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Alguns Aspectos do Conto

Julio Cortázar
Para Cortázar existem algumas constantes, certos valores que se aplicam a todos os contos, valores
esses que lhes conferem a individualidade e qualidade de obra de arte. De difícil conceituação, o conto surge,
como um conjunto de fatos que trabalham conjuntamente com a liberdade e a capacidade de síntese do
artista. Cito a liberdade pois ao conto não se aplicam leis e síntese, segundo a analogia do autor, o romance
é como o cinema e o conto como uma fotografia. O conto é um recorte, um fragmento da realidade, com
limites determinados, porém com a força para abrir essa realidade captada pela lente da câmera. Como na
fotografia, o conto é a escolha de uma imagem ou acontecimento significativo capaz de atuar não apenas em
si mesmo, mas no leitor. O contista não pode proceder cumulativamente, pois o conto insere em si um limite,
ele traz uma noção de condensação de tempo e espaço, submetido a uma “alta pressão espiritual e formal
para provocar essa ‘abertura’”. Ao conto pertence uma certa pressão no leitor desde as primeiras cenas.

Assim, o principal elemento do conto é o tema. A escolha do tema desde um acontecimento


fantástico, dramático ou até mesmo um momento banal do cotidiano deve ser convertido a um “resumo
implacável de uma certa condição humana.”

“Um conto é significativo quando quebra seus próprios limites com essa explosão de energia espiritual que
ilumina bruscamente algo que vai muito além da pequena e às vezes miserável história que conta.”

Um tema às vezes é escolhido pelo autor, por vezes o autor se sente impelido a escrever. Um bom
tema é um núcleo e os acontecimentos giram em torno desse único ponto, essa gravidade atrai os
acontecimentos para si, fazendo suspeitar ao leitor uma realidade mais vasta. Algo que parece pequeno,
porém que se espalha e nos faz transcender os limites do conto. Como em se tratando de contos nada é
absoluto, o tema não é significativo por si só, o que existe é essa ligação entre o escritor e certo tema em
determinado momento e entre certos contos e certos leitores. Dessa forma temos o contista e sua bagagem
de vivências tentando criar uma obra, em seguida o tratamento que se dá a essa obra, ou seja, o
desenvolvimento do tema. Podemos inferir que todo conto é predeterminado pelo que causa ao escritor,
assim o conto tem que “nascer ponte” para que essa emoção seja transportada ao leitor.

Um bom contista tem que saber causar esse sentimento de “sequestro”, de arrebatamento no leitor,
que segundo Cortázar é atingido usando um estilo baseado na intensidade e tensão. Intensidade se dá na
eliminação do supérfluo, dos floreios, deve-se ater ao que é necessário para o desenvolvimento do tema. A
tensão é a forma que autor tem de nos aproximar do tema, daquilo que o autor nos conta, a atmosfera do
conto. Ambos os aspectos, intensidade e tensão, são, de fato, o ofício do escritor, é a demonstração mais
clara de suas capacidades como contista. No entanto Cortázar enfatiza que essa arte, para ele, deve vir da
vivência do escritor, pois se lhe faltar uma motivação “entranhável” a obra não passará de exercício estético.
O escritor deve estar totalmente comprometido com o que escreve, pois dessa forma garantirá a verdade que
quis transmitir ao leitor. O conto deve ser como se apresenta ao escritor que não deve recear não ser aceito
já que há um universo enorme de leitores, esses saberão distinguir a forma mais simples ou mais complexa,
mais que o obrigará a evadir-se de sua realidade. O conto, mesmo com temas populares, só será bom se se
ajustaram aos aspectos citados anteriormente.

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