pelos sentidos com uma intensidade
próxima à real.
Mesmo assim, o esboço a mão livre não está com seus dias contados, ainda não existem
computadores tão simples, portáteis e manejáveis como um bloco de notas e um lápis. Além de sua
reconhecida utilidade como ferramenta para a criação arquitetônica, o esboço a mão livre assume
papel não menos significativo quando utilizado para a representação de edificações existentes ou
na análise e observação de sítios ou paisagens nas quais se pretende intervir.
O prazer do risco natural, a simplicidade, rapidez e intimidade com que a mão trabalha a
pena sobre o papel são, e deverão continuar sendo, insubstituíveis. O exercício do desenho, como
instrumento para estudar e representar o objeto, contitui-se cada vez mais na única relação concreta
e real que o arquiteto mantem com a matéria física que deve criar: é a sua última “manualidade”.

EXPRESSÃO GRÁFICA NO ESTUDO DA FORMA ARQUITETÔNICA


Utilizados para o estudo e observação de uma edificação, sítio ou paisagem, tanto o esboço
a mão livre como o desenho de precisão, possibilitam um registro analítico, sensível e sintético,
que, por resultar de um olhar seletivo, se mostram, para o arquiteto, muitas vezes mais valioso que
uma fotografia ao representar uma dada realidade.

Uma rua de Amsterdam


Esquema de análise conforme sugestão do autor Dieter Prinz

Duas visões do conjunto arquitetônico de Pisa


Desenhos do caderno de viagens de LeCorbusier
ANÁLISE GRÁFICA NO ESTUDO DA FORMA ARQUITETÔNICA
Utilizados na forma de análise gráfica, estes desenhos visam decompor exemplos
significativos de objetos arquitetônicos tendo como interesse principal a compreensão de suas
qualidades formais.
Usualmente uma análise gráfica irá revelar aqueles aspectos fundamentais de uma edificação.
As ilustrações a seguir servem como um exemplo típico, foram elaboradas pelo autor Francis D. K.
Ching para o texto Arquitetura: Forma, Espaço e Ordem — bibliografia obrigatória da disciplina.
Os desenhos apresentam, de forma concisa, uma análise gráfica da VILLA SAVOYE de LeCorbusier.
EXEMPLOS DE REPRESENTAÇÕES PARA ANÁLISE DE UMA EDIFICAÇÃO
A título de exemplo, apresentaremos uma série de representações gráficas de um importante
edifício da antigüidade clássica:o Panteão. Este edifício, tendo sobrevivido intacto, é único entre
os muito edifícios importantes da Roma imperial.
Convertido em igreja no século VII foi bem conservado desde então. Hoje é conhecido
como Santa Maria Rotonda. Seu pórtico era originariamente parte de um templo inacabado cuja
construção data do ano 25 AC., já a rotunda em si foi construída por Adriano cerca de 150 anos
depois. Na época a idéia de um templo
com essa forma circular não era uma
novidade. No entanto, inéditas eram as
suas dimensões: tanto o diâmetro da
rotunda como a altura do topo do domo
são de 147 pés romanos, o que equivale
a cerca de 44 metros.

Situação do Panteão no Mapa de Nolli


MAIS EXEMPLOS DE REPRESENTAÇÕES PARA ANÁLISE DE EDIFICAÇÕES

Casa França Brasil (Centro / Rio de Janeiro) — Arquiteto Grandjean de Montigny


Museu de Arte Contemporânea de Niterói — Arquiteto Oscar Niemeyer
Habitação popular multifamiliar (Gamboa / Rio de Janeiro) — Arquiteto Lucio Costa
Habitação unifamiliar em área desertica (projeto não executado) — Arquiteto Oscar Niemeyer
ANEXO 4
MONUMENTO AOS PRACINHAS: DEPOIMENTO DO ARQUITETO

Transcrição da palestra proferida pelo arquiteto e professor Marcos Konder Neto, no dia 16
de setembro de 1994, no Monumento aos Mortos na II Guerra Mundial, para os alunos das turmas
do primeiro período do Curso de Arquitetura durante visita promovida pelos professores José Barki,
James Miyamoto e Beatriz Santos de Oliveira. Presentes ainda os professores Arnaldo Rocha e
Ananias Godoy, este último encarregado desta transcrição.

Croquis do Arquiteto Oscar Niemeyer

NOTAS DA TRANSCRIÇÃO:
1) Procurou-se manter a máxima fidelidade possível ao que foi dito pelo palestrante e seus
interlocutores, inclusive quanto a coloquialismos, expressões espirituosas, pausas, interjeições e
interrupções.
2) Os trechos iniciados por reticências geralmente referem-se a respostas dadas a alunos, cujas
perguntas não foram captadas pelo equipamento. Reticências no meio de uma frase geralmente
significam uma pausa maior do palestrante. Negrito significa tom enfático.

*
M.K.N.: “Muita gente pensa que eu sou do século passado, mas eu sou desse mesmo; eu me
formei em 1950, portanto, segunda metade do século. Somos contemporâneos, apesar de tudo.
Este projeto, digamos, é o coroamento de todo um conceito arquitetônico, que atualmente está
meio em desuso, mas que eu acho que ainda tem muitos frutos a dar...
... É o conceito da Arquitetura Moderna, da arquitetura contemporânea; que teve seus maiores
expoentes nas figuras de Le Corbusier, Mies Van Der Rohe, de Gropius, enfim, da Bauhaus, não é?
e que propugnava por uma arquitetura que - de certa forma radical - rompesse com as tradições do
passado e passasse a utilizar toda a tecnologia do século XX, e toda a conceituação social e psicológica
da nossa época. Quer dizer, uma arquitetura que rompia com o academicismo.
Nós mesmos, na escola, tínhamos uma luta constante com os nossos professores, coitados, que
com boa vontade queriam nos ensinar a fazer posto de gasolina em estilo grego...coisas assim desse
tipo, com volutas, etc. E nós contrariávamos isso fazendo as coisas ultramodernas; até, às vezes,
sem lastro(1), mas justamente por uma questão de combate. Então esse período foi um período
importante, um período muito rico. Eu pertenço, digamos assim, à segunda geração da
Arquitetura Contemporânea. A primeira geração foram os grandes mestres conhecidos, como Lúcio
Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, os irmãos Roberto(2), principalmente os dois mais
velhos, que já morreram, também não esquecendo o Sérgio Bernardes, que era mais ou menos entre
eles e nós... O Reidy, eu tive o privilégio de trabalhar com ele na prefeitura, quando ele era funcionário
e onde eu também fui funcionário, aliás porque ele me chamou, juntamente com o Hélio Marinho,
que foi meu companheiro aqui no projeto, e o Flávio Marinho Rego, para colaborar com ele no
departamento de edificação popular, onde nós fizemos muitas coisas interessantes - infelizmente
nada foi realizado - e foi o período em que ele começou a ...
(1) Sem embasamento de ordem técnica, estrutural.
(2) Maurício, Marcelo e Milton Roberto.

