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AULA 02 – PARTE 01

UMBANDA E CANDOMBLÉ
Semelhanças e Diferenças

Olá a todos, sou Alexandre Cumino e essa é a primeira parte da segunda aula de Teologia de
Umbanda Sagrada. Estamos falando sobre o que não é Umbanda, sobre a Umbanda e Candomblé,
diferenças e semelhanças.
Já falamos algumas coisas sobre a África, para entender melhor o que é o Candomblé, e
podemos defini-lo como o resgate de uma cultura e uma religiosidade africana. O nome Candomblé é
muito mais utilizado para definir a religiosidade afro-brasileira realizada na Bahia.
A Bahia, principalmente no final do período de escravidão, recebeu uma grande leva de
escravos da cultura Nagô e mais especificamente da nação ou da cidade/nação de Keto.
Na África, os Nagôs e os Gêges viviam em guerra e quando uma nação vencia a guerra essas
nações africanas faziam escravos e os vendiam para os europeus. Então o europeu não entrava na
África armado para fazer escravo, na maioria das vezes ele comprava os reis e rainhas africanas,
porque era uma sociedade monárquica, esses reis e rainhas faziam escravos de guerra e
vendiam/trocavam para os europeus. Era troca de pessoas por bugigangas / quinquilharias e por armas
para fazer mais escravos.
Os europeus também patrocinaram muitas guerras na África, uma nação contra a outra, e era
comum na hora de comprar escravos dentro de um navio chamado de tumbeiro, costumava-se
misturar africanos de várias nações diferentes para evitar uma revolta, evitar que eles tomassem conta
do navio.

Filme recomendado: Amistad

Esse filme mostra bem essa realidade do trafico negreiro, dos navios negreiros, dos
tumbeiros...me lembro de ter lido o relato escrito de um desses navios em que a pessoa que fazia o
transporte de escravos, as pessoas eram tratadas como animais.
O negro não era considerado pelo europeu como gente, discutia-se até se o negro tinha ou não
tinha alma, apenas por não ter uma cultura igual, porque não tinham certos avanços tecnológicos, eram
considerados primitivos, assim como muita gente ainda hoje considera o índio uma gente primitiva,
primitiva no sentido de atrasado mesmo, infantil, dentro da idéia de evolução.
E não é uma realidade, uma cultura não é atrasado nem primitiva pelo modo de ser diferente.
Mas essa era a visão: os negros escravos eram tratados como animais, eram colocados no
navio...segundo as palavras de um desses tumbeiros, eram colocados como livros em uma prateleira,
acorrentados, um ao lado do outro, as vezes passavam a viagem inteira no mesmo lugar, não tinham
espaço para ficar em pé talvez.
Durante todo o tempo de viagem de um continente para o outro, atravessando o atlântico, esses
negros, esses escravos, esses ancestrais...porque eu sou muito branco, sou muito branquinho, mas sou
brasileiro e brasileiro é resultado dessas três culturas. Eu tenho também na minha família descendente
de índio e negro.

“No meu entender não somos brancos ou negros, somos todos brasileiros.
Essa é uma visão bem umbandista.”

Teologia de Umbanda Sagrada / Tutor: Alexandre Cumino Página 1


Então, enquanto vinham da África, comiam uma ração, alguma coisa simplesmente que
permitisse que chegassem com vida porque o único valor era o monetário de quantos negros chegariam
aqui para serem vendidos. Dentro do navio eram colocados então negros de uma nação misturados
com negros de outra nação, mas no final do período da escravidão começaram a vir muitos negros da
cultura Nagô e principalmente para a Bahia.
Chegaram mais negros da cultura Nagô na Bahia do que em todas as Américas. Porque havia
uma guerra na África entre Gêges e Nagôs e mais especificamente da nação de Keto. A nação Keto,
dentro da região da cultura Nagô, foi inteira escravizada pelo rei, general, militar Guezo da cultura
Gêge. E a nação inteira, que fazia o culto de Oxossi, foi escravizada e levada para a Bahia. E isso deu
um caráter e uma marca Nagô, Yorubá com forte influência de Keto aos cultos afro brasileiros baianos.

Daí vem a definição Candomblé de Keto.


“Que nação você toca ? Eu toco Angola, toco Keto, toco Ijexá...”

Qual é a origem cultural do seu culto afro brasileiro ?

Fala-se afro brasileiro pois por mais que tenha origem africana é o que esta sendo feito no Brasil
e não tem como não ser influenciado pela cultura dessa terra, tanto que na África cada região tem o
culto de um ou de outro orixá. E quando chega na Bahia, em um único culto chamado de
Candomblé, se estabelece o culto de todos os orixás.

Orixá não é espírito humano...orixá quando incorpora não fala.

