Você está na página 1de 15

LEITURA DE TEXTOS MULTISSEMIÓTICOS NO LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA

PORTUGUESA: BREVE REFLEXÃO

ARAÚJO, Layane de Santana1


Universidade Federal da Paraíba – CNPq - PIBIC
layanearaujo335rt@gmail.com
CHAGAS, Maria Vanessa Monteiro das2
Universidade Federal da Paraíba – CNPq - PIBIC
vanessachagasm@gmail.com
SALES, Laurênia Souto3
Universidade Federal da Paraíba
laureniasouto@gmail.com

EIXO: 1 – GT: 8
RESUMO
Conforme dados fornecidos pelo Programa Internacional de Avaliação dos Alunos (2015), os
discentes concluem o ensino fundamental com dificuldades de compreender o que leem.
Diante desse cenário, o material didático disponível aos alunos para as atividades de leitura
propiciadas   em   sala   de   aula   constitui­se   essencial   para   a   formação   leitora   de   sujeitos
autônomos e críticos. Com base nesses aspectos, neste trabalho objetivou­se investigar como
se dá a abordagem da leitura em atividades voltadas para os textos multissemióticos propostas
no livro didático  Português­Linguagens, de autoria de Cereja e Magalhães (2017), adotado
pelas escolas estaduais do município de Mamanguape-PB. O foco na análise das atividades de
leitura de textos multissemióticos teve como motivação a ênfase dada a esses textos pela Base
Nacional Comum   Curricular   (BRASIL,   2017).   Para   embasar   teoricamente   a   pesquisa,
recorreu­se aos estudos de Kleiman (2007), Koch e Elias (2006) e Soares (2001), entre outros
autores que compreendem a leitura como processo de construção de sentidos, no qual o leitor
é o sujeito ativo na compreensão e interpretação dos textos. Os resultados da análise apontam
que o LD apresenta diversos textos multissemióticos e que há uma abordagem significativa da
leitura, contudo, em algumas atividades, não são abordados os elementos não-verbais
presentes nos textos, atentando-se apenas para os conteúdos verbais ou vice-versa. Dessa
forma, cabe ao docente avaliar o que foi apresentado, a fim de ampliar e redimensionar as
atividades de leitura propostas para os textos multissemióticos, de modo que o aluno possa
melhor desenvolver e exercitar suas competências e habilidades leitoras.

1
Graduanda em Letras pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: layanearaujo335rt@gmail.com
2
Graduanda em Letras pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: vanessachagas.ufpb@gmail.com
3
Doutora em Linguística pela Universidade Federal da Paraíba. Professora Adjunta do Departamento de Letras
da Universidade Federal da Paraíba – CCAE e professora do Programa de Mestrado Profissional em Letras
(PROFLETRAS/UFPB). E-mail: laureniasouto@gmail.com
Palavras-chave: Leitura. Textos Multissemióticos. Livro didático.

