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BETANIA TANURE DE BARROS

MARCO AURÉLIO SPYER PRATES

0 ESTILO
í

li

A O D O M C A B R A L
GI A EMPRESARI AL
U N IE U R O
Procedim entos a serem observados ao u tiliz a r livro s:
• Não m an use a r livro s ou docum entos com as mãos sujas;
• M antê-los longe de plantas; aqu á ticas, guarda-chuvas,
capas m olhadas ou q u a lq u e r tipo de líq uido ;
• Não fu m a r ou re a liz a r refeições ju n to aos livro s ;
• Não u sar fita s adesivas,/ colas plásticas, gram pos e clipes
m etálicos nos d o cu m e n to s;
• Nunca u sa r ca rim b o s.
• Ja m a is u s a r caneta m a rc a -te x to , esferog rá fica ou
lápis, para fa z e r anotações, ou s u b lin h a r pa rtes do
texto. L e m b re -s e o liv ro é da com u nida de e não de uso
exclusivo se u. S u a s anotações so m e n te in teressa m a
você e não ao p ró x im o aluno que u tiliza rá a obra.
• Não faze r ano taçõ e s partiqplares em papéis avulsos e
colocá-los e n tre as p ág in a s de um liv ro . Eles deixarão
m arcas;
• Não dobrar o papel (o re lh a s), pois ocasiona o rom pim ento
das fib ra s use m arcadores próprios para liv ro s ;
• Ja m a is , nunca, em h ipótese algum a a rra n q u e ou
rasque pá gina s dos livro s.
• Não c a rre g a r o liv ro de q u a lq u e r form a , jo g a d o -d e n tro do
carro ou m o ch ila s;
Nunca m o lh a r os dedos com líquidos para v ira r as páginas
do livro, e sp e cia lm e n te com a sa liva , que é ácida e deteriora
o papel com o te m p o . O ideal é v ira r pela p arte su pe rio r da
folha;
• Não a p o ia r os co tovelos sobre os docum entos;
Não co la r in fo rm a çõ e s adicionais aos livros, mesmo que
sejam de g ra nd e im p o rtâ n c ia para sua prova.
N° Registro 008300
Data. 04/1211999

O ESTILO
BRASILEIRO DE
ADMINISTRAR
th;
nr
EDITORA ATLAS S.A.
Rua Conselheiro Nébias, 1384 (Campos Elisios)
Tel.: (011) 221-9144 (PABX)
01203-904 São Paulo (SP)
BETÂNIA TANURE DE BARROS
MARCO AURÉLIO SPYER PRATES

O ESTILO
BRASILEIRO DE
ADMINISTRAR

SÃO PAULO
EDITORA ATLAS SA. - 1996
N.” 8300 23/03/97
© 1996 by EDITORA ATLAS SA.
Rua Conselheiro Nébias, 1384 (Campos Elísios)
01203-904 São Paulo (SP)
Tel.: (011) 221-9144 (PABX)
(q ZZ^ Í)

ISBN 85-224-1470-X

Impresso no Brasil/Printed in Brazil

Depósito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto ne 1.825, de 20 de dezembrc


de 1907.

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - É proibida a reprodução total ou parcial, ct


qu alq u er form a ou po r qualquer meio. A violação dos direitos de au to r (Lei n‘
5.988/73) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Capa e Ilustrações: Roberto de Castro Polisel

Editoração Eletrônica: DIAGRAN - Assessoria Editorial e Produção Gráfica

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Barros, Betânia Tanure de


O estilo brasileiro de administrar / Betânia Tanure de Barros, Marco Aurélio
Spyer Prates. São Paulo : Aüas, 1996.

Bibliografia.
ISBN 85-224-1470-X

1. Administração de empresas - Brasil 2. Cultura organizacional - Brasil 3.


Gerência - Desenvolvimento - Administração I. Prates, Marco Aurélio Spyer. II.
Título.

96-1034 CD D-658.00981

índice para catálogo sistemático:


1. Brasil : Empresas : C ultura organizacional : Administração 658.00981
Dedico este livro à
TANIA
pela sabedoria da compreensão e
certeza de suas futuras vitórias

Spyer

À minha mãe pela sabedoria e a


meu pai que tanto me ensinou
a lutar para construir um
país mais justo

Betânia
SUMARIO

.gradeamentos, 5
Atmrsentação, 9
P^fácio, 11

CONCEITOS BÁSICOS, 13
1.1 Estilo e cultura, 13
1.2 Sociedade e cultura, 15
1.3 Classificações da cultura, 17
1.4 Riscos metodológicos, 19
1.5 Conclusão, 21

SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO, 23


2.1 Abordagens da cultura brasileira, 24
2.2 Um novo m odelo de interpretação da cultura brasileira, 26
2.2.1 Subsistema dos líderes, 31
2.2.2 Subsistema institucional, 44
2.2.3 Subsistema pessoal, 57
2.2.4 Subsistema dos liderados, 66
2.3 Conclusão, 70

5 IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL, 73


3.1 Processo de formulação de estratégias, 75
3.2 Processo decisório, 79
O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

3.3 Processo de liderança, 85


3.4 Processo de coesão organizacional, 90
3.4.1 Estrutura, 94
3.5 Processo de inovação e m udança, 98
3.6 Processo de motivação, 102
3.7 Conclusão, 105

4 MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL, 107


4.1 O caso da M étodo Engenharia, 107
4.2 Os anos 70, 108
4.3 Primeiros movimentos de m udança, 109
4.3.1 Início do processo de m udança, 111
4.4 Im plem entação da m udança, 115
4.4.1 Desconcentração do poder, 116
4.4.2 Ampliação da lealdade às pessoas, 118
i
4.4.3 M udança do mecanismo de controle das incertezas, 119
4.4.4 Prevenção contra o personalismo, 121
4.4.5 Diversidade de opiniões sem geração de confronto, 122
4.4.6 Formação de agentes e cidadãos empresariais, 124
4.4.7 Flexibilidade pelo bem comum, 126
4.4.8 Festas que reforçam o p ertencer e a igualdade, 127
4.4.9 Não ao paternalism o, 127
4.4.10 Não à im punidade, sim à premiação, 129
4.5 Uma avaliação atual e perspectivas, 130
4.6 Conclusão, 139

5 RECRIANDO O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR, 141

Bibliografia, 145
APRESENTAÇÃO

O Estilo Brasileiro de Administrar é um livro que veio para exercer forte


influência entre os que se interessam pela questão gerencial e pelo desenvolvi­
m ento da em presa no Brasil.
O brasileiro tem um estilo próprio de adm inistrar. Esse estilo “não é qual­
quer um, nem tam pouco vários outros am ontoados entre si. É único e original”.
Lssa é a conclusão dos autores. Eles, no entanto, são prudentes: a conclusão não
fecha o assunto. Ao contrário, cria espaço para desdobram entos que eles - ou
outros - deverão explorar.
Num terreno em que é difícil fazer afirmações definitivas, eles se valem de
trabalhos consagrados, comprovam seus pressupostos em pesquisas, ju n to a mais
de 2.500 executivos brasileiros e exploram as hipóteses em um a em presa já lau­
reada com o título de em presa do ano.
Não só assumem a conclusão, mas definem a que serve: referências cultu­
rais tipicam ente brasileiras aos dirigentes de empresas brasileiras às voltas com
m odelos criados em outros países e aos de multinacionais de outros países que
procuram m elhores resultados em sua ação gerencial no Brasil.
O leitor reconhece essas expressões?

1. M anda quem pode, obedece quem tem juízo.


2. O cidadão vai ter que esperar um pouco.
3. Deixa com o está para ver como é que fica.
4. Você sabe com quem está falando?

Tão com uns aos nossos ouvidos, essas expressões ficam mais fáceis de ser
entendidas depois da leitura dessa obra. Não que ela seja simplesmente um a in-
10 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

terpretação do seu significado. Ao contrário, seus autores penetram em questões


profundas ligadas à concentração de poder, ao personalism o e ao paternalism o,
à postura de espectador, ao formalismo e à im punidade que, segundo eles, são
elem entos centrais da “personalidade” da gerência brasileira.
Os dois autores, de cuja convivência desfruto na Fundação Dom Cabral,
destilaram esse trabalho ao longo de estudos, discussões, pesquisas e leituras que
são m encionadas no texto. Por conhecê-los, arrisco revelar algo não dito e que
o leitor precisa conhecer: essa obra foi concebida na rota Itu - Belo H orizonte
- Fontainebleau. Essa é a rota do Program a de Gestão Avançada (PGA) que cen­
tenas de altos dirigentes têm percorrido desde 1990 à procura de instrum entos
gerenciais p ara to rn ar suas empresas competitivas m undialm ente. O PGA é o re­
sultado da parceria entre a Dom Cabral e o INSEAD, um a das mecas da adm i­
nistração m o d ern a, com apoio das em presas associadas ao CTE - C entro de
Tecnologia Empresarial. Isso significa que os professores Betânia T anure de Bar-
ros e M arco Aurélio Spyer Prates testaram suas hipóteses num dos am bientes
mais exigentes da arena gerencial.
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PREFACIO

Este livro é resultado de um conjunto de ações que inclui estudos e cinco


^r.os de observação sistematizada do com portam ento das organizações. A m aio­
ria dos estudos realizados baseou-se em entrevistas, em grupos de discussão e es-
rudos em p írico s. A o p o rtu n id a d e de, n este p e río d o , in te ra g ir com 2.500
executivos que participaram dos program as de desenvolvimento da Fundação
D >m Cabral - FDC e de congressos nos quais apresentam os nossas reflexões, nos
ie u a certeza de que as questões tratadas neste trabalho têm eco na prática das
: rranizações brasileiras.
O utro aspecto a ressaltar é o interesse m ultifuncional pelo tema, o que fi-
u m uito evidente com a participação das instituições ANPAR, SPE, ABTD e
IBLF. através de seus associados, nas pesquisas e nos grupos de discussão.
Na origem deste livro algumas pessoas tiveram papéis im portantes: o antro-
pólogo R oberto Da M atta e nosso colega Ulisses Ferreira Diniz, que conosco
: r.struíram as prim eiras idéias em torno do m odelo cultural brasileiro. Uma
—e nção especial aos colegas e amigos Domingos M uchon e Paulo Roberto Gar-
Lemos, que, durante a passagem p o r este m undo, partilharam , contribuíram
e drvulgaram as idéias constantes neste livro. A nossos colegas M ozart Pereira
i : s Santos e Solange da Costa Pinto, que leram e criticaram os originais deste
fe ro e a Seníria, que, ao longo destes anos, com paciência e com petência nos
apoiou nos aspectos administrativos.
Coube à equipe da M étodo Engenharia, desde seus acionistas até os ope­
rários, coordenados p o r Oscar Vicente Simões de Oliveira, proporcionar-nos
ama oportunidade única de verificar em profundidade a aplicabilidade de nos-
>: m odelo em um caso de m udança organizacional.
D urante estes anos de trabalho tivemos contato constante com o A ndré
L^urent, professor do INSEAD, com quem discutimos nossas hipóteses e que
12 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

nos aportou dados de pesquisas internacionais realizadas p o r ele e sua assistente


M ariane Ugé, sobre cultura de organizações instaladas em diversos países.
Finalm ente, é preciso destacar que este trabalho se insere no contexto de
desenvolvimento de pesquisas patrocinadas pelo CTE - C entro de Tecnologia
Empresarial, da Fundação Dom Cabral, o que perm itiu sua viabilização.

Os Autores
1
CONCEITOS BÁSICOS

1.1 ESTILO E CULTURA

Nosso objeto de análise é a administração. Sua natureza não é física, é pre-


j:m :n a n te m e n te hum ana. E para transform ar a natureza hum ana é preciso im-
Dfr.mir um estilo. C onfigura um estilo um a m odificação de algo em estado
■amral, feita de form a seletiva e padronizada, que produza um a representação
zzra.c terística e diferenciada das demais.
O estilo brasileiro de adm inistrar não é qualquer um, tam pouco vários ou-
r ;> am ontoados. E único e original, criado, em um processo de transformação,
por nossos dirigentes, gerentes e todos os outros colaboradores envolvidos no
íe^afio cotidiano de adm inistrar nossas organizações. Descrever a form a e os
=«:<ios da prática brasileira de lidar com seus negócios é o desafio deste livro.
Qual é a im portância desta tarefa?
Havia nos anos 50 e 60 um a premissa básica em relação à universalidade
da aplicação eficien te de con ceito s de ad m in istraç ão nas em presas, inde-
r^ rd e n te de seu am biente nacional.
O surgim ento das operações m ultinacionais e multiculturais explicitou de
forma inequívoca a im portância do caráter e da identidade nacionais, à m edida
zue o econôm ico não conseguia sobrepujar o social e o cultural.
A tualm ente, ao mesmo tem po em que se procura unificar políticas econô­
micas em níveis m acrorregionais, surgem barreiras sociais e culturais no nível
das nações.
Como se integram os trabalhadores dos países europeus fora de seu país de
: ngem? Será possível haver um a lei européia com tribunais especiais para apli-
:á-la da m esm a forma?
14 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Parece que a tendência é exatam ente no sentido do reconhecim ento da


identidade das nações, que se diferenciam em vários aspectos e que têm, cada
vez mais, a consciência do significado de em preendim entos multiculturais entre
suas empresas.
Assim, em um m undo cada vez mais econom icam ente internacionalizado,
é fundam ental para a sobrevivência de cada um a das sociedades reconhecer sua
p rópria identidade cultural para m anter relações interdependentes produtivas.
E essas relações se fazem de forma expressiva através das empresas de cada país.
Nossa perspectiva tem dois objetivos: oferecer elementos e parâmetros cul­
turais brasileiros que possam ser considerados pelos dirigentes nacionais em de­
cisões de implantação de modernas formas de gerenciamento criadas em outros
países e pelos dirigentes de multinacionais de outros países, para se adequarem
com maior consciência à nossa cultura e obterem melhores resultados em sua
ação gerencial.
Nossa premissa básica é de que a empresa, além de ser vista como uma uni­
dade econômica, em sua função empreendedora e produtiva, deve ser entendi­
da tam bém com o uma u n id ad e so cio cu ltu r a l, p alco de fe n ô m e n o s de
socialização e de aculturamento. E como tal, expressa no conjunto de suas re­
lações um a série de valores, estruturas e processos vigentes na cultura e na so­
ciedade brasileira.
O utro não é o entendim ento de G uerreiro Ramos (1983) que, analisando
os elem entos de um fato administrativo, descreve a sociedade como um com po­
nente de estruturação da organização. Diz ele: "As empresas, qualquer que seja
a escala, refletem invariavelmente as características, os estados, estágios, conjun­
turas e a estrutura da sociedade” na qual estão inseridas.
Tam bém Roberto DaMatta (1990) tem o princípio de que "os valores cul­
turais se exprim em em tudo que a sociedade produz, de sorte que é possível as­
sum ir que as empresas de um dado sistema social são - tal como ocorre com a
música, com a literatura, com a política e com a família - expressões desta so­
ciedade".
Porém , nestes espaços, vive o hom em que tem suas atitudes e com porta­
m entos que refletem avaliações de riscos e expectativas individuais e próprias,
fundam entados em sua personalidade.
P o rtanto, vários fenôm enos culturais, sociais e psicológicos interagem e
criam um a dinâm ica de com plexo entendim ento e, com certeza, com poucas
possibilidades de tratam ento puram ente objetivo, o que é peculiar das ciências
sociais.
Neste m om ento, não pretendem os tratar com a mesma profundidade to­
dos estes aspectos. A ênfase é a vertente da antropologia cultural, onde estare­
mos focando os traços culturais brasileiros e sua dinâm ica de funcionam ento/
CONCEITOS BÁSICOS 15

Na análise da dinâm ica que ocorre entre os traços identificados, haverá tam bém
um a contribuição da psicossociologia, auxiliando o entendim ento do com por­
tam ento de um grupo quando afetado por outro.
Mesmo sabendo da ação determ inante e determ inada entre os aspectos cul-
rurais e a personalidade individual e de sua im portância para m elhor form atar
'o estilo brasileiro de administrar", reservamos esta vertente para um a comple-
m entação futura. Aspectos mais psicológicos, como o narcisismo, o m edo ou a
megalomania dos brasileiros, poderão ser citados apenas com a intenção de um
registro oportuno.

1.2 SOCIEDADE E CULTURA

O hom em e seus semelhantes estão constituídos em sociedades, um agre-


rado h um ano que tem alguns princípios com uns que lhe dão organicidade e
um padrão de relacionam ento relativamente duradouro de associação. O resul-
—do é um a sociedade original, no tratam ento do cotidiano.
Para m elhor caracterizarmos a relação da cultura com a sociedade, vejamos
caso das abelhas ou das formigas. Além dos seres hum anos, estes animais,
c :>mo outros, tam bém têm um a vida social. Podemos reconhecer que estão to­
dos voltados para um objetivo com um de sobrevivência, trabalhando organiza-
-iamente com um a divisão de tarefas bem delineada entre zangões, operárias,
soldados, machos, fêmeas e rainha. Sua colônia tam bém apresenta um a estru-
t ora em que se diferenciam os quarteirões ativos e seus arm azéns p ara ovos.
Tam bém se relacionam de form a p red eterm in ad a e sua origem , até o n d e se
?abe, é de ordem genética. Este com portam ento padronizado é fruto de um
aprendizado com as formigas adultas.
Q uerem os, com isto, ressaltar que a cultura não é geneticam ente predeter­
m inada. Excluem-se do conceito cultural as respostas instintivas dadas pelos
membros da sociedade, pois a cultura é o resultado da invenção social e é trans­
m itida e apreendida som ente através da interação, do processo de com unicação
e do aprendizado. Por isso, em um agrupam ento com o o das formigas, cujos
com portam entos têm origem genética, não se pode considerar que exista um a
ultura específica, m uito m enos a possibilidade de sua evolução.
Para o hom em , é preciso considerar sem pre a colocação de H oebel (1990):
"O hom em é o único animal que fala de sua fala, pensa o seu pensam ento, que
responde à sua pró p ria resposta, que reflete seu próprio reflexo e é capaz de di-
rerenciar-se mesmo quando está se adaptando a causas com uns e estímulos co­
muns."
O hom em , quando tem um a necessidade, busca superá-la. Ao fazer isto, es­
tará dando um a resposta a esta dem anda, mas, tam bém , estará, ao seu jeito, pra-
16 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

ticando um ato seguram ente baseado em padrões de com portam ento apreendi­
dos e que não são o resultado apenas da herança biológica.
As várias sociedades hum anas encontram modos diferentes de fazer as mes­
mas coisas e esta construção única e peculiar im pacta o processo de socialização.'
Este ocorre através da vivência das norm as que são formadas e repassadas de ge­
ração em geração, quando se conhecem as escolhas, o que deve ser incluído ou
excluído nos modos de agir, pois existe um acordo tácito e, às vezes, até incons­
ciente, en tre os m em bros das sociedades no sentido de não perm itir com porta­
m entos conflitantes com aquele estilo de vida.
Estas colocações podem induzir a um a noção essencialm ente estática da
cultura de um a sociedade. Reforça esta noção a atitude de vários m em bros da
sociedade que se utilizam da cultura como um instrum ento de defesa quando
suas ações são criticadas. É típica a citação: "Não dá para m udar porque isto é
cultural." Esta reificação da cultura, ou seja, torná-la a única responsável pelos
acertos ou fracassos de um a sociedade, não corresponde à realidade dos fatos.
Para dem onstrar o lado dinâmico da cultura, podem os recorrer a um prin­
cípio clássico de Hegel: "A história jam ais nos deu o exem plo de um m ovimento
social que não contivesse os germes de sua negação - negação essa que se faz
necessariam ente d entro do mesmo âmbito."
Com o já citamos, a cultura é o resultado de um a invenção social, ou seja,
um a estrutura de significados socialmente estabelecida, e traz, pois, o germ e, se
não da negação, pelo m enos de sua transformação, dando-lhe a possibilidade de
m udança ao longo dos tempos.
Isto tudo p orque os costumes estão referenciados a um conjunto de valores
e crenças aceitos pela sociedade. E estes valores e crenças podem ser influencia­
dos p o r novos movimentos culturais, econômicos, sociais e políticos. Não fosse
isto possível, estaríamos ainda adm irando, conform e Linton (1987), "a beleza
das formas torneadas das m ulheres dos anos 50", em contraposição ao m odelo
"esguio de magreza pontiaguda" das m ulheres da atualidade, ou para citar um
m ovim ento econôm ico, teríamos perpetuado a m archa irreversível para o socia­
lismo, sem perceber o atual avanço "da onda liberalizante que em erge dos es­
com bros do próprio socialismo".
O u tro exem plo em termos de movimentos sociais mostra-nos que as aspi­
rações sociais dos m em bros de um a sociedade urbana, aquela que tem a cultura
das cidades, voltaram-se ao consumismo de produtos e que o trabalho vem sen­
do substituído pelo lazer e, onde a qualidade de vida começa a ser privilegiada,
m ud an d o o eixo dos valores.
O que temos é um processo recorrente vivo, entre a sociedade e a cultura,
em que seus m em bros agem e manifestam a cultura que, em dado tem po, lhes
im prim e um padrão de com portam ento particular, mas que se transform a em
função do funcionam ento desta mesma sociedade ou de outras, num a perspec-
CONCEITOS BÁSICOS 17

tiva tem poral mais longa. Convivem o tradicional e o novo, estabelecendo am­
bos um a troca dinâm ica de elem entos até um novo estado de equilíbrio.

1.3 CLASSIFICAÇÕES DA CULTURA

Dois aspectos preocupam , do ponto de vista mais operacional, para o apro­


fundam ento do estudo da cultura de um a sociedade: o inventário de seus traços
e a estrutura de seu funcionam ento.
Novamente se tem ambas as questões: seu aspecto mais estático e seu aspec­
to dinâm ico. A prim eira tarefa é básica e mais simples, se com parada com a se­
gunda. Resume-se à identificação e classificação dos elem entos, colhidos pela
observação da vida social e que possam caracterizar um a sociedade com seus ele­
m entos mais significativos.
Porém , mais complexo é com preender a dinâm ica existente entre os diver­
sos traços. Isto será conseguido à m edida que os traços culturais inventariados
possam com por um sistema integrado em que o conjunto de todas as partes
constitua um arranjo original e único de inter-relação.
Para selecionarm os traços significativos, é preciso conhecer algumas formas
de identificá-los. A base são alguns postulados existenciais ou crenças a respeito
d a n atu reza da existência. Neste m om ento, estão em questão a n atu reza do
m undo exterior e a do próprio hom em .
H á tam bém os pressupostos relativos à b o n d ad e/m ald ad e das coisas/atos
que devem ser buscados ou rejeitados. Estes são cham ados postulados norm ati­
vos ou valores orientativos.
O utras alternativas existem, cada qual revelando vantagens e desvantagens.
N orm alm ente se diferenciam , na tendenciosidade da am ostra em relação ao
universo, ou são questionadas na validade para a com paração das culturas, a par­
tir de um a estrutura preestabelecida. Dificilmente se conseguirá um só esquem a
que seja extensivo, não tendencioso, que possibilite com parações interculturais
e seja de simples aplicação.
O esquem a mais simples, que se baseia em um a lista de traços orientados
por valores típicos, como existentes em todas as culturas, elim ina a grande es­
sência da cultura, que é sua natureza diferencial entre as sociedades. Um esque­
m a m ais e la b o ra d o p a r te de c o n ju n to s a n a lític o s p re e s ta b e le c id o s q u e
representariam um a tipologia com pleta de sistemas culturais, mas nesta situação
deve-se estar atento para que sua utilização futura se faça com senso crítico.
Desta forma, elegemos um a dessas classificações, que será seguida apenas
com o um m apa geral, porém , não o esgotando. Tam bém não nos limitaremos
18 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

a seus subsistemas integrados, de form a linear e onde os traços teoricam ente de­
veriam corresponder-se dentro de um a única tipologia.
T en d o p o r premissas estes graus de liberdade, três esquem as nos foram
bastante útéis na construção de um sistema cultural brasileiro e nos perm itiram
um a com paração com culturas de outras nações.

1. O mais genérico e amplo foi o de C ondon (1979), adaptado do esque­


m a do antropólogo Kuckhon. Ele considera que os valores que defi­
nem os traços culturais têm duas grandes vertentes. Aqueles que são
orientativos, como já foi dito anteriorm ente, detêm um a carga de bon­
dade ou m aldade e dizem o que é certo ou errado fazer, tendo, por­
tan to , caráter norm ativo e se p restando à avaliação. Os outros são
aqueles que revelam m uito mais um a crença e não separam o verda­
deiro do falso.

Os prim eiros estão ligados a questões do indivíduo, enquanto um ser


p róprio, e a questões da sociedade, com um a área de sobreposição
que trata dos aspectos da família. O segundo está relacionado às ques­
tões da natureza, que apresentam sobreposições com o cam po do ser
próprio, onde se contem plam aspectos de ordem cósmica, e com o
cam po da sociedade, que privilegia aspectos da natureza hum ana.

2. Um segundo esquem a de leitura da cultura nos é dado p o r Bolinger


e H ofstede (1987); sua m aior preocupação é a com paração de cultu­
ras de vários países, baseando-se em quatro pares de elementos: indi­
vidualidade/coletividade, m asculinidade/fem inilidade, distância do
p o d er/ig u ald ad e e controle da incerteza/certeza.

3. Um terceiro, de grande utilidade, pelo foco que estabelece em dois es­


paços reveladores da cultura brasileira, foi definido p o r Roberto Da-
M atta (1 9 8 7 ). Ele se re fe re ao esp aço da "rua" e da "casa". Ao
prim eiro, relaciona o conceito de indivíduo e igualdade; ao segundo,
associa pessoa e hierarquia. Mostra, ao mesmo tem po, a oposição exis­
tente entre estes elementos, mas também as várias características rela­
cionais que se estabelecem entre estes opostos.

O modelo de leitura cultural por nós desenvolvido fixou-se em dois eixos:


o do espaço institucional/pessoal e o do espaço líder/liderado, que introduz um
corte político para melhor compreensão da dinâmica da sociedade. Este modelo
é descrito no Capítulo 2 e constitui a base de análise para todo o nosso trabalho.
CONCEITOS BÁSICOS 19

im ente de- 1.4 RISCOS METODOLÓGICOS

nos foram As ciências sociais, em que estão incluídas a Antropologia Cultural e Social
>ermi tiram e a Psicologia, aplicam o m étodo científico de pesquisa, sem elhante aos das
ciências físicas, mas dificilmente se aproxim am da objetividade que é possível
obter nestas últimas.
do esque- Mesmo tentando reproduzir em laboratórios, sob condições controladas, si­
: que defi- tuações de realidade, o evento social traz em si algumas particularidades espe­
-S que são ciais. O am biente e o clima em que transcorre o evento social, os atores e as
ja de bon- relações existentes entre eles são de fundam ental im portância na interpretação
:ndo, por- do mesmo. Um simples aperto de mãos pode ter vários significados, se é dado
iutros são p or duas pessoas que acabaram de se conhecer ou p o r dois nam orados, ou se
i o verda- realizado entre pessoas que tinham um a inimizade anterior. Como fazer para si­
m ular o clima e as motivações?
to um ser Se fizermos observações de campo, poderem os equacionar o aspecto rela­
reposição tivo ao clima e ao am biente em que ocorrem os fatos, mas idevemos: estar -alerta
0 às ques- para a questão da "leitura" feita pelo pesquisador.
po do ser
Ao tentar "ler" um fato, o pesquisador pode contam inar a observação, pois
e com o ele e o "objeto" de estudo com partilham de um mesmo universo de experiências
imana. hum anas.
Bolinger Ademais, um a só observação não pode ser generalizada, sob o risco de não
de cultu- ter representatividade estatística. Apesar disto, o m étodo indutivo constitui-se
tos: indi- em prática norm al nos estudos antropológicos.
ância do
A aplicação dos m étodos estatísticos que perm item resolver a questão da
significância de determ inado com portam ento observado peca, p o r sua vez, p o r
1 dois es- pressupor a m anutenção uniform e do clima e do am biente no qual transcorre
ierto Da- o fato social.
■ a". Ao
C ientes destes aspectos, nosso trabalho pro cu ro u p artir das observações
egundo, em píricas feitas p o r nós no próprio am biente em presarial brasileiro. Isto perm i­
ção exis- tiu criar um conjunto de com portam entos que foram classificados d entro de um
cas rela- m apa de traços culturais.
Para garan tir a m aior significância destes traços em relação ao universo
brasileiro, foi levantada um a am ostra representativa com os principais atores en­
is eixos: volvidos nos com portam entos observados, para que confirmassem ou não o in­
xJuz um ventário inicialm ente levantado.
modelo
■abalho. Os estudos antropológicos prevêem também, em termos de cultura de um a
sociedade, a possibilidade de classificação de traços, por subculturas, naquelas
sociedades tidas como bastante pluralistas e /o u onde as m udanças sociais se fa­
zem em ritm o acelerado.
20 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

M esm o re c o n h e c e n d o que o Brasil p o d e ria ser visto com o um a sociedade


pluralista, com influências raciais diversas, acham os que u m a am ostra que con­
siderasse os estados de São Paulo, Rio de Ja n eiro , M inas Gerais, Paraná, Santa
C atarina e Rio G ran d e do Sul viria a ser bastante significativa. Afinal, ali se con­
c e n tra o m aio r volum e p o p ulacional e de atividade econôm ica, trazendo, p o r­
tan to , m anifestações bastante representativas do c o m p o rtam e n to nacional, em
term os de qualid ad e e q uantidade.

H o eb el (1990) m ostra q u e várias sociedades indicam ter sen tim en to de pes­


sim ism o. Este é o caso, p o r exem plo, destacado n a sociedade asteca; estudos re ­
latam q u e eles tin h am a vida com o m eram en te transitória, pois sabiam que n o
fim , seu líder, o sol, seria d e rro ta d o e en tã o os p o d eres do m al prevaleceriam
e d estru iriam a h u m an id a d e. P or isso, tin h am um sen tim en to de pessim ism o e
angústia que "aparecia nas suas esculturas vigorosas e terríveis e m o stran d o tam ­
bém u m a coloração de tristeza p ro fu n d a em sua poesia".

É com um n o Brasil se traçar um auto-retrato pessim ista, o que m uitas vezes


esp an ta os estrangeiros. Se as in terp retaçõ es apresentadas neste ensaio estiverem
co n tam inadas p o r um nível de crítica elevado, seg u ram en te n ão será proposital,
pois p ro cu ram o s evitar, ao m áxim o, que a análise de nossa realid ad e cultural ti­
vesse este possível viés de u m a baixa auto-estim a em relação à realid ad e brasi­
leira.

P o r o u tro lado, o leito r n ão p o d e fu rta r de aceitar a verd ad e dos fatos, m es­


m o q u e ele esteja m ais voltado p a ra um q u a d ro im aginário ideal, com o, p o r
exem plo, aquele que a litera tu ra oferece sobre gestão participativa nas e m p re ­
sas. N ão nos é p e rtu rb a d o r este contraste e n tre a realidade dos fatos e o ideal
im aginário, pois vemos nele o germ e de um a possível m udança.

A lém disso, p a ra um m e lh o r e n te n d im e n to das idéias deste trabalho, é p re ­


ciso que o próprio leitor tente fazer um a leitura descontam inada de seus padrões
culturais. Para isto, p rocuram os sem pre que possível a p re se n ta r exem plos com ­
parativos com outras nações.

E in teressan te exem plificar esta questão com o term o burocracia. Em alguns


países, inclusive n o Brasil, esta palavra carrega em si um significado pessim ista,
p o rq u e existe u m valor cultural orientativo que lh e dá a conotação de ser algo
ruim . Ela terá u m a conotação negativa p a ra aqueles que e n te n d e re m que este
sistem a inibe a criatividade ou é utilizado p ara m a n te r situações conservadoras,
de interesse p a rticu la r de determ in ad o s grupos. Para outros, a b u ro cracia é um a
b o a solução p a ra resolver alguns problem as adm inistrativos. Tal com o teorica­
m e n te c o n ceb id a e pregada, po d e ser m uito útil n a u n ifo rm id ad e de tra tam e n to
de questões iguais, g e ra n d o rapidez de ate n d im e n to , m e n o r custo de atrito e n ­
tre papéis de cada u m n o processo, além de p e rm itir m aior especialização com
possíveis ganhos de q u alidade n a execução.
1 m m i - Biblioteca
CONCEITOS BÁSICOS 21

Burocracia dificilmente será um term o neutro. A questão não deve ser pre-
julgada, mas deve-se colocar em term os críticos sua utilização em proporções
adequadas com outros fatores e, principalm ente, verificar a quem ela beneficia
dentro de um sistema m aior de análise.
O utra ilustração mais expressiva podem os dar com as posturas de um ita­
liano e um am ericano. Para o prim eiro, a "agitação" e a sim ultaneidade da fala
em reuniões pode até ser um símbolo de com petência e um a necessidade de sta-
tus, porém o am ericano percebe este am biente como desorganizado, onde as
pessoas não sabem estabelecer limites e prioridades. Serão os italianos mais com­
petentes p o r fazerem várias coisas ao mesmo tempo? Serão os am ericanos mais
capazes por estreitarem seu foco de ação?
Várias situações sem elhantes serão apontadas ao longo de nossa narrativa.
Nelas procuram os sem pre m inim izar nossas tendenciosidades.

