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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO (PUC-Rio)

COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

CLARA BALBI RODRIGUES DA COSTA (1711814)

​Orgulho e preconceito​ em tempos de internet


Como ​The Lizzie Bennet Diaries ​(Bernie Su & Hank Green, 2012–2013)
atualiza o tipo de subjetividade proposto por seu texto-fonte, ​Orgulho e
preconceito ​(Jane Austen, 1813)

Trabalho de conclusão de curso elaborado por ​Clara


Balbi Rodrigues da Costa​, estudante matriculada
sob o número 1711814, como requisito parcial para a
obtenção de título de ​Bacharel em Comunicação
Social – Jornalismo​, sob orientação da professora
Andrea França Martins​.

RIO DE JANEIRO - RJ
Junho/2018
Aos amigos, pela paciência diante da minha obsessão monotemática.
Aos meus pais, meus leitores mais entusiasmados, sempre.
Por fim, à minha avó, Gilda.

1
SUMÁRIO

1) Introdução 2

2) ​Orgulho e preconceito​ e os modos de ser da passagem do século XVIII para o XIX 5


2.1) Richard Sennett e a divisão dos domínios público e privado 5
2.2) Jane Austen e as subjetividades introdirigidas 9
2.2.1) A vida social e a desvalorização da vida em sociedade 12
2.2.2) O modo epistolar e a valorização da esfera privada 13

3) ​The Lizzie Bennet Diaries​ e as subjetividades alterdirigidas do século XXI 15


3.1) Paula Sibilia e o deslocamento do ser para o parecer 15
3.2) Orgulho e preconceito em tempos de internet 17
3.2.1) Primeiras impressões: a adoção da cultura internética 17
3.2.2) Segundas impressões: crítica à subjetividade contemporânea 20
3.2.2.1) O arco narrativo de Lydia como exemplo dos perigos da subjetividade
contemporânea 21
3.2.2.1) A jornada de Lizzie e a importância da privacidade 24

4) Conclusão 27

4) Referências bibliográficas 30

5) Apêndice: Relação de perfis fictícios dos personagens de ​The Lizzie Bennet Diaries
nas redes sociais 34

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1) Introdução

Iniciado em 1796, mas publicado apenas em 1813, ​Orgulho e preconceito (​ ​Pride and
Prejudice​, no original), de Jane Austen, foi escrito em um momento de turbulentas mudanças
sociais. No entanto, mais do que um contexto político-social complexo – que envolvia das
guerras napoleônicas à chegada da burguesia ao poder (TANNER, 2011, p. 44) –, o romance
mais popular da escritora britânica trata sobretudo de uma outra mudança: aquela ocorrida no
seio do lar e das subjetividades dos homens e mulheres do período.
Essa passagem do “homem público” para o que Paula Sibilia chama em ​O show do
eu: a intimidade como espetáculo (​ 2016) de ​homo psychologicus é, assim, um dos temas
centrais do livro, que propõe a valorização da essência dos indivíduos (o encontro do
“verdadeiro eu”) em oposição ao mundo de aparências que regia as relações sociais na época.
A trama é protagonizada por Elizabeth Bennet, filha de um pároco com problemas
financeiros na Inglaterra rural. Independente e extremamente crítica, ela atrai os olhares de
um forasteiro, o aristocrata Fitzwilliam Darcy. A princípio, porém, os dois não se entendem.
O casal precisa, então, ultrapassar seus “orgulhos e preconceitos” para enxergar que, no
fundo, estão apaixonados. Não é à toa, nesse sentido, que o romance por pouco não tenha se
chamado ​Primeiras impressões ​(TANNER, 2011, p. 47).
Desde o primeiro rascunho de ​Orgulho e preconceito​, no final do século XVIII,
muita coisa mudou. A fama do livro e de sua autora, porém, só cresceu. Jane Austen é tão
adorada hoje que seus fãs ganharam um apelido: são os ​janeites ​(HARMAN, 2009)​. ​E sua
obra rende a cada dia mais adaptações, das mais fiéis, como a clássica minissérie homônima
da BBC (​PRIDE and Prejudice​, 1995), às mais tresloucadas. Publicado em 2009, o livro
Orgulho e preconceito e zumbis,​ de Seth Grahame-Smith, recria a obra de Austen em um
cenário pós-apocalíptico.
Uma adaptação recente do livro, porém, é digna de nota. Criada por Hank Green e
Bernie Su, ​The Lizzie Bennet Diaries ​foi veiculada no YouTube de abril de 2012 a março de
2013. A websérie transpõe a trama original de Jane Austen para os Estados Unidos hoje.
Nela, Lizzie (apelido de Elizabeth) é uma mestranda em Comunicação de Massa com “uma
montanha de empréstimos estudantis” para pagar (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “My
name is Lizzie Bennet - Ep: 1”, 2012). Embora sua mãe seja obcecada em casar a

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protagonista e suas irmãs, Jane e Lydia, as três buscam maneiras alternativas de alcançar a
independência financeira enquanto navegam pelos percalços do início da vida adulta.
The Lizzie Bennet Diaries f​ oi um sucesso. Apenas seu primeiro episódio (THE
LIZZIE BENNET DIARIES, “My name is Lizzie Bennet - Ep: 1” , 2012) coleciona hoje
quase três milhões de visualizações no YouTube, e a série conquistou prêmios como o
Streamy Awards e o Emmy de Programação Interativa Original (ROBBINS, 2016). Também
no universo acadêmico pesquisadores têm se interessado pela adaptação. Desde 2014, pelo
menos três teses de mestrado foram apresentadas sobre o tema: “‘My name is Lizzie Bennet’:
Sucessfully Adapting Jane Austen's ​Pride and Prejudice ​(1813) for the Twenty-First Century
with ​The Lizzie Bennet Diaries ​(2012-2013)”, de Alexandra Fournier, defendida na
University of Waterloo, Canadá, em 2016; “Interactive Austen: An Analysis of ​The Lizzie
Bennet Diaries and the Postmodern Audience”, de Janette Duval, apresentada na Florida
Atlantic University, EUA, em 2014; e “Faithful to the fans: Audience Influence in ​The Lizzie
Bennet Diaries a​ nd Transmedia Adaptation Fidelity”, de Shaina Gwynn Robbins, defendida
na Brigham Young University, EUA, em 2016.
Mas como temas e personagens tão característicos dos séculos passados são
adaptados de forma bem-sucedida para o hiperconectado século XXI? A hipótese do presente
trabalho é que, se ​Orgulho e preconceito ilustrava particularmente bem uma mudança de
sensibilidade ocorrida na passagem do século XVIII para o XIX, ​The Lizzie Bennet Diaries
atualiza, por sua vez, essa subjetividade introdirigida típica da modernidade para a
subjetividade alterdirigida da contemporaneidade (SIBILIA, 2016). Apesar disso, a série é,
em última instância, crítica a esses modos de ser e relacionar-se atuais, e propõe em sua
resolução uma espécie de retorno aos valores vigentes na época da publicação do romance
original.
No primeiro capítulo, buscaremos caracterizar o tipo de subjetividade nascente na
época da escrita de ​Orgulho e preconceito,​ a passagem do século XVIII para o XIX. Para
isso, usaremos as obras ​O show do eu: a intimidade como espetáculo​, de Paula Sibilia (2016)
e, de maneira mais extensa, ​O declínio do homem público: as tiranias da intimidade​, de
Richard Sennett (1988). Uma vez estabelecidas as características dessa subjetividade, ainda
no primeiro capítulo, analisaremos como ela constitui um dos temas centrais de ​Orgulho e
preconceito​, exemplificando dois artifícios que corroboram esse entendimento. Para isso,

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usaremos a obra seminal do crítico literário britânico Tony Tanner, ​Jane Austen (1986);
ensaios dos acadêmicos Henry Hitchings (2003), Vivien Jones (2011) e do próprio Tony
Tanner (2011) publicados em diferentes edições de ​Orgulho e preconceito​; e “Character and
Caricature in Jane Austen”, ensaio de D.W. Harding publicado em sua coletânea ​Regulated
Hatred and other essays on Jane Austen (​ 1998).
No segundo capítulo, vamos nos debruçar sobre nosso objeto de estudo, a websérie
The Lizzie Bennet Diaries​. Para isso, no início do capítulo descreveremos as mudanças de
subjetividade correntes na contemporaneidade, tendo novamente como base os estudos de
Paula Sibilia (2016) sobre o tema. Depois, investigaremos como a websérie retrata essas
novas subjetividades, dialogando com as teses de mestrado de Alexandra Fournier (2016),
Janette Duval (2014) e Shaina Gwynn Robbins (2016) citadas anteriormente. Concluiremos o
segundo capítulo mostrando como, apesar da aparente atualização das subjetividades, ​The
Lizzie Bennet Diaries ​é em última instância crítica às subjetividades alterdirigidas que se
multiplicam hoje, como demonstram os arcos dramáticos das personagens Lizzie e Lydia na
adaptação.
Finalmente, dada a natureza particular da bibliografia empregada e de nosso objeto
de estudo, é importante ressaltar duas questões. As citações de até três linhas oriundas de
obras escritas em inglês – grande parte de nosso corpo de referências, como se vê acima –
foram traduzidas para o português, de modo a manter a fluidez do texto. É possível, no
entanto, conferir as citações originais em inglês em notas de rodapé. Já as citações de mais de
três linhas, reproduzidas de maneira indentada no texto, conservam o inglês de origem. A
segunda questão é o fato de que ​The Lizzie Bennet Diaries é uma série transmidiática, que se
desenrolou em múltiplas plataformas na Internet durante a sua veiculação. Um de seus
maiores diferenciais nesse sentido foi a atribuição de perfis em redes sociais para quase todos
os seus personagens. Para não misturar esses personagens fictícios com autores reais na
bibliografia, decidimos inserir os endereços eletrônicos correspondentes a seus perfis em um
Apêndice.