1. INTRODUÇÃO

Com todos os avanços e modificações ocorridas na sociedade nas últimas décadas,


tem-se exigido dos cidadãos novos comportamentos e novas formas de interação social. Essas
reconfigurações trouxeram impactos também nas formas de circulação dos gêneros textuais,
que, a partir de tais mudanças, começam a ganhar novas composições, a exemplo da
organização multissemiótica (palavras, sons, movimentos, imagens, cores, diagramações,
etc.). Nesse cenário, como orienta a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), cabe
à escola auxiliar o aluno para que ele desenvolva as habilidades necessárias para ler,
compreender e produzir essas novas formas textuais.
Dessa forma, para as práticas de leitura no contexto escolar faz-se necessário
considerar, conforme propõe Rojo (2013, p. 20), que “já não basta mais a leitura do texto
verbal escrito – é preciso colocá-lo em relação com um conjunto de signos de outras
modalidades de linguagem (...) que o cercam, ou intercalam ou impregnam”. Sendo assim, é
necessário levar o aluno a ler, compreender e construir sentidos através da relação entre essas
múltiplas linguagens.
Com base nessas considerações, decidimos focalizar essa pesquisa na leitura de
gêneros multisemióticos no livro didático (LD) de língua portuguesa. A opção por utilizar o
livro didático como objeto de estudo se deu pelo fato deste constituir-se como importante
objeto cultural para o trabalho com a língua e suas diversas dimensões, e por compreendermos
a importância do LD para a formação do sujeito leitor, uma vez que se constitui, em muitas
escolas, a única ferramenta que os alunos têm em mãos para o trabalho com a leitura e as
demais práticas de linguagem.
Dada a importância dessa pesquisa, de modo geral, buscou-se responder ao seguinte
questionamento: Como se dá a leitura de textos multissemióticos a partir das atividades
propostas no LD de Língua Portuguesa adotados para os anos finais do ensino fundamental?
Sendo assim, este estudo se constrói à luz das orientações prescritas nos documentos
oficiais para o ensino de língua portuguesa e para o trabalho com a leitura, como também dos
estudos de Kleiman (2006), Dionísio (2006), Rojo (2010) entre outros autores que discorrem
sobre a leitura em gêneros que compreendem múltiplas semioses.
Este trabalho está estruturado em sessões. Nesta primeira sessão, apresentamos ainda
os objetivos do trabalho. Na sessão seguinte, expomos o percurso metodológico que guiou
esta investigação; na sequência, expomos o aparato utilizado para fundamentar teoricamente a
pesquisa e, em seguida, discorremos sobre os gêneros multissemióticos, a leitura, suas
concepções e as orientações presentes nos documentos oficiais para o ensino de leitura. A
posteriori, fazemos a discussão e análise dos dados gerados a partir da análise de duas
amostras das atividades de leitura do LD. E, por fim, tecemos algumas considerações finais
acerca do que foi apresentado e discutido neste trabalho.

1.1 OBJETIVOS

1.1.1Objetivo Geral

Investigar como se dá a abordagem da leitura em atividades voltadas para os textos


multissemióticos propostas no livro didático de língua portuguesa adotados para os anos finais
do ensino fundamental pelas escolas da rede estadual de ensino de Mamanguape-PB.

1.1.2 Objetivos Específicos

De maneira especifica, buscou-se (1) examinar quais as orientações dos documentos


oficiais acerca do ensino de leitura de textos multissemióticos nos Anos Finais do Ensino
Fundamental e (2) analisar as atividades de leitura voltadas para os textos multissemióticos
propostas pelo livro didático em questão.

2. METODOLOGIA

Essa pesquisa configura-se como qualitativa de análise documental por investigar


“materiais que não receberam ainda um tratamento analítico” (PRODANOV E FREITAS,
2013), como é o caso do livro didático adotado para os anos finais do ensino fundamental nas
escolas estaduais de Mamanguape-PB. Desse modo, com essa pesquisa não se busca utilizar
aspectos estatísticos, e sim estudar e interpretar dados, diferentemente da pesquisa
quantitativa, que tem como foco generalizações estatísticas.
O desenvolvimento deste trabalho se deu em duas (2) etapas: 1) Catalogação dos
gêneros textuais encontrados no volume 1 da coleção adotada pelas escolas de Mamanguape-
PB; 2) Análise das atividades de leitura de textos multissemióticos propostas pelo livro
didático.
Para identificar quais os gêneros discursivos apresentados no livro didático para o
trabalho com a leitura, fizemos catalogações desses gêneros. A seguir, temos um quadro que
mostra a maneira que foram catalogados os gêneros no volume analisado.
Quadro 1 - Modelo utilizado para a Catalogação dos gêneros
CATALOGAÇÃO DO VOLUME I DA COLEÇÃO PORTUGUÊS-LINGUAGENS
GÊNERO TÍTULO AUTOR PÁGINA
Conto As três penas Jacob Grimm 12-14
Tira Mafalda Quino 22
Anúncio Nissan Lew’Laratbwa 24

Como pode-se ver no quadro acima, a catalogação se deu, nas duas coleções, através
da listagem do gênero, título, autor e página, dos textos encontrados no volume 1 da coleção
Português-Linguagens (2017).
Após a realização dessas etapas, analisamos o que o livro didático propõe a partir das
atividades de leitura em textos multissemióticos. Com a análise, percebeu-se que, de modo
geral, o livro didático apresenta atividades de leitura que contemplam diversos gêneros
multissemióticos a partir dos quais há uma abordagem significativa de leitura, entretanto, em
alguns momentos, essas atividades não abordam os elementos não-verbais presentes nos
textos, atentando-se apenas para os conteúdos verbais ou vice-versa.

