Você está na página 1de 24

CAPÍTULO 3 – O GÊNERO ARGUMENTATIVO E SUAS

CARACTERÍSTICAS

Há muitas espécies diferentes de texto de filosofia. Isso porque há muitas


metodologias distintas de se conduzir uma pesquisa em filosofia, assim como há
muitas maneiras diferentes de expressar os resultados da pesquisa (ou seja, de
escrever). Enquanto não tomamos conhecimento dos diversos percursos
existentes – o que acontece com alguma frequência entre os que têm pouca
familiaridade com textos filosóficos, e mesmo entre os alunos de filosofia no
começo da graduação – permanecemos meio perdidos. Quem está nessa situação,
se tem de enfrentar a tarefa de escrever um texto, costuma ficar sem saber muito
bem como conduzir a escrita, que caminho tomar, ou simplesmente como
escrever, o que naturalmente é angustiante.
Além disso, nem sempre a pessoa está completamente perdida, o que
acaba por aumentar a perplexidade. É relativamente comum entre os não-
iniciados e entre os novatos na academia já possuir uma área de interesse, já ter
um tema favorito, já ter lido bastante sobre esse tema e já saber mais ou menos o
texto que gostaria de escrever, mas não saber como fazer. Ensaiam-se alguns
parágrafos, mas sem muita segurança para decidir cada um dos passos que o
texto deverá seguir, ou para encadear esses passos de uma maneira lógica – da
maneira necessária para que o resultado final seja um bom texto de filosofia.
Muitos acabam aprendendo sobre as diferentes metodologias para pesquisa e
produção de textos filosóficos tardiamente e da forma mais difícil e mais
demorada: a “vida”, ou a “vida acadêmica”. Quer dizer, para muitos é só com o
tempo e com a experiência que vem a compreensão clara de que há diferentes
roteiros para pesquisar e escrever, assim como o domínio das características de
cada um.
Meu objetivo nesse capítulo é proporcionar um pequeno panorama de
algumas das metodologias mais comuns e mais tradicionais adotadas no âmbito
acadêmico da filosofia, descrevendo brevemente seus traços mais gerais e
destacando as características da metodologia mais própria do gênero
argumentativo frente às metodologias de outros gêneros. Gostaria de, com isso,
oferecer um modesto antídoto para a bem-conhecida angústia que acomete
aqueles que tiveram pouca iniciação nessa seara e, ao mesmo tempo, empoderá-
los, a fim de que adquiram a liberdade necessária para escolher que caminho
seguir de modo a tirar o proveito máximo de suas empreitadas de pesquisa e de
escrita.

2.1. Há basicamente dois caminhos


Toda forma de recortar e separar coisas corre o risco de ser reducionista e
cair em estereótipos, mas é necessário traçar alguma linha de corte. Para fins de
simplicidade, diremos que há basicamente dois tipos de texto em filosofia: o
exegético e o argumentativo. Trata-se mais de dois estilos (de pesquisar e de
escrever) do que de duas tradições ou escolas, mas vale ressaltar que são estilos
com características bastante distintas. Além desses dois, que são principais, há
ainda a possibilidade de mescla: o estilo exegético-argumentativo.

Estilo Argumentativo. Em geral, o estilo argumentativo de texto é aquele


que de um modo ou de outro gira em torno de uma disputa entre ideias, ou
pontos de vista, sobre algo. Isso quer dizer que esse estilo de trabalho sempre se
baseia, de um modo ou de outro, numa tentativa de mostrar que determinado
filósofo está certo ou errado relativamente a determinado ponto. Ele dá muita
atenção à análise das ideias que estão em jogo em cada um dos lados da disputa
– e sempre há pelo menos dois lados –, buscando explicitar a estrutura dessas
ideias, suas intuições de fundo, o conteúdo de cada uma das partes dos
argumentos envolvidos, etc., com a finalidade de provar tais ideias ou refutá-las.
Em geral o foco desse tipo de trabalho é no problema (o problema que
gerou a disputa), e não no filósofo. Isso significa que a pessoa que opta por
trabalhar com esse tipo de metodologia se debruça sobre determinado filósofo
para ver o que ele tem a dizer contra ou a favor do ponto que está sob disputa,
deixando em segundo plano o que ele eventualmente tenha dito sobre outros
assuntos.
Além disso, a escrita argumentativa costuma ser bem enxuta, prescindindo
do uso de vocabulários rebuscados, isto é, de jargão (embora frequentemente se
utilize de vocabulário técnico); e prescindindo também de considerações
historiográficas e mesmo de comentadores (i.e., de intérpretes dos filósofos que
estão sendo abordados). Ela tem como um de seus traços marcantes a expressão
(que pode ser mais ou menos explícita) do ponto de vista do próprio autor, quer
dizer, a própria pessoa que está escrevendo o trabalho é bem-vinda para emitir
juízos de valor sobre a qualidade e alcance dos argumentos que estão sendo
abordados, o que ela normalmente faz utilizando pronomes na primeira pessoa do
singular.
Se continuarmos a utilizar a analogia entre argumentos e engrenagens de
um motor, podemos dizer o seguinte: o autor de um texto argumentativo faz
como um engenheiro mecânico, quando este avalia um problema acometendo um
motor que está em fase de testes. Assim como o engenheiro mecânico emite
juízos sobre quais peças do motor precisariam ser substituídas para que o
problema seja resolvido, assim também o autor de um texto argumentativo emite
juízos sobre que partes do argumento de alguém não estão funcionando ou não
estão tendo o alcance que precisam ter para os fins a que se destinam, e porquê.
Em outras palavras: o engenheiro mecânico dá palpite sobre o que está certo e o
que está errado no motor recém-construído. De modo semelhante, o autor de um
texto argumentativo dá palpite sobre onde a teoria de determinada pessoa está
certa e onde está errada e porquê.