... projetar o museu(3), que coincidiu com o período da construção aqui do monumento. Aqui,
fazendo agora um pequeno histórico, naquele período estava sendo feito o desmonte do Morro de
Santo Antônio; e havia então, isto é...foi feito um projeto para o Aterro(4), com o produto do desmonte;
para cá, para fazer um grande aterro, tirando o material que vinha do Morro de Santo Antônio. Esse
projeto do Aterro foi feito pelo Reidy(5). Há alguns dias atrás eu tive a oportunidade de esclarecer
uma coisa que saiu no jornal e que dizia que o projeto do Aterro tinha sido de uma senhora chamada
Carlota Macedo Soares. Não é verdade. A Sra. Carlota Macedo Soares foi foi designada pelo
governador da época, o Carlos Lacerda, para dirigir as obras. Mas o projeto do Aterro, das pistas,
dos pavilhões, etc., foi projeto do Affonso Eduardo Reidy. E nesse projeto, então, ficou fixado o
local o local para o Museu de Arte Moderna; e os militares pediram que fosse designada uma área
onde eles queriam implantar um monumento em homenagem aos brasileiros que tinham morrido
na Itália, na campanha da Força Expedicionária Basileira. Como vocês sabem, o Brasil mandou
uma pequena força para a Itália, simbólica; mas de qualquer forma foi um esforço muito grande
para um país como o Brasil, um país subdesenvolvido. Coitados dos pracinhas! sem treinamento
nenhum, sem roupas, sem alimentação adequada...foram para lá sofrer os rigores do frio italiano...e
fizeram um bonito papel, mesmo simbólico! Demonstraram que o Brasil estava disposto a com-
bater, também, o fascismo que, no momento, estava sendo derrotado pelas forças aliadas. Então, os
militares pediram que fosse designada uma área de 100 x 100 metros, um quadrado, aqui no Aterro,
para que fosse erigido um monumento em homenagem aos brasileiros mortos, e também para
trasladar os restos mortais deles, que estavam situados no cemitério de Pistóia, na Itália. Para isso
foi aberto, então, um concurso público, de âmbito nacional, a todos os arquitetos que quisessem
participar e dando a área e dando um programa. O programa do concurso era um programa muito
complicado, porque eles pediam muitas homenagens: homenagem à Marinha, homenagem ao
Exército, homenagem à Aeronáutica; homenagem aos navios mercantes que foram torpedeados
pelos submarinos alemães; porque morreu muita gente - para que vocês saibam - muitos brasileiros
morreram não foi da Guerra, não; morreram nos navios que saíam aqui do Rio, que eram praticamente
o único meio de transporte para o nordeste na época... Não havia, quase, estradas, não é? era tudo
por navio...então os navios iam pela costa até o nordeste e eram torpedeados pelos submarinos
alemães. E morreram muitos brasileiros nesses naufrágios, civis inclusive, não eram só os militares.
... Então havia todas essas homenagens , e pedia-se também um museu, para os troféus da F.E.B., e
um mausoléu para a localização dos restos mortais. Esse programa, assim complexo e muito variado,
nos deixou preocupados. Depois, nós fomos começar a conceber o projeto, aí nós ficamos
imaginando: vamos fazer o quê? uma enorme construção, com isso tudo lá dentro? ou uma série de
pequenas coisas, disseminadas num terreno, cada uma simbolizando uma dessas homenagens?
Achamos que nenhuma dessas duas soluções era adequada. Nós queríamos fazer alguma coisa que
se fizesse com unidade, um monumento; e que dentro desse monumento as coisas ficassem, quase
que sem sentir, localizadas. Então isso foi uma das primeiras preocupações. A segunda preocupação
foi que aqui nesta parte do Rio de Janeiro nós temos uma visão paisagística muito bonita, que é de
toda a Baía da Guanabara, o perfil do Pão de Açúcar, etc., e nós não queríamos que o monumento
fosse uma coisa, digamos, muito massuda, cobrindo demais essa paisagem. Então essa foi a segunda
preocupação que tivemos. E a terceira preocupação o seguinte: como é que nós iríamos marcar,
simbolicamente, esse ponto; quer dizer, tinha que ser alguma coisa marcante. Não podia ser uma
coisa baixinha, ou uma simples construção; tinha que ter algum elemento marcante. Aí nós nos
lembramos do Arco do Triunfo, em Paris, onde existe o túmulo do soldado - aliás, era pedido
naquele programa a localização do túmulo do soldado desconhecido - bem, então nós nos lembramos
do Arco do Triunfo, em Paris, que é um pórtico embaixo do qual tem o fogo simbólico
permanentemente aceso e onde estão enterrados os restos do soldado desconhecido. Além disso,
havia uma outra preocupação; essa era uma preocupação de composição, já arquitetônica e espacial:
... era um espaço muito descampado.
... A tendência, quando se faz qualquer coisa aqui, não para quem está de perto, mas para quem está
lá longe (aponta para os prédios no centro da cidade e na Glória), é a coisa se amesquinhar, perder a escala,
ficar muito pequena e ficar sem balizamento. Então isso nos levou, logo de saída, a pensar em
alguma coisa que desse um envolvimento espacial; foi por isso que nós adotamos o partido do “L”,
alguma coisa que balizasse o espaço, entenderam? que o espaço não ficasse ...
(3) Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
(4) Parque do Flamengo, tb. chamado Aterro do Flamengo.
(5) O projeto arquitetônico e urbanístico. O paisagismo coube a Roberto Burle Marx.

... aberto. Isto foi outro princípio que norteou o nosso projeto. Baseados nesse princípio, nós
imaginamos o seguinte: Ora, numa homenagem é sempre bom que a pessoa seja obrigada a subir.
Ela já está prestando uma homenagem no momento em que ela está subindo, ela está se cansando,
ela já está dando algo de si para homenagear alguma coisa. Aí nós imaginamos o seguinte: fazer
uma plataforma alta, elevada do solo, com essa forma em “L”; e no eixo dessa plataforma, então,
localizaríamos uma grande escadaria e localizaríamos um elemento vertical marcante, sob o qual
estaria, então, o túmulo do soldado desconhecido. Houve uma outra consideração: Como nós
fecharíamos esse pórtico? À maneira tradicional seria com um arco, ou alguma coisa desse tipo. Aí
nós pensamos...não...mas...a arquitetura contemporânea, com o advento do concreto armado, abriu
grandes perspectivas para o arquiteto compor sem ser naquele sistema em que você leva os esforços
para as colunas através do arco. Então nós queríamos dar um sentido... digamos, também
arquitetônico a esse pórtico. E, posteriormente, foram dadas várias interpretações a esse pórtico; e
aí já não caberia mais aos arquitetos interferir. A princípio até havia uma gozação, diziam que era a
muleta do pracinha, havia essa primeira interpretação... O carioca é muito gozador, e quando esse
troço começou a aparecer aí a primeira coisa que diziam é que era a muleta do pracinha. Depois os
militares deram outras interpretações, diziam que eram como se fossem assim, digamos, mãos para
o céu. Mas eu confesso a vocês que nós, arquitetos, não tivemos nenhuma participação nesse
simbolismo nem nessa metáfora. A nossa idéia era arquitetônica, abstrata. Porque nós continuamos
achando que a arquitetura, apesar de ter conotações simbólicas e metafóricas, ela é muito uma arte
abstrata. Ela lida com espaços, com volumes, com texturas; e das artes talvez seja a que menos
comunique uma idéia imediata. Ela não é como a pintura, ou como a música, ou como a literatura.
Essa, então, nem se fala!...
... Quer dizer, a literatura comunica totalmente o que o escritor está querendo dizer... Então a nossa
idéia foi que o pórtico fosse alguma coisa que pairasse no ar, que não ficasse ligado à terra, tivesse
uma... como que estivesse sobrevoando. Então nos deu essa idéia de fazer uma superfície curva,
ascencional. Isso também nós achamos que daria um sentido de espiritualidade ao monumento;
alguma coisa que fisesse a curva ir para cima e não para baixo. Daí nós projetamos esse pórtico,
que ficou limitado, em altura, por um balizamento da Aeronáutica; porque aqui perto tem o Aeroporto
Santos Dumont, não poderíamos ultrapassar a trinta e poucos metros... Eu me lembro que esse
concurso foi em duas etapas: uma primeira etapa era só desenhos, perspectivas, e a segunda etapa
foi com maquete. Na primeira etapa eles classificaram cinco projetos, e na segunda etapa, então,
escolheram o definitivo. Eu me lembro que quando chegou na segunda etapa e nós começamos a
fazer a maquete, nós começamos a ver que o elemento que define o pórtico, lá em cima, estava
muito pequeno em relação ao espaço vazio. Então nós fizemos uma maquete com vários tamanhos
daquela cobertura e tirávamos fotografias para sentir a proporção, como se estivesse uma pessoa
olhando lá de longe; não adiantava por uma pessoa olhando aqui de perto. Tanto que aquilo ali é
enorme (referindo-se à grande laje curva, no alto) : Tem 20m de extensão por 10m de largura, são 200m2...
Daria um apartamento lá! Um bom apartamento, não? ... Eu tenho aqui um resumo que eu fiz, que
eu vou deixar depois com os professores... se vocês quiserem, depois, tirem xerox para dar uma
lida...”

