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Revista Brasileira de Ciências Sociais

ISSN: 0102-6909
anpocs@anpocs.org.br
Associação Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Ciências Sociais
Brasil

Waterloo Radomsky, Guilherme Francisco


Desenvolvimento, pós-estruturalismo e pós-desenvolvimento: a crítica da modernidade e a
emergência de "modernidades" alternativas
Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 26, núm. 75, febrero, 2011, pp. 149-162
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais
São Paulo, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=10719119009

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Desenvolvimento, pós-estruturalismo
e pós-desenvolvimento
A crítica da modernidade e a emergência de
“modernidades” alternativas

Guilherme Francisco Waterloo Radomsky

Com uma história de mais de meio século de se consolidou a partir da centralidade do Estado na
políticas, programas, debates acadêmicos e teóricos condução das economias e de programas de desen-
acalorados, o tema do desenvolvimento perpetua- volvimento integrados e se nutriu da oposição, pas-
-se insistentemente nas ciências sociais. A “década sível de ser vencida (pelo menos como princípio de
perdida” e a efetivação de princípios de governo ne- esperança), entre países desenvolvidos e subdesen-
oliberais pareciam prometer soterrar um tópico que volvidos desde o famoso discurso de Harry Truman
em 1949.
No entanto, com todas as vicissitudes e os
* Este artigo é um dos resultados do estágio como Rese-
arch Scholar na University of North Carolina at Chapel desgastes, a ideia de desenvolvimento (e todos os
Hill (2009-2010). Sou grato a Arturo Escobar por pro- derivados que geralmente aparecem ligados ao ter-
porcionar-me condições de trabalho e estudo e a Walter mo “desenvolvido”: sub, semi, pós) não perde força
Mignolo pela oportunidade de participar do seminário
“Education, Development, Freedom” na Duke Uni- imaginativa e poder conceitual, mesmo em meio à
versity. As discussões com Ondina Leal, Javier Pabón, ruína que um olhar crítico poderia depurar. Artifí-
Adriana Paredes e Rodrigo Medeiros enriqueceram o cio ideológico, implicação de um poder discursivo
texto. Agradeço também às contribuições dos pareceris-
tas anônimos da RBCS e ao CNPq pela concessão dos ou esperança de superação de problemas como a
recursos financeiros. Todas as incoerências e incorreções pobreza e a desigualdade, deve-se destacar sua re-
deste artigo são responsabilidade do autor. siliência diante das tentativas de desconstrução.
Mesmo assim, parece ter se tornado chave a sus-
Artigo recebido em maio/2010 peita de que a discussão sobre o desenvolvimento
Aprovado em fevereiro/2011 nas ciências sociais e no campo das políticas pú-
RBCS Vol. 26 n° 75 fevereiro/2011
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blicas (com a intervenção de agências e entidades Menos discutidos pela ciência social brasileira, en-
nacionais e internacionais) resiste não por colocar tretanto, são os pontos de vista elaborados pela an-
em pauta um assunto inquestionável, um bem co- tropologia do desenvolvimento e pelas perspectivas
mum cuja finalidade seria indubitável; tampouco pós-estruturalista e pós-colonial sobre o assunto,
sustenta-se por ser um recurso de poder que subjaz quando nos anos de 1990, o diálogo crítico permi-
nas “entrelinhas” do processo e que se esconde na tiu o aparecimento da perspectiva denominada de
medida em que é um artifício para manutenção de pós-desenvolvimento. Enquanto a primeira, duran-
status quo. Ambas são verdades (parciais, talvez) e, te longo tempo, dedicou-se a facilitar ou auxiliar
portanto, a elas escapam desejos e seduções que o as transformações desejadas pelos developers (ainda
“campo do desenvolvimento” (Ribeiro, 2005) pro- que se complexificou com o tempo e seus porta-
duz e alimenta para seu funcionamento. -vozes têm repensado esse papel), as perspectivas
Novos enfoques procuram recuperar a energia pós-estruturalista e pós-colonial nascem com obje-
perdida do campo, após testemunharem a falácia tivo inverso. É verdade que o pós-estruturalismo e
de programas de investigação e de receituários que o debate pós-colonial já faz parte do manancial teó-
tiveram êxito temporário nos anos de 1960 e 1970, rico das ciências sociais no Brasil desde longa data,
amparando-se nas noções de modernização social no entanto uma parte colossal dessa literatura em
e crescimento econômico. Rompendo com velhos âmbito internacional se dedica ao escrutínio crítico
paradigmas, a ânsia do desenvolvimento desenha do desenvolvimento e tem encontrado menores res-
agora caminhos plurais e heterogêneos com dife- sonâncias em nossas fronteiras.
rentes matizes. No Brasil, é quase lugar comum en- Neste texto, examino parte da trajetória que
tre especialistas a obra de Amartya Sen, que quase inicia com a crença primordial na eficácia das trans-
adquire um véu aurático e de ponto de mutação formações sociais planejadas – concedendo parti-
sobre o tema renovando a esperança redentora do cular espaço aos escritos antropológicos sobre o as-
desenvolvimento – agora “como liberdade”. Além sunto, mas não restrito a eles – e encontra ponto de
deste, são especialmente incorporados ao debate a tensão na crítica do desenvolvimento como narra-
perspectiva sobre capital social, a crítica do desen- tiva e prática de poder. O ponto fundamental será
volvimento igualado a crescimento (propagado pela mostrar os argumentos principais que confluem
noção de desenvolvimento sustentável) e os novos para a perspectiva (bastante diversa, é verdade) do
olhares sobre as instituições como centrais para a pós-desenvolvimento e, consequentemente, críticas
mudança social. posteriores que este recebeu por parte dos defen-
Como tal, o Estado não tem mais o protago- sores do desenvolvimento. Este panorama culmina
nismo; no entanto ele não desaparece do cenário, em recuperar a defesa impetrada pelos autores liga-
tal qual a proposta novo-desenvolvimentista com dos ao pós-desenvolvimento e, desse modo, avançar
matizes que ora enfatizam sua maior participação, para dois argumentos contraditórios e relacionados.
ora evocam a importância do mercado (global) De um lado, a desconstrução do desenvolvimento
para consecução de objetivos nacionais primordiais adquire força ao descentrar o viés eurocêntrico sob
(Bresser-Pereira, 2006). Noutro ponto, sem descar- o qual está erigida a teoria social, o que introduz
tar que a presença estatal é matricial, fórmulas de uma geopolítica da epistemologia e uma virada
articulação descentralizada avaliam positivamente a político-interpretativa para as contribuições que se
emergência de atores sociais locais, tornando rele- orientam pela noção geral de descolonização. De
vantes os processos territoriais de desenvolvimento outro, como a contra-crítica ao pós-desenvolvi-
(Abramovay, 2003; Schneider, 2004). mento sugere, ao problematizar o lugar da enuncia-
Comum a este debate é a arquitetura que re- ção e ao interpretar o desenvolvimento como uma
veste de tempos em tempos o desenvolvimento máquina, a perspectiva parece não encontrar ecos
com novos adjetivos e que se propõe a revitalizar no mesmo momento que nega a sedução das nar-
sua importância, tanto na academia como nas re- rativas, a agência efetiva dos que vivem as políticas
lações entre organizações da sociedade e o Estado. e os programas, e os desejos articulados a ambos.
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Antropologia, desenvolvimento no uso dos fatores. O autor, ao final, numa formu-