1.5 CONCLUSÃO

Retomemos a definição da necessidade de im prim ir um estilo em um p ro ­


cesso de transform ação. A questão agora é: Podemos evoluir em nosso estilo?
M udar a form a de fazer a mesma coisa?
Sim, e a isto tem-se cham ado modernização. Estamos sem pre evoluindo em
novas formas de fazer as mesmas funções.
As formas são eleitas e selecionadas a partir de um pressuposto de valores
orientativos, o que significa que m odernizar passa pela m udança de nossos va­
lores orientativos que, p o r sua vez, se traduzem e são traduzidos pelo sistema
cultural da sociedade. Para m odernizar é preciso evoluir com o sistema cultural.
A ecologia nos perm ite um caso exem plar. U m a nova percepção da n a­
tureza, de q u e ela p o d e ser hostil e ag red ir nossa sobrevivência, m u d o u a
crença em relação ao m eio am biente. A função de p ro d u ção não desaparece,
c o n tin u a rá a ser realizada, p o rém , de fo rm a d iferen te. Vamos, a p a rtir de
hoje, a p re n d e r a considerar se nossos processos produtivos são bons ou maus,
conform e agridem mkis ou m enos o am biente. Esta aprendizagem passa de
geração em geração. A universalidade destes traços culturais, porém , não im­
prim irá um a u n iform idade no tratam en to da questão. Pelo co n trário , as n a­
ções não deverão divergir no m érito, mas terão form as próprias de resolver
esta questão e irão evoluir p ara um estilo p róprio, m esm o que influenciadas
p o r outras culturas.
2
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL
BRASILEIRO

A análise das organizações tem tido o suporte de várias teorias adm inistra­
tivas que alternam suas ênfases entre aspectos mais mecanicistas, mais compor-
tamentais ou mais sociais.
Ao invés de recordá-las, querem os p ro p o r um novo enfoque que tem um a
ênfase cultural. Essa análise apresenta um a premissa básica, qual seja, está cir­
cunscrita pelos limites im plicitam ente estabelecidos pelo caráter cultural do am­
biente em que atua. Esses limites, que podem ser vistos como constrangim entos,
devem tam bém ser destacados como alavancas de ações e seguram ente perm i­
tem um grau de liberdade razoável na ação administrativa.
O que querem os dizer é que as ações administrativas têm um contorno cul­
tural que as influencia a ponto de poder caracterizar-se um estilo de conduzir
as organizações brasileiras. Esse estilo próprio não significa, contudo, que tais
contornos não perm itam variações em nível de cada um a das empresas. Ao con­
trário, a partir de alguns elem entos básicos, eles se com binam entre si e, com
intensidades diferentes, definem a cultura da própria organização.
É nesse sentido que A ndré Laurent (1989) coloca a cultura nacional como
um com ponente, não determ inante, mas im portante na formação da cultura or­
ganizacional. A análise das organizações deve reconhecer e ter presente, como
elem ento de influência em suas ações administrativas, os aspectos culturais na­
cionais, mas sem reivivificá-los.
O prim eiro desafio será, portanto, construir um sistema que seja bastante
representativo da cultura brasileira, para em seguida verificar o im pacto do mes­
m o no sistema de gestão da empresa.
24 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

2.1 ABORDAGENS DA CULTURA BRASILEIRA

A cultura brasileira tem sido apresentada por vários autores estrangeiros e


brasileiros com o Silvio Rom ero, Oliveira Viana, Sérgio B uarque de H olanda,
Paulo Prado, para citar alguns dos mais conhecidos.
Cada um deles, a seu m odo, recorre a fatores étnicos, religiosos, geográfi­
cos, econômicos, políticos e sociais para destacar alguns traços da cultura bra­
sileira.
Assim é que Sérgio Buarque de H olanda (1988), em Raízes do Brasil, discor­
re sobre os valores brasileiros em relação ao trabalho e à aventura; em relação
às bases da coesão social suportadas pela hierarquia e personalism o e em relação
às heranças rurais da era colonial, destacando o forte patriarcalismo e a cons­
trução dos espaços urbanos. Por fim, apresenta o hom em cordial brasileiro, sem
deixar de anotar, contudo, a im portância em todos esses aspectos dos valores da
Igreja.
Baseado em um a análise focada em tempos coloniais e na fase inicial, após
a proclam ação da República, ambos com forte influência rural, adm ite o autor
que, no futuro, os movimentos políticos da democratização, os movimentos so­
ciais de urbanização sob a influência das grandes metrópoles, o desenvolvimen­
to das com unicações e transportes e a m udança do eixo geopolítico em direção
às influências am ericanas, estariam, se não aniquilando, dim inuindo considera­
velm ente alguns dos traços culturais brasileiros. Diz Sérgio Buarque: "O desen­
volvim ento do velho e n g e n h o , e n g o lid o p ela u sin a m o d e rn a , a q u e d a de
prestígio do antigo sistema agrário e a ascensão de um novo tipo de senhores
de empresas concebidas à m aneira de estabelecimentos industriais urbanos, in­
dicam bem claram ente em que rum o se faz essa evolução."
Avançando nesse sentido, Nelson W erneck Sodré (1970) distingue, no de­
senvolvimento da cultura brasileira, três etapas, tom ando como referência o sur­
gim ento de um a cam ada social interm ediária entre os senhores e os escravos,
que ele caracteriza com o a pequena burguesia.
A prim eira etapa seria anterior ao aparecim ento da pequena burguesia; a
segunda posterior ao seu surgim ento e a terceira pertencente à época em que
a classe dom inante era a burguesia, tendo desaparecido o escravismo, persistin­
do, entretanto, rem anescentes feudais e parcelas da população vivendo em re­
lações pré-capitalistas.
O m arco político utilizado pelo au to r para fixar a transição da segunda
para a terceira etapa foi a Revolução de 30.
Pode-se, a partir de então, reconhecer o desenvolvimento das relações ca­
pitalistas de form a mais acelerada, com forte influência cultural am ericana.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 25

Ao longo do tem po, esse desenvolvimento introduz um a m aior profissiona­


lização em várias áreas, inclusive naquelas de expressão cultural, como na pro­
fissão dos artistas, dos jogadores de futebol. O corre o surgim ento de um novo
árbitro no julgam ento, p o r exemplo, das atividades artísticas, que deixou de ser
feito p o r pessoas do próprio setor para ser feito pelo m ercado, isto é, pelo pú­
blico consum idor. "São estes os juizes de seu valor".
A p ró p ria evolução da pesquisa científica e das universidades brasileiras
saiu do âm bito do esforço individual e isolado para o esforço institucional e or­
ganizado. O surgim ento dos "colarinhos brancos" destaca o aparecim ento de
um a burocracia profissional.
Esses foram alguns indicadores da m udança de escala de valores que ocor­
reram principalm ente a partir de 1945. De um a sociedade rural sob influência
européia para um a sociedade urbana industrial sob influência am ericana.
O que querem os resgatar são alguns indícios do surgim ento de um a nova
escala de valores, que passaram a conviver com um a escala tradicional de valo­
res. Isso nos levou a considerar outras obras, ainda não consagradas e p o r vezes
sem o rigor acadêm ico equivalente ao dos autores citados, mas que pudessem
nos fornecer dados culturais presentes na atualidade brasileira. Foram essencial­
m ente os trabalhos de pesquisa que nos perm itiram validar a continuidade e a
relevância dos traços culturais brasileiros, tradicionais ou não, apresentados pe­
los demais autores.
Esses trabalhos apuraram estatisticamente, através de pesquisas específicas,
o que defm e hoje, na visão dos próprios brasileiros, a sua identidade. Passado
mais um marco político de nossa história, com o térm ino de mais um período
autoritário no país, que alterou tanto a face econôm ica com o social do país,
como terão evoluído, esgotados uns e m antidos outros, alguns traços sócio-cul-
turais brasileiros?
Duas dessas pesquisas foram realizadas por agências de pesquisa de m erca­
do. A A gência de Propaganda MPM produziu um estudo especial, intitulado
"Brasileiros e Brasileiros” (1989), que teve como motivação a curiosidade de sa­
ber “a quantas an d a o nosso je itin h o ”. P retendendo responder ao desafio da
música “Brasil m ostra a sua cara”, o trabalho analisa as diferentes faces do ca­
ráter do nosso povo. O utra agência, a Feedback (1991) tam bém realizou um a
pesquisa destinada a descobrir como os brasileiros se percebem em seus traços
de postura pessoal e perante a sociedade. A prim eira foi realizada em 1989 e a
>egunda em 1991, abrangendo as grandes capitais brasileiras.
Finalm ente, nosso trabalho foi desenvolvido no sentido de p roporcionar
um a leitura original do sistema cultural brasileiro, visto a p artir de um conjunto
e tam bém de suas partes interagindo entre si, pois é nossa tese que esse é um
tecido que tem um a tram a forte, com seus fios interligando, transm itindo e re­
cebendo im pactos e reflexos en tre si, constituindo-se m uito mais com o um a
26 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

red e auto-sustentada em suas articulações, do que um sistema linear que tem


um a única origem e fim. Os nós dessa tram a são os traços culturais que iden­
tificamos com o sendo os mais relevantes, enquanto os fios ficam caracterizados
pelas relações entre esses traços.
O desejo de analisar a cultura brasileira nessa perspectiva vem da concep­
ção de que ela é um sistema complexo, onde se tem múltiplas causas para m úl­
tiplos efeitos, fluindo do tradicional enfoque linear de causa e efeito de partes
isoladas.

2.2 UM NOVO MODELO DE INTERPRETAÇÃO DA


CULTURA BRASILEIRA

Em nossa visão o sistema de ação cultural brasileiro está estruturado em


quatro grandes subsistemas:, o institucional, o pessoal, o dos líderes e o dos li­
derados, conform e m ostrado na Figura 2.1. O institucional está relacionado
com os traços culturais que encontram os no espaço da “ru a ”, como define Da-
Matta, enquanto os traços típicos do espaço da “casa” com põem o subsistema
pessoal. O subsistema dos líderes faz um corte, reunindo traços encontrados na­
queles que detêm o poder, enquanto o subsistema dos liderados abrange os as­
pecto s cu ltu rais mais próxim os daqueles su b o rd in ad o s ao p o d er. E m uito
im portante no tar que esta é um a visão dinâm ica e relativa, pois qualquer cida­
dão pode en co n trar características nos subsistemas alternativos conform e a si­
tuação n a q u al se en c o n tre , isto é, o ra estam os na posição de líderes, ora
estam os na posição de liderados. Por o utro lado, existem m om entos em que
atuam os de form a impessoal e em outros nos portam os como pessoa.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO

que tem
}ue iden-
terizados

t concep-
>ara múl-
ie partes

~ado em
0 dos li-
cionado
fine Da-
ísistema
idos na-
je os as-
1 m u ito
er cida-
n e a si-
•es, ora
;m que

F ig u ra 2.1 Composto sistêmico dos espaços culturais.


28 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

A dm itida essa estrutura, com o operam no dia-a-dia esses quatro espaços?


Surgem aí algumas possibilidades de relações, de convivência entre o indivíduo
e a pessoa, e de líderes e liderados.
E im portante perceber que esses conjuntos de traços culturais podem se so­
b rep o r com m aior ou m enor intensidade, chegando até a form ar um único con­
ju n to que tem o o u tro com o subconjunto. A este fenôm eno cham arem os de
englobam ento, podendo existir um a influência nos dois sentidos, tanto o indi­
víduo contam inando a pessoa, com o a pessoa contam inando o indivíduo.
O prim eiro caso se dá quan d o critérios impessoais com eçam a dom inar
processos tratados de form a familiar, como o exem plo da profissionalização da
em presa familiar. O segundo caso se dá quando os critérios pessoais (de rela­
ções entre pessoas) se sobrepõem a critérios formais e regulam entados. Este fe-
nôm em o poderíam os cham ar de familiarização ou tribalização.
O englobam ento entre os conjuntos de líderes e liderados tam bém pode
o co rrer nos dois sentidos. Q uando todos são líderes, há um processo de hori-
zontalização, e quando todos são liderados ocorre a verticalização. Ou, segundo
o conceito de Hofstede (1987), atinge-se um estágio avançado de igualdade, ou
um estágio de grande distância do poder, respectivamente.
Dessa form a, podem os ter configurações variadas, desde o predom ínio e
h eg em o n ia de um a dessas categorias, com o a simples convivência entre elas.
Nesse ponto, querem os ressaltar que, mais do que a estrutura cultural, será, fun­
dam entalm ente, o seu processo de funcionam ento que estará definindo o siste­
m a de ação cultural brasileiro.
São as estratégias de articulação dos elem entos desta estrutura cultural que
sustentam a operacionalização do sistema, garantindo a sua ação. Essas estraté­
gias podem ser consideradas com o invenções sociais, isto é, construídas pelo
conjunto social, mas, tam bém , subordinadas a elas, visto num a perspectiva de
curto prazo.
Esses subsistemas apresentam interseções entre si, encontrando-se aí traços
culturais com uns a ambos. São quatro interseções caracterizadas pela concentra­
ção do poder, pelo personalismo, pela postura de espectador e pelo evitar con­
flito, distribuídos da seguinte forma:

1. C oncentração de p oder na interseção dos subsistemas líderes e insti­


tucional.
2. Postura de espectador na interseção dos subsistemas liderados e ins­
titucional.
3. Personalismo na interseção dos subsistemas líderes e pessoal.
4. Evitar conflito na interseção dos subsistemas liderados e pessoal, con­
form e m ostrado na Figura 2.2.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 29

F igura 2.2 Traços culturais de integração dos subsistemas.

Os subsistemas estão, também, articulados através de traços culturais espe­


ciais que, em últim a análise, são os responsáveis pela não ru p tu ra do sistema
: : mo um todo. Ao mesmo tem po são os pontos que, para um a m udança efetiva,
deveriam se alterar em grau ou natureza. Esses traços são: o paternalismo, a leal­
dade às pessoas, o formalismo e a flexibilidade.
E nquanto o paternalism o e a flexibilidade fazem a ligação dos subsistemas
nstitucional e pessoal, os traços de lealdade às pessoas e o formalismo são os res-
ponsáveis pela aproxim ação dos subsistemas dos líderes e dos liderados. Por úl­
timo, devemos m encionar a im punidade como um traço central que realim enta
ao mesmo tem po o subsistema dos líderes, o dos liderados, o institucional e o
ressoai. U m a dem onstração esquemática está m ostrada na Figura 2.3.
30 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

F ig u ra 2.3 Traços culturais de articulação de subsistemas.

A com binação de todos os traços citados é que constitui e opera o sistema


de ação cultural brasileiro, dentro de nossa percepção. Podemos então visualizar
de form a detalhada e integrada o sistema que orienta nosso trabalho, conform e
a Figura 2.4.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 31

r _r ira 2.4 Sistema de ação cultural brasileiro.

Uma descrição mais detalhada de cada um destes elem entos e, principal-


—rr.te, suas relações de causa e efeitos, será feita nos próximos capítulos e mos-
■ará a dinâm ica de todo o processo em funcionam ento.

2.2.1 Subsistema dos Líderes

Consideram os nesse subsistema as características, em nossa cultura, ineren-


les àqueles que estão nas posições de m ando. Isto não significa que se restrinjam
aos governantes, p o d endo ser tam bém um mestre-de-obras, em sua relação com
os operários. É im portante observar que os traços aqui apontados são situacio-
nais, no sentido de que se fazem presentes no m om ento em que alguém assume
: papel de liderança.
Na dim ensão hierárquica, o que existe é a concentração de poder. Ao seu
Lado, surge o extenso personalism o, presente na dim ensão pessoal da nossa so­
ciedade.
32 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

O terceiro elem ento que surge, articulando essas duas dim ensões e que dá
o perfil do estilo brasileiro de liderar, é o paternalism o. A ele será dada especial
atenção na m edida em que gera vários desdobram entos em nossa cultura.

F ig u ra 2.5 Subsistema dos líderes.

Concentração de Poder

Antes de analisar a concentração do poder, em termos da realidade brasi­


leira, devemos conceituar poder sob a ótica da autoridade legítima, conform e We-
ber enunciou e é encontrada em todos os agregados sociais.

A legitim idade coloca em destaque a aceitação que os m em bros de um a so­


ciedade fazem, em consenso ou voluntariam ente, das bases nas quais a autori­
dade se estabelece. Essas bases podem ser a tradição, os princípios racional-legais
ou o carisma.

A autoridade baseada na tradição tem como exem plo a m aioria dos prim ei­
ros sistemas políticos, que fundavam sua estabilidade na aceitação p o r parte dos
governados de que o grupo governante tinha esse direito p o r costume e norm as
da sociedade. Como exemplo, podem os citar a origem divina dos governantes,
ou o direito do filho prim ogênito de reivindicar o trono.

A autoridade baseada em princípios racional-legais decorreu da evolução


dos sistemas políticos, nos quais os m em bros de um a sociedade devem ter algum
po d er de decisão no processo de seleção do sistema pelo qual são governados
e, possivelmente, mesmo na seleção das pessoas que venham a governá-lo.
SISTEMA DE AÇÂO CULTURAL BRASILEIRO 33

A base da legitimidade está em aceitar um conjunto com um de leis e dos


b n o d o s instituídos para a criação dessas leis. A racionalidade estaria presente
th «ír.ndo de se elaborar leis que fizessem justiça, que fossem do interesse da
que protegessem os direitos hum anos e proporcionassem um governo
K ado na com petência comprovada. O outro lado que sustenta essa autorida-
é que o sistema repousa no consenso de ser governado p o r um processo le-
L T il processo legal dá o direito às pessoas de exercerem a autoridade dentro
ama hierarquia de com ando/subordinação.
A terceira base de autoridade que é a carismática, deixaremos para apre-
ao tratarmos do traço de personalismo.
Analisemos agora as formas de estruturas do poder, quais sejam a autocra-
i :>:>üarquia limitada e a poliarquia plena.
A autocracia apresenta-se como um centro de p o d er coeso, consideravel-
Mc hom ogêneo e concentrado muitas vezes em mãos de um hom em forte.
Ti í poliarquia limitada, graças a um incipiente processo de organização
jnal de interesses, no qual se começam a diferenciar grupos da socie-
t. e exercida p o r um grupo m onopolista do poder, em constantes colisões
m n um, ora com outro grupo de pressão. Estes, dada a sua fragilidade de
cr. ainda não se constituem como "grupos de veto", sem, portanto, influen-
s definitivamente nas decisões.
? : r fim, a poliarquia exercida em sua plenitude corresponde à estrutura na
: ;>oder não é excessivamente centralizado ou m onopolizado e em que
r arnpla participação na elaboração de decisões. Nas sociedades que apre-
esse tipo de estrutura, os interesses tendem a exprimir-se de m odo or­
ou institucionalizado, sendo aí residual a população massificada, isto
vinculada a associações voluntárias ou compulsórias. No centro do p o d er
argim es poliárquicos, existe um a divisão interna em "grupos de veto", cada
interessado em preservar as fronteiras de seu dom ínio e dotado de meios
: r.;er os com petidores que pretendam invadi-lo. E im portante ressaltar
r e r h u m desses grupos isoladam ente tem preponderância sistemática sobre

C om binando as estruturas de p oder com suas principais bases de autorida-


nitidam ente verificar o movimento pendular que historicam ente
S, p o d e m o s
n rrru no Brasil.
Nrirando Sodré (1970) até o fim da m onarquia “estivemos sob um a auto-
f c t tradicionalista, em que só se configurava a área cêntrica do poder, pois
■ai: e ra amorfo (um país sem povo e sem classes). Na República Velha pode-
■dfacerr.ir um processo de poliarquização no Brasil. Emerge da m onarquia,
■■o g ru p a m e n to solidam ente institucionalizado, o exército, exercendo um
^ e i de p oder compensatório". Porém, durante várias décadas depois de ins­
t a i i Reoública, ainda delinea-se, de m odo tênue, a diferença entre um a cias-
34 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

se m édia incipiente e um operariado sem hábitos de organização, largam ente


constituído de ex-escravos ou de seus descendentes.
A poliarquia limitada com a autoridade baseada em princípios racional-le-
gais com eçou a se exercer pelas coalizões de interesses da m onocultura do café
e os da corporação militar. Em seguida, voltamos a um a autocracia com aspectos
tradicionalistas na base do poder, pois durante o Estado Novo de 1937 a 1945,
o governo foi exercido em regime ditatorial. Representou, no entanto, um pro­
gresso no tocante ao processo de institucionalização, quando se estabeleceram
duas grandes leis: a da Justiça do Trabalho e a da Sindicalização, reforçando a
base legal do processo.
Após esse período, retornam os a um a poliarquia limitada, em que em ergiu
um a classe industrial nacional, para mais um a vez cairmos em um regim e dita­
torial, que repetiu com sucesso a im plantação de várias reformas institucionais.
Finalm ente, na década de 80, presenciamos um a transição para a poliar­
quia ainda limitada, porém com um enorm e avanço na institucionalização do
m ovim ento sindical, mas, ainda, sem os trabalhadores participando do centro
de poder, apesar de ensaiar algumas coalizões. O início da década de 90, apesar
de seus sucessivos processos eleitorais, não am plia substancialmente a poliarquia
brasileira, mas reconhece um poder político aos trabalhadores sindicalizados.
A tendência urbanizante, ao concentrar nas cidades volume expressivo da
população brasileira, trouxe da zona rural e de regiões m enos desenvolvidas
grandes massas ainda amorfas e com baixo grau de organização.
Esses movimentos não deixam dúvidas de que a sociedade brasileira tem se
valido, de form a alternativa, da força militar tradicionalista e do po d er racional-
legal para o estabelecim ento e a m anutenção da autoridade, criando assim um a
cultura de concentração do po d er baseada na hierarquia/subordinação. "Man­
da q u e m jjo d e , obedece quem tem juízo" reflete um ângulo im portante dessa
cu ltura.
Esse jeito de ser está distante, de um lado, do m odelo am ericano, no qual
a igualdade, em term os de código cultural, prevalece e em que cada cidadão
pode exercer indep en d en tem en te seu p o d er e ser respeitado e tratado igual­
m ente p erante a autoridade. Mas, também, por outro lado, há o m odelo ja p o ­
n ês, n o q u al prev alece a to ta b ilid a d e social sobre as p artes, ju n to a u m a
estratificação hierárquica, que é um princípio básico da vida social.
A expressão popular "Você sabe com quem está falando?", que ouvimos em
situações conflitivas, revela toda a carga autoritária exercida pelo cidadão que
se ju lg a com direitos (reais ou imaginários) especiais, isto é, não sujeito a um a
lei de caráter geral para todos na sociedade.
Aliás, no Brasil, a própria palavra cidadão tem contornos negativos, pois é
freqüentem ente usada para m arcar a posição de alguém que está em desvanta­
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 35

gem ou mesm o em inferioridade. Q uando se diz: "o cidadão vai ter que esperar
um pouco" ou "o cidadão não tem todos os docum entos em ordem" pode-se es­
perar maus mom entos. Nossa cultura não entende o cidadão, qualquer que seja
ele, como o núcleo do poder.
É oportuno agora referirmo-nos ao conceito de distância do p o d er ou dis­
tância hierárquica, introduzido p o r Hofstede (1987) em seus estudos sobre a re­
latividade das culturas nacionais.
Segundo o autor todas as sociedades apresentam desigualdades de po d er
entre seus membros, porém , existem diferenças no grau dessas desigualdades.
À m edida desse grau ele cham ou de “índice de distância de p o d e r”, que seria
um indicador do grau de centralização da autoridade e do grau de liderança au­
tocrática.
Em sua escala de valores de 0 a 100 (100 representando alta concentração
de p o d er em um único com ando), o Brasil tem 69 pontos, bem próxim o da
França, Bélgica e índia, contra som ente 40 pontos dos Estados Unidos. Os países
nórdicos como a Finlândia, N oruega, Suécia e Dinamarca são os que apresen­
tam os m enores índices. O Japão fica com 54 pontos, acima dos Estados Unidos,
ju n to a outros países asiáticos como Coréia do Sul e Taiwan, e A lem anha Oci­
dental e Grã-Bretanha com 35 pontos, ficam abaixo dos Estados Unidos. Como
pode ser visto no Q uadro 2.1, esse resultado corrobora nosso traço cultural de
concentração de p oder e de valorização da hierarquia.
36 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Q u a d ro 2.1 Concentração de poder.

Ordem País índice Ordem País índice

1 Malásia 104 27 Grécia 60


2 Guatemala 95 28 Coréia do Sul 60
3 Panamá 95 29 Irã 58
4 Filipinas 94 30 Taiwan 58
5 México 81 31 Espanha 57
6 Venezuela 81 32 Paquistão 55
7 Países Árabes 80(2) 33 Japão 54
8 Equador 78 34 Itália 50
9 Indonésia 78 35 África do Sul 49
10 índia 77 36 Argentina 49
11 Países da África Ocidental 77(3) 37 EUA 40
12 Iugoslávia 76 38 Canadá 39
13 Cingapura 74 39 Holanda 38
14 Brasil 69 40 Austrália 36
15 Hong Kong 68 41 Costa Rica 35
16 França 68 42 Alemanha Ocidental 35
17 Colômbia 67 43 Grã- Bretanha 35
18 Salvador 66 44 Suíça 34
19 Turquia 66 45 Finlândia 33
20 Bélgica 65 46 Noruega 31
21 Países da África do Leste 64(4) 47 Suécia 31
22 Peru 64 48 Irlanda 28
23 Tailândia 64 49 Nova Zelândia 22
24 Chile 63 50 Dinamarca 18
25 Portugal 63 51 Israel 13
26 Uruguai 61 52 Áustria 11

Personalismo
Façamos por um m om ento a interrupção no credo do indivíduo sem pri­
vilégios, não diferenciado dos demais através de um a hierarquia, e voltemos ao
conceito da autoridade cuja base legítima é o carisma.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 37

W eber observou que muitos tipos de movimentos políticos se baseavam em


qualidades pessoais irresistíveis de um determ inado líder. "Eles induzem nos
seus seguidores um a resposta em ocional intensa, atraindo-os e levando-os a exe­
cutarem ações pouco habituais." Seja pela força da sua personalidade, ou p o r
seus dons inexplicáveis, a base dos líderes de autoridade é totalm ente instável
e não proporciona um princípio para a sucessão, como os outros sistemas ba­
seados na tradição ou nos sistemas nacional-legais.
Tivemos e temos, no Brasil, vários exemplos em anos recentes. Getúlio Var­
gas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros, Leonel Brizola, Fernando Collor, pa­
recem ter exercido forte autoridade carismática. Em quase todos esses casos, a
instituição do partido político foi sem pre colocada em segundo plano, fundida
e englobada pelo candidato, colocando-se a pessoa em um plano superior. Esses
exemplos, em intervalo de tem po tão curto, parecem ser significativos de um tra­
ço cultural que denom inam os personalismo.
O magnetism o exercido pela pessoa, através de seu discurso, ou p o r seu po­
d er de ligações (relações com outras pessoas) e não p o r sua especialização, pa­
rece destacar-se no cotidiano brasileiro. A rede de amigos, para não falar de
parentes, é o cam inho natural pelo qual trafegam as pessoas para resolverem
seus problem as e mais um a vez obterem os privilégios que aqueles que não têm
um a "família" não podem se habilitar.
Esse é o "cidadão" brasileiro que se diferencia pela hierarquia e pelas re­
lações pessoais. Aqui no Brasil, o indivíduo isolado e sem relações é considerado
como altam ente negativo, um ser marginal em relação aos outros m em bros da
com unidade. A com unidade norte-am ericana seria hom ogênea, igualitária, indi­
vidualista e exclusiva; no Brasil ela seria heterogênea, desigual, relacional e in­
clusiva.
Se lançarm os mão de um a outra dim ensão cham ada "individualismo e co-
letivismo", utilizada tam bém por Hofstede (1987) para explicar com portam en­
tos culturais de várias nações, vamos confirm ar o valor atribuído aos laços entre
os m em bros de um a sociedade.
Ressalta ele que, num a das pontas da escala, encontram os sociedades nas
quais os laços são m uito frágeis, soltos. Cada um deve cuidar de seu interesse
próprio. O relacionam ento entre eles existe, mas se faz em termos de m útua uti­
lidade pela troca objetiva, atendendo cada qual suas próprias necessidades. E é
dessa form a que a sociedade busca sua integração e perm ite um a m aior perm ea­
bilidade em relação à agregação de novos m em bros ju n to a ela.
Na o utra p onta da escala, estão as sociedades nas quais os laços são m uito
estreitos. As pessoas nascem dentro de coletividades ou grupos que podem ser
um a extensão de sua família. Espera-se que cada um olhe pelo interesse de seu
íru p o e este fiscálizará e o protegerá, quando se encontrar em perigo. Essa é
um a form a forte de integração e de im perm eabilidade de algumas sociedades.
38 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Analisando no Q uadro 2.2 os resultados encontrados para o índice de in­


dividualismo, reconhecem os o Brasil com 38 pontos, o que o deixa mais próxi­
m o de sociedades que valorizam o relacionam ento com as pessoas de seu grupo.

Q u a d ro 2.2 Individualism o e coletivismo.

Ordem País índice Ordem País índice


1 Estados Unidos 91 28 Turquia 37
2 Austrália 90 29 Uruguai 36
3 Grã-Bretanha 89 30 Grécia 35
4 Canadá 80 31 Filipinas 32
5 Holanda 80 32 México 30
6 Nova Zelândia 79 33 África do Oeste 27
7 Itália 76 34 Iugoslávia 27
8 Bélgica 75 35 Portugal 27
9 Dinamarca 74 36 Malásia 26
10 Suécia 71 37 Hong Kong 25
11 França 71 38 Chile 23
12 Irlanda 70 39 África Ocidental 20
13 Noruega 69 40 Cingapura 20
14 Suíça 68 41 Tailândia 20
15 Alemanha Ocidental 67 42 El Salvador 19
16 África do Sul 65 43 Coréia do Sul 18
17 Finlândia 63 44 Taiwan 17
18 Áustria 55 45 Peru 16
19 Israel 54 46 Costa Rica 15
20 Espanha 51 47 Paquistão 14
21 índia 48 48 Indonésia 14
22 Japão 46 49 Colômbia 13
23 Argentina 46 50 Venezuela 12
24 Irã 41 51 Panamá 11
25 Jamaica 39 52 Equador 8
26 Brasil 38 53 Guatemala 6
27 Países Árabes 38
SISTEMA DE AÇAO CULTURAL BRASILEIRO 39

Como era de se esperar, os Estados Unidos apresentam o m aior índice de


■ dnidualism o (91), próxim o da Inglaterra e Canadá. A França tem um índice
õe 71 e tem em torno dela, p ara cima e p ara baixo, os países nórdicos. Quase
Kxkts os países asiáticos, ju n tam en te com os outros da América Latina, em nível
Ao r. ;uador, se apresentam como extrem am ente coletivistas.
Para os que têm pouca riqueza e prestígio social, a família é um a fonte de
prestígio individual. Ali o indivíduo podia sentir-se "alguém". A família é o es­
paço social onde o indivíduo pode ser o centro do cenário. A parte a família,
: rrgulho nacional dava-lhe sentim ento de im portância. Na Europa, segundo
* ::o m (1983), freqüentem ente, isto ocorre pelo orgulho de classe. Mesmo que
alm ente não fosse ninguém , orgulhava-se de pertencer a um grupo que po-
m se achar superior a outros grupos comparáveis.
O Japão apresenta um índice de individualismo abaixo da m etade, com 46,
— jicima do brasileiro. O que minimiza as relações pessoais no Japão, compa-
cabvamente ao Brasil, é que lá, também, a m eritocracia é um credo forte, ha-
ie rd o forte concorrência interna baseada na com petência dos indivíduos. E o
casc. por exem plo, da disputa p o r um a vaga nas universidades japonesas. Mes-
■ o que entre as universidades haja um a hierarquia e que, depois de cursá-la, é
r_ rd a a estratificação social, o concurso para en trar é feito entre iguais.
Assim, Brasil e Japão dão mais valor ao seu grupo de “pertença” ào que ao
r. iivíduo propriam ente dito, fazendo do seu grupo um a referência forte. Essa
irra d e , na qual a referência para a decisão é a im portância ou a necessidade
i a pessoa envolvida n a questão, sobrepondo-se às necessidades do sistema no
a questão está inserida, é a que encontram os no Brasil e a ela estamos cha-
■xando de personalismo.

Paternalismo

A com binação dos dois traços m encionados, concentração de poder e perso-


•Kzlismo, em m aior ou m enor grau, tem como síntese o patemalimo. Ele apresen-
ta duas facetas: é o patriarcalismo e o patrimonialismo.
40 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Para desenvolvermos considerações sobre essas duas facetas, devemos reto­


m ar a im portância do papel da família na sociedade brasileira. Com o célula
principal da organização dos períodos coloniais, nos moldes do velho direito ro-
m ano-canônico, e que resistiu a vários movimentos sociais e atravessou a rep ú ­
blica até os dias de hoje.
Com princípios onde a autoridade máxima está centrada no pai, de forma
inquestionável, estendia este pátrio poder não só ao âm bito de suas relações pri­
vadas, como tam bém interferia fora de seu recinto doméstico. Com isso, vimos,
historicam ente, as atitudes típicas do relacionam ento familiar invadirem o espa­
ço público, conform ando também o sistema burocrático brasileiro. Este se viu
invadido em suas posições e cargos p o r pessoas de confiança, ou das relações
pessoais das famílias no poder. A com petência e o mérito, através do concurso
público, que estão na base do sistema racional-legal, na formação dos quadros
burocráticos do sistema, freqüentem ente são abalados pelos laços afetivos e ape­
los em ocionais que estão na dinâmica de decisão do sistema familiar. Passamos,
assim, a ter a m áquina estatal pública com andada pela ordem genealógica e, por
isso mesmo, voltada aos interesses familiares privados.
No Brasil pode-se dizer que só, excepcionalm ente, tivemos um sistema ad­
ministrativo e um corpo de funcionários puram ente dedicados a interesses ob­
jetivos e fundados nesses interesses.
Carregamos, portanto, em nossa sociedade, o valor de que o patriarca tudo
pode e aos m em bros do clã só cabe pedir e obedecer, pois caso contrário, a re­
beldia pode ser prem iada com a exclusão do âmbito das relações.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 41

>. a face supridora e afetiva do pai, atendendo ao que dele es-


do clã, e o patrimonialismo, a face hierárquica e absoluta im-
i m d icio n al aceitação, a sua vontade aos seus membros, convivem
: r.os-sa cultura.
2 relação com a pesquisa de Hofstede (1987), vemos que essa
se encontra em países que com binam um alto índice de con-
poder (ou hierárquica) com baixo individualismo. Hofstede é mais
pois conclui em sua pesquisa que as sociedades coletivistas sem pre
níveis de concentração de poder, exceção feita para a Costa Rica.
.7. pode-se ver no mesmo grupo países como a Venezuela, Co-
e Cingapura. D iam etralm ente opostos, com alto grau de indivi-
p eq o en a concentração de poder, temos os Estados Unidos, C anadá
Harém, nem todos os países com alto grau de individualismo apre-
concentração de poder. Os países latinos-europeus, ou seja,
Itália e Espanha mostram um a com binação de grandes valores
do poder aliada ao individualismo. O Brasil fica no mesmo grupo

r ;-iira 2.7 Concentração de poder/individualismo.


42 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

É interessante explicar que, apesar do grau de proxim idade que o Brasil


tem em relação ao Japão, em termos de concentração de poder, isso ocorre de
form a qualitativam ente diferente. Apesar da aparente autocracia tradicionalista,
na figura do Im perador, a estrutura de poder no Japão se caracteriza mais como
um a poliarquia plena, pois lá existem vários grupos que se auto-regulam em ter­
mos de poder, não perm itindo que um deles seja hegem ônico, mas ao mesmo
tem po todos respeitam e fazem prevalecer o sistema racional-legal como a refe­
rência básica. E a interdependência exercida em sua form a mais profunda.

No Brasil o que existe é um a dependência, muitas vezes infantilizada, em


relação ao governo. Os brasileiros continuam a eleger como o perfil mais ade­
quado para a sua liderança aquele que possa ser forte e centralizador e que te­
n h a um rosto b astante personalizado. Este foi o resultado de um a pesquisa
recente realizada pela MPM Propaganda (1989) sobre o caráter nacional. A es­
colha entre um perfil denom inado de radical autoritário, em contraposição ao
hum anista liberal, recaiu sobre o prim eiro.

Isso levanta um a questão básica. Será real que aceitemos esta form a de li­
derança? Se verdadeiro, não estaria existindo um conflito latente entre aqueles
que detêm o p o d er e aqueles que não o detêm? Qual é o estilo brasileiro para
se contornar tal questão?

Um pré-requisito para nos aprofundarm os nessas questões é discutirmos a


natureza psicossocial das interações entre os líderes e os liderados. Tecnicam en­
te este é um fenôm eno de dependência social, no qual o com portam ento de
pessoas é influenciado pelo com portam ento de outras, a partir da percepção pe­
los prim eiros da ação destes últimos.

Vamos nos ater aos fenôm enos de dependência social, baseados no enfo­
que de T hibaut e Kelley (Rodrigues, 1973), que distinguem duas formas de po­
der que cham am de controle do com portam ento e de controle do destino. No
Brasil, a estratégia do p o d er se faz através do controle duplo. Por um lado, pode-
se exercitar o controle do destino pela possibilidade de um a p erd a/reco m p en sa
de um a posição funcional com suas conseqüências econôm icas. Isto é m uito
acentuado pelas características de altas taxas de reservas de mão-de-obra e pela
sua baixa m obilidade geográfica e ocupacional. De outro lado, as relações so­
ciais criadas, seja pelo grau de parentesco, amizade ou intim idade, pode favo­
r e c e r o e x e rc íc io do c o n tro le do c o m p o rta m e n to p e la p o ssib ilid a d e da
p erd a/reco m p en sa destas relações pessoais.

E nessa m istura de aspectos puram ente econômicos, na qual se faz um a tro­


ca objetiva de trabalho p o r rem uneração, com aspectos essencialmente afetivos,
em que se troca em ocionalm ente a dedicação e colaboração não atritosa pelos
laços de intim idade pessoal, que se desenvolvem o jo g o e a estratégia de cada
um dos atores. Para que não haja um a ruptura, é preciso que cada um procure
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 43

: máximo de benefício com um m ínim o de custo, pago nas duas espécies


afetiva e fiduciária.
ím . nas sociedades em que o p oder é distribuído de form a desigual e
i perm anecer nesta situação, ocorre um fenôm eno psicossocial de de-
continuada dos liderados pelos líderes, aceito p o r ambos nas condi-
acima.
linha, podem os dizer que as sociedades e organizações serão lidera-
pí-:em alisticam ente quanto os seus membros perm itam . O paternalism o
a n t: nos liderados quanto nos líderes, sendo o sistema de valores dos
geralmente, com plementares.
Os movimentos sindicais, n a m edida em que tentam cada vez mais institu-
: Tíizar a interação da classe patronal com os em pregados, estão na verdade
bnscando dim inuir o duplo controle dessa dependência. No entanto, ainda con­
tinua prevalecendo a postura de dependência.
Depois de consultados pela MPM Propaganda, os brasileiros pesquisados
apresentaram ainda 40% de atitudes de "egocentrismo dependente". A Figura
2.8 ilustra o resultado com pleto dos vários segmentos encontrados.