RESPONDENDO À PERGUNTA DE UMA ALUNA:

M.K.N.: “... é; não, aí é que mostra que arquitetura é Arte, não é so construção. Porque os conceitos
da arquitetura contemporânea, da Arquitetura Moderna, eram basicamente os conceitos do
funcionalismo; aquele famoso slogan que “a forma segue a função”, que foi divulgado pelo
Sullivan(6), que era o mestre do Frank Lloyd Wright; mas este conceito foi emitido pela primeira
vez por aquele arquiteto da Biblioteca Santa Genoveva, de Paris, como é o nome dele?...agora me
esqueci(7), no século XIX, ele é que disse: “Em arquitetura a forma deve seguir a função”, isto é, a
forma deve se adequar àquilo que está abrigando, não pode ser gratuita. Então, a arquitetura
contemporânea, na época da nossa geração, era muito bitolada por esse conceito. A gente tinha
muito medo de fazer alguma coisa que parecesse gratuita, que não tivesse assim uma função. Eu,
quando era estudante de arquitetura, uma vez estava num escritório e nós projetávamos hospitais; e
o arquiteto me mandou estudar uma fachada. Eu achei que a fachada estava monótona, as janelas
assim recortadinhas, e fiz uma moldura em cada ...
(6) Louis Sullivan, arquiteto norte-americano de fins do séc. XIX.
(7)Henri Labrouste, Bibliothéque Nationale, Paris, 1868.

... janela, uma moldurinha de concreto. O arquiteto disse assim: “Nãão! Que absurdo! Que é isso,
rapaz? Uma janela é uma janela, não pode ter uma moldura em volta! Isso aí é um absurdo, é uma
coisa que não se pode fazer!...” Quer dizer, era uma certo purismo, uma ética exagerada em relação
ao exercício da profissão. Claro que isso tudo foi um exagero, mas um exagero necessário.
Atualmente, os arquitetos não estão mais tão presos a esse tipo de conceito. Mas ainda acho que
esse conceito de que a arquitetura deve espelhar, o mais possível, aquilo que ela está contendo; e
que deve espelhar, o mais possível, todo o contexto sócio-econômico da sua época acho que con-
tinua válido. Então, respondo à sua pergunta o seguinte: Aquilo ali é gratuito (indicando as quatro
hastes horizontais que ficam entre os pilares do pórtico). Nós chegamos à conclusão de que os pilares estavam
muito vazios de alguma coisa que quebrasse essa altura. Então, aquilo ali não tem função estrutural,
não tem função outra que não a meramente estética. O que é ótimo, porque vem provar que arquitetura
é uma arte, não é só construção. Ela tem um conteúdo de Arte que jamais vai ser tirado. Eu tenho
uma frase em que digo assim: Arquitetura é Arte com engenho, engenharia é engenho sem Arte.
Essa é a diferença entre Engenharia e Arquitetura. O arquiteto tem que conhecer a tecnologia, tem
que ter noções boas de estrutura, de resistência dos materiais...
...Tem muita gente que acha que o arquiteto não tem que conhecer nada disso. Ele faz o projeto, da
sua cabeça, alguma coisa assim, depois dá para o engenheiro; para o engenheiro então escolher a
estrutura. Não, isso é absolutamente errado! Eu acho que o arquiteto consciente, quando faz um
projeto, ele tem que lançar toda a estrutura do projeto. Ele pode não saber dimensionar exatamente
o tamanho de uma viga ou de uma coluna, mas ele sabe que aquela viga não vai ter um metro de
largura nem vai ter dez centímetros de altura... Ele sabe que aquela viga vai oscilar entre 50 ou 60
centímetros de altura, por 20, por exemplo. Agora, então, vai caber ao engenheiro calculista, no
caso, dimensionar a viga corretamente, estipular as ferragens, etc. Nesse monumento aqui, toda a
estrutura foi concebida por nós. O calculista, aliás, foi um dos maiores calculistas brasileiros, chamado
Joaquim Cardoso; que foi colaborador do Niemeyer na maior parte das suas obras, inclusive em
Brasília. Esse calculista tinha uma característica inusitada: ele era calculista e poeta, para vocês
verem que homem que era esse Joaquim Cardoso... Infelizmente, ele teve uma tragédia na sua vida,
que foi o desabamento do Pavilhão da Gameleira, lá em Belo Horizonte; que, como sempre na hora
da desgraça, muitos atribuíram a ele um erro de cálculo, mas eu não acredito. Ele era um calculista
muito audacioso, trabalhava sempre no limite da capacidade do material. Mas ele era um camarada
criador! Ele não era como a maioria dos calculistas que, quando o arquiteto propõe alguma coisa
com duas colunas, por exemplo, eles querem dez colunas. Quer dizer, ele procurava respeitar. Eu
me lembro que quando eu cheguei com o projeto lá pra ele, eu disse: “Ô, Cardoso, nós estamos com
seções muito pequenas para a estrutura... acho melhor fazer isso em concreto protendido.” Porque
o concreto protendido, vocês sabem, permite seções menores de vigas, etc. Ele disse: “Não, não,
vamos fazer de concreto normal mesmo, que dá.” E realmente, ele fez com concreto tradicional
mesmo, só que com uma ferragem aí dentro que... é como a gente chamava naquele tempo: “ferro
à milanesa”; é praticamente estrutura metálica envolvida por uma camada muito fina de cimento,
areia e pedra. Bom, então respondi sua pergunta e acabei fazendo uma digressão que me perdi um
pouco, mas, enfim... Então a idéia do partido foi essa, criar um espaço, balizar esse espaço, criar
uma escadaria que levasse a pessoa à homenagem, criar esse pórtico sob o qual estaria o túmulo do
soldado desconhecido, que é o elemento simbólico, que é o elemento chave do conjunto. Aí, então,
dentro desse conjunto, nós imaginamos as homenagens às três forças armadas. Ora, nada melhor
do que botar essa homenagem no primeiro plano. Então o escultor, na época o Alfredo Ceschiatti,
que colaborou muito com Oscar Niemeyer em Brasília, fazendo aquelas esculturas da Justiça, que
fez aqueles anjos da Catedral, etc. O Ceschiatti era muito influenciado por aquele escultor francês
famoso, o Mayol. Ele(8) tem esculturas muito bonitas, principalmente de mulheres; são meio pesadas,
meio barrocas... Então, nossa idéia foi botar ali, no primeiro plano, a homenagem às três forças
armadas; aquelas três figuras ali, simbolizando o soldado, o marinheiro e o aviador. Havia uma
homenagem que eles pediam que seria muito complicada de se fazer, que era a homenagem à
Aeronáutica. Já imaginou um aviãozinho daquela época, de hélice e tal? se a gente fizesse um
aviãozinho daquele lá em cima, hoje em dia ia ser ridículo, não é? Então nós pedimos a um colega
muito talentoso, um arquiteto chamado Júlio Catele Filho, que foi colega de turma - também tá vivo
ainda, não é do século passado, não!(risos) — aí eu disse: Ô Catele, tem uma coisa boa aqui pra você
fazer... ele lidava muito assim com essas coisas... eles pedem uma homenagem à Aeronáutica;
quero que dê idéia de avião, de coisa voando, mas que não tenha ...
(8) Referindo-se a Alferdo Ceschiatti, não a Jacques Mayol.