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2) ​Orgulho e preconceito e​ os modos de ser da passagem do século XVIII
para o XIX

O presente trabalho parte do pressuposto de que ​Orgulho e preconceito,​ escrito por


Jane Austen e publicado pela primeira vez em 1813, ilustra particularmente bem algumas das
mudanças de subjetividade vivenciadas pelos indivíduos de sua época. Mas o que
configuraria essa subjetividade?
Em ​O show do eu: intimidade como espetáculo,​ Paula Sibilia (2016, p. 48) nomeia
essa subjetividade, ainda nascente no final do século XVIII, de introdirigida​. ​Alcançando o
seu auge nos séculos XIX e XX, os ​homo psychologicus o​ u ​homo privatus,​ como também são
chamados, seriam assim os homens e mulheres que estabelecem fronteiras rígidas entre os
domínios público e privado. Enquanto o primeiro, destinado à convivência com “estranhos”,
seria associado àquilo que é desconhecido, ameaçador – nele não é permitido, portanto,
“deixar fluir livremente os próprios medos, as angústias, os desejos e outras emoções” – o
campo do privado, por oposição, representaria o lugar onde se é “permitido ser ‘vivo e
patético’ à vontade” (SIBILIA, 2016, p. 96). Não é à toa, nesse sentido, que seja esse o
contexto de nascimento da própria noção de interioridade psicológica, em decorrência do
surgimento da psicanálise. Afinal, é no interior da casa e de si mesmo que o ser humano pode
verdadeiramente ​ser.​
É importante ressaltar, no entanto, que a cisão entre público e privado não é, de
modo algum, uma evolução natural das sociedades através dos tempos. Nas palavras da
autora, trata-se de uma “invenção histórica e datada, uma convenção que em outras culturas
não existe ou se configura de modos diferentes”, recente mesmo no Ocidente (SIBILIA,
2016, p. 91). Como aconteceu, então, essa separação?

2.1) Richard Sennett e a divisão dos domínios público e privado

A pergunta guia o livro ​O declínio do homem público (​ 1988), do sociólogo


norte-americano Richard Sennett. Buscando entender o esvaziamento da política do seu
próprio tempo – a obra foi escrita em 1974 –, Sennett elabora uma espécie de linha do tempo
da vida pública desde o século XVII até o século XX. É na passagem do século XVIII para o
XIX, porém, que ele localiza pela primeira vez a divisão da sociedade entre os âmbitos

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público e privado, principal responsável pelas “tiranias da intimidade” que, segundo ele,
reinariam no século XX.
Marcadas por um enorme crescimento populacional – o número de habitantes de
Londres, por exemplo, saltou de 150 mil em 1595 para 700 mil em 1700 (SENNETT, 1988,
p. 70) –, as capitais europeias do século XVIII encontravam-se diante de um desafio e tanto:
como conviver com as multidões de estranhos que chegavam dia após dia? A resposta, de
acordo com Sennett, foi a elaboração de um tipo de sociabilidade de bases impessoais, em
que a expressão pública era anti-simbólica. Para esclarecer o conceito, o sociólogo descreve
sua manifestação em dois campos distintos: a moda, onde o corpo era visto como um
manequim; e o teatro, onde a relação da plateia com os atores se dava de um modo muito
diferente de hoje.
Na França e na Inglaterra da época, ainda vigoravam as leis suntuárias, que
atribuíam a cada classe social um conjunto de trajes adequados. Teoricamente, portanto, um
comerciante que se vestisse como um nobre, ou um trabalhador manual que se passasse por
mestre de ofício seriam punidos. Na prática, porém, em meio às ‘multidões de estranhos’, era
difícil identificar quem não era o que afirmava ser. Além disso, lembra Sennett, em tempos
de capitalismo incipiente, surgiam a todo tempo novas profissões, carentes de um código de
vestimenta apropriado.
Apesar disso, esses indivíduos tinham um desejo imenso de colocar ordem nas ruas.
Começam, então, a usar seus trajes de passeio como fantasias, vestindo-se com roupas de
classes sociais diferentes das suas. O objetivo não era exatamente fingir ocupar um lugar
acima do seu no ​ranking social (e não era isso o que acontecia, na maioria das vezes), mas
simplesmente regulamentar o âmbito público – mesmo que, de forma paradoxal, essa
regulamentação identificasse arbitrariamente as pessoas. Nas palavras de Sennett: “Era menos
importante que as pessoas fossem de fato aquilo que vestiam do que o seu desejo de vestir
algo de reconhecível para que se tornassem ‘alguém’ nas ruas” (SENNETT, 1988, p. 92).
Também no teatro essa codificação “anti-simbólica” se repetia. Vistos como uma
espécie de criadagem pelo público, uma herança dos tempos de corte, os atores eram o tempo
todo interrompidos com vaias, palmas, e pedidos de bis durante suas performances. Não se
tratava de um ritual catártico, à moda dionisíaca. A plateia do século XVIII estava
perfeitamente ciente de suas intervenções disruptivas, ora aplaudindo a atuação dos

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intérpretes nos momentos mais marcantes da peça (com lágrimas, gritos e desmaios,
inclusive), ora os humilhando, no caso de performances aquém do esperado ou de falas sendo
esquecidas. Isso porque suas demonstrações, por mais passionais que aparentassem, eram
simplesmente sinais (SENNETT, 1988, p. 106).
Em Linguística, símbolos são os sintagmas que representam alguma coisa, seja por
convenção ou de maneira arbitrária. Eles têm, portanto, uma “função substituidora”
(CAMARA, 1986, p. 220). Os sinais, alternativamente, não carregam “em si a ideia de
substituição”. São, por exemplo, os sinais de trânsito, ou o apito que marca o fim de um jogo
de futebol: embora incitem à ação, eles nada substituem (e, portanto, nada simbolizam).
Para Sennett, assim, os códigos de vestimenta, a relação entre atores e plateia, além
de diversos outros sistemas de expressão do século XVIII representavam simplesmente sinais
para os homens e mulheres daquele tempo (SENNETT, 1988, p. 106-7):
“Na metade do século XVIII, esta conversão do sinal em símbolo, esta pressuposição de um
mundo por detrás de uma determinada expressão, pareceria estranha. [...] As pessoas não tinham que
estar atentas para promover um processo de decodificação para saberem o que realmente estava sendo
dito, por detrás dos gestos.”

Foi, assim, através de uma expressão pública anti-simbólica em que a


“espontaneidade era produzida pela artificialidade” que os cidadãos de Paris e Londres do
século XVIII estabeleceram uma sociabilidade de base impessoal, “sem revelar sentimentos
próprios, história social ou posição social” (SENNETT, 1988, p. 109). É só no século XIX,
com a separação da vida pública da vida privada, que surge a obsessão pela decodificação das
aparências – e que, para Sennett, se inicia o “declínio do homem público”.
Voltemos, então, à nossa pergunta inicial: o que motivou essa divisão? Sennett
sugere que a principal causa da fragmentação dos domínios público e privado no século XIX
seria o desenvolvimento do capitalismo industrial. Nesse sentido, o autor defende que a
chegada das lojas de departamento é paradigmática da mudança de sociabilidade do séculos
XVIII para o XIX.
Até as últimas décadas do século XVIII, os comerciantes varejistas eram proibidos
por lei de distribuir impressos atribuindo preços fixos às suas mercadorias. As feiras de
alimentos, eram, então, marcadas por rituais de pechincha tão passionais quanto cotidianos,
os “exemplos mais comuns do teatro diário de uma cidade, e do homem público como ator”
(SENNETT, 1988, p. 180). Quando lojas como o Bon Marché, fundada por Aristide

