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Publicado In: Anais do 2º Workshop Arqueológico de Xingó.

Aracaju: Universidade Federal de Sergipe / Museu 1


Arqueológico de Xingó. 2002, p. 46-56.

O povoamento do Planalto Central do Brasil

Emílio Fogaça*

Nesta rápida intervenção pretendo propor alguns tópicos para discussão, apoiando-me
no balanço dos conhecimentos acumulados durante mais de vinte anos e que nos é agora
atualizado e sintetizado pelo Prof. Schmitz em sua conferência (Schmitz, inédito).

O ANOS QUE ESTÃO POR VIR

Em suas reflexões, o Prof. Schmitz nos aponta uma série de problemas novos,
naturalmente decorrentes das pesquisas desenvolvidas no Planalto Central – a necessidade
de implementar estudos específicos sobre diferentes categorias de vestígios ou o
reconhecimento das relações estabelecidas entre sítios em áreas já intensa e extensamente
estudadas –, além daqueles que não puderam ser tratados, falta de tempo ou de recursos,
pelos pré-historiadores concernidos.
Talvez seja triste constatar que a principal contribuição inovadora para essa temática,
que não marginaliza os fatos arqueológicos em prol de modelos interpretativos no mínimo
fátuos, seja fornecida pelo próprio Prof. Schmitz (No prelo), ao investigar as relações entre
sítios de Serranópolis, tendo como ponto de partida a cultura material neles preservada.
A continuidade da pesquisa sobre o povoamento do Planalto Central Brasileiro, que só
pode ser um empreendimento coletivo, parece permanecer na dependência de uns poucos
arqueólogos debruçados sobre sítios e vestígios. Enquanto que, por sobre suas cabeças,
pairam espectros de natimortos, incapazes de perceber diferenças entre o homem pré-
histórico da savana brasileira e os !Kung do Kalahari.
Daí a minha preocupação em levantar uma discussão sobre o futuro. Destaco portanto
alguns aspectos que a meu ver merecem um desenvolvimento sistemático.

A visão que temos dos antigos caçadores-coletores do Planalto é majoritariamente


focada na ocupação de abrigos. Como destaca o Prof. Schmitz, há fortes indícios da
articulação desse tipo de habitat com estabelecimentos a céu aberto. Estes últimos são na
maioria extensas oficinas líticas para exploração de também extensas fontes de matéria

*
Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia/UCG
e-mail: emilio@ucg.br
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prima. Nesses casos, os principais indícios da relação desses sítios com as ocupações mais
antigas dos abrigos derivam de algumas características das indústrias líticas, uma vez que
faltam datações absolutas para os sítios abertos (Prous e Fogaça, 1999).

Vislumbro aí dois desafios para a pesquisa: desenvolver metodologia apropriada para a


prospecção de sítios a céu aberto pré-cerâmicos1 e, em segundo lugar, investigar
diferentemente essas indústrias, de forma que as relações possam ser postuladas não
apenas com base em similaridades tipológicas – trata-se na essência de submeter as
coleções líticas já existentes a análises tecnológicas aprofundadas – O segundo desafio
será tratado logo adiante. Detenho-me aqui no primeiro ponto.

A REPRESENTATIVIDADE DOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS

Os sítios à céu aberto conhecidos são, quase na totalidade, sítios superficiais. Na falta
de cartas geológicas detalhadas (escalas 1:10.000 ou 1:25.000), sondar sistematicamente o
subsolo (segundo os métodos ditos ‘probabilísticos’) em busca de sítios em depósitos da
transição Pleistoceno/Holoceno seria praticamente procurar uma agulha no palheiro. Tendo
em vista no entanto a importância da informação que pode ser produzida por sítios dessa
natureza, parece-me útil tentar desenvolver metodologias de prospecção geologicamente
orientadas, integrando desde o início o geológo e o arqueólogo2. Trata-se de praticar uma
‘arqueologia da paleo-paisagem’3. Se, por um lado, alguns trabalhos de arqueologia de
contrato desenvolveram metodologia eficaz para amostrar a distribuição horizontal de sítios
pré-históricos, por outro lado ainda não resolveram o problema da representatividade
‘vertical’, para identificar a cronologia das ocupações regionais.