... aquele aviãozinho de hélice voando, que daqui a dez anos vai ser um troço ridículo! Aí, ele
concebeu essa escultura metálica, que para mim é uma das coisas mais bonitas que tem aqui no
monumento. Não envelheceu, digo conceitualmente, como conceito de Arte, não fisicamente. É
engraçado, o cara não é escultor, é arquiteto, continua até hoje fazendo projetos, tem seu escritório;
isso aí é projeto dele... Eu estou citando todos eles porque foram nossos colaboradores importantes
no projeto... E finalmente, eles pediam umas homenagens à Força Expedicionária e aos navios
mercantes e militares que haviam sido torpedeados na costa brasileira...
... Então nós chamamos um pintor, chamado Anísio Medeiros — foi professor da faculdade, não
foi? — para colaborar conosco, fazendo aqueles dois painéis ali à entrada do mausoléu, de cerâmica,
um deles homenageando os navios mercantes e o outro homenageando os navios de guerra. Ele fez
também, ali no museu, que fica atrás disso(9), um painel cujo tema é guerra e paz. É um bonito
painel, que simboliza essas coisas. Aí nós completamos as homenagens. E a parte dos mortos, nós
pensamos o seguinte: Enquanto a parte de homenagens deve ser “subindo”, os mortos devem ficar
num local de recolhimento, de subsolo, num mausoléu; que é uma grande área onde estão enterrados
os quinhentos mortos, ou coisa assim, chamados os pracinhas, mortos na Itália que foram repatriados.
Essa foi a concepção geral. Ali no meio tem um jardinzinho, que depois eu vou mostrar pra vocês,
que tem um painelzinho que fica no gramado, com o roteiro da F.E.B. na Itália, enfim... Agora,
digamos, quanto à... Ah! tem uma coisa curiosa: Quando você está lá na Av. Rio Branco, o pórtico
monumental está bem no eixo. Então as pessoas me perguntam... “Puxa, vocês fizeram? É uma
coisa incrível, o pórtico está bem no eixo!...” Nada disso, foi mera coincidência! Daqui a quinhentos
anos os teóricos de arquitetura vão fazer milhões de traçados reguladores, teorias geniais, etc., etc.,
nada disso!(risos) foi mera coincidência! Começou a construir o troço e tal, quando ficou pronto,
tava lá: bem no eixo da Av. Rio Branco! Tá bom, não é? deu sorte até... mas não foi com esse
objetivo. Você vê que a sorte ajuda às vezes o arquiteto, então foi uma boa coisa!(risos) ... Então,
bem, deixa ver se eu esqueci alguma coisa... Bom, do ponto de vista mais técnico, tem 4.900m2 de
área construída, os materiais são todos granitos de primeira qualidade... Ah, aqui tem um pequeno
detalhe que eu quero mostrar a vocês para livrar minha cara como arquiteto: Aquele arrematezinho
ali, aquele dente (aponta para a junção da mureta direita da escadaria com a da plataforma), não faz parte do
meu projeto. O projeto foi feito e construído sem o dente, mas anos depois houve aí uma reforma
no monumento e não nos chamaram para dar opinião nesse negócio, e quando eu vi, o mal já estava
feito. Não sei por quê, alargaram aquele peitoril e levantaram, em relação a esse negócio... Tem
também umas coisas curiosíssimas! Estão vendo estes postes enormes aqui(10)? Foi um americano
que chegou aqui uma vez, chamado pelo Carlos Lacerda, o Kelly, especialista em luminotécnica,
para melhorar a iluminação do Aterro; e ele bolou esses postes, que daqui a alguns anos vão ficar
obsoletos, porque as árvores vão crescer, as frondes vão ficar muito grandes e a iluminação não vai
penetrar. Mas até agora eles estão funcionando. Bem, esse americano veio aqui e inventou esses
postes aí. E um belo dia eu estava no escritório e recebi um telefonema do Ministério da Guerra(11),
para eu ir a uma reunião. Aí eu cheguei — tava “assim”de general, lá — vão me prender aqui!...
... Era na época da revolução de 64, aí eu pensei: Ôpa, vão me prender aqui!... A minha ficha não
era das melhores, eu digo: Tô frito!...
Eles disseram: “Não, não,... nós chamamos o senhor aqui porque queremos fazer uma consideração...
porque o arquiteto Kelly sugeriu que o fogo simbólico em vez de ser ali embaixo fosse lá em cima...
porque o governador Carlos Lacerda já se prontificou a pagar as despesas...” Eu digo: Mas como?!
Querem fazer um negócio tipo de uma refinaria?? Aquele fogo lá, coisa grotesca!! Você sabe que
eles já estavam embarcando nessa canoa? Eu disse não, senhor! de maneira nenhuma, isso aí vai
mutilar totalmente a idéia, vai tirar totalmente a dignidade do monumento... Vai ficar que nem
aqueles troços de refinaria, aquelas torres que ficam queimando gás permanentemente, uma torre
de refinaria!(risos) Então foi vetado. Outra coisa que o monumento também teve, e aí eu acho que
foi mérito nosso; foi o primeiro monumento contemporâneo, talvez, no mundo, assim com essa
característica. Porque, antigamente, todos tinham aquele ranço de... estátua eqüestre e não-sei-quê.
Aliás, o Lúcio Costa ressaltou isso uma certa ocasião. Ele é lúdico, ele pertence à população. A
população entra, passeia, sobe, desce...
(9) Até àquele momento, a palestra estava sendo feita de frente para a escadaria, onde se sentavam os alunos.“Atrás
disso”, i.e., atrás da escadaria, local do museu de troféus da F.E.B..
(10) Postes de iluminação do Aterro do Flamengo, com altura de vários andares e cinco “cúpulas” pretas.
(11) Antigo ministério militar, que englobava as três forças armadas, e que hoje corresponde ao Ministério do Exército.