Estilo Exegético. Já o estilo exegético tem mais ou menos as


características opostas: ele não costuma envolver disputa entre ideias, nem
mesmo indiretamente. Seu foco geralmente é a busca por melhor compreender
determinada ideia na obra de determinado filósofo. Ou seja, o trabalho exegético
é um trabalho interpretativo, e não “disputativo”. Ele não visa provar que alguém
está certo ou errado, e sim ampliar a compreensão que temos sobre o pensamento
de alguém. Para isso, ele procura dissecar a ideia que está para ser compreendida,
mostrando suas origens, suas influências, a maneira particular como ela é
pensada pelo filósofo em questão, o papel que ela desempenha dentro do corpus
desse filósofo, enfim, procura explorar de maneira intensa aquilo que o filósofo
pensou sobre um assunto. Graças a isso, o foco desse tipo de trabalho é no
filósofo, e não no problema. Isso significa que a pessoa que opta por trabalhar
com esse tipo de metodologia se debruça sobre um filósofo para poder
compreendê-lo de maneira mais aprofundada, eventualmente deixando em
segundo plano o que outros filósofos tenham dito contra ou a favor algum ponto
específico que o filósofo aborda. Além disso, a escrita exegética costuma ser
mais barroca, valorizando o uso do vocabulário próprio do autor (seu jargão
próprio), valorizando elementos historiográficos, bem como a relação do filósofo
em questão com a tradição na qual está inserido; faz uso profuso de
comentadores; e, tem como um de seus traços marcantes o fato de que o autor
costuma se abster de expressar seus próprios pontos de vista, ou emitir juízos de
valor sobre o que está sendo abordado. O autor fala sobre um filósofo, mas não
discute com (ou contra) ele. E, vale ressaltar, esse estilo tem grande
expressividade no cenário brasileiro, podendo-se dizer que ele predomina na
produção acadêmica nacional.
Para descrever um texto exegético, a melhor analogia não é com a atuação
do engenheiro mecânico frente às engrenagens de um motor em fase de testes, e
sim com a atuação de um investigador de polícia, ou detetive, que pretende
investigar um crime, esclarecendo algo que está obscuro. O detetive vai atrás de
certas informações que, juntas, formam uma reconstituição detalhada da cena do
crime. Ele se interessa por saber coisas como: de onde cada item veio e porque
foi colocado ali; qual foi a motivação por trás da mente criminosa; como
exatamente foi a sucessão de eventos; por que foi escolhida tal vítima, e não
outra; como exatamente a arma do crime provocou os danos que provocou, e
assim por diante. Seu objetivo é melhor compreender o crime (que ainda não está
completamente claro), e não palpitar sobre se alguém está certo ou errado.

Estilo Exegético-argumentativo. Por fim, o trabalho do tipo exegético-


argumentativo é aquele que costuma se propor a realizar uma tarefa dupla:
compreender e tomar partido. Ele reúne e mescla características dos dois estilos
anteriores, porém de maneira extremamente sistemática. Em geral, seu objetivo é
compreender e deslindar uma disputa entre intérpretes, sobre determinada ideia,
presente em determinado filósofo.
Para tanto, começa com a tarefa do investigador de polícia, reconstituindo
a cena em seus aspectos mais relevantes. Em seguida, identifica um ponto
nevrálgico onde os especialistas discordam entre si – digamos que os peritos
discordam quanto a se o crime foi friamente calculado ou se foi passional. O
investigador então observa e compara como cada grupo de peritos justifica sua
opinião. Ou, em outras palavras, observa e compara os argumentos fornecidos
por cada grupo de peritos. E, em seguida, realiza a tarefa do engenheiro mecânico
frente aos argumentos (ou engrenagens) de cada grupo, identificando e
mostrando onde cada um deles está certo e errado, e tomando partido quanto a
qual funciona melhor, ou qual está mais certo.

2.2. Mas cada caminho tem diversos sub-caminhos


Cada um dos estilos principais, por sua vez, possui diversas possibilidades
de implementação, quer dizer, diversas formas possíveis de resultar num texto.
Aqui veremos algumas delas. Você vai observar, a partir da descrição e da
amostra de roteiro de cada um desses modelos de texto, que há diferenças muito
marcadas entre os modelos argumentativos e os exegéticos, e perceberá que essas
diferenças expressam o fato de argumentação e exegese serem projetos
investigativos distintos, ou abordagens distintas. Observação: o roteiro
esquemático que acompanha cada descrição é apenas um exemplo de como cada
modelo pode ser implementado, e não uma receita de bolo rígida.

▪ Modelo argumentativo equilibrado


Neste modelo, o autor apresenta e discute os dois lados de uma disputa,
sem necessariamente estar (ou pelo menos sem se mostrar) comprometido com
um deles já de saída. Nesse modelo o autor inicialmente se porta como se fosse
um relator neutro, alguém que está presente num tribunal apenas para descrever a
disputa de argumentos travada entre acusação e defesa. Ele especifica aquilo
sobre o que acusação e defesa estão em conflito (ou seja, especifica o objeto da
disputa) e sem seguida descreve o que cada um dos lados tem a dizer em seu

próprio favor. Posteriormente, o autor assume o papel de juiz, julgando qual dos
dois lados está mais bem amparado e explicitando seu próprio ponto de vista
acerca da disputa. Note que nesse modelo a apresentação dos dois lados é
equilibrada, ou seja, o autor expõe da maneira mais completa, imparcial e
caridosa possível os argumentos de cada um dos lados, para somente no final
julgar e tomar partido quanto a qual deles parece ter “vencido” a disputa.
Exemplos de títulos de trabalhos que se adéquam a esse modelo: “O debate
McDowell-Dreyfus”; “Determinismo ou libertarianismo? Uma breve
apresentação”.
▪ Modelo argumentativo equilibrado com terceira-via
Aqui o autor procede de acordo com o modelo equilibrado ao longo do
desenvolvimento do texto. Porém ao final, em vez de tomar partido
favoravelmente a um dos dois lados da disputa que foram abordados, ele
apresenta (e/ou defende) um terceiro lado, que em geral constitui uma solução
alternativa para o problema que vinha sendo abordado. Em geral, a exposição

