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TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO

As características essenciais do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) são obsessões


ou compulsões recorrentes, suficientemente graves para causar sofrimento notável. As
obsessões e compulsões consomem tempo e interferem de modo significativo na
rotina normal do indivíduo, no desempenho ocupacional, nas atividades habituais e
nos relacionamentos. O paciente pode ter obsessão, compulsão ou ambas.

A obsessão é um pensamento, sentimento, idéia ou sensação recorrente e intrusiva.


Em contraste com esta, que é um acontecimento mental, a compulsão é um
comportamento. Especificamente, uma compulsão é um comportamento consciente,
padronizado, recorrente, como contar, verificar ou evitar. O paciente com TOC se dá
conta da irracionalidade das sensações e experimenta tanto a obsessão como a
compulsão como egodistônica (i. e., comportamentos indesejáveis).

Embora o ato compulsivo consista em uma tentativa de reduzir a ansiedade associada


à obsessão, nem sempre existe êxito em realizá-lo. Completar o ato compulsivo pode
não afetar a ansiedade, mas até aumentá-la.

EPIDEMIOLOGIA

A prevalência durante a vida do TOC na população geral é estimada em 2 a 3%. Alguns


pesquisadores referem que o transtorno é encontrado em até 10% de pacientes
ambulatoriais de clínicas psiquiátricas. Esses dados fazem do TOC o quarto diagnóstico
psiquiátrico mais comum, após as fobias, os transtornos relacionados a substancias e o
transtorno depressivo maior. Estudos epidemiológicos na Europa, na Ásia e na África
confirmaram essas taxas, que estão além dos limites culturais.

Entre os adultos, as mulheres e os homens têm probabilidade igual de serem afetados,


mas, entre adolescentes, os meninos são os mais afetados. A idade média de inicio é
de cerca de 20 anos, embora os homens tenham uma idade de inicio mais precoce
(média de 19 anos) do que as mulheres (média de 22 anos). De modo geral, os
sintomas de dois terços das pessoas afetadas têm o início antes dos 25 anos, e os
sintomas de menos de 15% têm início após os 35 anos. O início pode ocorrer na
adolescência ou na infância, em alguns casos até aos 2 anos de idade. Os solteiros com
frequência são mais afetados com TOC do que os casados, embora esse achado
provavelmente reflita a dificuldade de manter um relacionamento, dificuldade esta
que essas pessoas apresentam. O transtorno é menos comum entre os negros do que
entre os brancos, embora o acesso à assistência médica, e não as diferenças na
prevalência, possa explicar essa variação.

CO-MORBIDADE

Os indivíduos com TOC costumam ser afetados por outros transtornos mentais. A
prevalência durante a vida de transtorno depressivo maior em pessoas com TOC é de
cerca de 67%, e para a fobia social, de 25%. Outros diagnósticos psiquiátricos co-
mórbidos comuns incluem transtorno por uso de álcool, transtorno de ansiedade
generalizada, fobia específica, transtorno de pânico, transtorno da alimentação e
transtornos da personalidade. A incidência de transtorno de Tourette em pacientes
com TOC é de 5 a 7%, e 20 a 30% daqueles com TOC têm história de tiques.

ETIOLOGIA

Fatores Biológicos

Neurotransmissores
SISTEMA SEROTONÉRGICO. Os vários ensaios clínicos com medicamentos apóiam a
hipótese de que a desregulação da serotonina esteja envolvida na origem das
obsessões e compulsões. Os dados mostram que os medicamentos serotonérgicos são
mais eficazes do que aqueles que afetam outros sistemas de neurotransmissores, mas
não está claro se a serotonina está envolvida na causa do TOC. Estudos clínicos
dosaram as concentrações dos metabólitos da serotonina no líquido cerebrospinal
(LCS) (p. ex., o ácido 5-hidroxiindolacético [5-HIAA]) e a afinidade e o número de locais
de ligação nas plaquetas da imipramina (Tofranil) tritiada. (que se liga a locais de
recaptação da serotonina) e relataram achados variáveis nas medidas em pacientes
com TOC. Em um estudo, a concentração do 5-HIAA no LCS reduziu após o tratamento
com clomipramina (Anafranil), focalizando a atenção no sistema serotonérgico.

SISTEMA NORADRENÉRGICO. No momento, existe menos evidência para a disfunção


do sistema noradrenérgico no TOC. Relatos anedóticos mostram alguma melhora dos
sintomas com a utilização oral da clonidina.