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para embasar teoricamente a pesquisa recorremos aos estudos de Kleiman (2006),


Koch e Elias (2006), Soares (2001), Rojo (2010), entre outros autores que compreendem a
leitura como processo de construção de sentidos, no qual o leitor é o sujeito ativo na
compreensão e interpretação dos textos. Esses textos podem ser verbais, não-verbais e
multissemióticos.
Quanto à leitura de textos multissemióticos, utilizamos como referência Dionísio
(2006), Gomes (2017), Rojo (2009), entre outros autores que consideram que a multissemiose
favorece a participação social ao sujeito leitor, uma vez que possibilita o desenvolvimento de
modos de leitura em contextos compostos por diferentes semioses.
Utilizamos também como referência os documentos oficiais: os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) para o ensino fundamental (1998), a Base Nacional Comum
Curricular (2017), que oferecem orientação quanto à prática de ensino da leitura de textos
multissemióticos, e também o Programa Nacional do Livro Didático (2017).

3.1 Gêneros Textuais Multissemióticos?

Vivemos rodeados por gêneros textuais. E, atualmente, não podemos dizer que
passamos sequer um dia sem nos depararmos com eles, uma vez que basta acessarmos a
internet em nossos smartphones que, mesmo sem perceber, teremos contato com os gêneros
textuais diariamente. Lemos gêneros, escrevemos gêneros e vivemos rodeados por gêneros.
Muitos pensam que os gêneros textuais surgiram nesse século, entretanto a noção de
gênero textual surge com a tradição poética de Platão, passa por Aristóteles, na retórica, e,
assim, cresce e amplia-se até os dias atuais. A “explosão dos gêneros textuais” é impulsionada
pela modernização e avanços ocorridos na sociedade e, em consequência disso, surgem os
gêneros que contemplam múltiplas semioses.
De acordo com Dionísio (2006),

Imagem e palavra mantêm uma relação cada vez mais próxima, cada vez mais
integrada. Com o advento de novas tecnologias, com muita facilidade se criam
novas imagens, novos layouts, bem como se divulgam tais criações para uma ampla
audiência. Todos os recursos utilizados na construção dos gêneros textuais exercem
uma função retórica na construção de sentidos dos textos. [...] Representação e
imagens não são meramente formas de expressão para divulgação de informações,
ou representações naturais, mas são, acima de tudo, textos especialmente construídos
que revelam as nossas relações com a sociedade e com o que a sociedade representa.
(p. 132)

Sendo assim, conforme expõe Dionísio (2008), é inegável a contribuição das novas
tecnologias para a formação desses gêneros textuais, que mesclam e aproximam, cada vez
mais, imagem e palavra, exigindo, portanto, outras habilidades para a construção de sentidos.
Ao discorrerem sobre o assunto, Rojo e Barbosa (2015) afirmam que texto
multissemiótico
é aquele que recorre a mais de uma modalidade de linguagem ou a mais de um
sistema de signos ou símbolos (semiose) em sua composição. Língua oral e escrita
(modalidade verbal), linguagem corporal (gestualidade, danças, performances,
vestimentas – modalidade gestual), áudio (música e outros sons não verbais –
modalidade sonora) e imagens estáticas e em movimento (fotos, ilustrações,
grafismos, vídeo, animações – modalidades visuais) compõem hoje os textos da
contemporaneidade, tanto em veículos impressos como, principalmente, nas mídias
analógicas e digitais. (p. 108)
Com base nas considerações das autoras, compreende-se que os textos
multissemióticos são resultados da junção de duas ou mais modalidades da linguagem ou a
mais de um sistema de signos ou símbolos, podendo contemplar as modalidades verbal,
gestual, sonora, visual. Rojo e Barbosa (2015) ressaltam, ainda, que esta última modalidade, a
visual, compõe grande parte dos textos da atualidade, devido a veiculação nas mídias
impressas, a exemplo de revistas e livros didáticos, e nas mídias digitais, a exemplo das redes
sociais. Corroborando com a perspectiva de Rojo e Barbosa (2015), Dionísio (2011, p. 139)
afirma que os textos multissemióticos constituem-se de “palavras e gestos, palavras e
entonações, palavras e imagens, palavras e tipográficas, palavras e sorrisos, palavras e
animações etc.”
Dado o surgimento desses letramentos multissemióticos, a escola, sobretudo as aulas
de Língua Portuguesa, não pode se tornar indiferente a esses textos. E, de acordo com a
orientação da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), é necessário levar o aluno a
ler, compreender e construir sentidos através da relação entre essas múltiplas linguagens.
3.2 Ensino de Leitura: Concepções e Orientações Oficiais