*
... é programa para papai no fim de semana trazer filho; passou a ser uma coisa integrada à cidade
e não uma coisa assim... monumento é aquela coisa que você vê de longe, aquela coisa cheia de
pompa. Esse não, o pessoal vai lá em cima, vê a vista, passeia. Inclusive, antigamente, quando o
mar ia até o Passeio Público, no tempo do Glaziou(12), ali onde tem aquelas esculturas do Mestre
Valentim(13) era um mirante. O sujeito ia passear no Passeio Público e ficava olhando para a Baía
da Guanabara. E nós restabelecemos, de certa forma, este mirante, até em condições invejáveis,
porque o cara vai ali pra cima com a namorada, fica namorando, tira fotografia, olha o Pão de
Açúcar, olha para a paisagem... Mesmo sendo um monumento fúnebre, guardando suas características
de seriedade, a população passou a participar dele com o maior interesse. Outra coisa interessante:
O concreto aparente foi utilizado, aqui no monumento juntamente com o museu(14) — foram
construídas na mesma época as duas obras — talvez pela primeira vez aqui, em larga escala, no
Brasil. No Rio de Janeiro tenho certeza, no Brasil ... acredito também. Porque até àquela época a
arquitetura carioca predominava no Brasil inteiro. Não havia, ainda, o fenômeno da arquitetura
paulista. O Rio era ainda a capital de fato, até um certo período, e depois a capital cultural do país.
Então foi a primeira vez em que se usou o concreto aparente. Aquelas colunas que vocês vão ver lá
no subsolo (indicando o pilar de sustentação da laje sobre a qual está a escultura de Ceschiatii), nós fizemos a
interseção de dois sólidos, dois prismas. Um prisma de base triangular, aliás, piramidal, e um prisma
reto; para evitar que ficasse massudo, pesado. Então, o que nós obtivemos? Obtivemos uma base
quadrada, na diagonal, mas você não tem aquela sensação de coisa pesadona, chegando no chão.
Isso foi uma “sacação” que depois eu vi em muitos projetos aí pelo Rio de Janeiro, vi em tudo
quanto é lugar por aí. Direitos autorais, são nossos... Ali no mausoléu, nós continuamos com o
mesmo tema das colunas que vão lá embaixo. Do ponto de vista técnico, vou mostrar para vocês
uma coisa interessante: aquele balanço de 14 metros, se vocês olharem com atenção... É, ele caiu...
pra vocês verem; o calculista, o Joaquim Cardoso, disse assim: “Eu vou dar uma contra-flexa...”
(interrompe para explicar) Contra-flexa é o seguinte: você tem um grande balanço, você quando concreta
faz a coisa levantada. Depois, quando tira o escoramento, o concreto trabalha e a coisa desce. O
Cardoso deu ali uma contra-flexa de 19 centímetros e mesmo assim, quando tiraram o escoramento,
ainda passou um pouquinho do nível. Os vãos aqui são muito grandes, o vão daqui pra lá tem 30
metros, sem coluna intermediária (vão entre o museu e a entrada do mausoléu)... Então é uma estrutura
muito ousada, até, para a época. Uma estrutura como nunca até então hsvia sido feita no Brasil.
Graças ao auxílio que tivemos do querido mestre Joaquim Cardoso. Então, como nós tínhamos a
escadaria como único elemento opaco da construção, nós resolvemos localizar o museu atrás. O
museu, do ponto de vista estrutural, é interessante também. Você olha assim, ele é uma caixinha de
vidro, então, aparentemente só tem esses dois pilares e mais nada. Mas aí tem um macete
arquitetônico. Todos os montantes das esquadrias são pilares de aço embutidos, que formam uma
espécie dum envoltório estrutural, para ajudar a segurar essa grande plataforma aqui. Esses dois
pilares do pórtico têm uma característica interessante: eles são ocos. Um tem uma escadinha que
vai até lá em cima (indica o da esquerda), e o de cá tem uma caixa d’água até mais ou menos um terço
da altura, que serve a todo o conjunto. Esse projeto foi laureado com menção honrosa na VI Bienal
de São Paulo. Eu sou autor também do Restaurante Rio’s, aqui no Aterro. O Aterro, aliás tem uma
característica: ele está tombado, não se pode construir mais nada. Bom, vocês amanhã poderão
dizer pros seus netos: olha, eu conheci o autor do projeto desse troço aí... Eu estava com 28 anos,
estava formado há quatro anos quando fiz esse projeto. Concursos valem a pena. Se vocês tiverem
chance de fazer um concurso, façam.”

*
M.K.N.: “...tem uma historinha engraçada também. O Le Corbusier, na última viagem que fez ao
Brasil, pouco antes de ele morrer (interrompendo) — O Le Corbusier morreu não foi de velhice, não.
Morreu afogado. Ele era um cara tão incrível que com setenta e tantos anos resolveu enfrentar o
mar lá na França e acabou morrendo afogado...
... Ele era o papa da Arquitetura naquela época, e o Lúcio Costa dizia que que os livros de LeCorbusier
eram “livros sagrados”; é como se fosse a Bíblia. Conhecem aqueles álbuns do LeCorbusier?, são
cinco álbuns...
(12) Auguste Marie Glaziou, diretor de parques e jardins da Casa Imperial, foi o grande paisagista da segunda metade
do séc. XIX, no Rio de Janeiro. M.K.N. refere-se à reforma do Passeio Público, executada por Glaziou em 1860, que
deu ao parque o traçado e o paisagismo que permanecem até hoje.
(13) Valentim da Fonseca e Silva (1740 ou 1750 a 1813), o Mestre Valentim, como se tornou conhecido, foi o maior
escultor do Brasil colonial, depois do Aleijadinho. Foi autor, dentre inúmeras obras, das esculturas, do chafariz e das
duas pirâmides (chamadas “agulhas”) que ainda hoje ladeiam o portão principal do Passeio Público.
(14)M.A.M.

... No meu tempo, se projetava com aqueles álbuns em cima da prancheta, não se podia sair daqueles
cânones. Era um exagero, mas um exagero sadio, porque a gente estava aprendendo Arquitetura de
alguém que podia nos ensinar alguma coisa que infelizmente nossos professores não podiam nos
ensinar, na época. Eles tinham uma identificação arquitetônica totalmente diferente da nossa. Então,
como eu ia dizendo, ele veio ao Brasil, o Lúcio Costa foi recebê-lo, etc.; e a filha do Lúcio Costa,
a Maria Elisa, foi levar o Le Corbusier para visitar as obras do Rio e, naturalmente, trouxe ele aqui
para o Museu de Arte Moderna. Ficaram, e tal... mostrou, e tal; aí botou no carro e iam saindo para
levá-lo lá naquela ponta do Leblon, na casa do Sérgio Bernardes, aquela num promontoriozinho
que tem lá - aliás, uma das melhores coisas que fez o Sérgio Bernardes - aquela, com cobertura
meio-tubo. Bem, aí o carro tava passando aqui em frente, já, direto; aí o Le Corbusier disse assim:
“-Ôpa! Pára aí, pára aí; que obra é essa aí?” ; “-Ah, é o monumento e tal...” , “-Não, não, pára que
eu quero ver!” . Então, eles pararam o carro, diz que ele saltou e ficou aqui uma hora vendo... Aí,
depois eu até levei um susto, porque um dia eu estava no escritório e recebi um telefonema do Lúcio
Costa - ele disse assim: “Ô Marcos!”; —Diga! — quer dizer, eu não falei assim não! (risos); eu não
sou íntimo do Lúcio Costa, eu trato ele de Doutor Lúcio, Professor Lúcio, porque ele é bem mais
velho... Ele disse: “Olha, o Le Corbusier viu a sua obra, gostou muito, e gostaria de conhecê-lo.”
A mim e ao Hélio Marinho, que foi meu companheiro de projeto. Aí, teve um jantar, de noite,
fomos lá e tal, ele (15) disse: (caricaturando engraçadamente um sotaque francês) “Bravô, messiê! Bravô e
tal...” E antes de ele ir embora deixou uma cartinha para o Lúcio Costa, manuscrita, onde ele faz
ponderações sobre os amigos, o Brasil — ele gostava muito do Brasil, afinal, foi onde as teorias
dele todas foram implantadadas pela primeira vez, o paradigma é o Ministério da Educação e
Saúde(16). Houve um traço original dele e depois a equipe de arquitetos levou adiante. Então, ele
fala em Brasilia, evidentemente, e diz assim (lê, traduzindo para as turmas, a cópia da carta de Le Corbusier):
“No mundo moderno, Brasilia é única. No Rio de Janeiro, há o Ministério, há as obras de Reidy...”
— que ele elogiou — “...e há o Monumento aos Mortos da Guerra.” Quer dizer, estas foram as
obras que ele citou, no Rio de Janeiro, como sendo as mais importantes. E a casa do Sérgio Bernardes,
coitado, que eles levaram-no para conhecer, ele nem menciona. Nós tínhamos muita influência
dele, evidente que tínhamos; aliás, toda a Arquitetura da minha época tinha influência de Le Corbusier,
isso não se pode negar, não é? Bem, essa foi mais uma historinha interessante... Agora, acho que
nada mais eu poderia dizer. Vocês querem fazer alguma pergunta?”
(15) Referindo-se a LeCorbusier
(16) Atual Palácio Gustavo Capanema, edifício sede do Ministério da Educação no Rio de Janeiro, situado no quarteirão
entre R. Araújo Porto Alegre, R. da Imprensa e Av. Graça Aranha. O projeto, feito a partir de croquis de Le Corbusier
em 1936, foi desenvolvido por uma histórica equipe de arquitetos notáveis, composta por Lúcio Costa (o chefe), Carlos
Leão, Jorge Moreira (autor do edifício da FAU-UFRJ) e Affonso Eduardo Reidy; aos quais juntaram-se, mais tarde,
Oscar Niemeyer e Ernâni Vasconcelos.