nesse modelo acaba sendo um pouco menos equilibrada do que no anterior,


porque é feita já com o propósito de revelar insuficiências em ambos os lados
que inicialmente protagonizam a disputa – ou seja, a exposição já é feita com o
autor tendo por objetivo mostrar que nenhum dos dois lados é bom o suficiente
ou adequado o suficiente para “vencer”. Ele pode, inclusive, declarar isso já nos
parágrafos iniciais do texto, se quiser. Exemplos de títulos que se adéquam a esse
modelo: “Compatibilismo: uma via média no debate entre deterministas e
libertários”; “Nem dualistas nem fisicalistas: entendendo o dualismo de
propriedades”.
▪ Modelo argumentativo persuasivo
Nesse modelo o autor normalmente declara seu próprio ponto de vista já
na introdução e, ao longo do desenvolvimento do texto, procura convencer o
leitor, através de argumentos fundamentados, de que ele está certo.
Diferentemente do modelo equilibrado, aqui não há exposição neutra e
balanceada de dois lados – o que há é a apresentação e a tomada de partido a
favor de um lado, seguida da tentativa de rebater as objeções que classicamente

vêm, ou que podem vir, do(s) lado(s) oposto(s). Assim, se na abordagem


equilibrada o papel do autor era comparável ao do relator neutro e ao do juiz,
aqui o papel do autor é equivalente ao de uma das duas partes que estão em
conflito. Ou seja, o autor, nesse modelo, desempenha o papel ou da acusação ou
da defesa, e não do juiz. Graças a isso essa abordagem costuma parecer mais
“bélica” do que as anteriores, porque “ataca” diretamente uma ideia, ou um autor,
mas é um estilo bastante comum de trabalho argumentativo, talvez até mesmo o
mais comum. Exemplos de títulos adequados a esse modelo: “Por quê o dualismo
de substâncias é uma posição insustentável”; “Por quê ser um compatibilista”.
▪ Modelo argumentativo persuasivo-terapêutico
Já nesse modelo o objetivo é dissolver aparentes problemas, ou aparentes
disputas, mostrando que onde parece haver um problema (ou uma discordância
entre autores) na realidade não há nenhum(a). Ou seja, autor busca defender o
ponto de que algo que parece uma disputa real entre duas ideias ou duas teorias é,

na realidade, uma disputa meramente verbal; ou não é uma disputa porque os


interesses de cada um dos dois lados não são conflitantes, apenas diferentes; ou
que determinado problema que vem sendo discutido por certos autores na
verdade é um falso-problema, fruto de confusões e mal-entendidos. Em função
disso essa abordagem é indicada para desfazer mal-entendidos ou para dissolver
conflitos – em vez de um dos lados “vencer” no final, o que há é uma espécie de
“conciliação”. Graças a isso, o papel do autor nesse tipo de abordagem não é nem
o do juiz, nem o da acusação e defesa: aqui o autor desempenha um papel de
conciliador, ou mediador de conflitos. Exemplos de títulos que se adéquam a esse
modelo: “Desfazendo mal-entendidos acerca da noção de conceito”;
“Neokantianos versus naturalistas: um falso dilema”.
▪ Modelo exegético sincrônico clássico
Como todo modelo exegético de texto, esse modelo procura investigar
para melhor compreender. Ele se concentra numa temática específica, com foco
bem direcionado: ele se propõe a elucidar (interpretar) um conceito específico,
numa obra específica, de um filósofo. O corte é sincrônico, ou seja, a abordagem
não é pautada pelo desenvolvimento do conceito em questão ao longo de

diferentes obras ou períodos históricos, ou seja, ela não pretende mostrar como
um conceito foi sendo transformado ao longo do tempo, e sim como ele aparece
numa determinada obra, ou num determinado momento. A ideia é ampliar a
compreensão que se tem acerca do conceito em questão lançando sobre seu
significado e papel um olhar sistemático. Exemplos de títulos que se adéquam a
esse modelo: “A noção de movimento na Física de Aristóteles”; “O conceito de
divertimento nos Pensamentos de Pascal”. Esse é, possivelmente, o modelo mais
clássico e mais bem-aceito de trabalho exegético no ambiente acadêmico
brasileiro.

▪ Modelo exegético sincrônico aplicado


Semelhante ao anterior, esse modelo faz um corte sincrônico, delimitando
um conceito, num autor (preferencialmente em uma obra). Mas ao invés de
investigar seu sentido de uma maneira sistemática, o objetivo aqui é ver se o
conceito em questão pode ser utilizado (i.e., aplicado) para ampliar a
compreensão que temos acerca de determinada questão numa área específica (e
geralmente, não-filosófica, tal como a arte, a educação, sociologia, dentre outras).
Exemplo de título: “A noção platônica de aisthesis na arte contemporânea”;
“Interfaces entre Foucault e a educação: o conceito de biopoder no contexto do
ensino básico brasileiro”. Uma outra diferença para o modelo exegético

sincrônico clássico é que o aplicado se propõe a tarefa dupla de interpretar um


conceito em um autor e o mundo, isto é, uma parte do mundo (a parte sobre a
qual o conceito será aplicado). Quer dizer, aquilo em que esse texto resultará será
não apenas uma interpretação de um autor, mas também uma interpretação do
mundo.
▪ Modelo exegético sincrônico-comparativo 1
Outra variação do modelo exegético sincrônico, esse modelo escolhe não
um único conceito, e sim dois, em um mesmo filósofo. A busca é por ampliar a
compreensão que se tem acerca da relação entre os dois conceitos na obra do
autor. Em geral os conceitos escolhidos possuem uma articulação estreita,
desempenhando papéis antagônicos ou cooperativos dentro do pensamento do