Segundo Antunes (2003), as concepções de língua e linguagem adotadas pelo docente


e pela escola ou instituição de ensino influenciam no modo como se trabalha com a leitura e
as demais práticas de linguagem.
De acordo com Coracini (2001, p. 143), “na visão estruturalista da leitura, ler significa
atribuir sentido a algo que já está lá de forma imanente, que já tem sentido literal,
independente do sujeito”, ou seja, o leitor é um decodificador e ler se restringe a uma técnica
de reconhecer palavras, sendo vista, portanto, como mera reprodução. Já no viés cognitivista,
a leitura é tratada apenas sob a perspectiva do leitor. Conforme ressalta Leffa (1999, p.18),
essa perspectiva “considera a decodificação do texto como processo do ato de ler, no qual a
partir da decodificação de palavras o leitor compreende o texto, entende o seu sentido”. Desse
modo, a leitura acontece, mais uma vez, através da reprodução, assim como na concepção
estruturalista.
De acordo com as orientações existentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Fundamental (BRASIL, 1998) e na Base Nacional Comum Curricular (BRASIL,
2017), o ensino de leitura deve ser pautado na concepção sociointeracionista, uma vez que,
para esses documentos, saber ler não implica em apenas decodificar ou extrair significados
existentes no texto, mas em compreender e atribuir sentidos ao gênero textual lido.
Na concepção sociointeracionista, o ensino de língua portuguesa deve ter como base
os gêneros discursivos, que, de acordo com Bakhtin (2003, p. 280), são enunciados (orais e
escritos) “concretos e únicos, que emanam dos integrantes de uma ou de outra esfera da
atividade humana”. Dessa maneira, percebe-se que os gêneros do discurso não podem ser
trabalhados independentemente de sua realidade social e de sua relação com as atividades
humanas. Nesse contexto, podemos afirmar que há um diálogo entre Bakhtin e os PCN
(1998), quando este último afirma: “Todo texto se organiza dentro de determinado gênero em
função das intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, as
quais geram usos sociais que os determinam” (BRASIL, 1998, p. 21).
Em concordância com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), a Base
Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) compreende a leitura como o conjunto de
“práticas de linguagem que decorrem da interação ativa do leitor/ouvinte/espectador com os
textos escritos, orais e multissemióticos e de sua interpretação” (p. 67). Nessa perspectiva, o
leitor é o sujeito ativo na compreensão e interpretação dos textos.
Diante dessas considerações, podemos constatar que o ensino de LP, tendo os gêneros
textuais como ferramenta, faz com que o aluno desenvolva o conhecimento necessário para
adaptar-se às diversas atividades linguísticas, diferentemente do que ocorre quando está
voltado às práticas essencialmente metalinguísticas. Nesse sentido, entendemos que a escola,
enquanto espaço que possibilita a construção de conhecimentos, e o livro didático, enquanto
objeto cultural para o trabalho com a língua e suas práticas de linguagem, devem tornar a sala
de aula um ambiente para a língua ser processada juntamente ao texto. Desse modo, o aluno
poderá, por exemplo, refletir sobre os usos da língua, produzir textos, atribuir sentidos ao que
lê a partir dos processos de leitura, análise e produção de diversos gêneros textuais.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com essa pesquisa, verificou-se que todas as escolas estaduais que contemplam os
anos finais do ensino fundamental na cidade de Mamanguape-PB adotam a coleção

