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Pesquisas em Tradução |1

COLEÇÃO – ‘NAS TRILHAS DA TRADUÇÃO’

VOL. I

PESQUISAS EM
TRADUÇÃO

Sumário
2|Prefácio

Conselho Editorial

Álvaro Faleiros (USP)


Anasthasie Angoran (Univ. Félix Houphouët-Boigny)
Carolina Paganine (UFF)
Fabiele Stockmans De Nardi (UFPE)
Fatiha Dechicha Parahyba (UFPE)
Germana Henriques Pereira (UnB)
Helena Topa Valentim (Universidade Nova de Lisboa)
Ines Oseki Depre (Université d’Aix – en-Provence)
José Hélder Pinheiro (UFCG)
José Lambert (Katholieke Universiteit Leuven)
Josilene Pinheiro-Mariz (UFCG)
Luana Ferreira de Freitas (UFC)
Marc Charron (Université d’Ottawa)
Marcelo Paiva de Souza (UFPR)
Marta Pragana Dantas (UFPB)
Muguras Constantinescu (Univ. Stefan Cel Mare/Suceava)
Pedro Heliodoro de Moraes Branco Tavares (USP)
Philippe Humblé (Vrije Universiteit Brussel)
Roberto Mulinacci (Università di Bologna)
Walter Carlos Costa (UFSC/UFC)

Sumário
Pesquisas em Tradução |3

COLEÇÃO – ‘NAS TRILHAS DA TRADUÇÃO’

VOL. I

PESQUISAS EM
TRADUÇÃO

Marie Hélène Catherine Torres (UFSC)


Maura Regina da Silva Dourado (UFPB)
Sinara de Oliveira Branco (UFCG)
Organizadoras

Ideia
João Pessoa
2014

Sumário
4|Prefácio

Todos os direitos reservados às organizadoras.


A responsabilidade sobre textos e imagens
é do respectivo autor.

Editoração/Capa
Magno Nicolau

Revisão
Marie Helene Catherine Torres
Maura Regina da Silva Dourado
Sinara de Oliveira Branco

Este livro foi publicado com verba da CAPES.


Projeto Dinter NF 2041/2009.

P472 Pesquisa em tradução / Marie Hélène Catherine Torres, Maura


Regina da Silva Dourado, Sinara de Oliveira Branco (Orgs.).
Vol. 1. Col. Nas trilhas da tradução. - João Pessoa: Ideia,
2014.
267p.
ISBN 978-85-7539-851-7
1. Tradução – Interpretação

CDU 82.03

EDITORA
www.ideiaeditora.com.br

Impresso no Brasil – Feito o Depósito Legal

Sumário
Pesquisas em Tradução |5

PREFÁCIO ................................................................................................ 7
Marie Hélène Catherine TORRES
Maura Regina da Silva DOURADO
Sinara de Oliveira BRANCO

O FABULISTA E A BIBLIOTECA ........................................................ 11


Ana Cristina Bezerril CARDOSO
Claudia Borges de FAVERI

POESIA, TRADUÇÃO E HIPERTEXTO .............................................. 31


Aglaé FERNANDES

O OUTRO FORSTER: INICIANDO UMA TRADUÇÃO


COMENTADA ........................................................................................ 51
Garibaldi Dantas de OLIVEIRA
Walter COSTA

GUY DE MAUPASSANT NO BRASIL: UMA QUESTÃO DE


CANONE ................................................................................................. 65
Carmen Verônica de A. R. NOBREGA
Marie Hélène C. TORRES

POE NO BRASIL: UMA ANÁLISE DOS PARATEXTOS DAS


EDIÇÕES DE BRENNO DA SILVEIRA E CLARICE LISPECTOR ... 99
Francisco Francimar de Sousa ALVES
Andréia GUERINE
Luana Ferreira de FREITAS

OS “NÓS TEXTUAIS DE SIGNIFICADO” NAS LEGENDAS DO


DOCUMENTÁRIO SAUDADE DO FUTURO ..................................... 117
Lavínia Teixeira GOMES
Maria Lúcia VASCONCELLOS

A (IN)VISÍVEL PRESENÇA: O TRADUTOR NO TEXTO


LITERÁRIO TRADUZIDO .................................................................. 137
Marcílio Garcia de QUEIROGA

Sumário
6|Prefácio

ESFERAS DE CONFLITO EM GRANDE SERTÃO: VEREDAS -


A REPRESENTAÇÃO DE JOCA RAMIRO E HERMÓGENES,
ANALISADA POR MEIO DO MODELO HALLIDAYANO DE
TRANSITIVIDADE ..............................................................................151
Daniel ALVES
Maria Lúcia VASCONCELLOS

ENSINO DE INGLÊS INSTRUMENTAL E TRADUÇÃO:


CONCEPÇÕES DE ALUNOS ACERCA DO TEMA ..........................177
Letícia Caporlíngua GIESTA

A RETEXTUALIZAÇÃO DA TRADUÇÃO AUTOMÁTICA DE


ABSTRACTS NA ESFERA ACADÊMICA ...........................................199
Cleydstone Chaves dos SANTOS

A TRADUÇÃO E SUAS RELAÇÕES COM O ENSINO DE


LÍNGUAS ..............................................................................................229
Sinara de Oliveira BRANCO

NOTAS BIO-BIBLIOGRÁFICAS DAS ORGANIZADORAS


E DOS AUTORES .................................................................................261

Sumário
Pesquisas em Tradução |7

No ano de 2010, três universidades federais uniram-se


em torno de um Projeto de Doutorado Interinstitucional na
área de Estudos da Tradução (DINTER/Edital 05/2009 da
CAPES – Ação Novas Fronteiras) com o objetivo de
estabelecer um polo de referência no ensino, pesquisa e
formação de professores-pesquisadores em Tradução na
Paraíba. As instituições e seus respectivos Programas de Pós-
Graduação são: Universidade Federal de Santa Catarina
(instituição promotora) - Programa de Pós-Graduação em
Estudos da Tradução (PGET), Universidade Federal da
Paraíba (instituição receptora) - Programa de Pós-Graduação
em Letras (PPGL) e Universidade Federal de Campina
Grande (instituição associada) - Programa de Pós-Graduação
em Linguagem e Ensino (POSLE). O objetivo principal do
DINTER é investir na qualificação de recursos humanos das
universidades, bem como em sua estrutura, com ênfase na
Pós-Graduação e na pesquisa, visando formar professores-
pesquisadores para o ensino, a pesquisa e a extensão, no
intuito de fortalecer os grupos de pesquisa na área de
tradução na UFPB e UFCG.
Com tais objetivos em mente, os professores-
pesquisadores envolvidos no Projeto – tanto doutorandos
quanto colaboradores – foram convidados a participar da
escrita deste livro, que apresenta a evolução da pesquisa
sobre temas relevantes na área dos Estudos da Tradução, no
sentido de propiciar a formação de massa crítica qualificada,
expandindo o interesse pela área.
Este primeiro volume da Coleção Nas Trilhas da
Tradução, intitulado Pesquisas em Tradução, está dividido em

Sumário
8|Prefácio

doze capítulos, que tematizam a tradução das perspectivas


da linguística, do ensino e da literatura. No primeiro capí-
tulo, Cardoso e Fáveri apresentam as obras de La Fontaine
no Brasil, fazendo um levantamento das traduções em língua
portuguesa das fábulas lafontainianas, relacionando essas
traduções ao seu público alvo.
No segundo capítulo, Fernandes trata do processo de
tradução do texto poético, selecionando os poemas ‘Les
effarés’, de Rimbaud (1984), e ‘Balõezinhos’, de Manuel Ban-
deira (1924), para um estudo descritivo de como os dois
poemas são distribuídos com o intuito de apresentar pro-
postas teóricas de classificação das relações textuais surgidas
no século XX.
No capítulo seguinte, O Outro Forster, iniciando uma
tradução comentada, Oliveira e Costa trazem um estudo
sobre tradução comentada, uma das áreas mais prolíficas dos
Estudos da Tradução no Brasil.
Objeto de discussão de vários críticos, escritores, histo-
riadores e leitores, como, por exemplo, José Veríssimo, Otto
Maria Carpeaux e Mário de Andrade, Maupassant e a tradu-
ção de sua obra no Brasil são revisitadas por Nóbrega e
Torres em Guy de Maupassant no Brasil: uma questão de cânone.
Alves e Freitas analisam a importância dos paratextos
das edições de Brenno da Silveira e Clarice Lispector para a
análise das traduções em Poe no Brasil.
No sexto capítulo do livro, Gomes e Vasconcellos
investigam as referências culturais nordestinas nas legendas
do documentário “Saudade do Futuro” de Marie-Clémence e
Cesar Paes (2000), debruçando-se, especificamente, sobre os
“nós textuais de significado”.
Queiroga, em A (in)visível presença: o tradutor no texto
literário traduzido, trata da presença do tradutor no texto
traduzido, isto é, do estilo do tradutor e de sua voz ou
presença discursiva.