Conforme destaca o Prof. Schmitz, a hipótese da ocupação duradoura de moradias


abrigadas não é generalizável. Nossas próprias observações, a partir de dados escavados
por A. Prous ao norte de Minas Gerais, nos levam a vislumbrar, para esse período,
ocupações esporádicas e com fins bastante restritos nos abrigos do vale do rio Peruaçu
(Fogaça, 2001a).

1
Emprego voluntariamente o termo ‘pré-cerâmico’. Pretendo dessa maneira destacar o fato de que, mesmo em
recentes projetos de arqueologia de contrato, em áreas de usinas hidrelétricas, que se utilizaram de metodologia
rigorosa para prospecção, a quantidade de sítios com material cerâmico é sempre predominante (cf., por
exemplo,Melo, 1996; Viana et al., 1999; Caldarelli, 2001 – áreas que conheço diretamente).
2
Um trabalho a nível de doutoramento desenvolvido atualmente no IGPA procura contribuir nesse sentido, ao
identificar as dinâmicas, naturais e antrópicas, na formação de uma paisagem fluvial (Júlio Cézar R. de Rubin,
com. pes. 2002).
3 Tenho em mente como exemplo os trabalhos desenvolvidos recentemente na Garganta de Olduvai (Tanzânia)
para prospecção de sítios geologicamente orientada (Blumenschine e Masao, 1991; Blumenschine e Peters,
1995).
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Talvez, a diversidade e a quantidade de vestígios preservados nos abrigos de


Serranópolis só poderá encontrar similar, em outras regiões, nos acampamentos à céu
aberto. Alguns poucos sítios enterrados, descobertos uma vez expostos pela erosão, em
Goiás (Prous e Fogaça, 1999) e no Distrito Federal (Fogaça, org., 1997), sustentam, na
minha opinião, a validade de futuros projetos de prospecção concebidos para dar
prosseguimento ao estudo do povoamento no centro do Brasil.

Talvez as condições de conservação naqueles terrenos ácidos do Planalto Central


não forneçam a mesma riqueza de dados que os abrigos calcários e areníticos. Mas ainda
que nos restem apenas as indústrias líticas, muito poderá ser dito sobre os seus autores.
Desde que aproveitemos os importantes avanços teóricos e metodológicos obtidos pela
tecnologia lítica desde um século. Introduzo assim o tema do segundo desafio que
destaquei anteriormente.

UMA TRADIÇÃO DENOMINADA ITAPARICA

Gostaria inicialmente de lembrar que todo o arcabouço cronológico construído para


as culturas do Paleolítico europeu (estabelecido primeiramente no norte e sudoeste da
França, de onde derivaram as denominações continentais: acheuléen, moustérien,
magdalenien etc) foi fundamentado em dados escavados tanto em abrigos, quanto em sítios
abertos, e até a primeira metade do século XX, antes da invenção dos métodos de datação
radiométrica. Esse arcabouço ainda é o mesmo. Modificaram-se as durações de certas
culturas, precisaram-se variações culturais no interior de um dado período, desenvolveram-
se metodologias de escavação e de análise dos dados. Mas as culturas musterienses
permanecem musterienses, os magdalenenses continuam lá, caçando suas renas às
margens do rio Sena.

Destaco esse exemplo para frisar que dificilmente pode haver na ciência boa crítica
que não seja construtiva. E que, conforme Gallay (1986), o conhecimento arqueológico pode
ser acumulativo. Não basta tentar substituir os paradigmas interpretativos. Um novo
entendimento deve não somente basear-se em novos fatos (daí a importância das
descobertas em setores do conhecimento incipientes) como também mostrar-se capaz de
explicar os fatos antigos.

