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IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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informações contidas nesta publicação.
Sumário

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 4

1.1. Glossário ..................................................................................................................................................... 5

2. PARA COMEÇAR: ONDE ESTÁ A DESIGUALDADE E QUAL A RELAÇÃO ENTRE GÊNERO


E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................................................................. 7

2.1. Mulheres e homens: distintos papéis, diferentes realidades ........................................................................ 7


2.1.1. Desigualdade no âmbito da unidade familiar ............................................................................................. 12
2.1.2. Desigualdade no mercado de trabalho ....................................................................................................... 20
2.1.3. Desigualdade nos espaços de poder e decisão ........................................................................................... 31
2.1.4. Desigualdade nas ciências e tecnologias .................................................................................................... 38

2.2. Qual a relação entre igualdade de gênero e desenvolvimento sustentável? ............................................... 44


2.2.1. Como as mulheres são afetadas por problemas sociais, econômicos e ambientais .................................. 51

2.3. O que a sociedade perde com a desigualdade de gênero e o que ganha com a igualdade? .......................... 67

3. EM BUSCA DE UMA MUDANÇA DE PARADIGMA .................................................................... 77

3.1. A luta dos movimentos sociais e feministas ............................................................................................... 77

3.2. Empoderamento da mulher e o papel do homem ...................................................................................... 94

3.3. Valores femininos para um mundo mais sustentável ............................................................................... 101

4. TRANSVERSALIZAÇÃO DA TEMÁTICA DE GÊNERO ............................................................ 111

4.1. Transversalidade de gênero nas políticas públicas.................................................................................... 111

4.2. A política de gênero no Brasil .................................................................................................................. 116

4.3. A importância da transversalização das políticas ...................................................................................... 124

4.4. De que forma o gestor público pode efetuar a internalização das questões de gêneros na elaboração de
políticas, programas e projetos ............................................................................................................................ 128

4.5. Exemplos concretos de políticas que contemplem a variável de gênero ................................................... 136

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................... 144


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 4

1. INTRODUÇÃO

Este material contém os assuntos tratados no curso Igualdade de gênero e


desenvolvimento sustentável e pode ser utilizado como material de consulta e
complemento.

Este curso foi desenvolvido devido ao fato de os gestores públicos não estarem
sensibilizados quanto à temática do gênero, não conseguirem perceber a relação entre
desigualdade de gênero e problemas ambientais, econômicos e sociais, e, portanto,
não elaborarem as políticas públicas inserindo a variável de gênero. A expectativa
para este curso é, então, que esses gestores sejam sensibilizados e capacitados para
lidar com essas questões.

Segundo o MMA, é interessante desenvolver este curso:

Porque a temática de gênero é transversal e aqueles que não atuam diretamente


com esse assunto desconhecem sua importância e como inseri-lo no seu cotidiano.
Conhecendo e internalizando a problemática de gênero nas suas instituições, os
gestores podem contribuir para o combate à desigualdade, que afeta o
desenvolvimento.

Objetivo:

O objetivo geral deste curso é sensibilizar e capacitar os gestores públicos de


todas as áreas sobre a problemática da desigualdade de gênero e a importância da
transversalização dos temas “gênero” e “desenvolvimento sustentável”.

Já os objetivos específicos deste curso são:

 Fornecer informações sobre a temática, de modo a reduzir o


desconhecimento.

 Sensibilizar os gestores quanto à temática, de forma a reduzir o


desinteresse (e até o preconceito).

 Capacitar os gestores para que eles sejam aptos a elaborar políticas com
um olhar mais voltado para a questão de gênero.

O público-alvo:

O público-alvo deste curso constitui-se por gestores públicos de todas as áreas,


federais, estaduais e/ou municipais com nível educacional superior, de ambos os
sexos e de todas as faixas etárias.
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O público-alvo deve:

 Conhecer os impactos negativos da desigualdade de gênero.

 Entender a relação entre igualdade de gênero e desenvolvimento


sustentável.

 Identificar a importância de se trabalhar pela igualdade de gênero.

 Aprender como elaborar políticas públicas transversais nesses temas.

1.1. GLOSSÁRIO

Neste material existem alguns termos técnicos bastante específicos aos temas
tratados. Pensando nisso, apresentamos um breve glossário contendo esses
conceitos. Em caso de dúvidas, retorne ao glossário e consulte o termo desconhecido:

 CNDM: Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.


 CNPM: Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres.
 Conhecimento tradicional: consiste na informação ou prática individual ou
coletiva de comunidade indígena ou de comunidade local, com valor real ou
potencial, associada ao patrimônio genético.
 Desenvolvimento sustentável: aquele capaz de suprir as necessidades da
geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das
futuras gerações.
 Empoderamento: tradução não dicionarizada do termo inglês empowerment,
denota o processo pelo qual as mulheres ganham poder interior para expressar e
defender seus direitos, ampliar sua autoconfiança, identidade própria e autoestima
e, sobretudo, exercer controle sobre suas relações pessoas e sociais.
 Equidade: disposição para se reconhecer imparcialmente o direito de cada um;
equivalência ou igualdade. Característica de algo ou alguém que revela senso de
justiça, imparcialidade, isenção, neutralidade etc.
 Família monoparental: é a definida na Constituição da República Federativa do
Brasil, artigo 226, parágrafo quarto, como sendo "a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes". As famílias formadas por um dos pais e
seus descendentes organizam-se tanto pela vontade de assumir a paternidade ou
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a maternidade sem a participação do outro genitor, quanto por circunstâncias


alheias à vontade humana, entre as quais a morte e o abandono.
 Família reconstituída: é composta por um casal, no qual um dos membros, ou
ambos, tem filhos do casamento anterior.
 Gênero: construção cultural das características masculinas e femininas.
 Heteronormatividade: padrão de sexualidade que regula o modo como as
sociedades ocidentais estão organizadas, significado que exerce o poder de
ratificar, na cultura, a compreensão de que a norma e o normal são as relações
existentes entre pessoas de sexos diferentes.
 Hiato: no sentido figurado, um hiato representa uma falha, uma lacuna.
 Insumo: Cada um dos elementos (matéria-prima, equipamentos, capital, horas de
trabalho etc.) necessários para produzir mercadorias ou serviços.
 Intergovernalidade: pacto federativo (acordo firmado entra a união e os estados
federados. Este acordo estabelece as funções, direitos e deveres da união e dos
estados).
 Intersetorialidade: inclusão da sociedade civil organizada, por meio da
participação social.
 Intragovernabilidade: órgãos setoriais e centrais do Governo federal
 Laicidade: ideologia, doutrina ou sistema que se baseia no preceito básico de que
o poder político e/ou administrativo, geralmente de um país, deva ser exercido pelo
Estado e não por igrejas ou ideais religiosos.
 Morbidade: Número que se refere aos doentes atingidos por determinada doença;
incidência de uma doença.
 OCDE: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
 ODM: Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
 Paradigma: que pode ser utilizado como padrão (a ser seguido); modelo, exemplo.
 PEA: População Economicamente Ativa.
 PNPM: Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.
 Relações patriarcais: fazem com que a família seja compreendida como um todo
homogêneo e o homem visto como representante dos interesses do conjunto e
detentor do poder de decisão.
 Somatização: Sensação de dores e sintomas físicos provenientes de distúrbios
psíquicos.
 SPM: Secretaria de Políticas para Mulheres.
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 Transversalidade da política de gênero: consiste na reorganização de todas as


políticas públicas dos governos, a fim de incorporar o recorte de gênero para além
da instituição responsável pela coordenação de políticas para as mulheres.

2. PARA COMEÇAR: ONDE E STÁ A DESIGUALDADE


E QUAL A RELAÇÃO ENT RE GÊNERO E
DESENVOLVIMENTO SUST ENTÁVEL

2.1. MULHERES E HOMENS: DISTINTOS PAPÉIS, DIFERENTES

REALIDADES

 Gênero e sexo são a mesma coisa? A diferença de sexo torna homens e


mulheres desiguais?

 As diferenças de gênero são naturais (definidas pela biologia) ou culturais


(construídas socialmente)?

 Pense nas mulheres que você conhece (mãe, esposa, filha, colega de trabalho
etc.), você consegue perceber se existem diferenças entre elas e os homens, no
que tange a liberdade, direitos e oportunidades?

O primeiro passo para que você compreenda e interiorize o conceito de


Igualdade de Gênero consiste desde logo em efetuar uma distinção entre Sexo e
Gênero.

Sexo: Diferenças biológicas e fisiológicas entre homens e mulheres.


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 8

Gênero: Construção cultural das características masculinas e femininas.

O conceito de Sexo pertence ao domínio da biologia e traduz o conjunto de


características biológicas e fisiológicas que distinguem os homens e as mulheres.

Por oposição, o conceito de Gênero é um conceito social que remete às


diferenças existentes entre homens e mulheres, diferenças essas não de caráter
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biológico, mas resultantes do processo de socialização. O conceito de gênero


descreve assim o conjunto de qualidades e de comportamentos que as sociedades
esperam dos homens e das mulheres, formando a sua identidade social.

Uma vez que a abordagem utilizada neste curso se prende ao conceito social, e
mais concretamente com as relações que se estabelecem entre os homens e as
mulheres, sobre as quais se pretende efetivar a mudança, convém clarificar que essas
relações de gênero se têm caracterizado por:

 Serem diferentes de cultura para cultura, de religião para religião, ou de uma


sociedade para outra;

 Serem influenciadas por diferentes fatores, tais como: a etnia, a classe social, a
condição e a situação das mulheres;

 Evoluírem no tempo;

 Serem dinâmicas e estarem no centro das relações sociais;

 Distinguirem-se pela sua desigualdade, havendo uma hierarquização dos


gêneros, na qual os homens têm um lugar privilegiado em relação às mulheres.
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Pronto, agora que você já identificou a diferença entre sexo e gênero, pode estar
se perguntando: Mas qual é importância de se falar nisso atualmente? Por que é
importante discutir a igualdade de gênero?

Primeiro, deve-se considerar que a igualdade entre mulheres e homens, ou


igualdade de gênero, significa igualdade de direitos e liberdades para a igualdade de
oportunidades de participação, reconhecimento e valorização de mulheres e de
homens, em todos os domínios da sociedade, político, econômico, laboral, pessoal e
familiar.

Desde a segunda metade do século XX assistiu-se a um conjunto de importantes


transformações nas sociedades industrializadas. Essas transformações tiveram
repercussões em diversos níveis, afetando o comportamento de homens e mulheres
nas esferas profissional e familiar.

Assim, cada vez mais se observam transformações profundas no “modelo


familiar”, tradicionalmente baseado em uma construção social de papéis de gênero em
função do sexo, conduzindo a uma concepção do masculino e do feminino
diferenciada e hierarquizada em termos de importância, segundo a qual se atribuíam
ao homem papéis e responsabilidades no domínio público, de sustento, e de
orientação para resultados, de competitividade e força, e à mulher papéis no domínio
privado, de cuidado da casa e da família, com base em características mais
emocionais e relacionais.
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De fato, a esse conceito de “modelo familiar” comumente aceito, foram


acrescentadas novas variáveis e realidades, fruto das várias modificações nas
estruturas familiares, que nos permitem hoje em dia reconhecer a existência não de
um, mas de vários “modelos familiares”, (famílias monoparentais, famílias
reconstruídas, famílias clássicas de dupla profissão) em que a tônica dominante passa
pelo fato de ambos os elementos do casal terem uma atitude ativa face ao trabalho,
passando as mulheres a assumirem uma postura mais participativa na esfera pública.

Ora esses novos “modelos familiares” implicam necessariamente um ajustamento


na organização da vida familiar e, sobretudo, nas relações sociais de gênero, questão
que nos remete para a importância da inclusão do princípio da igualdade de gênero
em todas as esferas da sociedade.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 12

Falar em igualdade de gênero atualmente torna-se, assim, fundamental, ainda


mais se nos detivermos no aspecto de que a crescente participação das mulheres no
mercado de trabalho não foi acompanhada por um crescimento correspondente da
participação dos homens na vida familiar.

Um dos motivos pelos quais a desigualdade de gênero é tão gritante na nossa


civilização, deve-se às relações patriarcais que fazem com que a família seja
compreendida como um todo homogêneo e o homem visto como representante dos
interesses do conjunto e detentor do poder de decisão.

2.1.1. Desigualdade no âmbito da unidade familiar

 Gestar, cuidar dos/as filhos/as e da casa fazem parte do destino biológico


das mulheres?

 Se todos usufruem do bem-estar e conforto do lar, por que é


responsabilidade apenas da mulher cuidar desse ambiente?

 Como é a rotina da sua família? Os homens ajudam nas tarefas


domésticas e nos cuidados com os filhos após o trabalho?

 Quais indicadores podem contribuir para que o questionamento à divisão


sexual do trabalho doméstico saia do âmbito privado?
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 13

As relações patriarcais existentes na família se ancoram e são constitutivas de


uma visão da economia e do trabalho restritos ao âmbito de mercado.

Essa visão se apoia no discurso em que as mulheres são destinadas à esfera


privada, como parte de um destino biológico vinculado à maternidade e reforça o não
reconhecimento da produção doméstica e do papel econômico do trabalho das
mulheres na família.

Para as mulheres a realização desses trabalhos coloca-se como parte de sua


identidade primária, uma vez que a maternidade é considerada seu lugar principal.
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Essa identidade é introjetada de forma profunda pelas mulheres e sua vivência


está marcada pela avaliação das funções maternas e valores associados: a docilidade,
fragilidade, compreensão, cuidado, afeto. Na verdade esse discurso da boa mãe é
uma construção ideológica para que as mulheres continuem fazendo o trabalho
doméstico.

Essa realidade que é apresentada como fruto da natureza, na verdade é


estruturada por uma relação social específica entre homens e mulheres, que tem como
base material, uma forma de divisão do trabalho, a chamada divisão sexual do
trabalho.

Segundo Daniele Kergoat, a divisão sexual do trabalho se organiza a partir de


dois princípios: da separação (trabalho de homem e trabalho de mulher) e
hierarquização (o trabalho dos homens é mais valorizado). Disso, decorrem práticas
sociais distintas, que atravessam todo o campo social. Ou seja, uma sociedade
sexuada, estruturada transversalmente pelas relações de gênero.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 15

Dentro de casa, quase sempre as mulheres seguem sendo consideradas como


as únicas responsáveis pelas inúmeras tarefas da casa, dos cuidados com as crianças
e da família, enfim responsáveis pelo bem-estar. O trabalho doméstico naturaliza a
divisão do público e do privado e estabelece um lugar para cada um e cada uma na
sociedade.

Economistas e outros cientistas sociais têm avançado na análise do trabalho


reprodutivo e na tentativa de estimar seu valor, uma vez que ele se encontra fora da
esfera produtiva mercantil. Mas para que inicie a difusão do valor intrínseco do
trabalho doméstico é necessário estimar a magnitude deste em termo quantitativo,
assim será possível obter dados suscetíveis de serem comparados com outros
agregados nacionais. Uma análise dos domicílios mostra uma distribuição desigual do
trabalho dentro da família – as mulheres investem mais tempo em atividades não
remuneradas que os homens.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 16

O acesso a esse tipo de informação abre a possibilidade de confrontar o uso do


tempo ao menos em duas dimensões: para a reprodução econômica e para a
reprodução social. O tempo para reprodução econômica envolve aquele destinado ao
trabalho remunerado e o gasto com deslocamento para sua realização. O tempo para
reprodução familiar e social incorpora, basicamente, as atividades de organização
domiciliar, de lazer e de sono. Ambos os tempos são recorrentemente transformados
pelas mudanças econômicas, sociais e culturais.

É importante destacar que a regulação do uso do tempo depende, na sociedade


moderna, da presença das instituições políticas e culturais. Elas regulam sua duração
e fazem a articulação entre os dois tempos. Não há naturalidade na alocação de seu
uso. Portanto, as pessoas realizam a alocação de seu tempo sob constrangimento
social, tendo pouca ou relativa autonomia de decisão sobre esse processo.

Como as mulheres são responsáveis pelo trabalho doméstico, existe um uso do


tempo profundamente desigual entre homens e mulheres. Apesar da tendência de
uma menor jornada de trabalho de caráter econômico exercida pelas mulheres fora de
casa, elas possuem uma jornada total superior à dos homens, uma vez que as
mulheres além de possuírem trabalhos remunerados, também respondem por uma
jornada de trabalho em afazeres domésticos, em média, três vezes superior àquela
realizada pelos homens.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 17

No gráfico abaixo, verifica-se que, no total, as mulheres dedicavam 25,3 horas


semanais aos afazeres domésticos, contra 9,9 horas dos homens. A análise por
grupos etários mostra que o tempo dedicado aos afazeres domésticos cresce à
medida que aumenta a idade para ambos os sexos, demonstrando a dinâmica do ciclo
de vida do grupo familiar. Os/As filhos/as que moram com pais e mães dedicam menos
tempo aos afazeres domésticos por cada sexo, demostrando que na esfera do cuidado
reside o núcleo da desigualdade de gênero.

O trabalho doméstico tem ocupado um lugar central na reflexão de


pesquisadoras feministas (Delphy Kergoat, Hirata, Araújo), pois ele encerra uma das
contradições profundas das sociedades, que remuneram o trabalho realizado na
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 18

esfera pública, mas ignoram atividades voltadas para a manutenção do espaço


doméstico – cruciais para manter a vida individual e coletiva.

Só por meio da análise da relação entre atividades domésticas e atividades


remuneradas é que se pode compreender de forma marcante as desigualdades das
relações de trabalho entre e para as mulheres.

Há dupla concepção para o mesmo trabalho doméstico: a) atividade não


remunerada realizada por donas de casa; b) prestação de serviços nos lares de outras
famílias. A primeira é qualificada como algo voluntário, gratuito, oriundo da dedicação
aos familiares, enquanto a segunda é uma atividade profissional desempenhada por
grande parte das mulheres brasileiras, sobretudo pelas mulheres negras. Como uma
prestação de serviços, o trabalho doméstico remunerado enseja um vínculo de
trabalho, podendo ser formalizado através da carteira assinada e de certos (e
geralmente reduzidos) benefícios. O trabalho das mulheres no âmbito de suas próprias
famílias não é tratado como um produto, uma vez que não se converte em renda
monetária. Há, assim, uma desvalorização do autoconsumo.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 19

De modo geral, o trabalho doméstico (remunerado ou não) não é percebido como


parte da organização do tempo social, sendo concebido como parte das atribuições
femininas, uma extensão de sua natureza destinada a servir. Esta percepção se
contrapõe àquela acerca do tempo despendido em atividades laborais realizadas fora
da esfera da casa, visto como diacrônico e cumulativo. O trabalho doméstico é tratado
como uma categoria à parte dos demais empregos e, em razão de seu estatuto
profissional especial, permanece como uma grande dimensão estruturante das
desigualdades de gênero e raciais no País.

As formas com que as pessoas lidam com os desafios do trabalho e da vida


familiar são marcadas pelas desigualdades de gênero. As desvantagens vivenciadas
pela maioria das mulheres acabam afetando a renda, o compromisso, a estabilidade
nos postos de trabalho e a qualidade de vida de todos os membros da família. A
despeito destas desvantagens, as mulheres estão se inserindo progressivamente nas
atividades produtivas.

Em pesquisa realizada em 2009 por Bruschini e Ricoldi, concluiu-se que as


trabalhadoras mais jovens que são chefes de família e têm filhos/as muito
pequenos/as são as mais sobrecarregadas. As políticas públicas mais adequadas para
este segmento deveriam priorizar as creches e as jornadas de trabalho mais flexíveis
para compatibilizar a atividade profissional e o cuidado familiar; já as trabalhadoras
com mais idade, cujos/as filhos/as são maiores, descrevem um cotidiano menos
pesado. Para ambas existe a preocupação com a violência, o uso de drogas, o lazer e
as atividades físicas. As trabalhadoras anseiam por políticas públicas que garantam
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 20

escola para os/as filhos/as, segurança, transporte e espaços públicos de lazer para a
toda a família.

A conciliação entre vida familiar e atividade laboral constitui um dos maiores


desafios de nosso tempo. Buscar fórmulas de conciliação entre a atividade laboral e as
tarefas de cuidado não é apenas assunto de negociação entre homens e mulheres,
mas também entre o Estado, o mercado e a sociedade em geral.

2.1.2. Desigualdade no mercado de trabalho

 O mercado de trabalho fornece as mesmas oportunidades para homens e para


mulheres?

 O desemprego atinge homens e mulheres de forma distinta?

 Em sua cidade, quais as possibilidades de “bicos” ou trabalhos informais para


homens e mulheres?

 Há uma segregação de gênero para os “bicos” ou trabalhos informais possíveis?


De que forma e por quais motivos?

 Há aqueles e aquelas que rompem esses limites? Como essas pessoas são
vistas?

Grandes transformações sociais ocorridas no Brasil nas últimas décadas, como o


processo de urbanização e o crescimento do setor terciário da economia, bem como a
redução da fecundidade, as mudanças na dinâmica conjugal e familiar e a elevação
dos níveis médios de escolaridade tornaram o sexo feminino uma força de trabalho
indispensável para o desenvolvimento do País.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 21

Alguns estudiosos consideram que o aumento da participação feminina no


mercado de trabalho ocorreu em função da necessidade de uma complementação da
renda familiar por parte das mulheres (cônjuges ou filhas), em uma situação de
redução do rendimento per capita domiciliar. Contudo, esta argumentação não
considera que as mulheres continuam se inserindo no mercado de trabalho nos
momentos de aumento da renda domiciliar e são, principalmente aquelas com maior
nível educacional (e com salários acima do salário mínimo), as que possuem as
maiores taxas de atividade, inclusive as que moram sozinhas.

Embora as mulheres brasileiras predominem nos segmentos mais escolarizados


da PEA (População Economicamente Ativa), os homens seguem em maioria nos
segmentos com melhor remuneração. As mulheres ocupadas predominam nas faixas
de 0 a ½ salário mínimo (SM) e de ½ a 1 salário mínimo, enquanto os homens
ocupados predominam nas faixas acima de um SM. Observe o gráfico a seguir:
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 22

O fato de as mulheres ganharem menos do que os homens, mesmo trabalhando


a mesma quantidade de horas, possuindo as mesmas qualificações e muitas vezes
tendo maiores níveis educacionais, reflete uma persistente desigualdade de gênero.
Várias outras questões estão envolvidas neste tema, tais como a relação entre
trabalho doméstico e trabalho produtivo e a do uso do tempo.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 23

As diferenças de renda, do ponto de vista de gênero, são reforçadas com a


transversalidade das desigualdades no âmbito regional e local de domicílio. Homens e
mulheres de todas as regiões tiveram aumento do rendimento médio entre 2001 e
2007. As mulheres do Nordeste apresentaram os menores rendimentos do País,
sendo R$ 280 em 2001 e de R$ 485 em 2007. Em seguida, aparecem empatados os
homens do Nordeste e as mulheres do Norte. Em um grupo intermediário estão as
mulheres do Sul, do Sudeste e do Centro-Oeste e os homens do Norte.

No topo do gráfico, indicando aqueles com maiores rendimentos, encontram-se


os homens do Sul, do Sudeste e do Centro-Oeste. Nota-se que os maiores ganhos
ocorridos entre 2001 e 2007 ficaram com homens e mulheres do Centro-Oeste,
provavelmente refletindo o peso dos maiores salários do Distrito Federal. Estes dados
mostram como são complexas as interações entre as desigualdades de gênero e as
desigualdades regionais. Se, de modo geral, o sexo feminino ganha menos que o
masculino, as mulheres do Sudeste e do Centro-Oeste, por exemplo, tiveram
rendimentos maiores do que os homens do Norte e do Nordeste do País.