Vale dizer que, diante da perda rep en d n a de um a liderança autocrática, os


liderados vivem um sentim ento de orfandade e passam a agir diante de obstá­
culos com o advogados em causa própria, buscando apenas o seu próprio con­
forto e bem-estar, sem se preocuparem com o todo, grupo ou sociedade a que
pertencem .
44 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Na verdade, os brasileiros revelam pouca capacidade ou oportunidades res­


tritas de filiação a grupos ou associações, só o fazendo em função de festas e co­
m em orações e, nestes casos, orientados p o r suas ligações pessoais.
Dessa forma, órfãos do autoritarism o e com baixa capacidade de relacionar
entre iguais, os brasileiros são presas fáceis de um novo líder que viesse a lhes
oferecer um a nova dependência de poder. Isso contrasta com o com portam ento
típico dos am ericanos que estão freqüentem ente se associando a vários grupos,
mesmo que de form a breve e com repetidas mudanças, mas orientados sem pre
p o r seus interesses individuais. Esse interesse individual é a referência de cada
um e através do qual se manifesta a independência do cidadão diante dos líde­
res. Se considerarm os o Japão, a referência também são os líderes, mas ao mes­
m o te m p o ex iste m re s triç õ e s p a ra líd e re s e lid e ra d o s ad v in d as d e suas
responsabilidades para com seu agregado social.
O m odelo brasileiro é o de egocentrismo dependente. Com isto, para ele
garantir a sua segurança futura e dos seus familiares, passa a construir um ca­
pital social, fundado em suas relações com o p oder e reproduzindo a cadeia dos
"amigos do hom em ". Pratica um a intensa contabilidade de débitos e créditos
pessoais, um a conta seguram ente devedora para com aqueles no poder, na hie­
rarquia, ou com status superior.
Para concluir, querem os deixar claro que o paternalism o gera um a dupla
d ep en d ên cia sim, mas a p ar do controle que exerce, abre cam inho para um a
form a eficiente de se identificar e pertencer a um grupo, tendo p o r recom pensa
um m aior grau de segurança, proporcionado pelo grupo. Mas é verdade, tam­
bém, que o custo disso é um grau m enor de liberdade e autonom ia para seus
m em bros, se com parado com outras culturas m enos paternalistas.

2.2.2 Subsistema Institucional

A liberdade individual e o grau de autonom ia estão na base da dinâm ica


do subsistema institucional, que com põe o sistema de ação cultural brasileiro.
V erem os com o a concentração de p o d er e o paternalism o induzem um
novo traço da cultura brasileira que é a sua postura de espectador. Concom itan-
tem ente, apresentarem os um dos principais elem entos que articulam, dentro do
subsistema institucional, o subsistema dos líderes e dos liderados, garantindo, na
ação, a sua convivência. É o fenôm eno do formalismo, um a das formas mais sig­
nificativas e relevantes de como nossa cultura procura fugir às incertezas do fu­
turo.
Por último, destacaremos o traço da im punidade, que tem fortes reflexos
do subsistema "pessoal" e que é um dos elem entos que pode reforçar, como
tam bém m inar, a m anutenção e a estabilidade do sistema de ação cultural bra­
sileiro como um todo.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 45

F igura 2.9 Traços do subsistema institucional.

Espectador

Esparta não se com para a Atenas. Foi Toynbee que alertou para a diferença
básica entre elas. A prim eira "fechada", a segunda "aberta"; a prim eira rígida, a
segunda plástica, inclinada ao novo. Na sociedade ateniense, reinava não só o
clima para o diálogo, mas exercitava-se perm anentem ente a discussão e o debate
das idéias.
Vejamos como podem os caracterizar a sociedade brasileira em suas postu­
ras mais próximas de um a sociedade aberta ou fechada, enquanto no subsistema
institucional.
J á destacamos, anteriorm ente, a evolução do processo político brasileiro,
em que o clima dem ocrático sofria sem pre condições adversas, subjugadas às
diástoles e sístoles impostas pelas nossas lideranças. Vimos, tam bém , a forte he­
rança dos traços rurais assentados na prática autoritária do patriarca estendendo
seus dom ínios para os espaços públicos.
Assim nasceu e se desenvolveu no hom em brasileiro o gosto, a um tem po
de m andonism o, de protecionism o e de dependência, que estão encarnados em
nossas soluções paternalistas. Mas aí estão tam bém as condições para o mutismo
brasileiro, um a sociedade na qual a prática do diálogo, visto com o o processo
46 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

real de com unicação, é substituída pela prática dos "comunicados" ao povo.


Mesmo distante no tem po ainda é viva a história do com unicado imperial: "Digo
ao povo que fico."
Mas se o m utism o do povo brasileiro tem suas raízes bem caracterizadas,
qual é a sua natureza e em que estágio está a sociedade brasileira? Segundo Pau­
lo Freire (1983): "O mutismo não é propriam ente inexistência de resposta. É
resposta a que falta teor m arcadam ente crítico."
Isso nos faz refletir sobre a consciência do povo brasileiro de sua realidade.
T om ando em prestado de Álvaro Vieira Pinto as expressões "consciência in tran­
sitiva, consciência transitivo-ingênua e consciência transitiva crítica," Paulo Frei­
re (1983) descreve o movimento de transição pelo qual nossa sociedade passa.
De um a sociedade fechada para se tornar um a sociedade mais aberta.
"Uma com unidade p rep o n d eran tem en te intransitivada em sua consciên­
cia, com o era a sociedade fechada brasileira, se caracteriza pela quase centrali­
zação dos interesses do hom em em torno de formas mais vegetativas de vida."
Suas preocupações não saem do plano biológico com objetivos básicos de so­
brevivência. Sua esfera de apreensão é limitada e falta-lhe qualquer com prom is­
so com algo fora de sua órbita vegetativa. Ainda hoje muitos dos brasileiros aqui
se encontram .
Na m edida em que se am plia o seu p o d er de captação e de respostas às
questões que partem de seu am biente, aum enta o seu diálogo com outros ho­
mens e seu m undo, iniciando um processo de consciência transitiva.
"A consciência transitiva é, porém , num prim eiro estágio, prep o n d erante­
m ente ingênua." A transitividade ingênua, fase em que nós brasileiros nos acha­
mos hoje nos centros urbanos, mais enfática ali, m enos aqui, se caracteriza,
en tre outros aspectos, pela simplicidade na interpretação dos problem as e na
aceitação de explicações mágicas e fabulosas, tipicam ente da intransitividade,
mas que ainda p erd u ra neste estágio. Pode-se encontrar ainda posturas de baixa
preocupação em conduzir pesquisas e em buscar explicações mais científicas
para os fenôm enos além de atitudes com forte teor emocional, distorcendo o
diálogo p ara polêmica.
O avanço econôm ico industrial brasileiro com eçou a rom per com a socie­
dade tipicam ente fechada em que vivíamos. O processo de urbanização expon­
do o hom em brasileiro a formas de vida mais complexas, cria estímulos para a
passagem a um a consciência transitiva mais crítica. No entanto, a total deterio­
ração do sistema educacional, ju n to à centralização e massificação das com uni­
cações eletrônicas no Brasil, retardam em m uito esse novo estágio.
Fase em que o senso crítico exigiria um a m aior profundidade na interpre­
tação dos problem as, substituindo explicações mágicas p o r princípios causais.
Em que se procuraria testar os novos modelos sem antes substituir os velhos pelo
simples surgim ento de modismos. Em que seria perfeitam ente possível conviver
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 47

; tradicional e o m oderno pela validade de ambos enquanto funcionais. Em que


negaria a transferência de responsabilidades, principalm ente sociais e políti­
cas, pela recusa a posições quietistas.
Seguram ente esse não é ainda o quadro brasileiro no geral. E isso não é
orivilégio" da grande população analfabeta. Até as elites se pautam pelo que
G uerreiro Ramos cham ou de exemplarismo, im portando, indiscrim inadam ente,
modelos sem capacidade de adaptá-los às nossas condições culturais. O utro não
foi o exem plo de im plantação da estrutura do Estado nacional dem ocrático, im-
oortando-se o m odelo am ericano, este suportado p o r realidade de diálogo de
participação e de iniciativa autônom a, para um a de mutismo, de submissão e de
acomodação.
Funcionam os, reflexivamente, orientados pela autoridade externa. Nosso
centro de gravitação, com raríssimas exceções, sem pre esteve em um a referência
de p oder externo dom inadora, que limita a nossa consciência crítica.
O que dizer, então, do povo brasileiro com baixa qualificação, em um am­
biente de grande desequilíbrio de poder, sem liberdade e autonom ia e com bai­
xíssimo senso crítico?
Esse processo não poderia deixar de resultar na conform ação do traço cul­
tural que estamos denom inando de espectador, com suas principais vertentes de
mutismo e de baixa consciência crítica e, por conseqüência, de baixa iniciativa,
de pouca capacidade de realização por autodeterm inação e de transferência de
responsabilidade das dificuldades para as lideranças.

F ig u ra 2.10 Assum ir responsabilidades é para os outros.


48 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

A co n firm ação desse perfil está n a pesquisa sobre o c ará ter brasileiro
(MPM, 1989), que revela o m ínim o de desejo de m udança, dando m ostra de
um a aceitação passiva de sua realidade. Não tem o estímulo do po d er que em
seu perfil paternalista reproduz um processo de infantilização em relação aos li­
derados. O povo é qualificado como incapaz e em função disso tomam-se as de­
cisões p o r ele, o que o deixa novam ente sem praticar e sem possibilidades de
crescimento. Este círculo perverso pode ser notado também na relação do go­
verno, com seu papel paternalista, para com as empresas. Protegidas em seus se­
to re s co m a lta s a líq u o ta s d e im p o rta ç ã o , n ã o a p re s e n ta v a m c o n d iç ã o
competitiva, o que reafirmava a necessidade de m anter o m ercado fechado. In­
ternam ente, submetidas a constantes pacotes econômicos de caráter autoritário,
não se p ro p u n h am a tom ar nenhum a iniciativa própria, a menos que o governo
lhes desse um a sinalização, tal é o grau de dependência para com ele e o receio
de p erd er essa relação paternalista.
Esse processo de infantilização, que reforça o baixo nível de consciência
crítica, faz com que, mesmo havendo um a m aior liberdade de atuação, não se
saiba o que se quer, não há vontade própria. Assim, envolvido em um clima de
perplexidade, o libertado sente-se novam ente forçado a conform ar sua conduta
às expectativas da autoridade externa. Tal processo não ocorre só em países
com o o Brasil, mas em geral naqueles que apresentam um alto índice de distân­
cia do poder. E o caso da França e da Bélgica, em que os indivíduos têm como
regra geral esperar que os líderes exerçam a liderança autocrática. A inércia é
ponderável em relação a eventos externos, mesmo que estes estejam a influir e
afetar as suas atividades, como são os casos das decisões econôm icas governa­
mentais.
Em eventos políticos, nem pensar. Fenôm enos como o m ovimento das "Di-
retasjá" e mais propriam ente "Fiscal do Sarney", em que o povo deixou de ser
súdito e passou a ser partícipe e polícia de seu destino, são exceções do ponto
de vista de iniciativas, mas continuam confirm ando a postura de consciência
transitivo-ingênua, na qual se acreditou em soluções generalizadas e mágicas.
Em sociedades como a sueca, a dinam arquesa e a israelense, com baixa dis­
tância do poder, a iniciativa pode vir diretam ente dos indivíduos ou do grupo,
não sendo privilégio do líder tom ar a iniciativa. E, se assim for, sua atitude ou
decisão será questionada e criticada. No caso da sociedade am ericana, são as li­
deranças que m antêm a prerrogativa de iniciar as ações, enquanto nos países
asiáticos, onde a sociedade é sim ultaneam ente coletivista, haverá formas pelas
quais se possa influenciar o líder na perspectiva do bem-estar da com unidade.
A outra vertente do traço cultural de espectador é a transferência de res­
ponsabilidade. A lógica é a seguinte: se o p oder não está comigo, não estou in­
cluído nele e não sou eu quem tom ou a decisão, a responsabilidade tam bém
não é m inha. Logo, vou transferi-la para quem de direito, na nossa cultura, para
cima, na linha hierárquica.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 49

Isso se manifesta em duas outras circunstâncias, ou seja, quando algo de er­


rado acontece, a culpa ou o problem a principal se situa fora da m inha área de
atuação e controle. N orm alm ente, a culpa do desastre em presarial deve ser de­
bitada em grande parte ao governo, conform e verbalização de vários em presá­
rio s b r a s ile ir o s . F in a lm e n te , a n o ssa c a p a c id a d e d e realização por
autodeterminação é m uito reduzida.
Entre a "cultura do fazer", voltada para o m undo, com a perspecdva da m u­
dança cumulativa e a idéia de progresso e a "cultura do estar", que foge do m un­
do, que resiste à m udança e desconfia do progresso, seria mais apropriado para
os brasileiros a "cultura do estar fazendo", isto é, agindo "para o gasto" ou o su­
ficiente para a m anutenção do estado atual ou, no máximo, pequenas reformas
sem avanços significativos.
Deus e o tem po são para nós recursos inesgotáveis. Um Deus que é brasi­
leiro, a quem está entregue a nossa sorte, pois caberá a ele dar um a solução aos
nossos problem as, bastando, para isto, só esperar. Esperar o tem po de am anhã
e ir dando tem po ao tem po para que os imponderáveis atuem mais livremente
e que o assunto se resolva com o m ínim o de interferência. A nossa existência
não é um em preendim ento que deverá ser bem-sucedido em prazo hábil, como
o é para os americanos. E, sim, um bilhete de loteria, no qual vale a pen a apos­
tar, pois pode ser prem iado um dia.
Por fim, vale acrescentar a visão de um estrangeiro que nos parece m uito
oportu n o com o um a síntese para esse traço de espectador. E um a das conclu­
sões de B ernard C. Roseu (Freire, 1983) em suas pesquisas feitas no Brasil sobre
a motivação para a realização: "Fatalismo e passividade (são os) efeitos da expe­
riência brasileira de socialização, a qual desencoraja a iniciativa independente
e a autoconfiança dos indivíduos."

Formalismo

Hofstede estabeleceu um a dim ensão cultural que denom inou controle de


incerteza para caracterizar a m aneira como as sociedades se com portam em re­
lação ao desconhecido, que gera incertezas e riscos. O futuro é um desses focos
de imprevisibilidade.
Algumas sociedades socializam seus m em bros para aceitarem e tolerarem
os eventos tal qual eles se apresentam . Essas pessoas não trabalharão com tanto
em pen h o . Serão relativam ente tolerantes em relação ao com portam ento e às
opiniões que diferem de suas próprias, pois não sentem ameaças em função des­
sas divergências. Estas serão sociedades com um baixo índice de controle da in­
certeza.
50 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

O utras sociedades socializam seus m em bros no sentido de com bater e ven­


cer o futuro. E claro que isso gera um a m aior ansiedade entre as pessoas que
deverão estar de prontidão, preparadas antecipadam ente, o m áxim o possível,
para en fren tar as surpresas. O clima é mais tenso e se envolve de um a m aior
em ocionalidade e agressividade. Estas sociedades se classificam com um alto ín­
dice de controle da incerteza.
Três são as formas de se transm itir m aior segurança e evitar riscos futuros.
São elas: a tecnologia, as leis e a religião.
Através da tecnologia, nós nos protegem os dos riscos da natu reza e da
guerra. Construím os diques, estações geradoras de eletricidade e foguetes que
se destinam a nos p ro p o rcio n ar um a sensação de segurança. Através da lei e
toda espécie de regras formais e de instituições, nós nos protegem os da impre-
visibilidade do com portam ento hum ano. Opiniões divergentes e com portam en­
tos perversos p ro cu ram ser elim inados pelas regras form ais. F in alm en te, a
religião, no seu sentido mais amplo, incluindo ideologias ou movimentos dog­
máticos, pode propiciar um a sensação de segurança em relação a aspectos que
transcendem a realidade hum ana.
A ênfase que é dada em cada sociedade a um ou mais desses três elem en­
tos, é que define seu traço cultural original. Assim, países, mesmo tendo graus
parecidos de controle da incerteza, poderão estar agindo tipicam ente de forma
diferente.
Se com pararm os Japão e Portugal, ambos apresentam altos índices de con­
trole da incerteza, porém , enquanto o Japão tem um a forte tendência a se uti­
lizar da tecnologia para com bater principalm ente as incertezas futuras que lhe
podem trazer a natureza e a guerra, Portugal tem se valido excessivamente das
leis num a atitude preventiva em relação a com portam entos sociais, econômicos
e políticos não aceitos p o r sua sociedade.
Na classificação de Hofstede, é interessante observar que aquelas socieda­
des que aceitam novos m em bros, com m aior nível de diálogo e consciência tran­
sitiva crítica, g u ard am fo rte c o rre la ç ã o com baixos graus de c o n tro le da
incerteza. Podemos exemplificar esta afirmação com a Suécia, Dinam arca, Esta­
dos Unidos e Inglaterra.
No outro extrem o, sociedades mais fechadas que rejeitam um a aproxim a­
ção íntim a daqueles que não pertencem ao grupo e que valorizam a hierarquia,
se m ostram mais vulneráveis à não-aceitação de insegurança do futuro e apre­
sentam altos índices do controle da incerteza. Assim se situam o Japão, Portugal,
a França e a Bélgica, dentre outros.
Mas como se pode notar no Q uadro 2.3, essas correlações não são m uito
apuradas, havendo sociedades fechadas, como a índia, com baixo grau de con­
trole da incerteza e sociedades abertas como Israel, com índices elevados.
CULTURAL BRASILEIRO^
SISTEMA DEAÇÃO
TLO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR
76, relativam ente elevado n o conjunto da
Itália e Áustria.
t o m seus membros no sentido de cousil apresenta um índice 76, relauvJ - . bia Itália
o gera uma maior ansiedade entre aspróxim o de países como a Venezue ,
preparadas antecipadam ente, o máxi
O clima é mais tenso e se envolve de, ^ Controle de incertezas.
índice
de Estas sociedades se classificam corri
índice Ordem
Equador__________
transmitir m aior segurança e evitar ri: Alemanha Ocidental
e a religião.
Tailândia______—
kós nos protegem os dos riscos da nai
rstações geradoras de eletricidade e f<
Finlândia
■ar tuna sensação de segurança. A t r a ç ^ ^ i
i e de instituições, nós nos protegem oBélgica Suíça
j hum ano. Opiniões divergentes e cori^ salvador Países da África <

dim inados pelas regras form ais. Finr


Japão Holanda
implo, incluindo ideologias ou movi:
Países da África
eruação de segurança em relação a a s ^ 5 ^ a^
m a. Peru Austrália
Noruega
a i a sociedade a um ou mais desses
tural original. Assim, países, mesmo te Chile África do Sul
eza. poderão estar agindo tipicamente =spanha Nova Zelândia

Costa Rica Indonésia


ortugal, ambos apresentam altos índic p an am á Canadá
canto .o .Tapão
. tem um a forte tendênci---------
r Argentina EUA
er pnncipalm ente as incertezas futura-------- -—
Filipinas
erra, Portugal tem se valido excessivan_Jil!3^
relação a com portam entos sociais, eci Coréia do Sul índia
«ociedade. México Malásia

e. é interessante observar que aquela: Israel Grã-Bretanha


com m aior nível de diálogo e consciêí Colômbia Irlanda
^rrelação com baixos graus de co Venezuela Hong Kong
esta afirmação com a Suécia, Dinamai
Brasil Suécia

Itália Dinamarca
es mais fechadas que rejeitam um a a
Paquistão Jamaica
encem ao grupo e que valorizam a hie
Lo-aceitação de insegurança do futuro Áustria Cingapura
à incerteza. Assim se situam o Japão, Taiwan
os. Países Árabes (2)
Q uadro 2.3, essas correlações não sãi
[íadas, como a índia, com baixo grau
«rtas como Israel, com índices elevac
52 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Mas qual é a form a brasileira mais típica de proporcionar um a sensação de


que a sociedade está preparada para enfrentar incertezas do futuro, advindas da
natureza, da guerra, com portam entais ou de outros acontecim entos e fenôm e­
nos imprevisíveis?
O brasileiro apresenta códigos de um a socialização do tem po que o colo­
caria mais próxim o de um a sociedade pouco preocupada com o futuro. Segu­
ram ente, ele vive m uito mais no tem po presente do que no futuro. A busca de
resultados imediatistas e de um a baixa capacidade de provisionam ento mostram
um a postura sem ansiedade para o que possa vir depois.

Esse lado mais descontraído pode ter explicação no que dizíamos anterior­
m ente em relação à sua capacidade de ter esperança em tempos m elhores, en­
tregue à proteção de um Deus que é brasileiro. Mas é possível, tam bém , que sua
tão propagada riqueza natural lhe dê m argem a sentir-se mais seguro, pois com
tais reservas pode sacar m uito hoje contra o futuro.
SISTEMA DE AÇAO CULTURAL BRASILEIRO 53

■ar uma sensação de A verdade é que o brasileiro tem um certo ecletismo quando se refere à re­
) ruturo, advindas da ligião. Apesar da influência da Igreja Católica, não ficou ele m enos influenciado
lam entos e fenôme- pelas cerimônias de origem principalm ente africanas. Ao lado da religião oficial,
quando o brasileiro freqüenta a igreja católica, ele não se esquece de consultar
> tem po que o colo- um cen tro espírita, ou um terreiro de um banda, para com isso se “g aran tir”
r a n o futuro. Segu- mais.
:• futuro. A busca de Porém, a tudo isto se sobrepõe um a forte capacidade de elaboração de leis,
►cnamento mostram regulam entos, normas. Para ficar em um só exemplo, citemos a nossa Constitui­
ção com 245 artigos, possivelmente um a das maiores do m undo, com o intuito
am plam ente declarado de tentar garantir ao povo vários aspectos novos e muitos
específicos pela força da lei m agna do país.
Analisemos com m aior profundidade este fato.
Subjacente à questão de regular com portam entos futuros em m aior ou m e­
n o r detalhe, está a estratégia de buscar viabilizar a construção nacional, em que
é preciso tentar articular os subsistemas dos líderes e dos liderados.
E preciso d ar possibilidade, mesmo que só formal, para que as relações en­
tre estes subsistemas ocorram de form a evolutiva, sem rupturas.
Na vida real, o que ocorre propriam ente é um a aceitação tácita das norm as
e regras, com um a prática distorcida, apoiada p o r outros elem entos culturais
mais vivos e presentes no com portam ento brasileiro.
"A esta discrepância entre a conduta concreta e as norm as prescritas que
se supõe regulá-la denom inam os formalismo. O formalismo não é necessaria­
m ente u m a patologia social como querem alguns autores. Em sociedades em
transform ação, como o caso brasileiro, pode ser visto com o um a estratégia de
m udança social, im posta pelo caráter dual de sua formação histórica e de m odo
particular como se articula com o resto do m undo" (Ramos, 1983).
Vejamos alguns exemplos do cotidiano. A lei que regulam enta a obtenção
de um em prego público através de concurso existe para que todos, através do
conhecim ento e m érito próprio, possam ingressar na atividade do serviço públi­
co. No entanto, outras variáveis socioculturais atuam na prática. A baixa quali­
ficação educacional, a escassez relativa de em pregos p ara um a m ão-de-obra
conhecer. abundante e as fortes relações pessoais que regem a conduta dos brasileiros fa­
zem com que a lei não seja cum prida nestas circunstâncias.
Existem processos ou canais extralegais, ou mesm o legais, aceitos como
norm ais e regulares pela consciência coletiva. Sua ética está no fato de que eles
dizíamos anterior-
perm item superar um peneiram ento social, muitas vezes imposto p o r leis e re­
npos m elhores, en-
gulam entos idealistas ou protecionistas.
I, também, que sua
is seguro, pois com Expressões com o fazer vista grossa, descobrir o mapa da mina, arranjar um pis­
tolão, quebrar o galho, são indicativos das variadas situações nas quais os critérios
54 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

legais são ignorados em favor de um a mobilidade social maior, quase sem pre as­
cendente.
A realidade é que existe um hiato entre o direito e o fato, que caracteriza
o formalismo, mas que tam bém o justifica. Este é o lado patológico do form a­
lismo, pois à m edida que ele de fato ocorre, processos de ajustam ento surgem
p ara superá-lo. Como estes processos são perm itidos e podem atingir as confi­
gurações de um nepotism o, favoridsmos e até mesmo subornos, isto gera insta­
bilidade e insegurança. Surge aí o risco de se aplicar novam ente o rem édio das
legislações, cada vez mais específico e abrangente, criando um turbilhão de n o r­
mas para um a aparente estabilidade nas relações sociais.
Nesta situação, dois fenôm enos podem teoricam ente ocorrer: a paralisia to­
tal do sistema ou sua com pleta desmoralização. No Brasil, tende a ocorrer a se­
g u n d a hipótese, que na verdade gera o início de um novo ciclo formalístico,
buscando novos estágios de construção nacional, através de reformas de legisla­
ção, como, p o r exem plo, nossas várias reformas monetárias.
Para ilustrar um a estratégia distinta, vejamos o que ocorre na Inglaterra,
um a sociedade com baixo formalismo. Sua constituição não é sequer escrita,
pois suas leis estão no espírito público antes de serem convertidas para o papel
e o discurso. As reformas não precedem os costumes, as leis não se antecipam
às práticas coletivas. Isto dá à sociedade inglesa um assentam ento mais sólido e
definitivo.
Normas gerais satisfazem os ingleses e não lhes causam desconfortos. Se es­
tas podem d ar m argem a várias interpretações, eles dispõem de um bom instru­
m ento para ajustamento: a negociação. E um a negociação eficaz, pois se fará em
condições de m aior igualdade, pois lá a distância do p oder é baixa e não fun­
cionará a hierarquia ou liderança autocrática.
Aqui no Brasil, como vimos, o processo é totalm ente diferente. Se as nor­
mas são bastante específicas, nosso ajustam ento se faz p o r um processo de rein-
terpretação das leis, cujo resultado vai d ep en d er essencialmente de quem está
do outro lado da questão. Se é pessoa de nossas relações ou com autoridade, a
flexibilidade na reinterpretação é ampla; se é pessoa fora das relações, a rigidez
é absoluta.
O utro não é o significado do dito: "Para os amigos tudo, para os inimigos
nada, para os indiferentes a lei", atribuído a Getúlio Vargas, e citado até hoje
com m uita freqüência.
E preciso analisar agora um lado diferente do formalismo: ser um a estra­
tégia de articulação com o resto do m undo.
O Brasil, suas elites e lideranças, o tem usado positivamente neste sentido.
E esta é um a necessidade não autônom a, pois é com andada por países mais de-
SISTEMA DE AÇÀO CULTURAL BRASILEIRO 55
ÍI5TRAR

social m aior quase sem pre F ' : ^ d o s , que têm um poder específico, seja ele econôm ico, político ou até
esmo militar.
ireito e o fato que caracteri um a vez’ ° formalismo se apresenta onde se deseja regular as relações
: D ]afj0 patológico do forrif-^ h d eres e liderados, buscando criar mecanismo de suposta estabilidade.
cessos de ajustam ento surge Todas as im portações institucionais que fizemos ao longo da nossa história
dos e podem atingir as coii[^am COm o pressupostos um alinham ento com os novos m ovimentos m un-
•smo subornos, isto gera ins^_, d 0 nosso m odelo republicano, em termos de constituição e organização
icar novam ente o rem édio d, Fitado, ao m uito provável m odelo de preservação am biental que está p o r vir,
criando um turbilhão de e serão soluções formalistas, o que nos inclui no clube das sociedades de-
; sociais. Evolvidas.
am en te ocorrer: a paralisia t £5ta possibilidade de abertura para as relações com o resto do m undo atra-
10 Brasil, tende a ocorrer a % ^e legislação e norm as foi tam bém a form a que o Japão aceitou depois de
e um novo ciclo formalístic»— ,tado pelos Estados Unidos. Sob a égide de reconstrução nacional, todos os
através de reformas de legi%ntutos dem ocráticos foram levados à sociedade japonesa, que passou a se in-
monetárias. g--ar ao m undo capitalista.
>s o que ocorre na Inglaten Hoje, o Japão continua usando do expediente do formalismo para se ajus-
jtituição não é sequer escrir e p0 r outro lado, resistir às interferências mais profundas de outros países
?rem convertidas para o pajfc ç^u m ercado.
imes, as leis não se antecipa .
m assentam ento mais sólido ° exem plo mais apropriado é o que estabelece norm as para a distribuição
í produtos de outros países no m ercado interno japonês. Form alm ente válidas,
tc ilm e n te atingem seus objetivos, pois h á costumes praticados de um a distri-
ies causam desconfortos. Se tição com vários níveis na cadeia que inviabilizam o preço competitivo de pro-
es dispõem de um bom inst%tos importados. Como dizemos no Brasil, isto é "só para inglês ver".
^ociação eficaz, pois se fará e
1 do poder é baixa e não fu

npunidade
»talmente diferente. Se as nc
e faz p or um processo de rei
essencialmente de quem eS Para com pletar os traços culturais brasileiros mais im portantes que desta-
relações ou com autoridade111105 no subsistema institucional, devemos fazer algumas considerações em re-
soa fora das relações, a rigid^ão à im punidade.
Este traço torna-se relevante à m edida que pode ser ele o elo que fecha
amigos tudo, para os inimig^-*1 cadeia de valores culturais e que lhe dá um a realim entação crescente. Es-
túlio Vargas, e citado até ho11105 nos referindo ao fato de que, estando os líderes ao largo das punições,
t o fortalece sua posição de poder, aum entando ao longo da cadeia do subsis-
m a institucional o grau de consistência entre os traços vistos anteriorm ente.
do formalismo: ser um a esti
O nde a lei só existe para os indiferentes e onde os direitos individuais são
lonopólios de poucos, a apatia só pode crescer, deixando o brasileiro cada vez
lo positivamente neste sen tic^s espectador,
romandada por países mais c
56 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Nossc
gregar tod
nunca do .<
de pressioi
tura mais <
quando ac
Nesse
çáo, visto q
como estín
d a em nos
O mo
onde abum
aqui existe:
Só ma
para a Qua
nossa cultu

2.2.3 Sut
Na bas
F ig u ra 2.12 Deixa como está para ver como fica.
que tem a c
dade pesso;
A sociedade que dava legitimidade aos seus líderes através do sistema jurí-
dico-institucional não lhe reconhece mais credibilidade, dando m argem ao ego­
centrism o d ep en d en te fundam entado em suas relações pessoais. No extrem o,
esta situação ficaria próxim a do dito popular "salve-se quem puder" ou daquilo
a que com um ente se cham a a lei de Gerson: "E preciso levar vantagem em tudo."
Um segundo efeito pode ocorrer. E a transformação em heróis daqueles
que conseguem resultados positivos com a transgressão da lei. Isto não chega a
ser incom um , a transgressão é um a vitória contra os líderes atuais e não um a
d erro ta do sistema racional-legal.
U m a aproxim ação do que é dito acima são os exemplos mais recentes dos
grandes bicheiros nas zonas mais populosas e industrializadas do Brasil. São eles
transgressores da lei, mas dentro de seu grupo e área de atuação, são heróis que
protegem seus membros.
De form a genérica, não querem os dizer que os grupos não tenham seus lí­
deres e heróis, mas sim que, se não houver um a referência m aior que esteja pac­
tu a d a fo rm a lm e n te e n tre os g ru p o s da so cied ad e, a te n d ê n c ia é de u m a
desagregação social en q u an to um a sociedade institucionalm ente constituída
para todos, cam inhando para um a sociedade com características essencialmente
tribais. F ig u ra 2
SISTEMA DE AÇÀO CULTURAL BRASILEIRO 57

Nossos heróis nacionais, que são um a referência geral e conseguem con­


gregar todos os brasileiros, têm-se originado mais do setor esportivo e quase
nunca do segm ento político. Atualmente, apesar de um m ovimento da socieda­
de pressionando p o r um a m udança de sua elite dirigente em torno de um a pos­
tura mais ética nos negócios públicos, existe ainda um alto grau de tolerância
quando acontece algo “com igo” ou com alguém do “m eu ” grupo social.
Nesse ponto, é preciso inverter o raciocínio e pesquisar a face da premia-
ção, visto que sob a perspectiva da punição, o prêm io é a im punidade. O prêm io
como estím ulo a um a atitude mais realizadora tam bém não encontra ressonân­
cia em nosso país.
O m odelo da prem iação positiva é m uito utilizado nos Estados U nidos,
onde abundam as classificações e os prêm ios em todos os setores. Os poucos que
aqui existem são iniciativas privadas em âm bito mais profissional.
Só mais recentem ente é que o governo estabeleceu um Prêmio Nacional
para a Q ualidade e Produtividade. Este expediente não tem fortes atrativos em
nossa cultura, em que a auto-estima ainda é pouco respeitada.

2.2.3 Subsistema Pessoal


Na base deste subsistema estão a segurança e a harm onia. Este subsistema,
que tem a categoria do personalismo, já apresentado, é com posto ainda da leal­
dade pessoal e do traço cultural evitar conflito.

F ig u ra 2.13 Traços culturais do subsistema pessoal.


58 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Lealdade às Pessoas

A lealdade às pessoas é a contrapartida do subsistema pessoal ao formalis­


m o do subsistema institucional e como tal é a responsável p o r articular os sub­
sistemas dos líderes e liderados, pelo lado do espaço "pessoal".
Vejamos inicialm ente alguns conceitos im portantes da sociologia de gru­
pos.
E ntre os fenôm enos psicossociais, a coesão social pode ser definida como
"a quantidade de pressão exercida sobre os membros de um grupo a fim de que
nela p erm aneçam ”, de acordo com Rodrigues (1973). H á várias razões capazes
de levar um a pessoa a pertencer a um grupo.
Entre elas existe a atração pelo grupo; neste caso, existem três possibilida­
des: atração pessoal, atração pela tarefa a ser executada pelo grupo e atração de­
vido ao prestígio que confere a seus membros.
V
Pela pró p ria característica do personalismo, que identificamos como m uito
presente no sistema de ação cultural brasileiro, devemos eleger a atração pessoal
com o o elem ento mais forte de coesão social no am biente brasileiro, sem des­
cartar, contudo, a atração pelo prestígio do grupo, que, eventual e idealm ente,
poderiam ser combinadas, visto que o prestígio do grupo está personalizado no
prestígio de um de seus membros.
A pesquisa sobre o caráter brasileiro dá-nos um sinal forte dessa tese, pois
m ostra que 40% dos entrevistados votam naquele que tem maiores chances de
vitória.
Fazer parte do grupo que terá prestígio e poder é um valor mais orientativo
p ara nós do que, p o r exem plo, nos Estados Unidos é a necessidade de expressar
sua consciência e p o d er individual, através do voto, em relação ao program a do
candidato.
A coesão social no Brasil está sujeita a um a ética pessoal que se manifesta
pela lealdade às pessoas. O m em bro do grupo valoriza mais as necessidades do
líder e dos outros membros do grupo do que as necessidades de um sistema maior
no qual está inserido.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 59

O m ecanism o, portanto, de am pla interligação entre os vários grupos de


um a sociedade está centrado na pessoa, essencialmente nos líderes. As decisões
tom adas em nível de colégio das lideranças, a exem plo daquelas realizadas no
Congresso Nacional, são bem aceitas e toleradas. A confiança é depositada na
pessoa do líder e ela passa a ser o elo de ligação da rede que integra os segmen­
tos.
Dificilmente os m em bros das equipes funcionam estimulados p o r sua auto-
estima e p o r sua obrigação consigo próprios. Na ausência do líder, pode existir
um clima de desorientação, como a pesquisa sobre o caráter brasileiro também
detectou, e, dessa forma, toda sociedade fica em função direta da presença do
líder.
F undam ental e responsável será o papel deste líder se a lealdade passar
para o plano da identificação ou imitação do líder. Esta é um a possibilidade p re­
visível em um a sociedade onde a individualidade é baixa e a dependência exer­
cida pelo co n tro le do co m p o rtam en to é praticada. Este fen ô m en o de fusão
O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

am pla e de pertença entre as pessoas envolvidas é um forte mecanismo de coesão.