Sumário
Pesquisas em Tradução |9

Em Esferas de Conflito em Grande Sertão: Veredas: a


representação de Joca Ramiro e Hermógenes, Alves e
Vasconcellos investigam o perfil ideacional de ambos os
líderes, a partir de categorias do sistema de transitividade
da Linguística Sistêmico-Funcional Hallidayana, desve-
lando os processos verbais e relacionais que, respectiva-
mente, denunciam a natureza de Joca Ramiro e Hermóge-
nes e o papel de liderança que desempenham em seus
bandos.
O capítulo de Giesta visa analisar as concepções de
alunos de cursos de graduação acerca da articulação entre
ensino de inglês instrumental e tradução.
No penúltimo capítulo, A retextualização da tradução
automática de abstracts na aula de inglês instrumental, Santos
examina o relato de alunos de inglês instrumental sobre o
desempenho do Google Tradutor na tradução automática de
abstracts, com o intuito de discutir até que ponto atividades
de retextualização de tradução automática podem trazer
benefícios para o ensino-aprendizagem de língua inglesa
instrumental.
Finalmente, o último capítulo, A tradução e suas relações
com o ensino de línguas, de Branco, tem como principal
objetivo apresentar atividades de ensino de língua inglesa
utilizando estratégias e categorias de tradução implemen-
tadas no projeto de pesquisa “Estratégias de Tradução e sua
Relação com o Ensino de Língua Estrangeira”, desenvolvido,
sob a sua coordenação, no Programa de Pós-Graduação em
Linguagem e Ensino da Universidade Federal de Campina
Grande (UFCG).

Marie Hélène Catherine TORRES


Maura Regina da Silva DOURADO
Sinara de Oliveira BRANCO

Sumário
10 | P r e f á c i o

Sumário
Pesquisas em Tradução | 11

Ana Cristina Bezerril CARDOSO


Universidade Federal da Paraíba

Claudia Borges de FAVERI


Universidade Federal de Santa Catarina

É impossível separar a história da tradução daquela das


línguas, das culturas e das literaturas – ou ainda daquela
das religiões e das nações.
Antoine Berman

Partindo da ideia de Michel Butor1 de que a obra de


arte não é nunca a expressão de um único indivíduo mas o
resultado de uma reescritura, de uma colaboração secreta,
múltipla e variada, consideramos La Fontaine, como o
grande renovador do gênero fábula e o primeiro dos
fabulistas franceses. Vejamos o que diz o próprio autor a esse
respeito no prefácio da sua primeira coletânea de fábulas:

Não foi Sócrates o único a considerar como irmãs a


Poesia e as fábulas. Fedro também não deixou
dúvidas a esse respeito, e pela excelência de sua obra
podemos avaliar a do príncipe dos filósofos. Depois
de Fedro, Avieno tratou do mesmo assunto. Por fim,
seguiram-nos os modernos: temos exemplos não só
entre os estrangeiros, como também entre nós. É
verdade que quando os nossos trabalharam nisto, a
língua era tão diferente da atual que não nos resta

1No 1°CD da Petite histoire de la littérature française, Michel Butor


defende a idéia de que a obra de arte é o resultado de vozes
múltiplas (faixas 4 e 5).

Sumário
12 | O fabulista e a biblioteca

senão considerá-los como estrangeiros. Isto não me


desviou absolutamente do meu objetivo; ao contrário,
animou-me a esperança de que, mesmo não me
saindo bem desta empresa, pelo menos me seria
concedida a glória de tê-la iniciado. (Fábulas, prefácio
1668)2

E ainda:

A união faz a força. Quem diz não sou eu,


mas sim o escravo frígio, que outrora escreveu
o que abaixo transcrevo, e se alguma inserção
acrescentei, não foi por querer tornar meu
o que é dele somente. Essa vã pretensão teve Fedro,
não eu, que só quis adaptar nossos costumes de hoje
ao texto original... (livro IV, XVIII)3

La Fontaine deu vida nova a esse gênero literário e


talvez por tê-lo feito tão bem, vigora a ideia de que sua obra
se resume às duzentas e quarenta fábulas e de que seu fazer
artístico é apenas de fabulista. Dandrey (2009, p. 192)
considera esse privilégio concedido às fábulas um tanto
quanto injusto, face à diversidade da inspiração de La
Fontaine e à variedade dos gêneros nos quais o autor se
expressou. Continuando o comentário, Dandrey lista a
grande e diversificada produção lafontainiana: sessenta e
quatro contos, um romance em prosa entremeado de versos,
um idílio heróico, dois libretos de ópera, duas tragédias
(uma lírica e outra incompleta), duas comédias, um balé

2 Neste trabalho, adotamos a tradução do prefácio, de 1668, das


fábulas de La Fontaine, feita por Eugênio Amado (Ed. Itatiaia
1989).
3 Do livro primeiro ao livro sétimo, as traduções são de Eugênio

Amado, a partir do livro oitavo são de Milton Amado. (Ed. Itatiaia


1989)