NEUROIMUNOLOGIA. Foi encontrada uma relação positiva entre infecção por


estreptococo e TOC. infecção pelo estreptococo b-hemolitico pode causar febre
reumática, e de 10 a 30% dos pacientes desenvolvem coréia de Sydenham e exibem
sintomas obsessivo-compulsivos. O inicio da infecção geralmente ocorre por volta dos
8 anos de idade para produzir tais seqüelas. A condição é chamada de transtorno
neuropsiquiátrico auto-imune pediátrico associado com infecção estreptocócica
(PANDAS).

Estudos com imagens Cerebrais. Vários estudos de imagens cerebrais funcionais


- p. ex., a tomografia por emissão de pósitrons (PET) - exibiram aumento da atividade
(p. ex., do metabolismo e do fluxo sanguíneo) nos lobos frontais, nos gânglios basais
(especialmente no caudado) e no cíngulo de pacientes com TOC Relatou-se que os
tratamentos farmacológicos e comportamentais revertem tais anormalidades. Tanto
estudos de imagens com tomo grafia computadorizadas (TC) como com ressonância
magnética (RM) encontraram bilateralmente caudados menores em pacientes com
TOC. Procedimentos neurológicos envolvendo o cíngulo são por vezes, eficazes no
tratamento de pacientes com o transtorno.

Genética. Os dados genéticos disponíveis sobre o TOC apóiam a hipótese de que o


mesmo tem um componente genético significativo. Contudo, não distinguem ainda os
fatores hereditários da influência de efeitos culturais e comportamentais sobre a
transmissão do transtorno. Estudos de concordância em gêmeos encontraram uma
taxa consistente de concordância bem mais elevada em gêmeos monozigóticos do que
em dizigóticos. Estudos das famílias desses pacientes demonstraram que 35% dos
parentes de primeiro grau também são afetados pelo TOC. Estudos familiares de
probandos com TOC encontraram aumento das taxas de transtorno de Tourette e de
tiques motores crônicos entre os parentes, os quais têm ainda alguma forma de
transtorno de tiques. Esses dados sugarem uma relação familiar, talvez genética, entre
o transtorno de Tourette e os transtornos de tiques motores em alguns casos de TOC.

Fatores Comportamentais

De acordo com os teóricos do aprendizado, as obsessões são estímulos condicionados.


Um estímulo relativamente neutro passa a se associar a medo ou ansiedade por um
processo de resposta condicionada, por ter sido associado a acontecimentos nocivos
ou provocadores de ansiedade. Dessa forma, objetos e pensamentos previamente
neutros tornam-se estímulos condicionados capazes de provocar ansiedade ou
desconforto.
As compulsões são estabelecidas de forma diferente. Quando o indivíduo
descobre que certa ação reduz a ansiedade ligada a um pensamento obsessivo,
desenvolve estratégias ativas de evitação sob a forma de compulsões ou rituais para
controlar a ansiedade. De forma gradual, devido à eficiência na redução do
desconforto secundário (ansiedade), as estratégias de hesitação se tornam fixas, como
padrões aprendidos de comportamentos compulsivos. A teoria do aprendizado provê
conceitos úteis para explicar certos aspectos dos fenômenos obsessivo-compulsivos -
por exemplo, a capacidade de provocar a ansiedade de idéias não necessariamente
amedrontadoras por si próprias e o estabelecimento de padrões compulsivos de
comportamento.

Fatores Psicossociais

Fatores da Personalidade. O TOC difere do transtorno da personalidade


obsessivo-compulsiva. A maioria das pessoas com o primeiro não tem sintomas pré-
mórbidos compulsivos, e esses traços não são necessários nem suficientes para o
desenvolvimento do transtorno. Apenas 15 a 35% de pacientes com TOC têm traços
obsessivos pré-mórbidos.