No entanto, é tam bém frágil, pois, dependendo das relações pessoais, pode vir
a provocar facilm ente com partim entalizações e estratificações, ou "searas" pró­
prias.
Aqui, os aspectos da casa considerados p o r Roberto DaM atta interferem
novam ente. O m odelo de identificação familiar faz-se de form a extensiva e in­
tensiva.

C om binando o caráter de essencialidade da presença do líder com o cará­


ter clãnico advindo da dim ensão da casa, não é surpreendente vermos no am­
biente político as demissões solidárias ou o preenchim ento de cargos em blocos,
pois o sucesso ou a d erro ta de um a pessoa atinge um bilicalm ente a todos do
grupo. As "turmas se revezam no com ando da política e da econom ia brasilei­
ra ”.

Por conseqüência natural, as pessoas que obtêm a lealdade pessoal de seu


grupo form am um capital pessoal pela quantidade de seus seguidores, mas, tam­
bém , pelo acúm ulo de informações de que dispõem através deles.

Este capital pode naturalm ente ser barganhado com as áreas do poder, sa­
bedores que são da posição privilegiada que têm estes interm ediários que estão
nos nós de um a rede de mobilização. A política feita através dos votos de cabres­
to ou dos "cabos eleitorais" é um a dem onstração clara, apesar de rude, do re­
c o n h e c im e n to do valor destas pessoas p ara o bom fu n cio n a m en to de um a
em preitada no seio da sociedade.

Nas sociedades fechadas, esta é a única m aneira de acesso a seus membros.


No Brasil, com o no Japão, esta é um a das formas de se m anter im permeável a
agente externos.

E ntretanto, a lealdade às pessoas também tem um preço que, em última


análise, é a segurança ou a pressão dos membros do grupo. A sociedade é toda
perm eada pela busca da segurança, o que está bastante compatível com o índice
de controle da incerteza acima da m édia encontrado no Japão e no Brasil. São
sociedades que têm pouca disposição para aceitar o risco. O mesmo ocorre com
a A lem anha e, curiosam ente, Hofstede assinala: "E interessante notar que países
que procuram segurança têm-se dado m elhor nos últimos 20 anos do que países
tom adores de riscos."

U m a últim a consideração refere-se à interação entre a lealdade às pessoas


e o traço cultural mais forte do controle da incerteza que é o formalismo. Po­
dem ser vistos com o m ecanism os em oposição. D entro de um a lógica linear,
com o é a da sociedade alemã, quanto mais se fortalecem as instituições, mais se
enfraquece o p o d er das lideranças, pois o p oder se transfere para as norm as im­
pessoais.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 61

No caso inglês, ambos os mecanismos são enfraquecidos, ou m elhor, m ini­


mizados, pois se evita o excesso de norm as e se valorizam as negociações mais
individualizadas. O m ovimento no caso dos países como índia e China é no sen­
tido de valorizar unicam ente o líder clânico, com poucas regras formais.
No Brasil, a cada reforço que o formalismo recebe, mais vai se fortalecer
a lealdade às pessoas, para que o sistema ten h a condições de fluir. A solução
nara a rigidez institucional faz-se via tráfego das redes de relacionam ento pes­
soal.
Um esforço que vem sendo feito em sentido contrário pode ser destacado
no processo de desregulam entação pelo qual passam alguns setores no país.
Tem-se p ro cu rad o d im in u ir o artificialismo das norm as, concom itantem ente
com o enfraquecim ento dos elos das cadeias setoriais, sujeitos à ação da força
da lealdade às pessoas. Neste caso, existe um a valorização da iniciativa indivi­
dual, que, livre das norm as e das relações pessoais que dom inam o acesso aos
negócios regulam entados, pode perm itir um a entrada nos setores mais rápida
e direta, considerando-se som ente as regras do m ercado e a capacidade nego-
dal.

Evitar Conflito

Já vimos que a relação entre os indivíduos num a situação de desigualdade


de p o d er pode levar a um grau de alienação, baixa motivação e conseqüentes
passividade e pouca iniciativa. Vimos tam bém que esta mesma situação de de­
sigualdade de p oder e forte dependência pode representar um a situação latente
de conflito, que no caso brasileiro é tratado pelo expediente das relações pes­
soais, mais propriam ente pela lealdade a um a pessoa capaz de interm ediar a re­
lação entre líderes e liderados.
Vamos aprofundar-nos um pouco mais na dinâm ica do conflito, que cria
situações de tensão p o r envolver divergências de m érito ou de meios. No Brasil,
m uito mais nos meios de com o fazer do que no m érito do que fazer.
Diante de um a questão de objetivos ou estratégia, o tratam ento do alinha­
m ento de todos em torno de um a solução pode, segundo Etzioni (1961), de
acordo com o tipo de poder envolvido (coercivo, de recom pensa ou legítimo)
ter seu processo de envolvimento definido como sendo do tipo coercitivo-alie-
natório, remunerativo-calculativo ou normativo-moral, respectivamente.
T eoricam ente, o prim eiro tipo está próxim o do exem plo do presidiário,
com pletam ente alienado pela organização coerciva de prisão, enq u an to o se­
62 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

gu n d o segue o padrão dos prêmios para alcançar desem penhos significativos.


Por últim o, o m odelo normativo-moral é típico do m ilitante político que tem
um alto grau de com prom etim ento ideológico, p o r ju lg ar ser sua obrigação mo­
ral.

Pelos motivos anteriorm ente discutidos, com o pouco respeito às leis, nor­
mas e regulam entos, com a baixa prática de estabelecer premiações, parece que
a sociedade brasileira optou p o r um m odelo de envolvimento mais coercivo-alie-
nativo. Freqüentem ente, existem referências de que "calado, o brasileiro já está
errado", significando um a coerção através da punição para aquele que queira ar­
riscar-se a p articip ar com algum a sugestão, abafando qualq u er iniciativa em ­
p reen d ed o ra que os brasileiros p o r ventura tenham .

No entanto, esta seria um a interpretação sob a perspectiva do subsistema


institucional. Gostaríamos de desenvolver um a variação da classificação de Etzio-
ni que nos parece caracterizar mais o envolvimento brasileiro e que denom ina­
mos afetivo-moral (de ética pessoal). Isto porque, em um a sociedade onde a
lealdade é à pessoa do líder, que hum aniza as relações buscando harm onia do
grupo, alegria e descontração, no espaço da dim ensão pessoal, podem os iden­
tificar aí um a sedução afetiva que é sua principal arm a de com prom etim ento e
de coesão social.

Uma sociedade que tem esses valores orientativos, ao tratar de seus confli­
tos, não o fará abertam ente, colocando explicitamente as questões sobre a mesa,
com o nos Estados Unidos. Isto pode com prom eter o relacionam ento, criar cons­
trangim entos entre as pessoas, m inar a harm onia do grupo.

Os conflitos latentes, que vierem a ter um a escalada maior, deverão ainda


estar em um grau de imersão e serem tratados em circuitos fechados, com bas­
tante cautela para harm onizar pontos de vista pessoais.

Para isto, a solução brasileira é usar soluções indiretas (triangulações) entre


os pólos divergentes. Um terceiro que m antenha boas relações pessoais com am­
bos os pólos; é o mecanismo mais largam ente utilizado. Vale ressaltar que o tra­
ço de evitar conflito é m uito mais presente no sentido liderado-líder, enquanto
no sentido líder-liderado; o prim eiro não teme a existência do conflito, pois a
estrutura da relação já indica que o segundo irá encontrar soluções indiretas.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 63

Nosso processo de redem ocratização nos anos 80 foi conseguido desta ma­
neira; o papel do m ineiro Tancredo Neves não foi outro senão de, com amplo
acesso às partes envolvidas, harm onizar e formalizar acordos antecipados para
não criar impasses futuros, ou revanchismos pessoais. O processo tranqüilo de
transição do regim e ditatorial ao regime dem ocrático deu mostras do valor que
a sociedade dá à harm onia em nossas relações.

É preciso notar, porém , que tecnicam ente, o conflito pode alcançar a situa­
ção de impasse, em que as partes rom pem o relacionam ento e não há mais a
possibilidade de retorno, ou de recuo nas posições assumidas.

Se existe baixa capacidade de recuo, isto é, ínaior possibilidade de se en­


rijecerem as posições, mais im portante fica a noção de evitar conflito. O traço
brasileiro fica m uito claro na expressão popular de que "dou um boi para não
en trar na briga, mas um a boiada para não sair". Algumas variações podem ser
encontradas em termos regionais, mas a indicação dada pela pesquisa de Paula
Jr. (1991) m ostra um a tendência geral para a baixa capacidade de recuo do bra­
sileiro.

C ontudo, mesmo em um a situação de impasse, temos um a form a indireta


de tratar aqueles que são nossos inimigos declarados. A via formal, com o já vi-
64 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

mos, é pela lei. A via inform al, porém , é pela fofoca, que evita o confronto em o­
cional. De form a inversa, na frente dos outros não se discorda dos amigos. Pa-
rece-nos im portante e básico não deixá-los em situação constrangedora.
Considerem os agora a possibilidade de definir objetivos claros com o fonte
de motivação, isto é, estabelecer desafios explícitos e mensuráveis para serem al­
cançados. Veremos que para os brasileiros esta interpretação não é válida.
Pelo contrário, pode ser vista como fonte de conflitos porque, mais um a
vez, o brasileiro é motivado pelo relacionam ento e a busca de objetivos pode ter
com o pressuposto um a ação concorrencial, o que não nos estimula, pois é pre­
ciso ter agressividade contra terceiros, vontade de realizar, executar e fazer, o
que não é da natureza cultural brasileira.
C orroborando com esta noção, estão os resultados de Hofstede, que clas­
sificou os países segundo um índice de m asculinidade/fem inilidade, conform e
m ostrado no Q uadro 2.4. Toda sociedade constrói socialmente um a divisão de
papéis entre os hom ens e as m ulheres, atribuindo-lhes responsabilidades distin­
tas nas várias funções sociais. Q uanto mais fortem ente distintos forem estes pa­
péis, mais m asculina é a sociedade. Nelas predom inam os tradicionais valores
sociais masculinos, como: o herói é quem executa, realizar é mais im portante do
que estar, o grandioso é bonito sendo o pequeno deplorável; o vencedor é enal­
tecido ao invés da simpatia ao coitado derrotado; ser agressivo traz adm iração,
enquanto m anter e buscar mais qualidade de vida e relacionam ento são aspec­
tos secundários.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 65

Q u a d ro 2.4 M asculinidade e feminilidade.

Ordem País índice Ordem País índice

1 Japão 95 28 Cingapura 48
2 Áustria 79 29 Israel 47
3 Venezuela 73 30 Indonésia 46
4 Itália 70 31 África do Sul 46
5 Suíça 70 32 Turquia 45
6 México 69 33 Taiwan 45
7 Irlanda 68 34 Panamá 44
8 Jamaica 68 35 Irã 43
9 Grã-Bretanha 66 36 França 43
10 Alemanha 66 37 Espanha 42
11 Filipinas 64 38 Peru 42
12 Colômbia 64 39 África do Leste 41
13 África do Sul 63 40 El Salvador 40
14 Equador 63 41 Coréia do Sul 39
15 Estados Unidos 62 42 Uruguai 38
16 Austrália 61 43 Guatemala 37
17 Nova Zelândia 58 44 Tailândia 34
18 Grécia 57 45 Portugal 31
19 Hong Kong 57 46 Chile 28
20 Argentina 56 47 Finlândia 26
21 índia 56 48 Iugoslávia 21
22 Bélgica 54 49 Costa Rica 21
23 Países Árabes 53 50 Dinamarca 16
24 Canadá 52 51 Holanda 14
25 Malásia 50 52 Noruega 8
26 Paquistão 50 53 Suécia 5
27 Brasil 49

Nesta ordem das coisas, destacamos o Japão como o país mais masculino,
assim como Alem anha, Áustria e Suíça. No outro extremo, encontram os os paí­
ses nórdicos e a H olanda. Entre os m oderadam ente femininos estão Portugal,
66 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

França e Espanha, e no conjunto dos países m oderadam ente masculinos estão


México, Itália e Venezuela. O Brasil está rigorosam ente no centro, com 49 p o n ­
tos na escala de 0 a 100.
Esta é um a posição razoável, pois ao lado de nossas tendências p o r projetos
m egalom aníacos, da escassez de m ulheres em posições de com ando ou como
heroínas, é forte nossa necessidade de privilegiar o bem-estar, o relacionam ento,
a qualidade de vida e de ver nos coitados nossos heróis.
Convive-se aqui com um a indecisão de valores que seguram ente é mais um
fator a influenciar as decisões na vida nacional. O processo é m uito mais im por­
tante que a realização. Assim, se for preciso competição, vamos fazê-la de form a
cooperativa e para isto temos um governo para interm ediar.
Esta tem sido historicam ente a form a de o governo atuar no Brasil, no que
se refere à realização de projetos para o desenvolvimento nacional.
Desde a distribuição das capitanias aos cartéis setoriais econômicos atuais,
o padrão competitivo m uito pouco foi estimulado, inclusive com multinacionais.
Esta é, sem dúvida, um a capacidade de transform ar em bates abertos em alianças
cooperativas, através de acordos prévios.
Segundo Schein (1992), tudo isso segue o princípio m aior de se evitar con­
frontações e situações embaraçosas para os envolvidos. Se nos Estados Unidos,
onde prevalece o individualismo, esse com portam ento é visto com o inconve­
niente e, muitas vezes, como sinal de fraqueza, no Japão é adm irado como um a
arte e, mais do que seu aspecto estético, representa um a necessidade nas rela­
ções hum anas.
Porém , lá, o grau de m asculinidade é elevado, tendo o Japão um a grande
agressividade e competitividade que o motivam a conquistas externas. Com bina
com m estria a competitividade para fora e a cooperação para dentro.
No Brasil, temos um a competitividade mais para dentro, ao lado de tratar
de evitar os conflitos de form a declarada.

2.2.4 Subsistema dos Liderados

Ao discorrerm os sobre os subsistemas dos líderes, institucional e pessoal, ti­


vemos a oportunidade de tratar de dois dos traços que pertencem ao subsistema
dos liderados que são: postura de espectador e o evitar conflito.
Resta agora aquele que consideramos um dos mais im portantes no sistema
de ação cultural brasileira. E o que dá a articulação entre os sistemas institucio­
nal e pessoal no espaço dos liderados, assim como o paternalism o o faz no es­
paço dos líderes. E o traço da flexibilidade.
SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 67

F ig u ra 2.16 Traços do subsistema liderados.

A Flexibilidade é a versão m oderna do processo que se convencionou cha­


m ar de je ito criollo", como um a estratégia de segundo grau, isto é, suscitada do
form alism o cujas características seriam a criatividade e o pragm atism o. Hirs-
chm an, segundo Ramos (1983), explica o adjetivo criollo: "o term o é com um ente
aplicado na América Espanhola às maneiras de fazer as coisas que resultam de
um longo processo de adaptação a circunstâncias locais e que não correspon­
dem a qualquer plano intelectual preconcebido de origem estrangeira. No Bra­
sil, o j e i t o criollo fico u com u m a c o n o ta ç ã o in flu e n c ia d a p e la lite ra tu ra
sociológica de um processo de contornar um a dificuldade a despeito da lei e até
mesmo contra ela."
A p o n ta n d o u m a tra je tó ria p a ra este traço cu ltu ral, G u erreiro Ramos
(1983) prescrevia que à m edida que avançássemos na industrialização, esta seria
um a m aneira de agir em extinção, um a vez que a indústria não subsiste sem o
predom ínio da racionalidade das relações sociais. E dizia: "O jeito é tanto mais
eficaz quanto mais o exercício do p o d er público se acha subm etido ao interesse
de famílias ou clãs, no sentido latu do termo. O nde dom ina a política de clã,
pode-se sem pre dar um jeito, a despeito da lei ou contra ela.” Obviam ente a prá­
tica do jeito foi, no Brasil, mais usual do que hoje. O u a incom patibilidade com
o processo industrial não existe, ou a política de clã no Brasil aum entou de in­
tensidade, pois os indicadores pesquisados p o r Barbosa (1992) dão m ostra da
crescente presença do jeitinho em nosso país, consolidando fortem ente este tra­
ço, com o um dos marcos centrais de nosso sistema de ação cultural. Diz ela que
a expressão foi encontrada pela prim eira vez na literatura em 1943, mas foi em
68 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

meados da década de 50 que ela com eçou a se popularizar. Depois disso, sua
presença foi crescente em jornais, revistas, rádio e televisão, música, livros. Nem
mesmo com o avanço industrial a prática do jeitin h o diminuiu.
O que nos parece mais razoável é que, pelos efeitos perversos da crise eco­
nôm ica n a década de 80, com m aior concentração de renda, reforçou-se a dis­
tância do p o d er existente no país, o que significa dizer que a política de clã
fortaleceu-se. Como a crise pede segurança e um a das possibilidades é obtê-la
via relacionam entos, a condição de sobrevivência do indivíduo e da preservação
do corpo social, den tro do formalismo, agravado pela crise, se fez pelo jeitinho
brasileiro.
Parece-nos exem plar a criatividade e o pragmatismo do rapaz da zona nor­
te do Rio de Jan eiro alugando sandálias para atravessar a areia quente da praia,
estabelecendo ali um a atividade econôm ica informal, não sujeita à fiscalização
oficial; e se esta existisse, haveria sem pre guardada para estas ocasiões a expres­
são: "Q uebra o galho aí, moço."
A flexibilidade representa, na verdade, um a categoria com duas faces que
denom inam os de adaptabilidade e de criatividade, ambas reconhecidam ente
apontadas até pelos estrangeiros que nos visitam.

F ig u ra 2. IV Com jeito vai.


A adaptabilidade pode ser identificada não só em nível das empresas, que
dem onstram um a agilidade enorm e de se ajustarem aos vários pacotes econôm i­
cos governam entais, mas também em nível dos em pregados das empresas que
em contato com técnicos do exterior, responsáveis pela im plantação de proces­
sos tecnológicos im portados, apresentam um desem penho su rp reen d en te em
pouco tempo.
O conceito de adaptabilidade, visto pelo lado processual, não é um a cria­
ção em seu sentido puro, como a produção de algo novo. E um a capacidade
criativa que se exercita dentro de determ inados limites prefixados. Este contor­
no restritivo é exatam ente o processo que decorre no lado do subsistema insti­
tucional, no qual existe um reco n h ecim en to das norm as e em função delas
resulta um ajustam ento de elem entos operativos, criando apenas novos hábitos
condizentes com nossa m aneira de ser.
Esta flexibilidade dá-se pelo fato de o formalismo se ver diante da lealdade
às pessoas. Se p o r um lado existe um arcabouço normativo idealizado, a ser se­
guido d entro do dom ínio institucional, existe também um a rede de relaciona­
m en to baseada n a lealdade pessoal d en tro de um a realid ad e social que, se
acionada, vai estim ular a busca de um a solução para objetivos pessoais.
O conceito de criatividade tem em si o elem ento do inovador. Sua expres­
são mais significativa pode ser vista nas festas de carnaval, nas atividades espor­
tivas em equipe e em outras manifestações que, em bora individuais, tam bém se
constituem em construções amplas e originais da sociedade brasileira, como,
por exem plo, a do estilo arquitetônico de Brasília.
Ele ocorre em situações em que a igualdade ocorre de fato, em contrapo­
sição à igualdade de direito, conform e a concepção de Barbosa. Ela considera
que é preciso criar um a situação em que possa existir a igualdade entre indiví­
duos, saindo do dom ínio hierárquico para um dom ínio moral. Isto é, o que de­
veria ser igual p o r um a questão normativa, institucional, o é p o r um a questão
relacional, em que predom ina a ética pessoal.
E o que ocorre na festa do carnaval. Aí se processa a igualdade de fato, pre­
tos e brancos, ricos e pobres, poderosos e não poderosos, católicos e umbandis-
tas, brasileiros e estrangeiros, cultos e analfabetos, todos iguais sam bando,
cantando o mesmo enredo, senão para exibir, pelo m enos para divertir.
É preciso notar, porém , que mesmo neste m om ento, principalm ente nas
escolas de samba, existem os destaques e a comissão de frente, que sinalizam o
indivíduo se sobrepondo ao grupo, construindo novam ente um a hierarquia de
fato suportada, porém pelo relacionam ento pessoal.
Fica assim caracterizada, como um traço também m arcante em nossa cul­
tura, a flexibilidade de conviver com a hierarquia em um am biente de igualdade
de fato.
70 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Portanto, nem transgressor, nem legalista, simplesmente transcendente, os


dois ju n to s convivem sobrepondo-se, indo e vindo com liberdade que transcen­
de os limites, criam um a convivência natural e com binam seus elem entos areia
e água, mas continuam praia e mar.

2.3 CONCLUSÃO

Esta foi a descrição daquilo a que chamamos sistema de ação cultural brasileiro
cuja dinâm ica tem como resultado global um estilo de ser brasileiro, um a cons­
trução nacional que o distingue de outras nações, p o r mais que se queira im-
por-lhe modelos de outros países. A identidade nacional existe, mesmo que o
pessimismo de alguns a interprete como a de Macunaíma, o herói sem caráter.
Ledo engano, pois o caráter de M acunaíma é na verdade multifacetado, um ser
"compósito", feito de aparentes contradições e incoerências, e é isto que lhe dá
tipicidade.

_________ _____________ __ ==-— _________

Concentração Personalismo
de poder

Paternalismo

<D
Ë.
Q.
Q>
CL
CD
Impunidade ay
co
•U
CD
V)
CO
o
Q>
__ _
Flexibilidade

Postura de Evitar
espectador conflito

F ig u ra 2.18 Sistema de ação cultural brasileiro.


SISTEMA DE AÇÃO CULTURAL BRASILEIRO 71

nscendente, os A capacidade de flutuar nos espaços dos líderes e dos liderados, ou do ins­
que transcen- titucional e do pessoal, ligando-os através do paternalism o e da flexibilidade, do
em entos areia formalismo e da lealdade pessoal, explicam alguns dos paradoxos de nossa so­
ciedade. U m a sociedade alegre, harm ônica mesmo na pobreza; criativa, mas
com um baixo nível de crítica. A form a de operar estes aparentes paradoxos,
como explicado neste capítulo, é que faz típica nossa cultura, deixando os ob­
servadores externos adm irados com nosso jeito de ser.
E para provar que até esteticamente este caráter é m erecedor de adm ira­
'ural brasileiro ção, lem bram os a descrição de DaMatta (1984) sobre nossa capacidade relacio­
J, um a cons- nal, "que p reten d e ligar, com força, sugestividade e inigualável desejo, o alto
: queira im- com o baixo, o céu com a terra, o santo com o pecador, o interior com o ex­
esmo que o terior, o fraco com o poderoso, o hum ano com o divino, o passado com o p re­
em caráter, sente...".
ido, um ser
Conviver com os opostos é um a arte. E é esta a base de nosso estilo de ad­
que lhe dá
m inistrar. No próxim o capítulo, estaremos descrevendo o im pacto da cultura
brasileira nos processos de gestão.
3
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA
NA GESTÃO EMPRESARIAL

A em presa é um espaço sociocultural. Não há como abstrair-se desta pers­


pectiva. Este espaço tem sua dim ensão mais profunda nas premissas culturais
que suportam as atitudes e com portam entos dos grupos na em presa (um a em ­
presa aberta ou fechada, o valor do trabalho e do ser hum ano, a im portância
do futuro e como enfrentá-lo) e tem sua dim ensão mais visível nos mitos e sím­
bolos (títulos nos cartões, salas grandes para chefias, andares para diretorias, dis­
tribuição de d ep artam en to s pelos an d ares, vistas privilegiadas, retrato s nas
paredes, placas de com unicação visual), nos ritos e rituais (o gerente que anda
na fábrica pela m anhã todos os dias, ou reuniões todas as sextas-feiras, ou co­
m em orações de todos aniversariantes) e nos heróis e lendas (o Zé saiu do hos­
pital para o trabalho, "virou" três dias direto na em presa sem ir p ara casa),
presentes no dia-a-dia da empresa.
Estes elem entos caracterizam a cultura organizacional da em presa. O que
iremos abordar é como os traços culturais brasileiros impactam e agem sobre os
vários com ponentes do sistema de gestão: na formulação de estratégias em pre­
sariais, no processo decisório, no processo de liderança, no processo de coesão
organizacional, no processo de inovação e m udança e nos processos de motiva­
ção.
Para tanto, usaremos como referência o sistema cultural apresentado ante­
riorm ente, verificando como a prática de cada um dos processos gerenciais está
correlacionada com o estilo brasileiro de ser.
É preciso lem brar que o fato de term os práticas administrativas diferentes
em outras culturas, muitas delas defendidas como as mais corretas, não significa
que a prática brasileira esteja errada. Pelo contrário, é a m aneira pela qual con­
seguimos agir naturalm ente, sem constrangim entos e com satisfação. Se os re­
sultados não são os m elhores em term os competitivos, devemos aperfeiçoar
nosso jeito e não simplesmente copiar outros estilos.
74 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Qual é o m elhor jeito de adm inistrar conflitos? O am ericano, de assertivi-


dade e face a face, ou o japonês, de pouca assertividade e de construção de um a
solução a p artir do outro? O u o brasileiro, de evitar o conflito direto, especial­
m ente com quem detém o poder, e fazê-lo através de um mediador? A avaliação
da eficiência destes métodos será m edida no curto ou no longo prazo? É difícil
dizer qual é o m elhor, pois os critérios podem ser amplos. M elhor para quem
e m elhor para quê?
Nosso objedvo é constatar o que ocorre, atualm ente, dentro das organiza­
ções brasileiras, com ênfase nos empresários, dirigentes e gerentes da Região Su­
deste. Para que se possa fazer um a generalização para o universo de empresas
de outras regiões, seria preciso um cuidado m aior em relação a como se altera
a relevância de uns traços culturais sobre os outros, o que evidentem ente dará
um a dinâm ica do sistem a de gestão diferente, porém todos equivalentes en­
quanto gerados pela mesma base de traços culturais.
Assim, este trabalho apreciará nosso estilo de adm inistrar, com parando-o
com os de outras culturas, reconhecendo a riqueza analítica de observar o que
ocorre em culturas diferentes, em outros países. Isto facilitará a descoberta de
nossas peculiaridades e de como estamos posicionados em relação a outras cul­
turas empresariais.
D entro de nossa realidade, selecionamos um a am ostra que procurou atin­
gir em presas de portes variados, bem com o de setores diversificados e tendo
controles acionários na maioria nacionais. C ontudo, também as multinacionais
se fizeram representar.
O ambiente brasileiro passa por transformações profundas, o que vai exi­
gir m udanças no sistema de gestão das empresas, que serão mais ou m enos fa­
cilitadas p o r alguns traços culturais. N ão estam os su g erin d o q u e os traços
culturais deverão m udar, mas que alguns deles deverão evoluir e ter m aior ên­
fase sobre outros.
Cada um dos processos com ponentes do sistema de gestão tem o im pacto
de diversos traços. Esta sim ultaniedade de causas torna a análise complexa. O
que estaremos procurando discernir é em que sentido os vários traços facilitam
ou dificultam a m udança de um sistema de gestão.
Como fonte de dados para estas observações, vamos nos valer da pesquisa
de traços culturais na em presa brasileira feita através de levantam entos especí­
ficos ju n to aos empresários, dirigentes e gerentes brasileiros. A pergunta básica
desta pesquisa foi: Quais os reflexos em sua gestão de cada um dos traços cul­
turais brasileiros (definidos no sistema cultural já apresentado)?
C om plem entarm ente, utilizaremos alguns estudos realizados em nível in­
ternacional, que têm considerado a gerência brasileira, para analisar caracterís­
ticas comparativas com outras culturas.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 75

Destaca-se a pesquisa elaborada por A ndré Laurent, realizada com execu­


tivos de diversos países pardcipantes dos program a do INSEAD, que correspon­
de a um total de 1.167, até o ano de 1993. Esta mesma pesquisa foi aplicada por
nós em 2.500 executivos brasileiros, cujos resultados serão utilizados nas análises
deste capítulo.
O utra pesquisa a que recorrerem os novamente neste capítulo é a de Hofs-
tede (1987), que apesar de ter sido aplicada em um a única em presa, com atua­
ção em vários p aíses, nos serve de re fe rê n c ia p a ra u m a co m p aração dos
resultados que encontram os em nossa pesquisa.

3.1 PROCESSO DE FORMULAÇÃO DE ESTRATÉGIAS

Como prim eiro com ponente do sistema de gestão, analisaremos a estraté­


gia do negócio e o processo de estabelecê-la, verificando o im pacto dos seguin­
tes traços: a concentração do poder, o personalismo, a postura de espectador,
o formalismo e a flexibilidade.
A concentração de poder coloca nas mãos de um a pessoa os destinos da or­
ganização. Esta situação predom ina nas empresas brasileiras, mas tem manifes­
tações d iferen tes nas realidades am ericana e jap o n esa. A d iferen ça está no
processo de conduzir a decisão. No caso japonês, várias estratégias são propostas
pelo nível inferior, de acordo com a realidade vivida p o r estes níveis, mais pró­
ximos e sensíveis a algumas m udanças em processamento. O presidente vai ape­
nas s a n c io n á -la s o u n ã o , le g itim á-la s o u n ã o e a m p lia r o u r e d u z ir seu
aproveitam ento. No caso am ericano, a estratégia sai de um processo de form u­
lação elaborado nos altos escalões da empresa, envolvidos por extensos estudos
de um staff ou consultores à busca de oportunidades criativas e inovadoras. Em
termos comparativos, o caso brasileiro está mais próxim o do am ericano. As em­
presas que têm um processo de planejam ento em presarial formalizado estabe­
le c e m a e s tr a té g ia n o n ív e l s u p e r io r e a q u e la s q u e a fo r m u la m m ais
inform alm ente têm na intuição do presidente ou de mais alguém próxim o dele
a fonte do pensam ento estratégico.
Neste m om ento é que se revela o personalismo como traço atuante, pois
a solução será dada p o r um a única pessoa. A conseqüência é que fica fácil para
o corpo de liderados identificar a responsabilidade única pelos rum os da em pre­
sa. Q uando este enunciado é claro e assertivo, não deixa dúvidas para outras de­
cisões su b seq ü en tes nos níveis in ferio res e, em ex istin d o dúvidas, sabe-se
exatam ente a quem recorrer.
Por outro lado, este estilo visa à m anutenção do poder, seja pela preserva­
ção das informações, seja pelo ritual do "pedir a bênção". Esta é a faceta do per­
sonalismo para que todos saibam quem m anda na em presa. Isto faz com que
76 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

não haja um a explicitação e divulgação correta das direções e rumos da em pre­


sa, deixando os liderados em um a condição de incerteza e insegurança, estimu­
lando inclusive a busca de informações através da rede de relações.
Poderia pensar-se que este procedim ento contraria o traço do formalismo,
um expediente eficaz em nossa cultura, mas neste caso é perfeitam ente expli­
cável, pois o formalismo é um instrum ento utilizado para a busca do controle
da incerteza, no senddo de dar estabilidade à relação dos líderes com os lide­
rados, e não para restringir a ação dos líderes ou deles exigir o cum prim ento
do que foi estabelecido. Por parte dos líderes, o escrito é sinal de rigidez e de
perda de flexibilidade para sua atuação, mas para os liderados torna-se um ins­
trum ento regulatório.

Esta fluidez e grau de liberdade que se gera para dentro da em presa não
tem igual correspondência em relação ao am biente externo. O traço postura de
espectador interfere diretam ente na postura estratégica das empresas em rela­
ção a seu am biente de negócio. A exemplificação que trazemos fez parte dos re­
sultados do estudo da com petitividade da indústria brasileira (Spyer Prates,
1993b).

Neste estudo, onde se analisa a gestão como um fator de competitividade,


ficou bastante evidente que as estratégias utilizadas pelas empresas brasileiras,
em tem po de recessão, tiveram um perfil caracterizado pela prudência. Ficaram
observando o am biente para ver o que aconteceria.

A grande m aioria das empresas praticou um a estratégia defensiva. Deram


prioridade à racionalização de recursos, com iniciativas acanhadas em termos de
desenvolvimento de produto. Prevaleceu o aperfeiçoam ento dos produtos exis­
tentes e a preocupação em m anter os mercados atuais, praticando baixos inves­
tim entos de risco.

Esta é um a dem onstração típica da relação cautelosa e às vezes passiva dos


em presários brasileiros com seu am biente de negócio e não como vim ator deste
cenário.

O utras posturas são possíveis neste m om ento. C onsiderando dois pontos


extremos, temos de um lado a ação empresarial am ericana de modificar seu am­
biente, nele atuando diretam ente a partir de seu p oder de influência. Do outro
lado, temos o entendim ento dos japoneses, que também aceitam o fato do am­
biente, mas dele tentam criar uma alavanca de crescimento, um a nova oportu­
nidade.