Então o Candomblé é culto de orixá, os orixás se manifestam mediunicamente, eles incorporam,


o adepto fica em transe e para fazer parte de um Candomblé você tem que ser iniciado.
Esse processo de iniciação é complexo, a pessoa tem que ser aceita pelo orixá, pelo dono da
casa. Dentro da iniciação a pessoa é raspada (cabeça) e por meio dessa raspagem dos cabelos ou as
vezes o corpo inteiro no tradicional...é feita uma incisão, são feitas oferendas, é feito o ritual do BORI
que quer dizer “dar de comer a cabeça”...o ORI é o alto da cabeça, é onde fica o “centro de força de
poder da vida espiritual”.
Nas iniciações são feitos banhos de limpeza, descarga e iniciar-se é: morrer para o mundo
profano e nascer para o mundo sagrado. Então iniciar-se no Candomblé é morrer para o mundo e
nascer para o sagrado e encantado mundo do Candomblé do culto afro brasileiro.
Aqui estou falando principalmente do culto afro brasileiro baiano, em que se destacam os
Candomblé mais tradicionais da Bahia que são:
- Casa Branca do Engenho Velho : Casa Branca do Engenho Velho, Sociedade São Jorge do
Engenho Velho ou Ilê Axé Iyá Nassô Oká é considerada a primeira casa de candomblé aberta em
Salvador, Bahia. Constituído de uma área aproximada de 6.800 m², com as edificações, árvores e
principais objetos sagrados. É o primeiro Monumento Negro considerado Patrimônio Histórico do Brasil
desde o dia 31 de maio de 1984. Fonte: wikipedia

- Cantuá e Ilê Axé Opó Afonjá : Cantuá que teve como a sacerdotisa Mãe Menininha, muito fotografado
por Pierre Verger.

Pierre Verger foi um francês que esteve na África e no Brasil, foi iniciado no Ilê Axé Opó Afonjá
por Mãe Menininha, foi feito filho de Xangô e na África foi iniciado como sacerdote de Ifá.

Teologia de Umbanda Sagrada / Tutor: Alexandre Cumino Página 2


A quem quiser se aprofundar na leitura e na informação dos cultos afro brasileiros, eu
recomendo ler:

- Pierre Verger da editora Corrupio, título “Orixás”.

Também tem de Pierre Verger da EDUSP, nota sobre o culto de Orixás e Voduns. Essa
bibliografia eu também mando como nota de aula. Logo no Candomblé se estabelece culto para vários
orixás.
Chegavam negros escravos de todos os lugares da África mas na Bahia houve uma
concentração de Nagôs de língua Yorubá, da cultura que vinha da nação de Keto, logo
criou-se o Candomblé - culto de Orixás feito a moda baiana. E para sobreviver em um primeiro
momento foi criado, já no Candomblé muito antes de surgir a Umbanda, os cultos de nação baianos.
Criaram um sincretismo entre santos e orixás, ou seja, como não havia a liberdade religiosa de fazer o
culto ao orixá, lembrando que todo escravo ao chegar no Brasil em muitas vezes antes de sair da África
eram batizados no catolicismo.
Então todos eram considerados católicos. O padre já abençoava o tráfico negreiro, por que a
igreja considerava que a África era o inferno no mundo e que era uma oportunidade muito boa o negro
ser escravo porque o seu corpo estava escravizado mas sua alma estava livre por estar sendo batizado
cristão.
Essa era a filosofia da igreja que abençoou e patrocinou o tráfico negreiro e são páginas
conhecidas da história que estou falando e a relação da religião é importante nessa época. Ao chegar
aqui o negro não esquece seus Orixás...Seus Inquices no caso dos angolanos...seus Voduns no caso
dos Gêges...seus Tatás no caso dos congos...
E logo na Bahia começou a se tornar notório e muito presente o culto de orixá e numa primeira
instancia era proibido. Para burlar ou fugir dessa proibição e poder cultuar os orixás é que o negro, o
Africano ou o afro baiano, criou uma relação entre santos e orixás, até porque essa relação já existia
entre Orixás e Voduns.
Por exemplo, o negro não enxergava limite para as divindades. Ele entendia que o mesmo
Ogum do culto de nação Nagô poderia vir na cultura Gêge com o nome de GU...O mesmo Oxumaré na
cultura Nagô é DAN na cultura Gêge...o mesmo Obaluaye na cultura Nagô é Xapanã no culto de
Vodun...então eles já entendiam que a mesma divindade assume nomes, formas, nomes e culturas
diferentes. Assim como Olorun em uma cultura é Zambi, na Umbanda a gente entende que Olorun é
Zambi, é Tupã, é Deus. Deus em cada cultura assume um nome.
Da mesma forma nós poderíamos dizer que, por exemplo, OXUM é a nossa Afrodite. Oxum é a
divindade do amor na cultura Nagô e na Umbanda, assim como é Afrodite na cultura Grega, Vênus na
cultura Romana, Lakshmi na cultura Hindu, assim como faz a presença do amor na sua forma feminina
por meio de Nossa Senhora da Conceição, em todas as culturas a gente vai encontrar uma divindade
feminina do amor que pra nós é Oxum.
Se Deus é o mesmo Deus que assume vários nomes, então as divindades também são
divindades que podem se manifestar com nomes formas diferentes, em diferentes culturas.
Com esse entendimento, o negro criou o um sincretismo entre santos e orixás, ele reconheceu
que Jesus Cristo e Oxalá tem as mesmas qualidades, ali então estabeleceu um sincretismo. Por meio
da imagem de Cristo o negro cultuava Oxalá, São Jerônimo ele cultua Xangô. No Candomblé a imagem
de São Jorge se cultua Oxossi e de São Sebastião se cultua Ogum...ao contrário da Umbanda onde
São Jorge é Ogum e São Sebastião é Oxossi.