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Boucicaut em 1852, inauguram um sistema de preços fixos, o consumidor, acostumado a
‘performar’ em público, passa a comprar em silêncio, de forma passiva.
Ao mesmo tempo, os rituais de pechincha das feiras não desaparecem.
Restringem-se, no entanto, às negociações em atacado, que passam a ser realizadas em
segredo. Sennett localiza aqui um marco fundamental para a separação das esferas pública e
privada. Pois em público (e não só nas lojas de departamento, como também nos teatros e em
outras ocasiões sociais, como o sociólogo exemplifica posteriormente), os indivíduos
obedecem a convenções de passividade, silêncio, e concentração. É no campo privado, caso
das negociações por atacado ou do âmbito familiar, por exemplo, que esses indivíduos são
livres para se expressar diretamente, mantendo uma interação ininterrupta. Assim, “o segredo
é o preço da continuidade do contato humano” (SENNETT, 1988, p. 188).
Para o sociólogo, há ainda um segundo fator fundamental para entender a separação
dos mundos público e privado do século XIX: o surgimento da personalidade como categoria
social. Com o desenvolvimento da ciência promovido pelo Iluminismo do século XVIII, no
século XIX a secularidade – ou seja, um movimento em direção à imanência, à crença no
mundo material e concreto, afastando-se da transcendência – se instala. Sem deuses nos quais
acreditar, os homens passam então a mistificar sua própria condição. Uma mistificação que
desemboca, enfim, no conceito de personalidade.
E o que é a personalidade para Sennett? O autor a define como um atributo variável
de pessoa para pessoa, cuja variedade está, justamente, ligada à aparência. “Uma pessoa é o
que parece; portanto, pessoas com diferentes aparências são pessoas diferentes”, explica
(SENNETT, 1988, p. 192). Além disso, ela não pode ser controlada, e manifesta-se
involuntariamente nos indivíduos. Para o autor, vem daí o temor dos homens e mulheres do
século XIX de interagir continuamente em público: “É somente ocultando seus sentimentos
que elas estarão seguras, e somente em momentos e lugares escondidos é que se estará livre
para interagir.” (SENNETT, 1988, p. 188)
O que fazer, então, se a personalidade emerge involuntariamente nos seres humanos,
transparecendo em suas aparências? A resposta dos homens e mulheres do início do século
XIX em protegerem-se ainda mais. As roupas tornam-se cada vez mais homogêneas e
monocromáticas, e a burguesia vitoriana, profundamente reprimida no âmbito sexual (a

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doença psíquica da época era, afinal, a neurose), mostra-se muito mais pudica do que aquela
que a antecedeu no século XVIII.
Paradoxalmente, à medida que as pessoas se fecham ao contato alheio e encontram
maneiras de homogeneizar suas aparências, a sociedade fica ainda mais obcecada em
decifrá-las. Assim, se no século anterior um “homem poderia ou não poderia ser aquilo que
suas roupas proclamavam, mas a proclamação era clara” (SENNETT, 1988, p. 211),
baseando sua expressividade em um sistema de sinais, no século XIX as expressões eram
encaradas como símbolos – cujas leis eram, no entanto, acessíveis apenas a iniciados. Sennett
explica essa contradição da seguinte forma (SENNETT, 1988, p. 211):
“A lógica da investigação se faz necessária como um meio de fazer contato com o indivíduo,
contato que poderia ou não germinar atrás da fachada da aparência. Se, no entanto, a pessoa não
conhecesse as regras que governavam as aparências particulares, se não soubesse ‘ler’ um nó de
gravata, ou a existência de uma echarpe usada sobre o coque, ela jamais teria certeza das deduções que
fizesse sobre quem ela estaria encontrando nas ruas.”

Nesse cenário, é sintomática a invenção da ciência da etologia, que decodifica o


caráter a partir do comportamento mínimo, como a caligrafia ou o tamanho do crânio de
alguém, ou o ​boom ​dos romances policiais. O detetive Sherlock Holmes, de Arthur Conan
Doyle, por exemplo, faz sua primeira aparição em 1887 (WILSON, 2018). O
recém-inaugurado âmbito público do século XIX caracteriza-se, desse modo, por uma intensa
ansiedade social, onde as pessoas buscam proteger-se ao máximo umas das outras através de
suas vestimentas e códigos de etiqueta elaborados, “acessíveis apenas aos iniciados”.
Paradoxalmente, essa homogeneização incita uma espécie de obsessão da sociedade da época
em decodificar as aparências. Não admira, portanto, que o processo culmine com uma
progressiva associação do domínio público com o desconhecido e ameaçador, enquanto o
lugar do privado, por oposição, se consagre como o âmbito da liberdade e autenticidade do
indivíduo.

2.2) Jane Austen e as subjetividades​ ​introdirigidas

“Que vidas calmas, tinham essas pessoas!”, suspira Winston Churchill ao ler
Orgulho e preconceito p​ ela primeira vez. No quinto volume de sua autobiografia, ​Closing the
Ring,​ o ex-primeiro ministro britânico admite que os contratempos românticos enfrentados
por Elizabeth Bennet e Mr. Darcy mais pareciam um sonho distante comparados à realidade
da Segunda Guerra Mundial. “Nenhuma preocupação com a Revolução Francesa, ou com as

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dificuldades das guerras napoleônicas”, ele continua, citando dois dos muitos conflitos que
Austen testemunhou em vida. “Apenas bons modos controlando as paixões naturais até o
limite”1 (CHURCHILL, 2002, p. 516).
A percepção de Churchill é partilhada por grande parte dos fãs e leitores da escritora
inglesa. E, embora seja exagerado afirmar que seria necessário um leitor extraordinariamente
perspicaz apenas para perceber que havia uma guerra em curso (WINGFIELD-STRATFORD
apud TANNER, 1986, p. 4), de modo geral ​Orgulho e preconceito ​parece se passar em um
“presente quase eterno em que muito pouco irá ou poderá se transformar” (TANNER, 2011,
p. 44). Apesar disso, os romances da autora ilustram de maneira particularmente
bem-sucedida uma outra transformação em curso na época: a da subjetividade, que se
distanciava a cada dia mais dos “homens públicos” de Paris e Londres do século XVIII em
direção aos ​homo psychologicus t​ ípicos dos séculos XIX e XX tais quais descritos por Paula
Sibilia.
As histórias de Austen têm como pano de fundo um contexto ao mesmo tempo
afastado geograficamente e um pouco anterior às capitais europeias da virada do século
XVIII para o XIX descritas por Sennett. ​Razão e sensibilidade​, o primeiro romance da
escritora, por exemplo, foi iniciado em 1795 e publicado em 1811 (WARREN, 2018). Apesar
desse relativo distanciamento, o problema central enunciado por Austen é o mesmo que,
segundo Richard Sennett, aflige grande parte da sociedade a partir do século XIX: a
decodificação dos símbolos sociais, em especial os códigos de etiqueta, de modo a revelar
status social e atitudes morais (JONES, 2011, p. 16). No seminal ​Jane Austen,​ o crítico
literário britânico Tony Tanner ​resume a questão: em um metateatro como o da época, como
separar os atores ‘verdadeiros’ daqueles que apenas simulam boas maneiras?” (TANNER,
1986, p. 29).
Com efeito, continua Tanner, as heroínas de Austen costumam ter dificuldade para
estabelecer essa distinção, não raro cometendo graves equívocos em suas avaliações.
Compreender o significado oculto por trás das aparências e comportamentos dos homens e
mulheres do século XIX era, afinal, uma arte para os iniciados – o que, de todo modo, não

1
No original: “What calm lives they had, those people! No worries about the French Revolution, or
the crashing struggle of the Napoleonic Wars. Only manners controlling natural passion so far as they could,
together with cultured explanations of any mischances.” In: CHURCHILL, Winston. ​Closing the Ring.​ New
York: Rosetta Books, 2002.
11
impediria uma pessoa habilidosa de simular ou manipular esses símbolos, enganando
inclusive os “leitores” mais escrupulosos.
É esse o drama principal de ​Orgulho e preconceito.​ Extremamente crítica, a
protagonista, Elizabeth Bennet, passa grande parte do livro emitindo juízos de caráter
precipitados em relação aos outros personagens. Um dos exemplos mais icônicos dessa
tendência é a cena em que ela e Mr. Darcy travam contato pela primeira vez. Elizabeth não
precisa de mais do que algumas horas de baile e um comentário descontextualizado para
chegar a um veredicto final em relação ao cavalheiro: “Ele era o homem mais orgulhoso e
antipático do mundo, e todos esperavam que ele nunca mais voltasse ali.” (AUSTEN, 2011,
p. 112)
Também ao conhecer Mr. Wickham, um oficial do Exército com quem Darcy
mantém uma longa rixa, a personagem se equivoca. Em parte graças à sua profunda antipatia
pelo aristocrata, em parte graças ao aspecto cavalheiresco de Wickham – em sua primeira
aparição, Austen o descreve como tendo “todos os melhores atributos da beleza, lindas
feições, boa estatura e boa prosa” (AUSTEN, 2011, p. 181) –, ela acredita nas mentiras que
ele conta sobre Darcy.
“A provação particular de Elizabeth é de fato bastante antiga”, escreve Tanner em
uma introdução ao livro, “pois ela enfrentava pela primeira vez as discrepâncias
problemáticas entre aparência e realidade, e os limites insuspeitados da cognição” (TANNER,
2011, p. 56). Mais importante para nós, porém, é o fato de que a oposição entre essência e
aparência de ​Orgulho e preconceito é típica daquela subjetividade nascente no século XIX.
Isso porque, assim como os homens e mulheres descritos por Richard Sennett em ​O declínio
do homem público ​(1988), na resolução desse conflito Austen também aponta para uma
sobrevalorização do âmbito privado em detrimento da esfera pública.
Esse duplo movimento pode ser visto no romance principalmente através de dois
artifícios. O primeiro, a condenação moral dos personagens que se importam
demasiadamente com o mundo público através de sua caricaturização. O segundo, o uso do
modo epistolar – um tipo de escrita profundamente pessoal e privada – como meio
privilegiado da comunicação autêntica e verdadeira, em oposição às informações equivocadas
obtidas a partir do convívio social.