e pós-estruturalismo lação que pareceria nefasta hoje até mesmo para os
eloquentes defensores da ajuda externa, pontua que
Enquanto o final da década de 1960 testemu- os antropólogos precisam entender as necessidades
nhava uma rediscussão do problema da moderniza- dos governos e das agências (e nada declara a res-
ção na sociologia e na ciência política, outros dilemas peito das populações que sofrem mudanças).
cercavam o campo da antropologia. Alguns autores Nas nações ditas desenvolvidas, este era um
atribuem as origens de “uma possível” antropologia clima em que posicionava antropólogos em meio
do desenvolvimento (Schröder, 1997) aos projetos à discussão sobre seu papel a favor de mudanças
coloniais e ao ramo da antropologia aplicada, sempre sociais, sem uma atenção maior sobre quais mu-
muito contestada em países como os Estados Unidos danças e se elas seriam benéficas. Parte dos anos de
e já em atividade desde os anos de 1930 (Gardner e 1980 foi marcada por essa perspectiva, que lenta-
Lewis, 1996). Um das questões cruciais era o cará- mente era minada por dentro e por fora (Grillo,
ter ainda colonial da própria disciplina que estaria a 1985).1 Informar o debate, formar opinião pública,
serviço dos governos imperiais (ou das ex-colônias), interpretar as culturas para outsiders e auxiliar for-
cuja eficiência era dada pelo sucesso como tipo de muladores de políticas bastavam como horizonte
conhecimento específico para resoluções de proble- possível em prol do desenvolvimento conduzido
mas culturais locais (tribais ou com camponeses). por Estados com ajuda internacional, respeitando
Desse sucesso dependia o auxílio de agências inter- a máxima do ex-presidente dos Estados Unidos,
nacionais que financiavam projetos. A valorização Harry Truman, de que os países desenvolvidos de-
recaía no trabalho de “lubrificação”, em que antro- veriam “ajudar os outros [países] a se ajudarem”
pólogos atuavam como brokers para verificação in (Rist, 2008, p. 134).
loco das possibilidades de auxílio externo, sempre Outra questão que marcou a antropologia apli-
persuasiva para elites locais, bem como no acompa- cada das décadas de 1970 e 1970 foi a existência
nhamento dos projetos implantados. de povos tradicionais no interior dos territórios de
Trabalho amplamente conhecido na literatura nações consideradas desenvolvidas, ou mesmo nas
sobre antropologia e desenvolvimento, a publica- periféricas, em que setores modernos também apa-
ção de Cochrane (1971) é o ápice de uma ideologia reciam. Nesse último caso, em que Brasil, Peru,
pró-desenvolvimento em que a prescrição é enten- México e outros países latino-americanos são exem-
dida não apenas salutar, mas indispensável. Dife- plos, o debate obedeceu aos critérios de tentativa
rente do debate entre economistas e sociólogos – de uma interpretação nacional em que a antro-
que se debruçavam sobre problemas de estrutura pologia participava com as outras ciências sociais.
agrária, classes operárias e modelos de distribuição No Brasil, a dicotomia entre setores “atrasados” e
de riqueza –, a antropologia precisava enfrentar “modernos”, cujo conflito interpretativo procu-
uma suposta alteridade radical, na medida em que rava entender o lugar e a relação entre ambos (na
o “outro” vinha a ser o alvo da política de transfor- famosa polêmica entre Ignácio Rangel e Francisco
mação. Pela importância na época, chama a aten- de Oliveira), encontrava eco nas análises de povos
ção que o trabalho de Cochrane pouco discuta o indígenas pouco integrados à sociedade nacional.
que é desenvolvimento, ou seja, ele o toma como Nesse hiato, emerge uma antropologia preocupada
dado e de uma forma descritiva em que processos com o desenvolvimento sem perder de vista o cará-
de transformação comportamental são elementares. ter particularista, especialmente em nações em que
A mudança não seria senão induzida externamen- serviços de proteção ao índio existiam. Neste caso,
te e com base nos moldes elaborados por agências é sintomático que a noção de etnodesenvolvimen-
de desenvolvimento, cujos modelos de moderniza- to, entendida como dimensão esquecida durante
ção eram amparados em aspectos como aumento muito tempo, demarque um repensar do desenvol-
da produção, eficiência econômica, crescimento da vimento quando pluralidade cultural é antes um
produtividade de setores agrícolas e racionalidade desafio do que um problema.2
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Este clima propiciou reflexões diversas. Minha de Roma intitulado Limites do Crescimento – foi
impressão é de que a discussão no âmbito da an- a construção de uma alternativa em torno de um
tropologia (com a sua contestação interna e exter- lema: o desenvolvimento sustentável.3
na como “disciplina do saber colonial”, conforme Em meados dos anos de 1980, a crítica ao
Asad, 1973) favoreceu o aparecimento de propo- desenvolvimento começa a se tornar mais forte
sições críticas radicais ao desenvolvimento. Nela, no interior da antropologia. Dahl e Hjort (1984)
comparada às outras ciências sociais, a interpreta- apresentam o problema de a “development anthro-
ção privilegiou o desenvolvimento enquanto equa- pology” ter focado insistentemente na organização
cionado a representações, prescrições, mensagens técnica da ajuda internacional (como se a própria
e significados (Hobart, 1993; Corbridge, 1994). discussão do que é desenvolvimento fosse secundá-
No entanto, é preciso relativizar esta afirmação. ria) e aparece a ideia de uma ideologia do desen-
As condições para tal processo tiveram efeito real volvimento na sua mensagem e sua exportação. No
na recepção de Foucault, na emergência do pós- entanto, é entre 1985 e 1987 que emergem dois
-colonialismo (sendo central o trabalho de Said trabalhos cujos ímpetos se direcionam claramente
(1978) sobre o orientalismo) e na desconstrução à desconstrução do desenvolvimento. Resultados
pós-moderna. Nesse sentido, foi essencial para a de duas teses de doutorado e transformadas em li-
antropologia uma atmosfera favorável para absor- vros alguns anos depois, Ferguson (1990) e Esco-
ção desses prismas, mas não se pode afirmar que a bar (1995) não procuram um balanço reflexivo que
antropologia orientada pró-desenvolvimento tenha permita a refundação dos seus resíduos positivos,
perdido seu espaço; ao contrário, o número de pro- mas a implosão da sua narrativa subjacente. Cabe
fissionais em cargos do Banco Mundial e agências ressaltar: ambos os autores valem-se da perspectiva
aumenta. Por outro lado, autores como Gustavo de Michel Foucault sobre governamentalidade e se
Esteva e Gilbert Rist, mais vinculados às ciências concentram na armadura que formou o dispositivo
econômicas e aos development studies, e igualmente do desenvolvimento.
Vandana Shiva e Majid Rahnema forneceram ou- Detenho-me nestes dois autores por um mo-
tras ligações importantes para o questionamento mento. Ferguson (1990) toma como objeto a aná-
dos modelos de desenvolvimento planejado. Para- lise de um grandioso projeto de desenvolvimen-
lelamente, uma quantidade de trabalhos de grande to rural no Lesoto e se volta para o dispositivo
fecundidade apareceu na chance de uma reciclagem que permitiu sua operação. Em termos teóricos,
do tema para que se enfrentassem desafios não re- duas visões disputavam hegemonia, até então: a
solvidos pelas políticas anteriores e ofuscados por modernização e o neomarxismo dependentista.
teorias obtusas. Na primeira, o dispositivo de desenvolvimento é
Pode-se mencionar, entretanto, que o proble- positivo e essencial para o planejador poder “me-
ma ambiental exerceu um efeito espetacular ao lhorar” a situação-alvo; na segunda, de caráter crí-
tentar impedir novas possibilidades de se reinven- tico, mostram-se as lacunas e aquilo que o desen-
tar o tópico. Embora mais significativo em inte- volvimento deixa de fazer. Por sua vez, Ferguson
lectuais isolados ou movimentos sociais, é preciso empenha-se a mostrar, com fracassos e sucessos
pontuar que mesmo nos setores acadêmicos essa (totais ou parciais), o que o desenvolvimento faz.
perspectiva teve efeitos, inclusive nas propostas de Em última instância, ele funciona como uma má-
crescimento zero, slow down consumption e outras quina antipolítica:
(Veiga, 2006). Em todo o caso, excetuando-se as
propostas mais agressivas em prol da recuperação [...] resultados que, a princípio, parecem como
de áreas degradadas e da defesa fervorosa da natu- meros “efeitos colaterais” de uma tentativa
reza (supostamente) intocada, o que de fato per- malsucedida para engendrar uma transforma-
durou como tema acadêmico desde a Conferência ção econômica tornam legíveis outras pers-
das Nações Unidas sobre o Meio-ambiente Hu- pectivas como não intencionadas, ainda que
mano em 1972 – e o famoso relatório do Clube instrumentais, elementos em uma constelação
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resultante que tem o efeito de expandir o exer- ços para reparação do desenvolvimento, a necessi-
cício de um tipo particular de poder do Estado dade é uma superação do modelo como um todo:
enquanto simultaneamente exerce um efeito
despolitizante poderoso. E esta constelação O desenvolvimento foi – e continua a ser em
resultante “sem autor” eu chamo de máquina grande parte – uma abordagem de cima para
antipolítica [...] (Ferguson, 1990, pp. 20-21).4 baixo, etnocêntrica e tecnocrática que trata as
pessoas e culturas como conceitos abstratos,
A máquina antipolítica age de modo acrítico. estatísticas que podem ser movimentadas para
Para poder implementar projetos de desenvolvi- cima e a para baixo em gráficos de progresso
mento num espaço qualquer, o aparelho estatal, (Escobar, 1995, p. 44).
os organismos e as agências multilaterais precisam
“acomodar-se” aos problemas de desigualdade so- O ponto de vista de Escobar salienta que a
cial e conflitos locais, no mais das vezes sem tocá- violência não é um efeito do descaso, do acesso
-los; caso contrário, não haverá alianças locais a fim desigual a políticas e dos efeitos prometidos e não
de torná-los praticáveis. Ademais, o que se processa cumpridos dos programas. Ele é o resultado pró-
em organismos e agências propositoras de projetos prio do dispositivo como um todo, ao movimen-
é tributário de um diagnóstico que olha a realida- tar, planejar, quantificar a vida das pessoas. Para
de social a partir da ideia de “falta”, de algo a ser tal efeito se cumprir, a visualização é basilar, fato
corrigido ou imputado e que o desenvolvimento, característico da modernidade; assim o regime ob-
na forma de programa integrado com racionalidade jetificador é a luz necessária para o dispositivo ve-
própria, será o responsável pela efetuação. rificar e controlar (Idem, p. 155). Essa economia
Esta última dimensão é mais enfaticamente só faz sentido quando a máquina é tão poderosa e
escrutinada por Arturo Escobar. No seu Encoute- o desenvolvimento, menos que um conjunto dis-
ring development, o autor faz um estudo sistemáti- cursivo e prático suplementar ao panorama moder-
co e global sobre a “era do desenvolvimento”: sua no, transfigura-se num modo de entendimento da