Fatores Psicodinâmicos. Sigmund Freud definiu a condição que agora se denomina


TOC como neurose obsessivo-compulsiva. Ele presumia que havia uma retração
defensiva envolvida no caso de desejos edípicos que provocavam ansiedade. Postulou
ainda que o paciente com neurose obsessivo-compulsiva regredia à fase anal do
desenvolvimento psicossexual.
Embora a terapia psicanalítica não altere diretamente as obsessões ou as
compulsões associadas com a doença, o insight psicodinâmico pode ser de grande
auxílio na compreensão de problemas como adesão ao tratamento, dificuldades
interpessoais e problemas de personalidade acompanhando esse transtorno do Eixo I.
Ainda que os sintomas de TOC possam ser de origem biológica, pode haver significados
psicodinâmicos ligados aos mesmos. Há a possibilidade de os pacientes reforçarem a
manutenção da sintomatologia por causa dos ganhos secundários. Por exemplo, um
paciente cuja mãe fica em casa para cuidá-lo pode, inconscientemente, manter os
sintomas de TOC porque estes favorecem a atenção da mãe.
Outra contribuição da abordagem psicodinâmica envolve a compreensão das
dimensões interpessoais. Estudos mostraram que os parentes se acomodam ao
paciente mediante participação ativa em rituais ou modificações significativas de suas
rotinas. Essa forma de acomodação se correlaciona com o estresse na família, com
atitudes de rejeição contra o paciente e o mau convívio entre os membros. Por vezes,
estão envolvidos nos esforços de reduzir a ansiedade do paciente ou controlar suas
expressões de raiva. Esse padrão de relacionamento pode se tornar internalizado e ser
recriado quando o paciente passa a ser submetido a tratamento.
Por fim, outra contribuição do pensamento psicodinâmico é o reconhecimento
de precipitantes que iniciam ou exacerbam os sintomas. É comum as dificuldades
interpessoais aumentarem a ansiedade e, em conseqüência, a sintomatologia.
Pesquisas sugerem que o TOC pode ser precipitado por um número de estressores
ambientais, especialmente aqueles envolvendo gravidez, dar à luz ou cuidados
maternos e paremos dos filhos. Uma compreensão dos estressores pode auxiliar o
clínico em um plano geral de tratamento que reduza os próprios acontecimentos
estressantes ou seu significado para o paciente.

OUTROS FATORES PSICODINÂMICOS. Na teoria psicanalítica clássica, o TOC era


denominado neurose obsessivo-compulsiva, considerada uma regressão da fase
edípica para a fase psicossexual anal do desenvolvimento. Quando os pacientes se
sentem ameaçados por ansiedade regridem para um estágio associado à fase anal.
Uma das características marcantes de pacientes com TOC é o grau com que são
preocupados com agressão ou limpeza, tanto abertamente no conteúdo de seus
sintomas como nas associações subjacentes a eles. Dessa forma. a Psicogênese do
transtorno pode se situar em alterações no crescimento e no desenvolvimento
normais relacionados à fase analsádica do desenvolvimento.

Ambivalência. A ambivalência é o resultado direto de uma mudança das


características da vida impulsiva. É um aspecto importante de crianças normais
durante a fase de desenvolvimento anal-sádica; elas sentem tanto amor como raiva
assassina contra o mesmo objeto, por vezes ao mesmo tempo. Os pacientes com TOC
experimentam conscientemente tanto amor como ódio contra um objeto. Esse conflito
de emoções apostas é evidente nos padrões de fazer e desfazer do comportamento e
na dúvida paralisante diante de escolhas.

Pensamento Mágico. No pensamento mágico, a regressão desvela formas precoces de


pensamento, em vez de impulsos; isto é, as funções do ego, bem como as do id, são
afetadas pela regressão. Inerente ao pensamento mágico é a onipotência do mesmo.
Muitos pacientes com TOC acreditam que, por pensar em um acontecimento no
mundo externo, isso pode levar à sua realização sem as ações físicas intermediárias.
Tal sentimento leva-os ao medo de ter um pensamento agressivo.
DIAGNÓSTICO

Como parte dos critérios diagnósticos de TOC, o DSM-IV-TR possibilita aos clínicos
especificar o tipo com insight pobre, se os pacientes não reconhecem o excesso de
suas obsessões e compulsões (Tab. 13.4-1).

CARACTERÍSTICAS CRÔNICAS

As obsessões e as compulsões têm certos aspectos em comum: uma idéia ou impulso


se intromete de maneira insistente e persistente na percepção consciente do
indivíduo. O sentimento de temor ansioso acompanha a manifestação central e
costuma levar o indivíduo a tomar contramedidas em relação à idéia ou ao impulso
inicial. A obsessão ou a compulsão é alheia ao ego, sendo experimentada como
estranha à experiência do indivíduo como ser psicológico. Não importa quão vívida ou
imperiosa sejam, em geral a pessoa as reconhece como absurdas e irracionais. O
indivíduo que sofre de obsessões e compulsões em geral tem um forte desejo de
resistir-lhes. A despeito disso, cerca da metade deles oferece pouca resistência às
compulsões, embora cerca de 80% acreditem que sejam irracionais. Por vezes,
supervalorizam as obsessões e compulsões - por exemplo, podem insistir que a
limpeza compulsiva é moralmente correra, ainda que tenham perdido seus empregos
pelo tempo disperdiçado com essa atividade.