Sumário
Pesquisas em Tradução | 13

cômico, fragmentos de um sonho, um poema científico, três


epístolas críticas em verso, um poema cristão, duas
paráfrases de textos sagrados, um relato de viagem, seis
elegias, sátiras, odes, baladas, madrigais, sonetos, canções,
epitálamos e epigramas, um pastiche, traduções de versos
latinos, cartas, muitos versos de circunstância e outras obras
perdidas. Esse sucesso e predileção pelas fábulas pode ser
confirmado através de suas reescrituras tanto na língua/
cultura fonte quanto na língua/cultura alvo. Consideramos
reescrituras as categorias elencadas por Lefevère (2007, p.
17): tradução, edição e antologização de textos, compilação
de histórias da literatura e obras de referência e de crítica.
Neste artigo, nosso percurso será balizado pelas
reflexões de André Lefevère tal como exposto em seu
trabalho Tradução, reescrita e manipulação da fama literária.
Além da tradução vista como reescritura, sua perspectiva de
que existe a formação de uma imagem de um determinado
autor no sistema literário de acolhida assim como existe
também, a possibilidade de limitação do discurso literário
provocada pelo componente ideológico presente nas
traduções.
La Fontaine chega pela primeira vez ao Brasil, por
contrabando, no original em francês. De fato, suas fábulas
aqui aportam no final do século XVIII, burlando o controle
de Portugal sobre a circulação de impressos. E mesmo antes,
em meados do século, uma coletânea de contos e novelas
chega em terras brasileiras. As primeiras traduções de sua
obra datam de um pouco mais tarde. Em que medida estas
reescrituras, no sentido de Lefevère (2007), serão absorvidas
pelo sistema literário brasileiro, contribuindo para a
consolidação de uma dada imagem do autor francês, que
imagem é esta e quanto ela permanece presente nos dias
atuais, são os aspectos que tentaremos aprofundar nas
páginas que seguem.

Sumário
14 | O fabulista e a biblioteca

Segundo Ivan Junqueira4, em uma palestra proferida


na Academia Brasileira de Letras sobre o tradutor de poesia
Abgar Renault, existe no Brasil uma tradição clássica de
tradução que começou no século XIX com Odorico Mendes e
com o Barão de Paranapiacaba. Através de investigações
realizadas nos catálogos online da Biblioteca Nacional
pudemos confirmar a afirmação do acadêmico, sobretudo no
que diz respeito às traduções de La Fontaine, realmente suas
traduções em português do Brasil começaram a ser feitas no
século XIX. Descobrimos, contudo, tradutores brasileiros do
autor francês anteriores ao Barão de Paranapiacaba, consi-
derado como o primeiro tradutor no Brasil das fábulas
lafontainianas. O resultado dessa pesquisa é o que mostra-
remos a seguir.
Por uma questão de ordem cronológica, apontaremos
primeiramente a presença das obras originais de La Fontaine
no Brasil. Em seguida apresentaremos o levantamento das
traduções em língua portuguesa das fábulas lafontainianas e
para terminar relacionaremos essas traduções e o seu público
alvo.
A principal fonte de investigação utilizada neste
trabalho foram os catálogos online da Fundação Biblioteca
Nacional. Essa escolha foi feita porque o acervo, de livros,
mais completo do país está ali reunido, e ainda porque boa
parte dos catálogos está disponível para o público através da
internet, o que facilita a pesquisa realizada a distância. A
busca nos catálogos foi feita, inicialmente, a partir da entra-
da: La Fontaine. Em seguida, procuramos também através de
outras entradas, isto é, nomes de alguns tradutores, quando
sabíamos de antemão que eles haviam realizado traduções
de fábulas do autor francês. Esse foi o caso de Monteiro

4Disponível em:
http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?i
nfoid=4248&sid=530,acesso 11/03/12.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 15

Lobato e de Paulo Coelho. As traduções lobatianas não estão


registradas como sendo traduções de La Fontaine, mas sim,
como obra original do autor brasileiro. Uma explicação
possível para Lobato ser catalogado como autor das fábulas
lafontainianas seria o fato de Lobato também ter escrito
fábulas. Quanto à versão das fábulas de Paulo Coelho, assim
como as de Lobato, não foram catalogadas como sendo uma
tradução, mas como obra original desse autor. É interessante
observar nesses dois casos que as noções de autor e a de
tradutor, confundem-se. Embora essa separação autor /
tradutor pareça bem clara nos dias atuais, constatamos que
na realidade a situação é diferente, sobretudo quando o
tradutor é também autor.
Os acervos da Biblioteca Nacional pesquisados foram
respectivamente o acervo Obras Raras e o acervo Geral-Livros.
A entrada nos catálogos era sempre feita através do link
Autores-Pessoas → La Fontaine. Essa escolha foi feita por uma
questão metodológica e cronológica. Vejamos os resultados
obtidos:
 1° Acervo pesquisado: Obras Raras → Catálogo
Antigo Obras Raras (obras catalogadas de 1945 a
1981) através da entrada Autores-Pessoas → 16
Hits encontramos para: lafontaine, jean de..
 2° Acervo pesquisado: Obras Raras → Catálogo
de Obras Raras (obras catalogadas a partir de
1982) através da entrada Autores-Pessoas →0 Hit
para: lafontaine, jean de.;
 3° Acervo pesquisado: Geral-Livros → Catálogo
Antigo através da entrada Autores-Pessoas →6
Hits para: lafontaine, jean de., e 26 Hits para:
lafontaine, jean de, 1621-1695.
 4° Acervo pesquisado: Geral-Livros → Catálogo
Corrente através da entrada Autores-Pessoas → 35
Hits para: lafontaine, jean de.;