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2.2.1) A vida social e a desvalorização da vida em sociedade

Em “Character and Caricature in Jane Austen”, o psicólogo e crítico literário


britânico D.W. Harding identifica uma característica curiosa em relação ao mundo retratado
por Jane Austen. Enquanto nas pinturas é raro que caricatura e retratos fiéis apareçam juntos,
nos livros da autora abundam situações em que personagens estereotipados convivem com
personagens tridimensionais (HARDING, 1998, p. 82-3). Mas o que distinguiria esses dois
tipos?
Ainda na introdução de ​Orgulho e preconceito​, Tony Tanner sugere que essa
distinção depende do grau de distanciamento dos personagens em relação aos seus “papéis
sociais”, padrões de comportamento esperados na sociedade (TANNER, 2011, p. 71). Assim,
os personagens completamente definidos por seu papel social seriam as “caricaturas” tais
quais definidas por Harding. São figuras como a mãe de Elizabeth, Mrs. Bennet, sua irmã
caçula, Lydia, ou seu primo clérigo Mr. Collins que, simplesmente obedecendo às
expectativas da sociedade, são incapazes de compreender analiticamente a estrutura social na
qual estão inseridas.
Já os personagens tridimensionais costumam ter mais distanciamento crítico em
relação aos papéis sociais que interpretam. Mais importante, porém, é que tendem a levar
mais em conta sua própria individualidade do que as expectativas da sociedade em geral na
hora de tomar decisões. Nas palavras de Tanner, eles colocam a verdade para consigo
mesmos acima da verdade para com um papel (TANNER, 2011, p. 70), apresentando mais
capacidade de reflexão e introspecção do que os outros personagens. Observa-se aqui um
traço característico do comportamento dos ​homo psychologicus de Sibilia, portanto: a
“formulação do interior do sujeito como o lugar da verdade e da autenticidade” em oposição
ao exterior – ou o âmbito público – tomado por aparências superficiais e, por vezes,
enganosas (SIBILIA, 2016, p. 131).
Em um posfácio a uma edição de ​Orgulho e preconceito,​ o escritor Henry Hitchings
exemplifica essa independência que Elizabeth e Mr. Darcy mantém do seu próprio universo
social através de uma passagem do final do capítulo 31 do livro (HITCHINGS, 2003, p. 488).
Ao encontrarem-se em uma reunião na casa da tia de Mr. Darcy, Lady Catherine, Elizabeth,
brincalhona, condena Darcy por ter sido mal-educado no baile em que se conheceram.
Embora a maioria das jovens tomassem chá de cadeira, o cavalheiro se recusou a chamá-las

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para dançar, diz. A desculpa de Darcy é que ele não teria o talento de certas pessoas para
conversar com quem nunca viu antes. “Não consigo nunca captar o tom do que estão falando,
nem me fazer parecer interessado no assunto”, justifica (AUSTEN, 2011, p. 297).
Elizabeth retruca com uma metáfora sobre seu talento como pianista. Sentada ao
instrumento, ela declara que, se não é uma virtuose, não é porque é incapaz – ela
simplesmente não treinou para isso. A resposta de Darcy é tão ambígua quanto significativa.
“Nenhum de nós dois agimos tendo em vista uma plateia”, declara, referindo-se tanto aos
dons musicais de Elizabeth quanto a uma outra performance, intrinsecamente ligada ao
“metateatro social” descrito por Tanner na introdução de ​Jane Austen ​(1986)– vale notar que,
no original, Austen usa justamente o verbo “performar”, ou “atuar”, nessa fala de Darcy: “We
neither of us​ perform t​ o strangers”, grifo nosso (AUSTEN, 2003, p. 226).

2.2.2) O modo epistolar e a valorização da esfera privada

O movimento contrário, de valorização do âmbito privado, pode ser observado através


de um elemento formal do romance, as trocas epistolares entre os personagens. No total, nada
menos que 44 cartas aparecem em ​Orgulho e preconceito,​ entre citações indiretas, meras
menções, e transcrições integrais. Além de muitas, elas também são cruciais para o
desenvolvimento da trama – o que levou teóricos como o britânico Brian Southam (apud
TANNER, 2011, p. 66) a aventar a possibilidade de ​Orgulho e preconceito ​ter sido
originalmente concebido como um romance epistolar.
Seja como for, elas são de fundamental importância para a estrutura do romance – e
também para a identificação de ​Orgulho e preconceito como representante daquele tipo de
subjetividade nascente no século XIX descrito por Richard Sennett em ​O declínio do homem
público.​ Isso porque, um meio de comunicação típico dos ​homo psychologicus​, alcançando o
seu apogeu ao longo dos séculos XVIII e XIX (SIBILIA, 2016, p. 97), as cartas marcam
alguns dos únicos momentos do livro em que os mal-entendidos principiados no âmbito
público são esclarecidos. O modo epistolar aparece, assim, como espaço da expressão
verdadeira e autêntica, distinguindo-se das trocas dialógicas entre os personagens, propensas
aos equívocos e, de forma ainda mais problemática, à farsa.
Além disso, como aponta Henry Hitchings (2003, p. 488), as cartas também
funcionam como um dispositivo realista, permitindo o que a comunicação em público e suas
formalidades não permitem – vale lembrar aqui Sennett e o intenso medo de se expôr

14
compartilhado pelos indivíduos do século XIX –, “um relato completo dos sentimentos de seu
autor, cuidadosamente redigidos ao invés de desabafados apressadamente” (SENNETT,
1988, p. 217). O melhor exemplo dessa lógica, continua o escritor, seria a icônica carta de
Mr. Darcy a Elizabeth no capítulo 35.
Nela, Darcy, pela primeira vez deixando o orgulho de lado, esclarece dois dos
principais mal-entendidos do livro iniciados na esfera pública. O primeiro diz respeito ao
relacionamento de seu melhor amigo, Mr. Bingley, com a irmã mais velha de Elizabeth, Jane.
Respondendo a uma acusação da protagonista, ele admite que foi o responsável pela
separação dos dois. Mas apenas porque, em sua avaliação, Bingley não era correspondido em
sua paixão por Jane, e Darcy não queria ver seu amigo frustrado. O segundo e maior
equívoco a ser esclarecido é o verdadeiro caráter de Wickham. Continuamente afundando em
dívidas de jogo e de bebida, o soldado não só tinha contínuas vezes pedido dinheiro a Darcy,
como também por pouco não raptara a irmã mais nova dele, fingindo estar apaixonado.
A carta abala todas as certezas de Elizabeth em relação a Mr. Darcy. “Sentiu-se
absolutamente envergonhada de si mesma. Não conseguiu pensar mais em Darcy ou em
Wickham sem se sentir cega, tendenciosa, preconceituosa, absurda” (AUSTEN, 2011, p.
333). O primeiro momento em que a heroína passa a distinguir, então, a verdade das
aparências, é motivada por um tipo de escrita profundamente privada, típica das
subjetividades introdirigidas descritas por Paula Sibilia em ​O show do eu (​ 2016). É só depois
dela que Elizabeth pode dizer, finalmente: “‘Só agora me conheço’” (AUSTEN, 2011, p.
333).
Cartas, obsessões com a decodificação das aparências, a separação estrita entre as
esferas pública e privada. Os elementos e temas de ​Orgulho e preconceito n​ ão poderiam ser
mais representativos de um mundo que fica a cada dia mais distante do nosso – onde o eu se
exibe, sem pudores, em infinitas telas (SIBILIA, 2016, p. 48). Como, então, ​The Lizzie
Bennet Diaries (​ 2012-2013) adapta essa história para o século XXI? É esta a pergunta que
norteia o próximo capítulo.

15
3) ​The Lizzie Bennet Diaries​ e as subjetividades alterdirigidas do século XXI

3.1) Paula Sibilia e o deslocamento do​ ser​ para o ​parecer

“O comportamento dos personagens de Austen pode parecer, aos olhos dos leitores
modernos, insuportavelmente recatado”2, observa Henry Hitchings (2003, p. 488). Recatados,
pudicos, reprimidos. Personalidades que, de tão desconfiadas da “enganosa exterioridade do
eu” (SIBILIA, 2016, p. 126), têm dificuldades para construir relações sadias no âmbito social.
De fato, como argumentamos no capítulo anterior, a saída encontrada por Jane Austen para
que seus personagens confiem uns nos outros é relacionarem-se fora do domínio público, tão
propício ao desenrolar dos “orgulhos e preconceitos”, e mergulharem em seus ​eus privados
das cartas e dos quartos.
Para Paula Sibilia, porém, mais do que recatados, Elizabeth Bennet, Mr. Darcy e os
tantos personagens que emergem das páginas dos romances de Austen seriam figuras em
extinção. Isso porque o tipo de subjetividade que eles representam e que buscamos dissecar
anteriormente vem, nas últimas décadas, sendo substituído por outras formas de construção
identitária: elas seriam as personalidades ​alter​-dirigidas, ou seja, orientadas para o olhar
alheio, onde “fatores como a visibilidade e as aparências [...]​ b​ alizam, com insistência
crescente, a definição do que é cada sujeito” (SIBILIA, 2016, p. 126).
Se a autora não é clara ao listar as origens precisas dessa nova subjetividade – uma
lista que incluiria, entre outros, a compressão tempo-espacial advinda do desenvolvimento
tecnológico, a difusão da linguagem audiovisual no cinema e na publicidade, e até mesmo a
crescente solidão dos indivíduos nas cidades –, ela é minuciosa ao descrever seus efeitos. O
mais significativo deles, porém, é uma consequência direta do esfacelamento das fronteiras
entre os domínios público e privado que vem se verificando nas últimas décadas. Trata-se do
deslocamento da construção de si do interior psicológico para a exterioridade visível; do
“psiquismo interiorizado para a pele e para os atos visíveis, do quarto próprio para as telas de
vidro, da intimidade protegida pelas duras paredes do lar para uma extimidade bem editada”
(SIBILIA, 2016, p. 127). Em resumo: para os ​homo tecno​-lógico, espécie de evolução do
homo psychologicus​, ​ser​ é ​parecer.​