invenção, a infantilização do “terceiro mundo” e o modernidade ocidental a respeito do mundo, uma
esquema de poder em cascata que partia de uma espécie de lente pela qual a realidade é observada,
preocupação/interesse dos países desenvolvidos, medida e escalonada (Escobar, 1995, 2000); ou, na
passava por agências e organismos internacionais versão mais recente de Ferguson (1999), um mito
e chegava à importação e implementação por Es- que organiza a interpretação das pessoas sobre a
tados “subdesenvolvidos” e seus níveis de ação re- história (linear e progressiva).
gionais e locais. Embora o livro examine planos de De modo que entre as publicações de Ferguson
desenvolvimento levados a cabo na Colômbia, sua (1990) e Escobar (1995) (cujos primeiros trabalhos
vasta pesquisa bibliográfica e a articulação do caso aparecem ainda nos anos de 1980), e no período
colombiano com programas do Banco Mundial subsequente, um fluxo de artigos e livros orientados
mostram que o problema atingiu países da Ásia pelo pós-estruturalismo, pelo debate pós-moderno
à América passando pelas ilhas do pacífico e pelo e pela perspectiva pós-colonial torna-se vigoroso
continente africano. em direção a um momento histórico, desejado por
Escobar sustenta que o desenvolvimento, mes- seus autores, que possa estar livre dos incômodos
mo falhando, produz coisas, ideários, disciplinas; a do desenvolvimento. Os mais conhecidos são a co-
isso ele denomina de efeito de instrumento. Formas letânea organizada por Sachs (1992), os trabalhos
de conhecimento local e modelos de compreensão de Gustavo Esteva (1992), a edição organizada por
da natureza são sacrificados em favor de um modo Rahnema e Bawtree (1997) e o primoroso livro de
racional de governo com a constituição de pro- Rist (2008). O ápice deste debate é o que fornece
gramas de alavancagem econômica, supostamente o título da conclusão do livro de Escobar – noção
geradores de bem-estar a populações entendidas que também se tornou ponto de encontro entre
como pobres. Portanto, para Escobar não há espa- muitos desses autores antes mencionados – e se sin-
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tetiza na possibilidade de “imaginar uma era pós- (Idem, p. 24). O ponto de partida do autor não pos-
-desenvolvimento”. sui, ao final, uma superação conceitual em direção a
uma apreensão mais elaborada; ao desenvolvimento
é preferível dizer adeus, não ressucitá-lo.
Pós-desenvolvimento: noções, Rist mostra que a série de práticas em torno do
respostas e réplicas desenvolvimento foi ganhando, ao longo das déca-
das, reformulações e críticas internas que, pouco a
O pós-desenvolvimento dificilmente poderia pouco, se tornaram o próprio reconhecimento do
ser considerado um programa unitário e homogê- insucesso das teorias, dos programas e das políticas.
neo de pensamento. Como movimento intelectual, A conferência de Bandung, os esforços de moder-
o que aproxima autores é a crítica (variada) do mo- nização, a crítica marxista e cepalina e as visões de
delo de desenvolvimento planejado que efetivou multidimensionalidade do desenvolvimento (IDH
transformações sociais radicais desde meados do formulado no âmbito do PNUD); o modelo da
século XX. Mais que um projeto comum, cone- “autoconfiança” advogado por líderes de países do
xões parciais aparecem entre os propositores e, por Sul Global, a ideia da necessidade de um “outro de-
razões de espaço, concentro-me, nesta parte, em senvolvimento”, a conversão para formas sustentá-
apenas duas contribuições que penso serem bási- veis e a abordagem das necessidades básicas; a South
cas para o entendimento da proposta, a de Gilbert Comission, as metas do milênio e a perda da eficácia
Rist e a de Arturo Escobar.5 Com isso, será possível do discurso do desenvolvimento para um foco na
privilegiar as respostas contrárias ao pós-desenvol- redução da pobreza, todos apenas comprovam que
vimento e as réplicas. o insucesso é parte deste motor. Programa após pro-
A sutileza da análise de Rist suaviza o arcabou- grama, reformulação e replanejamento, o discurso
ço “excessivamente foucaultiano” em direção a uma do desenvolvimento não se movimenta, ele apenas
crítica histórica que mostra, fracasso após fracasso, troca de figurino para obter nova energia que logo
a ruína do desenvolvimento nas iniciativas e expres- fracassa novamente. Portanto, diferentemente de
sões de seus próprios porta-vozes. Contudo, o que é Escobar, a análise histórica de Rist conclui com o
desenvolvimento, afinal? Esquivei de qualquer defi- “paradigma do desenvolvimento” tropeçando nos
nição até o momento propositadamente para recu- seus próprios pés.
perar o que Rist considera como ponto de partida Já Escobar parte de concepção ligeiramente
no entendimento: distinta. Nos trabalhos recentes, embora não se
afaste totalmente da concepção anterior – a notar
“Desenvolvimento” consiste de um conjunto pela marcante observação de que “o pacífico [co-
de práticas, às vezes aparecendo em conflito lombiano] foi construído [...] como uma entidade
uma com outra, que requer – para a reprodu- ‘developmentalizable’” (Escobar, 2008, p. 159) – a
ção da sociedade – a transformação geral e a reflexão sobre o desenvolvimento se alinha mais
destruição do ambiente natural e das relações claramente à crítica da modernidade. Porém, aqui
sociais. Seu objetivo é aumentar a produção há uma ambiguidade. Enquanto a visão crítica da
de mercadorias (bens e serviços) direcionadas, modernidade é almejada, ela não descarta certa
pelo mecanismo da troca, para demanda efeti- afinidade com projetos menos radicais que ainda
va (Rist, 2008, p. 13). possam ser transformadores. Escobar passa a vis-
lumbrar o diálogo construtivo com um tipo de
Esta definição é fundamental para o autor mos- perspectiva que ainda se alimenta das possibilida-
trar que o desenvolvimento, funcionando ancora- des de o desenvolvimento ser reconfigurado, que
do no mito do progresso e na concepção linear de é o caso das propostas de Anthony Bebbington,
história para o pensamento ocidental, se constitui Norman Long e Alberto Arce. Para estes autores,
como a “crença numa série de práticas que formam não apenas se transmutam as formas pelas quais
uma unidade apesar das contradições entre elas” o desenvolvimento é formulado e implementado
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nos lugares (a própria consideração com as formas pessoas querem, mas não sabem o que é. A crítica
locais de ação, de conhecimento e de revisão dos de Ziai é sutil, pois se intromete no segundo pro-
projetos é essencial), mas também a própria moder- blema a categoria da falsa consciência, expurgada
nidade pode aparecer, pelo menos, em “moderni- pelos pesquisadores que se desvencilhavam de dile-
dades” alternativas. Por outro lado, Escobar (Idem, mas teóricos advindos do marxismo.
pp. 176-196) percebe que, a partir de pesquisa em- A interpretação de Storey (2000) orienta-
pírica com povos indígenas e afrodescendentes na -se para outra direção. Um dos pontos delicados
Colômbia, alternativas surgem de modo heterogê- nas propostas do pós-desenvolvimento reside na
neo: algumas são apenas esquemas territorializados romantização e na confiança excessiva que os in-
de desenvolvimento alternativo (baseados em segu- telectuais depositaram em movimentos sociais,
rança alimentar e bem-estar da população); outras compreendidos como espaços em que relações efe-
ensejam uma postura de oposição aos modelos de tivamente democráticas e antiautoritárias imperam.
intervenção, que Escobar denomina de moderni- O problema, para Storey, é culpar Estados, orga-
dades alternativas; por fim, a radicalidade, de fato, nismos e agências de desenvolvimento, tendo como
existe em uma experiência analisada pelo autor, que cenário de esperança a sociedade civil e os movi-
ele equaliza como a busca por alternativas à moder- mentos como libertadores da máquina autoritária.
nidade. Essa seria a única a escapar das armadilhas Embora Storey e Ziai não sejam céticos e apon-
do discurso que supõe não existir espaço fora da tem a perspicácia de determinadas proposições dos
modernidade (e do discurso do desenvolvimento). autores vinculados ao pós-desenvolvimento, men-
Volto ao assunto adiante. cionam que o “desejo” das pessoas por melhorar a
Como movimento que surgem no ambiente qualidade de vida (independentemente do que se
acadêmico após a onda de trabalhos identificados entenda por isso) poucas vezes aparece como ques-
com o pós-desenvolvimento, um conjunto de au- tão legítima. O pós-desenvolvimento não oferece
tores moveu respostas contundentes. Se a contra- soluções. Isso leva ao problema das capacidades de
posição à narrativa do desenvolvimento objetivou agência e de resistência nos locais em que projetos
pontos nodais, tais como o discurso totalizante, o são conduzidos, dimensões pouco mencionadas. A
hiato que aumentou entre países centrais e peri- avaliação de Pottier (2003) acerca disto é bastante
féricos durante o período desenvolvimentista, as segura: a crítica não percebe que qualquer projeto
consequências ao ambiente e o sistema de poder de desenvolvimento, na prática, é muito mais sujei-
que inventou o terceiro mundo, a perspectiva do to às demandas locais, mesmo que no discurso exis-
pós-desenvolvimento é acusada, por sua vez, de ta, de praxe, um tom monocórdio. Se o desenvolvi-
homogeneizar projetos e políticas de desenvolvi- mento ocorre num conjunto de relações complexas
mento, que, na prática, foram mais diversos e me- que são irremediavelmente situadas, portanto sujei-
nos orquestrados do que se conclui (Storey, 2000; tas à conjuntura e aos atores que conduzem os pla-
Ziai, 2007). nos, qualquer projeto opera em ambiente de poder
Grande inspiração dos autores do pós-desen- e, nesse, formas de negociação se fazem presentes.
volvimento, a arqueologia foucaultiana propõe que Nas réplicas dos autores defensores de uma era
discursos são fragmentados, interrompidos, pos- livre do desenvolvimento planejado, nota-se que o
suem diferenças e descontinuidades. Essa premis- pós-desenvolvimento não resistiu a algumas lúci-
sa foi fracamente articulada em favor de apontar o das respostas. Isso também aparece na antropologia
sistema de poder da narrativa do desenvolvimento, aplicada, que, mesmo trabalhando a “favor do de-
entendida quase como monolítica e coesa (Ziai, senvolvimento” por décadas, tenta reconstituir seu
2007, pp. 112-114). Como efeito, Ziai observa que papel recentemente para uma inserção mais analí-
no pós-desenvolvimento dois vetores transparecem tica, direcionada à abordagem etnográfica dos pro-
com fraqueza. No primeiro, a própria essencializa- jetos e reconhecendo o potencial de certa abertura
ção do desenvolvimento e, no segundo, sua inter- ao pós-estruturalismo e ao pós-desenvolvimento
pretação, pelos seus expoentes, como algo que as (Mosse e Lewis, 2006). No entanto, o “diálogo”
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entre defensores e críticos do desenvolvimento ênfase pós-estruturalista no discurso monolítico do