Português – Linguagens, de autoria de Thereza Magalhães e William Cereja (2017). Para

melhor aprofundamento das discussões, optou­se por fazer um recorte e analisar o volume 1,

dirigido às turmas do sexto ano. 
Em termos gerais, a referida coleção é dividida em quatro unidades temáticas e traz
diversos gêneros textuais com temas atuais e adequados ao público. O eixo da leitura,
segundo o Programa Nacional do Livro Didático (BRASIL, 2017), ocupa um maior espaço na
coleção, assim como o dos conhecimentos linguísticos. A leitura é bem articulada aos outros
eixos, contudo, a articulação entre o eixo dos conhecimentos linguísticos e os demais não é
facilmente encontrada na obra. O Guia dos Livros Didáticos expõe que, na coleção, o eixo da
leitura é priorizado, uma vez que disponibiliza diversos gêneros textuais para que o aluno
adentre no universo juvenil.
Na coleção Português - Linguagens, “as atividades de leitura [...] colaboram para a
formação do leitor” (BRASIL, 2017, p.46). Isso se justifica, de acordo com o PNLD, pelo fato
de a leitura estar presente em todos os eixos de ensino e não se limitar à decodificação dos
elementos linguísticos e/ou à identificação de informações na superfície textual, mas ao
intenso trabalho com a compreensão e análise das características dos mais diversificados
gêneros textuais. Um ponto negativo existente na coleção, conforme expõe o PNLD (2017),
são os temas selecionados para a leitura, pois estes não refletem, em sua maioria, a
heterogeneidade sociocultural brasileira. Em geral, a coleção citada é bem estruturada e
apresenta um trabalho significativo com os eixos para o ensino de Língua Portuguesa e,
consequentemente, para o ensino de leitura.
O volume 1, destinado aos discentes do sexto ano do ensino fundamental, é
estruturado em quatro unidades, que possuem três capítulos cada uma. Cada unidade é
dividida em quatro eixos: Estudo do texto, Produção de texto, Língua em foco e De olho na
escrita. Neste trabalho, expomos a análise de uma seção do eixo De olho na escrita e uma do
eixo Língua em foco.
Os capítulos que contém o eixo De olho na escrita iniciam-se com um gênero textual
que serve como base para a discussão sobre questões ortográficas que serão estudadas no
decorrer do capítulo. Já os capítulos voltados ao eixo da Língua em foco, são divididos nas
seguintes seções: Construindo o conceito, Conceituando, Exercícios, A categoria gramatical
na construção do texto e Semântica e discurso.
De modo geral, o LD apresenta uma diversidade textual rica, formada por gêneros que
pertencem a diferentes esferas da atividade humana. Ao todo, foram catalogados 242 textos
pertencentes a mais de 20 gêneros textuais que circulam na sociedade.
No LD em questão, encontra-se textos jornalísticos, a exemplo da notícia e
reportagem, textos literários, como contos e poemas, textos da esfera publicitária, como
anúncios e propagandas, textos multissemióticos, como tiras e anúncios publicitários, e textos
que circulam na internet. Todos esses gêneros que estão no LD, antecedem unidades, realizam
diálogo entre os conteúdos, servem como espaço para discussão do que está sendo trabalhado
e são fundamentais para as questões dos exercícios.
A seguir, vemos um gráfico que apresenta a quantidade de gêneros textuais verbais,
não-verbais e multissemióticos encontrados no LD.

Gráfico 01 – Gêneros textuais catalogados no volume 1 da coleção Português-Linguagens


(2017).

A partir dos dados apresentados no gráfico acima, pode-se ver que o livro didático
apresenta uma maior quantidade de gêneros multissemióticos, uma vez que compreendem
48% dos gêneros presentes no LD, correspondendo a 107 gêneros. Esses dados refletem que o
livro didático compreende as orientações da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL,
2017), uma vez que esta orienta para que sejam ofertados, em todos anos do ensino
fundamental, textos que contemplem múltiplas semioses.
O gráfico abaixo mostra quais foram os gêneros multissemióticos encontrados no livro
didático.
Gráfico 02 - Gêneros textuais multissemióticos encontrados no volume 1 da coleção
Português-Linguagens

De acordo com o gráfico acima, encontram-se, no LD, os seguintes gêneros


multissemióticos: tira, charge, anúncio publicitário, capas de livro/revista, placa, cartum, HQ,
cartaz, poema concreto e fotos com legenda. Entre esses gêneros, destaca-se a tira e o anúncio
publicitário, com 63 e 25, respectivamente.
Ressaltamos que a quantidade de gêneros multissemióticos encontrada no LD se
constitui um fator positivo para o desenvolvimento das competências e habilidades leitoras
desses textos, conforme orienta a Base Nacional Comum Curricular (2017). Entretanto, é
necessário analisar a qualidade dos gêneros multissemióticos oferecidos, se as atividades de
leitura contribuem para a inserção de práticas significativas de leitura.
Com base nessas considerações, resta-nos analisar o que o livro didático oferece, em
termos de leitura, nas atividades propostas a partir de textos multissemióticos.