Sumário
16 | O fabulista e a biblioteca

 5° Acervo pesquisado: Geral-Livros → pesquisa


livre → Monteiro Lobato fábulas →38 Hits para:
Lobato, Monteiro.
 6° Acervo pesquisado: Geral-Livros → pesquisa
livre → Paulo Coelho fábulas →1 Hits para:
Coelho, Paulo.

Afora a pesquisa nos catálogos da Biblioteca Nacional


(doravante BN), investigamos alguns sites de venda de livros
usados. Os livros encontrados foram praticamente os
mesmos livros que estão catalogados na BN, salvo uma
tradução de 1926 de autoria de Luiz Antonio dos Santos, sem
editora. Outra publicação não registrada pela BN é a
antologia de autores variados lançada pela editora Brasil-
América do Rio de Janeiro em 1968.

Obras originais de La Fontaine no Brasil

A primeira presença de que se tem notícia sobre um


livro de La Fontaine no Brasil é bastante curiosa, data do
século XVIII, ano de 1794 na cidade do Rio de Janeiro. Essa
informação foi encontrada em uma série de docudramas de
10 episódios, feita para a TV Brasil em 2009, chamada
Histórias do Brasil. No 6° episódio intitulado Leituras
Perigosas, encontramos a história de um cirurgião, Manuel
Toledo, que decide burlar o controle da Metrópole sobre a
circulação de livros. Ele quer fazer circular obras literárias e
compra de um contrabandista uma edição das Fábulas de La
Fontaine5. Embora não tenhamos conseguido comprovar
esse fato em relação ao livro de La Fontaine, Gomes (2007, p.
122) faz referência à extinção da Sociedade Literária do Rio

5 Disponível em: http://tvbrasil.org.br/historiasdobrasil/


hotsite/episodio.php?ep=6, acesso em 09/03/12.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 17

de Janeiro exatamente no ano de 1794. Essa sociedade fora


criada em 1786 com o apoio do vice-rei D. Luís de
Vasconcelos e Sousa.
A historiadora e professora Lúcia Bastos6, comentando
sobre o final conturbado do século XVIII e o início do século
XIX, afirma que àquela época, novas ideias estavam
circulando com a independência dos Estados Unidos e com a
Revolução Francesa e que no Brasil colônia, a livre circulação
de livros era proibida, sendo por esse motivo, muito difícil o
exercício da atividade de livreiro ou a existência de livrarias.
Na América portuguesa, havia o medo de se vender
qualquer tipo de livro uma vez que estes poderiam conter,
como se dizia na época, as ideias perigosas dos abomináveis
princípios franceses. No entanto, apesar de todas essas
dificuldades, afirma Bastos, havia livros circulando. Essa
afirmação é confirmada por Cláudia Heynemann, historia-
dora e pesquisadora do Arquivo Nacional7. Segundo
Heynemann “os livros vinham de navio, mesmo. Ou por
contrabando ou por americanos que tinham estado na
Europa, ou por importações, ou por europeus que vinham.”
Ou seja, malgrado a proibição imposta por Portugal, havia
livros circulando em Portugal e no Brasil colônia. Havia
bibliotecas na colônia e algumas continham, de acordo com
Heynemann, “todos os autores franceses que eram,
justamente, aqueles proibidos no Índex”. Heynemann cita
como exemplo a biblioteca do Marquês de Pombal, que
segundo ela, continha livros proibidos.
A partir do levantamento realizado nos catálogos
online da BN, podemos afirmar que a obra mais antiga do
fabulista francês no Brasil data de 1743. Trata-se de um livro

6 Disponível em: http://tvbrasil.org.br/historiasdobrasil/


hotsite/episodio.php?ep=6#hist, acesso em 09/03/12.
7 Disponível em: http://tvbrasil.org.br/historiasdobrasil/
hotsite/episodio.php?ep=6#hist, acesso em 09/03/12.