acabou por esclarecer mal-entendidos e, por seu desenvolvimento. Decididamente, Escobar sugere
turno, criou novas diferenças e soluções. Primeiro, que não, haja vista que para operar de modo eficaz
tanto para Rist como para Escobar, o que unifica e poderoso, o discurso/prática do desenvolvimento
a perspectiva não é o exame específico de atitudes necessitou de grande coerência, mesmo na maior
tomadas ou programas particulares de desenvolvi- multiplicidade de situações e casos empíricos em
mento – como parece se aproximar o estudo de Fer- que se atualizou.
guson (1990). Antes, a crítica se dirige à fé e à ideo­
logia, “um modelo explanatório ou uma formação Pós-desenvolvimento e a
discursiva que forma certas práticas que tendem em modernidade/colonialidade
direção a uma ‘mercantilização universal’[...]” (Rist,
2008, p. 257). Segundo, se os autores não oferecem Na medida em que o pensamento dos auto-
soluções, Rist insiste na atitude e sublinha que o res do pós-desenvolvimento se consolida, ainda
ponto é justamente este: o desenvolvimento está na que numa atitude entre se defender e aceitar argu-
raiz dos problemas e não deve ser substituído por mentos contrapostos, uma promissora associação
algum programa que clame por validade universal concretiza-se com a revisão crítico-propositiva não
(2008, p. 258). Terceiro, ainda contrarresposta de apenas da modernização via desenvolvimento, mas
Rist, embora o pós-desenvolvimento ter sido fulmi- também da modernidade como tal. Na formulação
nado por alimentar uma visão romântica de povos do pós-desenvolvimento, mostrei que inicialmente
tradicionais e movimentos sociais, o mais impres- o problema situava-se nos discursos e, em alguma
sionante é ver os formuladores do desenvolvimento medida, nas práticas equacionadas por Estados, seja
não tolerarem quando grupos e movimentos sociais por meio da ajuda internacional, seja por organiza-
se afastam dos pilares da modernidade. ções multilaterais e ONGs. Parecia faltar, portanto,
Certa oscilação se faz evidente. O pós-desen- um ponto de vista que conseguisse ser enfático si-
volvimento, parece-me, vê-se diante do fato de multaneamente no sistema de poder que as prescri-
não dar expressão e voz às formas locais e múlti- ções de desenvolvimento efetivam e na constituição
plas de apropriação, inovação e resistência. Ainda da modernidade nas margens da Europa, dando
no seu livro mais conhecido, Escobar afirmava que fecunda visibilidade à agência propositiva que po-
o “impacto das representações do desenvolvimento vos e grupos sociais empreendem como projetos
é profundo no nível local. Nesse nível, conceitos de vida coletiva (local e/ou em rede). É quando se
de desenvolvimento e modernidade são resistidos, acasalam os esforços obtidos do pensamento pós-
hibridizados com formas locais, transformados” -estruturalista com a recepção parcial da reflexão
(1995, p. 51). Todavia, se o impacto é profundo – de autores identificados com o pós-colonialismo
e o ponto nodal dos autores é justamente por sua (Frantz Fanon, Edward Said, Homi Bhabha) e com
violência e eficácia (isto é, por construir coisas) –, os estudos subalternos (Dipesh Chakrabarty, Rana-
como a resistência e a hibridização ocorrem? Esse jit Guha, Gayatri Spivak) para rever criticamente
é o interstício de negociação e poder que cobram postulados da modernidade e equacioná-la com a
Storey (2000), Mosse e Lewis (2006) e especial- colonialidade (Quijano, 2000; Mignolo, 2000).
mente Pottier (2003). Quando me refiro a uma influência parcial
No seu livro mais recente, Escobar (2008, p. dos estudos pós-coloniais e subalternos, sublinho,
348) igualmente aceita algumas das críticas diri- a partir da leitura de Mignolo (2000), que estes
gidas aos trabalhos anteriores, todavia insiste que enfrentam diretamente o colonialismo inglês e en-
o conflito interpretativo entre os pesquisadores se contram no período a partir do século XVIII seu
ajusta às orientações teóricas em questão. Em uma campo de batalha. Dimensão particular é advin-
passagem, que em sua brevidade induz ao leitor da quando o olhar é sobre o colonialismo ibérico.
que respostas e réplicas acerca do assunto atingi- Por essa razão, para expoentes deste pensamento
ram certo esgotamento, indaga se estaria errada a como Aníbal Quijano, Walter Mignolo, Catherine
Desenvolvimento, pós-estruturalismo e pós-desenvolvimento  157