O cenário é ainda mais complexo quando incluímos as desigualdades raciais.


Segundo estudo realizado por Paixão e Carvano em 2006, o rendimento médio mensal
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 24

do trabalho principal, em todo o País, era de R$ 1.016,00 para os homens brancos, R$


586,26 para os homens negros (pretos e pardos), R$ 744,51 para as mulheres
brancas e R$ 388,18 para as negras. Fica evidente que as diferenças de rendimento
por cor/raça variam muito. Embora os dados demonstrem que de 1995 a 2002 estas
desigualdades diminuíram paulatinamente em todo o País, os diferenciais de
rendimento por cor e gênero ainda são muito altos; servem de alerta para que não
percamos de vista a grande desigualdade que as cifras evidenciam e a necessidade
de políticas públicas voltadas para a equidade de gênero e raça.

No Brasil, décadas passadas, o mercado de trabalho era um espaço de


hegemonia masculina. Até a metade do século XX, as mulheres não tinham o
horizonte da carreira profissional ou a participação na vida pública como metas
preponderantes, não tendo participação significativa na população economicamente
ativa. Hoje, a presença das mulheres no mercado de trabalho é expressiva, o que
contribui para desvelar as desigualdades e as discriminações se comparadas aos
homens, seja no espaço público, seja no espaço privado.

O Brasil apresentou um grande crescimento da População Economicamente


Ativa (PEA) nas últimas seis décadas, registrando um aumento de 5,8 vezes. A PEA
masculina passou de 14,6 milhões para 56,1 milhões (incremento de 3,8 vezes),
enquanto a feminina teve uma elevação extraordinária, passando de 2,5 milhões, em
1950, para 43,4 milhões, em 2008 (crescimento de 17,2 vezes).

O gráfico a seguir mostra o comportamento das taxas de atividade para homens


e mulheres, entre 1950 e 2007. Verificam-se a redução das taxas masculinas e o
aumento das femininas no período. A linha do gráfico mostra a tendência de
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 25

decréscimo do hiato de gênero, já que existe um processo de convergência no nível de


inserção de ambos os sexos na população economicamente ativa.

De acordo com a pesquisa feita pela Catho Online em 2011, de forma geral, no
Brasil, as mulheres não chegam a ocupar nem um terço dos cargos de presidentes
nas organizações de todos os portes, com uma presença de 22,91%. A boa notícia é
que a presença delas aumentou, já que era de 15,14% em 2001.
(Fonte: http://www.negocioglobal.com.br/pt/economia/mais-mulheres-ocupando-cargos-de-chefia-nas-
empresas)

Chamamos a atenção para o fato de um contingente expressivo de mulheres


estar representado pelas principais provedoras de suas famílias, em contextos nos
quais os maridos perderam seus postos no mercado formal de trabalho e, ainda assim,
não serem reconhecidas.

É recente na legislação civil o reconhecimento das mulheres como “pessoa de


referência da família”, designação antes reservada somente aos homens, vistos como
“o chefe da família”. Desde que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
incorporou o quesito “pessoa de referência” nos censos, foi possível demonstrar a
crescente participação das mulheres no provimento da família; atualmente esse
percentual é de cerca de 30%.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 26

A População Economicamente Ativa (PEA) feminina tem crescido mais


rapidamente do que a masculina, mas o desemprego de mulheres se mantém mais
elevado do que o de homens desde a década de 1980. A oferta de trabalho feminino
aumenta em ritmo superior ao crescimento da demanda. Entre as explicações para o
maior desemprego feminino, três merecem destaque:

Desemprego feminino: Explicação

Fator 1.

Um dos fatores que contribuem para o desequilíbrio entre oferta e demanda é a


segregação ocupacional, que torna o leque de profissões femininas mais estreito que o
masculino. Assim, ao oferecer mais opções para os homens, o mercado atingiria um
equilíbrio em um nível mais baixo de desemprego masculino, enquanto a disputa pelas
poucas ofertas de emprego feminino torna o desemprego das mulheres um fenômeno
mais frequente;

Fator 2.

A divisão sexual do trabalho, que incumbe preferencialmente as mulheres das


tarefas domésticas e do cuidado com os/as filhos/as e dos/das idosos/as no domicílio,
torna mais difícil compatibilizar o emprego fora do local de residência com os afazeres
domésticos. Enquanto o homem pode optar por um emprego que o afaste a maior
parte do dia (ou da semana) da rotina familiar, a mulher precisa, em geral, conciliar
trabalho e família, e suas opções são mais limitadas;

Fator 3.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 27

As mulheres são comumente mais vulneráveis à falta de segurança pública e no


trabalho. Os padrões culturais sexistas da sociedade dificultam a entrada da mulher
em algumas ocupações consideradas inseguras ou exercidas em horários
incompatíveis com o cuidado familiar, por exemplo, vigia e segurança noturno.

Apesar de as mulheres terem ingressado na força de trabalho em grande número


em quase todo o mundo nos últimos 25 anos, esse aumento da participação não se
transformou em oportunidades iguais de emprego ou em salários iguais para homens
e mulheres.

Homens e mulheres tendem a trabalhar em partes muito diferentes do “espaço


econômico”, com pouca mudança ao longo do tempo, mesmo nos países de alta
renda. Em quase todos os países, as mulheres têm mais probabilidade do que os
homens de participar de atividades de baixa produtividade. Também têm mais
probabilidade de trabalharem no setor de salários informais.

Na agricultura, em geral, as mulheres trabalham em terrenos menores e cultivam


culturas menos remunerativas. Como empresárias, elas tendem a gerenciar empresas
menores e a se concentrarem nos setores menos lucrativos.

E no emprego formal, elas se concentram em ocupações e setores do “sexo


feminino”. Esses padrões de segregação por gênero no mercado de trabalho se
transformaram com o desenvolvimento econômico, mas não desapareceram.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 28

Atualmente se observa um inicio de mudanças no que se refere à posição


econômica das mulheres rurais, embora ainda seja alarmante o número de mulheres
que em nosso País trabalha sem auferir renda, e nesse universo há uma porcentagem
de trabalhadoras domésticas de origem rural, em particular jovens, que trabalha
apenas em troca de casa e/ou comida. O percentual de participação das mulheres nas
atividades para autoconsumo é bastante elevado e corresponde a 46%.

Em relação ao trabalho urbano, quando conseguem empregar-se no mercado de


trabalho, as mulheres concentram-se em espaços bastante diferentes daqueles
ocupados pelos trabalhadores do sexo masculino. As mulheres são, em maior
proporção que os homens, empregadas domésticas, trabalhadoras na produção para o
próprio consumo e não-remuneradas, enquanto os homens encontram-se,
proporcionalmente, mais presentes na condição de empregados (com e sem carteira
assinada), conta-própria e empregador.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 29

E são as mulheres negras as que mais ocupam postos no emprego doméstico


(21,4% contra 12,7% das mulheres brancas) e nas categorias que englobam a
produção para autoconsumo, a construção para o próprio uso e as trabalhadoras não
remuneradas (17% contra 12%).

Sendo assim, o que explica essa segregação persistente por gênero no mercado
de trabalho e os hiatos resultantes em termos de ganhos?

As diferenças de gênero na utilização do tempo, no acesso a bens e crédito, e no


tratamento por parte dos mercados e das instituições formais (incluindo estrutura
jurídica e normativa) desempenham um papel importante na restrição das
oportunidades das mulheres.

O crescimento de renda tem certa influência na mudança desses padrões, mas


não os elimina. As interações mutuamente reforçadoras entre esses diferentes fatores
tornam o problema particularmente de difícil solução.

Um segundo fator que aumenta a segregação no mercado de trabalho e as


disparidades salariais são as diferenças em dotações físicas (incluindo o acesso a
bens e crédito).

Em termos de agricultura e empreendedorismo, grandes e significativos hiatos de


gênero no acesso a insumos (incluindo terra e crédito) e na posse de bens estão na
base do hiato de produtividade de gênero. Na verdade, as diferenças de produção
para agricultores do sexo masculino e feminino desaparecem de uma só vez, quando
o acesso aos insumos de produção é levado em consideração.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 30

Quão grandes são as diferenças de gênero no acesso a bens (principalmente


terra), crédito e outros insumos?

Uma variedade de fontes de dados sugere que são enormes. Dados para 16
países em cinco regiões em desenvolvimento indicam que as famílias chefiadas por
mulheres têm menos probabilidade de possuir e de lavrar terra. Por causa de
problemas como esses relacionados à titularidade da terra, embora as mulheres
respondam por dois terços do trabalho no mundo, elas são donas de apenas 1% dos
bens produzidos no mundo.

Um terceiro motivo para a diferença de gênero no mercado de trabalho é que as


falhas de mercado e as restrições institucionais também desempenham um papel
importante. Os mercados de trabalho, muitas vezes, não funcionam bem para
mulheres, principalmente se sua presença for limitada a alguns setores ou ocupações.
Quando existem poucas mulheres empregadas, os empregadores podem manter
crenças discriminatórias sobre a produtividade ou adequabilidade das mulheres como
trabalhadoras – tais crenças podem persistir se não houver mecanismos
implementados para corrigi-las.

O acesso a informações sobre empregos e o apoio a promoções e avanços na


carreira geralmente ocorrem em redes por gênero, prejudicando as mulheres que
estão tentando ingressar em um campo dominado por homens (ou prejudicando do
mesmo modo os homens que estão tentando ingressar em um campo dominado por
mulheres, como enfermagem). E, às vezes, barreiras legais, concebidas como
medidas de proteção, impedem as mulheres de ingressar em alguns setores ou
ocupações.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 31

Em resumo, quer as mulheres sejam agricultoras, empresárias ou trabalhadoras,


muitas caem em uma armadilha da produtividade: trabalham duro em um campo de
atuação desigual com acesso desigual a insumos de produção. Essa armadilha impõe
custos significativos ao bem-estar das mulheres e às oportunidades econômicas dos
dias atuais, além de sérios desincentivos para investir nas mulheres de amanhã.

O desenvolvimento econômico e social de um país depende do pleno emprego


dos insumos produtivos disponíveis e do crescimento da produtividade dos fatores de
produção. Para haver aumento do excedente social e avanço na disponibilidade per
capita de bens e serviços, são necessários incorporação de progressos tecnológicos,
aumento do nível de informação, inovação do conhecimento e crescimento qualitativo
do capital humano, com o desenvolvimento de uma força de trabalho saudável e mais
escolarizada. A inserção feminina na divisão social do trabalho é um dos elementos-
chave para o desenvolvimento humano com equidade de gênero.

2.1.3. Desigualdade nos espaços de poder e decisão

 Se as mulheres são maioria na população, por que não o são na representação


política?

 As mulheres votam em mulheres? Por quê?


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 32

 As mulheres não gostam de política partidária? Não gostam de ocupar lugares de


poder? Ou há outros motivos? Quais?

 Você acha que as cotas para mulheres nos partidos podem diminuir as
desigualdades de representação?

 Que outras medidas poderiam ser adotadas?

 Você já parou para refletir se faria diferença para a população a presença de


mais mulheres no Governo e no Congresso?

Veja só que contraditório: as mulheres são maioria da população e dos votantes,


mas são minoria no exercício do poder.

Entre 1974 e 2006 o eleitorado brasileiro passou de cerca de 34 milhões para


quase 126 milhões de eleitores. As mulheres, que eram minoria, passaram a ser
maioria entre o universo das pessoas aptas a votar.

Já no início do século XXI, o sexo feminino atingiu a maioria do eleitorado.


Contudo, este poder majoritário do voto não chegou a transformar a representação por
gênero nos diversos níveis da representação parlamentar. As mulheres brasileiras
continuam sub-representadas no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas e
nas Câmaras Municipais.

Durante a maior parte da história do Brasil, as mulheres estiveram distantes da


vida pública e tinham como destino os espaços privados e a convivência familiar. As
mudanças começaram a ocorrer com o Movimento Sufragista, responsável pela
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 33

ampla mobilização para a conquista do direito das mulheres brasileiras de votarem, o


que aconteceu em 1932.

As sufragistas brasileiras capitaneadas pela bióloga Bertha Lutz (1894-1976) e


pela engenheira Carmem Portinho (1903-2001) criaram organizações, polemizaram na
imprensa, escreveram discursos e pelas de teatro. Mesmo sem direito ao voto, para
chamar a atenção da sociedade, criaram o Partido Republicano Feminino. Isso em
1910. Finalmente, em 1932, o Colégio Eleitoral estendeu o voto às mulheres
alfabetizadas. A primeira brasileira eleita foi a médica Carlota Pereira de Queirós
(1892-1982), deputada federal por São Paulo. Foi de sua autoria o projeto para a
criação de serviços sociais no País. Nesses anos, a sociedade brasileira avançou
muita na questão. No Legislativo, a força da deputadas conseguiu vitórias, como a
criminalização do Assédio Sexual e a Lei Maria da Penha – ferramenta para as
mulheres se defenderem da violência sofrida no trabalho e dentro de casa. As
senadoras, apesar de serem apenas 12,3% do total, também fazem barulho.

(Bertha Lutz, em 27 de abril de 1925 / Reprodução)

(Álbum da Família (presente na 4ª capa do livro de Ana Luiza Nobre, Carmen Portinho, o moderno
em construção, 1999)

(Carlota Pereira de Queiroz: primeira deputada eleita no Brasil, em 1934 / Reprodução)


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 34

Os avanços na representação política das mulheres brasileiras têm sido pequeno


e não têm acompanhado os avanços ocorridos no resto do mundo.

O percentual de mulheres no Parlamento no Brasil é menor do que em outras


regiões com nível de desenvolvimento mais baixo.

Na América Latina e no Caribe, o Brasil estava em um dos últimos lugares no


ranking da participação feminina nos Parlamentos. Em 2009, o Brasil só possuía taxas
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 35

de participação maior do que o Haiti e a Colômbia, perdendo para todos os outros


países, em uma lista de 29 Parlamentos.

Será que um Parlamento mais “feminino” não significaria também proposições de


projetos de lei de natureza diferente das que temos hoje?

Um dos motivos que explicam o diferencial de participação feminina no Brasil e


no resto do mundo é a forma como a política de cotas (Lei de Cotas 9504/97, que
institui 30% de cotas para candidatas mulheres) foi adotada no País, que reserva um
número de vagas para as candidaturas femininas, mas não obriga os partidos a
preencherem estas vagas.

Devem se considerar os avanços previstos com as Novas Regras Eleitorais


aprovadas no Congresso Nacional, em setembro de 2009, válidas para as eleições de
2010. Além de garantir uma parcela do tempo de propaganda e um percentual do
fundo partidário para as mulheres, a lei inova no sentido de fazer as cotas funcionarem
como um piso e não como um teto. É provável que o percentual de candidatas fique
acima de 30%, tendendo a elevar o percentual de mulheres eleitas.

Em 2009 foi acatado pela Câmara Federal um substituto que prevê uma reserva
de 5% do fundo partidário para promoção de atividades de incentivo à participação
política feminina, e de 10% do tempo dos partidos no rádio e na TV para as mulheres,
nos anos eleitorais ou não. Anteriormente não existia percentual. Agora, se o partido
não destinar o percentual para esta finalidade, no ano seguinte terá que acrescentar
mais 2,5% do fundo partidário como sanção pelo não cumprimento da lei.

Nas eleições majoritárias do Senado, onde não existem cotas, a primeira


senadora foi eleita em 1990 e o percentual de mulheres passou de 1,2% na legislatura
1991-1999 para 12,4% na de 2007-2015. Para as administrações estaduais, a primeira
governadora foi eleita no País em 1994, sendo que atualmente existem três
governadoras, representando 11,1% do total das Unidades da Federação.

No Poder Judiciário, a representatividade feminina nos Tribunais Superiores é


também extremamente reduzida. Até 1995, nenhuma mulher ocupava cargo nas
instâncias superiores. Em 1998, a participação feminina subiu para 2%; em 2001, para
8,2%; e em 2003, para 9,09%. As mulheres já são maioria entre os/as formados/as
nos cursos de Direito, mas na primeira instância jurisdicional, as mulheres ocupam
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 36

30% dos postos do Supremo Tribunal Federal (STF). Até 2000, nenhuma mulher havia
sido ministra do STF. Apenas em 2001 houve a indicação da ministra Ellen Grace
Northfleet.

Ministra Ellen Grace Northfleet

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), composto por 28 ministro, em 2004 havia


quatro ministras. Já o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem 16 ministros e apenas
uma ministra. É importante assinalar que, na primeira instância, o número de juízas do
trabalho supera o de juízes. Além da baixa participação de mulheres nas altas cortes
de Justiça, a representatividade feminina é nula nos Tribunais Superiores Eleitoral e
Militar.

O Instituto Vox Populi realizou uma pesquisa, com representatividade nacional,


que mostra que o eleitorado não discrimina o sexo feminino, ao contrário, considera as
mulheres mais competentes, sensíveis e honestas ao ocuparem cargos de
responsabilidade pública. Assim, as desigualdades de gênero na política seriam
explicadas não pela rejeição dos eleitores, mas por outros motivos, como:

 A persistência da cultura patriarcal que associa os homens ao espaço público e


as mulheres ao espaço privado;

 O peso do poder econômico no processo eleitoral e o custo crescente das


campanhas favorecendo as candidaturas masculinas;

 O pouco tempo dedicado à ação política pelas mulheres, em grande parte pela
sobrecarga de responsabilidades, pelo acúmulo das tarefas domésticas e com o
cuidado com as/os filhas/os e com os familiares doentes, bem como com os
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 37

cuidados dispensados às pessoas com deficiência e às idosas/os, além dos


dedicados à vida laboral;

 As trajetórias políticas das mulheres, menos consolidadas relativamente às dos


homens.

Para além da presença feminina na política institucional, ou seja, nos cargos e


postos da administração direta e indireta, vale lembrar que são diversas as formas de
participação política, podendo-se destacar alguns mecanismos e instrumentos no
âmbito do Estado, da sociedade organizada e dos partidos políticos.

No caso da participação político-partidária feminina, esta é crescente ao longo


dos anos e uma de suas expressões é o elevado percentual de mulheres no total de
filiadas/filiados. Apesar disso, elas ainda se mantêm como minoria nas direções
partidárias.

Cabe ressaltar que os partidos têm um papel fundamental no sistema político


brasileiro na medida em que possibilitam, com exclusividade, o acesso a cargos e
mandatos eletivos. Por conseguinte, assumem responsabilidades com o
equacionamento dos problemas da realidade brasileira e com a educação política das
cidadãs e cidadãos.

No âmbito da sociedade organizada, destacam-se os movimentos feministas e os


de mulheres em sua ampla diversidade: de mulheres negras, indígenas, lésbicas,
trabalhadoras rurais e domésticas, donas de casa, associações de mães, entre outros.
Estes agrupamentos se sustentam em identidades para além da referência de gênero,
em suas convergências com a condição social, de raça/etnia, de orientação sexual,
entre outras. Outros espaços de participação das mulheres são os movimentos:
ambientalista, negro, de direitos humanos, de lésbicas, gays, bissexuais e
transgêneros (travestis e transexuais), de pessoas com deficiência, de idosas, de
crianças e adolescentes e de jovens.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 38

Os movimentos feministas e de mulheres têm aprofundado suas parcerias e


alianças com estes movimentos sociais, gerando vínculos de solidariedade e
fortalecendo a compreensão de que a construção de uma sociedade justa e humana
passa pela superação de todos os tipos de discriminação e desigualdade. Por fim,
trabalhar para ampliar a participação das mulheres nos espaços de poder e decisão é
trabalhar para consolidar e aperfeiçoar a democracia brasileira.

Para refletir:

 Você acha que depois da eleição, pela primeira vez em nosso País, de uma
mulher como presidente, as mulheres passaram/passarão a ter mais presença
na esfera política?

2.1.4. Desigualdade nas ciências e tecnologias


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 39

 Como se dava e como se dá, atualmente, a distribuição de homens e mulheres


nas áreas de humanas e de exatas?

 Em seu campo de atuação, há maior concentração de mulheres e de homens


em algumas áreas? Como você explica essa concentração?

 Homens e mulheres têm iguais acessos a tecnologias, como a internet?

À primeira vista, pode parecer que as escolhas ou os modos de inserção em


diferentes espaços da sociedade sejam reflexo exclusivo de preferências naturais,
aptidões natas, capacidades e desempenhos distintos entre homens e mulheres. As
assimetrias de gênero são essenciais para a análise da distribuição de homens e
mulheres nos diferentes espaços da sociedade e têm servido também para classificar
as aptidões de homens e mulheres em diferentes áreas científicas.

A física, por exemplo, foi considerada uma disciplina mais apropriada para ser
exercida pelos homens por ser imparcial, mais racional, abstrata, por exigir aptidão
analítica e um trabalho árduo e longo, enquanto as ciências humanas, que se dedicam
ao estudo das pessoas, e mais próximas das preocupações do cotidiano, foram
consideradas mais adequadas às mulheres.

Observa-se que o modo de compreender o que é específico de cada disciplina foi


associado ao que se entende como característica de cada gênero. Isto faz com que as
mulheres estejam pouco representadas na física e em outras ciências ditas “mais
complexas” (o termo é traduzido de hard sciences, da discussão epistemológica norte-
americana e europeia), não porque sejam disciplinas “mais difíceis”, mas pelas
imagens que as associam ao masculino. Também a matemática sempre foi vista como
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 40

incompatível com as mulheres. Geralmente, o prestígio de uma ciência depende de


seu grau de “matematização” e, quanto mais matemática for exigida para um dado
emprego, maior a remuneração e menor a taxa de participação das mulheres.

Esta perspectiva foi diversas vezes legitimada por teorias biológicas da


lateralização cerebral ou da genética. Entretanto, poucos esforços foram feitos para se
estudarem as diferenças de gênero em relação a outras importantes variáveis, tais
como etnia, cultura e classe. Historicamente, portanto, o gênero foi um organizador
silencioso de teorias e práticas científicas, estabelecendo prioridades e determinando
resultados.

A noção das fêmeas como naturalmente subordinadas conformou-se com a


perspectiva política da posição social inferior da mulher. A fala de uma médica no topo
de sua profissão poderia ser estendida a outras áreas:

As mulheres, desde meninas, educadas para cuidar dos outros (filhos, marido,
parentes idosos), acabam por abraçar carreiras tidas como femininas: professoras,
enfermeiras, assistentes sociais, psicólogas, empregadas domésticas etc. Não só é
comum que elas escolham carreiras no campo do ensino ou da prestação de serviços
sociais ou de saúde, como se supõe que tais atividades sejam uma extensão, no
espaço público, das tradicionais atividades que elas já desenvolvem no ambiente
doméstico. Esta escolha é construída pela socialização diferencial de gênero.

O processo de escolarização pode reforçar a associação frequente entre o


gênero feminino e determinadas ocupações. Este vínculo leva a uma desvalorização
social de certas profissões, por elas serem consideradas de menor competência
técnica ou científica. Mesmo entre carreiras de prestígio social, como a medicina, as
especialidades que se feminizaram – a exemplo da pediatria – terminam sendo mais
mal remuneradas se comparadas a outras especialidades cujo contingente masculino
é mais expressivo, como a ortopedia ou a neurologia.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 41

Se incluirmos nesta análise as relações raciais, teremos um quadro ainda mais


agravado, como vimos na lição anterior ao analisarmos os salários médios de
brancos/as e negros/as e entre mulheres brancas e mulheres negras.