filósofo, de modo que compreender a relação que existe entre eles tem um
impacto sobre a compreensão que se tem acerca de cada um. Exemplos de títulos
que se adéquam a esse modelo: “Má-fé e Responsabilidade no pensamento de
Sartre”; “Sensibilidade e Conhecimento no Teeteto de Platão”.
▪ Modelo exegético sincrônico-comparativo 2
Por fim, uma outra variação do modelo exegético sincrônico faz mais ou
menos o contrário do modelo anterior: consiste de escolher não dois conceitos
num mesmo autor, e sim um conceito em dois autores. A busca é por ampliar a
compreensão que se tem acerca da relação entre o conceito tal como pensado

pelo filósofo A e o mesmo conceito tal como pensado pelo filósofo B,


ressaltando as semelhanças e diferenças. Em geral os autores escolhidos ocupam
posições antagônicas dentro de uma tradição, ou então são representantes de um
mesmo movimento, porém com formas originais de desenvolver suas ideias.
Exemplos: “A noção de Subjetividade em Kant e em Hegel”; “O ceticismo de
Pirro e o ceticismo de Montaigne”.
▪ Modelo exegético diacrônico clássico
O modelo exegético diacrônico, diferentemente do sincrônico, pauta-se
pela tentativa de compreender o desenvolvimento de um conceito ou de uma
ideia em momentos diferentes da história (ou ao longo das diferentes fases da
obra de um filósofo, ou então ao longo dos diferentes momentos de uma
tradição). A ideia é entender quais foram as mudanças que o conceito ou ideia

sofreu e quais foram os fatores que pesaram para essas mudanças. Esse tipo de
modelo tem baixa implementabilidade em textos ou em projetos curtos, como
artigos, monografias (TCC‟s) ou mesmo dissertações de mestrado, devido a
abrangência do assunto que se propõe a tratar. Em compensação, para teses de
doutorado ou mesmo para livros é uma abordagem relativamente frequente.
Exemplo de título adequado a esse modelo: “A ideia Sartreana de Liberdade em
O Ser e o Nada e na Crítica da Razão Dialética”.
▪ Modelo exegético diacrônico-comparativo
Por fim, o modelo exegético diacrônico-comparativo procura estudar o
desenvolvimento do pensamento de um autor em outro, ou segundo outro
(geralmente entre autores localizados em momentos diferentes da história da
filosofia). Ou seja, pretende ampliar a compreensão que temos da influência de
determinado autor, escola ou tradição sobre o pensamento de outro(s), ou então a

forma como a obra de determinado autor, escola ou tradição é recebida por um


autor, escola ou tradição posterior(es). Como o anterior, é difícil de ser
implementado em projetos menores, mas é uma boa opção para trabalhos
grandes. Exemplos de títulos que se adéquam a essa abordagem: “O jovem
Heidegger leitor de Aristóteles”; “Influências dos pré-socráticos sobre o
pensamento medieval”.
▪ Modelo exegético-argumentativo 1
Uma das estratégias mistas entre argumentação e exegese consiste de
buscar compreender se determinada tese pode ser atribuída a determinado
filósofo. Ela é muito utilizada quando o objetivo do autor é ampliar a compressão
que se tem do pensamento de um filósofo quando ele não deixou explícita sua
adesão ou sua rejeição à tese em questão, e cujos textos aparentam uma certa

ambiguidade, i.e., parecem poder ser entendidos das duas maneiras. Essa
estratégia é implementável principalmente quando há discordâncias entre os
intérpretes, ou seja, quando há comentadores que consideram que o filósofo
aceita a tese em questão, e outros que acreditam que ele a nega, pois assim o
autor do trabalho pode executar um plano argumentativo (equilibrado ou
persuasivo) para lidar com as posições dos intérpretes. Exemplo de título
adequado a esse modelo: “Descartes era um compatibilista?”.

▪ Modelo exegético-argumentativo 2
Outra forma de mescla envolve avaliar se as teses advogadas por
determinado filósofo foram superadas pela tradição que se seguiu a ele (ou por
seus críticos) ou se ainda permanecem de pé, sendo defensáveis ainda nos dias de
hoje. Como a estratégia anterior, esta quase sempre só é implementável quando
há comentadores que consideram que as ideias do filósofo foram derrubadas por
críticos ou por pensadores posteriores, e outros que acreditam que elas
permanecem vivas e em pleno vigor (ou porque os críticos fizeram delas uma
leitura incorreta ou porque as objeções podem ser derrubadas através de
tréplicas). Exemplo de título adequado a esse modelo: “A fenomenologia superou
completamente a distinção kantiana entre númeno e fenômeno?”

2.3. Exercícios
A seguir estão vinte abstracts extraídos de textos de diferentes tipos (a
maioria são artigos), possuidores de diferentes estilos e propostas. Leia-os e
procure responder, a respeito de cada um deles, às seguintes perguntas:

▪ Baseado no título do texto e no conteúdo do abstract, você acha que o


texto é argumentativo, exegético ou exegético-argumentativo?
▪ Baseado no título do texto e no conteúdo do abstract, de qual modelo,
exatamente, o texto parece ser?
▪ Por que? Quais características você é capaz de apontar no abstract que te
levam a imaginar que o texto foi escrito de acordo com esse modelo, e não com
outro?
▪ Na sua opinião, é preciso ter domínio sobre o conteúdo de um texto para
conseguir identificar qual a abordagem (estratégia de escrita, modelo) adotada
pelo seu autor?
▪ Como parte adicional do exercício, escolha alguns dos textos a que esses
abstracts pertencem, busque por eles na internet e procure lê-los. Observe a
maneira particular como cada autor executou a estratégia de escrita do modelo
que ele escolheu utilizar. Você consegue reconstituir o roteiro que o texto seguiu,
apontando cada um dos “passos” adotados pelo autor? Observação: lembre-se
que cada modelo admite diversas variações em termos de roteiro; e que a maneira
particular de executar um roteiro é livre.