Walsh, Arturo Escobar e outros, também é central taram políticas de desenvolvimento nasceram de
observar que fontes de inspiração propriamente la- um passado longínquo de diferença com violência,
tino-americanas são essenciais na crítica da moder- cujo horizonte jamais suspendeu a subalternidade
nidade/colonialidade, como as obras de José Carlos da relação. Ademais, nas últimas décadas com o
Mariátegui, Darcy Ribeiro e Paulo Freire. advento da globalização o discurso do desenvolvi-
A associação entre o pós-desenvolvimento e a mento adquiriu um formato associado ao caráter
crítica da modernidade/colonialidade vem sendo mundializado das relações de mercado e às formas
formada nos últimos anos em grupos de pesquisa, neoliberais de governo, eventualmente com a subs-
encontros diversos e debatida em periódicos especí- tituição dos programas planejados e centralizados
ficos, bem como a colaboração incessante entre pes- por intervenções em forma de ajustes econômicos
quisadores de instituições diferentes.6 Essa aproxi- estruturais, conforme recente análise de Ferguson
mação, obviamente, é observada numa parcela dos (2006) para a África. Assim, concede-se uma ca-
autores que sentem afinidades entre as duas formu- racterística única ao discurso: de que, além de não
lações, particularmente aqueles devotados a estudar haver espaço para propostas que fujam das tenta-
a América Latina. Destaco, a seguir, somente três tivas de desenvolvimento, independentemente das
pontos de contato entre crítica da modernidade e cores em que se apresente, também não existiria
do desenvolvimento, buscando os nomes principais uma exterioridade à modernidade (Escobar, 2008).
e uma descrição sintética, porém não é objetivo Nesse caso, o que os autores identificados com a
analisar obras ou autores em separado ou fazer a crítica da modernidade/colonialidade se encorajam
exegese de cada conceito, tema que daria pelo me- em tornar visível é justamente o silêncio imposto às
nos outro artigo. alternativas à modernidade e ao desenvolvimento
A primeira premissa basilar é a que associa mo- que são efetuadas por movimentos sociais e comu-
dernidade e colonialidade (Quijano, 2000; Migno- nidades resistentes.
lo, 1995, 2000). Questão inspirada nos trabalhos No Brasil, este debate é razoavelmente co-
de Wallerstein e de Quijano, Mignolo sustenta nhecido, embora pouco associado à discussão do
que uma face não pode ser entendida sem a outra; desenvolvimento. É o caso de Costa (2004), que
isto, basicamente, implode a autointerpretação de repreende a sociologia reflexiva de Giddens e Beck,
uma modernidade saída de matrizes tais como o a argumentando não conseguirem vencer o resíduo
Reforma protestante, o Iluminismo e a Revolução evolucionista da sociologia da modernização. Na
Francesa. Aqui emerge a ideia de exterioridade da suposição dos autores, não mais as estruturas so-
modernidade e da Europa: ambas adquirem outros ciais das sociedades “desenvolvidas” representam
sentidos vistas de seu exterior, portanto o moder- o ponto de chegada, mas a noção de subjetividade
no não pode ser explicado pelo desenvolvimento reflexiva, que se pretende universal. (Pelo menos do
intra-europeu, ele relaciona o colonialismo como prisma do elogio ao empreendimento moderno, a
fundante (especialmente o liderado pelas nações posição de Habermas não seria tão distinta, con-
ibéricas). Assim, conceitos como diferença colo- cluindo que as margens da Europa vivem uma mo-
nial, colonialidade do poder/saber e ferida colonial dernidade que necessita ser completada.)
associam o espetacular desenvolvimento do capita- Autores como Costa (2004, 2006), Carva-
lismo à colonização das Américas (Quijano, 2000, lho (2001) e Maia (2009) concluem ser não ape-
2005), somados ao fato uma construção da dife- nas possível, mas desejável ler a realidade brasilei-
rença como subalterna e hierarquizada, uma inces- ra pelas lentes do pós-colonialismo e da proposta
sante produção da violência sobre formas de vida modernidade/colonialidade/descolonização. En-
não-identificadas com a europeia (Mignolo, 2000, tretanto, essas vozes ainda são raras no ambiente
2005). acadêmico brasileiro. Respeitando as interpretações
Desse modo, o que importa ressaltar é que diversas, outros pesquisadores preferem uma leitura
como resultado de séculos de colonialidade, ob- menos desconstrutiva e sugerem uma modernidade
servam os pesquisadores, as premissas que orien- de algum modo redentora, ainda que ambivalente,
158  REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 26 N° 75