Dois conceitos importantes, desenvolvidos nos trabalhos arqueológicos e etnológicos


voltados para a tecnologia humana, são os conceitos de escolha e opção cultural. Servem
para diferenciar os grandes princípios tecnológicos de uma cultura (as ‘escolhas’) das
variações espaciais ou temporais (as ‘opções’) que podem, estas últimas, surgir dentro dos
limites das escolhas efetuadas e dos determinismos circunstanciais. Todos os dias
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vivenciamos esses fenômenos: as culturas do ocidente escolheram servir-se à mesa de


garfo e faca, mas inúmeras opções se manifestam quanto às matérias primas desses
artefatos, suas dimensões, estilos etc. Apesar das diferentes culinárias ocidentais,
estabelecemos em comum uma mesma relação com os alimentos, que devem ser cortados
e perfurados durante o seu consumo.

Existe em todo o Planalto Central brasileiro um fenômeno análogo, que pode ser
abordado como uma escolha cultural: a produção de suportes unifaciais para instrumentos
líticos. Tal escolha é melhor compreendida quando comparamos essas indústrias com
aquelas, aproximadamente contemporâneas, conhecidas no sul do Brasil: as indústrias
denominadas Umbu e Humaitá4 (cf., por exemplo, Hoeltz, 1997). Enquanto que os
caçadores meridionais concebiam seus artefatos sobre duas ou três faces do suporte, em
todo o centro do Brasil as soluções adotadas concentraram-se sobre a modificação apenas
de uma das faces de robustas lascas, eventualmente laminares.

Nas camadas VIII e VII da Lapa do Boquete (vale do Peruaçu), foram adotadas
complexas estratégias de reaproveitamento de artefatos, sempre mantendo-se a face lisa
preservada (apenas em alguns casos com negativos rasantes periféricos de refrescamento
dos gumes). A opção pelo prolongamento da vida útil dos suportes não ultrapassou os
limites da escolha tecnológica dos grupos planaltinos (Fogaça, 2001a).

Um exame detalhado de instrumentos meridionais e do Planalto Central permite


verificar que as mesmas necessidades (raspar, cortar, limar, perfurar etc) foram satisfeitas
segundo conceitos totalmente distintos. Muitas vezes, encontramos em diferentes setores
das peças bifaciais (Humaitá) as mesmas extremidades funcionais encontradas nas
extremidades dos artefatos unifaciais (lesmas e os chamados raspadores plano-convexos):
extremidades arredondadas obtidas por retoques abruptos e semi-abruptos, paralelos,
adjacentes a retoques laterais (em uma das bordas) com delineamento convexo ou retilíneo
e formando ângulos menos abruptos. Mas certamente em cada região o funcionamento
dessas partes ativas dependia de gestos de utilização diferentes; os suportes bifaciais, em
média, são muito mais pesados que os unifaciais. Por outro lado, o prolongamento da vida
útil de um suporte unifacial dependia de uma importante modificação volumétrica,
implicando muitas vezes na produção de uma parte ativa distinta, enquanto que nos
instrumentos bifaciais do sul, esse prolongamento poderia ser obtido pelo aproveitamento de
uma outra face, pela transferência da parte ativa para um outro setor do suporte.

4
Tive recentemente a oportunidade de examinar parte do material atualmente estudado por Sirley Hoeltz para o
seu doutorado. As observação que apresento foram autorizadas pela pesquisadora, a quem agradeço.
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É importante frisar que tais diferenças nada devem a determinismos da matéria


prima ou a exploração de ambientes distintos, posto que se manifestam muito mais na
concepção dos suportes do que nas extremidades ativas. Daí a pertinência de considerá-las
como escolhas culturais.