ABSTRACT 1
A discussão realizada por Kripke do necessário a posteriori, em Naming and
Necessity e “Identity e Necessity” – em que ele estabelece o fundamento para
distinguir a possibilidade epistêmica daquela da metafísica e explica a relação
entre as duas –, é, em minha opinião, um dos mais proeminentes feitos da
filosofia do século vinte. O meu objetivo neste ensaio é extrair as lições
duradouras da sua discussão e desemaranhá-las de certas dificuldades que aí
podem ser encontradas. Eu argumento que, na realidade, existem duas rotas
kripkianas para o necessário a posteriori – uma que é correta e filosoficamente de
longo alcance, a outra que é incorreta e filosoficamente enganadora.
SOAMES, Scott. Kripke sobre a possibilidade epistêmica e metafísica: as duas
rotas para o necessário a posteriori. Sképsis, ano VI, n. 161, 2013, pp. 160-188.

ABSTRACT 2
A discussão filosófica contemporânea acerca dos conflitos sociais se encontra
pautada pelas contrariedades da configuração política atual que, um tanto quanto
não encerrada exclusivamente pelos conflitos de classe, se manifesta sob o signo
do não reconhecimento de diferenças culturais, de gênero, de raça, étnicas e de
orientação sexual. É nesse sentido que se justificam as tentativas de atualização
de um modelo teórico que centralize a noção de reconhecimento, tal como fizera
o jovem Hegel, para a compreensão dessas novas lutas sociais. Portanto, neste
artigo procurou-se examinar a influência do pensamento do jovem Hegel na
elaboração da teoria do reconhecimento de Axel Honneth, o principal
sistematizador de uma atualização do modelo hegeliano, tendo por
objetivo evidenciar a importância de se examinar as fontes teóricas que
propiciaram o instrumental categorial do reconhecimento.
RAVAGNANI, Herbert Barucci. Luta por reconhecimento: a filosofia social do
jovem Hegel segundo Honneth. Kínesis, Vol. I, n° 01, Março-2009, pp. 39-57.

ABSTRACT 3
Texto em que pretendo localizar ocorrências do vocábulo sýntaxis, desde
usos remotos até os primeiros no âmbito da linguagem, feitos pelos estoicos.
Penso que o desenvolvimento da noção de sýntaxis foi crucial para o
amadurecimento de uma concepção realista-mentalista de linguagem presente
nos primeiros gramáticos gregos, pois eles teriam herdado da filosofia uma
intepretação das relações sintáticas entre palavras como modo de exprimir
relações sintáticas (i.e.: de ordenação) entre objetos na mente, que por sua vez
espelhavam relações sintáticas entre objetos no mundo.
de BRITO, Rodrigo Pinto. Sobre a Noção de “Sintaxe” de Xenofonte a Crisipo.
Principia, n. 36, 2018.

ABSTRACT 4
O artigo analisa o modo como Malebranche apresenta o conhecimento que
possuímos de nossa própria alma a partir da noção de sentimento interior. Para
tanto, tomamos como ponto de partida a concepção malebrancheana do
argumento do cogito, opondo-a à de Descartes, tomando-o como uma
constatação imediata da existência de algo que sente, sem, no entanto, poder
afirmar algo sobre sua essência. O conhecimento da alma torna-se assim algo
puramente afetivo, sem nenhum conteúdo positivo, e por natureza distinto do
conhecimento propriamente dito. Buscamos desse modo mostrar como, na
filosofia de Malebranche, cria-se um campo propriamente humano do sentimento
cujo conteúdo é irredutível a qualquer ciência.
KONTIC, Sacha Zilber. Cogito, Sentimento e Afetividade em Malebranche.
Kriterion, nº 140, Ago./2018, pp. 613-630.

ABSTRACT 5
Nesse artigo são analisadas as propostas de Dauer (1974) e Puntel (1990) de
justificação da concepção coerencial da verdade. O cerne das duas propostas é a
passagem da coerência de um conjunto de proposições para a verdade dessas
proposições, com base em teorias semânticas holistas. O objetivo é explicitar os
pressupostos semânticos das duas propostas e mostrar que ambas têm
dificuldades em distinguir entre o dito e a realidade. Argumento ainda que a
razão formal da inadequação está na incapacidade das teorias coerenciais em
distinguir os aspectos inferenciais e referenciais da noção de proposição
verdadeira.
BRAIDA, Celso. Sobre a versão coerencial da noção de verdade. PERI, v. 01 ,
n. 01, 2009, pp. 83-103.

ABSTRACT 6
O problema do debate filosófico contemporâneo acerca do dom, trazido à tona
sobretudo pelos filósofos franceses Jacques Derrida e Jean-Luc Marion, trouxe
novas e vivas discussõets sobre o que é e qual a sua natureza. O presente artigo
analisa se o amor pode ser considerado como um dom ou se segue o mesmo
problema sublinhado por Derrida. Segundo o autor, todo dom tem uma
contradição interna e não pode ser considerado como tal. O que é dom para as
pessoas (alguém doa algo para alguém de modo livre), para Derrida é uma
commodities, um círculo econômico. Em outras palavras, o dom é impossível. A
análise que se faz neste artigo é se o amor segue este paradigma, portanto é
impossível, ou se ele constrói um caminho próprio e segue sua própria lógica. É
possível analisar o amor seguindo os passos da fenomenologia? Reduzindo o
amor a fenômeno, então a análise se abre a novos horizontes.
SANTANA, Wellington José. Is love a gift? A philosophical inquiry about
giveness. Kriterion, nº 134, Ago./2016, pp. 441-454.

ABSTRACT 7
Wilfrid Sellars é conhecido por seu famoso ataque a ideia de dados epistêmicos,
isto é, a tese de que há algum conhecimento que é "dado" diretamente ao sujeito.
De sua rejeição a dadidade, no entanto, seguem-se importantes ideias para uma
discussão epistemológica. O objetivo deste artigo é apresentar a premissa geral
do dado e da crítica de Sellars, e então discutir os conceitos extraídos desta
crítica, introduzindo a epistemologia do próprio autor.
MAROLDI, Marcelo Masson. O mito do dado e a epistemologia de Sellars.
Griot Revista de Filosofia. V.14, n.2,dezembro/2016, pp. 393-409.