Padrões de Sintomas

A apresentação de obsessões e compulsões é heterogênea em adultos e em crianças e


adolescentes. Os sintomas de um mesmo paciente podem se superpor e mudar com o
tempo, mas o TOC possui quatro tipos de sintomas principais.

Contaminação. O problema mais comum é uma obsessão de contaminação,


seguida pelo lavar ou acompanhado pela evitação compulsiva do Objeto tido como
contaminado. O objeto temido por vezes é difícil de se evitar (p. ex., fezes, urina,
poeira ou germes). Os pacientes podem, literalmente, arrancar a pele das mãos pelo
lavar excessivo ou podem ser incapazes de deixar suas casas por causa do medo de
germes. Embora a ansiedade seja resposta emocional mais comum ao objeto temido, a
vergonha e o nojo obsessivo também são recorrentes. Os pacientes com obsessão por
contaminação, em geral, acreditam que isso se transmite de objeto a objeto ou de
pessoa a pessoa com o menor contato.
TABELA 13.4-1 Critérios diagnósticos do DSM-IV-TR para transtorno obsessivo-
compulsivo
A. Obsessões ou compulsões:
Obsessões, definidas por (1), (2), (3) e (4):
(1) pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que, em algum
momento durante a perturbação, são experimentados como intrusivos e inadequados e
causam acentuada ansiedade ou sofrimento
(2) os pensamentos, impulsos ou imagens não são meras preocupações excessivas com
problemas da vida real
(3) a pessoa tenta ignorar ou suprimir tais pensamentos, impulsos ou imagens, ou
neutralizá-los com algum outro pensamento ou ação
(4) a pessoa reconhece que os pensamentos, impulsos ou imagens obsessivas são produto
de sua própria mente (não impostos a partir de fora, como na inserção de pensamentos)
Compulsões, definidas por (1) e (2)
(1) comportamentos repetitivos (p. ex., lavar as mãos, organizar, verificar) ou atos mentais
(p. ex., orar, contar ou repetir palavras em silêncio) que a pessoa se sente competida a
executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser
rigidamente aplicadas
(2) os comportamentos ou atos mentais visam prevenir ou reduzir o sofrimento ou evitar
algum evento ou situação temida; entretanto, esses comportamentos ou atos mentais
não têm uma conexão realista com o que visam neutralizar ou evitar ou são claramente
excessivos
B. Em algum ponto durante o curso do transtorno, o individuo reconheceu que as
obsessões ou compulsões são excessivas ou irracionais. Nota: isso não se aplica a crianças.
C. As obsessões ou compulsões causam acentuado sofrimento, consomem tempo (tomam
mais de 1 hora por dia) ou interferem significativamente na rotina, no funcionamento
ocupacional (ou acadêmico), em atividades ou relacionamentos sociais habituais do
individuo.
D. Se outro transtorno do Eixo I está presente, o conteúdo das obsessões ou compulsões
não está restrito a ele (p. ex., preocupação com alimentos na presença de um transtorno
da alimentação; arrancar os cabelos na presença de tricotilomania; preocupação com a
aparência na presença de transtorno dismôrfico corporal; preocupação com drogas na
presença de um transtorno por uso de substância; preocupação com ter uma doença
grave na presença de hipocondria; preocupação com anseios ou fantasias sexuais na
presença de uma parafina; ruminações de culpa na presença de um transtorno depressivo
maior).
E. A perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância (p. ex.,
droga de abuso, medicamento) ou de uma condição médica geral.
Especificar se:
Com Insight Pobre: se, na maior parte do tempo durante o episódio atual, o individuo não
reconhece que as obsessões e compulsões são excessivas ou irracionais.
De American Psychiatric Association. Diagnostic and Statical Manual of Mental Disorders. 4th ed.
Text rev. Washington, DC: American Psychiatric Association; copyright 2000, com permissão
Dúvida Patológica. O segundo tipo mais comum é a obsessão da dúvida, seguido
pela compulsão de verificar. A obsessão por vezes implica certo perigo de violência (p.
ex., esquecer de desligar o fogão ou não trancar a porra). O verificar pode envolver
idas múltiplas até a casa para verificar o fogão, por exemplo. Os pacientes têm uma
dúvida obsessiva e sempre se sentem culpados de terem esquecido ou cometido
alguma coisa.