2
No original: "[...] the conduct of Austen's characters can to a modern audience seem maddeningly
coy." HITCHINGS, Henry. Afterword. In: AUSTEN, Jane. ​Pride and Prejudice. L ​ ondon: Collector's Library,
2003.
16
Nada mais distante, portanto, dos homens e mulheres do início do século XIX
descritos por Richard Sennett em ​O declínio do homem público ​(1988), obcecados em
desvendar o significado dos símbolos ocultos das aparências. Ao contrário, as subjetividades
alterdirigidas d​ o presente inscrevem as próprias identidades diante dos olhos curiosos do
público, em telas de ​smartphones,​ ​tablets e​ computadores. Adotando códigos próprios da
linguagem do cinema e da publicidade, realizam performances de si ao mesmo tempo
contínuas e efêmeras, “impelidas a se estetizarem constantemente e a performar em cena,
como se estivessem sempre na mira dos fotógrafos ​paparazzi ou num reality-show [...] A
meta é enfeitar e criar o próprio ​eu como se fosse um personagem audiovisual” (SIBILIA,
2016, p. 313).
Um personagem ​audiovisual.​ O adjetivo escolhido por Sibilia não é fortuito: enquanto
a escrita se consagrou como meio de expressão por excelência dos ​homo psychologicus n​ os
séculos XIX e XX, o audiovisual se estabelece hoje como a linguagem reinante. Mais
semelhante à informação tal qual descrita por Walter Benjamin (apud SIBILIA, 2016) do que
à narrativa clássica, o meio é caracterizado pela fragmentação e dinamicidade, além da
ancoragem na vida real e uma certa tendência à explicitação. Por fim, exige uma
sensibilidade praticamente antípoda àquela tão valorizada pelas subjetividades introdirigidas
do passado, definida pela atenção e pelo isolamento. A tal ponto que, reflete Sibilia, escrever
ou mesmo ler um dos monumentais romances da época tornou-se cognitivamente impossível,
já que (SIBILIA, 2016, p. 281):
“ambas as tarefas implicam não apenas um volume de trabalho imenso, uma concentração e uma
perseverança hoje inimagináveis, mas também uma ambição de totalidade – fixa e com sentido – que
de modo algum subjaz às desmesuras do YouTube.”

Nesse sentido, é particularmente revelador que ​The Lizzie Bennet Diaries tenha
escolhido o YouTube para realizar sua versão de ​Orgulho e preconceito ​– ou, mais
especificamente, o ​vlog.​ Contração de ​video web log,​ o formato é uma espécie de diário
audiovisual onde os indivíduos se postam em frente à câmera e discorrem sobre seus
pensamentos, opiniões e experiências, publicando, em seguida, os vídeos na Internet
(CAMBRIDGE DICTIONARY). O estilo se difundiu de tal maneira neste início dos anos
2000 que se tornou uma profissão rentável, aqui e lá fora (FISCHBERG, 2015). E pode ser
considerado mais uma face do fenômeno contemporâneo de exibição da intimidade que
Sibilia analisa em ​O show do eu.

17
“Nenhum de nós dois agimos tendo em vista uma plateia”, declarara Mr. Darcy a
Elizabeth no capítulo 31 de ​Orgulho e preconceito (​ AUSTEN, 2011, p. 297). Mas e quando
“performar para estranhos” (AUSTEN, 2003, p. 226), recorrendo à fala do personagem na
obra original, torna-se a norma? É esse o paradoxo que ​The Lizzie Bennet Diaries ​enfrenta ao
transpor ​Orgulho e preconceito p​ ara os tempos da Internet.

3.2) ​Orgulho e preconceito ​em tempos de internet

3.2.1)​ ​Primeiras impressões:​ ​a adoção da cultura internética

A princípio, ​The Lizzie Bennet Diaries parece mergulhar de cabeça na cultura da


Internet e nas subjetividades alterdirigidas que ela cultiva. Afinal, a primeira incorporação de
Austen na cultura digital contemporânea (DUVAL, 2014, p. 4) não só adota o ​vlog como
meio de transmissão da história, como também utiliza uma estrutura transmídia complexa e
inovadora. Além do canal “oficial” da websérie no YouTube, onde a trama central foi
veiculada entre 2012 e 2013 (THE LIZZIE BENNET DIARIES, 2012-2013), o projeto criou
e manteve também perfis em diversas mídias sociais, como Twitter, Pinterest, Tumblr,
Lookbook.nu e o próprio YouTube3. A história se desenrola, assim, “através de múltiplos
suportes midiáticos, com cada novo texto contribuindo de uma maneira distante e valiosa
para o todo”, nas palavras do estudioso de novas mídias Henry Jenkins (2008, p. 135).
Pertencentes a personagens e empresas citadas na websérie, os perfis tinham a dupla
função de conferir realismo aos personagens, que ganharam mais densidade ao exibir gostos,
desejos e humores em suas páginas nas redes sociais, e à trama, uma vez que os perfis
interagiam diretamente com o público e entre si.
A irmã mais velha de Lizzie, Jane, por exemplo, é responsável pelo setor de compras
de uma marca de roupas no enredo. Por isso, ganhou perfis no Lookbook.nu, de
compartilhamento de fotos de moda; no Pinterest, espécie de mural de inspirações virtual; no
Tumblr, diário também visual, mas cronológico; e, finalmente, no Twitter, microblog que
permite entradas de até 400 caracteres. Os perfis concediam à personagem uma
tridimensionalidade que o seu tempo em tela não permitiria – os episódios da série tinham,
afinal, apenas cinco minutos cada. Além disso, também serviram, no desenrolar da narrativa,
como material de referência para a trama central. Dessa forma, quando o então namorado de

3
Para a relação completa dos perfis dos personagens de ​The Lizzie Bennet Diaries ​em redes sociais,
ver Apêndice.
18
Jane, Bing Lee (o Mr. Bingley do romance original) se muda para Los Angeles sem se
despedir, ela descobre o acontecimento pela conta do personagem no Twitter. Quando o casal
finalmente termina o namoro, o Pinterest de Jane passa a exibir murais com imagens
melancólicas e mensagens de auto-ajuda. Outros personagens, como Lydia Bennet, Charlotte
Lu, William Darcy, Gigi Darcy, Caroline Lee e a própria Lizzie também interagiam
constantemente entre si e com os fãs no Twitter e em outras redes sociais ao longo da série.
Embora remetam à ficção, os perfis dos personagens de ​The Lizzie Bennet Diaries nas
redes sociais não apresentam em lugar algum indícios explícitos de que estão a serviço de
uma narrativa inventada, roteirizada nos mínimos detalhes. Um internauta desavisado que se
deparasse com o perfil de Jane no Pinterest não saberia, desse modo, que ele não pertence a
uma pessoa real. O mesmo se dá com o próprio ​vlog de Lizzie. No primeiro episódio da série,
não são poucos os comentários de internautas confusos em relação ao estatuto do canal:
tratar-se-ia de uma obra de ficção, ou de uma história real curiosamente parecida com aquela
contada por Jane Austen há duzentos anos atrás? O perfil do YouTube ​ParallaxVue​, por
exemplo, optou pela segunda opção. Ignorando a natureza ficcional da personagem de Lizzie,
ele a aconselhou a ser menos exigente em relação a sua mãe, e desejou boa sorte com os
estudos4 (THE LIZZIE BENNET DIARIES, "My name is Lizzie Bennet - Ep: 1", 2012).
Um embaçamento entre ficção e realidade que, para Paula Sibilia, é outra marca da
subjetividade contemporânea. Ainda em ​O show do eu (​ 2016), a autora argentina esclarece
que o “gosto pelo real” vem contaminando a sociedade burguesa pelo menos desde o século
XIX. Datam da época, por exemplo, a popularização dos romances naturalistas, os museus de
cera, e as reportagens sensacionalistas, e o próprio cinema – que, reza a (falsa) lenda, fez seus
primeiros espectadores fugirem da sala de exibição ao mostrar a chegada de um trem à
estação (LOIPERDINGER; ELZER, 2004). Se naqueles tempos, no entanto, o paradigma do
realismo consistia “em inventar ficções que parecessem realidades, lançando mão de todos os
recursos de verossimilhança possíveis”, hoje ele convive com o movimento contrário, o
desejo de criação de “realidades que pareçam ficções” (SIBILIA, 2016, p. 249). É o que
estaríamos fazendo, argumenta Sibilia, através de nossos perfis nas redes sociais, palcos de