As tecnologias e, em particular, as tecnologias de informação e comunicação,


são consideradas como um importante vetor de transformação da vida social,
econômica e política em todo o mundo. Em muitos casos, o aperfeiçoamento contínuo
e aplicação das tecnologias têm contribuído para a criação de novas e significativas
oportunidades econômicas e de emprego, sendo que muitos países em
desenvolvimento estão tirando partido das novas tecnologias para acelerar os seus
processos de desenvolvimento.

Milhões de homens e mulheres sem acesso às novas tecnologias correm o risco


de ficarem excluídos do desenvolvimento. Uma vez que as mulheres representam uma
maioria significativa dentre aqueles que não têm acesso às tecnologias, o fosso
tecnológico adquire uma manifesta dimensão de gênero, apresentando, por
conseguinte, várias vertentes. De fato, este fosso existe entre os países que têm e os
que não têm um fácil acesso às tecnologias avançadas. E, também, em cada país,
entre os diferentes estratos socioeconômicos com ou sem acesso às tecnologias (em
particular nas zonas rurais).

Observam-se, ainda, disparidades entre homens e mulheres a nível nacional e


regional na maioria dos países: praticamente em toda a parte, as mulheres se
deparam com mais obstáculos que os homens no acesso à formação e na utilização
das tecnologias.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 42

A participação das mulheres no ensino superior vem registrando um aumento


contínuo, aproximando-se atualmente dos 50% a nível mundial. Apesar disso, verifica-
se em várias regiões do mundo, um marcado desequilíbrio entre homens e mulheres
nos cursos científicos e tecnológicos (em todos os níveis de ensino) e na mão-de-obra.

Um relatório recente da OCDE (Organização para a Cooperação e


Desenvolvimento Econômico) revela que, na maioria dos países membros desta
organização, menos de um terço dos alunos do secundário que frequentam as aulas
de química, física e biologia avançadas são do sexo feminino. Nos Estados Unidos, as
mulheres representam menos de 15% dos estudantes matriculados em computação
avançada.

Todavia, de acordo com o Instituto de Estatística da UNESCO, na América Latina


e Caribe, 43% dos pesquisadores em ciência e tecnologia são mulheres, uma
porcentagem bastante superior à média mundial de 28%. De acordo com os dados
declarados, esta porcentagem atinge cerca de 50% na maioria dos países da Ásia
Central, 43% na Comunidade de Estados Independentes e cerca de 31% na África.

Porque existem disparidades tão acentuadas entre homens e mulheres em


algumas regiões do mundo e em outras não?
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 43

De acordo com a OCDE, é mais uma questão de incentivos, de distribuição de


papéis em função do sexo e de atitudes do que de competências. As meninas têm
muito menos probabilidades que os meninos de estudarem engenharia, informática ou
física e, ainda que nos países da OCDE mais da metade dos diplomas universitários
seja obtida por mulheres, apenas 30% dos diplomados em ciência e tecnologia são
mulheres. A porcentagem de mulheres diplomadas do ensino superior que enveredam
pela pesquisa é ainda mais reduzida, representando menos de 30% dos
pesquisadores em ciência e tecnologia, na maioria dos países da OCDE, e apenas
12% em países como o Japão e a República da Coreia.

Convém ainda salientar outro elemento: o grau de acesso das mulheres e dos
homens às tecnologias de informação e comunicação. Embora, nos países da OCDE,
as mulheres ocupem mais de 60% dos postos de trabalho relacionados com estas
tecnologias, apenas 10 a 20% são programadoras, engenheiras, analistas ou
designers de sistemas. A grande maioria desempenha tarefas de secretariado,
processamento de texto ou entrada de dados, ou seja, tarefas de rotina que requerem
um baixo nível de competências ou uma formação técnica limitada.

Em 2006, continuavam a ser significativas as disparidades na utilização da


Internet entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento, embora se registre
um ritmo de desenvolvimento acelerado em algumas regiões do mundo.

De um modo geral, o utilizador típico da Internet é do sexo masculino, titular de


um diploma do ensino superior e aufere rendimentos superiores à média.

Observa-se, no entanto, uma evolução positiva. De fato, em várias regiões do


mundo, as disparidades entre os sexos são bem mais reduzidas e até inexistentes
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 44

entre os jovens, o que se deve à crescente disponibilização de computadores, nas


escolas e outros locais de ensino e formação.

Na Cúpula Mundial para a Sociedade de Informação (WSIS), convocada pelas


Nações Unidas em 2005, os líderes mundiais reconheceram o papel-chave da ciência
e tecnologia, incluindo as TIC (Tecnologia da Informação e Comunicação), no âmbito
do debate mais amplo em torno do desenvolvimento. Esta cúpula contribuiu de forma
determinante para a definição de metas visando estabelecer uma sociedade de
informação mais equilibrada, harmoniosa e solidária.

Com os dados apresentados sobre a participação das mulheres na produção de


conhecimento científico, na educação, no mercado de trabalho, na vida política, na
propriedade etc., queremos demonstrar que uma persistente hierarquia de gênero
organiza as relações sociais no espaço público, destinando lugares, postos, posições
de prestígio, funções específicas, direitos e deveres a cada sexo.

A análise aqui iniciada, e que será aprofundada durante todo este curso,
pretende oferecer subsídios para que se abandone a avaliação ingênua de que a
participação de homens e mulheres na vida pública seja aleatória, fruto de desejos
pessoais ou resultante de aptidões ou habilidades naturais a cada sexo. Somos
socialmente educados e educadas para nos interessarmos mais ou menos por política,
economia, leis, quer sejamos homens ou mulheres. A via de acesso à cidadania passa
por lutas e conquistas normativas e jurídicas.

2.2. QUAL A RELAÇÃO ENTRE IGUALDADE DE GÊNERO E

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL?

 O que é desenvolvimento sustentável? Ele está relacionado apenas à natureza?

 Por que é necessário haver igualdade de gênero para que haja desenvolvimento
sustentável?

 Existe algum dispositivo legal que trata desse assunto?

Embora o termo “desenvolvimento” tenha uma naturalidade e legitimidade que


fazem parecer que ele é constitutivo da história da humanidade, ou pelo menos da
história do mundo ocidental, a sua trajetória é relativamente curta. É no século XVIII -
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 45

quando o “trabalho” deixa de ser visto prioritariamente como castigo, penosidade, algo
ligado ao destino dos “menos capazes”, e se transforma em “vocação”, em “convicção
de uma obrigação”, em condição de merecimento do paraíso, em fator legitimador das
posses que o indivíduo conquista - que se torna perceptível a mentalidade pró-
desenvolvimentista.

Também o conceito de “ecodesenvolvimento” foi mudando com o passar do


tempo. Atualmente, a definição mais aceita para desenvolvimento sustentável é aquele
capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de
atender as necessidades das futuras gerações. É o desenvolvimento que não esgota
os recursos para o futuro.

Essa definição surgiu na Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e


Desenvolvimento, criada pelas Nações Unidas para discutir e propor meios de
harmonizar dois objetivos: o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental.

Além disso, o desenvolvimento sustentável, em sentido amplo, também está


ligado à igualdade de direitos entre pessoas (entre homens e mulheres, por exemplo),
melhoria de vida para a população e valorização de aspectos que vão além do
consumo, como a família, a cultura, o contato com a natureza, entre outros.

(Foto: Secretaria de Estado da Mulher do DF)

Refletir sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável significa contemplar


fatores relacionados à degradação ambiental dos ecossistemas em geral, por
exemplo, o desmatamento, a contaminação da água, do solo e do ar, assim como a
superexploração e inadequado manejo dos recursos naturais.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 46

Contudo, é um fato conhecido que o discurso da conservação tem sido abordado


de uma perspectiva predominantemente biológica, sem considerar a relação que os
homens e as mulheres e suas distintas formas de organização estabelecem com o seu
entorno.

Dentro da sociedade, os diversos grupos humanos se ordenam, hierarquizam-se,


diferenciam-se e ocupam determinada posição, na qual desenvolvem, também,
diversas formas de relação com a natureza.

Quando nos referimos ao meio ambiente, estamos tratando de compreender e de


relacionar processos naturais ligados à ação humana. Em última instância, não se
trata de conhecer processos sociais e naturais de forma isolada, mas antes de saber
de que maneira o uso que a humanidade atualmente faz dos recursos existentes
interfere em processos naturais que afetam a qualidade de vida dos homens; e de
saber quais formas alternativas de utilização são possíveis para que os impactos
negativos de desenvolvimento sejam evitados ou minimizados.

Os modelos de desenvolvimento existentes afetam de maneira diferente o


cotidiano de homens e mulheres. O padrão corrente de desenvolvimento não é nem
sustentável, nem igualitário. Para melhorar a condição do ser humano na sociedade, é
importante desentranhar as estruturas de poder nas quais estamos imersos.

Para se chegar a um novo modelo de desenvolvimento, todos os atores e atrizes


sociais têm de ser contemplados, considerando-se suas vozes. É dentro dessa ótica
que é importante se dar atenção não só para a incorporação das mulheres em
análises das necessidades práticas existentes, como para a utilização da perspectiva
de gênero para a elaboração de políticas sociais mais justas e equitativas.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 47

A equidade de gênero é considerada pelo Fundo de População das Nações


Unidas (UNFPA, em inglês) um direito humano, sendo o empoderamento das
mulheres ferramenta indispensável para promover o desenvolvimento e a redução da
pobreza.

Mulheres com maiores níveis de educação e participação no mercado de trabalho


estão, em geral, mais capacitadas para contribuir para a saúde e a produtividade de
suas famílias e localidades, criando melhores perspectivas para as novas gerações. A
importância da igualdade de gênero é evidenciada pela sua inclusão como um dos oito
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), e é reconhecida como a chave para
se alcançar os outros sete objetivos (UNFPA, 2009).

Embora o êxito em cada uma das três dimensões do desenvolvimento


sustentável (social, ambiental e econômica) seja importante para o empoderamento
das mulheres, isto não é suficiente, tornando indispensável adotar uma abordagem
integrada. Isso implicaria uma mudança para um modelo de desenvolvimento
sustentável, no qual as dimensões econômica, social e ambiental envolvam as
mulheres como beneficiárias, líderes e contribuintes de um crescimento inclusivo, justo
e socialmente equitativo, e que administrem de forma eficiente os recursos e o meio
ambiente.

Dimensão econômica: O crescimento inclusivo é um elemento crucial para


assegurar que os resultados dos esforços do desenvolvimento sejam distribuídos de
forma equitativa. Quando as mulheres têm acesso adequado a recursos e
oportunidades e participam em pé de igualdade da vida econômica, estão em melhor
posição para cumprir seus papeis como condutoras dos resultados do
desenvolvimento e aproveitar as vantagens do crescimento econômico inclusivo e
sustentável.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 48

Evidências mostram que isso não apenas beneficia as próprias mulheres, mas
também contribui para o crescimento econômico. Todavia, a feminização da pobreza,
o trabalho não remunerado das mulheres, sua concentração em empregos informais e
precários, as restrições ao seu acesso aos recursos produtivos e ao capital, a falta ou
ausência de representantes e de vozes femininas nas instâncias decisórias-chave
limitam as contribuições das mulheres à produtividade, à eficiência e ao
desenvolvimento sustentável.

Dimensão social: A igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres são


aspectos fundamentais da justiça social. As normas sociais, os estereótipos sexuais, o
acesso limitado e desigual a recursos e serviços de educação e saúde, além de outros
direitos não satisfeitos, restringem a capacidade das mulheres de participar de forma
plena e equitativa de todos os aspectos da vida.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 49

Apesar do progresso no marco normativo para a igualdade e gênero e o


empoderamento das mulheres nas últimas décadas, há um longo caminho a ser
percorrido para garantir os direitos das mulheres no âmbito da família, da comunidade
e da sociedade. Dentre vários exemplos, pode-se mencionar o das mulheres
indígenas, que carecem de muitos direitos e são praticamente esquecidas ou deixadas
de lado por políticas econômicas e estratégias de desenvolvimento que não oferecem
proteções ambiental e social que contemplem sua exclusão social.

Políticas sociais que compreendessem os princípios de inclusão, equidade e


sustentabilidade ambiental contribuiriam para a criação de um ambiente propício para
um crescimento mais distributivo e benéfico para todas as categorias sociais de
mulheres e homens – e, consequentemente, para avançar a concretização do
desenvolvimento sustentável.

Dimensão ambiental: As mulheres que são produtoras, trabalhadoras e


administradoras de recursos da agricultura contribuem para influenciar a produção e o
consumo sustentáveis, proteger o meio ambiente e a biodiversidade, preservar o
conhecimento tradicional e alocar recursos apropriados e sustentáveis nas famílias e
nas sociedades. As agricultoras tomam decisões em condições altamente limitadas
que muitas vezes as forçam a adotar modelos de produção que negligenciam a
preocupação com o desenvolvimento sustentável.

No contexto da economia do cuidado, as mulheres que vivem em situação de


pobreza têm de administrar diferentes alocações de recursos escassos, incluindo água
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 50

e energia. Isto se evidencia mais particularmente quando elas são confrontadas com a
degradação ambiental, que aumenta seu fardo de cuidado.

Além disso, a pobreza afeta seus padrões de consumo e a gestão global dos
recursos naturais pela comunidade. Oferecer às mulheres oportunidades e recursos e
engajá-las nos processos decisórios relativos ao meio ambiente poderia melhorar os
meios de subsistência e o bem-estar de comunidades inteiras em áreas que avancem
em direção à sustentabilidade.

Por efeito dos debates sobre desenvolvimento que se desenrolaram desde os


anos 1980, organismos internacionais, como o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), o Banco Mundial e, mais recentemente, o Fórum
Econômico Mundial têm buscado avaliar as desigualdades entre homens e mulheres
no desenvolvimento, incorporando indicadores de equidade e de empoderamento de
gênero, tais como o Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Gênero (IDG), a Medida
de Empoderamento de Gênero (MEG) e o Índice Global de Desigualdade de Gênero
(IGDG). Além dos Relatórios Anuais de Desenvolvimento Humano que desde 1995
incluem o IDG e a MEG em suas tabelas estatísticas, é importante fazer referência ao
relatório sobre gênero e desenvolvimento publicado pelo Banco Mundial, “Engendering
Development” (Banco Mundial, 1998) que foi amplamente traduzido e disseminado.

Inclusive estudos de entidades privadas afirmam que a redução das


desigualdades de gênero aumenta a produtividade e o crescimento econômico.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 51

Segundo relatório do Fórum Econômico Mundial, as pesquisas demonstram que


o investimento na educação feminina reduz as taxas de fecundidade, de mortalidade
infantil e de mortalidade materna, aumenta as taxas de participação da força de
trabalho e elevam os ganhos salariais.

O estreitamento dos hiatos de gênero (gender gap) não só é uma questão de


promoção da igualdade social, mas também incrementa o crescimento econômico e o
bem-estar da população.

No Brasil a equidade de gênero figura no texto da Carta Magna como um direito


fundamental, a partir da Constituição Federal de 1988. Os princípios de dignidade,
liberdade, privacidade e igualdade de tratamento perante a lei converteram-se,
gradativamente, em legislação complementar e ordinária, contribuindo para reduzir as
desigualdades e as discriminações entre homens e mulheres no País.

Afinal, não há como se pensar em desenvolvimento em seu sentido mais amplo


sem que haja igualdade perante todos os cidadãos. Não há como uma sociedade lutar
pelo desenvolvimento sustentável se não promover a igualdade entre gêneros.

2.2.1. Como as mulheres são afetadas por problemas sociais,


econômicos e ambientais

 A falta de água e energia elétrica afeta mulheres e homens da mesma forma? Por
quê?

 Quais são as dificuldades enfrentadas pelas mulheres no ambiente urbano? Você


consegue perceber tais dificuldades em seu cotidiano?

 Por que a saúde das mulheres é importante para o desenvolvimento do País?

 Qual a relação entre educação e saúde? Na região onde você mora, existe
desigualdade de gênero no acesso à educação?

 Por que muitas mulheres ainda não denunciam casos de violências ocorridos em
suas casas?

 A pobreza tem gênero?

 Por que a questão do gênero é importante na adaptação às mudanças


climáticas?
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 52

Ainda que, conforme visto no capítulo anterior, o ordenamento legal do Brasil


estabeleça preceitos fundamentais para garantir a igualdade de tratamento perante a
lei e a equidade de gênero, na vida cotidiana persistem inúmeros obstáculos, seja no
mundo do trabalho, seja na esfera política ou privada. Mulheres brasileiras, nos
diferentes períodos da vida, sofrem a violência com base no gênero em suas várias
expressões: restrições no campo da autonomia sexual, dificuldades de acesso à saúde
sexual e reprodutiva, sobrecarga de responsabilidades, segregação ocupacional,
discriminação salarial, baixa presença nos espaços de poder, má distribuição dos
afazeres domésticos etc.

Vejamos alguns problemas sofridos pelas mulheres:

Água potável

Embora a igualdade de acesso à água potável seja aceita de modo amplo como
um direito humano essencial para o pleno gozo da vida, a falta de acesso a ela tem um
impacto claramente específico em função do gênero: em diversas comunidades ao
redor do mundo, buscar água é de responsabilidade das mulheres e crianças.

Além disso, a água é primordial para o conjunto total de atividades domésticas,


as quais ainda são tradicionalmente vistas como “do domínio das mulheres” por muitas
culturas: preparação de alimentos, cuidado dos animais, irrigação de plantios, higiene
pessoal da família inteira, cuidado dos doentes, limpeza, lavagem e eliminação de
resíduos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 53

Em áreas rurais, mulheres e meninas estão indo cada vez mais longe para
encontrar água, submetendo-se ao risco frequente de violência em áreas política ou
ambientalmente instáveis. A crescente quantidade de tempo consumido pela procura
de água limita as oportunidades de mulheres e meninas para participar de outras
atividades – como ir à escola ou gerar renda.

Embora as imagens de mulheres carregando água sejam onipresentes, poucos


entendem o verdadeiro impacto social e econômico dessa tarefa monumental. Uma
das estimativas de 2012 sugere que cortar apenas 15 minutos do tempo de caminhada
até uma fonte de água poderia reduzir a mortalidade de crianças abaixo de cinco anos
em 11% e a prevalência de desnutrição e diarreia em 41%. Em Gana, por exemplo, a
diminuição de 15 minutos no tempo da busca de água aumentou a frequência das
meninas na escola de 8% para 12%.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 54

Acesso à energia

Atualmente, 1,4 bilhão de pessoas não têm acesso a formas de energia


modernas. Aproximadamente 2,7 bilhões de pessoas dependem de fogueiras e fogões
tradicionais para cozinhar e se aquecer. A responsabilidade de buscar combustível
(como madeira, estrume e resíduos agrícolas) cabe a mulheres e meninas.

Quando as fontes de energia modernas são limitadas ou inexistentes, muitas


mulheres são obrigadas a percorrer longas distâncias a fim de buscar combustíveis
para as necessidades domésticas, e as tarefas diárias demoram mais para serem
concluídas.

Estudos apontam que as mulheres gastam em geral aproximadamente 35 horas


por semana para cozinhar e lavar.

No Quênia, por exemplo, o investimento em infraestruturas e tecnologias que


poupam tempo e mão de obra, especificamente em melhores fogões, reduziu as
necessidades de madeira combustível em aproximadamente 40%.

Estudos de caso da Bolívia, Tanzânia e Vietnã mostram que, com melhor acesso
à energia em casa, as mulheres podem conciliar atividades de geração de renda com
tarefas domésticas.

Estima-se que todos os anos a poluição do ar em casa, proveniente de fogueiras


e fogões tradicionais usados para cozinhar e aquecer, mata 2 milhões de pessoas –
85% das quais são mulheres e crianças.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 55

Os digestores de biogás e os fogões solares podem oferecer opções de


emissões menores do que os fogões tradicionais a biomassa, e podem reduzir de
forma substancial a poluição dentro de casa.

Cidades e territorialidade

As famílias chefiadas por mulheres estão se tornando cada vez mais comuns em
áreas urbanas. Para as mulheres, as razões da migração urbana incluem não apenas
a falta de oportunidades econômicas no meio rural, mas também a violência contra as
mulheres, os sistemas autoritários patriarcais de controle familiar e comunitário e as
pressões familiares.

Em levantamento realizado no Censo IBGE 2010 sobre o perfil socioeconômico


de mulheres em aglomerados subnormais (favelas), a estudiosa Rossana Brandão
Tavares notou que há um número significativo de áreas em que registrou mais de 50%
dos domicílios sob a responsabilidade das mulheres. Contudo, elas continuam tendo
rendimento inferior ao dos homens: em média homens ganham R$690,00 e mulheres,
R$510,00. Por conta disso, elas acabam residindo em áreas ainda mais precárias e
sujeitas a riscos ambientais, como desmoronamentos, enchentes, entre outros.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 56

Além disso, o fato de as mulheres se tornarem chefes de família não


necessariamente modifica a estrutura valorativa das relações de gênero. Pelo
contrário, as mulheres são mais pressionadas a “dar conta” de múltiplas
responsabilidades agregadas.

Nas grandes cidades, aspectos cotidianos como mobilidade e territorialidades


impactam mais as mulheres, pois são as maiores vítimas de estupro, tanto no
deslocamento a pé quanto no transporte público. Seja por iluminação precária, seja
por falta de segurança ou mesmo pela cultura do estupro, a mulher acaba tendo seu
direito de ir e vir cerceado.

Portanto, reconhecer a vulnerabilidade das mulheres no espaço urbano é uma


das formas possíveis de reconhecer que as relações de poder e de dominação
permeiam as nossas vidas. Por essa razão, não podem ser deixadas de lado no
debate político e científico.
(Fonte: http://www.mackenzie.br/dhtm/seer/index.php/cpgau/article/view/tavares.2012.2/646)

Saúde
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 57

Embora as mulheres tendam a viver entre seis e oito anos a mais do que os
homens, numa escala global, há disparidades regionais consideráveis. Por exemplo, a
expectativa de vida das mulheres africanas ao nascer é mais baixa do que no resto do
mundo; em 2007 era de apenas 54 anos. Em contrapartida, mulheres de 35 países de
outras regiões têm uma expectativa acima de 80 anos.

No Brasil, a esperança de vida, somando-se homens e mulheres, era de 50 anos


em 1950. Em 2000, subiu para 70 anos. Ou seja, a população brasileira está
envelhecendo - em 1960 havia 3,3 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, que
representavam 4,7% da população. Em 2011 a taxa subiu para 12%, com 23,5 milhões
(Pnad/IBGE, 2011). Tal mudança que requer um olhar atento ao processo.

Nesse cenário, as mulheres são a maioria (55,7%), o que caracteriza uma


tendência à feminização do envelhecimento, confirmando o que apontam várias
pesquisas: as mulheres vivem mais do que os homens, embora em grande parte com
doenças crônicas degenerativas. Esse envelhecimento apresenta desafios em
diversos campos, inclusive com índices de incapacidades funcionais relevantes para
uma vida saudável.