ABSTRACT 8
Neste artigo pretendemos mostrar as vantagens do modelo epistemológico
coerentista quando aplicado ao universo moral. O ponto de partida será apontar
que a justificação da crença moral é dada pela coerência com um sistema
coerente de crenças que é consistente e que isso pretende resolver o problema da
dicotomia entre fato e valor. Posteriormente, apresentam-se as características
centrais do coerentismo holístico e investiga-se o método do equilíbrio reflexivo.
O próximo passo será fazer referência a três conhecidas objeções ao coerentismo,
a saber: o problema do isolamento, os sistemas coerentes alternativos e a
circularidade viciosa. Por fim, procuramos responder a essas objeções apelando
para os seguintes argumentos: holismo social, razoabilidade e estabilidade social.
COITINHO, Denis. Moralidade, Justificação e Coerência. Kriterion vol.56
no.132, July/Dec. 2015, pp. 557-582.
ABSTRACT 9
Este artigo tem como objetivo discutir a atualidade do fenômeno psicossocial
descrito por Simone Weil como desenraizamento operário. A autora, a partir de
sua experiência de trabalho nas fábricas de Paris nos anos de 1935 e 1936,
utilizou este conceito para descrever e analisar o sofrimento gerado pela
organização do trabalho fabril. Buscou-se aqui comparar as reflexões da autora
com entrevistas realizadas com nove trabalhadores metalúrgicos de fábricas da
região do ABC paulista sobre as memórias das experiências de trabalho. A
análise das biografias profissionais procurou responder a seguinte pergunta: as
transformações ocorridas no mundo do trabalho, conhecidas genericamente como
reestruturação produtiva, teriam transformado o fenômeno descrito por Simone
Weil como desenraizamento operário? Os resultados apontam que o problema do
desenraizamento é persistente e deve ser compreendido como intrinsecamente
relacionado à organização capitalista do trabalho.
SVARTMAN, Bernardo Parodi. Trabalho e desenraizamento: um estudo sobre
o sofrimento psicossocial gerado pela organização do trabalho fabril. Psic. Rev.
São Paulo, volume 20, n.2, pp. 221-244, 2011.

ABSTRACT 10
O Argumento do Conhecimento de Frank Jackson é um dos mais influentes
argumentos contra o fisicalismo. Jackson defende que nenhuma informação
física captura os aspectos subjetivos da experiência, os qualia. Os objetivos deste
artigo são expor o argumento do conhecimento e analisá-lo submetendo-o a três
críticas. A primeira é a crítica desenvolvida por Dennett que nega que Mary
aprende alguma coisa quando ela vê o vermelho pela primeira vez. A segunda
crítica é a hipótese da habilidade de Lewis, que afirma que quando Mary vê o
vermelho pela primeira vez, aprende uma habilidade. E a terceira crítica, baseada
nas identidades a posteriori do tipo água=H2O, afirma que o que Mary aprende
ao ver o vermelho não corresponde a um novo fato, mas a um novo modo de
apresentação de um mesmo fato físico. Concluiremos que estas críticas falham ao
responder o que Mary aprende com a experiência, na medida em que não
explicam o seu progresso epistêmico.
BORGONI, Daniel. Uma análise do argumento do conhecimento de Jackson.
Kínesis, Vol. V, n° 09, Julho 2013, pp. 47-61.

ABSTRACT 11
O artigo defende a tese de que o naturalismo biológico de Searle é uma forma de
dualismo de propriedades. Após um exame do problema mente corpo e do
dualismo de propriedades (seção 2), e de uma exposição do naturalismo
biológico (seção 3), é discutida criticamente a concepção de subjetividade
ontológica (seção 4), concepção que leva o naturalismo biológico a ser um
dualismo entre propriedades objetivas e subjetivas.
PRATA, Tárik de Athayde. O caráter dualista da filosofia da mente de John
Searle. Discusiones Filosóficas. Año 15 Nº 25, julio – diciembre 2014, pp. 43-62
ABSTRACT 12
O presente artigo, situado no âmbito da lingüística aplicada, tem por objetivo
proporcionar um “debate teórico” entre duas teorias semânticas lexicais
concorrentes: de um lado, a teoria das representações mentais de Jerry Fodor, do
outro, a teoria do léxico gerativo de James Pustejovsky. Nosso debate visa
confrontar as mencionadas teorias em dois níveis: o primeiro, ao nível dos
fundamentos, quanto a questões recorrentes em semântica lexical, como
ontologia, holismo e composicionalidade; o segundo, ao nível das críticas tecidas
por Jerry Fodor e Ernest Lepore ao projeto de Pustejovsky e da
contraargumentação desse último. Esse debate tem por objetivo confirmar nossas
hipóteses de que teorias decomposicionalistas tal como a de Pustejovsky não são
a maneira mais apropriada para o tratamento do significado lexical, e que teorias
atomistas apresentam superioridade metodológica para o trato de tal questão.
BRAUNER, Gustavo. Sobre a Semântica Lexical: James Pustejovsky versus
Jerry Fodor & Ernest Lepore. In: V Semana de Letras, 2005, Porto Alegre. Anais
da V Semana de Letras. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005.

ABSTRACT 13
Para Russ Shafer-landau, enquanto as teorias metaéticas denominadas por ele de
céticas implicariam na impossibilidade do progresso moral (robusto), na
equivalência moral entre posições morais antagônicas, e na infalibilidade moral,
a teoria não-cética denominada objetivismo incorreria, aparentemente, no
absolutismo moral, na ne gação da diversidade e da divergência morais, e na
adoção de uma metafísica incompatível com a visão científica de mundo. Shafer-
Landau, no entanto, discorda que isso valha para o realismo moral. Esta
comunicação apresenta e analisa parte dos passos argumentativos presentes neste
quadro.
BONELLA, Alcino Eduardo. Realismo Moral: uma introdução. Dissertatio
UFPel, n. 39, 2014, pp. 31-41.