4
No original: “​ParallaxVue: [​ ...] I wish you all the best with your post grad work and your career.
Please go easy on your mom. Remember, there's a very good chance you'll be a mom one day too! :)
-pv​.​” In: "My name is Lizzie Bennet - Ep: 1", ​The Lizzie Bennet Diaries​, 9 abr. 2012. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=KisuGP2lcPs>. Acesso em 25 jun. 2018.
19
performances tão ambíguas em relação a sua veracidade que há quem use o termo
“autoficção” para qualificá-los.
Sibilia é pessimista ao apontar uma causa para o fenômeno, que suscitou o ​boom de
gêneros como reality shows, biografias e documentários nos últimos anos. Ela argumenta que
a ânsia por histórias “reais” de toda sorte é uma consequência da fragmentação da realidade
que vivemos hoje. O real recorreria, assim, às estratégias narrativas e códigos midiáticos
tipicamente associados ao realismo para ganhar consistência, utilizando o “glamour de algum
modo irreal – embora inegável – que emana do brilho das telas, para se realizar plenamente
nessa performance mais ou menos ficcionalizada” (SIBILIA, 2016, p. 287).
O pessimismo da teórica argentina não é compartilhado pelos espectadores de ​The
Lizzie Bennet Diaries​. Ao contrário, a fervorosa comunidade de fãs da websérie estava
profundamente engajada em sua busca por interação com os perfis ficcionais dos
personagens. Além das trocas cotidianas no Twitter e os comentários nos canais de YouTube
oficiais e paralelos, outras duas instâncias exemplificam esse interesse: os vídeos de
“Perguntas e Respostas” de Lizzie e Lydia em seus respectivos canais no YouTube, e a
intervenção dos fãs no envolvimento entre Lydia e Wickham.
Doze no total – dez no canal de Lizzie, dois no de Lydia, ​The Lydia Bennet (THE
LYDIA BENNET, 2012) –, os vídeos de “Perguntas e Respostas” são típicos do universo dos
vlogs. Apesar de roteirizados em ​The Lizzie Bennet Diaries,​ eles partem de questões reais dos
espectadores, feitas em redes como Twitter, Tumblr, Facebook, o próprio YouTube. Se, de
um lado, a estratégia “oferece novos níveis de revelação e experiência” (JENKINS, 2008, p.
135) e de interação com os espectadores, de outro, os vídeos são o lugar da série onde as
referências ao livro ​Orgulho e preconceito ​são mais explícitas, um verdadeiro exercício de
metatextualidade compartilhado pelos escritores e espectadores do canal. Um exemplo é
quando, no terceiro “Perguntas e Respostas”, perguntam a Lizzie em qual país estrangeiro ela
gostaria de morar. A resposta é o cenário do romance original do livro, a Inglaterra: “Não
tenho certeza do porquê. Só me sinto… estranhamente conectada à Inglaterra por alguma
razão” (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “Questions and Answers #3”, 2012).
Além dos vídeos de “Perguntas e Respostas”, outra instância em que a participação –
e, portanto, a adoção da cultura da Internet – ficou evidente na adaptação ​foi na intervenção
dos fãs no envolvimento entre Lydia e George Wickham.

20
O clímax de ​Orgulho e preconceito a​ contece quando, no capítulo 46, Lydia e
Wickham fogem para se casar (AUSTEN, 2011). A fuga se revela, porém, um golpe armado
pelo casal, que ameaça “viver em pecado” caso a família da jovem não lhes dê um generoso
dote. Darcy, ciente do caráter de Wickham e dos problemas financeiros dos Bennet, paga o
dote e garante um casamento honrado à caçula, sem o conhecimento de Elizabeth e sua
família. A descoberta da intervenção de Darcy pela protagonista serve como evidência
definitiva de seu valor, e propulsiona o final feliz dos dois.
Já na websérie, o clímax corresponde ao episódio 84 (THE LIZZIE BENNET
DIARIES, “Ugh - Ep. 84”, 2013). Wickham ameaça divulgar uma ​sextape de Lydia na
Internet. Antes que Wickham consiga lançar o vídeo, contudo, Darcy intervém, comprando a
empresa que divulgaria o vídeo de modo a impedir a humilhação pública de Lydia.
A depender dos fãs da série, no entanto, a atuação do mocinho seria dispensável:
fazendo uso da “inteligência coletiva”, descrita por Jenkins (2008) como processo pelo qual
comunidades ​online compartilham conhecimento, eles mesmos tentaram tirar o site de
Wickham do ar (que, seguindo a lógica transmídia da série, também existia virtualmente). A
tentativa exemplifica o sucesso das estratégias transmídia para confundir os limites entre
ficção e realidade. Desta vez, porém, os produtores estabeleceram limites em relação à
participação dos espectadores, pedindo que o grupo interrompesse as tentativas de derrubar o
site para que o enredo seguisse sem mais intervenções (ROBBINS, 2016).

3.2.2) Segundas impressões: crítica à subjetividade contemporânea

Em última instância, porém, ​The Lizzie Bennet Diaries é crítica em relação à cultura
digital que adota e, consequentemente, de suas subjetividades alterdirigidas. A websérie se
alinha, assim, com os princípios e valores propostos por ​Orgulho e preconceito há dois
séculos atrás, valorizando essência sobre aparência e, de maneira ainda mais pronunciada, a
separação entre os domínios público e privado.
Essa moral crítica pode ser vista sobretudo em dois aspectos da série: o uso do arco da
personagem Lydia como alerta para os perigos da subjetividade alterdirigida, e a própria
jornada da protagonista, Lizzie, que, à semelhança de sua correspondente literária, Elizabeth,
aprende ao longo da narrativa a valorizar o âmbito privado de comunicação em detrimento do
público.

21
3.2.2.1) O arco narrativo de Lydia como exemplo dos perigos da subjetividade
contemporânea

Além das inovações formais, uma das maiores mudanças operadas por ​The Lizzie
Bennet Diaries e​ m relação a ​Orgulho e preconceito é o arco narrativo de Lydia. No livro, a
personagem é uma das “caricaturas” citadas por D.W. Harding em “Character and
Charicature in Jane Austen” (1998). Fofoqueira, impulsiva e muito mais sexualizada que as
irmãs, a personagem preocupa-se demais com as aparências para ultrapassar a categoria de
estereótipo.
Na websérie, ao contrário, Lydia é uma personagem muito bem desenvolvida, embora
não perca a essência “indócil, despudorada, fogosa, ruidosa e destemida” que lhe é atribuída
por Austen na obra original (AUSTEN, 2011, p. 449). Em parte, é possível argumentar,
porque a websérie reduz a três as cinco irmãs de ​Orgulho e preconceito:​ Kitty, sem função
narrativa clara no romance, torna-se a gata de Lydia; Mary vira uma prima que, apesar de
aparecer frequentemente no canal do YouTube de Lydia, só participa da trama principal em
um episódio. Na tese “‘My Name is Lizzie Bennet’: Successfully Adapting Jane Austen’s
Pride and Prejudice (1813) for the Twenty-First Century with ​The Lizzie Bennet Diaries
(2012-2013)”, porém, Alexandra Fournier (2016, p. 74) sugere que a verdadeira causa da
mudança é a crescente onda de empoderamento feminino vista hoje: “Não faria sentido, por
exemplo, adotar a atitude depreciativa de Austen em relação à Lydia, depreciando-a por sua
sexualidade, em um mundo a cada dia mais feminista.”5
De fato, um dos grandes esforços dos criadores da websérie foi a atualização dos
dilemas e dificuldades que as mulheres enfrentavam na época de Austen para o mundo atual.
Em ​The Lizzie Bennet Diaries,​ assim, a estabilidade financeira não depende de maridos ricos,
mas do próprio esforço pessoal, e pedidos de casamento são substituídos por ofertas de
emprego. Por fim, Lydia, castigada no romance com um casamento infeliz – “O afeto de
Wickham por Lydia era justamente como Elizabeth esperava que seria; distinto daquele que
Lydia sentia por ele” (AUSTEN, 2011, p. 451) – vira, no século XXI, vítima de um
relacionamento abusivo. A mudança no enredo reforça ainda mais a tendência feminista da

5
No original: “It would not do, for instance, to adopt Austen’s disparaging treatment of Lydia and
shame her for her sexuality in an increasingly feminist world.” In: FOURNIER, Alexandra. “​My Name is Lizzie
Bennet​”​: Successfully Adapting Jane Austen’s Pride and Prejudice (1813) for the Twenty-First Century with
The Lizzie Bennet Diaries (2012–2013). Tese (Mestrado em Literatura Inglesa) – University of Waterloo,
Ontário, Canadá, 2016.
22
série, ao posicionar o relacionamento da personagem com as irmãs como fundamental para a
sua recuperação.
Ao mesmo tempo, a mudança acaba revelando uma crítica da websérie em relação à
cultura da Internet e, de maneira ainda mais pronunciada, às subjetividades alterdirigidas que
nela florescem. Isso porque o motivo pelo qual Lydia entra em depressão é, justamente, a sua
adoção de uma subjetividade alterdirigida. É só quando ela aprende a valorizar a própria
intimidade e a reconhecer essências e aparências – ou seja, se aproxima do conceito de
subjetividade dos ​homo psychologicus – q​ ue ela conquista, enfim, o senso de si.
É interessante apontar que, em 2014, a então mestranda Janette Duval apresentou uma
teoria semelhante em sua tese “Interactive Austen: An Analysis of The Lizzie Bennet Diaries
and the Postmodern Audience”, defendida na Florida Atlantic University. Um de seus
argumentos centrais consiste em afirmar que a personagem de Lydia cumpriria uma “função
de espetáculo” na narrativa. Disruptiva e obcecada com a própria aparência, ela, tal qual o
espetáculo segundo Guy Debord (apud DUVAL, 2014), seria a defensora-chave da produção
de imagens, sendo a maior delas a sua própria. À medida que a história avança, porém, fica
evidente que seu papel enquanto espetáculo é insustentável dentro da narrativa. Seria essa
insustentabilidade que permitiria que a crítica social apresentada pelo texto original fosse
preservada na websérie, desse modo (DUVAL, 2014, p. 36).
Embora Debord e sua “sociedade do espetáculo” sejam citados à exaustão ao longo de
O show do eu (​ SIBILIA, 2016), acreditamos que, mais do que representar uma
“função-espetáculo”, Lydia é particularmente representativa das subjetividades alterdirigidas
tais quais definidas por Sibilia. Por isso, preferimos dialogar com os conceitos da ensaísta
argentina ao invés de referenciar diretamente o autor francês.
Exibindo alguns dos piores estereótipos atribuídos aos representantes da geração
millennial (FOURNIER, 2016, p. 65), Lydia é, assim, praticamente a corporificação dos
modos de ser e relacionar-se contemporâneos. Com dificuldades para separar os âmbitos
público e privado, frequentemente irrompe no quarto e nos vídeos da irmã mais velha sem
pedir licença. Vai de mal à pior nos estudos e repetiu um ano na faculdade local apesar de ser
visivelmente inteligente – em parte porque não consegue se concentrar, como observa sua
prima Mary no nono episódio do vlog de Lydia, “Study Break” (THE LYDIA BENNET,
"Study Break - Ep: 9", 2012): “Ei, você está realmente pegando o jeito de… aprender coisas.