O caso mais recente da postura am ericana é a atual reação de sua indústria


automobilística, que recupera no m ercado interno sua posição competitiva dian­
te dos carros japoneses. Um rearranjo substancial processou-se na indústria para
se obter um a nova posição de superioridade.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 77

O exem plo japonês pode ser dem onstrado com sua reação à crise de ener­
gia. Ela foi utilizada para alavancar mais ainda a eficiência produtiva naquele
m om ento, obtendo m enores consumos energéticos, para um a mesma produção.
Ao invés de ser um a restrição, os novos meios de utilização perm itiram até um
aum ento de produção.
O caso brasileiro é de aceitar com passividade a condição externa e reagir
defensivamente. O que vem de fora toma-se um constrangim ento real. A reces­
são é tratada como um dado do problem a e, assim o sendo, buscam-se medidas
adaptativas. E quando nossa flexibilidade se manifesta com sua face do subsis­
tem a institucional.
D urante os vários planos econômicos, as empresas conseguiram reagir ra­
pidam ente às novas regras impostas, buscando soluções pouco inovadoras, po­
rém eficientes, para sua sobrevivência.
Aqui, a noção de tem po assume relevância e interfere profundam ente no
tipo de visão estratégica que possa ser formada. Como já vimos, o fator tem po
pode ser visto como um recurso limitado em algumas culturas e abundante em
outras.
No prim eiro caso, como o dos Estados Unidos, a orientação é para o curto
prazo, esquecendo-se das bases do passado e se voltando prioritariam ente para
o futuro. Comparativamente, no Japão a perspectiva de planejam ento e das de­
cisões dele decorrentes é para o longo prazo, sendo que os fatos passados e a
história são relevantes para as novas estratégias a serem definidas. No caso bra­
sileiro, somos mais imediatistas, não temos m em ória e a perspectiva está mais
voltada para o presente. Praticamos um a sucessão de decisões para a sobrevivên­
cia de hoje, pois o "futuro a Deus pertence". Se somos espectadores da evolução
dos fatos externos, somos criativamente pragmáticos no curto prazo.
Poderíam os dizer que hoje, de forma em brionária e reservada a algumas
empresas brasileiras, já se observam alguns sinais de atitudes mais proativas no
sentido de construir seu futuro a partir dos fatores externos e num a perspectiva
de longo prazo. No entanto, um a contam inação geral deste espírito talvez só
virá de form a gradual, se tivermos um am biente ecônom ico estável p o r vários
anos, contribuindo para a evolução deste traço cultural.
Devemos refletir sobre a afirmação de que "o planejam ento estratégico é
mais popular nas empresas dos países nos quais a cultura é de fraco controle da
incerteza, pois ele pressupõe um a tolerância grande à am bigüidade e ao afasta­
m ento das certezas do passado", colocada por Agrícola (1989).
E preciso en ten d er o planejam ento estratégico, não como um sistema ad­
ministrativo em que o processo burocrático seja o essencial, mas em que preva­
leça sua função de ardculação da em presa com o am biente futuro de negócios.
78 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Esta referência nos leva a identificar as empresas americanas com mais pro­
pensão a utilizar o planejam ento estratégico, devido a sua disposição de confor­
m ar o futuro.
Por outro lado, onde aquela função do planejam ento não é aceita com na­
turalidade, procura-se formalizá-lo e estruturá-lo passo a passo, ritualizando-o de
form a excessiva, não lhe dando a agilidade necessária para a tom ada de decisão.
No caso dos alemães, eles planejam adequadam ente para o longo prazo,
com benefícios evidentes, porém perdem em flexibilidade e em rapidez de rea­
ção quando é necessário lidar com problem as de curto prazo. A burocracia nas
empresas im pede totalm ente a obtenção de informações com rapidez e as de­
cisões tendem a ser lentas.
No Japão, como foi visto, a cultura apresenta-se m uito mais forte em termos
de controle das incertezas que no Brasil, indicando um processo de planejam en­
to mais formalizado também. Ao mesmo tempo, os vínculos com o passado di­
m in u em os graus de liberdade p ara um a flexibilidade am pla e criativa. Isto
torna o planejam ento um processo mais rígido e de m aior continuidade, pro­
vocando, em conseqüência, decisões mais lentas.
No Brasil, nossa cultura, com parada com a dos americanos, é de um con­
trole da incerteza mais alto, porém mais baixo que o dos japoneses e mais pró­
x im o d o s a le m ã e s. N ossa fo rm a de c o m b a te r a in c e r te z a é atra v é s da
normatização. Em relação às ações do passado damos pequeno valor a nossa m e­
m ória e, influenciados p o r nossa flexibilidade, procuram os recriar tudo.
Dessa forma, o planejam ento estratégico no Brasil apresenta dificuldades
culturais para se fixar de form a mais natural e nos moldes como é tratado nos
outros países. Aqui, devemos tratá-lo como um instrum ento mais flexível e di­
nâmico, sem o que será m era formalização. Nosso pragmatismo e nossa rapidez
de adaptação dificultam uma posição para resultados de longo prazo. Igualm en­
te ineficiente fica o processo de planejam ento, ao considerarm os que com a va­
riabilidade dos fatos externos ele não é tratado como um processo contínuo e
conseqüente. Tudo recom eça sempre, pois as premissas em que se baseou o pla­
nejam ento não têm a visão de longo prazo. Por mais paradoxal que possa pa­
recer, p o r não se qu erer correr risco, só se faz o planejam ento de curto prazo
e este deve ser constantem ente revisto. O paradoxo é que o planejam ento é exa­
tam ente um instrum ento útil para se evitar maiores riscos no longo prazo.
Muito se fala hoje de administração estratégica, que daria à em presa flexi­
bilidade e rapidez de ajuste às turbulências externas. Ela pressupõe um a postura
dissem inada do pensam ento estratégico em vários níveis da organização. Para o
caso brasileiro, os traços culturais discuüdos nesta seção atuarão como dificul-
tadores na im plantação de vim processo de administração estratégica. Sem dú­
vida, será preciso um esforço m uito m aior e grande persistência para obtê-la
enquanto um processo de gestão.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 79

3.2 PROCESSO DECISÓRIO

Especificamente em relação ao processo decisório nas empresas brasileiras,


vamos verificar que a grande m aioria dos traços apontados anteriorm ente afeta
de algum m odo este processo. Discutiremos a influência da concentração do po­
der, do personalismo, do paternalism o, da postura de espectador, do formalis­
mo, da lealdade pessoal, do evitar conflito e da im punidade.
O processo decisório nas empresas pode ser discutido sob várias perspec­
tivas. Nossas observações serão feitas a partir do interessante jogo" de transfe­
rências que ocorre de m aneira geral nas empresas. São dois os fenôm enos: a
transferência para cima feita pelos liderados e a transferência para baixo feita
pelos líderes. Um verdadeiro "ioiô" de transferências de responsabilidades que
ocorre no processo decisório.
Em prim eiro lugar, vejamos quem participa e quem tem o p oder na fase
de tom ada de decisão.
Nossa cultura de concentração de poder, que ainda é significativamente
presente, não deixa dúvidas sobre quem é o responsável pela decisão. Por outro
lado, a valorização do conhecim ento, mesmo sendo superficial, e a conseqüente
desvalorização do esforço mais rotineiro e mecânico, não deixam dúvidas sobre
quem deve im plem entar. "Manda quem pode, obedece quem tem juízo", apesar
de o discurso ser feito no sentido da participação e consenso.
Esta distinção entre a tom ada de decisão e a im plem entação de assuntos,
sejam estratégicos, táticos ou operacionais, reproduz-se ao longo de toda a linha
hierárquica.
A cobrança p o r este com portam ento pode ser m ostrada no resultado ob­
tido em nossa pesquisa. Ao perguntarm os aos gerentes brasileiros se "é im por­
ta n te q ue o g e re n te te n h a respostas precisas p a ra a m aio ria das q uestões
colocadas pelo subordinado sobre assuntos referentes ao seu trabalho", consta­
tamos em 83% dos casos um a resposta afirmativa. A Figura 3.1 mostra-nos este
resultado com parativam ente a outros países.
80 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

"É IMPORTANTE QUE O GERENTE TENHA RESPOSTAS PRECISAS PARA A


MAÍORIA DAS QUESTÕES COLOCADAS PELO SUBORDINADO SOBRE
ASSUNTOS REFERENTES AO SEU TRABAHO"

F ig u ra 3.1 Os sabidões.

Além de transferirem a responsabilidade para instâncias superiores, isto re­


vela a dependência criada pelo paternalismo, um a com binação da concentração
de po d er e do personalism o, bem como pela postura de espectador p o r parte
dos subordinados. Isto é absorvido pelos líderes e tem a conotação de preguiça
e falta de segurança para assumir responsabilidades, refletindo na necessidade
de m anter um controle mais rígido (o que nem sem pre acontece). Por outro
lado, envaidece o líder, pois ele se sente poderoso e indispensável. Neste sen­
tido, cria-se um círculo vicioso em que os liderados se mostram sem pre inexpe­
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 81

i PARA A rientes em tom ar a decisão e os líderes concentram decisões de caráter mais


50BRE
operacional. O que se observa, em piricam ente, no Brasil, é que esta transferên­
cia de responsabilidade de decisões ocorre em todos os níveis, inclusive no nível
dos presidentes das empresas. Decisões que poderiam ser tomadas pelas em pre­
sas são transferidas para o nível governam ental, num a tentativa de se resguardar
de riscos. A responsabilidade pela tom ada de decisão individual deve ser um
processo de aprendizado em que o erro não intencional não deveria ser punido.
Encorajar a decisão ou assumir o risco pela tom ada de decisão é um problem a
para as empresas brasileiras.
Atualm ente, fala-se m uito em encorajar e dar espaço ao em preendedor. Po­
rém, na realidade, percebe-se que este só pode acertar. A forma de lidar com
o erro é desencorajadora e punitiva. O elem ento que contribui fortem ente para
esta diferenciação é o status relacional das pessoas envolvidas. Para aqueles da
rede de relações, o tratam ento pode ser encorajador e até de permissividade.
Contudo, tam bém na França, os indivíduos subordinados, regra geral, não
desejam participar nas decisões. Esta é um a das conclusões de Hofstede, obser­
vando a variável “concentração de p o d er” . Faz parte da expectativa dos lidera­
dos que os líderes exerçam a lideran ça autocrática. Torna-se difícil p ara os
líderes exercer a liderança sob qualquer outra forma que não a autocrática.
R everter esta situação, para agilizar a decisão em am biente competitivo,
vem sendo a necessidade de empresas no Japão, é o que nos m ostra Yoschimoto
em seu livro (1992). Foi um esforço de m udança cultural a prática do Banco Su­
mitomo, quando se reorganizou em seis unidades e concedeu para o cabeça de
cada divisão autoridade ilimitada.
Hoje, existem fortes indícios de que este processo esteja revertendo-se tam­
bém no Brasil. As empresas estão assumindo um núm ero m aior de decisões sob
sua responsabilidade e risco. A descentralização interna também deveria ocor­
rer, principalm ente reforçada pelos movimentos de redução dos níveis hierár­
quicos, d esen ca d ead o s nas g ran d es em presas, no início destes anos 90. A
constatação deste aprendizado só virá dentro de mais algum tempo.
Vejamos agora como é tratada a im plem entação das decisões e qual o fe­
nôm eno que aqui ocorre.
riores, isto re­ Desta feita trata-se da transferência de responsabilidade para baixo, signi­
concentração ficando que o líder que decidiu não está afeito a repassar para os subordinados
dor por parte os detalhes executivos. A maioria gosta de liderar com diretrizes gerais, mais do
o de preguiça que com norm as e procedim entos detalhados, que sejam orientativos para seus
a necessidade liderados. Este foi um resultado verificado em pesquisa realizada pelo Sebrae so­
ei. Por outro bre o perfil do gerente brasileiro. Isto nos parece bastante coerente com o traço
el. Neste sen- de personalism o, pois a orientação genérica lhe perm ite exercer m aior flexibi­
rnpre inexpe- lidade e interpretação pessoal em seu gerenciam ento.
82 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Essa assertiva pode parecer contraditória, já que sabemos que presencia­


mos nas empresas brasileiras um a quantidade excessiva de norm as adm inistra­
tivas. Na realidade, porém , a presença dessas norm as não significa que elas
sejam conhecidas ou que reflitam as práticas nas empresas. De fato, pode-se di­
zer que, além de serem controladas pessoalm ente pelos gerentes, que dizem
quando, com o e onde elas dever ser aplicadas, tais norm as têm, geralm ente,
um a orientação corretiva. Assim, em vez de espelharem com portam entos reais,
elas se destinam a corrigir o que se percebe como sendo um abuso das relações
pessoais. O resultado é que, quanto mais norm as são feitas para corrigir clien-
telismos e nepotism o, mais aparecem esses fenômenos. Daí o alto grau de for­
malismo, discrepância entre a norm a prescritiva e a prática real, nas empresas
brasileiras: regras para “o de fora” ver.
No início dos anos 90, as empresas brasileiras iniciaram seus program as de
qualidade total, bem como a im plantação de processos de certificação da qua­
lidade, orientados pelas normas ISO 9000. O lhando sob a perspectiva cultural,
devemos nos preocupar com a possibilidade de termos na em presa apenas várias
certificações da qualidade (um diplom a), sem, na realidade, elas apresentarem
a qualidade total. As norm as da ISO 9000 apenas garantem que exista um sis­
tem a de qualidade formalizado, mas não garantem necessariam ente a qualida­
de, p o r exem plo, dos produtos.
Normas prescritivas, que são absolutam ente evitadas, caracterizam-se como
decisões previam ente determ inadas e formalizadas, e, como tal, estarão sujeitas
a reconhecim ento e legitimação por parte daqueles que a devem seguir. Neste
instante, nas empresas brasileiras, prevalece o p oder pessoal sobre o p o d er ins­
titucional.
A título de com paração, vejamos como acontece o relacionam ento líd e r/li­
derado na Alem anha, em relação a este jogo de transferências, conform e des­
crito p o r B em thal (1978), que procura verificar o im pacto da cultura alemã no
estilo gerencial das empresas.
O liderado recebe, ju n to com a liberdade total de im plem entação, a auto­
ridade ilimitada para fazê-lo. O liderado tem o direito de sugerir m udanças e
de ap o n tar sua avaliação através da cadeia de com ando hierárquica. Ele assume
a obrigação de realizar a tarefa a partir de sua própria iniciativa e inteligência
e é desencorajado a reto rn ar a seu líder para mais conselhos ou apoios e cober­
tura. Não h á o processo que chamamos de delegação de volta. Ele recebe a res­
ponsabilidade legal e moral de realizar o trabalho estabelecido na descrição e nas
instruções do m anual e as segue rigorosamente.
O princípio da delegação de responsabilidade é acom panhado p o r um a
forte noção de prestação de contas. A rotina diária é gerenciada p o r delegação
de responsabilidade, mas as decisões não usuais e excepcionais têm um processo
de consulta controlada realizado individualmente. Após as consultas, em que se
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 83

colhem idéias e se debate, cada um tira suas próprias conclusões e nunca há


um a votação. A decisão é do líder e somente a im plem entação da decisão pode
ser discutida.
Na Alem anha, o líder m aior tem considerável autoridade e liberdade, re­
sultando no que se poderia descrever como a hierarquia dos déspotas. Indivi­
d u alm en te , os alem ães dão o m elh o r de si e não p edem ajuda ou dividem
inform ação. Internam ente, em cada unidade no nível operacional, o processo
decisório é realizado p o r consenso, requerendo bastante tempo.
Este m odelo de liderar através de norm as gerais aproxima-se da filosofia
am ericana de descentralização, em que as decisões devem ser tomadas no nível
mais baixo da organização, onde existe a com petência adequada e a m elhor in­
form ação disponível. Tam bém consagra a considerável am plitude que tem o su­
bordinado para determ inar a m aneira de im plem entar, dentro do espírito da
gerência p o r objedvo.
C onfirm ando as colocações acima, recorrem os novam ente aos resultados
da pesquisa m ostrados na Figura 3.1. Nos Estados Unidos, onde só 18% concor­
daram , prevalece o reconhecim ento de que os subordinados devem ser parte do
processo decisório e com poder para resolverem os problem as em seu nível ou
de situações delegadas com autoridade. Já na Alemanha, os subordinados reco­
nhecem com mais ênfase sua dependência em relação a decisão superior, pois
46% confirm aram a hipótese da pergunta.
Até aqui, os modelos vistos consideram o processo decisório, em suas eta­
pas de tom ada de decisão e im plem entação, de forma estanque ou dividida.
No Japão, o processo decisório segue outros caminhos: "Eu posso decidir
que quero fazer um a coisa, mas se eu não tiver o apoio dos funcionários, a idéia
não dará certo. Lá, até mesmo um executivo-chefe, cuja em presa ostente seu
nom e, sabe que precisa encontrar um equilíbrio entre seus desejos pessoais e a
harm onia do grupo. Nos Estados Unidos, o chefe é o cheíáo e ele dá as ordens.
Aqui, isso pode se tornar algo m uito perigoso" nos conta Noritake Kobayashi -
Reitor da escola de adm inistração da Universidade de Keio. Porém, nos Estados
Unidos, o chefe pode ser questionado sem os riscos de que isto provoque trau­
mas na organização.
Para se evitar isto, tem-se considerado o processo decisório jap o n ês um pro­
cesso de consenso, pelo fato de envolver várias unidades e vários níveis da or­
g a n iz a ç ã o . Este m esm o sistem a n ã o d ife re n c ia , p o r ta n to , a d e c isã o d a
im plem entação, fazendo com que a integração destas duas fases ocorra natural­
m ente d u ran te entendim entos informais antes do ritual formal (sistema ringi)
de aprovação do docum ento com o plano, que passa por toda a cadeia vertical
e horizontal das pessoas envolvidas, obedecendo a ordem hierárquica ascenden­
te. É interessante observar a capacidade de veto de que dispõe qualquer um a das
pessoas envolvidas. Caso seja reprovado pela segunda vez consecutiva o projeto
84 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

será arquivado. Isto m ostra na prática o equilíbrio do p o d er entre os membros


do grupo, totalm ente desvinculado da cadeia hierárquica. O status da hierarquia
não corresponde a um status de poder. Não corresponde também ao status de
áreas privilegiadas de escritório ou refeição. Isto é substituído pelos privilégios
externos em clubes, moradias, aposentadoria, por exemplo. A contrapartida des­
ta integração é o grande consumo de tem po e o fato de que pode ser usada so­
m ente para grandes decisões (com tem po m aior para decidir).

Dessa forma, o sistema de decisão japonês pode ser apresentado como al­
tam ente descentralizado, de cima para baixo, informal, com com unicação ver­
bal u sad a p a ra p ro c u ra r consenso e um sistem a escrito p ara confirm ação
posterior.

Por últim o, seria interessante analisar tam bém o processo das reuniões du­
rante as quais várias decisões podem ser tomadas ou não.

No Brasil, este evento é bastante influenciado pelo traço de evitar conflitos.


A reunião tem o simbolismo de um acontecim ento social em que as relações de­
vem ser preservadas. N orm alm ente, não são reuniões em que o im portante é a
agenda com seus assuntos e tempos. Ambos não prevalecem diante da necessi­
dade de se estabelecer a harm onia ou para evitar que conflitos se desenvolvam.
Para isto, é m uito com um que as decisões ocorram e os entendim entos se façam
antes das reuniões, para que aconteça um a reunião "à mineira".

Na Alem anha, as reuniões também têm a forte possibilidade de serem lon­


gas, porém p o r motivos diferentes. Eles recorrem a argum entações históricas e
com um grau exagerado de detalhes em suas apresentações. Sem contar que
irão buscar o consenso.

Esta cultura que respeita a autoridade, a hierarquia e a estrutura (funções


bem definidas e limites bem respeitados), induz tam bém a abordagem racional
na solução de problemas. A cultura alemã é orgulhosa de sua racionalidade e
lógica. Programas de relações hum anas e com partilham ento de emoções através
de grupos n u n ca foram vistos como atividades legítimas nas empresas alemãs.
Grupos para solucionar problem as m antêm a distância social apropriada, o que
é funcional para a em presa e em ocionalm ente confortável para o participante.

Como vimos, o processo decisório no Brasil, em suas várias facetas, assume


características p o r vezes semelhantes às dos americanos e p o r vezes às dos ja p o ­
neses e dos alemães. Isto pode ser resumido no Q uadro 3.1, que com bina duas
variáveis que interferem no processo decisório: a concentração da decisão e a
participação das pessoas envolvidas.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 85

Q u a d ro 3.1 Processo decisório.

Centralizado na Descentralizado
Não
cadeia na cadeia Consultivo
consultivo
hierárquica hierárquica

Brasil X X
EUA X X
Japão X X
Alemanha X X
França X X

O acom panham ento das decisões, isto é, o controle, reflete exatam ente o
traço da impunidade. Neste caso, estamos referindo-nos ao aspecto perverso da
concentração de poder, da lealdade pessoal, do evitar conflitos e do formalismo.
A convergência destes traços pode criar, de um lado, um a grande permissivida-
de, e de outro, o excesso de controles inúteis.

3.3 PROCESSO DE LIDERANÇA


Neste tópico, iremos abordar o processo de “com ando” que ocorre nas em­
presas. Apesar de o significado da palavra comando ser "m andar ju n to com", se­
m anticam ente parece estar associado a “ter p oder de m an d o ”. Para elim inar
este possível preconceito, tomamos a palavra liderança, que sugere a pessoa acei­
ta pelo grupo para dirigi-lo. Isto é, o poder de m ando existe, mas é legitimado
pelo grupo e não, necessariamente, pela hierarquia.
Torna-se im portante, então, analisar o papel do líder em seu relacionam en­
to com os liderados.
Inicialm ente, verificamos que a motivação pelo "poder é um forte atrativo
entre os líderes, mais do que o desafio de atingir objetivos e resultados para a
sua empresa". A pesquisa realizada p o r L aurent e aplicada por nós no Brasil re­
vela que 53% dos gerentes brasileiros responderam afirmativamente à pergunta:
“A m aioria dos executivos parece ser motivada mais pela conquista de p oder do
que para atingir resultados”. Algo parecido a seus pares franceses e italianos, mas
diferentes dos am ericanos e alemães, conform e m ostra a Figura 3.2.
Os gerentes am ericanos procuram ultrapassar seu próprio desem penho, es­
tão orientados p o r metas, buscam a auto-realização e desenvolvem sua própria
carreira. São pragmáticos, assertivos e relativamente igualitários. Necessitam de
feedback constante, avaliações e prêmios. Decidem de cima para baixo sem con­
sultar os liderados. Sacrificam a família e a vida social pelo trabalho, se com pa­
rados aos franceses e alemães, que não o fazem.
86 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

"A MAIORIA DOS EXECUTIVOS PARECE SER MOTIVADA MAIS PELA


CONQUISTA DE PODER DO QUE PARA ATINGIR RESULTADOS"

F ig u ra 3.2 A conquista do poder.

As teorias de liderança desenvolvidas nos Estados Unidos são para indiví­


duos conscientes de sua independência. A relação entre líderes e liderados é
orientada p o r um princípio em que ambos procuram seu máximo interesse pró­
prio e é regulada basicamente pelo mercado. Q uando um a das partes não en­
c o n tra r mais vantagens, p o d erá ro m p er o relacio n am en to e ir buscá-las no
m ercado. Este corte de vínculos é natural e sem traumas do ponto de vista tanto
da em presa quanto do em pregado.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 87

O que significa liderança participativa nos Estados Unidos? É o conceito da


participação perm itida ou concedida. O líder é que tem a iniciativa de dar aos
liderados a sinalização para participar das decisões, o que é um a expectativa dos
mesmos.
A relação líd er/lid erad o nos Estados Unidos pode ser assim resumida: re­
lacionam ento centrado nas relações formais de trabalho, com prom etim ento do
liderado d ependendo de suas recom pensas financeiras e de seu desem penho, li­
derado mais orientado pela carreira profissional do que pelos destinos da em­
p re s a , c o n tro le atra v és d a a n álise in d iv id u a l e b a se a d o em p a d rõ e s de
desem penho preestabelecidos e predom ínio de um relacionam ento líd er/lid e­
rado baseado no respeito à individualidade e no feedback assertivo.
No Japão, tanto líderes quanto liderados procuram criar condições que
tendem a elim inar conflitos entre si. Promove-se um com prom etim ento m útuo.
Acredita-se no com partilham ento do conhecim ento e busca-se agregar valor a
partir das idéias dos liderados. Eles são envolvidos em todos os aspectos dos pro­
cessos organizacionais. Os liderados japoneses participam de decisões sobre qua­
lidade, quantidade e mesmo planejam ento e políticas operacionais.
A lealdade no Japão envolve obrigações para baixo e para cima. Devoção
filial é im portante, mas lealdade ao clã e àqueles com autoridade é particular­
m ente valorizada. As palavras japonesas para chefe (oyabun) e para subordinado
(kobun) significam um a relação pai/filho. A lealdade é reforçada p o r um a forte
ética do trabalho, que engloba a família.
Exemplifica bem a seguinte frase dita p o r um em presário japonês: "Se você
(pai de família) perde o em prego e está em dificuldade financeira, você m anda
seu filho em bora?”
A relação líd er/lid erad o no Japão pode ser então assim resumida: relações
paternalistas com os liderados e suas famílias, em prego vitalício com d ep en d ên ­
cia e lealdade recíproca à em presa, realizações pela alta motivação do grupo
com um controle do trabalho exercido pelo próprio grupo. Praticam um pro­
cesso de solução de problem as em conjunto com o líder, o que é usado para re­
forçar os objetivos comuns, apesar do questionam ento das gerações mais jovens.
Na Alem anha, os líderes esperam um a boa resposta de seus liderados e os
testam , exigindo d esem penho. Eles retrib u em com perfeccionism o, porém ,
dada a baixa flexibilidade para as mudanças, a única m aneira de exigir-lhes p er­
feição é explicar-lhes os procedim entos e não modificá-los.
Os líderes esperam ainda lealdade, senso de dever e obediência de seus li­
derados, dando em troca a segurança do trabalho. Consideram seus liderados
responsáveis p o r sua performance e não os controlam. Esperam que os liderados
resolvam seus próprios problemas. Nota-se que muitos deles passam prolonga­
dos períodos em suas empresas,-senão a vida inteira, revelando um a baixa m o­
bilidade voluntária da mão-de-obra, se com parada à dos americanos.
88 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Os alemães, em geral, dão im portância ã com unicação escrita. Devem ser


francos e com unicar com clareza suas expectativas. O líd er deve preveni-los
quanto ao desem penho, se está bom ou não; em caso contrário, será negligência
do líder.
A liderança pessoal na A lem anha é perfeitam ente substituível por regras
bastante claras, detalhadas e apresentadas com lógica. A form alidade e a poli­
dez, incluindo o apropriado respeito ao status social e à posição hierárquica na
em presa, são m antidas no dia-a-dia da vida empresarial.
P oder, d in h e iro e influência não devem ser m ostrados ostensivam ente.
Franqueza, honestidade e diretividade governam as relações hum anas. Um im­
portante com ponente do caráter alemão é o alto valor dado ao trabalho duro,
especialm ente entre os altos executivos.
Na França, os líderes im prim em um forte controle sobre seus subordinados
e as decisões são altam ente centralizadas. Com estilo autocrático, esperam obe­
diência de todos. Só com partilham informações com as pessoas de status seme­
lhante em sua própria rede de relações e não com os liderados. Os liderados,
p o r sua vez, não desejam participar. Faz parte de suas expectativas que os líderes
exerçam liderança autocrática.
No Brasil, assim como no Japão, o relacionam ento acom panha a tradição
familiar, em que o líder dá a proteção e o liderado assume deveres morais para
com o líder. Nas crises e épocas de dispensas, o dram a que assola a em presa é
m uito m aior do que, p o r exemplo, nos Estados Unidos, seja para os dirigentes,
seja para os em pregados, pois o rom pim ento das relações líd er/lid erad o signi­
fica, inclusive, um a derro ta m oral para o chefe. Principalm ente se o traço da
lealdade pessoal for significativo nesta relação líder/liderado.
Na em presa brasileira é com um um líder destacar-se. O acionista ou o ad­
m inistrador principal exerce, na maioria das vezes, um presidencialismo forte,
em que a consulta a outras áreas de poder é baixa ou simbólica, passando, mui­
tas vezes, a em presa a ser reconhecida na figura de seu principal dirigente, fun­
d in d o -se em sua im agem e sem elh an ça. S urgem , tam bém , aí os m itos da
em presa.
Na relação líd er/lid erad o , a atitude dos liderados brasileiros não impõe
um a barreira à extensão da autoridade de seus chefes. Existe um a alta aceitação
da desigualdade de p oder e o reconhecim ento de que os detentores do poder
têm o direito de usufruir seu privilégio. O mesmo vale para a França. Já em paí­
ses como os Estados Unidos e a Alem anha esta desigualdade de p o d er é baixa,
o que se reflete em um a interação mais crítica entre líder e liderados.
Como en ten d er a questão da participação nas empresas brasileiras? Até re­
centem ente, esta era um a questão pouco presente, em função do alto grau de
dependência e da forte concentração de p oder existente nas empresas brasilei­
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 89

ras. Deparam os no m om ento com um a reivindicação de participação desenca­


deada nos vários níveis da organização.
Porém , q u an d o estes m esm os funcionários são participados de algum a
idéia ou decisão que lhes pareça certo privilégio, o equilíbrio parece estar asse­
gurado. A participação exigida parece ser m uito mais no sentido de ser com u­
nicado das decisões do que participar em sua formulação e, em conseqüência,
precisar assumir riscos e responsabilidades.
A nosso ver, o que existe mesmo é um a econom ia da inform ação, em que
o desequilíbrio entre a oferta e a dem anda faz parte de um mecanismo de p o d er
que privilegia poucas pessoas das relações mais próximas do líder.
A compatibilização dos objetivos pessoais com os objetivos da organização
estará sem pre sob o crivo da qualidade das relações com os líderes da organi­
zação. Na verdade, em nossa cultura, a legitimação do líder ocorre predom inan­
tem ente pela lealdade pessoal, reforçada pela hierarquia. O papel do líder será
m anter perm anentem ente este equilíbrio, tendo de um lado que desenvolver a
lealdade pessoal com seu grupo e de outro prestar lealdade à hierarquia.
Na prática, podem os constatar que "vários são os dirigentes que procuram
capturar mais dedicação para si do que para a empresa", form ando seu patrim ô­
nio de pessoas leais. Uma pesquisa realizada pelo atual Sebrae atribui esta pos­
tura à necessidade de se form ar um sustentáculo para sua posição. O m ercado
das lealdades pessoais passa a ser extrem am ente impermeável, seja pela baixa ca­
pacidade associativa m últipla dos brasileiros, seja pelo espírito de corpo dos gru­
pos já formados.
Finalm ente, no Brasil, os líderes precisam exercitar-se para não caírem na
arm adilha cultural de se portarem para baixo de forma autoritária, assim como
veêm seu próprio líder. E, ainda, exigirem de seu liderado o com portam ento
leal e de evitar o conflito, conform e ele se com porta para cima. Se a postura é
paternalista, esta cultura será transm itida até o último nível. Na m aioria das ve­
zes, é isto que acontece na prática, apesar de no discurso ser bastante diferente.
O Q uadro 3.2 m ostra as diferenças entre os gerentes franceses, am ericanos,
japoneses, alemães e brasileiros no que se refere aos princípios que regem as re­
lações de p oder e a form a principal de controle das decisões tomadas.
90 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Q u a d ro 3.2 Relação de poder e de controle.

Relação de poder Controle da decisão

Brasil Posição hierárquica e lealdade Através do relacionamento


pessoal

EUA Resultado e racionalidade Através de padrões de


desempenho estabelecidos

Japão Afiliação social Através de processo e metas

Alemanha Competências individuais Através de procedimentos e


tarefas

França Posição hierárquica Através de relacionamento

3.4 PROCESSO DE COESÃO ORGANIZACIONAL

As organizações precisam estabelecer um processo que m a n te n h a seus


com ponentes unidos em torno dos mesmos objetivos, canalizando esforços de
m odo convergente para sua missão.
No Brasil, isto se faz, predom inantem ente, através da lealdade às pessoas.
As relações "pessoais", altam ente valorizadas, favorecem um m aior apego à or­
ganização pela via da liderança, gerando um clima de segurança e confiança
m uito im portantes, inclusive nos m om entos de crise e sofrimento. Essa intimi­
dade e os laços pessoais de simpatia e amizade confundem-se de tal m odo com
as relações puram ente econômicas que, como disse DaMatta (1990), “o patrão
pode exercer um duplo controle da situação". Ele, assim, pode governar o tra­
balho, pois é quem oferece o em prego e pode controlar as reivindicações dos
em pregados, pois apela para a m oralidade das relações pessoais. As relações do
em pregado com o sindicato são, muitas vezes, vistas pelo patrão como desleal­
dade.
O fato é que esse estilo de relacionam ento perm ite increm entar o grau de
identidade dos em pregados com a em presa. N orm alm ente, os liderados apre­
sentam pouca capacidade de associação ou mesmo oportunidades restritas de
afiliação. Além disso, dispõem também de um a mobilidade geográfica e ocupa-
cional limitada, que p o r sua vez, quando ocorre é vista como negativa. Isto faz
com que a em presa seja um dos núcleos centrais e dos mais im portantes para
a fixação de identidade dos liderados. Mesmo porque, é lá que ele investe em
seus relacionam entos e forma seu capital social.
No Japão, este com portam ento é mais exacerbado, mas absolutam ente nor­
mal. Lá, o conceito de on se constitui na "célula geradora de todo o espírito co-
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 91

letivista nipônico". T udo gera on. Um favor que um dia deve ser retrib u íd o,
como um a obrigação do beneficiado ao benfeitor. Os liderados, cientes de que
a em presa tem m em ória daquilo que fizeram em seu benefício, confiam na di­
reção e em que um dia serão recom pensados. E a mesma a expectativa dos lí­
deres. O on é tam bém retribuir mais e m elhor do que se recebeu. Assim todos
cooperam e todos ganham m utuam ente. "Dificilmente alguém quebra a cadeia
do on porque sabe que as conseqüências serão duras, não só p o r parte da pessoa
ofendida mas de todo o seu grupo.” Para qualquer japonês, a aceitação do gru­
po com que convive é fundam ental em sua vida.
Como já foi dito anteriorm ente, estamos mais orientados para o ser do que
para o fazer. Deste m odo, nossa alternativa para a coesão social dá-se pelo per­
sonalismo e pelo prestígio do grupo.
Esta é um a coesão social que está sujeita a um a ética ancorada nas relações
pessoais. E o caso brasileiro. E com um vermos demissões solidárias ou admissões
em bloco, pois o sucesso ou a derrota de um a pessoa atinge um bilicalm ente to­
dos do grupo. O corre aqui o fenôm eno de identificação, decorrente da d ep en­
d ên cia, com o um processo de fusão am plo e de "pertença" e n tre as pessoas
envolvidas, com um a clara perda da individualidade.
As festas são um instrum ento de coesão social bastante utilizado pelas em­
presas, e nestas ocasiões cria-se um am biente em que existe a sensação de dimi­
nuição da distância hierárquica, contribuindo para m aior aproxim ação entre
líder e liderado.
Para que um a relação de d ep en d ên cia seja du rad o u ra, é preciso que o
cliente tam bém sinta os benefícios que decorrem do reconhecim ento de serem
tratados de fato como "pessoas" naquele am biente. Esse tipo de tratam ento, que
valoriza as relações sociais de m aneira personalista, faz parte das estruturas de
subordinação da sociedade brasileira. Assim, pode-se lim itar o em pregado sala-
rialm ente, com pensando perdas econômicas e políticas com um tratam ento al­
tam ente personalizado, que o faz parte integrante "da casa" e da em presa como
um ser hum ano, ainda que subordinado. Reforça ainda esta condição a política
de desenvolver e dar oportunidades aos filhos dos em pregados mais antigos da
casa.
E norm al a formação de guetos ou a criação progressiva de pequenas uni­
dades auto-suficientes dentro da organização m aior com "cada um p o r si", onde
o im portante é que “m in h a” área funcione e onde a prioridade se define através
dos objetivos da unidade, sem referência a alvos de ordem mais institucional.
Neste caso, com o ocorrem a coesão e o ajustam ento interunidades? Acor­
dos tácitos de áreas de influência e de p o d er são feitos para um a convivência
não competitiva e sem agressividade m útua, algumas vezes sem o envolvimento
da direção superior, e outras vezes com seu beneplácito.
92 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

No Japão, a linha que separa as relações sociais das relações de trabalho são
m uito tênues. Não é vista como um em pecilho ou problem a para a atividade na
em presa, pelo contrário ajuda, facilita e reforça as obrigações m útuas entre as
pessoas.
Por outro lado, existem os protocolos e códigos para regular as relações
d entro da estrutura da em presa nas diferentes hierarquias. Estas devem ser res­
peitadas rigidam ente. Existe um a ordem entre as pessoas cujo acesso está bem
definido em regras consideradas im portantes. Um líder japonês deve perguntar
sobre o bem-estar da família de seu liderado, mas tem a expectativa de que este
não tenha um com portam ento ativo de lhe trazer problemas familiares.
No Japão, o traço cultural do coletivismo funciona como um elem ento for­
te de coesão, onde os valores da organização são a referência principal para to­
dos. A ênfase na lealdade à organização e aos anos de serviço prestado a ela
prom ove a solidariedade organizacional.
Nas empresas americanas, em bora exista também um m odelo para o rela­
cionam ento entre os níveis de autoridade e diferentes funções, este protocolo
é flexível, sendo as pessoas encorajadas a alterarem a relação formal quando ne­
cessário para aten d er as necessidades de um a situação.
Os am ericanos separam bem as relações de trabalho das relações sociais,
evitando m esm o um possível conflito de interesses, de form a que obrigações
pessoais não possam afetar o desem pem ho no trabalho.
A coesão social inicia-se no processo de seleção e recrutam ento, em que,
em algumas culturas, as referências e indicações do grupo já ingressado na em­
presa servem de parâm etros e critérios. Em outras culturas, exige-se que sejam
selecionados aqueles que tenham qualidade superior no m ercado, de m odo a
reforçar a condição competitiva da empresa.
A dinâm ica do processo de liderança faz-se através da adm inistração dos
conflitos. T oda organização está repleta de conflitos entre seus com ponentes,
cabendo à liderança gerenciar e,stes conflitos de form a a m anter a coesão social
do grupo.
Nas em presas am ericanas, os conflitos são identificados e tratados direta­
m ente com os envolvidos. Suas causas são diagnosticadas e ações tomadas para
seu g eren ciam en to ou resolução. Espera-se um esforço individual das partes
para resolver o conflito de forma objetiva.
Nas empresas brasileiras, os conflitos são identificados, mas não tratados di­
reta e abertam ente. A solução encontrada envolve muitas vezes um interm ediá­
rio ou um m ediador, e algumas vezes é até postergada de form a indefinida. E
evitada, principalm ente, p o r quem não detém o poder.
Na pesquisa de A ndré Laurent aplicada p o r nós no Brasil podem os obser­
var que para a pergunta: "A m aior parte das organizações se portaria m elhor se
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 93

os conflitos pudessem ser definitivamente eliminados", 50% dos executivos bra­


sileiros pesquisados responderam afirmativamente em contraste com som ente
6% dos americanos. O utras comparações podem ser vistas na Figura 3.3.

"A MAIOR PARTE DAS ORGANIZAÇÕES SE PORTARIA MELHOR SE OS


CONFLITOS PUDESSEM SER DEFINITIVAMENTE ELIMINADOS"

100%

90%

80%

(0 70%

60%

50%
50%
d) 40%
T3 41‘
30%
27%
24%
18% 19% 17%
16%
13%
«d
0%

Era 3.3 Os pacifistas.