passível de uma reconstrução (Domingues, 2002, se efetivar na insurgência epistêmica, na valorização


2009); ou uma modernidade seletiva na qual se da ancestralidade, na performance das ontologias-
pode entendê-la por conquistas e carências (Sou- -outras que não a ocidental (Blaser, 2009; De la
za, 2000). Árdua tarefa é questionar o eurocen- Cadena, 2010).
trismo, pois o desafio decolonial é compreender o O terceiro e último ponto de contato que su-
Brasil sem recorrer aos cânones do ocidentalismo, blinho diz respeito à forma como o conceito de
interrogando livremente a ontologia que cunhou desenvolvimento pode ser transmutado quando
conceitos tais como indivíduo, sociedade, esfera apropriado e politicamente utilizado. Walsh (2010)
pública, igualdade e “conteúdo emancipatório da refere-se ao fato de que na nova constituição equa-
modernidade”.7 toriana a noção de buén vivir aparece como primor-
A segunda particularidade é o afastamento da dial. Resultado de décadas de lutas sociais, sumak
discussão sobre a economia (como os debates em kawsay, buén vivir em quéchua, constitui-se o que
torno do que seria um “desenvolvimento econô- o desenvolvimento deve(ria) ser (Walsh, 2010; Es-
mico mais justo”) e a aproximação ao problema cobar, 2010). Na realidade, Walsh mostra que viver
dos dispositivos de poder que operam nos âmbitos bem é antes de tudo um projeto coletivo, daí o di-
culturais e gnoseológicos. É o que mostram Walsh recionamento que transmuta os atuais esforços das
(2005), Mignolo (2005) e Blaser (2009) sobre a ne- organizações e agências internacionais em torno do
cessidade, durante longo tempo, de subjugação dos desenvolvimento humano, ou das formas ainda in-
sistemas de conhecimento não europeus para afir- sistentes na dimensão material do desenvolvimento
mar a modernidade – o que Carvalho (2001) cha- pensado como expansão tecnológica, de capital e
mou de a “voz calada do nativo”.8 A ela se relaciona de infraestruturas. Coletivo por princípio, interro-
a geopolítica da epistemologia que, sinteticamente, ga igualmente os aparelhos que querem criar liber-
Mignolo (2005, p. 44) define como a distribuição dades econômicas, capacidades, oportunidades in-
desigual de conhecimento, e a recente recuperação dividuais e acesso a mercados como é o enaltecido
de toda a sorte de práticas, saberes, epistemologias projeto (liberal?) de Amartya Sen (2000).
e cosmologias indígenas sintetizada na noção de Modificar os sentidos do desenvolvimento
“insurgência epistêmica” (Walsh, 2005). Insurgên- para, no caso limite, anulá-lo. Quando os territó-
cia experimentada por grupos indígenas e afrodes- rios, os projetos endógenos e, em suma, a vida e a
cendentes na Bolívia, no Equador e na Venezuela unicidade da experiência das pessoas (Blaser, 2004)
(Escobar, 2010), também presentes, com mais ou passam fulgurar como âncoras da desconstrução de
menos ressonâncias, no mundo indígena, rural e narrativas sobre progresso e história linear, o poten-
mesmo urbano do Brasil (cf. Carvalho, 2001). Na cial é uma reconfiguração político-epistêmica que
visão de Mignolo, movimentos sociais, escritores, sinalize a colonialidade vigorosa que permeia todo
ativistas forçam um redesenho do mapa do conhe- princípio de representar, prescrever em nome de
cimento, operando o que ele denomina “desligar- um desenvolvimento universal.
-se” [delinking] (Mignolo, 2000), uma destituição
do saber eurocentrado como o único legítimo e
cuja missão é efetuar uma produção de conheci- Considerações finais
mento descolonizante. Se todo o conhecimento é
localizado pela diferença colonial com a criação do Um conjunto de questões permanece em
subalterno e do inferiorizado, então uma geopolí- aberto nessa trajetória que procurei mostrar desde
tica da epistemologia desmascararia essa condição. uma primeira antropologia de mãos dadas com o
O deslocamento, portanto, é pensar o proble- desenvolvimento, passando pela infusão das pers-
ma do desenvolvimento como um processo que na- pectivas pós-colonial e pós-estruturalista e que
turalizou a versão modernizante para a qual o saber adquire um corpo de produção no pós-desenvol-
científico constitui o eixo de conhecimento válido. vimento e seu diálogo com o programa moderni-
Por essa razão, a crítica do desenvolvimento pode dade/colonialidade.
Desenvolvimento, pós-estruturalismo e pós-desenvolvimento  159