As idosas são menos escolarizadas, e isso se reflete na sua inserção no


mercado de trabalho com informalização e baixos rendimentos, inclusive quando
comparadas com os homens idosos. As condições socioeconômicas têm impacto
significativo na morbidade e mortalidade femininas: um grande número de pessoas
acima de 60 anos tem doenças hipertensivas, articulares e diabetes.
(Fonte: http://www.spm.gov.br/noticias/artigos/19-08-13-2013-correio-braziliense-o-envelhecer-com-
qualidade-eleonora-menicucci/?searchterm=doen%C3%A7as%20femininas)
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 58

As mulheres têm menos acesso a oportunidades para proteger, promover e


manter sua saúde e têm uma susceptibilidade diferente da masculina aos efeitos
nocivos da poluição, sofrendo consequências específicas ao serem expostas a
ambientes poluídos. Os riscos à saúde feminina são especialmente altos nas áreas
urbanas, bem como nas áreas pobres onde há grande concentração de indústrias
poluentes ou atividades agrícolas. As questões de saúde ocupacional vêm adquirindo
mais importância à medida que mais mulheres trabalham em sub-empregos em
condições insalubres.

Enquanto as doenças cardiovasculares, os problemas mentais que levam ao


suicídio e a outras formas de autoflagelação, e outros problemas de saúde igualmente
sérios afligem e matam mulheres em sociedades avançadas e em desenvolvimento, a
maior parte dos grandes desafios de saúde recai sobre aqueles que já carregam os
fardos socioeconômicos mais pesados. Praticamente todas as mortes maternas em
todo o mundo ocorrem em países em desenvolvimento.

A mortalidade materna é um problema complexo que se configura como


importante sinalizador da condição de vida e de saúde das mulheres. O problema da
mortalidade materna está diretamente ligado ao acesso aos serviços de saúde, desde
o pré-natal com qualidade até o leito materno, passando necessariamente pelo acesso
a informações claras sobre a saúde e os direitos reprodutivos. Na ponta do processo,
surge a apropriação do direito à saúde por parte da população feminina.

As informações sobre mortalidade materna configuram-se como o melhor


indicador para a avaliação geral da qualidade da saúde das mulheres. Por padrão, as
informações retratam o número de mortes de gestantes e o de mulheres que já tiveram
seus bebês num período de até 42 dias após o término de suas gestações.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 59

No Brasil, em 20 anos (de 1990 a 2010), a mortalidade materna caiu pela


metade. Em 1990, para cada 100 mil gestações com bebês nascidos vivos, 141
mulheres morriam. Já em 2010, para cada 100 mil gestações com bebês vivos,
tivemos a perda de 68 mulheres. Entretanto, esse número ainda é grande, e muito tem
de ser feito para que as mortes maternas sejam ainda mais reduzidas.
(Fonte: http://www.spm.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2012/05/21-05-em-artigo-ministra-eleonora-
menicucci-aborda-acoes-e-desafios-para-a-reducao-da-morte-
materna/?searchterm=doen%C3%A7as%20mulher)

Embora mulheres e meninas corram o risco de gravidez indesejada e abortos


inseguros, aquelas nascidas em sociedades economicamente menos desenvolvidas
estão em desvantagem devido à falta de acesso à informação e às modernas formas
de planejamento familiar . As complicações relacionadas à gravidez são as principais
causas de morte de mulheres entre 15 e 19 anos em países em desenvolvimento, e os
abortos inseguros contribuem de forma substancial para a taxa de mortalidade anual.
O número de mortes causadas pelo câncer do colo do útero também é
consideravelmente elevado no mundo em desenvolvimento devido à quase
inexistência de exames.

Além do câncer do colo do útero, o câncer de mama também é uma doença que
atinge muitas mulheres no mundo. No Brasil, os números ainda assustam. Dez mil
mulheres morrem no País todos os anos. A razão: 60% dos casos o câncer de mama
são detectados em estágio avançado. Apesar dos números, “o câncer de mama - uma
das doenças que mais matam mulheres no Brasil - tem cura e a principal aliada nesse
sentido é a detecção precoce, que eleva para 98% a chance de sobrevivência”, alerta
Rita Dardes, diretora médica do Instituto Avon.

Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), entre os tipos mais agressivos,


esse é o tumor de maior incidência entre as mulheres, seguido pelo câncer de colo de
útero. A cada ano, surgem 50 mil casos no Brasil e são registrados 9 mil óbitos.
(Fonte: http://www.spm.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2010/09/instituto-avon-divulga-pesquisa-sobre-o-
cancer-de-mama/?searchterm=doen%C3%A7as%20mulher)

Outro problema grave que atinge as mulheres em países menos desenvolvidos


economicamente são as altas taxas de mortalidade infantil. Seu enfrentamento é uma
pré-condição para o desenvolvimento econômico e o bem-estar de uma população, já
que a mortalidade precoce interrompe as potencialidades da vida dos indivíduos. . Ela
é um fardo para a família e a sociedade, mas principalmente para as mulheres, que
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 60

passam muito tempo grávidas, amamentando e cuidando de crianças, , cujas chances


de sobrevivência são pequenas devido ao acesso restrito à assistência médica.

Educação

É amplamente reconhecido que a igualdade de gênero na educação é a chave


para se alcançar igualdade, desenvolvimento e paz. Os dados disponíveis sugerem
que, se todos os estudantes de países de baixa renda adquirissem habilidades básicas
de leitura, 171 milhões de pessoas – 12% entre as mais pobres do mundo – poderiam
ser retiradas da pobreza. Há 900 milhões de analfabetos no mundo, dos quais 65%
são mulheres. Na América Latina, essa disparidade é um pouco menor 86,2% das
mulheres são alfabetizadas em relação a 98% dos homens.

Cada ano de escolaridade pode aumentar a renda das mulheres entre 10% e
20%. Mulheres instruídas têm mais possibilidades de conseguir melhores condições
de trabalho, adiar a maternidade, resistir à violência e participar dos processos
políticos.

Existem também vínculos diretos entre a educação e a saúde das mulheres. Por
exemplo, as mulheres com educação pós-primária têm cinco vezes mais
possibilidades de saber sobre prevenção do HIV do que as mulheres analfabetas. Na
África Subsaariana, se as mães tivessem pelo menos alguma educação secundária,
poderiam salvar as vidas de aproximadamente 1,8 milhão de crianças. Estima-se que,
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 61

entre 1970 e 2009, o crescimento da educação entre as mulheres em idade


reprodutiva tenha sido responsável por evitar 4 milhões de mortes de crianças até 5
anos. (Fonte: http://www.unifem.org.br/sites/700/710/00002242.pdf)

Apesar do entendimento global sobre a importância da educação e do


compromisso de longo prazo por parte de governos e outros atores importantes com a
garantia de educação para todos, atingir esse objetivo ainda é um desafio. As
mulheres estão em maior desvantagem devido a normas culturais seculares que têm
priorizado o progresso masculino e, com frequência, até mesmo proibido o das
mulheres. Consequentemente, elas constituem dois terços dos 774 milhões de adultos
analfabetos no mundo, e esta proporção não foi alterada nas últimas duas décadas.
Mais da metade das 72 milhões de crianças fora da escola são meninas.

Os estereótipos familiares das mulheres como donas de casa e dos homens


como provedores – e os estereótipos vinculados da mulher “nutridora”, emotiva,
fisicamente atraente, e do homem racional, adepto da tecnologia e intelectual –
continuam a manter as mulheres à margem da educação e excluí-las de certos
empregos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 62

É comum ver mulheres dominando as áreas de educação, saúde e bem-estar,


ciências sociais, humanidades e artes, mas sub-representadas nas áreas de ciências e
engenharia.

Alguns fatores contribuem para essa exclusão: segregação sexual, casamento


precoce, controle sobre a mobilidade e interação das mulheres, falta de infraestrutura
e instalações escolares adequadas a elas, falta de segurança no transporte e no
ambiente escolar e a falta de apoio público para a educação das mulheres.

Tais desigualdades são agravadas em tempos de crises econômica e financeira,


desastres naturais e conflitos políticos, prejudicando ainda mais as oportunidades
econômicas para meninas e meninos carentes, principalmente aqueles nascidos em
grupos indígenas ou minoritários em áreas rurais remotas.

Violência
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 63

São inegáveis as conquistas sociais das mulheres brasileiras nas últimas


décadas e a redução de algumas desigualdades de gênero. No entanto, a violência
contra as mulheres ainda é uma questão social grave e com consequências diretas na
vida, em geral, e, especialmente, na saúde sexual e reprodutiva.

A violência contra mulheres é caracterizada pela humilhação, subordinação e


pelo cerceamento. Ela gera ainda consequências indiretas para a saúde feminina
como depressão e ansiedade, síndromes relacionadas ao estresse, fobias,
dependência química, somatizações, disfunções sexuais, entre outras.

A forma mais comum de violência contra as mulheres é o abuso cometido pelo


companheiro, que envolve desde agressão psicológica e/ou física até relação sexual
forçada. O cenário mais real da violência doméstica ainda não é conhecido, pois a
agressão, na maioria as vezes, não é denunciada às autoridades, e a mulher busca
ajuda com amigas ou dentro da família, quando não silencia totalmente.

A partir dos casos registrados nas delegacias brasileiras, estudos analisando os


processos abertos mostram que 81% deles se referem à lesão corporal dolosa, com
abertura de casos na Justiça a partir das evidências de agressão, 5% correspondem a
estupro ou atentado ao pudor e 8% a ameaças. Na maioria dos casos (60%), após a
queixa não ocorre a separação conjugal.

Os estudos mostram que 80% daquelas mulheres têm entre 20 e 40 anos, com
vida conjugal de longa duração, e que a violência ocorre mais entre pessoas com
maior nível educacional. Este último dado deve ser motivo de maior investigação.
Entretanto, como a declaração da violência é tida, na maioria das vezes, como uma
vergonha ou de responsabilidade exclusiva dela, é possível deduzir que, para chegar à
denúncia, é necessário reconhecer-se como cidadã dotada de direitos, ter
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 64

informações quanto aos canais de denúncia e à rede de apoio às mulheres vítimas de


violência, o que é mais comum entre aquelas com maior nível de escolaridade.

Fator agravante para a não declaração de atos de violência por parte da vítima é
o receio quanto à forma com que será atendida, seja na delegacia, seja no serviço de
saúde. O medo de não ser ouvida, de ser criticada, de ter que ficar horas esperando
pelo atendimento diante de olhares desconfiados ou de acusação e o fato de sentir-se
responsável pelo fracasso da relação, entre outros fatores, muitas vezes
desencorajam e retardam uma tomada de atitude.

ALGUNS DADOS SOBRE A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER:

 A cada 15 segundos uma mulher é espancada no Brasil (Fundação Perseu


Abramo, 2002);

 o feminicídio vitimou mais de 41 mil mulheres brasileiras, entre 1997 e 2007


(SPM, 2010);

 as mulheres que sofrem violência são de todas as raças e classes sociais


(Cfemea);

 70% das agressões contra a mulher acontecem dentro da própria família e o


principal agressor é o marido ou companheiro (Fundação Perseu Abramo,
2001);

 23% das mulheres brasileiras estão sujeitas à violência doméstica, segundo


pesquisa em violência doméstica realizada em 54 países pela Sociedade
Mundial de Vitimologia (Holanda);

 25% dos dias de trabalho perdidos pelas mulheres decorre da violência


doméstica, segundo estudos do Banco Interamericano de
Desenvolvimento(BID);

 a Central de Atendimento à Mulher - Ligue 180 - funciona 24 horas por dia,


todos os dias, inclusive feriados. A ligação é gratuita.

A violência não é compatível com o desenvolvimento sustentável e no que


concerne à violência organizada, na forma de conflitos armados, as mulheres também
são diretamente atingidas. Elas são especialmente afetadas pela violência, com a
perda de suas casas e famílias, estupros, prostituição e gravidez forçada. Outra
consequência é que as mulheres se tornam as únicas provedoras da família e, mesmo
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 65

em meio aos conflitos, têm um papel chave na manutenção da ordem social e na


preservação das comunidades.

Pobreza

A maioria das pessoas que vivem com um dólar por dia ou menos é constituída
por mulheres. Além disso, o fosso entre homens e mulheres vítimas da pobreza não
parou de aumentar na última década, um fenômeno que tem sido referido como “a
feminização da pobreza”. Em geral as mulheres ganham em média ligeiramente
menos de 50% que os homens.

As mulheres que vivem na pobreza veem-se muitas vezes privadas do acesso a


recursos de crucial importância, como o crédito, as terras e as heranças. Não se
recompensa nem reconhece o seu trabalho. As suas necessidades em termos de
cuidados de saúde e alimentação não são prioritárias, carecem de acesso adequado à
educação e aos serviços de apoio e a sua participação na tomada de decisões, tanto
na esfera doméstica como na comunidade, é mínima. Vivendo nessas condições,
essas mulheres acabam não tendo acesso a recursos e serviços que lhes permitam
alterar a sua situação.

Tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento, produziu-


se um aumento do número de lares chefiados por mulheres.

De um modo geral, supõe-se que tais agregados que não têm acesso a
remessas provenientes de homens que trabalham sejam mais pobres do que os
chefiados por homens. Os agregados familiares chefiados por mulheres são mais
vulneráveis ao aumento do desemprego e às reduções das despesas sociais e da
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 66

previdência. Por isso, há necessidade de políticas que reforcem a autonomia


econômica das mulheres. (Fonte:
http://www.unric.org/html/portuguese/ecosoc/women/feminizacao.pdf)

A pobreza afeta com maior gravidade as mulheres e, por outro lado, sem a
importante contribuição das mulheres não é possível superar a pobreza. Assim a
igualdade de gênero – isto é – a eliminação das desigualdades sociais entre homens e
mulheres – é um dos objetivos que devem guiar as políticas para superar a pobreza.

Mudanças climáticas

Bom, adaptação às mudanças climáticas tem a ver com a redução da


vulnerabilidade aos riscos climáticos presentes e projetados. A vulnerabilidade às
mudanças climáticas é determinada em grande parte pela capacidade adaptativa das
pessoas. Uma calamidade climática particular, tal como a seca, não afeta toda a gente
numa comunidade – ou até no mesmo agregado familiar igualmente, pois algumas
pessoas têm maior capacidade que outras para gerir crises.

A partilha injusta de direitos, recursos e poder – bem como regras e normas


culturais repressivas – constrangem a capacidade de muitas pessoas, para agir sobre
as mudanças climáticas. Isto é especialmente verdade para as mulheres. Por
conseguinte, gênero é um fator essencial para entender a vulnerabilidade às
mudanças climáticas.

As mudanças climáticas estão tornando ainda mais difícil que as mulheres


compreendam os seus direitos básicos, e está piorando as desigualdades, uma vez
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 67

que elas são frequentemente mais vulneráveis aos impactos que os homens. Além
disso, é negado a muitas mulheres o acesso à nova informação sobre as mudanças
climáticas e à participação em processos importantes de tomada de decisões, apesar
de terem habilidades únicas e conhecimento muito importante para contribuir.

2.3. O QUE A SOCIEDADE PERDE COM A DESIGUALDADE DE GÊNERO

E O QUE GANHA COM A IGUALDADE?

 A igualdade de gênero beneficia apenas as mulheres?

 De que forma a desigualdade de gênero impacta na produtividade do País?

 Qual a relação entre as mulheres e as próximas gerações?

 Como as políticas públicas podem auxiliar no processo de autonomia feminina?

A igualdade de gênero representa uma economia inteligente: ela pode aumentar


a eficiência econômica e melhorar outros resultados de desenvolvimento de três
maneiras:

 Primeiro, removendo barreiras que impedem as mulheres de ter o mesmo


acesso que os homens têm à educação, a oportunidades econômicas e a
insumos produtivos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 68

 Segundo, melhorando a condição absoluta e relativa das mulheres, o que


introduz muitos outros resultados de desenvolvimento, inclusive para seus
filhos.

 Terceiro, nivelando as condições de competitividade, para que mulheres e


homens tenham chances iguais para se tornar social e politicamente ativos,
tomar decisões e formular políticas.

No Brasil, a hora de trabalho de uma mulher ainda vale um quarto a menos do


que a de um homem. E essa diferença não tem a ver com a experiência ou o nível de
educação dessas trabalhadoras. Pelo contrário: reflete a discriminação que ainda
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 69

existe no mercado de trabalho, embora a Constituição garanta direitos iguais para


homens e mulheres.

Um novo estudo do Banco Mundial mostra que, se essa desigualdade acabar,


não só as brasileiras, mas toda a economia do País sentirá os benefícios.

O relatório Igualdade de Gênero e Crescimento Econômico no Brasil trabalha


com uma série de leis hipotéticas e capazes de promover salários iguais entre homens
e mulheres. A consequência imediata dessas leis é o aumento na renda familiar. Há
também várias outras vantagens de longo prazo como veremos no decorrer desta
lição.

Quem ganha mais consegue poupar mais, o que traz um impacto direto no
crescimento econômico e na arrecadação de impostos, segundo o estudo. Além disso,
uma arrecadação mais alta pode dar origem a mais investimentos em saúde e
educação, o que beneficia crianças e adultos.

As brasileiras representam quase 44% da força de trabalho nacional. Além disso,


59,3% das empresas do País têm uma mulher entre os principais donos. Mesmo
assim, elas ainda são discriminadas pelo mercado de trabalho – e continuam a fazer a
maior parte das tarefas domésticas.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 70

Alguns parlamentares já tentaram aprovar projetos de lei para diminuir essa


desigualdade, mas ninguém conseguiu até agora. A Lei 6.653/2009, por exemplo, da
deputada baiana Alice Portugal, estabelece salários iguais e a criação de comissões
de igualdade de gênero em todas as empresas brasileiras. O texto nunca foi votado
pela Câmara.

Fora do Congresso, uma iniciativa da Secretaria de Políticas para as Mulheres


(SPM) teve mais sucesso: o Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça.

Das 16 empresas integrantes da primeira edição (2005/2006), 11 receberam o


selo pró-equidade, dado àquelas que se comprometem a oferecer salários e
oportunidades iguais. Na quarta edição (2011/2012), 81 participaram. Ainda assim,
elas representam uma minoria entre as corporações do País.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 71

Entre outros temas, o estudo realizado pelo Banco Mundial ainda analisa como
programas de transferência de renda e investimentos em infraestrutura permitem maior
igualdade de gênero.

Com maior acesso à água, ao transporte e à eletricidade, por exemplo, as


mulheres gastam menos tempo nas tarefas de casa e tornam-se mais livres para
cuidar dos filhos, estudar, trabalhar e descansar.

Na verdade, quando as atividades domésticas são bem divididas entre homens e


mulheres na unidade familiar, por exemplo, tanto o pai quanto a mãe passam a dispor
de mais tempo livre para ser desfrutado com filhos, lazer, etc.
(Fonte: Artigo Mulheres no trabalho: bom para elas e para a economia brasileira. Disponível em:
http://www.worldbank.org/pt/news/feature/2013/02/22/Brazil-why-promoting-equal-pay-is-good-for-
economy-job-market)
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 72

Dessa forma, a igualdade de gênero pode ter grandes impactos sobre a


produtividade. Para uma economia funcionar com todo seu potencial, as mulheres com
suas aptidões e talentos devem participar das atividades que façam melhor uso
dessas capacidades. Porém, de acordo com as histórias de muitas mulheres, este não
é sempre o caso em determinadas ocupações ou setores.

Quando o trabalho das mulheres é subutilizado ou indevidamente alocado –


porque elas enfrentam discriminação nos mercados ou instituições societárias que as
impedem de concluir sua educação, ocupar determinados cargos e ganhar os mesmos
salários dos homens – o resultado são perdas econômicas.

Quando as agricultoras, por exemplo, não têm a segurança da posse de terra, o


resultado é menos acesso a crédito e insumos e uso ineficiente da terra, o que reduz
as produções.

A discriminação em mercados de crédito e outras desigualdades de gênero em


acesso a insumos produtivos também tornam mais difícil para as firmas chefiadas por
mulheres serem produtivas e lucrativas como as chefiadas por homens.

A Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) estima que igualar o


acesso a recursos produtivos entre agricultores homens e mulheres poderia aumentar
a produção agrícola em países em desenvolvimento em até 4%.

Eliminar barreiras que impedem as mulheres de trabalhar em determinadas


ocupações ou setores teria efeitos positivos similares, reduzindo o hiato de
produtividade entre trabalhadores homens e mulheres de um terço até a metade e
aumentando a produção por trabalhador/a de 3 a 25% em toda uma série de países.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 73

Esses ganhos de produtividade podem ser ainda maiores em um mundo mais


integrado, onde a eficiência no uso de recursos é essencial para a competitividade e
crescimento do País. De fato, o trabalho recente mostra que a desigualdade de gênero
se tornou mais onerosa em um mundo de comércio aberto.

A desigualdade de gênero diminui a capacidade do País de competir


internacionalmente – especialmente se o País se especializa em exportar bens e
serviços para os quais trabalhadores homens e mulheres são igualmente bem
ajustados. Indústrias que confiam mais no trabalho de mulheres têm direitos iguais. A
relação também segue um caminho inverso: países com uma vantagem na fabricação
de produtos que dependem mais da mão de obra feminina também costumam adotar a
igualdade de gênero. E em países e regiões com populações que envelhecem
rapidamente, como a China, Europa e Ásia Central, encorajar as mulheres a entrar e
permanecer na força de trabalho pode ajudar a atenuar o impacto negativo do
encolhimento das populações em idade produtiva.

Outro aspecto importante de ser ressaltado é que as dotações, capacidade de


decidir e oportunidades das mulheres moldam as da próxima geração, pois quando as
mulheres exercem maior controle sobre os recursos dos domicílios ocorrem mais
investimentos no capital humano de crianças, o que resulta em efeitos positivos
dinâmicos sobre o crescimento econômico.

Evidências de uma série de países (tais como Bangladesh, Brasil, Costa do


Marfim, México, África do Sul e Reino Unido) mostram que aumentar a parcela da
renda familiar controlada por mulheres, seja por meio de seus próprios ganhos ou por
transferências de renda, muda os gastos de uma forma que beneficia as crianças.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 74

Pesquisas mostram que em diversos países a parcela de ativos e a parcela de


terra de propriedade de mulheres são associadas positivamente a maiores despesas
com alimentos e que um aumento da renda de mulheres adultas em apenas 10% da
renda média familiar elevou o número de anos de escolarização tanto de meninos
quanto de meninas.

Melhorias na própria educação e saúde de mulheres também têm impactos


positivos sobre seus filhos, já que uma melhor condição nutricional das mães foi
associada a melhor saúde e sobrevivência infantil. E a educação das mulheres tem
sido positivamente associada a uma série de benefícios de saúde para crianças –
desde taxas mais altas de imunização a uma melhor nutrição e a uma redução da
mortalidade infantil.

No que tange a esfera política, percebe-se que em todos os países e culturas, há


diferenças entre a capacidade de homens e mulheres fazerem escolhas, geralmente
com desvantagem para as mulheres. A capacidade de decidir das mulheres influencia
sua capacidade de desenvolver seu capital humano e considerar oportunidades
econômicas.

A capacidade coletiva de decidir que as mulheres têm pode ser transformadora


para a sociedade. Ela pode moldar as instituições, os mercados e as normas sociais
que limitam suas oportunidades e capacidade de decidir individuais. Empoderar
mulheres para que elas sejam atores políticos e sociais pode mudar escolhas políticas
e tornar as instituições mais representativas de uma série de vozes.