Sumário
18 | O fabulista e a biblioteca

de Contos e Novelas em verso, escrito em francês e


publicado em Londres. Certamente essa obra pertencera ao
acervo da biblioteca real portuguesa visto que possui o
carimbo da Real Bibliotheca. Segundo Gomes (2007, p. 75-76) a
biblioteca real de Portugal era uma das mais extraordinárias
da Europa e seu acervo era de 60.000 volumes. O autor
comenta ainda que ao fugir de Portugal em 1807 D. João VI
tivera a intenção de trazer todo o acervo da biblioteca,
porém, com a pressa da partida, vários caixotes de livros
ficaram esquecidos no cais de Lisboa. Somente em 1811, com
a vinda do arquivista real, Luiz Joaquim Marrocos, chegou a
segunda e última remessa de livros.
Composto por um número considerável de 31 livros, o
acervo de obras originais de La Fontaine é basicamente
formado por obras raras e antigas. Catalogado entre as obras
em francês, há também um livro em esperanto, editado em
1906, trata-se de uma tradução de G. Vaillant de uma seleção
de fábulas. Segundo as informações contidas nas fichas
catalográficas da BN, alguns livros do século XVIII de
autoria de La Fontaine também pertenceram à Real
Bibliotheca portuguesa, visto que possuem o carimbo dessa
biblioteca real. Outros livros de La Fontaine publicados no
século XIX e catalogados na BN contêm uma dedicatória a D.
Pedro II, isso significa que esses volumes provavelmente
compunham sua biblioteca particular. Pensando no conceito
de alta e baixa literatura ao qual se refere Lefevère (2007,
p.15), podemos observar que desde essa época, séculos XVIII
e XIX, a obra de La Fontaine é considerada alta literatura uma
vez que está presente nas bibliotecas reais e que é fonte de
reescrituras. Segundo esse autor, a divisão entre alta literatura
e baixa literatura teria aparecido em meados do século XIX e
também teria gerado uma divisão entre alta e baixa
reescritura de literatura.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 19

Autor Título Ano Editor


La Contes et nouvelles en 1743 Londres :
Fontaine vers [s.n.]
• carimbo da Real
Bibliotheca
La Fables choisies et mises 1756 Paris:
Fontaine en vers Chez Desaint et
• carimbo da Real Saillant
Bibliotheca
La Contes et nouvelles en 1762 Amsterdam :
Fontaine vers [s.n.]
• carimbo da Real
Bibliotheca
(Casa do Infantado)
La Fables choisies et mises 1792 Lausanne:
Fontaine en vers Chez François
Lacnube
Quadro 1: obras do século XVIII em francês

Como mostra o quadro acima, das quatro publicações


de La Fontaine existentes nos catálogos da BN, do século
XVIII, três contêm o carimbo da Real Bibliotheca. Isto quer
dizer que esses livros chegaram ao Brasil no início do século
XIX, entre 1808 e 1811, ou seja, o ano da chegada da família
real portuguesa ao Brasil e o ano da chegada da segunda
remessa de livros. Já o livro Fables choisies et mises en vers que
não contém o carimbo da biblioteca real, talvez tenha
pertencido a uma biblioteca particular. Desses quatro livros,
dois são de fábulas e dois de contos e novelas. O livro Contes
et nouvelles en vers, editado em Amsterdam no ano de 1762
foi catalogado em dois acervos: o acervo Obras Raras →
Catálogo Antigo Obras Raras; e o acervo Geral-Livros→
Catálogo Antigo. Os outros três livros foram catalogados
apenas no acervo Geral-Livros → Catálogo Antigo.

Sumário
20 | O fabulista e a biblioteca

Autor Título Ano Editor


La Fables de La Fontaine 1839 Paris:
Fontaine Armand
Aubrée
La Fables et œuvres diverses 1846 Paris: Lib. de
Fontaine F. Didot Frères
La Fables 1855 Paris: Garnier
Fontaine Frères
La Le premier livre des fables 1874/75 Paris: Lib. de
Fontaine de La Fonatine L’éche de la
Sorbonne
La Œuvres... théâtre, fables, 1877 Paris: Laplace
Fontaine poésies
Autor Les intrigues de Molière et 1877 Paris:
suposto celles de sa Femme ou La Isidore Liseux
La Fameuse comédienne
Fontaine • dedicado à D. Pedro II
La Fables de La Fontaine 1877 Tours: Alfred
Fontaine Mme. et Fils
Esopo Fables choisies d’Esope. 1878 Paris: Garnier
Nouvelle éd. Classique en
vue de l’étude simultanée
de la grammaire et des
racines, suivie des fables
imitées d’èsope par La
Fontaine et d’un lexique
nouveau
La Psyché 1880 Paris: Librairie
Fontaine des
Bibliophiles
La Fables 1883 Paris: E. Plen
Fontaine
La Contes de La Fontaine avec 1884 Paris:
Fontaine des illustrations A. Le Vasseur
de Fragonard
La Fables 1885 Paris: Librairie
Fontaine des
Bibliophiles
La Contes et nouvelles en vers 1895 Paris:
Fontaine A. Le Vasseur
et cie.
Quadro 2: obras do século XIX em francês