AMOSTRA 1
I UNIDADE – CAPÍTULO 1: Era uma vez
DE OLHO NA ESCRITA: EXERCÍCIOS

Nessa parte do capítulo, as atividades voltam-se à escrita. Sendo assim, na seção,


estuda-se as regras gramaticais e aspectos sobre a fonética da língua portuguesa.
Conforme as orientações propostas na BNCC (2017, p. 85), é importante que o aluno
leia, escute e produza “textos orais, escritos e multissemióticos que circulam em diferentes
campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia, fluência e criticidade”. No
entanto, em algumas atividades de leitura presentes no livro didático analisado, não há um
direcionamento para isso não aconteça, como pode-se ver na amostra:

Figura 1 – Recorte do exercício da página 265 do volume 1 da coleção Português-


Linguagens, de autoria de Cereja e Magalhães (2017).

Na amostra, vê-se uma tira de Adão Iturrusgarai que apresenta conteúdos verbal e não-
verbal muito interessantes para a leitura, reflexão e construção de sentidos. Contudo, nas
atividades posteriores à tira não há nenhuma questão que busque a compreensão ativa do
leitor (aluno), nem que atente para a imagem e relacione o conteúdo não-verbal ao verbal.
De início, é solicitado que o aluno realize a leitura da tira apenas para localizar “duas
palavras que estão propositalmente grafadas sem o acento gráfico”. Dessa forma, a atividade
de leitura torna-se estruturalista, acontecendo por meio da mera decodificação.
Em seguida, o aluno deve reescrever as palavras, acentuando-as adequadamente.
Nesse caso, o texto (tira) é utilizado como pretexto para se trabalhar com conteúdos
gramaticais e os aspectos multissemióticos do texto não são levados em consideração.
Desse modo, as atividades não compreendem as orientações da BNCC (BRASIL,
2017, p. 156) para o trabalho com a leitura de textos multissemióticos, nas quais, na leitura
desses textos, objetiva-se que o aluno compreenda os “efeitos de sentidos provocados pelos
usos de recursos linguísticos e multissemióticos”.

AMOSTRA 2
II UNIDADE – CAPÍTULO 1: O fazendeiro da cidade
A LÍNGUA EM FOCO: EXERCÍCIOS
Essa seção do capítulo focaliza no estudo da língua, devendo voltar-se, portanto, à
análise e reflexão de elementos linguísticos. Nesse capítulo, os estudos se direcionam à
classificação dos substantivos.
De acordo com o PNLD (2017, p. 42), nas atividades de leitura desse LD, os
“exercícios contemplam a compreensão das relações que se estabelecem entre a linguagem
verbal e a não verbal em textos multimodais” (PNLD, 2017, p. 42). Vejamos como ocorre no
recorte da atividade, a seguir:

Figura 2 – Recorte da charge “Pelo ralo” da p. 95 do volume 1 da coleção Português-


Linguagens, de autoria de Cereja e Magalhães (2017).

Figura 3 – Recorte do exercício da p. 96 do volume 1 da coleção Português-Linguagens, de


autoria de Cereja e Magalhães (2017).
A amostra traz uma charge publicada na Folha de São Paulo e, em seguida, são
expostas algumas questões que tratam sobre o conteúdo abordado na charge e sobre a
classificação dos substantivos. Diferente da tira analisada anteriormente, nesse texto busca-se
aliar o estudo gramatical à interpretação linguística e multissemiótica, conforme propõe a
BNCC (BRASIL, 2017).
Logo na primeira questão, vê-se a proposta de que o aluno olhe para a charge e atente
para o uso dos recursos verbais como também para a imagem presente no texto. Dessa forma,
a questão contribui para que o aluno construa sentidos do texto através da relação entre os
elementos verbais e não-verbais, trazendo uma proposta significativa para o trabalho com a
leitura do texto multissemiótico analisado (charge).
No entanto, na charge analisada, a segunda questão volta-se para a identificação da
categoria gramatical estudada no capítulo, o substantivo.
Com base nessas considerações, salientamos que o professor deve planejar sua aula
previamente, objetivando ampliar atividades de leitura em textos multissemióticos como esse,
de modo que, auxilie o aluno para a construção de sentidos relacionando os elementos verbais
aos não-verbais existentes no texto.