Pensamentos Intrusivos. No terceiro tipo, há pensamentos obsessivos intrusivos


sem compulsão. Essas obsessões são, em geral, pensamentos repetitivos de um ato
sexual agressivo que é repreensível para o paciente. Pacientes obcecados com
pensamentos de atos agressivos ou sexuais podem se denunciar à polícia ou se
confessar a um padre.

Simetria. O quarto tipo é a necessidade de simetria ou precisão que pode levar a


compulsão e lentidão. Os pacientes são capazes de levar horas para fazer uma refeição
ou barbear o rosto.

Outros Padrões de Sintomas. Obsessões religiosas e economia compulsiva são


comuns em pacientes com TOC. A tricorilomalia (arrancar cabelos compulsivo) e roer
as unhas podem ser compulsões relacionadas ao transtorno.

Exame do Estado Mental


No exame do estado mental, pessoas com TOC podem mostrar sintomas de
transtornos depressivos. Esses sintomas estão presentes em cerca de 50% de todos os
pacientes. Alguns têm traços de caráter sugerindo transtorno da personalidade
obsessivo-compulsiva (p. ex., necessidade excessiva de precisão e limpeza), mais não é
comum à maioria. Os pacientes com TOC, em especial os homens, têm uma taxa
superior à média de vida celibatária. Os casados apresentam uma taxa mais alta do
que a quantidade comum, de discórdia conjugal.

B. apresentou-se para internação psiquiátrica depois de ter sido transferida do andar


de medicina geral onde estava sendo tratada por desnutrição. Ela foi encontrada
inconsciente em seu apartamento por uma vizinha. Quando trazida ao pronto-socorro
pela ambulância, verificou-se que estava hipotensa. No exame psiquiátrico, a paciente
descreveu uma longa história de obsessões sobre limpeza, particularmente
relacionada a itens da alimentação. Relatou ser dificil para ela comer qualquer
alimento a menos que o lavasse 3 a 4 vezes, pois às vezes achava que o mesmo estava
sujo. Referiu que lavar os alimentos reduzia a ansiedade em relação à sujeira deles.
Embora relatasse tentar comer alimentos que não tinha lavado (p. ex., em um
restaurante), ficava tão preocupada em contrair uma doença que não podia mais
jantar fora de casa. B. confessou que suas obsessões sobre a limpeza dos alimentos
tinham se tornado tão extremas nos três meses anteriores, que conseguia comer
muito poucos alimentos, ainda que os lavasse em excesso. Reconheceu a natureza
irracional das preocupações obsessivas, mas nunca foi capaz de se forçar para comer,
ficando extremamente nervosa e nauseada após fazê-lo. (Cortesia de Daniel S. Pine,
M.D.)

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Condições Médicas

Os pré-requisitos do DSM-IV-TR para o diagnóstico, de sofrimento pessoal e


comprometimento do desempenho, diferencia o TOC de pensamentos ou hábitos
comuns ou levemente excessivos. As principais condições neurológicas a considerar no
diagnóstico diferencial são o transtorno de Tourette, outros transtornos de tiques,
epilepsia do lobo temporal e, em alguns casos, complicações pós-traumáticas e pós-
encefalíticas.

Transtorno de Tourette

Seus sintomas característicos são os tiques motores e vocais que ocorrem com
frequência e quase todos os dias. O transtorno de Tourette e o TOC têm idade de início
e sintomas semelhantes. Cerca de 90% das pessoas com o primeiro manifestam
sintomas compulsivos, e até dois terços delas satisfazem os critérios diagnósticos para
TOC.

Outras Condições Psiquiátricas

As principais considerações psiquiátricas no diagnóstico diferencial do TOC são


esquizofrenia, transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, fobias e transtornos
depressivos. O TOC pode, em geral, ser distinguido da esquizofrenia pela ausência de
outros sintomas esquizofrênicos, pela natureza menos bizarra dos sintomas e pelo
insight sobre a condição. O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva não tem
o grau de comprometimento do desempenho associado ao TOC. As fobias são
diferenciados pela ausência de uma relação entre os pensamentos obsessivos e as
compulsões, em geral uma compulsão de evitação. O transtorno depressivo maior
pode se associar a idéias obsessivas, mas os pacientes com TOC isolado deixam de
satisfazer os critérios diagnósticos para transtorno depressivo maior.