ABSTRACT 14
Este artigo discute duas variedades de interpretação para a teoria moral de Hume.
De um lado, ela é representada como uma forma de subjetivismo e, de outro,
como uma forma de realismo. Ao final, é proposto que esta filosofia pode ser
melhor descrita como uma forma de intersubjetivismo.
CONTE, Jaimir. Sobre a natureza da teoria moral de Hume. kriterion, nº 113,
Jun/2006, pp. 131-146.

ABSTRACT 15
O objetivo deste trabalho é mostrar, de acordo com Frege, em que consiste o
procedimento de „abstração‟ por ele formulado de maneira não sistemática no
capítulo IV, no quadro dos §§ 64-69 ss. dos Fundamentos da Aritmética. Este
procedimento, embora controverso, é um operador-chave para a definição do
conceito de número, objeto de investigação do mencionado capítulo. No início do
§ 62, faz a seguinte pergunta: como nos pode, pois, ser dado um número, se não
podemos ter dele nenhuma representação ou intuição? De uma maneira concisa,
responde que só no contexto de uma proposição as palavras significam algo.
Frege busca definir o conceito de número de uma maneira holista, fundado em
relações, até chegar a sua definição definitiva dos números em proposições que
sejam objetivas e que se seguem. No entanto, essa proposição precisa ser
definida e o procedimento ao qual recorre é a „abstração‟ que está exemplificada
pelo (i) paralelismo e (ii) pela equinumerosidade. Que tem como escopo uma
relação de equivalência: simetria, reflexividade e transitividade; todos os
princípios internos do mencionado procedimento. Na sequência, mostrar-se-á a
relevância da crítica empreendida à noção de objetos abstratos (números)
elaborada por E. J. Lowe em sua obra The Metaphysics of Abstract Objects, na
seção II sobre entidades abstratas.
VALADARES, Jeferson da Costa. O procedimento da 'abstração' em Frege
nos Fundamentos da Aritmética. Synesis, v. 5, n. 2, jul/dez. 2013, pp. 63-84.

ABSTRACT 16
O objetivo deste artigo é responder à questão: a teoria cartesiana das ideias é
realista direta ou representacionalista? Para responder a essa questão, analiso as
noções de ideia, ser objetivo, realidade objetiva e essência nas "Meditações" de
Descartes. Eu procuro mostrar que do ponto de vista da apreensão das essências
das coisas externas, Descartes é um realista direto. Mas como algumas provas da
existência são inferenciais, eu mostro também que deste ponto de vista a teoria
cartesiana é representacionalista.
FILHO, Raul Landim. Ideia, ser objetivo e realidade objetiva nas
"Meditações" de Descartes. Kriterion, vol.55 no.130, Dec. 2014, pp. 669-690.

ABSTRACT 17
O não-conceitualismo é a tese segundo a qual determinados estados mentais
podem representar o mundo ainda que o sujeito dos mesmos não disponha dos
conceitos necessários para especificar o que tais estados estariam representando.
Neste artigo não pretendo apresentar nenhum novo argumento nem em defesa do
não-conceitualismo nem contrário ao conceitualismo. O que realmente me
importa é esclarecer a própria noção. Resumo os termos do debate entre
conceitualismo e não-conceitualismo e assumo o não-conceitualismo como uma
tese filosófica suficientemente estabelecida tanto em termos conceituais quanto
em termos empíricos. Neste artigo tomo a liberdade de adotar uma abordagem
nada convencional. A minha ideia é empreender uma abordagem ao mesmo
tempo histórica e sistemática do não-conceitualismo, aclarando as ideias (pré-
conceitualismo) que, ao logo de uma evolução histórica, paulatinamente deram
ensejo ao não-conceitualismo.
PEREIRA, Roberto Horácio. Não-conceitualismo. “Compêndio em Linha de
Problemas de Filosofia Analítica”. João Branquinho e Ricardo Santos (Eds.).
Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2014.

ABSTRACT 18
Não devemos ajudar nenhum porco que esteja sofrendo diante de nós, a menos
que essa ajuda esteja relacionada à abolição da escravidão dos porcos. Os porcos
devem, assim, abrir mão de seus interesses mais vitais e imediatos a bem da
causa da abolição. Tampouco devemos melhorar as instalações de criação animal,
na medida em que isso retardaria a abolição da pecuária. Aliás, por que não usar
gaiolas mais sujas e apertadas a fim de acelerar a libertação das galinhas? Por
essa razão, a China, onde a legislação bem-estarista é insignificante, está mais
próxima de abolir a escravidão animal do que outros países. Reformas bem-
estaristas são mais prejudiciais aos animais do que reforma nenhuma. Apenas os
movimentos que lutam pelo fim da exploração são benéficos aos animais. Querer
promover o bem-estar dos frangos implica estar concordando implicitamente
com o uso deles como comida. É correto aumentar o bem-estar de uma pessoa,
mas não devemos tentar aumentar o bem-estar de uma vaca. O presente artigo,
apresentado no 12th Vegan Festival International, ataca, na linha de David
Sztybel principalmente, esses e outros resultados da argumentação antibem-
estarista de Gary Francione.
NACONECY, Carlos. Bem-Estar Animal ou Libertação Animal? Uma Análise
Crítica da Argumentação AntiBem-Estarista de Gary Francione. Revista
Brasileira de Direito Animal, v.4, n.5, 2009, pp. 235-267.