5. CONCLUSÃO
À luz da leitura dos documentos oficiais que norteiam o ensino de língua portuguesa e
o trabalho com a leitura, como também através dos estudos de Kleiman (2006), Dionísio
(2006), Soares (2001), Rojo (2010), entre outros autores que compreendem a leitura como
processo de construção de sentidos em textos verbais, não-verbais e multissemióticos,
buscamos investigar como se dá a abordagem da leitura voltadas para os textos
multissemióticos em atividades propostas no livro didático de língua portuguesa adotados
para os anos finais do ensino fundamental pelas escolas da rede estadual de ensino de
Mamanguape-PB.
A partir da análise realizada, verificou-se que o livro didático apresenta diversos
gêneros textuais multissemióticos e que há uma abordagem significativa na leitura desses
textos, contudo, em algumas atividades, não são abordados os elementos não-verbais
presentes nos textos, atentando-se apenas para os conteúdos verbais ou vice-versa.
Portanto, cabe ao docente avaliar o que foi apresentado, a fim de ampliar e
redimensionar as atividades de leitura propostas para os textos multissemióticos, de modo que
o aluno possa melhor desenvolver e exercitar suas competências e habilidades leitoras.
Com este trabalho, esperamos ter contribuído para a reflexão sobre como a leitura dos
gêneros multissemióticos vem sendo abordada em uma ferramenta tão importante para o
ensino de Língua Portuguesa nas escolas brasileiras, o livro didático.

6. REFERÊNCIAS

ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola, 2003.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino
fundamental: Língua Portuguesa. Ministério da Educação. Secretaria de Educação
Fundamental. Brasília: 1998.

BRASIL, MEC/SEF. 2017. Guia de Livros Didáticos PNLD 2017. 5º ao 9º ano. Brasília:
MEC/SEF.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base nacional comum


curricular. Brasília, DF, 2017.

DIONÍSIO, Ângela Paiva. Gêneros multimodais e multiletramento. In: KARWOSKI, A. M.;


GAYDECZKA, B.; BRITO, K. S. (Orgs.). Gêneros textuais: reflexões e ensino. 2. ed. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2006.
DIONÍSIO, Ângela Paiva. Gêneros textuais e multimodalidade. In: KARWOSKI, Acir Mário,
GAYDECZKA, Beatriz, BRITO, Karim Siebeneicher (orgs.). Gêneros textuais, reflexões e
ensino. 4. Ed. São Paulo: Parábola editorial, 2011.

GOMES, Rosivaldo. Leitura de gêneros multissemióticos e multiletramentos em


materiais didáticos impressos e digitais de língua portuguesa do ensino médio. 2017,
260p. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada). Instituto de Estudos da Linguagem,
Universidade Estadual de Campinas, 2009. Disponível:
<http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/325318/1/Gomes_Rosivaldo_D.pdf.>Aces
so em: mai. 2019.

KLEIMAN, Angela. Leitura e prática social no desenvolvimento de competências no ensino


médio. IN: BUNZEN, Clecio; MENDONÇA, Márcia; et al. (Orgs.). Português no ensino
médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial 2006.

KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender os sentidos do texto.
São Paulo: Contexto, 2006.

ROJO, Roxane. (Org.). Escol@ conect@d@: os multiletramentos e as TICs. São Paulo:


Parábola, 2013.

ROJO, Roxane. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009.

ROJO, Roxane, BARBOSA, Jaqueline. Hipermodernidade, multiletramentos e gêneros


discursivos. 1. ed. São Paulo, SP: Parábola Editorial, 2015. v. único. 150p.

SOARES, Magda. O Livro Didático como fonte para a história da Leitura e da formação do
professor leitor. In: MARINHO, Marildes. Ler e Navegar. Belo Horizonte: Mercado das
Letras, 2001.

Você também pode gostar