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Cosme e Damião é Ibeji, Santa Barbara é Iansã, São Lázaro Obaluaye, São Roque Omulu e
assim foi nascendo um sincretismo que a principio, foi criado para mascarar o culto de Orixá. Diz a
lenda que o negro pegava um Otá (quer dizer pedra), fazia um assentamento do Orixá nesse Otá e
escondia a pedra do orixá dentro da imagem do santo. E a partir daí começou então a manifestação de
um sincretismo num culto de orixá no Candomblé baiano.
Os orixás quando incorporam no Candomblé são para trazer axé que significa “poder de
realização”
Então o orixá traz o poder de realização para a sua vida e isso é importante porque o orixá
também traz axé na Umbanda mas de uma forma diferente....(como ?)
No culto de nação há o sacrifício animal (sagrado ofício), isso não é uma pura e simples
matança animal. Precisamos olhar o sacrifício animal com olhos de respeito num âmbito sagrado.
Porque a todos nós que vestimos jaqueta de couro, sapato de couro, comemos carne, feijoada, temos
que pensar bem antes de criticar um sacrifício animal.
No culto de nação o sacrifício animal é realizado principalmente para fazer a comunhão entre o
adepto e a sua divindade, por exemplo, quando há uma festa de Ogum será feito uma feijoada e para
isso há necessidade de um porco. A única diferença é que no Candomblé, você não aceitaria qualquer
porco, você teria um porco criado, feito para Ogum e no dia da festa esse porco seria sacrificado em
nome de Ogum de preferência com menos sofrimento possível, num corte rápido dentro da ritualística.
A carne desse porco vai alimentar a comunidade e apenas as partes que não se come são oferecidas
para Ogum porque quando a comunidade comer estará em comunhão com Ogum.
E do sangue do animal sai uma energia animal que é um axé...e esse axé é levado para a coroa
do filho e para o assentamento que ele está realizando, seu assentamento de forças.
Isso tudo faz parte do Candomblé, não é da Umbanda, é importante que se saiba. Essa
diferença é tão radical entre a Umbanda e o Candomblé quanto a diferença entre judaísmo e
cristianismo. No judaísmo há sacrifício animal, esta escrito na Bíblia - no Velho Testamento.
Inclusive, Deus dá uma ordem a Abraão para sacrificar o seu próprio filho, Abraão leva o filho e
no momento em que ele vai sacrificá-lo aparece um Anjo do Senhor e diz que estava testando a sua fé,
pede para que coloque o seu filho de lado e sacrifique um animal. Então há sacrifício animal na cultura
judaica, no Islã, no Hinduísmo e no Candomblé.
A idéia do sacrifício animal no Candomblé é muito próxima do judaísmo e daquilo que você pode
ler na Bíblia. A Umbanda justamente (olha só esta afirmação que estou fazendo, a seriedade dessas
informações, a minha responsabilidade com todas as informações que estou passando) a
caracterização da Umbanda como religião brasileira que é toda cantada e musicada em português,
diferente do Candomblé. O Candomblé baiano é todo cantado e musicado em Yorubá, tem o sacrifício
animal. A Umbanda é uma religião brasileira e muito cristã.
No alto de nosso altar, em 99% dos terreiros, há uma imagem de Cristo com os braços abertos.
Na Umbanda a imagem de Cristo não é apenas para representar Oxalá, mascarar o culto de Oxalá -
como diria o caboclo que trabalha nesta casa comigo, Cristo no altar não é enfeite.
Nós rezamos para Oxalá e também para Cristo pelo fato da Umbanda ser uma religião muito
Cristã. Então é por isso que não há sacrifício animal nem cobrança pecuniária pelos trabalhos.

Digitação: Danaíra S. M.
Aluna do Curso de Teologia de Umbanda Sagrada

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