Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
Incluo nesse conjunto as abordagens sociológicas do cotidiano, as perspectivas antropológicas
que se dedicam ao estudo da vida na cotidianidade contemporânea, as abordagens filosóficas que buscam
subverter a ideia hegemônica da dissociação filosofia/vida cotidiana e outros estudos, interdisciplinares ou
não, que se dedicam a compreender os fenômenos cotidianos em sua complexidade e inteireza.
conhecimentos, esses diferentes estudos entendem que toda produção de conhecimento
dito científico se dá num espaçotempo determinado, numa sociedade em que as relações
de força e a distribuição de poderes e saberes têm uma especificidade que interfere na
produção social de conhecimentos e que, portanto, estes não podem ser entendidos como
autônomos em relação à vida cotidiana e aos sujeitos que os produzem. Algumas histórias
reais ajudam a compreender a pertinência dessa afirmação e a validar a noção de produção
cotidiana de conhecimentos.
Outra história importante é a narrada por Bruno Latour (2002) sobre a inteligência
científica de Joliot, pesquisador responsável pelo projeto de desenvolvimento da bomba
atômica francesa nos anos 1940. No texto, o autor traz e explica a indissociabilidade entre
os argumentos políticos e científicos do cientista para manter vivo, ou seja, financiado,
seu projeto. Segundo Latour, Joliot priorizava, em momentos delicados politicamente, o
desenvolvimento de resultados que pudessem surtir efeito político. Gerenciava,
2
Lorenzo's Oil, (EUA): 1992, Universal Pictures, direção: George Miller.
simultaneamente, sua equipe e os políticos com os quais tinha que negociar. Ou seja,
nesse caso, a questão social definia, não só o que iria ser pesquisado, mas também os
processos de desenvolvimento das pesquisas. Assim, podemos afirmar que as chamadas
ciências naturais, se, por um lado, têm como objeto o “comportamento” da natureza, por
outro, são socialmente determinadas, tanto no que se refere ao que interessa pesquisar,
quanto no que diz respeito aos seus procedimentos e prioridades.
3
Cf. MORIN, 1995.
lógico-estruturais. O autor afirma que a realização de determinada estrutura não é e não
poderia ser uma transposição não-mediatizada de seus elementos estruturais.
Consequentemente, para ele, a compreensão teórica das estruturas sociais não significa,
em si, a compreensão das realidades sociais específicas nem, sobretudo, as de suas
possibilidades reais de transformação emancipatória. Melhor motivo para
compreendermos como necessidade o estudo das realidades cotidianas para pensar a
emancipação social não haveria. Esse tipo de reflexão político-epistemológica em lugar
de tentar ensinar à realidade o que ela deveria ser, se volta para a compreensão de sua
complexidade, das redes de conhecimentos, poderes e práticas que nela se tecem e que a
habitam e das possibilidades de novas tessituras a partir do já existente.
4
Cf. Oliveira, op. cit., 2003.
complexa na qual estão presentes e enredadas as diferentes dimensões da vida social É
necessário, ainda, compreendermos os modos como os praticantes da vida cotidiana nela
atuam, que é sempre singular, único e mutável, em virtude do próprio dinamismo
intrínseco ao viver, que traz permanentemente mudanças às redes de sujeitos, de saberes
e valores e, portanto, às práticas sociais.