Num patamar um pouco mais analítico, podemos perceber em todas as indústrias


divulgadas do Planalto Central (no início do povoamento) quatro grupos tecnológicos de
instrumentos retocados:

(a) os instrumentos unfaciais sobre lascas robustas: são artefatos modificados


lateralmente que comumente preservam partes do suporte original sobre a face superior
(nervuras longitudinais ou superfícies lisas); a extremidade distal recebe delineamento
variável (ogival, semi-circular, convergente em ponta axial ou desviada); tais instrumentos
parecem ser concebidos visando uma longa vida para o suporte, são paulatinamente
transformados, muitas vezes até o total esgotamento dos ângulos de retoque (essa
estratégia é notavél no material da Lapa do Boquete, onde os artefatos assumem volumes
plano-convexos, triangulares, trapezoidais, conforme a estratégia de reaproveitamento e as
características originais da lasca-suporte; parece-me que em Serranópolis, por exemplo, tais
instrumentos reaproveitados sejam minoritários, pode-se pensar que as modalidades de
ocupação dos abrigos, distintas em cada área, assumam um papel determinante na gestão
dos instrumentos);

(b) as lesmas : de maneira um pouco diferente do que propõe o Prof. Schmitz,


considero pertencente a esse grupo apenas um conjunto restrito de artefatos que possuem
características tecnológicas bem particulares e que não se prestam a reformas
padronizadas: são, de fato, peças com face inferior absolutamente lisa, uma vez que são
eliminadas as curvaturas da face inferior; tais artefatos respondem a um rígido conceito
plano-convexo que se manifesta na elaborada modelagem da face superior; essa
modelagem é obtida por retiradas invadentes que tendem a ultrapassar a metade axial do
suporte a partir de ambos os lados; as partes proximais (talão e bulbo) podem ser
eliminadas, sem deixar praticamente nenhum resquício na peça final; o resultado final é um
instrumento simétrico segundo ambos os eixos; em uma indústria do norte de Goiás,
recuperada em um sítio a céu aberto às margens do rio Tocantins (região da Serra da
Mesa), essas lesmas compõem a maioria dos instrumentos (Fogaça, org., 1991; Prous e
Fogaça, 1999).

Acho importante estabelecer essas duas categorias no interior das indústrias ‘plano-
convexas’ (ou unifaciais) pois somente as lesmas, ao meu ver, parecem ser bons
marcadores desses períodos antigos: em um estudo realizado sobre indústrias recentes dos
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abrigos do vale do rio Peruaçu (Prous, Fogaça e Alonso, 1995) percebeu-se o


reaparecimento em níveis arqueológicos recentes de instrumentos unifaciais robustos, agora
associados a pré-formas de lâminas de machado e à horticultura. Tanto os instrumentos
quanto os detritos de fabricação podem, em certa medida, ser confundidos com material
antigo.

(c) instrumentos pouco elaborados, oportunísticos: são geralmente lascas retocadas


parcialmente (debitadas ou detritos da produção dos instrumentos robustos), sem
modificação de seu volume original; ao caracterizarmos uma coleção recuperada no Abrigo
do Boquete, os denominamos Instrumentos de ocasião (Fogaça, Sampaio e Molina, 1997;
Fogaça, 2001a); esses instrumentos não expressam conceitos apriorísticos, respondem a
necessidades circunstanciais e suprem as necessidades de gumes cortantes, perfurantes e
para reentrâncias (coches), já que nos instrumentos unifaciais e nas lesmas as partes ativas
são semi-abruptas e abruptas; no vale do Peruaçu, essa categoria persiste nas fases
posteriores de ocupação (fase Serranópolis, em Goiás), podem assim nos informar se o
desaparecimento dos instrumentos ‘típicos’ se deve ao deslocamento espacial das
atividades ou a mudanças tecnológicas mais profundas;