Pelo que foi visto anteriorm ente, as bases da coesão social nas empresas
Bile-ras se diferenciam das americanas e japonesas. Em nossa realidade, o pa-
e ,: r jo de relações pessoais é um elem ento predom inante para articular ob-
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 93

conflitos pudessem ser definitivamente eliminados", 50% dos executivos bra­


s e ir o s pesquisados responderam afirm ativamente em contraste com som ente
ÇFr dos americanos. Outras com parações podem ser vistas na Figura 3.3.

"A MAIOR PARTE DAS ORGANIZAÇÕES SE PORTARIA MELHOR SE OS


CONFLITOS PUDESSEM SER DEFINITIVAMENTE ELIMINADOS"

F ig u ra 3.3 Os pacifistas.

Pelo que foi visto anteriorm ente, as bases da coesão social nas empresas
brasileiras se diferenciam das americanas e japonesas. Em nossa realidade, o pa­
trim ônio de relações pessoais é um elem ento predom inante para articular ob-
94 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

jetivos institucionais com objetivos individuais. Cultivar e m anter este patrim ô­


nio é um a tarefa im portante para aqueles que o detêm, surgindo daí o forte evi­
tar conflito. Até p o rq u e é este m esm o p a trim ô n io que p o d e h a b ilita r seu
proprietário a cargos mais elevados na hierarquia da empresa.

3.4.1 Estrutura

A estrutura organizacional coloca-se como um a alternativa para problemas


de coordenação de atividades e esforços de grupos dentro das empresas.
Ao surgir um p ro b lem a desta ordem , várias soluções p odem ser dadas,
como, p o r exemplo: determ inar novas regras para o relacionam ento entre as ati­
vidades, m elhorar a com unicação entre os líderes dos grupos, ou encam inhar
o problem a ao nível superior de autoridade na empresa.
Na Alem anha, os gerentes não vêem com clareza a estrutura que faz fun­
cionar sua organização, como foi identificado pela pesquisa de H õhn realizada
com gerentes de nível médio. O sistema gerencial alem ão é deliberadam ente
projetado p ara ser seguro. E um a prática nas empresas em pregar pelo menos
duas e, às vezes, três linhas de autoridade e controle, o que gera certa confusão.
Existe sem pre um a linha de autoridade técnica que segue um a cadeia de
com ando definida. Paralelam ente, existe um a linha inform al no sentido ascen­
dente, sendo difícil dizer qual destas duas linhas tem precedência sobre a outra.
Esta am bigüidade é construída como um mecanismo para aum entar o controle,
e som ente em tempos de crise é que se pode perceber e identificar a linha real
de autoridade. M embros do nível do comitê gerencial, que são executivos de fi­
nanças, produção e marketing, têm influência direta em todas as partes da or­
ganização. As linhas de autoridade devem ser seguidas religiosamente.
D entre elas, um a das mais comuns é a estrutura hieráquica, que, no entan­
to, pode tom ar várias formas, em função dos níveis e da am plitude do controle
na relação líd er/lid erad o .
No Brasil, os gerentes aceitam claram ente a existência dos que m andam e
dos que obedecem . Senão, vejamos: nossa pesquisa, que pergunta aos gerentes
de em presas brasileiras se "uma estrutura hierárquica é necessária, principal­
m ente, para saber quem tem autoridade sobre quem" revelou concordância en­
tre 66% dos entrevistados. Nos EUA, só 18% e na A lem anha 24% concordam ,
enquanto na França 45%, indicando um a postura bem mais próxim a da brasi­
leira, conform e visto na Figura 3.4.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 95

■te patrimô- "UMA ESTRUTURA HIERÁRQUICA É NECESSÁRIA PRINCIPALMENTE PARA


SÃBER QUEM TEM AUTORIDADE SOBRE QUEM"
o forte evi-
ib ilitar seu

i problemas
presas.
i ser dadas,
entre as ati-
encam inhar

que faz fun-


in realizada
eradam ente
pelo m enos
ta confusão.
ta cadeia de
ntido ascen-
>bre a outra.
' o controle,
a linha real
rutivos de fl-
jartes da or-
:nte.
e, no entan-
do controle F ig u ra 3.4 Os estruturalistas.

O desen h o de nossas estruturas organizacionais é influenciado tam bém


e m andam e
pela característica de concentração de poder e personalismo, o que conduz a
aos gerentes
um m odelo funcional acentuadam ente piram idal e integrado no nível hierár­
a, principal-
quico mais elevado. Mais um a vez, essa solução se acentua nas crises, pois o sen­
ordância en-
tim ento patrim onialista e patriarcalista fala mais alto, levando a um a cen tra­
concordam,
lização do processo decisório.
m a da brasi-
Em seu livro, Hosftede chega à conclusão de que o grau de igualdade entre
os hom ens e o grau de ansiedade que prevalece em um a sociedade são os ele­
m entos típicos que, em conjunto, explicam a estrutura das organizações. Segun-
96 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

do este raciocínio, a lógica de distribuição do poder e a form a de minimizar as


incertezas do futuro definem os traços básicos da estrutura.
Assim, países como Brasil, França e Japão têm um tipo de organização ba­
seado n a burocracia com pleta, em que o formalismo é reforçado pelo p o d er da
hierarquia, e cujo m odelo de estrutura organizacional é piramidal. Já os alemães
têm um tipo de organização baseado na burocracia impessoal, em que as regras
são absolutam ente respeitadas e superiores ao líder em qualquer situação. É a
m áquina bem azeitada funcionando, cada um cum prindo seu papel. A estrutura
tem papel pouco relevante no que se refere à distribuição de poder. Os Estados
Unidos, pelo informalismo, têm um tipo de estruturação tácita em que cada um
tem consciência de seu poder, formando-se as estruturas em to m o das ativida­
des. Desta form a, podem estar na organização com o se ela fosse um local de
m ercado, onde as relações dos indivíduos entre si e os procedim entos de traba­
lho são abertos e sujeitos a negociação e inovações. Nem p o r isso deixa de existir
a estrutura hierárquica, mas perm ite m enor resistência a estruturas matriciais,
m aior incentivo às divisões ou organizações p o r produto.
Estruturas mais flexíveis no estilo matricial, em que tarefas são realizadas
tomando-se dois princípios (funcional e hierárquico sim ultaneam ente), têm en­
contrado resistência, pois como é possível ao subordinado ter duas orientações
simultâneas?
Ao responder à questão "Convém evitar a todo custo um a estrutura de or­
ganização na qual os subordinados possam ter dois chefes", os executivos bra­
sileiros concordaram em 74% das respostas. Neste mesmo sentido, A lem anha e
França são rigorosam ente contrárias à presença de dois chefes, apresentando ín­
dices de 79% e 83%, respectivamente. Nos Estados Unidos, em bora o índice
seja mais baixo, 54%, também não se vê com bons olhos esta solução organiza­
cional.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 97

minimizar as "CONVÉM EVITAR A TODO CUSTO UMA ESTRUTURA DE ORGANIZAÇÃO NA


QUAL OS SUBORDINADOS POSSAM TER DOIS CHEFES"

fanização ba-
elo p oder da
á os alemães
|ue as regras
ituação. E a
A estrutura
. Os Estados
ue cada um
das ativida-
im local de
os de traba-
ta de existir
matriciais,

i realizadas
e), têm en-
)rientações

tura de or-
utivos bra-
lemanha e
ntando ín-
i o índice
organiza-

F ig u ra 3.5 Por um comando único.

U ma síntese das características culturais que influenciam as estruturas em


sua form atação e principal função organizacional pode ser m ostrada no Q uadro
3.3.
98 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Q u a d ro 3.3 Estruturas organizacionais. pragm áti


um a cap;
Critério influente na definição da táculos q
Principal função da estrutura
estrutura s ile ira s j
turbulent
Brasil Definida a partir das pessoas Identifica quem tem poder
ram most
EUA Definida a partir das tarefas Identifica uma divisão de tarefas nossos trz
incom um
Japão Definida a partir de objetivos da Identifica a responsabilidade por
empresa
de m erca
um grupo
Entr<
Alemanha Definida a partir dos processos Identifica uma coordenação de
pessoas
m inante q
do futuro,
França Definida a partir da autoridade Identifica uma estratificação ou iniciati
e de status social de m anuti
m anutenç
tem po par
3.5 PROCESSO DE INOVAÇÃO E MUDANÇA supervalor
De fo
Vejamos com o se processam a inovação e as m udanças na atividade em pre­ m uito afet;
sarial. Alguns sistemas culturais mostram-se mais abertos e receptivos às m udan­ ao risco, is
ças, e n q u an to outros só conseguem absorvê-las de m aneira gradual, evitanto Nas ei
reações violentas.
se não hou
Nas culturas do "fazer", é m enos doloroso lidar com mudanças. Estas cul­ to, as idéias
turas, quando as realizam, o fazem radicalm ente, atingindo o núcleo principal m o in ex ist
das atividades correntes. O exem plo mais atual em termos em presariais é a reen- m elhorias. ,
genharia, que é desenvolvida nos Estados Unidos e vem sendo praticada nos ne­ tadas para 2
gócios americanos. p ara a busc
Nas culturas do "ser", a m udança sempre tem efeitos dolorosos nas relações, O mes
surgindo daí a tentativa de m anter as m udanças em áreas periféricas den tro dos com o um p
limites do sistema atual, para evitar alterações radicais. que comum
Estas culturas preservam seus núcleos de valores, apesar de todo o progres­ Em um
so a seu redor. Este é o exem plo clássico da sociedade jap o n esa e, em termos concentradc
empresariais, da filosofia que orientou a im plantação da qualidade nas em pre­ na busca de
sas, buscando a m elhoria contínua, tendo sem pre p o r base o resultado anterior e na preferê
alcançado. gia de dividii
Em nosso país, alguns traços culturais atuam com m aior ênfase nos proces­ volvê-lo e an
sos de inovação e mudança: evitar conflitos, a flexibilidade vista pela face da cria­ Antes d
tividade e a im punidade. são sem pre n
O traço de pro cu rar evitar conflitos estimula a criatividade na busca de so­ fizemos assin
luções engenhosas que possam contornar restrições impostas pelas norm as ad­ são feitas nas
m inistrativas e técnicas. Com isto, tenta-se ajustar as necessidades objetivas e sua postura (
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 99

pragmáticas às situações formalizadas sem criar m uito atrito. Isto dá ao brasileiro


um a capacidade de flexibilidade e de raciocínio estratégico capaz de vencer obs­
táculos que se lhe apresentem , até mesmo de form a imprevista. As empresas bra­
>da estrutura
s ile ira s j á d e m o n s tr a r a m su a r á p id a c a p a c id a d e d e re a ç ã o a s itu a ç õ e s
turbulentas. Diante de vários planos econômicos, as empresas brasileiras pude­
tem poder
ram m ostrar seu alto grau de adaptabilidade. Especialmente, se pensarm os em
. são de tarefas nossos trabalhadores diante de novas tecnologias, estes revelam esta capacidade
incom um de reagir e se adaptar. Agora, novam ente o fazem diante da abertura
:nsabilidade por
de m ercado.
Entretanto, nossa confiança neste traço de criatividade é tão forte e predo­
ordenação de
m inante que interfere e influencia nosso grau de preocupação com as incertezas
do futuro. Esperamos as coisas acontecerem para, então, tom arm os um a decisão
[ratificação ou iniciativa. E o caso típico de nossa postura na em presa em face da atividade
de m anutenção preventiva. Ela é m uito pouco exercitada, se com parada com a
m an u ten ção corretiva. Torna-se, portan to , um a atividade criativa com pouco
tem po para elaboração e com soluções casuísticas e sob crise. Neste sentido, ao
supervalorizarmos nosso talento, reforçamos o estilo da improvisação.
De form a sistemática e planejada, a geração de idéias para a m udança é
id ad e em pre- m uito afetada pelo estilo gerencial de como lidar com o erro e com a aversão
'os às m udan- ao risco, isto é, pelo traço de espectador.
lual, evitanto
Nas empresas, é com um observarmos pessoas com idéias inovadoras, mas
se não houver um a recom endação explícita do chefe para desenvolver o proje­
;as. Estas cul- to, as idéias ficam apenas como idéias. Mesmo porque é pouco claro ou até mes­
leo principal m o in ex isten te o incentivo ao risco, in e re n te à inovação e à proposição de
■iais é a reen- m elhorias. As empresas brasileiras têm a m aioria de suas práticas gerenciais vol­
icada nos ne- tadas p ara a m anutenção da situação atual e m uito poucos processos orientados
para a busca de novos ganhos.
nas relações, O m esm o raciocínio pode ser levado para a atividade de planejam ento,
s dentro dos como um processo que deveria estar voltado para a inovação e m udança, mas
que com um ente não tem tido este papel.
o o progres- Em um nível mais estratégico, grande parte das empresas brasileiras tem se
, em termos concentrado em investimentos de baixo risco ou em seu adiam ento constante,
nas em pre- na busca de condições cada vez mais seguras, na pouca predisposição à inovação
ido anterior e na preferência pelo crescimento cauteloso. Tam bém está presente na estraté­
gia de dividir o m ercado, chegando facilmente à cartelização, ao invés de desen­
nos proces- volvê-lo e ampliá-lo.
ace da cria- Antes de um a crise mais radical, a m anutenção ou os ajustes tem porários
são sem pre mais praticados do que a m udança com inovações radicais. "Sempre
rnsca de so- fizemos assim e deu certo." Q uantas reuniões para o exercício de criatividade
normas ad- são feitas nas empresas? Só em épocas de crise, tendo o chefe de abrir m ão de
objetivas e sua postura de dono da verdade.
100 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Nossa conclusão é que somos bastante flexíveis às m udanças e temos um a


grande capacidade de inovação sob condições de crise. A crise é um fator fun­
dam ental para im pulsionar este processo de m udança. Vale ressaltar que quan­
do nos referimos à crise e a sua im portância nos processos de m udança, estamos
falando não só de crise econômico-financeira, mas também de crise de liderança
ou de identidade, como é o caso da M étodo Engenharia, que será relatado no
capítulo seguinte.
Podem os observar dois fenôm enos em term os de transform ação cultural:
um processo de evolução, em que os valores do conjunto social passam a ser
operacionalizados de m aneira diferente, e um processo de mudança, em que se
altera o núcleo dos valores. Como exem plo do prim eiro processo, podem os citar
que para o mesmo valor de respeito ao indivíduo, na década de 60, o simbolis­
mo era dado pela assinatura da carteira de trabalho, enquanto nos dias atuais
este mesmo respeito ao indivíduo tom a o contorno, por exemplo, de um a par­
ticipação p o r resultados. Podemos identificar um exem plo do processo de m u­
dança cultural nos casos de fusão, aquisição, privatização, ou qualquer outro
processo em que são questionadas e revisitadas as premissas culturais mais sub­
jacentes da organização.
Devemos tam bém considerar o traço da impunidade, en tendido em suas
duas vertentes: prem iação ou punição. Um dos instrum entos im portantes para
a validação ou para a continuidade do processo de m udança é o sistema de ava­
liação que perm ite um feedback a quem está processando a m udança, no sentido
de reforçar os prim eiros passos dados na nova direção.
No Brasil, esta via pouco tem contribuído p ara o processo de m udança,
dada a baixa utilização deste sistema realizado de m aneira rotineira e formal. As­
sim, deixam de existir os estímulos à m udança, seja pela via do prêm io ou da
punição.
Nas em presas os estímulos de prem iação não são m uito com uns, seja de
form a pecuniária ou não. Com isto, não se cria um hábito de m elhoria contí-
íiua, não pela falta de idéias para a m elhoria, mas pelo reforço da continuidade.
Aos poucos, parece existir um a tendência de as empresas pioneiras im plan­
tarem um a política de rem uneração variável baseada em resultados, mesmo an­
tes de a legislação vigorar. Uma situação mais recente no caso brasileiro nos é
relatada no Temas para excelência (1993). Confirm a o início de um movimento
de estím ulo ao risco, para os líderes, em um prim eiro estágio, e depois de form a
am pla para todo o pessoal, acom panhado do prêm io como sua contrapartida.
Os japoneses incentivam m uito a inovação dos trabalhadores, mesm o que
estes não apresentem grande capacidade inventiva. As m udanças seguem um a
preocupação com as coisas que estão sendo feitas e para iniciar um a m udança,
isto som ente é possível d entro do contexto da ordem social e na ordem que a
natureza estabeleceu no universo. E o traço da harm onia do conjunto colocado
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 101

em destaque. M udança sim, mas não a qualquer custo, principalm ente o custo
social, pois as m udanças podem afetar as relações do grupo. As inovações e m u­
danças são justificadas som ente se for possível achar um estágio precedente para
aquela nova ação. E a visão de processo e de continuidade, pois as coisas têm
um a raiz e não se iniciam do nada. Existe um a ligação conseqüente entre o pas­
sado e o futuro de m elhorias contínuas. Os recursos p ara as m udanças são bas­
tante considerados, pois a crença é que eles são limitados e que qualquer ação
irá retirar um a quantidade de recursos de outras.

No caso am ericano, o sucesso do gerente é m edido pela liderança e pela


inovação. Aqueles que seguem nunca são considerados vitoriosos. Sua adm inis­
tração racional e científica é um a base forte para as m udanças e inovações. A
inovação e a m udança têm inimigos, que são o forte pensam ento em custos e
a visão de curto prazo.

Apesar de o liderado ter um a descrição específica de seu trabalho, definin­


do sua autoridade e responsabilidade, um a supervisão clara, espera-se dos lide­
rados iniciativas, mas d entro de contornos definidos pelos líderes.

As m udanças e inovações serão na maioria das vezes planejadas com obje­


tivos fixados para serem alcançados e avaliados, como foi o projeto da Nasa ou,
mais recentem ente, a guerra no Golfo Pérsico. A iniciativa por m udança acon­
tecerá sem pre que as velhas formas não possam atender as novas dem andas. O
revigoram ento da indústria do aço e, mais recentem ente, da indústria autom o­
bilística, podem exemplificar este estilo.

Seguindo a necessidade de criar o futuro, as inovações e m udanças justifi-


cam-se em term os de compromissos futuros com um pequeno vínculo com os
costumes e tradições.

Os recursos tam bém não são limitantes de processos de m udança, pois exis­
te a crença de que eles existem para aqueles desejosos de procurá-los, desenvol­
vê-los e utilizá-los.

Os franceses têm também um a grande relutância em assumir o risco, pre­


servando ao m áxim o a situação atual. A revolução industrial chegou tarde à
França, sendo um bom exem plo do conservadorismo natural francês. Reforça
isto a resistência em aceitar idéias vindas de fora do círculo pessoal. Elas são exa­
minadas exaustivamente. A m udança lenta é vista como sinal de paciência e sa­
bedoria, prevalecendo os valores, em term os de negócio, de con tin uidade e
segurança.
102 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Q u a d ro 3.4 Processo de inovação e mudança.

Tipo da mudança Estímulo principal

Brasil Manutenção Casuístico e de fora para dentro


Japão Evolutiva Sistemático e de dentro para fora
EUA Revolutiva Casuístico e de dentro para fora
França Manutenção Sistemático e de dentro para fora

3.6 PROCESSO DE MOTIVAÇÃO

Com o objetivo de aprofundar a com preensão da motivação, podem os ini­


cialm ente explorar o conceito de masculinidade de Hofstede em sua aplicação
em vários países. O Brasil está a meio cam inho entre a masculinidade e a femi­
nilidade.
No extrem o máximo de um a cultura masculina está o Japão. A lem anha e
Estados Unidos estão acima do Brasil, revelando um a motivação natural p ara o
trabalho e um com portam ento im pulsionado pela competitividade. A França,
que se encontra abaixo do Brasil, com partilha conosco um a m en o r motivação
orientada para o trabalho e tem um com portam ento mais estimulado pela busca
de um am biente solidário do que p o r resultados.
Ao considerarm os o binôm io proposto por Hofstede, de segurança e rela­
cionam ento, ficamos em contraposição à motivação pelo risco e pelo desem pe­
nho.
E ntretanto, o traço brasileiro da impunidade e a falta de igualdade no tra­
tam ento dos ineficientes e desviantes, aliados à ausência de prem iação aos efi­
c ie n te s , te n d e m a g e r a r u m c lim a d e b a ix a m o tiv a ç ã o e d e g r a n d e
perm issividade nas organizações. E verdade que, errando, as pessoas podem
aprender. Se, p o r um lado, a im punidade pode, em princípio, encorajar as pes­
soas a assumir riscos, temos tam bém de saber que errar tem preço e, conform e
Ranschburg, presidente da Staroup (Ranschburg, 1991) "ser executivo (no Bra­
sil) significa não ser jam ais punido..."; temos tentado não seguir esta receita tão
brasileira.
No Brasil, a p articipação pode ser considerada um fato r m otivacional.
O corre, porém , de form a pouco autêntica, quando a liderança aponta através
de um pensam ento mágico benefícios imediatos. Movidos p o r um a crença in­
fantil e com espírito pouco crítico, vários são os líderes que conseguem estimu­
lar a m otivação de seus liderados através de promessas irrealizáveis. Como a
atração pela tarefa não é estimulada, o desem penho e a com petência nem sem-
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 103

p re são reconhecidos ou estimulados (estamos mais orientados para o ser do


que para o fazer).
Como vimos, a coesão social nas empresas brasileiras faz-se pelo persona­
lismo e pelo prestígio do grupo. Desta forma, gostar de estar no grupo cria um
am biente propício para a auto-realização. Na França, ocorre tam bém a motiva­
ção pela segurança, bem como pelo pertencer a um grupo.
Os am ericanos são altam ente motivados pelo profissionalismo. Sua auto-es-
tima não perm ite um a vergonha profissional, pois deste profissionalismo d epen­
de seu status social. São motivados pelo trabalho para ganhar dinheiro, sendo,
portanto, bastante ambiciosos e despendem m uita energia no trabalho, o que
não significa necessariam ente produdvidade. O francês julga isto indigno, já que
valoriza a qualidade de vida. Atribui grande im portância às férias e raram ente
sacrifica os prazeres da vida pela dedicação ao trabalho.
Tam bém é um traço encontrado nas empresas am ericanas o estím ulo aos
jovens mais do que às pessoas idosas. Isto se justifica em um am biente em que
a cultura valoriza a constante atualização em relação aos problem as e às m oder­
nas técnicas de tratá-los e o m aior dinamismo exigido para a inovação e m udan­
ça.
Já no am biente em presarial japonês, onde o conhecim ento das coisas do
passado form a a base do processo de desenvolvimento conseqüente, a motivação
e o estímulo são dados aos que têm m aior experiência e sabedoria acum ulados,
que possam apontar direções mais apropriadas para o conjunto da em presa.
A motivação pode ser ativada tam bém pela m obilidade das pessoas no tra­
balho. Nas empresas am ericanas, a mobilidade dá-se entre empresas, pois a car­
reira rápida tem maiores alternativas, oferecidas pelo m ercado. Já nas empresas
japonesas, dá-se entre as funções da própria empresa, para am pliar a experiên­
cia em relação ao grupo como um todo, preparando-se para um a carreira cuja
ascensão é mais lenta.
No Brasil, o que se vê nas empresas é a m anutenção de um corpo de fun­
cionários que tem m aior tem po de casa, não pelo reconhecim ento de sua sabe­
doria, com o é o caso japonês, mas, essencialmente, por se reconhecer nele o
com ando das vias de acesso às pessoas, as vezes até em contraste com sua baixa
com petência funcional. A m édia de idade relativam ente alta do pessoal ficou
com provada na recente crise econômica, em que um a das principais políticas foi
de incentivo à aposentadoria, principalm ente nas estatais e multinacionais.
As modvações estão tam bém afetadas pela form a como as culturas estabe­
lecem um compromisso entre a vida profissional e a vida privada.
O francês é mais sensível às tensões de sua carreira, possivelmente resulta­
do do trabalho em um a organização m uito estruturada e autoritária. Acredita,
porém , em um a separação mais nítida e rígida entre a vida profissional e a vida
104 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

privada, não devendo aquela, p o r princípio, interferir no tem po familiar e de


lazer. Ele se sente mais preso à sua carreira, sendo sua estratégia mais defensiva
e de evitar riscos.
Nas observações de Hofsted, com os japoneses e alemães, e em alguns paí­
ses latinos, a motivação dá-se pelo lado da segurança individual. Os am ericanos
orientam-se pelo sucesso pessoal e individual, pela riqueza e pelo reconhecim en­
to e auto-realização.

As regras de prom oção e os planos de carreira revelam aspectos culturais


interessantes. Muitas vezes, as regras não são claras e form alm ente definidas,
dando m argem ao exercício do poder e da decisão pessoal. A dependência pode
ser claram ente observada.

R ecentem ente, algumas em presas pioneiras com eçaram a fazer comitês


para decidirem p o r demissões, querendo com isto dar um caráter mais impes­
soal a este fato, e buscando um a análise m enos emocional. É um a sinalização da
valorização da com petência, o que pode estimular as pessoas a buscarem m aior
desenvolvimento e desem penho. Só que, na prática, novam ente falam mais alto
a dependência e a cultura paternalista, que fazem com que "os filhos" peçam à
em presa que lhes dê todo o treinam ento, colocando na mão da em presa seu de­
senvolvimento.

Muitas vezes, se estabelece um círculo vicioso em relação ao treinam ento.


A em presa não investe em treinam ento dos em pregados pela baixa lealdade a
ela e os em pregados não investem em seu próprio desenvolvimento, pois atri­
buem esta responsabilidade à empresa, que vai usufruí-lo, consagrando assim a
dependência e reforçando a postura paternalista.

Na verdade, ambos estão reforçando premissas que gostariam de ver mo­


dificadas. A em presa não vai conseguir m aior lealdade a ela e o liderado não
conseguirá sair do paternalism o. O resultado é que ambos reforçam os traços
culturais existentes.

Um conceito atual, restrito, porém , ao repertório de poucas empresas, é o


de a em presa criar com petência para seus em pregados, criando com isto a com­
petitividade da em presa. Em conseqüência, a em presa estaria criando emprega-
bilidade p ara seu pessoal. Esta é um a postura recente, que pode ser afetada
pelos traços culturais citados anteriorm ente. Para que se possa im plantar de for­
m a generalizada este novo conceito da em pregabilidade, será preciso evoluir
nos traços culturais da organização.
No Q uadro 3.5 apresentam os um resum o de algumas características moti-
vacionais presentes nas empresas de diferentes países.
IMPACTOS DA CULTURA BRASILEIRA NA GESTÃO EMPRESARIAL 105

po familiar e de Q u a d ro 3.5 Características M otiv acionais.


a mais defensiva
Relação da
Valorização
Fator de Fonte de Mobilidade vida
e em alguns paí- do perfil
estímulo controle de carreira profissional e
etário
. Os am ericanos social
) reconhecim en- Brasil Segurança, Externo Baixa, Baixa Jovem
rede de entre diferenciação
relações empresas
spectos culturais
EUA Remuneração Interno Alta entre Alta Jovem
nente definidas, e resultados de empresas diferenciação
pendência pode curto prazo
França Segurança e Externo Alta
rede de diferenciação
a fazer com itês relações
áter mais impes-
Alemanha Responsabilida­ Interno Baixa entre Alta
ia sinalização da de própria no empresas diferenciação
buscarem m aior cumprimento
: falam mais alto da tarefa
filhos" peçam à Japão Melhoria da Interno Baixa entre Baixa Maduro
em presa seu de- empresa empresas diferenciação
e grande
dentro da
empresa
ao treinam ento,
baixa lealdade a
mento, pois atri-
ügrando assim a 3.7 CONCLUSÃO

nam de ver mo- Com o vimos, todos os traços estão intrinsecam ente envolvidos nos vários
r o liderado não processos do sistema de gestão, assim como os processos tam bém estão organi­
Forçam os traços cam ente imbricados. Podemos dep reen d er tam bém que dificilmente destacare­
mos um traço em relação a outro, pois todos contribuem para d ar form a ao
estilo brasileiro de adm inistrar.
as empresas, é o
i com isto a com- Isto faz prever que seja extrem am ente difícil rom per as relações no sistema
riando em prega- de gestão, pela m udança de apenas um só dos traços. Por outro lado, ao se atuar
>ode ser afetada em qualquer um deles, todos os demais serão de alguma form a afetados. Uma
m plantar de for- peq u en a ação refletirá em todo o conjunto.
í preciso evoluir
Propostas como as de Ouchi, apresentada como teoria Z, em que buscava
um a sinergia cultural entre os traços da adm inistração am ericana e da adm inis­
acterísticas moti- tração japonesa, nos parecem ser bastante irrealistas ou, no m ínino, complexas
para se im plantar e adm inistrar. A com binação cria um a alternativa inconsisten­
te em term os do núcleo cultural ou, como diria Schein, as premissas subjacentes
são contraditórias, exigindo um esforço de custo-benefício duvidoso.
106 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Podem os considerar similitudes e diferenças en tre as culturas, mas um a


análise mais aprofundada das premissas básicas m ostra que o núcleo que as sus­
tenta é absolutam ente único e original.
Por exem plo, em term os de estrutura organizacional, somos parecidos com
os japoneses, porém o p oder lá não é concentrado e não acom panha som ente
a hierarquia. Aqui, nesta situação, o artefato cultural é proporcionado pela es­
tru tu ra hierárquica, mas as premissas básicas do núcleo cultural são o limite
dado pelo grupo externo e a referência social m aior do que a pessoal.
Assim, os processos da gestão devem ser criticam ente analisados, antes de
se lançar em aventuras m odernizantes pela simples com pra de sistemas de ges­
tão que funcionam em outros países. Não nos parece existir dúvidas sobre a ne­
cessidade de aculturação m ínim a dos diversos sistemas de gestão que, criados
em am bientes culturais diferentes, trazem im plicitam ente em butidos fatores cul­
turais, que podem dificultar a im plantação e seu desem penho posterior.
A grande tarefa a se realizar é conseguir abstrair o cerne cultural dos sis­
temas e processos gerenciais e depois, pragm aticam ente, adaptá-lo à cultura lo­
cal de form a concreta e operacional. A alternativa mais pro fu n d a é recriar o
sistema de form a original, apoiado pelos elem entos únicos e diferenciais da cul­
tura local.
Além disso, nosso ambiente econômico e social passa por transformações
profundas. T er esta perspectiva pode perm iür m aior perenidade ao sistema de
gestão a ser im plantado. A sabedoria de alinhar os elem entos culturais, econô­
micos e sociais é um a arquitetura, que se faz com um projeto básico cultural, um
projeto de detalham ento flexível e um a execução priorizada e disciplinada.
No próxim o capítulo, mostraremos um a experiência de como, na prática,
pode dar-se um processo de m udança cultural na vida de um a em presa. Desta
forma, ficará bastante clara a natureza interdependente que existe entre os vá­
rios traços e destes com os processos de gestão, alem da seqüência de sua con­
dução. Trata-se da experiência da M étodo Engenharia S.A., que já tem seis anos
de transform ação e que seguram ente continua procurando ajustar seu perfil cul­
tural.
4
MUDANÇA DA CULTURA
ORGANIZACIONAL

4.1 O CASO DA MÉTODO ENGENHARIA

Vimos até agora a descrição do sistema de ação da cultura brasileira, em


que identificamos detalhadam ente cada um dos traços nacionais e sua dinâm ica
de interação. Em seguida, verificamos o quanto estes traços influenciam o siste­
m a de gestão das empresas, m ostrando como a adm inistração brasileira está vin­
culada àquelas características, conform ando, com isto, um estilo p ró p rio de
conduzir os diversos processos gerenciais. E hora agora de m ostrar como pode­
mos evoluir de form a prática na realidade em presarial com todo este conjunto
de ingredientes culturais, para um sentido objetivo de m elhores resultados na
adm inistração brasileira.
Para isto, passamos a relatar um a experiência que foi um privilégio acom­
panhar: a experiência da M étodo Engenharia, que escolhemos para analisar a
evolução da cultura organizacional através das lentes de nosso m odelo, supor­
tando vim projeto de m udança total da empresa.
A M étodo Engenharia é um a em presa com sede em São Paulo há quase 20
anos, que foi considerada a m elhor em presa de seu setor cinco vezes nos últimos
10 anos. Foi, ainda, disünguida pela Revista Exame com o prêm io de M elhor Em­
presa no ano de 1991, dentre todas as m elhores empresas setoriais. Com um fa­
turam ento de US$ 100 milhões em 1991, a em presa não considera sua trajetória
concluída (dentro da idealização de seus dois acionistas), mas os resultados até
aqui alcançados certificam, no m ínim o, a correção do projeto e de sua execu­
ção.
Para sobressair-se e manter-se em seu setor de atuação, durante os anos trá­
gicos da década de 80, esta em presa soube revitalizar-se oportunam ente, tendo
com o base um processo de m udança na cultura organizacional.
108 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

T odo o processo de m udança é de longo prazo e em seu decorrer existe


a interferência de muitos fatores internos e externos à empresa. M udanças na
liderança da em presa acontecem , às vezes, antes de ser atingido o estado de
"massa crídca" ou um a crise de m ercado pode colocar em ritm o lento ações que
exigiam velocidade. Assim, os pontos de aborto de um processo de m udança po­
dem ser muitos ao longo de um cam inho extenso que deve ser percorrido. O
processo é em si hom eopático, algumas vezes p o r tentativas com erros e acertos,
estando sem pre sujeito ao descrédito quando surgem crises agudas. Estas irão
exigir um tratam ento alopático, que pode interrom per o objetivo inicial da m u­
dança e nâo perm itir a retom ada da terapêutica anterior.
E preciso, pois, mais do que inspiração. Uma forte dose de persistência e
o desejo de rom per a inércia organizacional, com constância de propósitos, são
condições essenciais p ara a m udança. Este é o papel da liderança: ser tenaz,
perspicaz e flexível o suficiente para captar o processo e conduzi-lo. Este tem
sido o papel dos acionistas da Método.

4.2 OS ANOS 70

Dois engenheiros de produção, Victor e Hugo, recém-formados, fundaram


a M étodo há 20 anos. O ideal que os movia era idêntico: racionalizar a constru­
ção civil, que m antinha sistemas produtivos do início do século.
H ugo, gaúcho descendente de alemães e espanhóis, filho de médico, trou­
xe dessa convivência um a visão mais social do trabalho e se apresentava com um
perfil mais com edido, dedicado, organizador e com um padrão de exigência
alto, buscando um perfeccionismo ao lado de um relacionam ento mais reserva­
do. Victor, paulista, filho de p eq u en o industrial, tinha a atividade produtiva
mais presente, com um perfil em preendedor em que a descendência italiana se
revelava nas posturas explosivas e cobertas de emoção. A presentando caracterís­
ticas diferenciadas, os dois sócios acreditam que este é um dos fatores que per­
m itiram até hoje um a com plem entaridade de sucesso. Isto é, enfrentaram as
disparidades, o que já é notável.
A estas características pessoais, juntaram -se outras experiências vividas,
com o a da Diagrama e da Sobrecil, a prim eira um a fábrica de blocos que fun­
cionava em um am biente altam ente concorrido. Para ter custos competitivos,
eles com eçaram a fazer blocos nos próprios canteiros. Este foi o tram polim para
assumir a adm inistração da obra, e a porta de entrada para a construção civil.
A Sobrecil, tam bém do setor de construção, foi assumida em situação de
grande dificuldade, pois estava em concordata. Hugo e Victor ajudaram a tirá-la
desta posição e foi a partir desta experiência que criaram a M étodo Engenharia.
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 109

O contexto político brasileiro, na década de 70, fez com que as pessoas fos­
sem educadas para um relacionam ento social com um forte com ponente auto­
ritá rio . Isto era refo rç a d o p elo sucesso do m o d elo a u to ritá rio q u e fazia a
econom ia crescer a altas taxas. Neste período, poucos eram os movimentos de
anseio p o r m udanças, dem andando mais democracia.
O rdem na casa era mais im portante e estava fortem ente ligada ao progres­
so. Na M étodo não poderia ser diferente.
A tuando no setor de construção civil, alguns outros fatores contribuíam
para reforçar esta postura autoritária. O m ercado era ganho pela potência do
lobby, o que significava decisões pessoais e não com petência em relação ao pro­
duto dem andado. Internam ente, lidava-se com mão-de-obra direta de origem
cam ponesa, que estava tam bém acostum ada ao autoritarism o da estrutura rural.
Ao lado do autoritarism o, existia tam bém a concentração de p oder repre­
sentada pela figura do mestre-feitor, que ainda hoje persiste no m odo de pro­
dução do setor.
Os acionistas são m uito claros em reconhecer que as características mais
fortes das empresas no setor de construção civil eram as estruturas fortem ente
hierarquizadas, em que não havia o m ínim o respeito ao em pregado. Ele era tra­
tado com o um "troço descartável, na verdade o peão era igual a um filho de cão
vadio". "O empirismo, a improvisação, o desperdício de materiais, o tem po e o
absoluto descaso em relação à mão-de-obra" resum em o m odo de produção em
vigor no setor, na visão dos acionistas.
D entro deste estilo, a M étodo cresceu ju n to com o setor de construção ci­
vil. T inha em sua estrutura muitos níveis hierárquicos, um a adm inistração cen­
tralizada com m uitos controles e um distanciam ento do escritório central das
obras.
Em term os de qualidade da gestão de seus recursos hum anos, tinha altos
índices de rotatividade e de acidentes de trabalho, com péssimas instalações e
alim entação nas obras. Era alienante, com poucas reuniões e prom oções sem
critérios. Pouco se importava, com a produtividade e qualidade, afinal "um m er­
cado que cresce 15% ao ano aceita qualquer desaforo", dizia um dos acionistas.