23
Digo, quando você larga esse celular e foca nas coisas por dois segundos.” Finalmente, mais
do que qualquer outro personagem da narrativa, está sempre em busca de mais seguidores, às
vezes inclusive priorizando suas interações virtuais sobre os de carne e osso. No episódio 35
(THE LIZZIE BENNET DIARIES, "Home Sweet Home - Ep: 35", 2012), por exemplo,
depois de uma longa estadia na casa de Bing e Caroline Lee, Lizzie e Jane voltam para a casa.
Lydia interrompe a gravação do vlog da irmã: “E aí? Saudades?”. Lizzie, em um misto de
afeto e ironia, responde que “na verdade, surpreendentemente, uma pequena parte de mim
sentiu sua falta”. Lydia a corrige: “Céus, não você! Eles”, sorri, apontando para a câmera.
Aos poucos, contudo, Lydia confirma os piores prognósticos de Sibilia (2016, p. 315)
em relação às personalidades excessivamente centradas nas aparências do século XXI:
“[...] uma certa falta de sentido pode pairar sobre as existências puramente alterdirigidas da
contemporaneidade. O mero fato de se exibir de modo atraente pode não ser suficiente para sustentar a
própria experiência; além disso, a necessidade de abocanhar um grande número de seguidores pode
levar a um contato meramente instrumental com os outros, que são valorados apenas em sua condição
de audiência potencial para a própria trivialidade. Por isso, apesar da estridência que insiste nessa
exibição de mundos felizes por toda parte, uma falta de consistência invisível parece estar gerando
fortes doses de sofrimento, insatisfação e solidão.”

É essa mesma solidão que torna Lydia vulnerável às investidas de Wickham.


Profundamente ferida pelo sarcasmo de Lizzie e aparente consenso da família quanto à sua
inferioridade, ela acaba se envolvendo romanticamente com o personagem. O relacionamento
é, no entanto, abusivo, e uma Lydia a cada dia mais insegura e pálida aparece em quatro
vídeos de seu canal ​(THE LYDIA BENNET, 2013). O envolvimento culmina, então, com a
tentativa de divulgação de uma ​sextape ​de Lydia por parte de Wickham, como narramos
anteriormente.
Após a resolução do escândalo, Lydia não retoma o próprio canal, e aparece com
parcimônia nos vídeos de Lizzie. Ao contrário, o caminho de sua recuperação aponta para a
reconexão com as irmãs e reconhecimento da própria solidão. Mais significativo ainda é o
fato de que, nestes últimos episódios da série, a performatividade característica de Lydia é
cada vez mais abafada.
A mudança já é visível no episódio 88, “An Understanding” (THE LIZZIE
BENNET DIARIES, "An Understanding - Ep: 88", 2013), em que Lydia decide narrar o seu
envolvimento com Wickham aos espectadores. Pouco depois de iniciar sua fala, porém, ela já
não sustenta o olhar para a câmera, direcionando-o para Lizzie ou para baixo. A partir daí, em
todas as suas aparições no vlog de Lizzie, ela passa a evitar encarar a câmera – e os

24
espectadores, dessa maneira –, mimetizando uma espécie de olhar “interiorizado” e tímido
radicalmente oposto àquele exibido pela personagem nos episódios iniciais.
A mudança pode ser compreendida como uma síntese do arco de desenvolvimento
da personagem, que culmina, assim, no aprendizado da importância da intimidade e da
solidão, e na desconfiança do domínio público como espaço de comunicação. O arco reitera,
nesse sentido, a moral enunciada por Jane Austen em ​Orgulho e preconceito ​há duzentos
anos atrás, compatível com as subjetividades introdirigidas de seu tempo.

3.2.2.1) A jornada de Lizzie e a importância da privacidade

Se a Lydia de ​The Lizzie Bennet Diaries experimenta na pele os perigos da


subjetividade contemporânea, o aprendizado de Lizzie é, em comparação, muito menos
traumático. Ainda assim, o arco da protagonista é análogo àquele vivenciado por sua irmã
caçula, baseado no afastamento do modo de ser e se relacionar típico dos ​homo
technologicus,​ em que essência e aparência são equivalentes, em direção à subjetividade dos
homo psychologicus que descrevemos no início deste trabalho. Como a Elizabeth de ​Orgulho
e preconceito​, portanto, Lizzie precisa aprender a reconhecer as “discrepâncias problemáticas
entre aparência e realidade” (TANNER, 2011, p. 56), desta vez no ambíguo território da
Internet. E, de novo como no romance original, na websérie a chave desse aprendizado reside
na valorização da privacidade em detrimento do âmbito público.
O primeiro momento em que o valor da privacidade é diretamente enunciado é no
episódio 28, “Meeting Bing Lee” (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “Meeting Bing Lee -
Ep: 28”, 2012). Nele, Lizzie exibe em seu vlog uma conversa entre Bing e Jane publicada
sem o conhecimento do casal. No episódio seguinte, “Ethics of Seeing Bing” (THE LIZZIE
BENNET DIARIES, “Ethics of Seeing Bing - Ep: 29”, 2012), arrepende-se da publicação:
“– Estive pensando que talvez Charlotte e eu tenhamos que tomar medidas drásticas. Não, não
tem nada a ver com os meus pais, nem com o Darcy. Tem a ver com os limites éticos desses vídeos.
Meu nome é Lizzie Bennet e… acho que passei do limite no meu último vídeo!”

A protagonista acaba não retirando o episódio do ar. E, embora os vídeos continuem


apresentando dúvidas frequentes sobre o que mostrar ou não em cena, a verdadeira tomada de
consciência da personagem só acontece no episódio 62, “Letter Analysis” (THE LIZZIE
BENNET DIARIES, “Letter Analysis - Ep: 62”, 2012). A carta em questão fora escrita por
Darcy e entregue a Lizzie no episódio anterior, “Yeah I know” (THE LIZZIE BENNET

25
DIARIES, "Yeah I know - Ep: 61", 2012), logo depois de ele ter confessado seus verdadeiros
sentimentos à protagonista (e ser espetacularmente rejeitado por ela, vale acrescentar).
É paradigmático que a versão contemporânea de Darcy tenha decidido usar o mesmo
recurso que seu correspondente em ​Orgulho e preconceito​. Como discutimos no primeiro
capítulo, a carta representa um importante momento de virada para Elizabeth no romance. É
só depois de ler e reler as palavras de Darcy que ela percebe os limites do próprio julgamento:
“‘Como pude ser tão desprezível!’, ela exclamou. – ‘Justo eu, que sempre me orgulhei do
meu discernimento!’” (AUSTEN, 2011, p. 333-4). Também na websérie a carta principia
uma verdadeira revolução em Lizzie, que passa a reavaliar tanto o seu comportamento em
relação a Darcy quanto a sua ingenuidade ao confiar no antagonista Wickham.
Para nós, contudo, mais importante é o fato de que esta descoberta é acompanhada da
primeira vez em que Lizzie decide respeitar a privacidade alheia. No caso, a de Darcy e sua
irmã Georgiana, como ela deixa implícito na seguinte fala (THE LIZZIE BENNET
DIARIES, “Letter Analysis - Ep: 62”, 2012):
“Tirando isso, pelos comentários pude perceber que estão curiosos sobre o que está na carta de
Darcy. Mas aí é que está: não posso contar. Acreditem, sei que isso está contra todos os princípios
pré-estabelecidos desses vídeos, onde eu costumo contar cada detalhezinho embaraçoso. O problema é
que os conteúdos da carta não são meus para dividir. Alguns envolvem pessoas que nunca conheci, e eu
não quero espalhar segredos que podem magoar alguém.”