Talvez a mais evidente seja a ambiguidade do Arce e Long em que se “acelera a fragmentação e a
que seria uma transformação do desenvolvimento dispersão da modernidade para uma constante pro-
como narrativa generalizante e associada à moder- liferação de modernidades” (2000, p. 1).
nidade/colonialidade, e recentemente à globaliza- Mesmo neste caso, o repensar da modernidade
ção, para uma abertura em direção aos processos e seus exteriores, especialmente na forma das in-
locais, diferenciados, heterogêneos e endógenos, surgências epistêmicas, é frutífero ao reconfigurar
quiçá autônomos, de desenvolvimento. Ora, a cir- e impulsionar criativamente o conteúdo elaborado
cularidade impede a superação que o pós-desenvol- inicialmente pelos autores ligados ao pós-desenvol-
vimento imaginou ou a “era” desejada foi apenas vimento, pois o que parece pouco provável de duvi-
um modo de reverter o processo para uma confi- dar é a ruína do desenvolvimento na maneira como
guração lugarizada, não mais universal e sim pluri- foi planejado, dirigido, implantado e reformulado
versal? Não permaneceria, nesse sentido, certa pers- ao longo de décadas. Cabe ressaltar, por conseguin-
pectiva progressista e sempre passível de cooptação te, essa complexidade e a reinterpretação na forma
(às vezes, indireta) por entidades com mais poder e de alternativas à modernidade ou modernidades
articulação (Estados e organizações quaisquer) que, alternativas, ambas fornecendo expressão aos “seus
de modo populista, encetariam expressões como outros”. Creio estar claro que elas interrompem jus-
participação, igualdade de gênero, princípio de di- tamente as tentativas de reconstrução e finalização
ferença e interculturalidade para fazer valer mas de da odisseia incompleta da Modernidade, rota que
lo mismo? É o que alerta Walsh (2010) para uma se apresenta de modo pouco plausível.
ambígua assimilação pelo Estado a respeito do buén Comecei pela discussão antropológica e o de-
vivir equatoriano e seu (ab)uso na constituição da- bate embrionário que essa disciplina auxiliou a
quele país. alicerçar quanto aos programas e projetos de de-
Um problema adicional diz respeito ao que se senvolvimento de grande porte. As interpretações
pode denominar de “desejo do desenvolvimento” recentes, por modalidades particulares e ênfases dis-
(DeVries, 2007). Não serão tão poderosas a narra- tintas, conjugam forças para recolocar outra antro-
tiva do desenvolvimento e suas promessas que as pologia na paisagem acadêmica, criando interações
pessoas realmente o querem? Aqui teríamos que ce- e tensões com a tradicional antropologia aplicada.
der o lugar que era cômodo ao pós-estruturalismo Debruçando-se sobre os processos, as apropriações
e a correlata visão de que o poder cria necessida- locais e os ideários latentes do assim chamado de-
des, para uma abertura ao desejo, à sedução (e à senvolvimento, ela própria não necessariamente
sedação), tal qual oferece DeVries num ensaio de se identifica com estes vetores nem destrói desejos
orientação lacaniana-deleuziana sobre o desenvolvi- manifestos em campo, fatores capazes de rever os
mento. “As pessoas, nos Andes, querem las obritas”, pressupostos que forneceram chaves no tratamento
diz DeVries (2007), polemizando diretamente com do/a “outro/a” num determinado momento.
Escobar e Ferguson (insistência também de She-
perd, 2004). Esse desejo não é livre de construção
e persuasão, no entanto parece ser pouco promissor Notas
responder aos interlocutores em pesquisa de cam-
po que suas vontades são falsas. A possibilidade é 1 Para uma crítica branda a respeito, ver Apthorpe (1985).
relativa a um desejo basilar, independentemente de 2 Conforme o artigo seminal de Stavenhagen (1985).
as máquinas-desejantes estarem no seio ou nas mar- Para um estudo recente, ver Verdum (2006).
gens da modernidade. Nesse caso, o projeto desco- 3 Lema que igualmente não pôde escapar de uma de-
lonizante teria que se acomodar a uma versão que cepção por parte de alguns analistas. Rist (2008, p.
substitui a oposição em essência entre “Ocidente 194) observa que o segundo termo (sustentável) ser-
e o resto” para uma compreensão da multiplicida- viu apenas para legitimar o primeiro, isto é, a perpetu-
de diferenciada e da parcialidade constitutiva do ação do desenvolvimento como gramática inquestio-
nável. De outra parte, pesquisadores denunciam que
projeto moderno, exatamente aquela que propõem
160  REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 26 N° 75

a cruzada do desenvolvimento sustentável propiciou o AGRAWAL, Arun. (2005), Environmentality: te-