4.3 PRIMEIROS MOVIMENTOS DE MUDANÇA

A crise de 1981/83 foi m uito significativa para alertar para as m udanças


nos negócios. Enquanto se processava a transição política, a econom ia brasileira
dava mostras de que estava alterando-se substancialmente. Nesta época, a M éto­
do, surpreendida pela crise, reduzia em dois terços seu quadro de mão-de-obra
direta e indireta, dim inuindo seu faturam ento de US$ 4 m ilhões/m ês para US$
800 m il/m ês em um prazo de seis meses.
110 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Na construção civil, a competitividade e os resultados das obras estavam di­


retam ente relacionados com a mão-de-obra. Havia um custo fixo exagerado in­
dicado pela relação de duas vezes e meia para cada custo de mão-de-obra direta,
cuja produtividade era baixíssima, se com parada com parâm etros internacio­
nais.
A qualidade dos produtos, das relações com o pessoal, com os fornecedores
e clientes tam bém era m uito ruim. E nas circunstâncias daquele m om ento, nem
mesmo os acionistas estavam satisfeitos, apesar de financeiram ente realizados.
Os dois acionistas, através da M étodo, queriam manter-se no negócio, mas
d en tro de um a visão diferente em face das novas tendências observadas e de
suas crenças pessoais de construir um novo patam ar na relação capital/trabalho.
A em presa precisava de m aior agilidade e flexibilidade dentro do am biente de
m udanças aceleradas. Deveria buscar produtividade e diferenciação pela quali­
dade de sua atuação. E tudo isto visava a atender às necessidades dos clientes
sem ferir a dignidade e a qualidade de vida de seu pessoal, pois som ente assim
conseguiriam garantir de form a sustentável a satisfação do cliente. O resultado
deveria ser tal que o p o d er de com petitividade rem unerasse satisfatoriamente
seus dois acionistas.
Com isso, estava delineada a estratégia do negócio e de gestão que deve­
riam apoiar-se m utuam ente.
Sua im plem entação foi sendo executada em um processo de aprendizagem
em que os vários passos se sucederam de form a pragmática. Inicialm ente, em
1987, houve um grande esforço para o aum ento da qualidade da produção da
mão-de-obra direta, através de treinam ento dos operários. Os resultados foram
lamentáveis, pois "vimos que estávamos errados e o que deveríamos m u d ar era
a cabeça", diz H ugo. O simples treinam ento não era suficiente. Seria preciso
um a verdadeira revolução cultural. Os paradigmas administrativos eram muitos
e estavam profundam ente instalados em todos os níveis da em presa, convivendo
de form a perversa.
Existia um alto grau de autoritarism o ao lado de um a passividade da mão-
de-obra, que respondia obediente ao chefe da obra, como confirm a Campos, di­
reto r da em presa que trabalhou na M étodo em 1982/84 e depois a p artir de
1988. "Durante m eu prim eiro período na construtora a em presa era mais idea­
lista que outras construtoras, mas se tom portava igual a elas." A centralização do
poder, mesmo que dividida pelos dois acionistas, era um ím ã que atraía todas
as decisões para o topo da organização. Para isso, contribuíam as norm as dos sis­
temas administrativos que, preparadas pelas assessorias técnicas da sede, tenta­
vam garantir o controle e o dom ínio da organização.
Exemplo disso era a área de suprimentos, com o p oder de decidir em re­
lação a o que e com o co m p rar p ara as obras, "podendo até m esm o p arar a
obra", o que era um absurdo, confessa Francisco Fernandes, ex-Diretor de Su-
M U D A N Ç A D A C U L T U R A O RG AN IZAC IO N AL 111

entos. Era necessário um ritual rigoroso para obter um a autorização da


para que o chefe da obra pudesse dar um aum ento salarial a seu peão. A
'logia, como um elem ento que pudesse ser um a resposta às crises futuras,
erà. coraxàeraAà, c r i vnais b&ràtd. c se
prestava a substituir equipam entos de tração. Considerada, ainda, com o um a
vantagem competitiva, a mão-de-obra precisava ser m antida pelos m enores cus­
tos. A total falta de crítica aos projetos que deveriam ser executados e aos mé­
todos utilizados nas obras revelava um a postura passiva, sem iniciativa, enfim, de
espectadores do processo, obedientes às norm as estabelecidas e sem um a res­
ponsabilidade pelo resultado final. Os engenheiros nem percebiam que abdica­
vam de sua com petência técnica em relação ao projeto, m an dando, simples­
m ente, o peão fazer o serviço sem dizer como. O nível de inform ação era res­
trito e utilizado como arm a de poder, o que valorizava a lealdade àqueles que
o detinham . Com isso, a com unicação era truncada e se fazia p o r canais não
convencionais. Não era incom um , através da m anipulação e da confidencialida­
de dos dados do orçam ento de um a obra, o p oder ser exercido onde os poucos
que o conheciam controlavam os demais que dele dependiam .

4.3.1 Início do Processo de Mudança

Os movimentos das "Diretas já" e o crescimento perm anente da ação sin­


dical foram fatos im portantes para confirm ar a certeza da direção das m udanças
qualitativas que se faziam na gestão da M étodo. Ao lado disto, os acionistas atra­
vessavam um a crise existencial. "Não basta ter lucro, querem os vencer pela com­
petência e não pelo lobby e querem os ser um veículo de m udança social", dizia
Hugo. T anto H ugo como Victor estavam genuinam ente decididos a vender suas
ações um para o outro, tam anha era a insatisfação com a m anutenção do status
quo. Estes foram os pontos que desencadeariam o processo de m udança.
Neste cenário de mudanças, foi fundam ental a vontade política dos acio­
nistas, que estavam dispostos a m udar o exercício do p oder dentro da em presa
e dar m aior transparência às decisões, para criar credibilidade ju n to aos em pre­
gados.
Em 1987, foram formalizados os docum entos Filosofia e Princípios e Políticas,
divulgados am plam ente a todos os em pregados da Método.
Este pode ser considerado o marco inicial do processo de m udança, pois
delineava a vontade inegociável dos acionistas e de como se p ropunham a con­
duzir seus negócios.
Dirigido a seus colaboradores, o docum ento Filosofia e Princípios começava
com um a m ensagem assinada pelos dois acionistas, Victor e Hugo. T inha como
objetivo "levar ao seu conhecim ento (dos funcionários) os princípios que devem
112 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

nortear sua ação no trabalho, fornecendo-lhe a base para um a avaliação de sua


aplicação concreta no dia-a-dia, para que eventuais distorções possam ser corri­
gidas em benefício de todos". Apresentava quatro linhas básicas:

FAZER BEM FEITO - é o princípio global que decorria do reconhecim ento de


que o sucesso de um a em presa depende de sua credibilidade ju n to ao público,
e que essa só se m antém em função da qualidade do serviço prestado. Mais do
que fazer bem feito para o cliente, a obra deveria ter um padrão de qualidade
diferenciado em relação ao m ercado, considerando seu consum idor final, que
são os usuários das obras, isto é, a com unidade.
U m a em presa de engenharia que pretenda construir com qualidade p re­
cisa, em prim eiro lugar, organizar-se como empresa. Neste sentido, alertava para
a necessidade de em penho, seriedade e com petência p o r parte de todos que tra­
balhavam na empresa. E propugnava p o r um a divisão racional de trabalho, que
significava o trabalho de equipe e exigia cooperação e solidariedade.

A EMPRESA COMO VEÍCULO SOCIAL - este princípio deixava claro que "a
em presa é prim ordialm ente o espaço onde as pessoas exercem seu desenvolvi­
m ento profissional e seu relacionam ento hum ano". A em presa é tam bém um
instrum ento para gerar lucro, mas como um instrum ento de "desenvolvimento,
possibilitando aos seres hum anos, que são seu suporte, m elhores condições de
trabalho, de realização profissional e até mesmo de vida". Reinvestir a m aior par­
cela do lucro na em presa é a tradução mais objetiva deste princípio.

A NEGOCIAÇÃO E A TROCA - este princípio deveria orientar as relações entre


todos n a em presa e sinalizava o direito de todos expressarem "suas opiniões, crí­
ticas e sugestões, bem como participar das decisões que lhe digam respeito". Sa­
b e r ouvir, esclarecer objetivam ente as atribuições e critérios de avaliação do
desem penho faz parte do papel gerencial, enquanto aos subordinados cabe es­
pecificar as condições de trabalho que necessitam para o desem penho de suas
atribuições. Fica claro que "o papel da em presa não é de distribuir benefícios
indiscrim inadam ente, de m odo paternalista, mas atender a reivindicações justas,
condizentes com o aprim oram ento de seu desem penho". Criar um am biente li­
beral e de diálogo e troca como condição para se obter um a qualidade integral
da empresa.

A COMPETÊNCIA: GARANTIA DE SOBREVIVENCIA- este princípio reconhe­


cia a necessidade de suportar o sucesso em presarial sob o eixo da produtividade,
abolindo totalm ente os riscos advindos do favoritismo ou do uso de influências
perversas nas práticas negociais. Estar sem pre sensível para o que acontece fora
da em presa, atento não só para captar as m udanças que se processam no con­
texto socioeconômico, com o tam bém para absorver as últimas conquistas do de-
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 113

senvolvim ento tecnológico, era a orientação para se g an h ar da concorrência


pela inovação. "É preciso então desenvolver um a tecnologia própria, criar, adap­
tar experiências de outros países", aplicá-las através de nossa mão-de-obra, que
é crescentem ente mais cara, e com isto buscar im plem entar um Projeto de Pro­
dutividade.
O outro docum ento, Políticas, "tradliZ, especifica e detalha essas orientações
para as diversas áreas do negócio empresarial". A preocupação principal é com
a concretização do discurso feito através do docum ento Filosofia e Princípios, atri­
b uindo a responsabilidade de implementá-los a todos os funcionários. Desta for­
ma, foram explicitadas políticas para Recursos H um anos, para Produção e para
Marketing. Estas deveriam ser simples, clara e tangíveis, de form a que todos pu­
dessem operá-las e cobrar de seus interlocutores um a ação consistente. Estava
decidido pelos acionistas que este processo seria im plantado, custasse o que cus­
tasse, e não seria apenas um a bela carta de intenções. Algumas "idéias-forças"
podem ser destacadas, tentando m ostrar a coerência do projeto criado, em tor­
no do qual os esforços cam inhariam para a m udança da cultura organizacional.

• Participação como direito e responsabilidade de todos. Ao entendim ento


im ediato de possibilitar reivindicações somava-se a expectativa de poder
contar ativamente com a criatividade e a possibilidade de assumir respon­
sabilidades. Para isso, dever-se-ia garantir um fluxo de inform ações cons­
tan te, "assegurando a tran sp arên cia das regras do jo g o a todos os
funcionários".
• Fazer do peão um funcionário. Isto seria traduzido de um a m aneira m uito
simples: tratar mão-de-obra, considerada no setor como descartável ou um
ser hum ano de segunda classe, à sem elhança das outras pessoas na em pre­
sa, dando-lhe condições dignas de trabalho, rem uneração, segurança,
alim entação, alojam ento e convívio social. Tam bém, definir critérios para
demissão, pois ela não poderia nunca ser utilizada como meio de coação.
• Desenvolvimento profissional e pessoal. Seria dada prioridade ao pessoal
interno nas vagas que surgissem, buscando também a polivalência como
um a otimização do potencial dos recursos hum anos, ao mesmo tem po que
garantia a flexibilidade e a agilidade da empresa.
• Fixação do homem à empresa. O foco seria voltado para a busca de
produtividade e orientaria principalm ente os critérios de admissão e de
demissão, que deveriam ser rigorosos em relação ao potencial e às possibi­
lidades de transferências internas.
• Redução dos custos aliada à melhoria do produto. Seria obtida através da
fórm ula simples de fazer engenharia, ou seja, buscar a maximização dos
resultados. A execução de um projeto de form a inteligente exige a aplica­
ção de técnicas mais racionais, com o uso da inform ática, criação de
O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

tecnologia e mecanização sem pre que possível e econom icam ente viável,
e jam ais utilizando o indivíduo como equipam ento de transporte".
• Aprimorar o projeto da obra a ser executada. Mudava-se o enfoque
tradicional de transferir a responsabilidade da qualidade da obra para
aquele que especifica o projeto. O conceito de qualidade n a em presa
"inclui a recusa em seguir especificações inadequadas do projeto". É
preciso usar a experiência do corpo técnico para aprimorá-lo, o que leva
a um a necessária troca de experiências entre todos que participam da
execução.
• Não mandar fazer e sim dizer "como" fazer. Fazer engenharia é também
descer ao detalhe dos métodos executivos, evitando-se, com isto, delegar
aos funcionários a responsabilidade de escolher a m aneira de executar o
serviço, sem que isto signifique desacreditar na inteligência daqueles
menos cultos. "Inteligência e cultura são coisas diferentes. É importante
estimular o surgimento de novas idéias, ouvir sugestões, aproveitar a expe­
riência dos trabalhadores, não se colocar no pedestal de dono da verdade.”
• Sempre é possível fazer melhor, mas antes é preciso fazer. Esta mensagem
transm ite um a abertura para se ter coragem de errar na busca de se fazer
bem-feito.
• Nunca "medir a mais". Medir a mais é roubo. A corrupção é o expediente
dos incom petentes para conseguir lucro. Por mais prosaico que possa
parecer, seria preciso ter ações do tipo treinar os engenheiros para que,
quando fossem fazer medições para os clientes, não medissem a mais, ou
seja, fazer o uso de medidas como um "metro tem 100 cm e não 90 cm",
com o é prática comum.
• Marketing é atribuição de todos. Revela a disposição de responsabilizar
todos pela qualidade da imagem da empresa. Além de ter em seus funcio­
nários os principais emissores de identidade da empresa, é preciso "associar
o seu nom e às obras realizadas, pois a qualidade final da obra é o principal
testemunho, resistente ao tempo, do bom desem penho da empresa".
• Conquistar a confiança, seja do cliente ou da comunidade. Significa uma
disposição de também estar aberto a estes dois públicos fundam entais para
a em presa. M anter o cliente inform ado do andam ento real da obra e expor
a ele as dificuldades e as providências tomadas eram as práticas desejadas.
A isto se soma a postura de abrir a obra à visitação, m ostrando em que
m edida a com unidade poderá ser beneficiada p o r ela. "Uma em presa
com petente não tem o que esconder, ao contrário, deve exibir sua com pe­
tência.”

Estes 11 pontos, aparen tem en te óbvios e singelos, seriam traduzidos em


apostar na com petência, correr riscos para errar e fazer m elhor, ser agente ativo
em relação à qualidade. Isto é, não transferir a responsabilidade a terceiros, não
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 115

e viável, ser superficial em relação aos processos construtivos e ter custos m enores, pas­
sou a ser a nova estratégia de negócios. Para suportá-la, um a nova estratégia de
;nfoque gestão, baseada na fixação do hom em na em presa, no trabalho em equipe e
>ra para cada um sendo dono de sua própria dignidade. Tudo isto com um intercâm bio
:m presa total, internam ente, entre dirigentes e funcionários, e externam ente, entre em ­
jeto". É presa e clientes/com unidade.
que leva No início, estes movimentos levaram a organização a certo grau de esqui­
pam da zofrenia, pois os acionistas e os docum entos apontavam para um a direção m uito
diferente da prática existente naquele am biente altam ente hierarquizado.
também
delegar
ecutar o 4.4 IMPLEMENTAÇÃO DA MUDANÇA
laqueies
portante Além da crise econômico-financeira, a vontade e a determ inação dos dois
r a expe- acionistas, que confessam ter tido um a crise existencial, foram fundam entais
:rdade.” neste processo.
insagem Um mestre-de-obras, que está na M étodo h á 13 anos, relata: "Desde o início
: se fazer era diferente, a gente falava: aqui é possível conversar com Deus", referindo-se
a H ugo e Victor. Porém , "começou a m udar mesmo quando a em presa ia co­
m eçar a d ar prejuízo e as pessoas mudavam ou perdiam o em prego”. Victor e
aediente
H ugo disseram sem meias palavras: “Q uem quiser participar fica, quem não qui­
ue possa
ser sai.” C ontinua o mestre-de-obras: "E a gente com eçou a ver que era verdade
iara que,
quando algumas pessoas foram m andadas embora. Antes, a m entalidade era a
mais, ou
mesma, mas eles não eram impositivos.”
»90 cm",
O ex-Diretor de Suprim entos e atual D iretor de um a das Divisões reforça
esta colocação dizendo: "As pessoas que tinham a cabeça mais aberta ficavam,
isabilizar
as outras não encontravam espaço. Foi m uito difícil”, continua ele, ’’algumas
is funcio-
pessoas diziam que tudo estava acontecendo m uito depressa. As pessoas que não
"associar
agissem d en tro de um novo conceito não ficavam e o H ugo e o Victor bancaram
principal
isto. Só p o r isso está m udando. Mas em alguns m om entos eles querem en trar
a".
nos detalhes das coisas, causando o ‘stop and go’ no processo. Aí a gente tam bém
ifica um a tem de policiar e colocar limites, o que não é nada fácil", conclui ele.
itais para A im plantação deste projeto não teve seguram ente um a estratégia fixa que
a e expor se manteve ao longo do tempo. Os ajustes nas ações foram sendo feitos em fun­
lesejadas. ção dos resultados internos obtidos e da realidade externa cheia de surpresas
) em que neste período de seis anos de cam inhada.
em presa
Para que possamos descrever a im plantação, vamos utilizar o sistema de
ia compe-
ação cultural para, em nossa percepção, apresentar como se processaram de for­
m a articulada as principais transformações dos vários traços culturais anterior­
zidos em m ente identificados.
;nte ativo Como vimos, o sistema de ação cultural nos faz observar dois conjuntos de
íiros, não atores genéricos, existentes em qualquer arranjo social: são os líderes e os lide­
116 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

rados. Partindo do princípio de que era necessário aproxim ar os dois universos


- o dos líderes e o dos liderados -, que estavam efetivamente m uito distantes,
é im portante verificarmos como, na im plantação das várias políticas, a M étodo
atuou nos diversos elem entos de seu sistema cultural.

4.4.1 Desconcentração do Poder

Um dos mecanismos de diluição do poder foi a criação de comitês, desmi-


tificando inclusive a figura do chefe todo poderoso. Um exem plo que veio de
cima foi a criação do Conselho de Gestão, composto p o r dois "cabeças" de cada
divisão, de dois representantes dos funcionários, além dos dois acionistas, onde
todos têm direito a voto de igual valor. "Houve um a época em que as reuniões
destes comitês chegaram às raias do exagero", como diz Marcos, D iretor da Mé­
todo. Em um prim eiro m om ento, a falta de critérios para qualificar o tipo de
decisão, que era de responsabilidade do Conselho de Gestão, fez com que ele
fosse acionado para resolver todos os problemas. Possivelmente, tam bém como
reflexo do costume da centralização e de transferir as decisões para cima. Hoje,
a m aior clareza de seu verdadeiro papel e, provavelmente, a m aior descentrali­
zação das decisões, fazem com que seu trabalho seja considerado mais objetivo
e tem funcionado bem , segundo a observação de seus participantes, entre os
quais se inclui Marcos.
Entre outros, existe ainda o Comitê de Investimento, formado por um repre­
sentante de cada unidade, em conjunto com os dois acionistas, que neste fórum
tem direito a veto.
O utro aspecto que m arcou m uito esta descentralização do p o d er foi a que­
da da unicidade de com ando, que já não existia no nível dos acionistas. O m o­
delo de equilíbrio de poder, en tre dois com andos principais, foi aos poucos
sendo im plantado pelos vários setores de atuação. O D iretor de Gestão, Oscar,
diz que "isto possibilitou a diluição do poder, deixando de existir a figura do
chefão, que tinha todos os poderes".
Um mecanismo m uito poderoso utilizado foi o da dem ocratização da infor­
mação e o incentivo para a busca desta, esteja ela onde estiver. Victor, um dos
acionistas, diz: "não recebeu a inform ação, vai buscar. Qual o problema?"
O utro caso típico é do Rubens, um engenheiro-chefe de canteiro. Ele vi­
n h a m uito bem no com ando de suas obras e achava que tinha um "veio" para
aquela atividade. Estava prestes a passar para um a obra que apresentava proble­
mas na execução. Teve o p o rtunidade de conhecê-la, durante um a sem ana, o
que lhe perm itiu listar um a série de ações e apresentá-las a seu superior, que ti­
n h a a responsabilidade pela obra na qual estava e pela obra em perspectiva. En­
tre as ações, ele dispensava a eq u ip e de m étodos e processos com posta de
recém-formados, que influíam m uito na execução, provocando um a responsabi-
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 117

lidade m uito diluída na condução da obra. Ele tinha bastante claro que a res­
s dois universos
ponsabilidade total da obra deveria estar concentrada em suas mãos e que até
nuito distantes,
mesmo a atividade de planejam ento e controle de produção devia ser feita por
ticas, a M étodo
quem fosse responsável pela execução. No entanto, esta sua m aneira de pensar
colidia com as diretrizes dos próprios acionistas, que queriam ter um engenhei­
ro de produção com sua equipe de métodos na obra, para introduzir modifica­
ções nos procedim entos de execução. Sem m aior capacidade de negociar, de
evitar conflitos e para fugir a novos desgastes, só coube a ele sair da M étodo.
"Para mim ficava a impressão de que tirar o m eu p o d er era um a desvalo­
zomitês, desmi- rização de m inha com petência e que na em presa se buscava um cam inho onde
lo que veio de a capacidade política de harm onizar interesses era mais valorizada. Sem ter esta
beças" de cada autonom ia, não podia me responsabilizar pelos resultados", concluiu ele. Na ver­
donistas, onde dade, era exatam ente o contrário. Era preciso aum entar a com petência técnica
ue as reuniões e ju n to a ela a com petência interpessoal. Hoje, este engenheiro já reto rn ou à
Diretor da Mé- M étodo e, ao fazer um a análise crítica de suas ações, acredita tam bém ter havido
5car o tipo de algum exagero e pressa p o r parte da em presa, no início do processo de descen­
z com que ele tralização do poder.
também como O fato é que, hoje, este é um ponto de forte diferenciação entre a M étodo
ra cima. Hoje, e as outras empresas brasileiras. Isto fica m uito bem caracterizado se com parar­
Dr descentrali- mos os dados de nossa pesquisa, cujos resultados são mostrados naF ig u ra 4.1.
mais objetivo E nquanto 88% dos 2.500 executivos de 520 empresas brasileiras disseram que
ntes, entre os concordam com a existência da concentração de po d er em suas empresas, na
M étodo isto é visto por apenas 29% dos 94 colaboradores pesquisados.
por um repre-
e neste fórum

d e r foi a que-
•nistas. O mo-
>i aos poucos
iestão, Oscar, 2?
'o
c
r a figura do <«5
•O1—
oo
ição da infor- c
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ictor, um dos O
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iteiro. Ele vi-
n "veio" para
ntava proble-
ia semana, o
lerior, que ti-
•spectiva. En-
om posta de
F ig u ra 4.1 Concentração de poder.
i responsabi­
118 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

teve
4.4.2 Ampliação da Lealdade às Pessoas o no

A lealdade às pessoas é um traço forte, tanto nas empresas brasileiras como


na M étodo, conform e podem os concluir pelos dados da pesquisa. Ela indica que cond
71 % dos executivos brasileiros concordam que a lealdade pessoal existe em suas press;
empresas. Na M étodo este percentual é de 66%, conform e m ostrado na figura porta
4.2. cama.
rem j:

4.4.3

A
identic
cordâr
no grá
traço, i

i(
i
c
F ig u ra 4.2 Lealdade às pessoas. (.
o
x
ÿ

Na busca da participação, em seu conceito lato sensu de "ser parte", era pre­
ciso traçar um a estratégia para um a nova coesão social. Ela teve seus fundam en­
tos baseados na credibilidade e confiança mútuas. Buscou-se am pliar a lealdade
das pessoas para a lealdade à empresa. Neste sentido, a M étodo desenvolveu es­
tratégias de coesão diferenciadas para os diferentes públicos. A prim eira voltada
para o grupo de direção, cam inhou na linha da sedução, pela oportunidade de
p erten cer a um grupo que tinha um projeto novo de em presa a ser construído F ig u ra 4
e que, pela via da com petência, poderia se afirm ar e, pela adesão aos novos va­
lores, perm anecer. A dií
O resultado foi que poucos dos originários aderiram aos novos valores e trole das i
pela força do g rupo foram sendo expelidos, ao longo do tem po, da M étodo. ça desses
U m a das exceções é ilustrada p o r um dos atuais diretores de Divisão, que não diretas e c
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 119

teve dificuldade de adaptação, porque já administrava de form a participativa"


o novo paradigm a da gestão.
A segunda, condizente à m ão-de-obra operacional, era de diferenciar as
condições de trabalho em relação ao m ercado e de dar m aior liberdade de ex­
pressão. As pessoas deveriam se sentir valorizadas pela empresa. O pedreiro teria
portas abertas n a diretoria. Condições consideradas mínim as com o roupa de
cama, cobertor e travesseiros nos alojamentos foram im plantadas e, apesar de se­
rem primárias, não era a prática no setor de construção civil.

4.4.3 Mudança do Mecanismo de Controle das Incertezas

A necessidade de controlar a incerteza é um outro traço em que existe um a


identidade entre a M étodo e as outras empresas brasileiras, pois o índice de con­
cordância das pessoas pesquisadas está bastante próximo. Como podem os ver,
no gráfico 4.3, nas empresas brasileiras 65% concordam com a presença desse
traço, enquanto na M étodo esse percentual é de 57%.

100% ■
90% ■

to 80% ■

F ig u ra 4.3 Controle das incertezas.

A diferença está na utilização dos vários mecanismos possíveis para o con­


trole das incertezas. No processo em curso na M étodo, percebem os um a m udan­
ça desses mecanismos den tro da perspectiva de desenvolvimento das relações
diretas e da tecnologia, como passaremos a relatar em seguida.
120 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

SUBSTITUIÇÃO DO FORMALISMO PELAS RELAÇÕES


DIRETAS

Para que não existissem barreiras mais rígidas em relação às m udanças, a


ação foi bastante radical em relação ao formalismo, num a dem onstração clara
de elim inar, o máximo possível, a discrepância entre as norm as e a realidade.
A tentativa era no sentido de com binar produtividade e agilidade com relações
mais diretas e pessoais. Normas podem ser questionadas e devem ser mínimas.
Era preciso acabar com cargos e procedim entos rígidos, perm itindo até que as
fronteiras dos órgãos ficassem mal definidas. Acabaram-se as norm as dos mais
variados tipos, desde os organogram as até instruções de datilografia.
Mas a inexistência de m anuais não deixou im pune a organização. Exigiu-se
m uito mais esforço de integração. Incentivou-se o fortalecim ento do grupo para
regular algumas ações e ampliação ao máximo das inform ações e seu acesso a
elas. Esse m ovim ento de dem ocratização da inform ação, considerado de funda­
m ental im portância, foi acom panhado pelo movimento de simplificação dos sis­
temas de inform ação, orientados para controle.
Em um prim eiro m om ento, o desnível de informações entre líderes e lide­
rados era tão grande que muitas vezes o sentim ento de falta de participação era
suprido pelo simples fato das pessoas serem participadas, inform adas dos assun­
tos que lhe dizem respeito ou lhe são próximos. Essas duas ações, de ampliação
da lealdade pessoal e de minimização do formalismo, deram partida à formação
de novos canais de integração entre líderes e liderados, estabelecendo um a coe­
são social em bases culturais em que o p o d er estava mais distribuído e suportado
pela com petência técnica e interpessoal.
O valor dado para as relações diretas e pessoais está espelhado n a fala de
um dos acionistas. H ugo diz: "o distanciam ento é a punição. Q uando alguém faz
algo errado, o grupo regula, e mesmo se não enfrenta o conflito de frente, se
distancia, fazendo a pessoa se sentir expelida pelo sistema".
O utro exem plo é no m om ento do preenchim ento de vagas, para as quais,
em igualdade de condições, "os amigos ou familiares dos funcionários têm pre­
ferência", confirm a, orgulhoso, Benedito, mestre-de-obras.

DESENVOLVIMENTO DA TECNOLOGIA

Apesar de estar na origem de sua fundação, o desenvolvimento tecnológi­


co, com o um a estratégia de prevenção diante de eventos futuros que possam
am eaçar a existência da em presa, só foi intensivam ente praticado em um a fase
mais adiantada das transformações. A busca da produtividade, via im plem enta­
ção de novas tecnologias, foi feita através da associação com um a em presa do
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL

exterior, nu m a tentativa de buscar um diferencial competitivo para a em presa.


Pois, conform e relata Victor, "a construção civil não está potencializada para ab­
sorver a tecnologia e este é o nosso desafio, m udar esta cultura". Com isso, era
preciso cuidar para que houvesse um a efetiva transferência de tecnologia exter­
na, devidam ente adaptada às nossas condições.
U m a nova form a de produção exigia um a nova form a de organização dos
canteiros de obra, acom panhada de novos m étodos de trabalho e, conseqüen­
tem ente, de um novo perfil dos em pregados, não só técnica mas gerencialm ente
também.
A concepção de canteiro como centro de fabricação foi sendo substituída
pela concepção de centro de m ontagem , onde os novos "montadores" podiam
exercer funções polivalentes. Essa m udança de métodos de trabalho e de perfil
da função fica dem onstrada na citação do Lourival, carpinteiro, quando diz:
"cada pessoa tem a pessoa certa para procurar o serviço que vai fazer. O serviço
n a M étodo é mais fácil, o pessoal traz as peças prontas e é só m ontar nas outras,
facilita bem para nós. De cada um a turm a tem um representante que, se falta
material, ele vai reclam ar p ara resolver".

4.4.4 Prevenção Contra o Personalismo

Era preciso cuidar para que o sistema não corresse o risco de se sustentar
no personalism o de algumas poucas pessoas, ou na dependência delas. Nesse
sentido, podem os identificar alguns movimentos como o da valorização da com­
petência, a abertura dos canais para todos os envolvidos e a decisão em colegia-
do. A decisão do g ru p o devia prevalecer, com o, p o r exem plo, no caso das
demissões, prom oções ou mesmo criação de novas funções. Foram introduzidos
vários comitês e colegiados, alguns de caráter mais perm anente e outros não.
Dessa forma, podem os verificar, conform e a Figura 4.4, que existe um a di­
ferença grande entre o índice de concordância com o personalism o na em presa
brasileira, que foi de 69%, e o índice encontrado pela pesquisa realizada na Mé­
todo, que ficou em 37%.
122 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

F ig u ra 4.4 Personalismo.

Um dos instrum entos mais udlizados no processo de m udança foi a criação


de grupos de negociação e trocas. Inicialm ente eram patrocinados pela área de
Recursos H um anos para formalizar um cam inho e quebrar a resistência inicial
de se sentarem juntos, p o r exem plo, o engenheiro e os operários, e tratarem de
necessidades e condições de trabalho. Hoje, eles são criados ou reform ulados
p o r iniciativa própria dos envolvidos.

M esmo com o avanço que pode ser observado, “ainda há m uito espaço
p ara cam in h ar”, como diz um dos diretores. “Mas hoje já existe um acordo tá­
cito de vigilância m útua, pois nós mesmos, incluindo os acionistas, às vezes es­
corregam os na casca de banana. A grande diferença é que quando isto ocorre,
explicitamos sem m edo e a pessoa revê o seu com portam ento."

4.4.5 Diversidade de Opiniões sem Geração de Confronto

Para o funcionam ento eficaz das decisões em grupo seria fundam ental que
as opiniões, mesmo que diferentes, fossem tratadas de form a a estimular a exis­
tência de um am biente mais criativo e produtivo. O tratam ento mais aberto e
direto dos problem as poderia sofrer o im pacto da tendência que temos de evitar
o conflito.
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 123

As verdadeiras posições não são expostas e defendidas, principalm ente por


aqueles que não detêm o poder. O princípio da com petência devia prevalecer
e, para isso, na M étodo, pode-se contar com os diversos grupos e comitês, pois
nesses fóruns a relação deixa de ser estritam ente pessoal, ou seja, preserva-se a
relação mesmo quando as opiniões são diferentes. Para isso conta-se com a m e­
diação feita pelo grupo.
Um exem plo disso é o G rupo de Reflexão. Lima, D iretor da M étodo, diz
que o grupo é form ado pelos dois acionistas e os dois chefes da Divisão de De­
senvolvimento e Gestão e acrescenta: "este é um meio de desobstruir os canais
sem que as diferenças interfiram nas boas relações". As redes de p o d er e os con­
chavos com eçam a ser desmontados. O utro mecanismo que tam bém garante a
neutralidade e a preservação do princípio da com petência é a presença e inter­
ferência de consultorias externas, para se resolver im parcialm ente os conflitos.
Mesmo assim, algumas vezes, os erros das pessoas não eram tratados aber­
tam ente e só apareciam depois que elas saíam da empresa, revelando resquícios
da forte presença do evitar conflito. U m a outra m aneira de evitar o conflito e
resolver os problem as, convivendo com as opiniões diferentes, é através das re­
lações pessoais, que cria um clima mais amistoso e de m aior confiança. Confor­
m e diz Campos, D iretor da M étodo, "o bate-papo, a conversa fiada, o almoço
com partilhado ajudam muito. Eu convido os aniversariantes do mês p ara um al­
moço e isto tam bém contribui para a aproxim ação das pessoas".
Parece haver um a correspondência desse mesmo clima no nível dos ope­
rários. E o que podem os observar no com entário de Pedro, um dos arm adores
que trabalha na Método: "todo m undo lá é amigo, com amigo é mais fácil de
arrum ar algum a coisa. Q uando a gente vê alguma coisa errada, chega ju n to do
amigo e mostra".
Percebe-se, então, um incentivo à construção de um a relação de confiança
en tre as pessoas que possa suportai as diferenças de opiniões, de um a form a
amigável. Assim é que na M étodo o seu traço cultural de evitar conflito fica re­
lativam ente abaixo da m édia das empresas brasileiras. Isto é revelado pela pes­
quisa, pois enquanto 68% concordam que o evitar conflito ainda está presente
na em presa brasileira, no caso da M étodo 43% têm a mesma opinião. Veja a Fi­
gura 4.5.
124 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

100% ■
90% ■

F ig u ra 4.5 Evitar conflito.