O direito de voto para mulheres nos Estados Unidos levou os formuladores de


políticas a voltarem sua atenção para a saúde infantil e materna e ajudou a reduzir a
mortalidade infantil de 8 a 15%.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 75

Na Índia, dar poder às mulheres no nível local (por meio de cotas políticas) gerou
aumentos no fornecimento de bens públicos (como água, irrigação e escolas) e
reduziu a corrupção.

Quando mulheres e homens não têm chances iguais de ser social e politicamente
ativos e influenciar leis, as políticas e instituições tendem a favorecer sistematicamente
os interesses daqueles que têm mais influência. Restrições institucionais e falhas de
mercado que alimentam desigualdades de gênero têm menor probabilidade de serem
tratadas e corrigidas, perpetuando sua existência.

Assim como outras nações, o Brasil vem passando por uma redefinição nas
relações entre homens e mulheres na sociedade e na família representada por uma
longa mudança institucional, que tem propiciado uma relativa desmontagem dos
privilégios masculinos na família e na sociedade e a obtenção crescente de direitos às
esposas e aos/às filhos/as.

Em uma perspectiva de longo prazo, o Brasil vem apresentando avanços sociais


e nas relações de gênero nas áreas de saúde, educação, mercado de trabalho,
previdência etc. Nestas áreas as desigualdades de gênero reduziram bastante. Na
política, os ganhos foram menores: as mulheres tornaram-se maioria do eleitorado,
mas possuem uma das mais baixas presenças no Parlamento entre os países da
América Latina. No mercado de trabalho houve conquistas parciais, com uma inserção
massiva das mulheres na população economicamente ativa e uma ampliação do leque
ocupacional, com redução dos diferenciais de salário e renda entre homens e
mulheres.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 76

As mudanças demográficas e as transformações do sistema sexo/gênero a elas


correlacionadas contribuíram para que se abrisse no País uma janela de oportunidade
para a consolidação do desenvolvimento, incluindo-se a redução da extrema pobreza
e da fome. Além disto, a conjuntura nacional e internacional do período 2004-2008
possibilitou a conjugação de crescimento econômico com crescimento da renda e
políticas sociais que aliviaram a extrema pobreza. Permanece como objetivo a ser
atingido o pleno emprego e o trabalho decente. A taxa de informalidade vem caindo
nos últimos anos, mas ainda é muito elevada.

Uma pesquisa realizada em Recife (PE) com as famílias cadastradas no


CadÚnico do Programa Bolsa Família (PBF) mostrou que as famílias em melhores
condições socioeconômicas são aquelas em que os dois cônjuges trabalham e em que
as crianças de 0 a 6 anos estão na creche ou na pré-escola.

A inserção da mulher no mercado de trabalho e a criação de mecanismos de


conciliação emprego e família mostraram-se fundamentais para o aumento da
autonomia feminina.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 77

3. EM BUSCA DE UMA MUDA NÇA DE PARADIGMA

3.1. A LUTA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS E FEMINISTAS

 O movimento feminista é coisa do passado? Se não, como ele vem


respondendo às novas demandas que lhe são colocadas?

 Qual a atuação e a importância do movimento feminista nas transformações


sociais?

 O que as mulheres querem?

 Qual a pauta do movimento feminista?

 E você? Reconhece o impacto do feminismo em sua vida pessoal e


profissional?

Podemos dizer que o embrião do que viria a ser o movimento feminista


posteriormente foi a Revolução Francesa (1789). Seus princípios revolucionários de
justiça social, liberdade, igualdade e fraternidade passaram a inspirar gradualmente,
nos séculos seguintes, reivindicações de diferentes segmentos sociais em condição de
desigualdade de acesso a direitos então negados. Os direitos das mulheres foram
imediatamente assumidos por esta bandeira; no entanto, só a partir do século XIX é
que começam a surgir manifestações públicas pela igualdade de direitos entre homens
e mulheres, traduzidos no igual acesso de ambos à educação, ao mercado de trabalho
e ao voto.

O Movimento Feminista é considerado por importantes analistas sociais como o


responsável pelas grandes mudanças ocorridas na segunda metade do século XX.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 78

Este movimento foi capaz de demonstrar à sociedade que as discriminações incidiam


sobre as mulheres, desde a sujeição feminina aos desígnios da autoridade masculina
no ambiente doméstico, até as situações de guerra, nas quais as mulheres eram (e
são) vulneráveis a mutilações, estupros e abusos de toda ordem.

O Movimento Feminista também possibilitou questionar a divisão sexual do


trabalho, caracterizada pela desigual repartição de tarefas, salários e poder entre
homens e mulheres, presente nas diversas sociedades. Aos questionar as posições
inferiores e menos valorizadas que as mulheres ocupavam, o Movimento Feminista
expôs as desigualdades de gênero em diversas esferas, tais como nas áreas do
trabalho, de educação, saúde, na organização da vida política, no ordenamento
jurídico da sociedade e na produção de conhecimentos científicos.

A partir da década de 1960 o Movimento Feminista se volta também para


questões relacionadas à saúde da mulher. Contando com a participação de cientistas
sociais, historiadoras, juristas, profissionais de saúde e outras militantes, o Movimento
Feminista passou a contestar a noção do destino biológico reprodutor das mulheres e
a analisar o contexto histórico da construção do lugar da mulher na sociedade.
Traduzida no lema “nosso corpo nos pertence”, a luta do Movimento Feminista tem
buscado romper com a subordinação do corpo (e da vida) da mulher aos imperativos
da reprodução.

A luta das mulheres e a sua organização em grupos são antigas. Essa luta e
esses grupos de mulheres nem sempre se chamaram Movimento Feminista. Algumas
estudiosas costumam dividir o Movimento Feminista em períodos históricos, também
denominados ondas.

O movimento feminista é dividido por etapas de acordo com a inclusão de novas


bandeiras ou pelo reforço de alguns desafios. Sobre esse assunto, não há consenso
entre especialistas. Alguns acreditam que haja apenas duas fases; outros defendem a
ideia de três fases.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 79

A marca da primeira onda feminista é a luta pelo direito do voto feminino.


Embora essa primeira onda tenha começado no século XIX, ela se manteve até a
conquista do direito ao voto pelas mulheres nos diferentes países (Alemanha:1918;
EUA: 1919; Inglaterra:1928; Brasil: 1932; França, Itália e Japão: 1945; Suiça:1973).
Uma importante marca da primeira onda foi o livro de Simone de Beauvoir, O Segundo
Sexo, de 1949. No livro, a autora denuncia as raízes culturais da desigualdade sexual
e as causas existentes na nossa cultura para que as mulheres sejam consideradas
inferiores.

Simone de Beauvoir

A proposta do feminismo de segunda onda, identificado a partir da década de


1960, foi a de colocar foco no aspecto socialmente construído das concepções do
feminino e do masculino. A frase clássica de Simone de Beauvoir “não se nasce
mulher, torna-se mulher”, expressou a ideia básica do feminismo: a desnaturalização
do ser mulher.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 80

Ao se considerar o caráter construído da dimensão de gênero, o feminismo de


segunda onda também permitiu a concepção da pluralidade dos femininos e
masculinos. Neste sentido, potencializou as articulações de feministas e a intersecção
com múltiplas agendas, como o combate ao racismo e à heteronormatividade.

O termo heteronormatividade, cunhado em 1991 por Michael Warner, é compreendido


e problematizado como um padrão de sexualidade que regula o modo como as
sociedades ocidentais estão organizadas. Trata-se, portanto, de um significado que
exerce o poder de ratificar, na cultura, a compreensão de que a norma e o normal são
as relações existentes entre pessoas de sexos diferentes.

A Terceira Onda Feminista teve sua origem no meio da década de 1980, onde
líderes feministas com raízes na segunda onda e diversas feministas negras
procuraram negociar um espaço dentro da esfera feminista para a consideração de
subjetividades relacionadas à raça. Esse movimento representa uma redefinição das
estratégias da fase anterior. Procurou contestar as definições essencialistas da
feminilidade que se apoiavam especialmente nas experiências vividas por mulheres
brancas integrantes de uma classe média-alta da sociedade.

A terceira onda do feminismo também apresenta debates internos. O chamado


feminismo da diferença, cujo importante expoente é a psicóloga Carol Gillian, defende
que há importantes diferenças entre os sexos, enquanto outras vertentes creem não
haver diferenças inerentes entre homens e mulheres defendendo que os papéis
atribuídos a cada gênero instauram socialmente a diferença.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 81

Durante a maior parte do século XX, o Brasil conviveu com os princípios


discriminatórios do Código Civil de 1916. O texto da lei privilegiava o lado paterno em
detrimento do materno, permitia a anulação do casamento adiante da não virgindade
da mulher (mas não do homem), afastava da herança a filha de comportamento
“desonesto” e não reconhecia os filhos nascidos fora do casamento, que eram
considerados “ilegítimos”, identificava o status civil da mulher casada ao dos menores,
silvícolas e alienados – ou seja, ao casar, a mulher perdia sua capacidade civil plena,
não podendo praticar uma série de atos sem o consentimento do marido.

O Código Civil de 1916, no que se refere aos direitos femininos, representou o


reconhecimento e legitimação dos privilégios masculinos; aqueles direitos de fato
consistiam na organização coercitiva da dominação do homem na família e na
sociedade. Através dele regulou-se e limitou-se o acesso das mulheres ao trabalho e à
propriedade.

Este Código, que era a expressão jurídica do patriarcado no Brasil, prevaleceu


plenamente em vigor até 1962, quando foi revogado pelo “estatuto da mulher casada”
(Lei 4.121/1962), que avançou no tratamento paritário entre os cônjuges, mas não
eliminou todos os privilégios do “pátrio poder” (poder dos pais/homens),
permanecendo diversos tipos de assimetria de gênero, como no caso das mulheres
que eram consideradas “concubinas”. A chamada “Lei do concubinato” (Lei n. 8.971)
só entrou em vigor em 29/12/1994.

As conquistas femininas ficaram mais ou menos congeladas nos primeiros dez


anos do regime autoritário. Porém, a partir de 1975 (Ano Internacional da Mulher),
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 82

operou-se um resgate das conquistas e do avanço formal da cidadania, que foram


marcantes para a história das mulheres brasileiras. O direito ao divórcio, por exemplo,
só passou a vigorar no Brasil com a Lei n.6.515 de 1977. O processo de
redemocratização possibilitou a criação da “Nova República” e conquistas práticas e
jurídicas, consolidadas na Constituição Federal.

Além dos ganhos inequívocos no que se refere aos chamados direitos


fundamentais – dignidade, liberdade, privacidade e igualdade de tratamento perante a
lei -, a reforma constitucional de 1988, marco da redemocratização do País, consolidou
a cidadania das mulheres, removendo obstáculos à igualdade de direitos.

Isto só se tornou possível graças à atuação do Conselho Nacional dos Direitos


da Mulher, dos movimentos de mulheres e do bloco das parlamentares, através do
conhecido Lobby do Batom, que empreendeu uma aguerrida mobilização nacional e
provocou uma forte transformação no campo político-ideológico dos direitos. Cerca de
80% das propostas feitas pelos movimentos de mulheres foram acatadas, entre elas, a
mudança do estado jurídico das mulheres, a destituição do pátrio poder e a
transformação do racismo em crime inafiançável. Deve se destacar que as conquistas
nesse campo foram profundamente negociadas. Os direitos sexuais de gays, lésbicas,
travestis e transgêneros, os direitos trabalhistas para as domésticas, o direito ao
aborto, entre outros temas, enfrentaram grande resistência, suscitando intenso debate
e muitos confrontos. Estes são, ainda hoje, temas polêmicos, e continuam a encontrar
forte resistência para a sua aceitação.

A partir de 1987 começa a se organizar um movimento de sensibilização de deputados


e senadores constituintes sobre as demandas das mulheres para a nova Constituição.
O grupo, que ficou conhecido como o Lobby do Batom, era formado por lideranças
feministas e as 26 deputadas federais constituintes, que se articularam de forma
suprapartidária. O Lobby do Batom obteve importantes avanços na Constituição
Federal, garantindo igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres
perante a lei.

As conquistas obtidas no plano interno têm correspondência com vários


avanços realizados no âmbito internacional e consolidados em documentos,
conferências e tratados, tais como:

 Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948);


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 83

 Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a


Mulher – CEDAW (1979);

 Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1989);

 Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou


Degradantes (1989);

 Convenção sobre os Direitos da Criança (1990);

 Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1992);

 Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1992);

 Programa de Ação da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena


(1993);

 Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a


Mulher (1994);

 Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher de Pequim


(1995);

 Convenções da OEA, em especial a Convenção para Prevenir, Punir e Erradicar


a Violência contra as Mulheres, Belém do Pará (1994).

Vejamos, agora, um panorama histórico das conquistas femininas no


Brasil:

As lutas e legados das gerações passadas abriram caminhos para a mulher de


hoje. O surgimento da pílula anticoncepcional foi um importante marco nesse
movimento. A mulher passou a ser de fato dona, principalmente, de seu próprio corpo,
onde a maior conquista é poder escolher se e quando tornar-se mãe.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 84

“A gente pode dizer que nos anos 60 a mulher passou a ser dona do
próprio corpo com o advento da pílula anticoncepcional. Isso mudou
profundamente a vida das mulheres, eu posso escolher quando engravidar
e eu posso fazer planejamento familiar.” (MJ, 55, Jornalista, SP)

A consequência disso foi uma queda da natalidade, o que, por outro lado
tornou-se fator de alavancagem das conquistas femininas, com mudança radical na
disponibilidade da mulher para estudar e seguir uma carreira.

“A redução da natalidade tem a ver com uma série de fatores, por


exemplo, com o fator de urbanização do Brasil (...), na zona rural o filho é
um ativo econômico (...), o filho gera riqueza; na zona urbana o filho não é
um ativo (...), passa a ser uma fonte de gastos...”. (PA, 34, Publicitário, SP)

“O Brasil é um dos poucos países que fez um planejamento familiar


espontâneo, não foi um política de Estado, caiu a natalidade”. (MJ, 55,
Jornalista, SP)

Como movimento social e proposta política, o feminismo surge no Brasil, a partir


de 1975, expandido o debate público sobre poder, igualdade e democracia. Para as
mulheres que integraram as primeiras filas deste movimento, reunindo-se em grupos e
coletivos, fundando centros e associações, lançando jornais etc., o conceito de
democracia incorporava também as esferas da família, do trabalho, da educação, da
violência e da saúde, indo além da esfera dos direitos civis e políticos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 85

Entre 1975-1979, as mulheres, organizadas em grupos, coletivos e


associações, buscaram interlocução com sindicatos e universidades, organizaram
manifestações, congressos e debates, alcançando um relativo espaço na imprensa e
dando visibilidade a suas reivindicações. Os primeiros passos das feministas foram,
portanto, no sentido de estabelecer uma presença pública no País, alcançar
legitimidade para sua pauta de reivindicações e ampliar sua base de militância.

Apesar de oscilante – com períodos de maior expressão e outros de retração –


uma importante vitória do movimento foi ter incorporado questões ligadas à violência
de gênero, à discriminação da mulher na família, no trabalho, na educação, na política,
ao debate político.

É indiscutível a contribuição feminina ao movimento que resultou na abertura


democrática.

“(...) Nunca houve uma luta no Brasil pela liberdade, pela democracia,
pela qualidade de vida, em que as mulheres não estivessem presentes, só
que essa expressão sempre foi apagada, porque na hora da representação
política nós não íamos; então esse simbolismo que eu acho que muda, mas
nosso engajamento sempre foi enorme, sempre foi muito grande, político
principalmente...”. (EP, 54, Médica, RJ)

O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) foi criado pela Lei n. 7.353
de 29 de agosto de 1985, vinculado ao Ministério da Justiça, com a finalidade “de
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 86

promover em âmbito nacional, políticas que visem a eliminar a discriminação da


mulher assegurando-lhe condições de liberdade e de igualdade de direitos, bem como
sua plena participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do país”.

Foi também estabelecido um Fundo de Desenvolvimento da Mulher, que


assegurava condições de operacionalidade a este órgão, alojado no Ministério da
Justiça, mas respondendo diretamente ao Presidente da República.

Do ponto de vista internacional, o CNDM se insere no contexto das


recomendações da Conferência Internacional de Mulheres realizada em Nairobi, em
1985, no sentido de que os governos nacionais empreendessem esforços para criar
mecanismos governamentais voltados para a mulher.

Desde sua fundação, o CNDM estruturou-se de forma a desempenhar um papel


relevante na Constituinte de 1988, momento crucial de afirmação dos direitos de
cidadania no Brasil, como vimos no inicio desta lição.

O êxito desse trabalho junto à Assembleia Nacional Constituinte, levando a que


cerca de 80% das reivindicações dos movimentos de mulheres - condensadas na
Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes - fossem incluídas no texto
constitucional de 1988, deve-se à conjugação de três forças que trabalharam de forma
consensual, tecendo estratégias conjuntas: o CNDM, os conselhos estaduais e
municipais de direitos das mulheres e os grupos e movimentos sociais de mulheres.

Outro fato importante que se destaca a partir da década de 1980 é a maior


participação das mulheres no mercado de trabalho, que é o espaço mais visível da
emancipação feminina, com importantes conquistas. Em um primeiro momento era
necessário que a mulher reproduzisse o modelo masculino para se impor nesse novo
ambiente de convivência.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 87

“Se nós formos olhar na década de 80, as mulheres que foram para o
mercado de trabalho eram mulheres que se estabeleciam muitas vezes por
serem ‘mais macho que muito homem’, no sentido de usarem ombreiras
gigantes, no sentido de ter que ser dura na colocação das suas ideias;
então, muitas dessas mulheres cresceram e se formaram como líderes em
oposição ao homem, o que é diferente dessa nova geração de mulheres,
que querem conquistar seu espaço não tendo o homem como referência”.
(PA, 34, Publicitário, SP)
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 88

Por outro lado, há uma particularidade do Brasil, apontada em algumas


entrevistas, onde as diferenças de gênero não seriam tão marcadas e a mulher, de
modo mais acentuado de uns anos para cá, poderia colocar no ambiente profissional
sua feminilidade, sem incorporar um persona ‘neutra’, não ameaçadora, conduta
esperada em outros países.

“Eu nunca deixei de ser feminina por ser uma profissional. Eu acho
que nos Estados Unidos agora melhorou bastante, mas na Europa, na
Inglaterra principalmente, uma professora universitária não entra em sala de
aula como uma mulher, ela entra como um ser neutro. (...) Eu não quero
vestir um terninho, eu não quero ser um homem de saias”. (PA, 62,
Antropóloga, RJ)

De qualquer modo, ainda falta muito para a mulher brasileira chegar com mais
força às posições de alto comando.

“Você vê no setor produtivo, no mundo coorporativo, são


pouquíssimas as mulheres que assumiram a liderança máxima de
presidentes CEOs das empresas, mesmo em cargos de diretoria (...); então
eu acho que se a gente for comparar com Alemanha, Holanda, Estados
Unidos, a gente está muito atrasado, tem muito que fazer”. (PA, 43, Gestora
Ambiental, SP)

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,


conhecida como RIO-92, destaca-se na literatura feminista no Brasil como o
tempo/espaço em que as reflexões sobre gênero e meio ambiente, a estruturação de
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 89

ações por parte do movimento de mulheres tomaram impulso, em dinâmica sinérgica


com o movimento feminista internacional. De fato, pela participação de milhares de
mulheres, incluiu-se na Agenda 21 dos governos um capítulo especial sobre as
necessidades das mulheres e sua importância para um desenvolvimento sustentável e
equitativo.

Neste capítulo - de numero 24 e intitulado “Ação mundial pela mulher, com


vistas a um desenvolvimento sustentável equitativo”, são propostos objetivos aos
Governos nacionais, vejamos alguns deles:

a) Implementar as Estratégias Prospectivas de Nairóbi para o Progresso da Mulher,


particularmente em relação à participação da mulher no manejo nacional dos
ecossistemas e no controle da degradação ambiental;

b) Aumentar a proporção de mulheres nos postos de decisão, planejamento,


assessoria técnica, manejo e divulgação no campo de meio ambiente e
desenvolvimento;

c) Avaliar, examinar, revisar e implementar, quando apropriado, currículos e materiais


educacionais, tendo em vista promover entre homens e mulheres a difusão dos
conhecimentos pertinentes à questão do gênero e da avaliação dos papéis da
mulher por meio do ensino formal e informal, bem como por meio de instituições de
treinamento, em colaboração com organizações não-governamentais;

d) Formular e implementar políticas governamentais e diretrizes, estratégias e planos


nacionais claros para conseguir a igualdade em todos os aspectos da sociedade,
inclusive a promoção da alfabetização, do ensino, do treinamento, da nutrição e da
saúde da mulher, bem como a participação dela em postos-chaves de tomada de
decisões e no manejo do meio ambiente, em particular no que se refere ao seu
acesso aos recursos, facilitando um melhor aceso a todas as formas de crédito, em
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 90

especial no setor informal, tomando medidas para assegurar o acesso da mulher


ao direito de propriedade, bem como aos insumos e implementos agrícolas;

e) Considerar a possibilidade de adotar, reforçar e fazer cumprir uma legislação que


proíba a violência contra a mulher e tomar todas as medidas administrativas,
sociais e educacionais necessárias para eliminar a violência contra a mulher em
todas as suas formas.

Em 2003 foi criada a Secretaria Especial de Políticas paras as Mulheres (SPM),


vinculada diretamente à Presidência da República, e que tem como estratégia central
desenvolver parcerias permanentes com diferentes ministérios com o objetivo de
tornar transversais as políticas de gênero e atuar em permanente diálogo com os
movimentos sociais de mulheres. Sua presença abre, sobre novas bases, o debate
sobre políticas públicas, gênero, governabilidade e movimentos de mulheres no Brasil.
A criação desta Secretaria de Estado coloca novamente a questão da cidadania da
mulher e das políticas públicas de gênero no Brasil no centro do poder, na dinâmica
das disputas e alianças no âmbito do governo.

A SPM tem desenvolvido ações conjuntas com os demais ministérios e


secretarias especiais para a promoção da igualdade entre homens e mulheres, o
combate à discriminação e a incorporação das questões de gênero nas políticas
públicas.

De 1985 a 2010, o CNDM teve suas funções e atribuições bastante alteradas.


Em 2003, passou a integrar a estrutura da SPM, contando em sua composição com
representantes da sociedade civil e do governo, o que amplia o processo de controle
social sobre as políticas públicas para as mulheres.

Na década de 2000 nasce, também, um importante mecanismo a favor das


mulheres: A Lei no. 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha,
que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa
lei resultou de uma luta histórica dos movimentos feministas e de mulheres por uma
legislação contra a impunidade no cenário nacional de violência doméstica e familiar
contra a mulher. É reconhecida pela ONU como uma das três melhores legislações do
mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 91

Embora a lei tenha apoio significativo de toda a sociedade, sua implementação


trouxe à tona muitas resistências. Resistências que conviviam com a aceitação da
violência doméstica como crime de menor poder ofensivo e reforçavam as relações de
dominação do sistema patriarcal.