(d) peças bifaciais foliáceas: com base no estudo de lascas provenientes das
camadas antigas da Lapa do Boquete (Fogaça, 2001a), considero a existência de bons
indicadores da produção regular de pequenas peças bifaciais, essencialmente pontas de
14
projétil foliáceas; na camada VII daquele abrigo (datações C entre 10.500 e 9.500 B.P.) foi
recuperado apenas um fragmento, porém em associação com detritos especiais; em uma
coleção de 4988 lascas analisadas, 1844 peças foram interpretadas como detritos desse
tipo de trabalho, classificadas em cinco grupos tecnológicos; são, em geral, lascas delgadas
com talão linear ou puntiforme, em muitos casos com perfil helicoidal, nas faces superiores
observa-se negativos de retiradas centrípetas provenientes de todas as direções
(característica típica das chamadas ‘lascas de biface’); apesar de que tais lascas dificilmente
poderiam provir dos instrumentos unifaciais e lesmas conhecidos, permanece intrigante a
pouca quantidade de pontas recuperadas nos abrigos do Planalto Central; os indícios a céu
aberto são mais numerosos, mas não podem ser relacionados com os abrigos devido à falta
de datações: em Serranópolis (Schmitz, inédito), no alto curso do rio Paranã (Mendonça de
Souza; Ferraz, e Mendonça de Souza, 1977; Mendonça de Souza; Simonsen, e Passos
Oliveira, 1983-84), no alto Tocantins (Simonsen, 1975), na Serra do Cipó (Prous e Malta.
Coord., 1991) e, ainda que questionável, em Lagoa Santa (Walter, 1958; Hurt e Blasi, 1969).

Mas penso que ainda é pouco para caraterizar em definitivo a tradição tecnológica
Itaparica. Resta-nos um longo caminho até podermos conhecer a sua gênese e seu
desenvolvimento ulterior.
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Um entendimento da gênese tecnológica e do desenvolvimento dessa tradição (que


poderá apontar para a existência de grupos ainda mais antigos) depende do
reconhecimento das filiações entre as indústrias Itaparica. Estamos iniciando atualmente um
projeto de pesquisa nesse sentido (Fogaça, 2001b). Consideramos que a indústria lítica
antiga do Planalto Central brasileiro dependeu de um sistema de produção lítico (conforme
define Boëda, 1997) centrado na debitagem (a adequação e exploração de núcleos para
produção de suportes robustos). A debitagem foi predominante sobre o façonnage (talhe ou
modelagem). Sem suportes robustos e longos não seria possível produzir (por façonnage)
os instrumentos em conformidade com as normas técnicas que os definem. Desta forma, as
variações significativas, transformações da tecnologia tradicional, desaparecimento da
tradição etc, – regionais ou temporais – deverão ocorrer prioritariamente na exploração de
núcleos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Finalizo essa intervenção frisando que os comentários que aqui expus visam
essencialmente destacar o potencial para a pesquisa futura oferecido pelos dados e os
estudos já realizados sobre o povoamento do Planalto Central do Brasil. Minha intenção é
incitar a discussão sobre o porvir dessa arqueologia. Penso que os desafios que destaquei
propõem uma reflexão metodológica, única capaz de dar um prosseguimento construtivo à
investigação.

Os sítios pré-históricos já pesquisados, em Goiás, Minas Gerais ou no Nordeste, podem


ser abordados como verdadeiros laboratórios: Serranópolis oferece abundante matéria
prima lítica, imediatamente disponível; no vale do Peruaçu, as rápidas ocupações dos
abrigos implicaram em pouca quantidade de instrumentos de pedra; nos grandes ateliês à
céu aberto uma diversidade de categorias (núcleos, instrumentos retocados, detritos
variados) pode ser relacionada.

Evidentemente, a pesquisa não se restringirá ao lítico. Este seria um primeiro incitador,


um enfoque provocador de outras pesquisas. Acredito que o fundamental é termos em
mente a responsabilidade da empreitada: naquela vasta região da América do Sul está
registrado parte dos testemunhos da última grande aventura no planeta do gênero Homo. O
interesse é portanto de toda a humanidade.
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