Outras condições psiquiátricas que podem estar ligadas ao TOC são a hipocondria, o
transtorno dismórfico corporal e possivelmente outros transtornos do controle dos
impulsos como a cleptomania e o jogo compulsivo. Em todas essas condições, os
pacientes têm tanto um pensamento repetitivo (p. ex., preocupação com o corpo)
como um comportamento repetitivo (p. ex., roubar). Diversos grupos de pesquisa
estão investigando esses e outros transtornos, como comportamento sexual
compulsivo, suas relações com o TOC e suas respostas a vários tratamentos.

CURSO E PROGNÓSTICO

Mais da metade dos pacientes com TOC apresentam início súbito dos sintomas. Em
cerca de 50 a 70% dos pacientes, ocorre após um acontecimento estressante, como
gravidez, problema sexual ou morte de um parente. Em vista de muitas pessoas
tratarem de manter seus sintomas em segredo, por vezes há uma demora de 5 a 10
anos antes que busquem ajuda psiquiátrica, ainda que essa defasagem esteja
diminuindo com o aumento do conhecimento sobre o transtorno. O curso costuma ser
longo, mas variável; alguns pacientes experimentam um curso flutuante, outros,
constante.
De 20 a 30% dos pacientes têm melhora significativa de seus sintomas, e 40 a
50% têm melhora moderada. Os 20 a 40% restantes ou permanecem doentes ou têm
piora de seus sintomas.
Cerca de um terço tem transtorno depressivo maior, e suicídio 6 um risco para
todos os pacientes com TOC. Um mau prognóstico 6 indicado por ceder (em vez de
resistir) às compulsões, início da infância, compulsões bizarras, necessidade de
hospitalização, transtorno depressivo maior coexistente, crenças delirantes, idéias
supervalorizadas (i.e., certa aceitação das obsessões e compulsões) e presença de um
transtorno da personalidade (especialmente transtorno da personalidade
esquizotípica). Um bom prognóstico é indicado por bom ajustamento social e
ocupacional, presença de um aconteci mento precipitante e natureza episódica dos
sintomas. O conteúdo obsessivo não parece se relacionar ao prognóstico.

TRATAMENTO

Com a crescente evidência de que o TOC é, em grande parte, determinado por fatores
biológicos, a teoria psicanalítica clássica tem sido desfavorecida. Além disso, em vista
de os sintomas parecerem refratários à psicoterapia psicodinâmica e à psicanálise, os
tratamentos farmacológicos e comportamentais se tornaram comuns. No entanto, os
fatores psicodinâmicos podem ser de benefício considerável na compreensão do que
precipita as exacerbações do transtorno e no tratamento de várias formas te
resistência ao mesmo, como a não-adesão aos medicamentos.
Muitos pacientes com TOC resistem de forma veemente aos esforços de
tratamento. Podem se recusar a tomar medicamentos e a realizar as tarefas de casa
indicadas pelo terapeuta e outras atividades prescritas pelos terapeutas
comportamentais. Os sintomas obsessivo-compulsivos por si só, não importa o quão
baseados em dados biológicos, podem ter significados psicológicos importantes que
tornem os pacientes relutantes em abandoná-los. A exploração psicodinâmica da
resistência ao tratamento pote melhorar a adesão.
Estudos bem-controlados verificaram que a farmacoterapia, a terapia
comportamental ou a combinação de ambas é eficaz para reduzir os sintomas de
forma significativa. A decisão sobre que tratamento utilizar se baseia no julgamento e
na experiência to clínico e na aceitação, pelo paciente, das várias modalidades.

Farmacoterapia

A eficácia da farmacoterapia no TOC foi comprovada em vários ensaios clínicos e é


reforçada pela observação de que os estudos verificam uma taxa de resposta a placebo
de apenas cerca de 5%. Essa porcentagem é baixa, comparada com a taxa de resposta
a placebo de 30 a 40% freqüentemente vista em estudos de medicamentos
antidepressivos e ansiolíticos.
Os medicamentos, todos eles utilizados para tratar transtornos depressivos e
outros transtornos mentais, podem ser administrados em suas faixas habituais de
dosagem. Os efeitos iniciais costumam ser observados após 4 a 6 semanas de
tratamento, embora 8 a I6 semanas sejam, em geral, necessárias para se obter o
benefício terapêutico máximo. O tratamento com antidepressivos ainda é controverso,
e uma proporção significativa de pacientes com TOC que respondem ao tratamento
com antidepressivos parece ter recaído quando essa abordagem é interrompida.
A intervenção-padrão é iniciar o tratamento com um ISRS ou com clomipramina
e, a seguir, mudar para outras estratégias farmacológicas se os medicamentos
específicos para a serotonina não forem eficazes. Os serotonérgicos aumentaram para
50 a 70% a porcentagem de pacientes com TOC que têm probabilidade de responder
ao tratamento.

Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina. os ISRSs - fluoxetina


(Prozac), citalopram (Celexa), escitalopram (Lexapro), fluvoxamina (Luvox), paroxetina
(Aropax) e sertralina (Zoloft) foram aprovados pela Food and Drug Administration (F
DA) para o tratamento do TOC. Doses mais elevadas têm sido necessárias para o efeito
benéfico, como 80 mg de fluoxetina por dia. Embora os ISRSs possam causar
transtornos do sono, náuseas e diarréia, cefaléia, ansiedade e inquietação, esses
efeitos adversos tendem a ser transitórios e geralmente menos perturbadores do que
os efeitos adversos associados aos antidepressivos tricíclicos, como a clomipramina. Os
melhores resultados clínicos ocorrem quando os ISRSs sôo utilizados em combinação
com terapia comportamental.

Clomipramina. De todos os medicamentos tricíclicos e tetracíclicos, a clomipramina


é o mais seletivo para a recaptação da serotonina, versas a recaptação da
norepinefrina, sendo superada apenas pelos ISRSs. A potência da clomipramina em
relação à recaptação da serotonina só é excedida pela sertralina e pela paroxetina. A
clomipramina foi o primeiro medicamento a ser aprovado pela FDA para o tratamento
do TOC. Sua dosagem deve ser aumentada de forma gradativa em 2 a 3 semanas para
evitar os efeitos adversos gastrintestinais e a hipotensão ortostática e, como outros
medicamentos tricíclicos, causa sedação significativa e efeitos anticolinérgicos,
inclusive boca seca e obstipação. Como com os ISRSs, os melhores resultados advêm
de uma combinação do medicamento com terapia comportamental.

Outros Medicamentos. Se o tratamento com a clomipramina ou um ISRS não é


bem-sucedido, vários terapeutas potencializam o primeiro medicamento pela adição
de valproato (Depakene), lírio (Carbolitium) ou tarbamazepina (Tegretol). Outros
agentes que podem ser tentados são a vcnlafaxina (Efexor), o pindolol (Visken) e os
inibidores da monoaminoxidase, especialmente a fenelzina (Nardil). Alternativas
farmacológicas para o tratamento dos pacientes não-responsivos incluem a buspirona
(BuSpar), a 5 hidroxitriptamina (5-HT), o L-triptofano e o clonazepam (Rivotril).
Agentes antipsicóticos podem ser úteis quando um transtorno de tique ou sindrome
de Tourette também está presente.
Terapia Comportamental

Embora poucas comparações tenham sido realizadas, a terapia comportamental é tão


eficaz quanto a farmacoterapia no TOC, e alguns dados indicam que os efeitos
benéficos são mais duradouros com a mental o tratamento de escolha para o
transtorno. A abordagem comportamental pode ser conduzida em situações tanto de
ambulatório como de internação hospitalar. As principais abordagens
comportamentais são a exposição e a prevenção de resposta. A dessensibilização, a
parada de pensamento, a inundação, a terapia por implosão e o condicionamento
aversivo têm sido utilizados em pacientes com TOC. Na terapia comportamental, os
pacientes precisam estar, de fato, comprometidos com a melhora.

Psicoterapia

Na ausência de estudos adequados sobre psicoterapia orientada ao insight, qualquer


generalização válida sobre sua eficácia é difícil de St estabelecer, embora haja relatos
anedóticos de êxito. Certos analistas observaram mudanças marcantes, duradouras e
positivas em pacientes com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, em
especial quando são capazes de conciliar os impulsos agressivos subjacentes a seus
traços de caráter. Da mesma forma, analistas e psiquiatra de orientação dinâmica têm
observado melhora sintomática mar cante em pacientes com TOC no curso de análise
ou de psicoterapia prolongada visando ao insight.
A psicoterapia de apoio, sem dúvida, tem seu lugar, principalmente para
aqueles que, a despeito de sintomas de vários graus de gravidade, são capazes de
trabalhar e fazer ajustamentos sociais. Com o contato contínuo e regular com um
profissional interessado, simpático e encorajador, podem chegar a se desempenhar
bem em virtude desse auxílio, sem o que seus sintomas os incapacitariam. Às vezes,
quando os rituais obsessivos e a ansiedade atingem uma intensidade intolerável, é
necessário hospitalizar os pacientes até que o abrigo de uma instituição ou a remoção
do estresse ambiental externo reduzam os sintomas até um nível tolerável.
Os membros da família muitas vezes chegam aos limites do desespero por
causa do comportamento do paciente. Qualquer processo psicoterapêutico deve
incluir atenção aos membros d; família para a provisão de apoio emocional,
asseguramento e explicações e conselhos de como manejar e responder ao paciente