4.4.6 Formação de Agentes e Cidadãos Empresariais

O bservando agora o grau de participação ativa dos liderados, através de ini­


ciativas em sua área de atuação, podem os identificar a sua eficaz im plem enta­
ção. Prim eiro como direito, depois como responsabilidade.
Típico dessa participação foi o envolvimento dos funcionários na pesquisa
salarial. Em um a prim eira etapa, eles próprios foram os executores da pesquisa
realizada ju n to a outras empresas e a M étodo aceitava os seus resultados. Hoje
a área de Recursos H um anos faz a pesquisa e os funcionários a aceitam, tendo
acesso a todas suas informações.
Em todos os casos, um princípio era respeitado: as pessoas deveriam par­
ticipar de decisões que as afetassem diretam ente. A própria alocação de pessoal
nas obras obedece a este princípio, perm itindo que o trabalhador, em função
de suas particularidades, tenha alternativas de escolha. Exemplo simples é o ho­
rário flexível no escritório central, onde cada um define com sua chefia um ho­
rário que possa respeitar seus compromissos pessoais.
Tam bém as atividades de planejam ento, como, p o r exem plo, a desmobili­
zação de obras, passaram a contar com a contribuição de sugestões da mão-de-
o b ra d ireta. Os p ró p rio s funcionários já têm consciência que eles precisam
deixar de ser espectadores do processo. Esta posição é revelada no depoim ento
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 125

da comissão de representantes feita no jo rn al Fatos e Feitos, editado pela Método:


"As pessoas habituadas aos moldes dessa relação autoritária têm ainda grande re­
ceio de tom ar iniciativas e correr riscos. Por enquanto, ainda preferem reclam ar
de m edidas impostas do que se arriscarem ao confronto, para p oder efetivamen­
te tom ar parte nas decisões. Em term os de Brasil, a possibilidade de se ter dois
rep resen tan tes de funcionários no Conselho de Gestão de um a em presa de
construção civil é, sem dúvida, um grande avanço. Porém, em bora esse espaço
tenha sido aberto na M étodo, ele só será efetivamente utilizado quando as pes­
soas aprenderem , na prática, como fazer isto."
Mas, um a dem onstração de que setores na M étodo já têm o espírito de
atuar ativamente e não como simples espectadores do processo, no qual estão
envolvidos, vem de Pedro, arm ador na M étodo, que revela: "não podem os des­
truir ou desperdiçar. Q uando vemos um colega fazendo isto, temos que dar con­
selho para ele, porque não vamos aceitar. Não pode dar nó cego".
A postura de espectador já parece ser coisa do passado, na M étodo. O mes­
mo não se pode dizer das empresas brasileiras. Nossa pesquisa revela que som en­
te 21% co n co rd am que ain d a haja u m a po stu ra de esp ectad o r n a M étodo,
enquanto 67% (três vezes mais) opinam pela presença desta postura nas em pre­
sas brasileiras, conform e indicado naF igura 4.6.

100%
90%
80%
CB 70%
'oc
<(0 60% 67%
■a
oo 50%
c
o
O 40%
03
rs 30% Brasil
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20%
21%
10% Método
0%

F ig u ra 4.6 Postura de espectador.


126 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

4.4.7 Flexibilidade pelo Bem Comum

A flexibilidade, visto pelas suas duas faces da aptabilidade e criatividade, é


um dos traços culturais de nossas empresas que tem um dos maiores graus de
reco n h ecim en to p o r todos que foram pesquisados. Ligeiram ente superior na
M étodo, não podem os dizer que ela se destaca, pois o seu índice de concordân­
cia é de 86%, e nas empresas brasileiras de 81%, conforme mostrado na Figura 4.7.

F ig u ra 4.7 Flexibilidade.

A liberdade de questionar as norm as e p o d er errar e não ser punido, deszr


que não haja dolo, aguçou o espírito crítico e criativo, ou pelo m enos estah-t-
leceu o clima fundam ental para o exercício, de form a ativa, de sugestões para
m elhorias nas atividades da empresa.
Por outro lado, com poucas norm as e estas de natureza geral, a necesãdê-
de do je itin h o p ara contorná-las pode reduzir-se bastante, canalizando, m a»
um a vez, a energia criadora no sentido de benefícios comuns. Essa visão é re­
forçada pelo Campos, que diz: "a criatividade é incentivada, inclusive fugir. 2 :
dos manuais"; ou pelo depoim ento de Francisco Fernandes que completa. ± -
zendo: "agora a criatividade está desabrochando, porque o sistema autoritár-.:
está dim inuindo".
Tam bém aparecem resultados tecnológicos com a criação de novos m e::-
dos executivos ou de ferram entas mais produtivas, seja p o r processos individu^í
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 127

seja p o r processos coletivos de criação. A própria incorporação de tecnologias


co n tratadas ex tern am en te é rap id am en te aceita e im plantada ou criticada e
adaptada, conform e as opiniões dos envolvidos.
Nessa trajetória de m udança, processos de trabalho são m elhorados a partir
de idéias e sugestões de "quem está com a mão na massa", m odificando a im­
pressão detectada num a pesquisa feita na década de 80, em que 90% dos peões
culpavam os engenheiros pelos erros acontecidos e vice-versa. Em um clima de
confiança, a busca de alternativas é feita em conjunto, seja na obra, seja no es­
critório e, segundo a própria percepção hoje dos funcionários, a criatividade em
conjunto passou a ser um a característica presente na M étodo, em m aior escala
que na m édia das empresas brasileiras.

4.4.8 Festas que Reforçam o Pertencer e a Igualdade

U m a das práticas do setor de construção e da M étodo, que se manteve mes­


m o depois de tantas mudanças, são as festas, com emorações e congraçam entos
que são promovidos tanto nas obras quanto na sede. A M étodo sem pre foi tida
como um a em presa festeira, e na opinião do acionista Victor isto é visto como
"uma boa m aneira de dar aderência à empresa, pois as pessoas se curtem".
Vários entrevistados de diferentes níveis hierárquicos acreditam que a rea­
lização de festas e o increm ento das relações pessoais ajudam a resolver proble­
mas e até mesm o a dim inuir conflitos.
M udou, no en tanto, a form a de operacionalizar as festas, com o ocorreu
com o Natal do ano de 1990, quando coube ao pessoal decidir com o seria, ou
até se haveria a festa. Fazer festa ou não depende hoje dos comitês.

4.4.9 Não ao Paternalismo

U m a das formas de regular o paternalism o é a criação dos grupos e comi­


tês. Em relação a estes, H ugo tem um a visão bastante clara: "os mecanismos e
as ferram entas são im portantes até que a filosofia seja introjetada. Depois, elas
vão p erd en d o a im portância. Não podem os correr o risco de copiar o m odelo
jap o n ês que, apesar de ser cheio de ferram entas, tem relações de p o d er com­
pletam ente autoritárias".
Porém , n en h u m a dessas m udanças deve ser vista como um a liberalização
inconseqüente ou com o um a nova postura paternalista, pois é fundam ental o
princípio da troca, em que a em presa precisa ter seu resultado de produtividade
e de lucro. Assim é que um a greve de transportes que não perm itiu com que
os trabalhadores chegassem ao trabalho, paralisando as obras e atrasando seu
128 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

cronogram a, foi motivo de um a negociação, na qual em presa e trabalhadores di­


vidiram os prejuízos, um a pagando parcela dos dias parados e outra repondo o
tem po de trabalho.
Talvez o exem plo mais significativo da interdependência, que se contrapõe
à dependência gerada pelo paternalism o, seja o do processo de divisionalizaçã-:
das atividades, form alizando a independência e a autonom ia dos negócios. Cada
um a das unidades tem sua própria estrutura de recursos, mas se relacionam en­
tre si e com a corporação através do Conselho de Gestão que, conform e dito an­
te rio rm e n te , é fo rm ad o pelos dois acionistas, dois re p re se n ta n te s de cada
unidade e dois representantes dos funcionários.
Essa nova postura está em fase de consolidação e, às vezes, as relações já es­
tabelecidas dificultam a m udança, pois conform e diz Geraldo, mestre-de-obras.
"a gente é m eio paizão, defende até na hora em que não deve".
Em bora tenha avançado bem em relação às empresas brasileiras, é preciso
cuidado para não cair em tentação. Na M étodo, a pesquisa revela que 43% ain­
da concordam que haja paternalism o, enquanto a dependência atinge níveis de
28%. Os dados relativos à am ostra das empresas brasileiras m ostram que a con­
cordância com a existência do paternalism o é de 77%, refletindo no índice de
76% de concordância em relação à dependência.

100%

90% Paternalismo Dependência


80% _____
77% 76%
çfl 70%
"o
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0) 43% Brasil
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28%
20 %
Método
10%
0%

F ig u ra 4.8 Paternalismo e dependência.


MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 129

iores di- 4.4.10 Não à Impunidade, sim à Premiação


jondo o
Um traço que se articula com todos os anteriorm ente descritos, mas que
tem um a especial ligação com o paternalism o e a dependência, é a im punidade.
ntrapõe
lalização Poucos concordam que a im punidade exista na M étodo, conform e m ostra
3S. Cada o gráfico abaixo. Enquanto na am ostra da pesquisa 69% concordavam que a im­
nam en- punidade existe em nossas empresas, na M étodo som ente 27% tem esta opinião.
dito an­
de cada
100%
>es já es- 90%
ie-obras, Impunidade
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10% ■ Método

0%

F ig u ra 4.9 Impunidade.

Observa-se, na M étodo, um a vigilância clara para não p u n ir indevidam en­


te, de form a a não im pedir que as pessoas construam soluções novas e arrisquem
n a busca de alternativas cada vez melhores.

Porém , quando se depara com o erro proposital e com pessoas que resis­
tem claram ente aos processos de m udança im plem entados, a ação da em presa
é clara e muitas vezes a demissão é a solução. “Este é um processo triste e do­
loroso, pois às vezes precisamos dem itir pessoas de quem gostamos”, diz um dos
executivos. Porém, é claro que não se pode abrir mão do rum o estabelecido e
que as ações gerenciais devem convergir para concretizar no cotidiano essa di­
reção.
130 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

4.5 AVALIAÇÃO ATUAL E PERSPECTIVAS

Fizemos um relato do processo dentro da perspectiva da m atriz cultural, o


que nos perm itiu visualizar de forma articulada os vários movimentos de trans­
form ação. A preocupação agora é avaliar, a p artir de questionários realizados
com pessoas nos vários níveis, desde os acionistas até o “chão-de-obra”, a situa­
ção atual (maio de 1993) do processo de m udança na M étodo e suas perspec­
tivas futuras. In terp retan d o o conjunto de 94 questionários respondidos e da
validação feita em 32 entrevistas, podem os apontar algumas conclusões a respei­
to desse processo de m udança cultural.
Não se pode dizer que a m udança cultural na M étodo Engenharia tenha
atingido integralm ente seus objetivos. Porém, algumas de suas propostas iniciais
tiveram bastante êxito, podendo-se dizer que, praticam ente, foram im plantadas
e assimiladas. A que parece ter alcançado m aior sucesso foi aquela que dispunha
que a em presa é um veículo social.
Dois outros pontos que avançaram nitidam ente e que estariam em estágio
final de im plantação, mesmo que exigindo um esforço a mais, é o princípio do
fazer bem feito e da negociação e troca. Talvez pelo envolvimento de um a par­
cela m aior de participantes, pela diversidade de experiências que devem ser en­
frentadas e pela própria natureza do desafio, em que os aspectos culturais estão
mais enraizados, esses princípios se desenvolveram de um a form a mais lenta.
Por últim o, o princípio da com petência como garantia de sobrevivência é
o que mais necessita de avanços. Isto pode erroneam ente parecer ou até indicar
que o sucesso da m udança pode ser questionado, pelo desem penho m enos sa­
tisfatório nesta área. E preciso, no entanto, considerar a violência dos fatos con­
ju n tu rais pelos quais vêm passando o país e o setor. O enfrentam ento das crises
de m ercado vem sendo tratado com m enos traum atism os e em ocionalidade,
com mais justiça e racionalidade, relativamente a outras empresas, seja do setor
ou entre as m elhores empresas brasileiras. A M étodo vem-se destacando como
a m elhor, considerando os critérios econômico-financeiros.
Fica, no en tan to , identificada um a necessidade básica, que é a de um a
m aior articulação de todos os elem entos internos, um a vez que a natureza filo­
sófica da m udança é de desconcentração do p oder e descentralização organiza­
cional com o envolvimento de um m aior núm ero de pessoas.
Se os princípios foram assim avaliados, como podem os avaliar e correlacio­
n ar a evolução havida nos traços culturais, já que estes é que caracterizarão a
real m udança cultural e o sentido desta transformação? A principal m udança foi
no universo dos acionistas e dos dirigentes, isto é, no espaço do poder. Houve
um a real inversão em termos do grau de concentração do poder, que ficou bas­
tante atenuado na percepção de todos.
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 131

Os dados da pesquisa realizada com os colaboradores da M étodo, para ve­


rificar o que pensam a respeito da existência dos vários traços culturais na em ­
presa, revelam que apenas um terço (29%) dos entrevistados concordam que
haja concentração de p oder na Método. Isso significa que nesse ponto a em pre­
sa já atingiu um a boa massa crítica.

F ig u ra 4.10 Concentração do poder.

Em relação ao personalism o e ao paternalism o, a percepção dos entrevis­


tados é mais equilibrada entre aqueles que concordam e discordam da presença
destes traços na M étodo. Podemos vislumbrar as posições no gráfico a seguir (Fi­
gura 4.11). 47% discordam que haja personalismo e 37% dos entrevistados p er­
cebem a sua ex istên cia no dia-a-dia d a em p resa, e n q u a n to em relação ao
paternalism o 43% concordam que ele existe e 42% discordam.
O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Personalismo

Paternalismo

F ig u ra 4.11 Personalismo e paternalismo.

U m a das explicações pode ser o com portam ento diferenciado no escritório


central e no campo. Neste ainda subexiste, mesmo que de form a não hom ogê­
nea, a postura tradicional paternalista do chefe-de-obra, que se apóia no m odelo
de com ando, onde prevalece, ainda, o controle econôm ico e afetivo. Um exem ­
plo dessa tese é m ostrado p o r um mestre-de-obras que teve a oportunidade de
trabalhar em diferentes obras, com diferentes engenheiros, e que tem a seguinte
percepção: "existem níveis diferentes de participação. Tem uns que querem que
a gente participe de tudo, outros de parte e outros poucos que a gente só exe­
cute. Para alguns (engenheiros e operários) se ‘ab rir’ depressa demais funde a
cuca". Dessa form a, personalism o e paternalism o acom panham o m ovim ento
qualitativo de minimização desses traços na M étodo, caracterizando um a forte
diferenciação em relação às empresas brasileiras.

Bastante coerente com essas m udanças e confirm ando as relações aponta­


das pelo m odelo, a postura de espectador se reduziu substancialmente, o que é
qualitativam ente a grande transformação que se processou no universo dos li­
derados, daqueles que não detêm o p oder de m ando, mas que passaram a ter
o po d er de influenciar.
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 133

Na M étodo, apenas 21% concordam que haja um a postura de espectador


dos liderados em relação aos acontecimentos, constituindo-se em um dos pontos
onde houve m aior convergência de percepções, o que fica bastante coerente
com a visão do grau de dependência entre líderes e liderados. Nesse caso, 28%
concordam que exista um a forte dependência na Método.

A confiança num clima em que os liderados são considerados com o fonte


de sugestões e de m udança, podendo agir com iniciativa, fez com que o temor,
com o o de evitar conflito, se reduzisse a ponto de se dividirem as opiniões a res­
peito da existência desse traço.
Na M étodo, 43% dos entrevistados têm a percepção de que se procura evi­
tar conflitos nas relações profissionais, mas 46% têm a opinião de que este não
é o procedim ento predom inante nas situações de confronto.
134 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

Esse é um avanço im portante, pois as questões podem ser tratadas de form a


mais direta, porém com respeito à pessoa. O entendim ento não será do ponto
de vista estritam ente pessoal mas, sim, tendo em vista um a outra referência, a
da empresa.
Era de se esperar que a im punidade também tivesse níveis medianos, visto
que já não tem a cobertura do p oder concentrado ou do paternalism o que pro­
tege seus afilhados. Foi precisam ente isto que aconteceu, apesar do alerta que
surgiu na validação que fizemos. Existe ainda um a im punidade em questões pro­
fissionais que são absorvidas pelo paternalism o existente. Isso se reflete na con­
co rd ân cia de 27% dos entrevistados n a M étodo em relação à existência de
im punidade na em presa, além de que 21% (o m aior índice de indefinição) nem
discordam , nem concordam.

Observa-se, tam bém , que é m uito grande a percepção de que existe um


alto grau de flexibilidade das pessoas na empresa. Esta quase unanim idade deve
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 135

ser vista seja como reflexo na inversão da postura de espectador, seja como di­
m inuição da postura do evitar o conflito, ou ainda como diluição do m odelo au­
toritário de poder. Assim, a m udança qualitativa foi de um clima de aceitação
passiva e de inércia por m elindres às relações pessoais, para um clima de m aior
ebulição criativa, com adaptações às variações do negócio originadas de um pro­
cesso mais aberto e crítico em relação às melhorias a serem im plem entadas.
Algumas vezes, o processo de aum entar a flexibilidade, seja através de res­
postas criativas, seja de respostas adaptativas, é lento. Mas isso pode ser atribuído
tanto à forte cristalização de um m odelo hierarquizado, quanto à inércia pro­
vocada p o r um a negação da realidade, quando se dem ora a aceitar o que os fa­
tos estão a indicar. Os dados revelam que 86% dos pesquisados concordam com
a existência desse traço de flexibilidade, o que dem onstra a capacidade de lidar
com norm as e regras que m udam com regularidade. Devemos observar que esse
foi o nível mais alto de concordância entre todos os traços levantados. É, por­
tanto, um traço de identidade que a M étodo apresenta.

O utro ponto que cham a a atenção é a dim inuição da discrepância entre o


real e o formal, pela eliminação de várias normas, sendo a mais significativa a
inexistência do organogram a. Isso foi suprido p o r um a m aior relação pessoal,
onde todos são inform ados sobre as pessoas que podem resolver os diversos as­
suntos na em presa. A lealdade às pessoas, que era um traço forte na organiza­
ção, ganhou, sob este foco, m aior destaque. Porém, também, o sistema m udou
no sentido de m aior equilíbrio do poder, agora mais distribuído, em que não
é mais possível a decisão absolutista. Assim, perm anece a lealdade às pessoas,
mas estas estão orientadas p o r um a necessidade m aior de um grupo ou da em­
presa.
136 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

A lealdade às pessoas tornou-se o segundo traço onde ocorreu um a m aior


convergência de opiniões, com 66% de concordância em relação a sua existên­
cia, na M étodo. Nesse sentido, pode-se considerá-lo como o outro ponto de for­
te identidade da empresa.

F ig u ra 4.16 Lealdade às pessoas.

Por último, o controle das incertezas que tinha o viés de ser feito via for­
malismo passou a dividir espaço com a tecnologia, que está sendo buscada in­
te rn a c io n a lm e n te e im p le m e n ta d a com a p a rticip a ção dos envolvidos. O
aum ento do clima de confiança entre as pessoas parece ser tam bém um dos ele­
m entos que vem iyudando no controle das incertezas.
A percepção de 57% dos entrevistados é a de que se procura agir no sen­
tido de controlar as incertezas. No entanto, é preciso destacar que existe ainda
um grande contingente, em torno de 21%, que ainda não tem um a sinalização
clara em relação a esse ponto, o que daria margem, no futuro, a poder se po­
sicionar com aqueles que discordam ou com aqueles que concordam com a exis­
tência do controle das incertezas.
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 137

Percebemos que a M étodo utiliza e increm enta de m aneira m uito positiva


algumas características da cultura brasileira, como a flexibilidade, tanto no que
se refere à criatividade quanto à adaptabilidade, e cultiva as relações pessoais,
que ajudam a criar um clima mais am eno e confortável entre as pessoas, con­
tribuindo para m aior aderência à organização. Estas características, de m aneira
bastante apropriada, são também utilizadas de form a a minim izar outros traços
de nossa cultura, com o as relações de p o d er hierarquizadas e autoritárias. Esta
nos parece ser um a form a m uito inteligente de maximizar os benefícios de um a
ação natural daqueles que estão inseridos na cultura brasileira.
Podem os ainda incorporar alguns outros pontos em termos do m om ento
atual da em presa. E que ela claram ente vive, através de seu corpo social, um mo­
m ento controvertido, quando se trata de valorizar mais ou m enos os aspectos
formais, com o o da descrição de cargos, das responsabilidades dos chefes ou das
funções em geral. Parece estar ainda bastante forte essa necessidade, talvez
com o um a m aneira de controlar incertezas e de dar m aior segurança em relação
ao futuro.
Como essa não é definitivamente um a postura nem um a linha que esteja
sendo reforçada pela direção, existe aqui um a área de dissintonia que m erece
ser trabalhada. A idéia de que o im portante são os objetivos claros e entendidos,
com o o po n to de orientação ou a premissa de que quanto m enos definidas as
funções pode-se esperar mais resultados, não tem suporte maciço no atual está­
gio da cultura organizacional da M étodo.
Típico de um a fase de transição, existe um a am bigüidade entre as vanta­
gens e desvantagens de se ter dois chefes. Mesmo incentivando a diversidade de
opiniões en tre os líderes, conform e é o desejo dos acionistas, é difícil, para a
m aioria das pessoas, estarem em um a estrutura não definida p o r um único che­
fe. O corpo social m ostra haver consciência das dificuldades que o m odelo de
138 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

dois chefes traz tanto em relação a dois reports, como em relação à possibilidade
real de haver um a divisão inform al das tarefas, o que pode gerar orientações es­
tratégicas diferentes.
Ao mesmo tem po, há um a forte unanim idade em relação ao perfil do ge­
rente. E m uito bem visto e aceito o gerente que exerce um papel político, que
tenha as características de um negociador e tenha respostas precisas para seus
subordinados. Este últim o item revela um a postura que o saber ainda está com
o chefe, reforçando o po d er hierárquico.
Por últim o, o p o d er ainda exerce um a modvação fundam ental para o exer­
cício gerencial. C oncretam ente, isto apareceu com a redução de níveis, tendo
estim ulado em várias pessoas a vontade de se tornarem supervisores, mesm o sem
maiores vantagens salariais, mas pelo forte im pacto que tem o status interno e
externo.
A fase atual tem revelado m udanças qualitativas em relação ao início do
projeto e seus resultados principais se revelam em sua plenitude, em termos do
objetivo de sobrevivência. E possível verificar ganhos substanciais em termos do
seu corpo social, no qual os valores são diferenciados e positivos para a grande
m aioria deles; a coesão é forte em torno do novo projeto, a qualidade de vida
é diferenciada e o clima de cooperação interna predom ina sobre o de com pe­
tição. As distâncias hierárquicas têm dim inuído e contribuído para um a m aior
aproxim ação em term os de igualdade de poder, de rem uneração, de respeito à
liberdade de expressão, de reconhecim ento à inteligência dos m enos favoreci­
dos socialmente. Enfim, o grau de socialização é grande, várias vezes m aior do
que o das outras empresas do setor e o das empresas brasileiras em geral. As ba­
ses para o enfrentam ento da concorrência estão se form ando solidamente.
A participação no m ercado ainda não é o suficiente para garantir um a so­
brevivência tranqüila, mas a imagem da M étodo vem sendo cada vez mais reco­
n h ecid a e identificada p o r sua nova postura de trabalho. Para viabilizar este
processo, m uita energia foi canalizada para dentro da organização. Será neces­
sário agora um foco mais voltado para o mercado.
Em bora exista um gap entre a imagem externa e as práticas cotídianas in­
ternas, assim como h á ritmos diferenciados entre as áreas no processo de m u­
dança, percebe-se claram ente o n orte dado pelos acionistas. Eles acreditam "que
mesmo que não saibam dizer se am anhã estará mais frio ou mais quente afir­
m am que agora, com certeza, em dezem bro estará mais quente que hoje, 2 de
ju lh o ”.
Se as m udanças qualitativas são visíveis, as m udanças quantitativas ainda
não têm indicadores expressivos e conclusivos. Não foi possível ainda aferir com
precisão os ganhos de produtividade. E nesse sentido que algumas ações deve­
rão ser retom adas e reforçadas, buscando explicitar os indicadores de gestão e
de desem penho p o r obra, divisão e em presa. E preciso evoluir no desenvolvi-
MUDANÇA DA CULTURA ORGANIZACIONAL 139

•ossibilidade m ento dos sistemas, pois em um am biente onde a cultura e a estrutura são mais
entações es- descentralizados, os sistemas desem penham um papel fundam ental na viabiliza­
ção da estratégia em presarial definida.
>erfil do ge-
■olftico, que
is para seus 4.6 CONCLUSÃO
ia está com
É pouco realista dizer que um estágio de m udança se concluiu, porque da
nova situação provocada novas questões irão surgir. A solução de velhos proble­
jara o exer-
mas provocará novos problemas, obviamente em estágios mais avançados e, m ui­
íveis, tendo
tas vezes, com o antes, ain d a não experim entados. O que nos parece é que
mesmo sem
percorridos seis anos, a M étodo Engenharia tem as bases de sua m udança cul­
s interno e
tural im plantadas, porque seu sistema as reflete. A estrutura divisionalizada con­
tribui para esse movimento e cria um novo desafio que é a consolidação dessa
d início do cultura em cada unidade. Tudo isso sem p erd er de vista o foco principal de todo
termos do este movimento: o seu m ercado. Estar sem pre competitivo, p ara satisfação de
termos do seus clientes, colaboradores, acionistas, fornecedores e a sua com unidade.
a a grande U m a últim a palavra. Estar competitivo tem um agente de transform ação
de de vida fundam ental: os executivos da M étodo Engenharia. Eles não são só aqueles ge­
de compe- rentes formalizados em cargos de com ando. São também operários que, p o r sua
ím a m aior p ró p ria iniciativa, provocam m udanças nos m étodos de trabalho ou nas norm as
respeito à administrativas. E esse conjunto que dá à em presa um a identidade diferente e
>s favoreci- que pode ser a sua grande vantagem competitiva absolutam ente diferenciada e
i m aior do não imitável.
?ral. As ba-
m ente.
ir um a so­
mais reco-
lilizar este
erá neces-

dianas in-
50 de mu-
itam "que
íente afir-
íoje, 2 de

vas ainda
ferir com
:ões deve-
: gestão e
esenvolvi-
5
RECRIAÇÃO DO ESTILO BRASILEIRO
DE ADMINISTRAR

Depois de percorridos os m eandros da cultura brasileira e de procurar des­


vendar os processos de gestão autênticos da realidade administrativa em culturas
diversas e de aprofundar em um caso de sucesso de m udança da cultura orga­
nizacional, é o m om ento de tercermos algumas considerações finais sobre o es­
tilo brasileiro de administrar.
Afinal, podem os concluir p o r um estilo próprio de administrar?
A resposta é sim. Fica patente que também temos nossa m aneira de fazer
adm inistração de negócios. E que tem reconhecim ento em nível internacional.
Sem dúvida sabemos lidar com flexibilidade, utilizando-nos de nossa criatividade
e adaptabilidade. Muito m elhor que empresários e operários em outros países.
Isso nos garante um estilo m uito adequado para a época de m udanças contínuas
e rápidas que vem caracterizando os novos tempos. Arriscamos dizer que só não
somos mais reconhecidos internacionalm ente pelo motivo que não criamos, ain­
da, um nível de competitividade internacional. Estivemos fechados para o am­
biente externo. Q uanto mais nos expusermos ao am biente internacional, mais
oportunidades terem os de explorar nossa capacidade de flexibilidade. Se temos
diferenças significativas em termos de competitividade, temos capacidade de di­
m inuir esses gaps em um a velocidade que poucos teriam. A daptando ou criando
situações novas, a gestão brasileira pode surpreender o m undo dos negócios. Es­
tamos som ente no início desse processo de exposição internacional e um longo
cam inho ainda deverá ser percorrido.
O outro aspecto que nos distingue é a facilidade natural que temos de im­
p lem en tar um clima de alegria em nossas relações, buscando a aproxim ação
pessoal, mais do que a institucional. O general De Gaulle tinha razão. Não so­
mos um país sério, apenas alegre, com a capacidade de encontrar, mesmo no
142 O ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR

am b ien te de crise, m om entos que com portam a descontração e que nos dão a
certeza de q u e é possível conciliar objetividade com em otividade. Devem os ala­
vancar de todas as form as, p a ra d e n tro da em presa e m esm o p a ra fora de nossa
c a p ac id ad e de e stab elecer relações pessoais e através dela p ra tic a r a leald ad e
pessoal. A leald ad e pessoal deve ser rec o n h e c id a e ex p lo rad a n ão só p elo seu
lado positivo e objetivo de agilizar inform ações, de consolidar alianças, com o
tam b ém p elo seu lad o em ocional de h u m an izar as relações in te rn a s /e x te rn a s
nas em presas.
E n q u a n to outros países vêm buscando, com o fórm ula atualizada de suces­
so, o envolvim ento e c o m p ro m etim en to au têntico das pessoas em to rn o dos ob­
jetiv o s das em p resas com o m eio d e o b te r m elh o res resultados, os brasileiros
p a recem ter um predisposição natu ral p ara esse co m p ro m etim en to autêntico.

Se fizerm os prevalecer estes nossos traços naturais, flexibilidade e lealdade,


sobre outros traços atu alm en te m ais valorizados, com o o paternalism o e o for­
m alism o, estarem os re p e tin d o em nível adm inistrativo um a fó rm u la q u e re p e ­
tidas vezes tem tido sucesso in tern acio n al n o cam po do esporte, da m úsica e de
nosso carnaval.

Q ual seria u m a trajetória de evolução em relação a alguns traços culturais?

N ão resta dúvida que é preciso a u m e n ta r nossa po stu ra de arriscar. E p a ra


isso é preciso que a au to rid ad e central, c o n c en tra d o ra do p o d e r, prom ova um
o u tro tip o de re la c io n a m e n to . Sair o m áxim o possível do p a te rn alism o p a ra
tran sfo rm ar a relação de d e p e n d ên c ia n ão n a in d e p e n d ê n c ia total, m as n a in ­
te rd e p e n d ê n c ia e n tre líderes e liderados. Esse é um p o n to de g ran d e resistên­
cia, m as m ais u m a vez é preciso que os líderes deixem de infantilizar os lide­
rados e acreditem n a capacidade deles de se adap tarem e serem criativos nessa
nova situação de m aior risco.

P or sua vez, os liderados devem sair da po stu ra de transferência de resp o n ­


sabilidades p a ra cim a e assum ir um papel mais ativo d e n tro de seu g ru p o de re ­
lações. A capacidade de arriscar está vinculada ao tipo de processo decisório e
de lid eran ça exercido, e n q u a n to a capacidade de adaptação e im p lem en tação
está relacio n ad a aos processos de m u d an ç a e de m otivação. N o processo deci­
sório e de lid eran ça é preciso que a au to rid ad e central estim ule o risco co m p ar­
tilhado e sua co n trap artid a, que é o rec o n h e c im e n to com partilhado. Para isso
é preciso que se d im in u a o traço de paternalism o e de d e p e n d ê n c ia e n tre líd e­
res e liderados, de m o d o que o processo decisório possa ser m ais qualificado.

E preciso estim ular m ais o sonho. E nisto tam bém somos especialistas. Nos­
sos projetos m egalóm anos ficaram adorm ecidos. O so n h o de Brasília tornou-se
exeqüível, o so n h o do carnaval é recriado a cada a n o com m uito sucesso. Em
síntese, p odem os lib erar nossa capacidade e m p re e n d e d o ra su p o rtad a pela cria­
tividade.
RECRIAÇÃO DO ESTILO BRASILEIRO DE ADMINISTRAR 143

N o processo de m u d an ç a e de m otivação, o essencial é o c o m p ro m etim e n ­


to, au tên tico , em que a peça-chave deve ser a lealdade às pessoas, crian d o em
to rn o delas a coesão social. Os sistemas mais institucionalizados são necessários,
m as n ão são suficientes n o caso brasileiro. Os sistemas p o d em até existir, m as
se n ão ho u v er disciplina, serão de p o u ca utilidade. E a disciplina só existirá se
ho u v er forte coesão social.
A lid eran ça deve avançar p ara um a m aior o rientação do processo ao seus
liderados, n u m a a titu d e educativa, que será bem -vinda e d e fo rm a a fazer seu
g ru p o crescer em term os de participação. O form alism o deve existir, mas p ro ­
c u ra n d o a p ro x im ar o real do form al. D im inuir essa distância a p a rtir d a p arti­
c ip a ç ã o dos lid e ra d o s n o s p ro cesso s tra n s fo rm a d o re s se rá b a s ta n te sa lu ta r.
A proxim ar líderes de liderados e as relações institucionais das inform ais são os
dois g randes m ovim entos, previstos a p a rtir do sistem a de ação cultural.
Esse é o processo possível que, a p a rtir de nossos traços culturais, segura­
m en te, revigora o estilo brasileiro de adm inistrar. Basta m irarm os n o exem plo
vindo d a á re a m usical, através de C aetano Veloso: “Form al e inform al, sério e
b em -h u m o rad o , exigente, refinado, in tern acio n al e nacional, Jo ã o G ilberto sur­
ge com o o exem plo acabado de u m a síntese que p ro jeta n o h o rizo n te a im agem
de u m país fo rte e v itorioso.” C o n tin u a C aetan o Veloso: “A cho q u e o Brasil
p o d e se utilizar de u m a capacidade m ínim a que tem p a ra a cidadania p a ra im ­
p o r seu estilo p ró p rio . Mas q u a n d o Jo rg e A m ado diz que o fim do ‘j e itin h o ’ não
seria bom , e u co ncordo. Eu acho que o Brasil presta com o é. O Brasil é in te­
ressante p o rq u e é e le.”
Assim, finalizam os essa tentativa de to rn a r descritível u m a form a p ró p ria de
a d m in istra r e, re c o n h e c e n d o , tam bém , a necessidade de evoluir, apoiando-se
com m aio r in ten sid ad e naqueles p o ntos que p o d em nos d a r m aior im pulso e di­
ferenciação dian te do resto do m u n d o . C om o o processo tem sua p ró p ria d in â­
m ica, p rin c ip alm e n te em nível em presarial, a nossa contribuição n ã o q u e r ser
absoluta, prescritiva e totalitária. Ao contrário, é relativa, orientativa e adaptati-
va.
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YOSHIMOTO, Tsikara. Qualidade, produtividade e cultura: o que podemos aprender com
os japoneses. São Paulo : Saraiva, 1992.
/ cole aqui
dobre aqui /

SIM. Tenho interesse em fazer parte do banco de dados seletivo da Atlas para receber
informações sobre lançamentos nas áreas de meu interesse.
rama
□ Fem.
Nome:____ ______________________________________________________ Sexo: D Masc.
Empresa:_______________________________ Cargo/Função:__
A lié ­
End. C om .:__________________________________________________________________
nâtes.
CEP:___________ -_______Cidade:________________________________ Est.
End. R e s .:_____________________________________________________
CEP: - Cidade: Est.

Utilizarpara remessa □ End. Comercial - Tel.: ( ______ ) .


com
F“ (_____ ).
D End. Residencial - Tel.: ( ______ ) _

Assinale sua(s) Área(s) de Interesse:


CD 01.50 Estratégia Empresarial O 05.52 Direito do Trabalho
D 01.51 Recursos Humanos D 05.53 Direito Tributário/Fiscal
D 01.52 Marketing D 05.54 Direito Comercial
□ 01.54 Produção/Materiais □ 06.50 Matemática/Estatistica/P.O.
□ 03.50 Contabilidade/Finanças □ 07.00 Ciências Humanas
□ 04.50 Economia □ 13.50 Informática
□ 05.51 Direito Civil/Processual

INFORMAÇOES COMPLEMENTARES

a) Hábito de compra
Costumo comprar livros através de:
□ livrarias □ mala direta
O feiras e congressos □ outro canal: .

b) Freqüência de compra
Compro anualmente em média:
D 1-2 livros □ 5-6 livros
□ 3-4 livros □ 7 ou mais livros

c) Fatores que influenciam minha compra


(Enumere em ordem de importância)
□ notoriedade do autor □ sugestão de amigo(s)
D nome da editora D atualidade do assunto
) □ preço D interesse pelo assunto
D capa e apresentação física □ outro:...............

d) Autorizo utilizar meu número de FAX para transmitir informações sobre novos lança­
mentos
G sim D não
ISR-40-2373/83
U.P. AC. Central
DR/São Paulo

CARTA - RESPOSTA
N ão é necessário selar
O selo será pago por:

eeDdKüfd] n tln s jm
05999-999 - SÃO PA ULO - SP

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