Sumário
Pesquisas em Tradução | 21

Conforme se vê no quadro acima, são em número de


treze as obras de La Fontaine publicadas no século XIX
catalogadas na BN. A maioria dos volumes é de fábulas, oito
ao todo. Há um livro de obras diversas, um sobre Molière e
La Fontaine, de suposta autoria de La Fontaine e que foi
dedicado a D. Pedro II, dois livros de contos e Psyché, um
romance em prosa entremeado de versos, segundo o próprio
autor, um récit poétique. Todos os livros foram editados na
capital francesa, à exceção de um de fábulas que foi
publicado em Tours. Das treze obras, cinco estão catalogadas
no acervo Obras Raras → Catálogo Antigo Obras Raras e oito
estão no acervo Geral-Livros → Catálogo Antigo. Curio-
samente a obra Fables choisies d’Esope, de autoria do escritor
grego, aparece na pesquisa → La Fontaine, fato que poderia
ser explicado devido à inclusão das versões lafontainianas
das fábulas gregas. Ainda nessa coleção há um livro raro de
contos ilustrados por Fragonard, pintor francês de estilo
rococó, do século XVIII.

Autor/Tradutor Título Ano Editor


La Fontaine Elektitaj fabeloj, 1906 Paris: Hachette
• trad. G. Vaillant de De La
Fontaine
La Fontaine Fables de La 1906 Paris:
Fontaine Jules Tallandier
La Fontaine Fables 1928 Paris: Lib. A.
Quillet
La Fontaine Fables de La 1929 Paris: Aux depens
Fontaine d’un amateur
La Fontaine Contes et 1931 Paris: Editions
nouvelles Nilsson
La Fontaine Fables 1941? Paris
La Fontaine Fables de La 1943? Rio de Janeiro:
Fontaine et Liv. Paulo de
d’autres Azevedo & c.
fabulistes
français

Sumário
22 | O fabulista e a biblioteca

La Fontaine Les fables de La 1944 Rio de Janeiro:


Fontaine Americ-edit
La Fontaine Œuvres 1948 Paris: Gallimard
diverses ;
• texte établi et
annoté par P.
Clarac
La Fontaine La Fontaine par 1961 Paris: Ed. du Seuil
lui même
Quadro 3: obras do século XX em francês

Entre as dez publicações elencadas no Quadro 3,


catalogadas no acervo da BN, sete são de fábulas de La
Fontaine sendo oito editadas em Paris e duas editadas em
língua francesa na cidade do Rio de Janeiro. Como já
mencionamos anteriormente, catalogado entre os originais
de La Fontaine, encontra-se uma tradução, Elektitajfabeloj, em
esperanto, feita por G. Vaillant. Trata-se de uma seleção de
fábulas do autor francês. Dentro da série Écrivains de toujours
da editora Éditions du Seuil, está o livro de 1961 La Fontaine
par lui-même. Essa série publicou a biografia de 55 escritores.
A biografia de La Fontaine tem apresentação de Pierre
Clarac e foi editada8 cinco (5) vezes; em 1961, 1962, 1963,1966
e 1967. A coletânea Œuvres diverses de 1948 é outro livro
sobre as obras de La Fontaine anotado e comentado por
Pierre Clarac.

8Disponível em: http://www.worldcat.org/title/fontaine-par-lui


meme/oclc/804380/editions?editionsView=true&referer=br.
Acesso em 17/03/12.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 23

Autor Título Ano Editor


La Fontaine Fables s.d. s.n.
Joseph Xavier Les deux pigeons, s.d. Marais: Imp.
Boniface comédie-vaudeville, em De Va
Saintine; quatre actes, imités de La Dondey-
conhecido Fontaine Dupré
como
La Fontaine Fables poétique choisies s.d. Paris:
Desaint&
Saillant
La Fontaine Fables s.d. Paris: Aux
• illustrées d’aquerelles éditions de la
par Jacques Touchet Belle Étoile
Quadro 4: livros sem data em francês

Desses quatro livros sem data, elencados no Quadro 4,


dois pertencem ao acervo Obras Raras → Catálogo Antigo
Obras Raras e dois ao acervo Geral-Livros → Catálogo
Antigo. Pelas pesquisas realizadas até o momento, embora
não tenhamos a certeza do ano de edição, podemos deduzir
que são publicações do século XVIII ou do século XIX visto
que estão catalogados no acervo de obras raras e de obras
antigas.