É claro, que, como explica Alexandra Fournier (2016, p. 24), a recusa em


compartilhar a carta com o público está ligada principalmente a preocupações com a
verossimilhança da trama. Como ela se desenrola em múltiplas redes sociais, onde os
personagens se seguem e interagem mutuamente, a revelação do verdadeiro caráter de
Wickham e seu envolvimento com Georgiana poderia ter servido de aviso à Lydia,
impossibilitando o romance desastroso entre os dois que marca o clímax da série.
Ao mesmo tempo, a fala de Lizzie explicita uma tentativa inédita da personagem de
estabelecer fronteiras mais rígidas entre ela e seu público. Um movimento que, se neste
momento preocupa-se com a manutenção da privacidade alheia, culmina no final da série
com a valorização da interioridade psicológica e da renúncia da protagonista em continuar
performando a si mesma na Internet.
A etapa final do aprendizado sobre a importância da privacidade ocorre então a partir
do escândalo de Lydia. É aqui que os personagens passam a relativizar a autenticidade das
experiências na Internet, em especial no que tange às relações pessoais. No episódio 89,

26
“Insomnia” (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “Insomnia - Ep: 89”, 2013), Lizzie desabafa:
“Para alguém que põe tanto da vida ​online​, você não pensaria que segredos seriam um
problema. Quem poderia saber? Acontece que conversar com a Internet não é o mesmo que
conversar com as minhas irmãs.” Lydia corrobora a informação mais tarde, no episódio 94,
“Revelations” (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “Revelations - Ep: 94”, 2013). Ao contar a
Lizzie que descobriu que Darcy foi o responsável por impedir a divulgação de sua ​sextape,​
ela confessa que as críticas que costumava dirigir a ele eram infundadas: “Eu não o conheço
bem, acho, além do que vi nos seus vídeos e do que eu... ouvi do… Das pessoas. O que nunca
é um jeito bom de se conhecer alguém.” A partir de então, praticamente todos os episódios
reiteram a mensagem, problematizando o âmbito público, especialmente a Internet, como
lugar efetivo de comunicação interpessoal e valorizando as trocas face-a-face.
The Lizzie Bennet Diaries termina com a protagonista encerrando seu ​vlog.​ “Existe
crescer, e crescer diante de dezenas de milhares de pessoas”, resume no centésimo e último
episódio (THE LIZZIE BENNET DIARIES, “The End - Ep: 100”, 2013). Mas é no Bônus 1
(THE LIZZIE BENNET DIARIES, “Dr. Gardiner's Seminar - Bonus 1”, 2014), publicado um
ano depois do término da série, que a mensagem é mais clara. No vídeo, Lizzie, mais madura,
recusa-se a responder perguntas de antigos espectadores sobre o seu relacionamento com
Darcy: “Uma das razões pelas quais e parei de fazer meus vídeos é porque eu percebi que, até
aquele momento, meu relacionamento com Darcy tinha sido vivido em frente às câmeras. Se
eu queria ele tivesse uma chance, precisava fazê-lo de forma privada.”
A fala sintetiza a posição crítica de ​The Lizzie Bennet Diaries e​ m relação às
subjetividades orientadas para o olhar alheio (alterdirigidas, dessa forma) que se multiplicam
no mundo contemporâneo e, mais especificamente, na Internet. Ao invés disso, sua proposta
é a revalorização de uma subjetividade típica dos séculos XIX e XX, caracterizada pela
privacidade, discrição e interioridade. Não à toa, aquela do livro que inspirou a websérie,
Orgulho e preconceito.​

27
4) Conclusão

Mais de duzentos anos separam ​Orgulho e preconceito ​de sua adaptação para o
YouTube, ​The Lizzie Bennet Diaries. Nesse ínterim, a humanidade testemunhou, entre outros,
três guerras mundiais, a invenção da Internet, a globalização de empresas, pessoas, produtos,
e avanços científicos e tecnológicos sem precedentes. Mais importante para este trabalho,
porém, é o fato de que também os nossos modos de ser e nos relacionarmos (que chamamos
de subjetividades ao longo da monografia) parece ter se transformado radicalmente desde o
primeiro rascunho do romance de Jane Austen, em 1795. Como, então, adaptar
comportamentos e valores típicos do século XIX para o mundo atual?
Foi essa a pergunta que norteou o presente trabalho. Para respondê-la, primeiramente
buscamos definir a subjetividade em voga durante o contexto de escritura e publicação de
Orgulho e preconceito,​ a passagem do século XVIII para o XIX, embasando-nos sobretudo
nos livros ​O declínio do homem público (​ 1988), do sociólogo norte-americano Richard
Sennett e, em menor escala, ​O show do eu: a intimidade como espetáculo (​ 2016), da ensaísta
argentina Paula Sibilia. De acordo com esses dois autores, os modos de ser e relacionar-se do
século XIX e mesmo do século XX são marcados pela divisão clara entre os âmbitos público
e privado, em que o primeiro é valorizado em detrimento do segundo.
Ainda no primeiro capítulo, evidenciamos como essa subjetividade constitui um dos
temas centrais de ​Orgulho e preconceito​. Baseando-nos nos escritos dos acadêmicos Henry
Hitchings (2003) e Vivien Jones (2011) publicados em diferentes edições do romance de Jane
Austen, no ensaio "Character and Caricature in Jane Austen", de D.W. Harding (1998), e no
livro seminal de Tony Tanner sobre a autora, ​Jane Austen (1986), mostramos como duas
estratégias narrativas e estilísticas do romance – de um lado, a caricaturização de personagens
demasiado preocupados com o âmbito público; de outro, o estabelecimento do domínio
privado como único espaço da comunicação efetiva e verdadeira através do uso de cartas
– reiteram os valores dos ​homo privatus​.
No segundo capítulo, nos debruçamos então sobre ​The Lizzie Bennet Diaries ​e as
subjetividades contemporâneas, investigando em que medida a websérie adota ou rejeita os
valores e comportamentos do contexto em que se passa, o século XXI. Assim, no início do
capítulo, definimos a subjetividade contemporânea de acordo com os escritos de Paula Sibilia
sobre o tema em ​O show do eu (​ 2016), evidenciando de que maneira os modos de ser e

28
relacionar-se de hoje se diferenciam daqueles reinantes nos séculos XIX e XX. Em seguida,
analisamos de que maneira essas subjetividades são retratadas em ​The Lizzie Bennet Diaries,​
dialogando com teses de mestrado da canadense Alexandra Fournier (2016) e das
norte-americanas Janette Duval (2014) e Shaina Gwynn Robbins (2016). Terminamos o
segundo capítulo chegando à conclusão de que, embora a websérie a princípio aparente
adotar os preceitos da cultura digital alterdirigida c​ ontemporânea, ao incorporar uma
estratégia narrativa transmidiática e interativa que confunde as fronteiras entre ficção e
realidade, afinal ela retoma os valores de manutenção da privacidade e interioridade
propostos por Jane Austen em ​Orgulho e preconceito​. Em última instância, portanto, a
websérie mostra-se crítica das subjetividades alterdirigidas promovidas pelas redes sociais
hoje.
Embora pioneira em sua proposta de adaptação, ​The Lizzie Bennet Diaries c​ ertamente
não será a última tentativa de tradução de um clássico literário para a Internet. De fato, depois
do sucesso da websérie, seus criadores fundaram uma empresa especificamente com esse
objetivo, a Pemberley Digital, cujos frutos ​The March Family Letters (​ PEMBERLEY
DIGITAL, 2014-2015), Frankenstein MD ​(PBS DIGITAL STUDIOS, 2014), Emma
Approved ​(PEMBERLEY DIGITAL, 2013-2014) e ​Welcome to Sanditon (​ PEMBERLEY
DIGITAL, 2013) – adaptações de, respectivamente, ​Mulherzinhas (1868), de Louisa May
Alcott, ​Frankenstein (1818), de Mary Shelley, e de outros dois livros de Jane Austen, ​Emma
(1815) e o inacabado ​Sanditon (1925) – estão disponíveis no YouTube. Não obstante,
diversos fãs também decidiram criar suas próprias versões de ​Jane Eyre ​(1847), de Charlotte
Brontë, com ​The Autobiography of Jane Eyre (​ JANE EYRE, 2013-2014) e ​O jardim secreto
(1911), de Frances Hodgson Burnett, com ​The Misselthwaite Archives ​(PENCIL INK
PRODUCTIONS, 2014-2015), entre uma infinidade de outros títulos.
“Adaptações não são, obviamente, inéditas nos nossos tempos”, lembra a acadêmica
canadense Linda Hutcheon em ​A Theory of Adaptation ​(2013, p. 56). “Shakespeare transferiu
as histórias de sua cultura da página para o palco, tornando-as acessíveis a um público
completamente novo. Ésquilo, Racine, Goethe e da Ponte também recontaram histórias
conhecidas de novas formas.” É o que acontece nesta ​tradução (para usar um termo da
autora) d​ e obras produzidas em momentos distantes no tempo e no espaço para a
contemporaneidade, assim, que nos interessou neste trabalho. Pois esse diálogo entre o ontem

29
e o hoje pode revelar, acreditamos, alguns dos maiores dilemas que afligem o segundo. No
caso de ​The Lizzie Bennet Diaries,​ a questão que se posta são os efeitos, a longo prazo, da
tendência atual de construção da identidade em público. Quanto a adaptações vindouras de
​ só o futuro dirá.
Orgulho e preconceito…

30
4) Referências bibliográficas

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​ as redes sociais
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