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4 Todas as citações de textos em língua inglesa foram Press.
traduzidas por mim. APTHORPE, Raymond. (1985), “Pleading and
5 O leitor poderá buscar referências adicionais em ou- reading agricultural development policy: small
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capitalocêntros, ver Gibson-Graham (2006). ARCE, Alberto & LONG, Norman. (2000), “Re-
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6 Refiro-me ao Modernity/coloniality working group,
centrado na colaboração entre pesquisadores da Duke
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University e a University North Carolina at Chapel (eds.), Anthropology, development and moderni-
Hill, especialmente nas pessoas de Walter Mignolo ties: exploring discourses, counter-discourses and
e Arturo Escobar. O grupo conta com contribuições violence, Londres/Nova York, Routledge, pp.
mais ou menos frequentes (diretas e indiretas) de Ani- 1-31.
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se dava em torno do pós-colonialismo, dos estudos
subalternos e de descolonização. Encerrado o journal,
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o debate migrou para o espaço intitulado Worlds and M. Blaser, H. Feit e H. G. Mcrae (eds.), In the
Knowledges Otherwise. way: indigenous peoples, life projects, and develo-
7 Domingues (2002, 2009) é receptivo de algumas teses pment, Ottawa, IDRC, pp. 26-44.
de Walter Mignolo, mas não aceita a proposição prin- . (2009), “Political ontology: cultural
cipal. Para ele, Mignolo desfavorece o diálogo entre studies without ‘cultures’”. Cultural Studies, 23
grupos, criando fronteiras que não seriam muito di- (5): 873-896.
ferentes da proposta por Huntington, porém, no caso BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos. (2006), “Estra-
de Mignolo, olhando de modo benevolente o “Ou- tégia nacional e desenvolvimento”. Revista de
tro”. A ambivalência da modernidade é o que permite Economia Política, 26 (2): 203-230.
Domingues pensar que ela gerou liberdades e simul- CARVALHO, José Jorge. (2001), “O olhar etno-
taneamente outras formas de dominação, além de as-
gráfico e a voz subalterna”. Horizontes Antropo-
severar riscos, angústias. Ainda assim, o autor entende
lógicos, 15: 107-147.
que a modernidade, mesmo na sua “terceira fase” em
que a heterogeneidade é uma marca, propiciou po- COCHRANE, Glynn. (1971), Development an-
sitivamente o aparecimento da reflexividade, da uni- thropology. Nova York, Oxford University
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Desenvolvimento, pós- DEVELOPMENT, POST- DÉVELOPPEMENT, POST-


estruturalismo e pós- STRUCTURALISM, AND STRUCTURALISME ET
desenvolvimento: A POST-DEVELOPMENT: POST-DÉVELOPPEMENT: LA
crítica da modernidade CONTROVERSIES BETWEEN CRITIQUE DE LA MODERNITÉ
e a emergência de (THE CRITIQUE OF) MODERNITY ET L’ÉMERGENCE DE
“modernidades” AND THE EMERGENCE OF “MODERNITÉS” ALTERNATIVES
alternativas ALTERNATIVE “MODERNITIES”

Guilherme Francisco Waterloo Guilherme Francisco Waterloo Guilherme Francisco Waterloo


Radomsky Radomsky Radomsky

Palavras-chave: Desenvolvimento; Pós- Keywords: Development; Post-develop- Mots-clés: Développement; Post-déve-


-desenvolvimento; Alternativas à moder- ment; Alternatives to modernity; Decol- loppement; Alternatives à la modernité;
nidade; Descolonização; Antropologia onization; Applied anthropology. Décolonisation; Anthropologie appliquée.
aplicada.

Com uma história de mais de meio sé- Over a period of more than fifty years Malgré une histoire de politiques, de
culo de políticas, programas e debates of policies, programs, and theoreti- projets et de débats théoriques de plus
teóricos, o tema do desenvolvimento sus- cal debates, the theme of development d’un demi-siècle, le thème du dévelop-
tenta-se incansável nas ciências sociais. remains persuasive in social sciences. pement se maintient toujours au centre
Concedendo especial atenção à produ- Giving special attention to the anthro- des sciences sociales. En accordant une
ção antropológica sobre o assunto, este pological reflection over this topic, this attention spéciale à la production anthro-
artigo analisa parte do percurso que leva article analyzes the path from the begin- pologique sur ce sujet, l’article analyse
a antropologia do desenvolvimento às ning of the development anthropology to une partie de la trajectoire qui conduit
críticas pós-estruturalista e pós-colonial the post-structuralist and post-colonial l’anthropologie du développement vers
sobre o tema e a concretização da pers- critique as well as the emergence of a des critiques post-structuralistes et post-
pectiva multidisciplinar denominada de multidisciplinary perspective known as coloniales, et vers l’affirmation d’une
pós-desenvolvimento. Após um balanço post-development. Following the discus- perspective pluridisciplinaire qui s’est
em torno da proposta do pós-desenvolvi- sion over ideas of post-development, we définie à propos de la notion de post-dé-
mento, volta-se para a recente aproxima- turn our focus to the recent association véloppement. Après une appréciation de
ção desta com a crítica da modernidade between this perspective and the critique la proposition du post-développement,
por meio da noção de descolonização. of modernity through the notion of de- l’article analyse son rapprochement crois-
Ao final, examinam-se quais expectativas colonization. Moreover, we examine sant avec la critique de la modernité à
aparecem no diálogo entre interpretações which problems come up in the dialogue travers la notion de décolonisation. En
acerca de um tema que se reinventa e se among interpretations over an issue that conclusion, sont examinées les attentes
reconfigura em possibilidades teóricas can reinvent and reconfigure itself in qui se posent dans le dialogue autour des
múltiplas. multiple theoretical possibilities. interprétations sur un sujet qui se réin-
vente et se rétablit en nombreuses possi-
bilités théoriques.

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