UM ALUNO, QUE HAVIA SERVIDO NO CORPO DA GUARDA DO MONUMENTO,


PERGUNTA SOBRE A PARTE DE TRÁS DA CONSTRUÇÃO, E SOBRE A VENTILAÇÃO DO
SUBSOLO.
*
M.K.N.: “...Ah, sim, sim, é o seguinte: nós não poderíamos fazer o negócio totalmente fechado,
então nós abrimos um rasgo todo pro lado de lá, que é o lado da boa orientação e tal, para dar uma
luminosidade, digamos, transversal; e quisemos criar um espelho d’água lá atrás; de modo primeiro
a isolar as pessoas do vão de iluminação. Nós aí achamos que ia ficar bonito - aí também, era uma
coisa estética, não tinha assim uma finalidade prática - que ele fosse em pequenas cachoeiras, três
ou quatro níveis, a água caindo... Não sei se está funcionando, mas é sempre uma coisa repousante,
não é?, é sempre repousante, todo mundo gosta daquele barulhinho...

O ALUNO: “Eu acho aquele barulho horrível!”

M.K.N.: “É horrível?(surpreso)

O ALUNO: “Para quem vive lá, é horrível, incomoda...”

M.K.N.: “Bem, quem vive lá são os mortos...”(risada geral na audiência)

O ALUNO: “Não, tem os soldados que moram lá... é ruim...”

M.K.N.: “Os soldados têm uma área ventilada para o lado de lá... A área dos soldados tem um poço
de ventilação para o lado de lá. Eles têm uma ventilação boa...”

O ALUNO: “Não é boa não...”

M.K.N.: “Não?... Ah, sim, você diz a parte onde eles dormem... É, esse alojamento é para lá,
realmente.”

O ALUNO: “...o alojamento dos oficiais tem ar condicionado, o dos soldados é muito quente...”

M.K.N.: “Mas aí você tem que ver o que é que está se projetando; isso é um monumento, nós
estamos falando de de um alojamento provisório, habitação é outra coisa. Nós estamos falando de
um monumento. Ali é o corpo da guarda que dorme quinze dias... Eles não ficam dormindo ali
permanentemente.

O ALUNO: “Mas mesmo assim devia ter uma ventilação. Tanto é que os oficiais têm ar condicionado,
os soldados não...”

M.K.N.: (desistindo de convencer o aluno) “Ah, você tem razão, claro... Então é uma falha nossa... Eles
podiam reivindicar isso, não é? seria uma boa coisa, não é?... Fala com eles lá, para eles reivindicarem
isso: botar um ar condicionado...”(gargalhada geral da audiência)

UMA ALUNA: “Por que aquele murinho não encosta no chão? (referindo-se à terminação da mureta da
escadaria, junto ao chão)

M.K.N.: “É um arremate, também, puramente estético. nós achamos que se terminasse abruptamente
o peitoril ficaria pior. Então, achamos que ficaria mais bonito ele ficar balanceado sobre o chão.

O MESMO ALUNO DA PERGUNTA SOBRE O ALOJAMENTO DOS SOLDADOS: “Aquela


escultura lá é de homenagem à Aeronáutica, não é?”

M.K.N.: “Aquela lá? É.”


O ALUNO: “Parecem uns destroços...”

M.K.N.: “Uns destroços?! Quem encara a obra de arte com rigidez é porque já tem uma rigidez
interna. A obra de arte é livre. É feita para as pessoas interpretarem. Um quadro abstrato, por
exemplo, você tem mil maneiras de interpretar. Você ouve uma sinfonia e tem mil maneiras de
sentir aquela sinfonia, então...

O ALUNO, INTERROMPENDO: “Mas quem fez aquela sinfonia já deixou tudo determinado,
de maneira pessoal, daquela maneira.”

M.K.N.: “Que nem sempre vai ser aquilo que você vai sentir, nem sempre... Não há comu-nicação
direta entre o autor e o usufrutuário da obra de arte. a obra de arte é aberta, ela excita a fantasia do
ser humano; é por isso que a Arte tem a ver com o cara. se não fosse assim, não precisávamos de
Arte, bastava a ciência, a tecnologia. A Arte é importante na medida em que ela abre para o ser
humano uma perspectiva nova.”

OUTRO ALUNO, CONCORDANDO: “Se não fosse assim, não tinha a Pintura, a gente só usava
a fotografia e pronto!”

M.K.N.: “Exatamente. A Arte abre uma perspectiva nova para o ser. Você diante de um quadro,
diante de uma música - até mesmo a música popular, que tem letra, lá, tudo explícito - o sentimento
que toca a cada um é diferente. Se o cara tá com “dor de corno”, perdeu a namorada, ou a namorada
já..., (risada geral) ele sente aquela música de um jeito. O outro, que tá de bem com a vida, que não
tem... coisa... já sente aquela música de outro jeito, compreende? Eu acho que a vantagem da obra
de arte é essa: ela é uma coisa aberta; senão, não precisava de Arte. Você chegava lá com a Arte,
ficava só... quer dizer... como faziam na União Soviética. O cara chegava lá: “Quero ser artista...,”
“Não, não, você vai ser técnico de agricultura...” Isso é um absurdo! Como se fez em Cuba, também.
Tem que acabar com isso! Não pode! O ser humano é livre, é livre para fazer o que ele quiser,
desde que não esteja prejudicando os demais seres humanos, ele deve procurar o seu próprio caminho,
ele deve desevolver a sua mente, e não deve ficar preso a nenhum esquema, nem restrito a nada,
nada assim muito sistemático, senão é a falência da humanidade. Mais alguma pergunta?”
*
M.K.N.: “...muito bem, vamos seguir para lá?(para a parte de cima do monumento) ...volta por essa
escada então, essa escada secundária, para continuar a visita ao monumento. Nós tivemos uma
preocupação funcional, no uso do monumento. Normalmente, a pessoa chega aqui logo, com aquela
ansiedade de subir essa escadaria e chegar logo aqui em cima. Então ela chega, olha aqui, olha ali,
começa a passear por aqui, vai até ali, olha a paisagem, tira fotografia, vai lá na ponta... Aí, quando
ele quer ir embora, ele se depara com aquela escadinha ali; aí ele desce, continua o passeio, vai ao
mausoléu, etc.”