Assim, a Lei Maria da Penha representou uma verdadeira guinada na história da


impunidade. Por meio dela, vidas que seriam perdidas passaram a ser preservadas;
mulheres em situação de violência ganharam direito e proteção; fortaleceu-se a
autonomia das mulheres.
(Fonte: http://www.spm.gov.br/publicacoes-teste/publicacoes/2012/lei-maria-da-penha-edicao-2012_)

Outra grande conquista feminina foi a aprovação da Lei 11.770/08, que amplia a
licença maternidade de 120 para 180 dias e cria o Programa Empresa Cidadã.
Vigorando a partir de 2010, a Lei beneficiou primeiro o funcionalismo público federal.
As empresas aderem voluntariamente ao programa. Em troca, podem deduzir
integralmente no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica a remuneração da empregada
nos 60 dias de prorrogação da licença.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 92

No caso da iniciativa privada, apesar de algumas empresas já adotarem a


licença de seis meses, a medida só começou a valer efetivamente apenas a partir de
janeiro de 2010.

As trabalhadoras que contribuem para a Previdência Social têm direito ao


salário-maternidade nos 120 dias (ou 180 dias) em que ficam afastadas do emprego
por causa do parto. O benefício foi estendido também para as mães adotivas:

- se a criança tiver até um ano de idade, o salário-maternidade será de 120 dias;

- se tiver de um ano a quatro anos de idade, o salário-maternidade será de 60


dias;

- se tiver de quatro anos a oito anos de idade, o salário-maternidade será de 30


dias.

A chegada de uma mulher à Presidência da República, com a vitoria de Dilma


Roussef nas eleiçoes de 2010, teve um efeito simbólico muito importante para o País.
Ter uma presidente mulher consolida diversas conquistas femininas, levanta a
autoestima, enriquece o imaginário das mulheres, torna possíveis os sonhos de
meninas em relação a realizações pessoais, políticas e profissionais:
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 93

“Venho para abrir portas para que muitas outras mulheres, também
possam, no futuro, ser presidenta; e para que --no dia de hoje-- todas as
brasileiras sintam o orgulho e a alegria de ser mulher. Não venho para
enaltecer a minha biografia; mas para glorificar a vida de cada mulher
brasileira. Meu compromisso supremo é honrar as mulheres, proteger os
mais frágeis e governar para todos!” (Discurso de posse da Presidente
Dilma Roussef – 01/01/2011)

“... elevou a autoestima das mulheres e conferiu uma sensação de


poder (...) há uma mensagem subliminar de que as mulheres têm mais poder
na sociedade brasileira”. (LS, 59, Bióloga, RJ)

Veja a seguir uma síntese das conquistas femininas:


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 94

3.2. EMPODERAMENTO DA MULHER E O PAPEL DO HOMEM

 As mulheres estão mudando. Será que os homens também estão?

 Assim como as mulheres estão ocupando cargos predominantemente


masculinos, será que os homens também estão passando a exercer profissões
predominantemente femininas?

 Como você acha que o desenvolvimento de políticas pode auxiliar nesse


processo de mudança?

O mundo feminino mudou muito em relação às gerações passadas, e felizmente


hoje uma menina, considerando as diferenças culturais e regionais do Brasil, está
inserida em uma sociedade mais justa e com mais oportunidades de realizações
profissionais e pessoais. Ela pode sonhar e, principalmente mais que sonhar, ela pode
buscar um mundo mais justo, menos cruel para ela e para as gerações subsequentes.

Atualmente fala-se muito em empoderamento da mulher, tanto no discurso


acadêmico quanto de órgãos governamentais e não-governamentais. Provavelmente
você também já ouviu falar. Sabe o que significa?

Bom, o termo “empoderamento” está relacionado à obtenção de ganhos, pelas


mulheres, tanto em termos materiais (aumento da renda e do controle sobre essa
renda e sobre os recursos envolvidos) e simbólicos (autoestima e confiança em si
mesmas) como nas relações sociais com os homens e com os membros das
comunidades onde elas vivem (participação mais ampla nas despesas de consumo e
na tomada de decisões importantes no interior das famílias, assim como maior
participação em associações representativas, sociais e políticas). O empoderamento é
um processo de aumento de poder no controle dos recursos externos e da autoestima,
o que permite estimular as capacidades internas de pessoas e grupos, que resultam
em liberdades de escolhas e de ações.

O conceito de “empoderamento das mulheres” foi consolidado nas Conferências


Internacionais do Cairo/94 e Beijing/95, a partir da contribuição dos movimentos de
mulheres que lutavam contra a exclusão social, a violência de gênero e a situação
subalterna do sexo feminino na sociedade e na família.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 95

Empoderamento representa uma maneira inovadora de enfrentar as


desigualdades de gênero existentes tanto na esfera pública quanto na privada e tem a
ver não só com a ampliação das capacidades individuais, mas também com acesso às
fontes de poder. Empoderamento é a tradução não dicionarizada do termo inglês
empowerment e denota o processo pelo qual as mulheres ganham poder interior para
expressar e defender seus direitos, ampliar sua autoconfiança, identidade própria e
autoestima e, sobretudo, exercer controle sobre suas relações pessoais e sociais.
Nesse sentido, a utilização da tradução literal serve para enfatizar um conceito que
tem aceitação internacional e reforça o enfoque das relações de poder.

“Está no gerúndio (ainda), mas o fato é que ela já não terceiriza mais a
responsabilidade para os outros, então o futuro e o sucesso dela não
dependem mais do sucesso do filho, do marido, ou do governo, ela chama
para si esse responsabilidade e o processo de empoderamento vem daí,
vem do quanto ela decidiu ser protagonista da própria vida”. (PA, 34,
Publicitário, SP)

Um dos reflexos dessa nova postura assumida pelas mulheres e em relação a


elas é o que algumas pesquisas vêm chamando de "as poderosas da nova classe
média brasileira", no contexto da ascensão de milhões de pessoas das classes D e E
para a classe C.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 96

Entre os anos de 2002 e 2011, a classe C apresentou uma alta de 38% na


população e de 62% na renda – é o que aponta a pesquisa feita pela Editora Abril em
parceria com a Data Popular, que desvenda a mulher da nova classe média.

Intitulada de “As poderosas da nova classe média”, o estudo aponta que a renda
feminina cresceu 78%, contra os 48% da renda masculina. “As mulheres deram o
grande empurrão para a evolução da nova classe média”, afirmou Demétrius
Paparounis, diretor do Núcleo Femininas Populares da Abril.

Se antes elas eram vistas como “donas de casa”, hoje elas são as “donas da
casa”, pois decidem ou influenciam praticamente todas as compras da família.

Elas têm mais poder porque contribuem mais para a renda da família, conhecem
mais as necessidades da casa e são mais bem informadas do que os homens.

 41% da renda familiar da nova classe média vêm da mulher (na classe A, a
mulher contribui com 25% do orçamento)

 70% são as principais responsáveis pelas compras da casa

Nessas pesquisas, algumas tendências são observadas: sofisticação do


consumo, valorização da carreira profissional, poder de decisão, valorização da
cor/raça e determinação dos padrões de consumo.

Para saber mais: http://poderosasdanovaclassemedia.com.br/index.html

Diante de todo esse novo perfil feminino, os homens também têm mudado. Em
geral, eles estão mais preocupados com a família, não só em garantir seu sustento –
já que hoje as mulheres também são responsáveis por essa parte -, mas em passar
mais tempo ao lado dos familiares. Muitos já participam da divisão do trabalho
domestico e alguns até são os responsáveis pelo cuidado dos filhos enquanto suas
companheiras saem para trabalhar.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 97

Diante das novas configurações no mercado de trabalho, é imprescindível que os


homens se adaptem a essa nova realidade, ou seja, o trabalho doméstico e o cuidado
com os filhos devem ser igualmente exercidos tanto pela mulher quanto pelo homem.

Há anos, preocupados com a elaboração de políticas a favor do trabalho decente,


a Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicou recentemente um relatório
intitulado Trabalho e Família: rumo a novas formas de conciliação com co-
responsabilidade social (OIT, 2009), no qual desenvolve uma ampla proposta nesse
sentido. Dentre as inúmeras sugestões e recomendações apresentadas nesse
relatório (p. 109-110), destacamos, a titulo de reflexão, algumas diretamente
relacionadas ao trabalho do cuidado:

a) Visibilizar e reconhecer o valor do trabalho doméstico não remunerado realizado


pelas mulheres, particularmente, sua capacidade de cuidadoras de crianças,
pessoas com deficiência e idosos, e também avaliar sua contribuição social e
econômica;

b) Superar a concepção de que o cuidado é uma responsabilidade privada, da esfera


do lar e das mulheres, redistribuindo as responsabilidades entre os domicílios, o
mercado e o Estado, a fim de garantir uma maior participação da sociedade no
processo de reprodução da força de trabalho;

c) Abandonar a ideia de que apenas as mulheres devam se preocupar com a


conciliação entre trabalho produtivo e responsabilidades familiares, promovendo
modelos alternativos de maternidade, paternidade e masculinidade como pré-
requisito para o êxito das políticas de conciliação. Enquanto a maternidade estiver
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 98

associada ao sacrifício e à onipresença com os filhos, dificilmente será possível


alcançar uma redistribuição de tarefas de cuidado, bem como aliviar a sobrecarga
que recai sobre as mães trabalhadoras. Requer, igualmente, dar ao papel dos
homens na família o significado de pessoas afetivas, interessadas e capazes de
assumir responsabilidades familiares, tais como: a criação dos filhos e das filhas, o
cuidado aos/às idosos/as e familiares enfermos e a realização de tarefas
domésticas;

d) Reconstruir amplamente o conceito de maternidade no mundo do trabalho, a partir


da revalorização das tarefas associadas às funções de cuidado e da criação de
novas formas de organização do trabalho e do tempo social;

e) "Em lugar de buscar a equidade promovendo, simplesmente a incorporação das


mulheres a um mercado de trabalho estruturado por gênero, o fundamental é
desconstruir o modelo do trabalhador ideal: homem, sem responsabilidades
domésticas com sua família";

f) Modificar "a relação entre mercado e trabalho doméstico de forma que todos os
adultos, homens e mulheres, possam alcançar seus ideais familiares e
profissionais. Isso passa pela revalorização do trabalho das mulheres e uma
desconstrução da percepção de que são força de trabalho secundária";

g) Promover que os marcos legais proíbam a discriminação associada às


responsabilidades familiares, entendendo que as licenças parentais e outras
ausências temporárias, associadas às responsabilidades familiares, não constituam
obstáculos para a manutenção do emprego e para o progresso nas carreiras
profissionais.

Em relação ao recorrente questionamento se as políticas devem ser específicas


ou universais, o estudo da OIT, acima referido, propõe que "além da elaboração e
implementação de políticas específicas, devem ser considerados os impactos indiretos
de todas as políticas públicas sobre as tensões entre o âmbito familiar e profissional".
Para tanto, "é necessário transformar toda ação de política pública em uma ferramenta
que contribua para a desconstrução dos papéis tradicionais de gênero e para a
incorporação da questão do cuidado".

O estudo lembra, ainda, que "a integração de distintas políticas com efeitos
conciliatórios pode potencializar os resultados das políticas setoriais e neutralizar
efeitos não desejados de iniciativas isoladas", sendo, para tanto, necessário combinar
estratégias bem definidas e de amplo alcance dirigidas a grupos com necessidades
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 99

especiais, juntamente com outras que fortaleçam políticas universais em matéria de


cuidado, de ampla cobertura e sustentadas por amplos pactos sociais e políticos (p.
108).

Além do mais, "as políticas devem ser desenhadas de acordo com o contexto
nacional, buscando as margens de ação que podem ser aproveitadas para avançar na
promoção da conciliação e de uma socialização do trabalho de cuidado" e, para tanto,
"o caráter conciliatório das políticas sociais setoriais existentes pode ser acentuado,
por exemplo, nos programas focalizados destinados à população mais pobre" (p. 110).

Do acima exposto, podemos concluir que a Organização Internacional do


Trabalho entende que a conciliação entre trabalho produtivo e as responsabilidades
familiares requer mudanças não apenas nas condições de emprego para mulheres,
senão também, nas exigências e nos requisitos de desempenho profissional impostos
a homens e mulheres no mundo do trabalho e mudanças nas condições do mercado
de trabalho. Nesse sentido, a proposta apresentada pela OIT nos remete não apenas
a uma mudança de foco, senão a uma mudança de paradigma.

Sobre isso é importante apontar um acontecimento interessante ocorrido em


2013:

Foi aprovada a Emenda Constitucional nº 72, de 02 de abril de 2013, que


regulamenta, entre outras coisas, o tempo de serviço das empregadas domésticas,
recebimento de FGTS e de horas extras.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 100

Você deve estar se perguntando: Mas qual a relação entre a regulamentação do


trabalho exercido pelas empregadas domésticas e a divisão sexual do trabalho?

Bom, podemos inferir que diante dessa nova lei, muitas famílias podem optar
pela redução de gastos, não contratando empregadas, ou diminuindo o tempo de
trabalho das que já tem. Isso fará com que inevitavelmente os membros da família
tenham que contribuir mais com as tarefas domésticas, tornando-as, assim, uma
responsabilidade de todos e não apenas da mulher.

Ou seja, com a nova lei, pode ocorrer uma grande mudança cultural no Brasil,
pois com a possível redução das empregadas domésticas e a maior dedicação das
mulheres ao seu trabalho remunerado, os homens terão de contribuir com as
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 101

atividades domésticas, estabelecendo, assim, novas relações com o trabalho


reprodutivo.

Outro fenômeno que também poderá ocorrer em decorrência da PEC das


empregadas (como ficou conhecida a nova lei) é que novas políticas públicas tenham
que ser criadas para apoiar as famílias. O trabalho reprodutivo ou doméstico terá que
ser encarado como um problema de toda a sociedade e, portanto, também do Estado,
e não apenas das famílias (da esfera privada).

Para refletir:

As mulheres estão mudando, os homens também. Mas, como vimos, ainda não
há igualdade entre os gêneros. Será que basta esperar que as coisas se ajustem
naturalmente ou é importante estabelecer políticas que contemplem a questão de
gênero?

3.3. VALORES FEMININOS PARA UM MUNDO MAIS SUSTENTÁVEL

 O que é empoderamento feminino?

 O empoderamento beneficia apenas as mulheres?

 As mulheres fazem diferença no desenvolvimento do País? E no bem estar da


população?

 Por que a mulher é importante para uma mudança no atual padrão de consumo?

 Existem muitas mulheres trabalhando na área da sustentabilidade?

 Como empoderar as mulheres sem sobrecarregá-las?

Já foi visto nos capítulos anteriores o que vem a ser o desenvolvimento


sustentável. Este conceito que traz um novo paradigma de produção e consumo leva
também a novas formas de gestão, pensamento e liderança: valorização da
diversidade, fomento à criatividade, incentivo à participação, ao debate e ao diálogo.
Que capitalizem os aprendizados nos processos, que questionem o custo dos
resultados e que aspirem a implementar políticas de longo prazo. Muitas destas
características fazem parte do estilo de liderança feminino; um grupo que, de acordo
com as suas próprias características, pode realizar um aporte significativo à saúde do
meio ambiente.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 102

Aparentemente são as mulheres as que mais se inclinam à sustentabilidade.


Uma pesquisa realizada com referência a padrões de consumo por The Futures
Company em nível global revela que as mulheres respondem em ação por 10% mais
que os homens quanto à preferência de produtos que cuidam do meio ambiente. E
este é somente um dos exemplos.

Pode-se estabelecer uma relação estreita entre o feminino e a sustentabilidade:

O estilo de liderança feminino é radial e se estrutura em rede; é flexível e


comunicativo. Constitui equipes de trabalho, compartilha informação e se organiza de
forma horizontal. Características que são fundamentais para liderar a nova onda de
globalização. – São as mulheres que naturalmente trabalham pela geração de
negócios sustentáveis, pelas necessárias mudanças nos padrões de consumo que
constroem um estilo de vida respeitoso dos ciclos de regeneração dos recursos
naturais e dos ecossistemas planetários.

- Elas têm um papel prioritário na gestão ambiental, na produção de alimentos e


na organização social.

- Num mundo globalizado e caótico, as mulheres ocupam um lugar central, um


papel vanguardista, segundo o sociólogo francês Alain Touraine. Entre a luta pela
igualdade e o reconhecimento de sua diferença, as mulheres estariam “no centro das
principais questões democráticas de nosso tempo”.

- As crises exigem multiplicar o cérebro e atender a várias frentes


simultaneamente, “um papel para o qual as mulheres estão historicamente treinadas e
culturalmente inspiradas”, como afirma a jornalista Laura di Marco em seu livro Las
Jefas (As Chefas).

Histórica e culturalmente a mulher tem em sua essência o cuidado com a família


e com seu entorno. Características femininas jogam a seu favor quando ela é
apontada como uma grande liderança para a sustentabilidade.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 103

A mulher tem a facilidade de se comunicar, influenciar novos padrões de


consumo e todas as condições para multiplicar novos hábitos de consumo sustentável.

Além de geralmente cuidar do orçamento familiar, é a mulher quem decide o que


consumir e o melhor momento para isso dentro de sua casa. Até pouco tempo atrás, a
decisão para a maioria dos produtos mais sofisticados era do homem e, em alguns
casos, como a compra do carro, a mulher, no máximo, opinava sobre algum detalhe.
Mas a palavra final era dele, e a esposa aceitava.

As mulheres basicamente compravam bens de conveniência, de supermercado,


alguns produtos tipicamente femininos; o resto era tudo por conta do homem. Hoje
acontece o contrário, pois a mulher decide 80% de todas as compras. É ela quem faz
escolhas para o filho e até para o marido.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 104

Além disso, de acordo com a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares, 2002-


2003), as mulheres já detêm a posse de mais de 52% dos cartões de crédito. Porém,
ainda são poucas as empresas que estão se adaptando a essa nova realidade, pois
muitas ainda não perceberam que as escolhas das mulheres passam por um processo
totalmente diferente. Essa predominância das mulheres nas compras se deu a partir
do aumento do seu poder aquisitivo, apesar de os salários médios ainda serem
menores do que os dos homens. Isso contribuiu para maior consumo e controle das
compras familiares pelas mulheres.

Essa mulher que já possui o maior poder de compra nas famílias pode ser um
ator estratégico no processo de mudança por padrões mais sustentáveis.

É normalmente a mulher quem se preocupa com a saúde dos filhos, com o


consumo de alimentos mais saudáveis. É geralmente ela quem se preocupa com a
separação do lixo, com o desperdício de água e energia. A mulher pode ser um
importante agente de transformação, de educação para o consumo consciente,
responsável.

O olhar sobre o todo, sem perder a percepção dos detalhes é apontado com uma
vantagem feminina. A mulher, especificamente da Classe C, teria essa característica
bastante apurada e, exatamente isso, a coloca à frente em sua comunidade, no papel
daquela que influencia e mobiliza.

“Eu acho que ela tem o papel estrutural sim, porque ela escolhe. A
mulher interage com compras de uma maneira muito mais fácil. Faz parte do
mundo da mulher o mundo das compras (...). Segundo, ela cuida da família,
(...) ela poderá induzir essa transformação numa velocidade maior, porque
ela vai compartilhar as informações. Terceiro, ela é uma pessoa que busca
informação (...) não consome produto sem informação”. (EP, 50, Bióloga,
DF)
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 105

Por ser, na maioria das vezes, a responsável pela educação em casa e nas
escolas, a mulher normalmente é associada à educação para a sustentabilidade, o
que, na prática, parece já estar acontecendo com a grande presença feminina no
movimento da educação para a sustentabilidade, em andamento na sociedade civil, de
certo modo.

Não se pode subestimar a importância do papel que as mulheres historicamente


têm na conservação da biodiversidade, gestão e partilha dos benefícios decorrentes
da sua utilização. As mulheres desempenham um papel fundamental na gestão da
biodiversidade para atender às necessidades de alimentação e saúde. Em vários
países, elas também têm um papel fundamental na gestão da agricultura e são as
principais gestoras e administradoras das sementes.

Além disso, a maior parte delas é responsável pelo controle, desenvolvimento e


transmissão do conhecimento tradicional. Uma vez que existe uma tendência que leva
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 106

os homens a procurar trabalho remunerado fora de suas terras e recursos, ampliou-se


o papel das mulheres na agricultura e na gestão dos recursos biológicos familiares,
bem como na proteção do conhecimento tradicional.

As mulheres são as principais produtoras de alimentos básicos em todo o mundo


(arroz, trigo, milho), que constituem 90% da ingestão de alimentos de pessoas pobres
nas áreas rurais e também entre 60 e 80% dos alimentos na maioria dos países em
desenvolvimento.

Na Índia, as mulheres contribuem com 75% de mão de obra para o transplante e


capina de arroz, 60% para a colheita e 33% para descascar.

As mulheres se organizaram em todos os níveis – desde o comunitário até o


nacional e o internacional – para advogar pela igualdade de gênero e o
empoderamento das mulheres, pelo desenvolvimento centrado nas pessoas nos
marcos de políticas e financiamento, para desenvolver iniciativas concretas que
melhorem a vida das mulheres e de suas comunidades, e para integrar as três
dimensões do desenvolvimento sustentável.

A mobilização e o chamado das mulheres em favor da mudança têm acontecido


em tipos muito diferentes de organizações da sociedade civil, governos locais e
nacionais e setores econômicos formais e informais. As mulheres têm desafiado as
relações de poder existentes, as leis, políticas e instituições discriminatórias, e
advogado pelos seus direitos, incluindo o de participar plenamente das decisões que
moldam suas vidas, seja em relação ao acesso á água e a fontes de energia seguras,
ou ao desenvolvimento de normas globais. De modo semelhante, analistas
econômicas feministas têm dado importantes contribuições ao destacar o papel das
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 107

mulheres no trabalho de cuidado não remunerado, que mantém comunidades e


economias, mas que é ignorado nos sistemas nacionais de contabilidade e formulação
de políticas.

O sucesso da liderança e organização das mulheres em favor da mudança pode


ser visto nos crescentes apelos, feitos por diferentes partes interessadas, por
investimentos nas mulheres e meninas, pelo crescimento econômico, redução da
pobreza ou outros objetivos. Essa nova abordagem cria novas oportunidades para a
promoção da igualdade, inclusão e estratégias centradas nas pessoas.

Um importante ponto de entrada para que as mulheres promovam e liderem


soluções para o desenvolvimento sustentável tem sido o nível local (comunitário). As
mulheres e os homens em comunidades locais não apenas enfrentam diretamente
problemas específicos, como também são os mais motivados a resolvê-los. As lições
aprendidas demonstram que a força coletiva de mulheres e homens é necessária para
provocar mudanças e identificar soluções no nível comunitário.

As comunidades – frequentemente dirigidas por grupos de mulheres – têm se


engajado e resolvido muitas questões ligadas a terra, moradia, subsistência e acesso
a serviços (como água, energia e manejo de resíduos). Entretanto, essas intervenções
em pequena escala não são sustentáveis por si mesmas.

Soluções sistemáticas e ajustáveis são necessárias para tratar as questões


sistêmicas do desenvolvimento sustentável e colocar a redução da pobreza e a
igualdade de gênero no âmago das intervenções. As boas práticas mostram que as
parcerias estratégicas entre os governos e a sociedade civil podem conduzir a
mudanças por meio de reformas jurídicas e regulamentares, planejamento, orçamento
e monitoramento e avaliação de políticas e programas.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 108

As iniciativas de larga escala devem consultar os usuários finais, especialmente


as mulheres, durante sua concepção e implementação, tendo em vista os papéis
desempenhados por elas em casa e na comunidade (como principais utilizadoras
domésticas de energia, água e terra para a segurança alimentar da família, entre
outros).