Outros Tratamentos

A terapia familiar costuma ser útil para apoiar a família, auxiliando reduzir a discórdia
conjugal resultante do transtorno e construindo uma aliança terapêutica para o bem
do paciente. A terapia de grupo é benéfica como sistema de apoio para alguns
pacientes.
Para casos extremos, resistentes ao tratamento e cronicamente incapacitados,
a eletroconvulsoterapia (ECT) e a psicocirurgia podem ser consideradas. A ECT não é
tão eficiente como a psicocirurgia, mas deve ser tentada antes da cirurgia. O
procedimento psicocirúrgico mais comum para o TOC é a cingulotomia, que tem êxito
no tratamento de 25 a 30% dos pacientes de outra maneira sem resposta a
intervenções. A complicação mais comum da psicocirurgia é o desenvolvimento de
convulsões, que são quase sempre controladas com fenitoína. Alguns indivíduos que
não respondem à psicocirurgia isolada, à farmacoterapia ou terapia comportamental
antes da operação, passam a fazê-lo após a psicocirurgia.

F42 Transtorno obsessivo-compulsivo

Transtorno caracterizado essencialmente por idéias obsessivas ou por


comportamentos compulsivos recorrentes. As idéias obsessivas são pensamentos,
representações ou impulsos, que se intrometem na consciência do sujeito de modo repetitivo
e estereotipado. Em regra geral, elas perturbam muito o sujeito, o qual tenta, freqüentemente
resistir-lhes, mas sem sucesso. O sujeito reconhece, entretanto, que se trata de seus próprios
pensamentos, mas estranhos à sua vontade e em geral desprazeirosos. Os comportamentos e
os rituais compulsivos são atividades estereotipadas repetitivas. O sujeito não tira prazer
direto algum da realização destes atos os quais, por outro lado, não levam à realização de
tarefas úteis por si mesmas. O comportamento compulsivo tem por finalidade prevenir algum
evento objetivamente improvável, freqüentemente implicando dano ao sujeito ou causado por
ele, que ele(a) teme que possa ocorrer. O sujeito reconhece habitualmente o absurdo e a
inutilidade de seu comportamento e faz esforços repetidos para resistir-lhes. O transtorno se
acompanha quase sempre de ansiedade. Esta ansiedade se agrava quando o sujeito tenta
resistir à sua atividade compulsiva.

Inclui:neurose:

 anancástica
 obsessivo-compulsiva
Exclui: personalidade (transtorno da) obsessivo-compulsiva (F60.5)

F42.0 Com predominância de idéias ou de ruminações obsessivas

Pode-se tratar de pensamentos, imagens mentais ou impulsos para agir, quase sempre
angustiantes para o sujeito. Às vezes trata-se de hesitações intermináveis entre várias opções,
que se acompanham freqüentemente de uma incapacidade de tomar decisões banais mas
necessárias à vida cotidiana. Existe uma relação particularmente estreita entre as ruminações
obsessivas e a depressão, e deve-se somente preferir um diagnóstico de transtorno obsessivo-
compulsivo quando as ruminações surgem ou persistem na ausência de uma síndrome
depressiva.

F42.1 Com predominância de comportamentos compulsivos (rituais obsessivos)

A maioria dos atos compulsivos está ligada à limpeza (particularmente lavar as mãos),
verificações repetidas para evitar a ocorrência de uma situação que poderia se tornar perigosa,
ou um desejo excessivo de ordem. Sob este comportamento manifesto, existe o medo,
usualmente de perigo ao ou causado pelo sujeito e a atividade ritual constitui um meio ineficaz
ou simbólico de evitar este perigo.

F42.2 Forma mista, com idéias obsessivas e comportamentos compulsivos

F42.8 Outros transtornos obsessivo-compulsivos

F42.9 Transtorno obsessivo-compulsivo não especificado

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