UM ALUNO PERGUNTA SOBRE O PISO DA PLATAFORMA ELEVADA:

M.K.N.: “Esse piso foi todo paginado por nós, inclusive os caimentos e tal... você está vendo essa
juntazinha aqui, ó?(chama a atenção para uma junta em diagonal nos granitos do piso)... isso aqui foi uma
paginação, um negócio... um trabalho de chinês pra fazer isso... calhas em toda a volta...”
*
M.K.N.: (diante da escultura que homenageia a Aeronáutica) “Essa escultura metálica é toda em aço
metalizado, para evitar a corrosão. Naturalmente, tem que sofrer uma conservação, mas já está aí
desde 1960, há quantos anos?... Há trinta e tantos anos, e até que está bem conservada...”
*
M.K.N.: “...fica dependente do calculista. O arquiteto que não tem segurança, digamos, de vez em
quando “viaja”; aí o calculista diz: “Não pode e tal, tem que botar um pilar aqui, tem que fazer isso,
tem que fazer aquilo...”, quer dizer; a única coisa que houve aqui, nossa, em relação ao cálculo foi
isso... Primeiro, porque eu sugeri ao calculista que fosse de concreto protendido porque, como essa
espessura de laje não é muito grande, e tem esses vãos, nós sabíamos que para concreto comum
teria que ter, talvez, seções muito altas. Mas esse calculista, como eu falei, era um cara muito
criativo, era um... era um gênio mesmo, não é? Ele disse assim: “Não, não precisa ser de concreto
protendido, vamos fazer com concreto armado...” E neste pilar aqui de baixo, eu tinha feito esse
projeto assim (desenha num papel um croqui com o pilar reto da primeira versão do projeto). Aí o Cardoso disse
assim: “Não, isso aqui não é bom, Marcos, issso aqui cria um desequilíbrio.” Aí nós fizemos essa
outra solução (faz outro croqui, com a solução da interseção dos dois prismas)... aí nós colocamos aqui dois
prismas. Isso foi uma coisa sugerida por ele, e já diminuiu esse vão daqui pra cá, e deu mais
equilíbrio ao esforço.
*
M.K.N.: “...mas aí você teria que ter aqui em baixo um engastamento muito grande, para
contrabalançar; aí teríamos que ter uma sapata excêntrica. Assim não, neste caso você tem uma
sapata comum, simétrica, com as estacas aqui em baixo. Mas, do ponto de vista estrutural, não
houve nenhuma modificação. Mérito, diga-se de passagem, sem falsa modéstia, nosso; porque nós
sabíamos exatamente o que nós queríamos, sabíamos o que estávamos projetando, exatamente.

*
M.K.N.: “Quando nós ganhamos o concurso, nós chamamos esse escultor para colaborar conosco(17).
Mas ele era meio vedete, meio metido a não dar muito ouvido ao que os outros diziam, era um
negócio assim... Aí ele me fez um projeto, uma maquete duma “pietá”(18). Vocês sabem o que é
uma “pietá”? “Pietá”, na estatuária clássica, é a mãe sustentando o filho morrendo, é a Virgem
Maria tirando Cristo da cruz; um tema que.. Tem a famosa “pietá”de Michelangelo, não é? aquela
até que foi quebrada... Aí ele fez uma “pietá”. Nós não gostamos da tal “pietá”, porque achamos
que não combinava com o aspecto do monumento. E essa coisa foi rolando, rolando, e chegamos a
fazer o contrato, ele fez o contrato — os contratos foram separados: o nosso, de arquitetura, foi um
contrato; o escultor teve o contrato dele, o pintor teve o contrato dele... Ele fez o contrato e nós não
estávamos gostando; e já tinha mandado começar a fazer. Aí um dia eu virei pro Hélio Marinho e
disse assim: Não agüento essa “pietá”! Não vai poder ter esse negócio aí! Aí falei com ele: Ó,
nós vamos tirar essa “pietá”de lá, não vai dar! Mas aí, como é que a gente vai fazer? Vamos falar
com o Marechal, né? O Marechal era um velhinho, baixinho assim, ele era sério, mas muito gozador;
olhava pra gente sério, mas com aquele olhar de gozador... A gente disse: Olha, nós não estamos
gostando daquilo ali. Em primeiro lugar, não está espelhando as três forças armadas... Aí nós
entramos com uma demagogia desgraçada!(risos) Tá parecendo que ela tá sustentando um soldado
do Exército, aí os outros vão reclamar! O pessoal da Marinha vai reclamar, o pessoal da Aeronáutica
vai reclamar! Aí, ele ponderou... tal... não-sei-quê e disse: “Tem razão. então como é que faz?” Eu
disse: vamos substituir! E não é que esse danado desse escultor recebeu uma grana pra começar a
fazer o negócio e conseguiu um novo contrato? E fez esse projeto, que foi muito legal, e ainda
ganhou... ganhou duas vezes!(risos)

Enfim, para ele foi bom, mas para nós também, porque ficou muito melhor do que com aquela
“pietá”.”
*
UM ALUNO PERGUNTA SE FORAM OS ARQUITETOS QUE CONCEBERAM OS
PAINÉIS, AS ESCULTURAS E SOBRE O PROCESSO DO PROJETO.

*
M.K.N.: “Bom, nesse lugar que nós bolamos, estabelecemos onde íamos botar cada coisa... Como
assim?... Não, quando você faz o projeto — porque em Arquitetura você faz o estudo preliminar,
depois o anteprojeto, depois o projeto de execução, basicamente são as etapas mais importantes...
... Então, quando você concebe — como quando nós ganhamos o concurso — já existia uma indicação
sumária, mas não era assim dessa forma. Eu me lembro até que era uma coisa assim: um quadro
que tinha um rendilhado por dentro.... Mas isso foi feito por nós, para ganhar tempo para fazer o
concurso. Posteriormente, então, nós chamamos o arquiteto Júlio Catele para fazer aquela escultura
direito, não como nós tínhamos feito na maquete. e nós distribuímos, então... Mas claro que seguindo
os critérios de localização determinados pelo projetista, e tudo pronto antes de se fazer o projeto de
execução. Você não pode deixar pra improvisar na obra: “Ôba, escuta, o que é que vai ser agora
aí?”, não, não pode ser assim. Arquitetura é Arte com ...
(17) Alfredo Ceschiatti
(18) It. piedade

... engenho, é por isso que o arquiteto tem que ter uma cultura humanística; ele tem que conhecer
várias coisas. Não pode ser meramente um artista, como é o escultor, e o pintor, que não têm
compromisso com a estática, com a funcionalidade; e não pode ser puramente um engenheiro, só se
preocupando em botar as coisas em pé. É por isso que o arquiteto tem que ter uma formação muito
mais ampla. Ele não é, de fato, um especialista nas coisas. Claro que alguns arquitetos se dedicam
depois - e não há desdouro nenhum - a só projetar instalações, e outros só estrutura; outros se
dedicam mais a planejamento, etc. Mas a formação profissional do arquiteto tem que ser de amplo
espectro, tem que dar uma visão geral.”

MARCOS KONDER NETO


Rio de Janeiro, 16 de setembro de 1994.
ANEXO 5
ESQUEMAS PARA EXECUÇÃO DE MODELOS

Na disciplina Estudo da Forma I os alunos irão construir alguns modelos (vide Apresentação).
A título de exemplo serão apresentados dois esquemas para elaboração de dois modelos de edificação.
O primeiro esquema , mais simples, se baseia no pequeno teatro (300 lugares) projetado pelo arquiteto
Afonso Eduardo Reidy cuja obra foi executada em 1951. O segundo esquema, mais complexo, se
baseia numa residência projetada pelo arquiteto holandês Rem Koolhaas cuja obra foi executada
em 1991. O material básico para a execução destes dois modelos é o papelão. O primeiro esquema
utiliza exclusivamente papelão de 1mm de espessura e o segundo papelão de espessuras variadas
(1, 2 e 3mm), além de varetas de madeira balsa. O primeiro esquema pode ser realizado
imediatamente, já que só se faz necessário cortes e vincos de fácil execução. O outro esquema,
onde se faz necessário colar e montar diversas partes, se aplica para o segundo trabalho da disciplina.
O Teatro Armando Gonzaga, também denominado Teatro Popular, está localizado no bairro
de Marechal Hermes, no Rio de Janeiro. A edificação tem uma concepção plástica que é
aparentemente simples, no entanto, encobre uma solução formal econômica, elegante e muito
sofisticada. Para esta edificação, serão também apresentadas algumas ilustrações que buscam analisar
graficamente (ver Anexo 3) a sua solução formal.
A Villa Dall’Ava está localizada no tradicional bairro de St. Cloud, em Paris. A edificação
tem um concepção plástica inusitada e muito elaborada. A sua solução formal faz uma referência
indireta a Villa Savoye de LeCorbusier (ver Anexo 3). Para esta edificaçnao só será apresentado o
esquema básico de elaboração do modelo.

