Há uma grande discussão acerca da origem do Tribunal do Júri. Alguns historiadores indicam que tal instituição teria se originado na época das leis mosaicas. Outros apresentam que o nascimento de tal órgão se deu no berço da Antiguidade Clássica, ou seja, nas civilizações grega e romana. Contudo, a teoria mais embasada em fatos históricos e a que apresenta a definição de Tribunal do Júri mais aproximado com ideia que se tem nos dias atuais é de que este teria surgido na Inglaterra, na época do Concílio de Latrão, sendo esta corrente a mais aceita pela doutrina. O Tribunal do Júri foi instituído em nosso ordenamento jurídico pela Lei de 18 de junho de 1822, sendo sua competência limitada a julgar os crimes de imprensa, sendo o mesmo formado por 24 Juízes de Fato. O Tribunal do Júri passou a integrar, como órgão, o Poder Judiciário a partir da Constituição de 1824, na qual a sua competência para julgamento foi ampliada, passando a abranger as causas cíveis e criminais. Já em 1842, a atuação do órgão foi restringida. A Constituição Federal de 1988 reconhece a instituição do Júri (expressa nos arts. 406 a 497 do CPP). Atualmente, a composição do Tribunal do Júri é totalmente diferente daquela instituída no século XIX, o que também ocorre com sua competência. Para fins de julgamento, o Tribunal é composto pelo Juiz-Presidente, que conduzirá e direcionará o procedimento, e pelo Conselho de Sentença, que é integrado por sete jurados leigos escolhidas através de sorteio em procedimento regulamentado em lei. 2. Princípios norteadores De acordo com o artigo 5º, inciso 38 da Constituição, são assegurados ao Tribunal do Júri a plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos vereditos e a competência para julgar os crimes dolosos contra a vida, sendo estes considerados os princípios basilares. Nos processos de júri vigora a plenitude da defesa, sendo assim não apenas a defesa técnica pode ser produzida que é a relativa aos aspectos jurídicos do fato. Dado ao fato de que são leigos os juízes, permite-se a utilização de argumentação não jurídica, com referências a questões sociológicas, religiosas, morais, etc. Ou seja, argumentos que, normalmente, não seriam considerados fosse o julgamento proferido por um juiz togado. Esse é um dos pontos positivos salientados pelos defensores da instituição, pois o Júri propicia um julgamento que vai além da frieza da lei, na medida em que os jurados julgam conforme suas consciências. Pontes de Miranda, inclusive, inclui o fato dos jurados serem tirados de todas as classes sociais conferir um tom democrático ao julgamento. Em relação ao sigilo das votações, temos que embora seja pública a audiência, o sigilo envolve tanto o voto quanto o local onde a votação acontece. A Constituição assegura o sigilo das votações para preservar os jurados de qualquer tipo de influência ou, depois do julgamento, de eventuais represálias. Por isso mesmo a jurisprudência repeliu a ideia de eliminação da sala secreta, assim entendida necessária por alguns juízes. Por esse motivo se mais de três jurados responderem negativamente à materialidade do fato e à autoria ou participação, a votação estará automaticamente encerrada, no sentido da absolvição do réu, sem que seja necessário se proceder à colheita dos demais votos, uma vez que se o resultado fosse 7x0 nesse sentido, não haveria sigilo. Pela soberania dos vereditos, o julgamento não pode ser alterado nem pelo juiz togado nem pelo tribunal que venha a apreciar um possível recurso. Sendo assim, em caso de julgamento que seja contrário à prova dos autos, a apelação provida terá o condão de cassar o julgamento e mandar o acusado a um novo júri. Mesmo nesse caso, o tribunal não modifica o julgamento para condenar ou absolver o acusado, ou mesmo para suprimir ou acrescer qualificadora. Alguns sustentam a inconstitucionalidade desse ato, uma vez que se o júri é soberano, não podendo um tribunal superior, composto por juízes togados, anular o julgamento para que outro seja proferido. Não é esse o entendimento que prevalece na doutrina e na jurisprudência. Seria inconcebível que uma decisão, contrária da prova do processo, não pudesse ser revista através de recurso, inclusive calcado no princípio do duplo grau de jurisdição. No segundo julgamento, qualquer que seja o resultado, a decisão será definitiva, ante a impossibilidade de nova apelação sob o mesmo fundamento legal. O Tribunal do Júri possui competência para processar e julgar os crimes dolosos contra a vida, tendo seu conteúdo mínimo definido na Constituição, em cláusula pétrea nos direitos fundamentais, nada impedindo que o legislador infraconstitucional amplie tal competência para outros delitos, o que não acontece hoje, (inclusive houve um tempo em que crimes de imprensa e crimes contra a economia popular eram julgados pelo Júri). Quando a CF se refere a crimes dolosos contra a vida, inclui os delitos consumados e os tentados, o homicídio (simples, privilegiado ou qualificado), o induzimento, instigação e auxílio ao suicídio, o infanticídio e o aborto, em suas diversas formas. Havendo conexão entre um delito contra a vida e outro crime de natureza diversa (por exemplo, homicídio doloso e ocultação de cadáver), ambos serão atraídos pelo Júri, mesmo que a infração conexa seja de menor potencial ofensivo, para fins de unidade de processo e de julgamento. Isso também acontece na continência – quando duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração. Se o dolo do agente não foi de atentar contra a vida, como ocorre no latrocínio, estupro seguido de morte, homicídio preterdoloso, etc., a competência para o julgamento será do Juiz singular. Tivemos alguns debates acerca alguns crimes para saber se eles serão julgados ou não pelo Tribunal do Júri. O Genocídio, por exemplo, definido como matar “com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso”. Para configuração do delito, não é exigido o ato de matar, prevendo-se outras figuras típicas, como a “transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo”. O STJ entendeu que a competência para o genocídio é do juiz singular, não do tribunal do júri a não ser, claro, que haja concurso formal entre o genocídio e o homicídio, sendo assim a competência do júri (entendimento do STF). Duas outras hipóteses de crimes, cujo julgamento era competência do Tribunal do Júri e não são mais são os Crimes contra a economia popular, com o advento do Decreto-lei 2 de 66, e a Lei de Imprensa de 67, que tratava, na verdade, de um escabinato, já que o juiz togado e os leigos votavam em conjunto. Há ainda algumas exceções ainda sobre a competência, como a que se verifica nas hipóteses de foro privilegiado. Se a Presidenta da República pratica um homicídio doloso, ela não será julgada pelo júri, mas pelo STF. Ou se for um governador de estado, o processo será julgado pelo STJ. 3. Características do Tribunal do Júri O Tribunal do Júri se caracteriza por ser um órgão horizontal, temporário e heterogêneo. Denomina-se como horizontal, pois não se tem hierarquia entre o juiz presidente e os jurados, uma vez que estes possuem funções diversas e a convergência entre eles gera a harmonia do tribunal. É temporário porque funciona em alguns períodos do ano. Em decorrência da grande quantidade de crimes dolosos contra a vida, é comum que o tribunal, principalmente nas capitais dos Estados, funcione durante todos os meses do ano. Quem define isso é a lei de organização judiciária de cada Estado-membro. Por ser composto por juiz de direito e por juízes de fatos, é tido como órgão heterogêneo, sendo formado por um juiz-presidente e por vinte e cinco jurados, dos quais sete compõem o Conselho de Sentença. Em relação às decisões dos julgamentos, estas ocorrem por maioria dos votos, ou seja, não é necessário que haja a unanimidade na votação. Portanto, quatro votos no mesmo sentido já são suficientes para que haja a majoritariedade na votação de cada questão.