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20/05/2019 Erosão dos partidos e da crença em futuro melhor é inédita, diz cientista político - 14/05/2019 - Ilustríssima - Folha

Erosão dos partidos e da crença em futuro melhor é


inédita, diz cientista político
Situação de crise da democracia é tema de seminário em SP que celebra os 50 anos
do Cebrap

14.mai.2019 às 22h16

Walter Porto

SÃO PAULO O cientista político polonês Adam Przeworski, primeiro


conferencista do seminário que celebra os 50 anos do Cebrap (Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento), iniciado nesta terça (14), não poderia
abordar outro assunto que não a crise da democracia no mundo —tanto por
ser esta a especialidade pela qual ele é reconhecido mundialmente, quanto
porque não se fala de outra coisa.

Ao estilo dos pesquisadores de ciências humanas, ele não veio para explicar,
mas para confundir —ou, na linguagem acadêmica, para levantar algumas
dúvidas pertinentes. Ao analisar as razões pelas quais uma direita de traços
autoritários e xenofóbicos tem emergido vitoriosa na Europa e nos EUA, o
professor da Universidade de Nova York (NYU) se diz incerto sobre a
predominância de causas econômicas, culturais ou políticas.

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O cientista político polonês Adam Przeworski, durante seminário que celebra os 50 anos do
Cebrap - Marlene Bergamo/Folhapress

Mas há alguns fatores sem precedentes, segundo estudos exibidos por


Przeworski, que ele aposta como determinantes para a análise do atual
contexto. 

A erosão dos partidos políticos tradicionais, dominantes desde o começo do


século 20, é um deles. Ele identifica uma grande mobilidade entre eleitores
de partidos antigos para legendas novas e uma alta abstenção nas urnas,
simultânea a um aumento da votação para partidos de direita mais radical,
nos países ocidentais estudados.

Outro aspecto é a estagnação econômica —Przeworski mostra que, nos


Estados Unidos, enquanto a taxa de produtividade por trabalhador cresceu
desde os anos 1970, a remuneração pelo trabalho pouco mudou. O que leva a
outro fator inédito, a queda na crença de que a próxima geração terá
condições de vida melhores que esta.

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Tudo isso aponta para o rompimento do que ele chama de "um compromisso
de classe" no qual o governo conseguia mediar bem as relações entre
trabalhadores e empresários. A soma de tudo isso pode indicar bons motivos
para se deixar de confiar nas boas e velhas instituições.

Analisando colapsos de democracias bem estabelecidas no século 20, o


cientista político aponta a posição contrária às instituições como um sinal de
que o compromisso democrático está ruindo. O crescimento da violência
contra o Estado e por parte dele também é mau agouro.

Crises econômicas e políticas são graves, mas não mortais, na concepção do


pesquisador. No entanto, ele aponta a paralisia política, "quando governos
não conseguem governar", como um fator "extremamente perigoso". 

Nesses momentos de virada, ele afirma que costumam surgir os populistas —


que são "tão antigos quanto a democracia", já que vocalizam a falha de um
sistema político tradicional na hora em que ele passa a deixar de funcionar.

O colapso da democracia, hoje, ocorre por meios mais furtivos, segundo


Przeworski —de dentro para fora, em vez de com marcadores temporais
claros. "Você pode destruir a democracia democraticamente, e é um tanto
imperceptível". 

Ele afirma que, "se olhar as estatísticas" sobre o fim de democracias


consolidadas, "não há muito o que temer". Apenas 11 dos 88 regimes
estudados por ele ao longo do século 20 colapsaram de forma clara. "Mas por
que ainda estamos nervosos? Talvez porque agora elas periguem morrer de
forma diferente". 

Se o cientista político evitou falar do caso brasileiro (um de seus slides dizia
"desculpe, sem Brasil!"), a presidente do Cebrap, Angela Alonso, abordou a
situação do país de forma velada em sua fala institucional de abertura do
evento.

Rememorando a história do instituto, fundado meses depois do AI-5, em


1969, a socióloga e colunista da Folha afirmou que o Cebrap "nasceu na

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resistência ao obscurantismo e ao autoritarismo. E meio século depois, é


ainda este espirito que nos anima e ilumina."

Apesar de não mencionar diretamente o presidente Jair Bolsonaro (PSL), ela


registrou que o instituto está preparado para "tempos difíceis" e saudou sua
persistência em momentos de maior gravidade. "Nós vingamos, não de parto
natural, mas a fórceps", assertou. "Para quem nasceu nas trevas da exceção, a
longevidade em si é um feito"

O seminário Democracia à Brasileira segue no Sesc Vila Mariana nesta quarta


(15) e quinta-feira (16).

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