TEATRO ARMANDO GONZAGA / AFONSO EDUARDO REIDY


Vinco

Vinco

* Demais linhas corte


VILLA DALL’AVA / REM KOOLHAAS
I
Trabalho realizado por aluno
ANEXO 6
RELATÓRIOS E PEQUENAS ENCADERNAÇÕES

1 Uma pequena encadernação pode ser o veículo ideal para comunicar um conjunto de trabalhos,
as habilidades e a capacitação de um indivíduo. Estas pequenas encadernações funcionam como
exposições miniaturizadas revelando organizadamente seu conteúdo numa forma sequencial, com
ênfase tanto na informação escrita como na gráfica. Com o advento do computador e de programas
de edição e ilustração, sua utilização é cada vez mais frequente. Manipuláveis e aptos à reprodução,
estas pequenas encadernações – também denominadas Portfolio, Book ou Brochura – podem também
ser utilizados para o armazenamento e/ou desenvolvimento de idéias. Podem também complementar
ou duplicar exposições de parede para uma circulação mais ampla.

2 Existem muitos estilos para a apresentação de pequena encadernação. Em geral, cada um


destes estilos utiliza um método uniforme de organização de seu conteúdo. Uma estrutura básica
incluiria: uma página título, prefácio, introdução, um sistema coerente de capítulos, seções e
parágrafos e, se necessário, conclusão, bibliografia e índice. Erros ortográficos, datilográficos ou
de dados podem despertar a desconfiança de eventuais leitores. Portanto, é importante que o rascunho
do texto seja conferido e revisado por um leitor/editor independente.

3 Para executar as montagens dos


pequena encadernação podem ser utilizados:
grampos, espirais plásticas ou garras
plásticas. As capas podem ser em plástico,
papel cartão, ou um material mais pesado
que o empregado no miolo.

4 Quando um relatório for proposto de


forma a duplicar uma exposição de parede,
sua encadernação deve ser prevista para uma
rápida e fácil desmontagem. O miolo, neste
caso, deve ser em papel mais pesado que o
usual. Os métodos de encadernação que
permitem essa transformação são as pastas
tipo classificador, com molas na lombada, e
lombadas plásticas de deslizar.

5 O corpo do texto pode ser manuscrito, impresso ou datilografado. Títulos ou chamadas podem
ser escritos com caracteres transferíveis (Letraset, Mecanorma, etc.) ou grafados através de estencil
metálico. Diversos fabricantes de caracteres transferíveis produzem caracteres tipográficos
semelhantes àqueles utilizados nas máquinas de escrever, que combinam muito bem com o corpo
de texto datilografado.
A seleção de caracteres tipográficos simples, e sua utilização de forma consistente em títulos
e chamadas, auxilia a compreensão do conteúdo. O grau de importância da infomação é atingido
pela variação de tamanho, peso, côr e localização. Como regra geral deve-se evitar contraste
exagerado de tamanho e tipos com formatos excessivamente elaborados.

Quando combinado com um desenho, o


texto de títulos, chamadas ou legendas, devem
ser cuidadosamente integrados como mais um
elemento da ilustração.

6 Os mais confiantes podem introduzir desenhos e ilustrações diretamente nas páginas


datilografadas ou manuscritas. No entanto, pode-se produzir originais, visando sua reprodução
xerográfica, em que texto, fotografias, ilustrações e desenhos são adequadamente montados sobre
papel cartão com o auxílio de colas spray (Letraset, 3M), bastão (Prit) ou para couro (Itacol, Leif).
Os originais devem ser produzidos em tamanho adequado à sua redução e de acordo com o
processo reprográfico que se pretenda utilizar. Antes de iniciar os desenhos a tinta, as espessuras
dos traços deverão ser definidas de maneira compatível com a redução pretendida.

Razão de Tamanho Tamanho Tamanho


Redução Mínimo de Mínimo de Mínimo de
Pena Letras Estencil
3:2 (66%) 0,1 12 pt. 3 mm
2:1 (50%) 0,2 16 pt. 4 mm
3:1 (33%) 0,3 24 pt. 6 mm
4:1 (25%) 0,4 36 pt. 8 mm

É importante não complicar desnecessariamente as ilustrações. Um desenho simples — a


“Traço” — cria as condições adequadas para uma impressão ou reprodução clara e limpa e é capaz
de sobreviver às reduções.

7 O traçado ou malha de diagramação é um instrumento fundamental para a definição do layout


básico do pequena encadernação. Um traçado de referência deve acomodar todos os ingredientes
necessários para um projeto de pequena encadernação. Este traçado deve prever largura de colunas
e espaços para ilustrações, títulos e margens.

Um layout básico, simples de executar e


fácil de ser lido, para os padrões A4 (210 x 297
mm), Carta ou Ofício (220 x 330 mm) na ver-
tical (portrait) que acomode tanto texto como
ilustrações é o de uma coluna. Este layout
permite a inserção direta de figuras no texto.
8 Um outro tipo de layout para estes padrões
de papel é o de duas colunas: uma coluna larga
para o texto corrido e ilustrações importantes e
uma coluna auxiliar, mais estreita, para ilustrações
menores, títulos, chamadas e texto de apoio. As
ilustrações nesta coluna estreita devem sempre
estar próximas ao texto a que se referem. Quando
pretendemos utilizar a frente e o verso das páginas,
estas colunas auxiliares devem alternar de posição
no traçado de referência, de forma que
permaneçam sempre ou junto à margem externa
ou junto à margem interna.

9 Como regra geral as margens junto à lombada (margens internas) devem sempre ser maiores
que as margens externas, de maneira a permitir uma encadernação adequada. Quando se pretende
acomodar numa página uma ilustração de grandes proporções, recomenda-se usar encadernações
grampeadas ou com espiral plástica.
O primeiro oferece o potencial da página
dupla ...

10 ... enquanto o último acomoda bem páginas


dobráveis.

11 Os padrões A3 , tablóide, ou mesmo os usuais A4, Carta ou Ofício, utilizados na horizontal


(landscape) são mais facilmente lidos quando organizados em 3 colunas. Assim a pequena
encadernação pode ser projetada empregando uma diagramação que dá suporte para:
A Texto simples corrido:
B Combinação de texto e ilustração:

C Ilustração de página inteira com texto


de apoio (títulos e chamadas) respeitando
as 3 colunas:

12 A simplicidade é um fator essencial do layout. É obtida pela eliminação de todo elemento


superfluo. Os elementos (títulos, chamadas, corpo do texto e ilustrações) devem ser combinados
com um sentido de ordem e unidade e de forma que cada um seja parte integrante do todo.

Ao mesmo tempo, o peso e valor desses elementos têm de estar em harmonia com o espaço
que ocupam.

13 Exemplos de estudos de layout utilizando traçados reguladores de referência:


ANEXO 7
ESQUEMA DE MONTAGEM DE MODELO
CASA DAS CANOAS

Croqui e planta do projeto de Oscar Niemeyer


PAVIMENTO DE ACESSO
CASA DAS CANOAS • Habitação Unifamiliar, Estrada das Canoas Rio de Janeiro
Arquiteto Oscar Niemeyer
PAVIMENTO INFERIOR
CASA DAS CANOAS • Habitação Unifamiliar, Estrada das Canoas Rio de Janeiro
Arquiteto Oscar Niemeyer
COBERTURA
CASA DAS CANOAS • Habitação Unifamiliar, Estrada das Canoas Rio de Janeiro
Arquiteto Oscar Niemeyer
PAVIMENTO DE ACESSO
PAVIMENTO INFERIOR

BASE
COBERTURA

PAVIMENTO DE ACESSO

BASE ESQUEMA DE MONTAGEM DO MODELO

PAVIMENTO INFERIOR

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