Por exemplo, através de suas responsabilidades diárias no manejo da água, as


mulheres e meninas conhecem a localização, confiabilidade e qualidade dos recursos
hídricos locais. A exclusão das mulheres do planejamento do abastecimento de água e
sistemas de saneamento tem sido apontada como uma das principais causas de seu
elevado índice de fracasso. Evidências vindas da Índia e do Nepal sugerem que o
envolvimento das mulheres na tomada de decisões em nível comunitário está
associado a um melhor manejo ambiental local.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 109

Por todo o mundo, mulheres líderes têm se levantado em defesa do meio


ambiente, dos direitos das mulheres e do bem-estar de suas comunidades.

Um movimento articulado e liderado por mulheres para se buscar alternativas


mais sustentáveis e a consolidação de práticas cotidianas faz todo o sentido. Um
movimento que tenha legitimidade e que possa reforçar a mulher dentro das suas
diferentes possibilidades, de cuidar, liderar, conectar, agregar e facilitar encontros,
diálogos e estratégias para um consumo mais sustentável.

Fundamental para esse movimento é que seja participativo e consiga agregar os


diversos olhares de mulheres de diferentes extrações sociais e faixas etárias, tomando
o cuidado para não se tornar um movimento de ‘elite’, sob o risco de perder força e
não ganhar legitimidade.

“... não pode ser um modelo de ambientalista nem um modelo de dona


de casa. Primeiro, consumo é um tema que inclui todos, então não é um
tema de meio ambiente, é um tema de qualidade de vida, então tem que
estar associado a temas que todo mundo se sinta dentro. A segunda coisa
que eu acho que é importante observar é que não pode ser um movimento
que escolha determinados grupos (...). Terceiro, eu acho que tem que
permear todas as faixas de mulheres que estão no mesmo espaço, inclusive
na mesma casa, tem que aproximar as mulheres, então eu tenho que pegar
uma família de classe média brasileira...” (EP, 50, Bióloga, DF)

A ideia da liderança feminina agrada e faz sentido, mas desde que venha
acompanhada de um chamamento para toda a sociedade, a fim de que a mulher não
fique novamente sobrecarregada. É importante não excluir os homens, sobretudo
pensando nos meninos das novas gerações, que deverão ser educados nesse sentido.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 110

“... Eu acho que cada vez mais a mulher vai ter esse papel pujante, né?
De motor de mudança. Então acho que contar com a mulher nesse papel é
muito importante, mas não esquecer que isso transcende gênero”. (EP, 37,
Marketeira, RJ)

No desenvolvimento de políticas, a presença das mulheres em si não é garantia


de obter os benefícios de estratégias de desenvolvimento participativos. Para que isso
aconteça, os seus pontos de vista, interesses e necessidades devem ser expressos e
levados em consideração.

A participação das mulheres oferece os seguintes benefícios:

 Compreensão dos tipos de atividades realizadas por elas.

 Compreensão dos interesses e necessidades das mulheres.

 Incorporação do conhecimento que está em suas mãos.

Viu só como as mulheres podem contribuir, e muito, para um planeta mais


sustentável? Por outro lado, vocês se lembram que no início do curso aprendemos que
o que consideramos traços femininos ou masculinos são culturalmente construídos?
Então, as características tidas como tipicamente femininas são também favoráveis ao
desenvolvimento sustentável. Mas tais valores devem ser preservados e apropriados
por todos – homens e mulheres. O “dever” de cuidar, preservar, pensar no coletivo, no
futuro, não pode ser só da mulher, é um dever de todos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 111

4. TRANSVERSALIZAÇÃO DA TEMÁTICA DE
GÊNERO

4.1. TRANSVERSALIDADE DE GÊNERO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

 O que é transversalidade de gênero?

 Quais são os objetivos da transversalidade de gênero?

 Existe diferença entre políticas para mulheres e políticas de gênero?

 Será que as políticas atuais ditas “para as mulheres” estão contribuindo para a
autonomia e empoderamento desse gênero ou apenas perpetuando aquela visão
antiquada de mulher como ser responsável pelo trabalho reprodutivo?

Em linhas gerais, a transversalidade da política de gênero consiste na


reorganização de todas as políticas públicas dos governos, sejam estas federais,
estaduais ou municipais, a fim de incorporar o recorte de gênero para além da
instituição responsável pela coordenação de políticas para as mulheres.

Nos dias atuais, a transversalidade integra o repertório essencial para o debate


sobre politicas públicas no Brasil. No entanto, se a utilização da terminologia tornou-se
bastante difundida, ainda são muitos os desafios para viabilizar a ampla efetividade
das políticas ditas transversais.

Falar em transversalidade é, antes de tudo, falar em um pacto de


responsabilidades compartilhadas que deve envolver, no caso da Política de Gênero,
todos os órgãos do governo e todos os entes federativos, garantindo-se a participação
social. Isso porque somente uma ação conjunta de todos os setores pode obter
sucesso em mudar a realidade de desigualdade entre homens e mulheres, tão urgente
e, ao mesmo tempo, tão cotidiana em nosso País.

Ou seja, a política de promoção das mulheres via a “transversalidade de gênero”


significa não unicamente a incorporação dessa perspectiva em um ministério ou
secretaria específica de atuação na área da mulher, mas seu impacto vinculante deve
ser assimilado por todas as políticas públicas propostas pelo Estado e desenvolvidas
em cada área governamental, considerando as especificidades das mulheres e dos
homens. Assim, cada ação política deveria contemplar tal perspectiva, uma vez que as
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 112

perguntas-chave implícita estariam sempre postas: modificam-se as condições de vida


das mulheres? Melhora-se a sua condição de empoderamento?

As ações políticas com especificidade de gênero devem vincular-se e relacionar-


se com todas as áreas das ações governamentais e devem questionar a ideia de que
existem áreas nas políticas públicas que estariam desvinculadas – ou se consideram
neutras – em relação à condição de gênero.

A gestão da transversalidade implica a articulação horizontal, e não hierárquica,


dos vários órgãos do Governo federal com os governos estaduais e municipais, com o
objetivo de influenciar o desenho, a formulação, a execução e a avaliação do conjunto
das políticas, gerando responsabilidade compartilhada por todos os participantes.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 113

Por transversalidade de gênero nas políticas entende-se a ideia de elaborar uma


matriz que permita orientar uma nova visão de competências (políticas, institucionais e
administrativas) e uma responsabilização dos agentes públicos em relação à
superação das assimetrias de gênero, nas e entre as distintas esferas do governo.
Esta transversalidade garantiria uma ação integrada e sustentável entre as diversas
instâncias governamentais e, consequentemente, o aumento da eficácia das políticas
públicas, assegurando uma governabilidade mais democrática e inclusiva em relação
às mulheres.

Falar da igualdade de gênero é romper com um universo restrito do não


reconhecimento da alteridade, do outro, da diferença, para caminhar em direção ao
espaço de equidade, da emancipação e do pertencimento.

As mulheres emergem como alteridade feminina, sociocultural e política. Passam


a estar presentes, reconhecidamente, nas arenas da vida cotidiana, onde se redefinem
com base na cultura, na história, nas relações de trabalho e nas formas de inserção no
mundo político, portanto, em um novo campo de possibilidades para estabelecer
convenções capazes de vencer sua condição de desigualdade.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 114

A garantia de que uma política de igualdade de gênero gerará bons resultados se


assegura em três dimensões articuladas:

 Na vontade e na decisão política que garanta, junto aos planejadores em todas


as instâncias federativas, a incorporação, nas suas agendas, da importância e
do significado da transversalidade de gênero, contemplando e compreendendo
seus desdobramentos e suas perspectivas, tanto em relação à ação do estado
quanto às suas instituições de planejamento.

 Na sua incorporação na prática dos gestores, que executam, monitoram e


avaliam as políticas públicas, em todos os níveis: federal, estadual e municipal.

 Na disseminação de novos valores culturais e políticos junto à população, com


vistas a que esta sensibilização torne a população participante e corresponsável
na construção de uma cidadania inclusiva.

Políticas públicas para as mulheres ou políticas de gênero?


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 115

As políticas públicas, no Brasil, no geral, quando são feitas e dirigidas às


mulheres não contemplam necessariamente a perspectiva de gênero. Políticas
públicas de gênero são diferentes de políticas públicas para as mulheres. Aquelas
consideram, inegavelmente, a diversidade dos processos de socialização para homens
e para mulheres, cujas consequências se fazem presentes, ao longo da vida, nas
relações individual e coletiva.

Já as políticas públicas para as mulheres têm centralidade no feminino enquanto


parte da reprodução social. Isso implica que não priorizam a importância e o
significado que se estabelece no relacionamento entre os sexos; ao contrário, a
centralidade posta na mulher-família reafirma a visão essencialista de que a
reprodução e a sexualidade causam a diferença de gênero de modo simples e
inevitável. Configura-se, portanto, numa política pública que enfatiza a
responsabilidade feminina pela reprodução social, pela educação dos filhos, pela
demanda por creches, por saúde e outras necessidades que garantem a manutenção
e permanência de família e não necessariamente seu empoderamento e autonomia.

Políticas públicas de gênero implicam e envolvem não só a diferenciação dos


processos de socialização entre o feminino e o masculino, mas também a natureza
dos conflitos e das negociações que são produzidos nas relações interpessoais, que
se estabelecem entre homens e mulheres e internamente entre homens ou entre
mulheres. Também envolvem a dimensão da subjetividade feminina que passa pela
construção da condição de sujeito.

A partir do momento em que os/as agentes públicos não têm clareza em relação
a tais pressupostos, voltam-se para tratar, por exemplo, a violência e as condições de
saúde centradas na mulher, exclusivamente, e não na natureza das relações e nos
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 116

padrões de comportamento entre os sexos, o que acaba reduzindo as possibilidades


de sua resolução.

As políticas para as mulheres não são excludentes das políticas de gênero,


embora tenham uma perspectiva restrita, pontual, de menor abrangência, atendendo a
demandas das mulheres, mas sem instaurar uma possibilidade de ruptura com as
visões tradicionais do feminino.

A longo prazo as políticas para as mulheres devem se transformar em políticas


de gênero. A consolidação de uma perspectiva relacional e crítica pode vir a
fundamentar a formulação de políticas públicas de gênero.

4.2. A POLÍTICA DE GÊNERO NO BRASIL

 Quando a temática da transversalidade ingressa definitivamente na agenda


política do Governo federal?

 O que foram as Conferências Nacionais de Políticas para Mulheres?

 Quais os objetivos dos Planos Nacionais de Políticas para Mulheres?

Para recuperar rapidamente a trajetória da transversalidade da política para as


mulheres, temos que considerar a IV Conferência Mundial das Mulheres em Beijing
(1995).
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 117

Foi nesse evento que surgiu a estratégia denominada “gender mainstreaming”,


traduzida como transversalidade de gênero. No documento da conferência entendia-se
por transversalidade a incorporação da melhoria do status das mulheres em todas as
dimensões da sociedade.

Já no âmbito do Governo federal brasileiro, as experiências com as estratégias e


gestão de política fundadas na transversalidade iniciam-se em 2003, em decorrência
de dois eventos de relevo:

I. A formulação do Plano Plurianual 2004-2007;

II. A criação das Secretarias de Política para as Mulheres – SPM - e de


Igualdade Racial – Seppir.

A criação da SPM e as suas respostas aos desafios de consolidação da Política


para as Mulheres merecem especial atenção, isso porque, para compreender melhor a
transversalidade da política para as mulheres, é necessário detalhar o histórico do
Plano Nacional de Políticas para as Mulheres – PNPM, e do seu Comitê de Articulação
e Monitoramento.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 118

(Foto: Secretaria de Política para as Mulheres)

Pensar em gestão de transversalidade implica o estabelecimento de uma rede


que triangule a intergovernalidade (pacto federativo), a intragovernabilidade (órgãos
setoriais e centrais do Governo federal) e a intersetorialidade (inclusão da sociedade
civil organizada, por meio da participação social). Assim, é essencial conhecer um
pouco melhor cada vértice desse triângulo.

Conforme mencionado, a temática da transversalidade ingressa definitivamente


na agenda política do Governo federal a partir de 2003, com a criação da SPM e da
SEPPIR.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 119

Alguns fatores de destaque para a compreensão dessa conjuntura são:

I. O compromisso político do Governo federal com a questão;

II. A produção científica de qualidade sobre as dinâmicas das relações de


gênero, que possibilitaram ampliar o conhecimento acumulado;

III. A visibilidade e a legitimidade do movimento feminista, que exerceu


pressão política importante para o desenvolvimento de políticas de gênero;

IV. As pressões internacionais oriundas de instâncias como Comitê


Cedaw/ONU, Comissão sobre a Situação da Mulher/ONU e Comissão
Interamericana de Mulheres/OEA e dos acordos oriundos das convenções,
como Beijing;

V. O questionamento de paradigmas e valores existentes que fundamentam


as desigualdades entre homens e mulheres e os diferentes papéis que
cada um assume na sociedade (II PNPM, 2008).

Dar materialidade para a transversalidade significou, também, criar caminhos


novos, cujos acertos nas escolhas determinaram o próprio sucesso da Política para as
Mulheres. A SPM definiu como sua âncora, nessa trajetória, o compromisso de
elaborar um Plano para a Política para as Mulheres que sistematizasse e integrasse
suas ações. Para que fosse meio hábil para realização desse objetivo, o Plano deveria
atender alguns requisitos:

I. Gozar de ampla legitimidade social, contemplando um processo


participativo na sua elaboração, integrando tanto a sociedade civil
organizada quanto o pacto federativo;

II. Definir responsabilidades objetivas para os órgãos do Governo federal,


contando com a participação destes quer na elaboração, quer na
implementação;

III. Institucionalizar um mecanismo que se viabilizasse como espaço


privilegiado para a coordenação horizontal e não-hierárquica.

É com base nesse diagnóstico que se iniciaria a trajetória do PNPM e de seu


Comitê de Articulação e Monitoramento. Iniciado por um processo construído com a
união de “muitas vozes”, por meio do diálogo entre Governo e sociedade civil, por meio
da I Conferência Nacional de Política para as Mulheres, e a “a muitas mãos”, com
intensa participação dos órgãos de Governo e representações dos entes federativos e
sociedade civil organizada.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 120

(Foto: Secretaria de Política para as Mulheres)

A I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (I CNPM) aconteceu em


2004 e envolveu diretamente mais de 120 mil mulheres em todas as regiões do País.
Assim, gestoras e gestores públicos, das diferentes esferas de governo, organizações
sociais dos movimentos de mulheres e feministas – negras, lésbicas, indígenas,
sindicalistas, trabalhadoras rurais, militantes das áreas de saúde e de direitos sexuais
e reprodutivos, entre outras – constituíram uma delegação de aproximadamente 2000
mulheres que, reunidas no âmbito da Conferência, debateram intensamente quais
seriam as diretrizes e a agenda política para a elaboração de um Plano que
sistematizasse e operacionalizasse a Política paras as Mulheres.

O resultado foi o I Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, aprovado pelo


Decreto nº 5.390/2005, que definiu quatro eixos estratégicos: autonomia, igualdade no
mundo do trabalho e cidadania; educação inclusiva e não sexista; saúde das
mulheres, direitos sexuais e reprodutivos; enfrentamento da violência contra a mulher.
O I PNPM foi elaborado de maneira participativa, já que demandou o diálogo constante
entre a SPM e os demais órgãos governamentais, representantes dos entes
federativos e sociedade civil organizada.

Em agosto de 2007, após cerca de 2 anos de vigência do I PNPM, foi convocada


a II Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres – II CNPM, envolvendo 200
mil mulheres em todo o Brasil. A II CNPM tinha como missão avaliar a implementação
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 121

das ações previstas no I PNPM, bem como repensar as diretrizes e estratégias para o
II PNPM.

A 3ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (3ª CNPM) ocorreu em


dezembro de 2011, com 200 mil participantes em todo o país e 2.125 delegadas na
etapa nacional. Como resultado, temos o PNPM 2013-2015, com ainda maior inserção
das temáticas de gênero em diversas frentes do governo.

Como um plano nacional, o PNPM reafirma os princípios orientadores da Política


Nacional para as Mulheres:

 autonomia das mulheres em todas as dimensões da vida;

 busca da igualdade efetiva entre mulheres e homens, em todos os


âmbitos;

 respeito à diversidade e combate a todas as formas de discriminação;

 caráter laico do Estado;

 universalidade dos serviços e benefícios ofertados pelo Estado;

 participação ativa das mulheres em todas as fases das políticas públicas; e

 transversalidade como princípio orientador de todas as políticas públicas.


IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 122

(Foto: Secretaria de Política para as Mulheres)

A elaboração dos Planos atende, portanto, ao objetivo de operacionalizar as


atribuições da SPM de formulação, coordenação e articulação de políticas para as
mulheres, por meio da sistematização e integração das ações do Governo federal para
a igualdade de gênero, de forma que sejam viabilizados a implementação, o
monitoramento e a avaliação, o controle social e as pactuações federativas.

A estratégia da elaboração de um Plano, como instrumento para concretizar a


transversalidade, provou ser o caminho correto a ser seguido. Outro elemento,
contudo, contribui para o sucesso da estratégia: o Comitê de Articulação e
Monitoramento do PNPM, que definiu a institucionalidade da rede, competindo-lhe
apoiar a gestão da transversalidade, enquanto coordenação horizontal e não-
hierárquica atribuída à SPM.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 123

O Comitê tornou-se, assim, o espaço de articulação, acompanhamento e


disseminação de conhecimento relativo ao tema de gênero, viabilizando à SPM a
execução de sua responsabilidade de coordenadora horizontal (ou transversal) da
Política de Gênero no Governo federal.

É importante ressaltar, contudo, que não é apenas por meio da articulação dita
intragovernamental (entre os órgãos), que a transversalidade se configura, pois esse é
apenas um dos vértices do triângulo que lhe confere materialidade, sendo essencial a
articulação intergovernamental (pacto federativo) e intersetorial (inclusão da sociedade
civil organizada, por meio da participação social).

Em decorrência desse entendimento, a participação social e a federalização da


política foram erigidas como diretrizes do PNPM, em suas duas edições. Ademais,
ambas as perspectivas foram incorporadas no modelo de gestão da política, por meio
da integração, ao Comitê de Articulação e Monitoramento do Plano, de representações
federativas e da sociedade civil organizada, por meio do CNDM (Conselho Nacional de
Direitos da Mulher).

A participação e controle social são elementos imprescindíveis para o avanço da


Política para as Mulheres. Isso se verifica pela análise do processo de construção do
Plano, cuja pactuação remete a I Conferência Nacional de Política para as Mulheres –
I CNPM -, e suas revisões, a II e III CNPM.

Em relação à federalização da política, é importante destacar os esforços


envidados pela SPM pra a elaboração de Planos Estaduais e Municipais. Fruto da
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 124

cooperação entre o SPM e entes federativos, contabilizam-se atualmente 6 planos


estaduais (Bahia, Amapá, Rio Grande do Sul, Pará, Rio Grande do Norte e
Pernambuco) e 193 planos municipais; além de pactuação federativa do Pacto
Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, uma das prioridades do
Plano, cuja adesão alcançou 26 Estados.

4.3. A IMPORTÂNCIA DA TRANSVERSALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS

 Reduzir as desigualdades de gênero significa negar as diferenças?

 Qual é a importância das transversalização da temática de gênero nas políticas


públicas?

 As políticas socioambientais estão levando em consideração a questão de


gênero?

Sob o impacto da democratização e da luta de movimentos feministas e de


movimentos de mulheres, desde os anos 80, tem ocorrido, no Brasil, um processo
gradual de incorporação da problemática das desigualdades de gênero pela agenda
governamental. Com a crescente importância dos governos municipais, a partir da
Constituição de 88, a redução das desigualdades de gênero passou também a fazer
parte da agenda dos governos locais.

O eixo de uma ação governamental orientada pela perspectiva de gênero


consiste na redução das desigualdades de gênero, isto é, das desigualdades entre
homens e mulheres (e entre meninos e meninas). Falar em reduzir desigualdades de
gênero não significa negar a diversidade. Trata-se de reconhecer a diversidade e a
diferença – entre homens e mulheres – mas atribuindo a ambos “igual valor”,
reconhecendo, portanto, que suas necessidades “específicas” e nem sempre “iguais”
devem ser igualmente contempladas pela sociedade e pelo Estado.

Se não se pensa nestas maneiras diferentes de estar na sociedade, corre-se o


risco de propor e implementar ações que aparentemente atendem a todos, mas, que,
na verdade, não reconhecem necessidades diferenciadas.

Podemos apreender ou visualizar de forma clara este risco de negligenciar a


diferença, de esquecer a diferença, considerando, por exemplo, um projeto de um
edifício público concebido, em tese, para todos, mas que não tenha rampas de acesso
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 125

ou elevadores: portadores de necessidades especiais e idosos estarão excluídos do


acesso a este edifício que, desta forma, não será um edifício para todos.

No caso de gênero, o processo é similar, embora menos evidente, pois não


estamos habituados em nossa sociedade a olhar as ações – governamentais e não-
governamentais, incluindo nossas ações cotidianas, a partir desta perspectiva, a partir
deste olhar.

Podemos refletir sobre alguns exemplos:

a) Uma política de acesso à moradia, à casa própria, que conceda o título de


propriedade ao “chefe da família”, entendido exclusivamente como o pai, o “cabeça
do casal”: as mulheres – casadas ou não; mulheres chefes de família ou não –
estarão excluídas do acesso a esta política;
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 126

b) Uma política de segurança pública tradicional não tem espaço para atender vítimas
de violência doméstica, pois não conta com pessoal preparado e com estratégias
de ajuda efetiva às vítimas, num caso em que o agressor é distinto do agressor
estranho, pois ele está “dentro de casa”. Assim, mulheres estão desprotegidas,
tanto na esfera privada como na pública;

c) Uma política de apoio ao pequeno produtor frequentemente concede crédito e o


título de propriedade da terra apenas a homens, excluindo, portanto, inúmeras
mulheres responsáveis pela atividade produtiva;

Diversos outros exemplos poderiam ser citados, mas o que interessa aqui é
destacar que é preciso “um novo olhar” para que se possa perceber se os diferentes –
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 127

homens e mulheres – estão sendo “atendidos”, se estão tendo oportunidades e


espaços iguais, inclusive para se manifestar.
(Fonte: Políticas públicas e gênero (Marta Ferreira Santos Farah). Em: Políticas públicas e igualdade de
gênero. Disponível em: http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/05630.pdf)

A gestão da transversalidade ou, ainda, a coordenação horizontal, é, como já


afirmamos, requisito indispensável para a efetivação da política para as mulheres.
Assim, a coordenação horizontal é o modo de ajuste entre o tratamento eficaz de
temas que perpassam amplo leque de programas e órgãos, e a cultura organizacional
para a formulação e implementação de políticas públicas, ainda marcadas pelo modelo
departamental.

As desigualdades de gênero existentes minam o sucesso das estratégias


nacionais para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e as
políticas de erradicação da pobreza.

A questão de gênero continua a ser "um dos mais fortes indicadores de


desvantagem a nível mundial". Na verdade, ela tem sido amplamente reconhecida e
tem demonstrado que a promoção de políticas de igualdade de gênero é essencial
para a erradicação da pobreza. Por outro lado, políticas e projetos de saúde, territorial,
de renda, de desenvolvimento, habitacional e tantas outras podem contribuir de forma
significativa para a promoção da igualdade de gênero.