ABSTRACT 19
O que é que deveríamos entender sob a definição anselmiana do Deus como
aliquid quo maius cogitari non potest, “algo do qual não pode ser pensado
maior”? Este artigo argumenta a favor de que a definição de Anselmo deveria ser
entendida como uma definição operativa, igual a uma receita ou instrução de um
médico: se você quer saber quem é Deus, deve então prosseguir e cumprir a regra
aí definida: Deus é aliquid quo maius cogitari non potest, “algo do qual não é
possível pensar maior”. Então, Deus não é nem um objeto tirado da natureza
(prima causa), nem um conceito tirado do intelecto (ens perfectissimum), nem
uma imagem tirada da imaginação. A existência de Deus é um resultado do modo
de pensar nele como “algo do qual não pode ser pensado maior”. Se você segue a
instrução de pensar em Deus, então, Deus existe e, além disso, existe
necessariamente, pois não é possível negar sua existência e, ao mesmo tempo,
pensar em algo maior.
SCHEIDER, Jakob Hans Josef. Em busca de Deus: Santo Anselmo de
Cantuária e a Prova Ontológica da Existência de Deus e sua crítica. Scintilla,
Curitiba, vol. 12, n. 1, jul./dez. 2015, pp. 129-152.

ABSTRACT 20
Neste trabalho buscaremos apresentar uma síntese dos principais conceitos da
teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas assim como deduzir algumas de
suas implicações para o estudo das organizações. Em particular, buscaremos
mostrar que esta teoria se constitui em poderoso instrumento analítico no estudo
da estrutura e funcionamento dos conselhos com participação popular que são
uma marca característica das sociedades capitalistas contemporâneas. Este estudo
tem por base a tese de doutorado Administração e Liberdade: Um estudo do
Conselho de Escola à luz da teoria da ação comunicativa de Jürgen
Habermas (Pinto, 1994).
PINTO, José Marcelino de Rezende. A teoria da ação comunicativa de Jürgen
Habermas: conceitos básicos e possibilidades de aplicação à administração
escolar. Paidéia (Ribeirão Preto) no.8-9, Ribeirão Preto, Feb./Aug. 1995, pp.
77-96.
2.4. Considerações finais
Por fim, é importante ter em mente que esses caminhos de escrita não são
os únicos que existem, mas apenas alguns dos mais comuns. Além disso, seu
passo-a-passo não é rígido, ou seja, não se trata de receitas de bolo que têm que
ser obedecidas à risca para que o produto final dê certo (vale a pena lembrar que
o passo-a-passo indicado nos diagramas é apenas um exemplo de como cada
modelo pode ser executado, e não a fórmula universal caracterizadora do
modelo). Todos os modelos admitem adaptações e, certamente, o tom pessoal de
cada pesquisador ou escritor também contribui enormemente para variações em
termos de resultado.
Dada a existência de uma gama tão vasta de possibilidades é comum, a
essa altura, surgir uma pergunta: com é feita a escolha de um caminho? Como os
autores decidem, ou escolhem, que tipo de abordagem adotar para a escrita de
seu texto, e que modelo seguir?
Em primeiro lugar, é importante ter em mente que a escolha por um
caminho deve levar em conta diferentes fatores. Um deles é a afinidade, isto é, o
gosto pessoal do autor: algumas pessoas gostam mais de escrever sobre do que
de discutir com. Já outras têm a preferência oposta. E há também as que gostam
das duas coisas. Adotar o modo de trabalho que mais se gosta tem um grande
impacto sobre a qualidade do trabalho final: quando fazemos o que gostamos
temos chances maiores de êxito porque conseguimos nos dedicar durante mais
tempo à tarefa e, consequentemente, temos chances maiores de ficarmos muito
bons naquilo que fazemos.
Mas o gosto pessoal não deve ser o único critério de escolha. Também é
preciso levar em conta o que se tem. Quer dizer, é necessário avaliar se o
material disponível permite ser tratado em termos argumentativos, ou em termos
exegéticos, ou em ambos. Se os textos disponíveis (os que estão sendo
pesquisados) forem todos exegéticos, quer dizer, se não for possível identificar
uma disputa em meio aos textos, provavelmente a investigação argumentativa
terá encontrado um obstáculo logístico. Por outro lado, se todo o material
disponível trata de disputas, e se não há nada exatamente obscuro em meio a
essas disputas, fazer uma exegese cuidadosa e que busque ampliar a
compreensão geral que se tem de um determinado conceito talvez não seja muito
produtivo. Um autor deve procurar observar o que é que tem em mãos e pensar:
que tipo de pesquisa poderia surtir efeitos aqui? Há algo não muito claro, que
precise ser melhor esclarecido? Há alguma relação entre ideias ou entre conceitos
que ninguém está enxergando e que, se explorada, contribuiria para uma
compreensão mais aprofundada de tal filósofo? Há intérpretes discordando entre
si, ou sustentando pontos de vista opostos sobre uma mesma coisa? Alguém está
dizendo algo de que eu discordo? Fazer a si mesmo esse tipo de pergunta ajuda a
adquirir clareza sobre que tipo de pesquisa o material permite.
Por último, também é importante conhecer o círculo onde o trabalho será
recebido. Há ambientes completamente exegéticos e há ambientes
completamente argumentativos. Um autor precisa dar uma olhada em que tipo de
material é produzido pelas pessoas que compõem o ambiente onde ele pretende
que o texto seja lido e onde ele pretende ser aceito enquanto autor ou
pesquisador, a fim de tentar identificar qual tipo de trabalho tem boa recepção
dentro desse ambiente e qual não tem. Orientadores, tutores e supervisores
podem ajudar nisso, mas uma boa ideia é passar a “frequentar” o ambiente onde
se pretende que o futuro texto seja lido. Frequentar é algo que se pode fazer de
maneira literal – participar de círculos, debates e reuniões em grupos de estudo,
grupos de pesquisa, eventos, conferências, e etc. – mas também de maneira
metafórica, digamos assim: é possível, e recomendável, ler os textos oriundos do
ambiente intelectual de interesse, ler o que é publicado nas revistas onde se
pretende publicar, etc. Acompanhando, dessa forma, a produção intelectual de
cada ambiente, é possível adquirir uma boa noção sobre que tipo de trabalho
cairia bem em cada círculo e sobre quais os círculos mais indicados para receber
o tipo de trabalho que se pretende fazer.

Você também pode gostar