A transversalização de gênero garante que os programas e os benefícios


gerados pelas diferentes políticas nacionais sejam distribuídos de forma mais
equitativa entre homens e mulheres, para, assim, combater a pobreza nas mulheres e
se tornar uma contribuição para alcançar os Objetivos Do Milênio.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 128

A transversalização da igualdade de gênero não é apenas uma questão de


eficiência e sustentabilidade, mas é principalmente uma questão de direitos humanos
e justiça social.

Em qualquer setor, em qualquer nível, políticas, programas e projetos que


ignoram as desigualdades de gênero correm risco de agravar tais desigualdades.

4.4. DE QUE FORMA O GESTOR PÚBLICO PODE EFETUAR A

INTERNALIZAÇÃO DAS QUESTÕES DE GÊNEROS NA ELABORAÇÃO

DE POLÍTICAS, PROGRAMAS E PROJETOS

 Como incluir as questões de gêneros na elaboração das políticas em meu setor?

 O que são mecanismos de gênero?

Como já foi visto aqui, falar em transversalidade é, antes de tudo, falar em um


pacto de responsabilidades compartilhadas que deve envolver, no caso da Política
para as Mulheres, todos os órgãos do governo e todos os entes federativos,
garantindo-se a participação social. Isso porque somente uma ação conjunta de todos
os setores pode obter sucesso em mudar a realidade de desigualdade entre homens e
mulheres, tão candente e, ao mesmo tempo, tão cotidiana em nosso país.

A Política para as Mulheres já apresentou enormes avanços nesse sentido,


valendo destacar o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, em sua 3a edição, e
o processo democrático que legitima sua construção e atualização, por meio das
Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres. Há, contudo, que se aprofundar
esse processo e uma das formas de fazê-lo perpassa o fortalecimento da perspectiva
de gênero nas políticas públicas em todos os órgãos de governo. Para que isso seja
possível, contudo, é imprescindível que a institucionalidade dessa agenda seja
garantida na rotina desses órgãos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 129

É esse o caráter dos Mecanismos de Política para Mulheres, um espaço de


articulação para elaboração de políticas para a igualdade de gênero nas ações de
cada órgão governamental; um espaço para inserção da perspectiva de gênero nos
órgãos para que eles possam incorporar tal perspectiva na formulação e na
implementação de suas políticas e ações. Os mecanismos podem adquirir diferentes
características: pode ser uma diretoria, um comitê, uma assessoria ou mesmo uma
área técnica, que se reúna periodicamente com membros das “instâncias decisórias”
de um mesmo órgão governamental – institucionalizado, com representatividade e
responsável pela incorporação das questões de gênero e pela tradução destas
questões em políticas e ações concretas a serem implementadas nas políticas
públicas sob a responsabilidade daquele órgão governamental. Deles se espera que
demonstrem que, em cada Ministério e em cada Secretaria, existe uma consciência de
que homens e mulheres não possuem os mesmos problemas e necessidades, mas
devem possuir os mesmos direitos.

A prioridade da Secretaria de Políticas para as Mulheres é que cada órgão


governamental tenha em sua estrutura um Mecanismo de Gênero.

Esse mecanismo pode uma Secretaria, uma Diretoria, uma Coordenação-Geral,


uma Coordenação, um Núcleo, Assessoria, ou mesmo um Comitê.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 130

A atuação engajada de todo o Governo Federal deve ser a diretriz máxima para a
Política de Gênero no Governo Federal. Por isso a institucionalização de Mecanismos
de Gênero nos órgãos da Administração Pública constitui uma agenda tão necessária
quanto inadiável.

1. Orientações estratégicas para Institucionalização dos Mecanismos de Gênero

Passaremos, nesse item, a detalhar quais são as orientações estratégicas para a


institucionalização da temática de gênero nos órgãos governamentais, assinalando os
pontos mínimos relevantes para a estruturação de mecanismos de gêneros.

1.1. Princípios norteadores da atuação dos Mecanismos de Gênero

O conjunto mínimo de Princípios norteadores dos Mecanismos de Gêneros


devem reproduzir – ou ao menos dialogar com as orientações para o Plano Nacional
de Políticas para as Mulheres – PNPM:
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 131

Em relação aos princípios transcritos, é especialmente importante ressaltar a


necessidade de internalizar na cultura organizacional do mecanismo de gênero:

 Igualdade e respeito à diversidade: é imprescindível que a transversalização de


gênero perpasse a abordagem das diversas formas de desigualdade (raciais,
étnicas, geracionais, orientação sexual).

 Participação e controle social: a garantia do diálogo constante com a sociedade


civil, além de contribuir para o processo democrático, concorre para qualificar as
decisões políticas, bem como a implementação e avaliação das ações e/ou
políticas. É a sociedade civil organizada que traz vivacidade e criatividade às
rotinas governamentais.

As diretrizes para a atuação dos Mecanismos de Gênero também devem dialogar


com aquelas instituídas pelo PNPM, quando houver convergência entre os escopos.

É essencial destacar que, em relação às atividades do Mecanismo de Gênero, a


preocupação constante com a formação e capacitação de servidores(as) e a
preocupação com a incidência sobre o ciclo orçamentários são essenciais para o bom
desenvolvimento dos trabalhos.

1.2. Objetivo dos Mecanismos de Gênero nos Órgãos Governamentais

Os Mecanismos de Gênero devem estar voltados para o desenvolvimento de


ações/iniciativas em benefício das mulheres e da igualdade de gênero, e o
aprimoramento da capacidade dos órgãos planejarem, articularem, implementarem,
monitorarem e avaliarem as iniciativas desenvolvidas em benefício das mulheres e da
igualdade de gênero. Nesse sentido, têm por objetivo atuar junto às diferentes
estruturas do órgão (secretarias, diretorias, departamentos) de modo a sensibilizar,
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 132

qualificar e comprometer toda a instituição com a adoção de um olhar de gênero que


seja transversal a todas as suas ações.

1.3. Atividades a serem desempenhados pelo Mecanismo

Para fazer frente aos objetivos anteriormente definidos, o Mecanismo de Gênero


dos órgãos governamentais pode desenvolver uma série de iniciativas. Suas opções
dependerão da realidade da instituição ao qual se encontra veiculado e de sua
expertise na área de gênero, bem como das suas possibilidades de atuação. Essas
serão definidas pela disponibilidade de recursos materiais, físicos e humanos e da sua
posição na hierarquia institucional.

Algumas atividades mínimas, porém, deveriam ser desenvolvidas nesse contexto,


valendo destacar:

a) Interferir na formulação do Plano Plurianual em relação à proposição de políticas


que considerem a perspectiva de gênero;

b) Estimular a reflexão conjunta entre as diferentes áreas da instituição a respeito da


incorporação da perspectiva de gênero nas ações desenvolvidas e em outras que
possam vir a ser implementadas;

c) Garantir a articulação permanente entre todas as áreas da instituição – finalísticas


ou não – para o planejamento, execução e monitoramento integrado de novas
ações ou a adequação de ações já desenvolvidas em benefício das mulheres ou da
igualdade de gênero;

d) Desenvolver ações de capacitação das equipes – permanentes ou não – dos


órgãos governamentais na temática de gênero, raça e etnia aplicadas à elaboração
de políticas públicas, incluindo o planejamento e a dimensão orçamentária;

e) Definir, junto às diferentes áreas, as prioridades de execução anual do Plano


Nacional de Políticas para as Mulheres e coordenar as atividades de elaboração
das propostas da instituição para as novas versões do Plano Nacional de Políticas
para as Mulheres;

f) Capacitar as equipes – permanentes ou não – para preenchimento do Sistema de


Acompanhamento do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e acompanhar
a alimentação trimestral dessa ferramenta de monitoramento;
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 133

g) Encaminhar servidoras/consultoras/estagiárias que apresentem denúncias ou


demandas relacionadas ao aprimoramento das relações internas de trabalho às
instâncias responsáveis (ouvidorias, recursos humanos, entre outras) a capacitar
as equipes dessas esferas para o atendimento qualificado e humanizado.

1.4. Instituição de comitês de gênero dentro dos mecanismos

Os mecanismos devem instituir comitês de gênero, que são estruturas


colegiadas, integradas por representantes de todas as áreas da instituição na qual se
localizam e devem se reunir regularmente para o planejamento e o monitoramento das
ações voltadas às mulheres ou à igualdade de gênero.O Comitê é instância
indispensável para existência dos mecanismos e para a efetividade de suas ações,
podendo, em um primeiro momento, ser equivalente ao próprio mecanismo

Devem integrar o Comitê: representantes de todas as áreas finalísticas da


instituição, do setor de recursos humanos, da assessoria de comunicação, da
secretaria-executiva, de empresas vinculadas (quando houver), da ouvidoria (quando
houver) e do conselho dos direitos da mulher – ou outra representação do movimento
feminista e de mulheres, na inexistência de conselho específico.

Importante assegurar, também, a participação de todos os colaboradores que


estejam representando a instituição em instâncias de deliberação da Secretaria de
Políticas para as Mulheres – respectivos organismos estaduais e municipais, tais como
o Comitê de Articulação e Monitoramento do PNPM e o Conselho Nacional dos
Direitos da Mulher. É interessante, ainda, estimular a participação de homens e
mulheres nos Comitês de Gênero e garantir a presença de representantes de outras
instituições parceiras que possam contribuir para as discussões temáticas.

2. Pensando e trabalhando com a transversalidade de gênero no dia-a-dia

O enfoque da transversalidade, que supõe uma mudança estratégica no modo


que a Administração Pública tem para atuar em prol da eliminação das brechas de
gênero precisa, não obstante, do acesso e uso de estatísticas desagregadas por sexo
sobre temas de especial relevância para as mulheres e homens. Este é, na verdade, o
primeiro passo ou a mais básica mudança a ser efetuada pelos gestores públicos –
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 134

pensar nos dados de maneira desagregada, trabalhar com essa desagregação por
sexo, que já permite identificar a situação de homens e mulheres na economia e na
sociedade.

A importância de se desagregar a informação por sexo se deve principalmente:

 Ao objetivo de se observar as brechas de gênero, ou seja, a distância entre


homens e mulheres;

 Para observar a disponibilidade ou não deste tipo de dado quando se tenta


desagregá-lo por sexo. Há ocasiões em que não se desagregou por sexo, já
que as bases de dados manipuladas não identificam o item sexo. Entretanto,
ainda assim, muitas vezes torna-se relativamente simples obter esse dado (por
exemplo: os investimentos realizados por homens ou mulheres).

 Para realizar propostas novas de indicadores. O uso de indicadores tradicionais


pode ser uma condição necessária, mas não suficiente para captar as
realidades de gênero. Portanto, a desagregação de dados possíveis oferece
uma perspectiva de quais são as grandes ausências de gênero.

No processo de integração da perspectiva de gênero no conjunto de ações,


quando o gestor está elaborando um programa, projeto ou qualquer outra iniciativa, a
primeira pergunta a ser feita é sobre a pertinência da dimensão de gênero. Para isso,
é preciso, por um lado, analisar se a proposta que está sendo elaborada vai dirigida a
algum grupo específico de pessoas (no momento em que se possa distinguir um efeito
direto ou indireto sobre homens e mulheres, o aspecto de gênero será pertinente).
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 135

Por outro, é necessário observar se na área sobre a qual se está trabalhando


existem diferenças nos recursos, na participação, nas normas ou valores pertencentes
a cada sexo. Isso significa identificar qual é a situação de partida de homens e
mulheres e quais podem ser os efeitos diretos e indiretos gerados sobre eles –
conhecer a forma de vida de homens e mulheres, a disponibilidade de recursos
(econômicos, humanos, políticos, etc.), as distintas necessidades e os diferentes
papéis de gênero que homens e mulheres desempenham na sociedade. Em ambos os
casos será pertinente a revisão a partir de uma perspectiva de gênero.

Vale mencionar que sob a perspectiva de gênero, a informação se revela mais


importante não ao tomar isoladamente o valor de cada indicador por sexo, mas ao
comparar os dois valores, ou seja, é somente de forma comparativa que as possíveis
diferenças existentes entre homens e mulheres podem ser observadas.

Outro instrumento fundamental são os indicadores de gênero, que são


específicos a cada projeto ou programa. Eles têm a função especial de poder
identificar mudanças sociais em termos de relações de gênero ao longo do tempo, isto
é, sinalizar as mudanças no status e papel das mulheres e dos homens em distintos
momentos do tempo, e, portanto, medir se a igualdade de oportunidades está sendo
alcançada através das ações planejadas. Permitem:

 Ver em que medida homens e mulheres participam de projetos e as razões de


sua ausência nos mesmos;

 Ver em que medida se levaram em conta as necessidades de homens e


mulheres e se as ações respondem a elas;

 Observar de que forma se trata ou ignora a discriminação de gênero, ou seja,


sinalizar como é essa participação para ambos os sexos;

 Ver em que medida um projeto ou programa afeta os papéis de gênero e se


estes mudam ao longo do tempo.

Além de dados desagregados por sexo, outra ferramenta importante são os


instrumentos de medição de impacto. São eles que de fato permitem enxergar como
as políticas, os programas e projetos afetam diferentemente homens e mulheres e
onde realizar a intervenção necessária para corrigir as desigualdades. Este
instrumento é especialmente útil aos gestores que elaboram o desenho de programas
e pretendem estimar o efeito que as atuações desenhadas terão sobre o coletivo
masculino e feminino, ou àquelas pessoas que participam da implementação,
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 136

monitoramento e avaliação desses programas e buscam conhecer como as diferentes


medidas levadas a cabo impactaram homens e mulheres.

Um exemplo simples de como um indicador de gênero pode servir de medida da


participação feminina num programa governamental é o número de creches ou espaço
destinado ao cuidado de crianças num programa de capacitação técnica ou de
estímulo à geração de emprego e renda, por exemplo. Ainda que o programa seja
voltado a todos – homens e mulheres sem distinção –, como normalmente são as
mulheres que ficam responsáveis pelo cuidado dos filhos, se não houver a
possibilidade de as mães deixarem seus filhos em creches ou se não houver um
espaço destinado às crianças em que elas possam deixá-las enquanto assistem às
aulas ou trabalham, certamente haverá muito mais homens do que mulheres
cadastrados.

Se as informações sobre os beneficiários do programa não estiverem


desagregadas por sexo, não poderíamos perceber a diferença na participação entre
homens e mulheres. Mas somente indo mais a fundo – procurando saber a razão
dessa brecha (o dilema feminino de conciliar a maternidade com o trabalho/a
profissão) – é que somos capazes de buscar as soluções para corrigir as
desigualdades (a oferta de creche ou de um espaço para o cuidado dos filhos no
próprio local da capacitação ou do trabalho).

4.5. EXEMPLOS CONCRETOS DE POLÍTICAS QUE CONTEMPLEM A

VARIÁVEL DE GÊNERO
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 137

 Será que já existem políticas que levam em consideração a problemática do


gênero?

 Como você poderia contribuir com a criação desses tipos de políticas?

Nessa lição você conhecerá alguns exemplos de políticas/programas que


contemplam a variável de gênero. Iniciaremos nossos estudos falando sobre o Bolsa
Família. Vamos lá!

O empoderamento, entendido como a capacidade de os indivíduos e grupos


poderem decidir sobre as questões que lhes dizem respeito, vem sendo utilizado no
âmbito das políticas públicas, o que enfatiza seu protagonismo para geração de
desenvolvimento autossustentável.

Os primeiros programas de transferência condicionada de renda foram criados no


México e no Brasil, em 1997. Por conseguinte, foram criados programas semelhantes
em outros países da América Latina, transferindo, preferencialmente às mães, uma
pequena soma de dinheiro sob a condição de cumprimento de algumas metas de
saúde e educação, tais como levar os filhos ao posto de saúde e à escola.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 138

Pesquisadores analisaram as mulheres beneficiárias desses programas e


perceberam que essas mulheres são mais cuidadosas na administração dos
benefícios, pois são mais pacientes do que os homens e pensam no futuro.
Considerados em conjunto, os resultados sugerem que programas de transferência de
renda convergem para uma mudança no equilíbrio de poder dentro das famílias.

A escolha das mães, de acordo com estudiosos, reforça a legitimidade do papel


feminino, havendo indicações de que as mulheres administram os recursos de modo
mais favorável à família, por exercerem papéis sociais mais relacionados aos cuidados
com os filhos e ao cotidiano da casa.

O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda


que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país.
O Bolsa Família integra o Plano Brasil Sem Miséria, que tem como foco de atuação os
16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais e está
baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 139

Todos os meses, o governo federal deposita uma quantia para as famílias que
fazem parte do programa. O saque é feito com cartão magnético, emitido
preferencialmente em nome da mulher. O valor repassado depende do tamanho da
família, da idade dos seus membros e da sua renda. Há benefícios específicos para
famílias com crianças, jovens até 17 anos, gestantes e mães que amamentam.

A gestão do programa instituído pela Lei 10.836/2004 e regulamentado pelo


Decreto nº 5.209/2004, é descentralizada e compartilhada entre a União, estados,
Distrito Federal e municípios. Os entes federados trabalham em conjunto para
aperfeiçoar, ampliar e fiscalizar a execução.
(Fonte: http://www.mds.gov.br/bolsafamilia)

O Programa Bolsa Família prioriza a mulher como responsável por receber o


benefício. Isso significa colocar quase R$ 1,2 bilhão por mês em mãos femininas. São
elas que recebem os valores transferidos pelo programa: 93% das 12,9 milhões de
famílias atendidas.

A transferência de renda e as oportunidades que surgem, especialmente nas


áreas de assistência social, segurança alimentar e inclusão produtiva, com a inserção
no Bolsa Família estão transformando a vida de milhões de mulheres em vários cantos
do Brasil.

O benefício do Bolsa Família pode significar a oportunidade de entrar na


faculdade ou passar em um concurso público. Esse é o caso de Ednamar da Silva dos
Santos, que aplicava uma parte do recurso recebido no sustento da filha e, com a
outra, pagava cursinho para vestibular e concurso de agente administrativo da
Prefeitura de Boa Vista. Trabalhava como empregada doméstica e foi aprovada em
ambos, quando devolveu o Bolsa Família. Ela considera o benefício o ponto de partida
para as suas conquistas.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 140

Ednamar devolveu o cartão bolsa família


(Foto: Ana Nascimento / Ministério do Desenvolvimento Social)

O PBF vem impulsionando o número de matrículas e diminuindo a taxa de


abandono nas escolas, reduzindo a vulnerabilidade e permitindo às pessoas pobres
reivindicar direitos sociais, além de refletir-se na diminuição das desigualdades de
gênero, fatores estes que facilitam o desenvolvimento humano.

Conforme o Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher da Universidade de


Brasília, o PBF tem obtido impactos relevantes na condição social das mulheres
beneficiárias, especialmente na visibilidade enquanto consumidoras, na afirmação da
autoridade no espaço doméstico e na mudança da percepção como cidadãs.

Neste contexto, o PBF pode ocasionar diminuição das desigualdades de gênero


bem como efeitos no empoderamento e na autonomia feminina.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 141

Além do Bolsa Família, outros programas como o Minha Casa, Minha Vida
(PMCMV) tem contribuído com o processo de empoderamento feminino. O Minha
Casa, Minha Vida é um programa do Governo Federal, gerido pelo Ministério das
Cidades e operacionalizado pela CAIXA, que consiste em aquisição de terreno e
construção ou requalificação de imóveis contratados como empreendimentos
habitacionais em regime de condomínio ou loteamento, constituídos de apartamentos
ou casas que depois de concluídos são alienados às famílias que possuem renda
familiar mensal de até R$ 1.600,00.

(Foto: Governo Federal)

O PMCMV foi lançado em março/2009, com a finalidade de criar mecanismos de


incentivo à produção e aquisição de 1 milhão de novas unidades habitacionais.
Atualmente essa meta é de 2 milhões de novas moradias para as famílias com renda
bruta mensal de até R$ 5.000,00.

O Minha Casa, Minha Vida contribui com o empoderamento porque os contratos


de compra de imóveis são firmados preferencialmente nos nomes das mulheres.

A agricultora familiar também tem uma série de políticas de fomento


direcionadas, como o Programa de Organização Produtiva, que garante o acesso das
mulheres às políticas públicas de apoio à produção e venda de seus produtos para
promover sua autonomia econômica. Até 2012, mais de 140 projetos foram
financiados, beneficiando mais de 79 mil mulheres.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 142

Entre 2003 e 2008, foram emprestados R$ 247 milhões a mulheres por meio de
cerca de 35 mil contratos no Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf). E,
para promover a participação econômica feminina nos assentamentos, desde 2011,
cada agricultora pode solicitar até R$ 3 mil para financiar projetos agropecuários e
comercialização de produtos nas áreas de reforma agrária. Mais de 7,1 mil contratos já
foram firmados.

(Foto: Reprodução)

A partir da obrigatoriedade da titulação conjunta da terra na reforma agrária, o


índice de mulheres titulares de lotes de terra avançou de 24% para 55%. Por meio do
Expresso Cidadã (documentação da trabalhadora rural), foram emitidos mais de um
milhão de documentos e 450 mil mulheres foram beneficiadas.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 143

(Foto: Governo Federal)

Programas como Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater), que atende


agricultoras familiares, extrativistas, quilombolas, pescadoras e indígenas, orientam e
promovem a autonomia feminina. Outra iniciativa de destaque é o Programa Nacional
de Documentação das Trabalhadoras Rurais (PNDTR). Por meio dele, 1,6 milhão de
mulheres em todos os Estados puderam retirar suas documentações civis e
trabalhistas, além de ter acesso aos direitos previdenciários. Já com o Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA), 5% das compras governamentais devem vir de
cooperativas femininas, prioritariamente.
IGUALDADE DE GÊNERO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 144

(Foto: Governo Federal)

Algumas iniciativas brasileiras, consideradas como referência na América Latina


e Caribe, serão estudadas para servir de exemplo aos outros países da região. Tais
como as ações conjuntas na reforma agrária, o acesso a programas como o de crédito
fundiário e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Reconhecer o devido papel da mulher nestes espaços, por meio da promoção da
igualdade no campo, favorece o desenvolvimento sustentável ao redor do mundo.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGR ÁFICAS

Nessa lição você encontra as principais referências bibliográficas utilizadas neste curso.
Quase todos os documentos listados abaixo podem ser encontrados na internet, por esse
motivo, aconselhamos que você os leia na íntegra como forma de aprofundamento nos
temas abordados aqui.

Lembre-se: Buscar mais informações e manter-se atualizado é essencial para a aquisição


de conhecimento!

ALISSON, Elton. Mulheres são mais vulneráveis aos impactos das mudanças
climáticas globais. Disponível em:
<http://sustentabilidademovimento.blogspot.com.br/2012/11/mulheres-sao-mais-
vulneraveis-aos.html>. Acesso em: 25 de Set. 2013.
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Poder.

ALVES, José Eustáquio Diniz; CORRÊA, Sônia. Igualdade e desigualdade de gênero


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http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/outraspub/cairo15/Cairo15_3alvescorrea.pdf>.
Acesso em: 25 de Set. 2013.

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PORQUE é importante falar em igualdade de género actualmente. Caderno prático para a


integração de igualdade de gênero na Cáritas em Portugal. Facscículo I. Disponível em: <
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2nea_Sobre_estudos_Rurais_e_G%C3%AAnero.pdf>. Acesso em: 25 de Set. 2013.

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