Obras traduzidas de La Fontaine no Brasil

Tomando como referência o acervo da BN, pode-se


dizer que, no Brasil, as obras de La Fontaine começaram a
existir em língua portuguesa no século XIX e que, desde
então, nunca deixaram de ser traduzidas. A tradução mais
antiga de uma obra lafontainiana catalogada na BN, data de
1839, e o suposto tradutor é Francisco Manoel do
Nascimento. Composto por um total de oitenta e nove livros,
o grupo das obras traduzidas de La Fontaine, tem como
característica ser formado por um único gênero literário, isto

Sumário
24 | O fabulista e a biblioteca

é, o gênero fábula. Para os leitores brasileiros que não lêem


em francês, é como se La Fontaine só tivesse escrito fábulas.
Com o grande número de traduções ao longo do século XX e
começo do século XXI, apesar de serem classificadas como
literatura infanto-juvenil, as fábulas de La Fontaine
continuam fazendo parte do cânone literário no Brasil.
Entendemos como cânone literário, obras ou autores que
fazem parte de um sistema literário porque são considerados
como modelo da poética codificada por aquele sistema.
Segundo Lefevère, (2007, p. 43) “a canonização influencia
grandemente a disponibilidade de uma obra literária”. Daí, a
inclusão das fábulas lafontainianas em coleções de clássicos
literários universais, como, por exemplo, a coleção Grandes
obras da cultura universal: clássicos de sempre da editora Itatiaia
de Belo Horizonte.
O fato de somente as fábulas serem traduzidas no
Brasil confirma o pensamento de Lefevère quanto ao poder
das reescrituras:

No passado, assim como no presente, reescritores


criaram imagens de um escritor, de uma obra, de um
período, de um gênero e, às vezes, de toda uma
literatura. Essas imagens existiam ao lado das
originais com as quais elas competiam, mas as
imagens sempre tenderam a alcançar mais pessoas do
que a original correspondente e, assim, certamente o
fazem hoje. (2007, p. 18-19)

Devido ao grande número de traduções de La Fontaine


nos acervos da BN, são oitenta e nove volumes ao todo,
apresentaremos no corpo deste trabalho apenas o quadro
detalhado das publicações do século XIX. Quanto aos séculos
XX e XXI, apresentaremos um comentário resumido das
traduções.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 25

Tradutor Título Ano Editor


Tradução Fábulas escolhidas 1839 Rio de Janeiro:
[sup.] de de La Fontaine Typographia,
Francisco Chalcographia e
Manoel do Livraria da
Nascimento Educação de C.
H. Furay
Justiniano José Collecção de 1852 Rio de Janeiro:
da Fabulas imitadas de Typographia
Rocha Esopo e de La Episcopal de
Fontaine Agostinho de
• dedicada a S. M. Freitas Guimarães
o Imperador D.
Pedro II e
oferecida à
mocidade das
escolas
Justiniano José Collecção de fábulas 1863 Rio de Janeiro:
da imitadas de Esopo e Typographia
Rocha de La Fontaine Nacional
• dedicada a S. M.
o Imperador D.
Pedro I I – 3ª
Edição
Justiniano José Collecção de 1873 Rio de Janeiro:
da Fabulas imitadas de Typographia
Rocha Esopo e de La Cinco de Março
Fontaine
• dedicada a S. M.
o Imperador D.
Pedro II. Nova
edição adoptada
para leitura das
escolas
municipais da
corte

Sumário
26 | O fabulista e a biblioteca

Barão de O 1° livro das 1883 Rio de Janeiro:


Paranapiacaba fábulas Typographia
• vertidas do Nacional
francez e
offerecidas ao
governo imperial
para uso das
escolas de
instrucção
primária
Vários Fábulas de La 1886 Lisboa, Rio de
tradutores Fontaine Janeiro: David
Corazzi ; José de
Mello
Barão de Fábulas de La 1886 Rio de Janeiro:
Paranapiacaba Fontaine Imprensa
Nacional
Quadro 5: livros do século XIX em português

O acervo da BN de obras de La Fontaine traduzidas


para o português no século XIX é composto por sete livros. A
partir do Quadro 5 podemos constatar que todas as obras de
La Fontaine em português são traduções de fábulas. Apesar
de editada no Rio de Janeiro, a tradução mais antiga que ali
existe é portuguesa. Ela é atribuída ao Padre Francisco
Manoel do Nascimento9, um clérigo lisboeta nascido em 1734
que, fugindo da inquisição, viveu em Paris até a sua morte
em 1819. Por ordem cronológica, a segunda tradução mais
antiga é a de Justiniano José da Rocha, o primeiro brasileiro a
traduzir no Brasil uma imitação de fábulas de La Fontaine.
Seu trabalho foi dedicado a D. Pedro II e destinado ao uso
em escolas primárias, tendo sido editado quatro vezes, uma

9 Disponível em: http://www.dec.ufcg.edu.br/ biografias/


FilintEl.html. Acesso em 10/03/12.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 27

delas em 190710. Talvez pelo fato de ter traduzido, em verso,


a totalidade das fábulas, João Cardoso de Menezes e Sousa, o
Barão de Paranapiacaba, é considerado como o primeiro
tradutor brasileiro de La Fontaine. A partir das traduções do
século XIX, é interessante sublinhar a mudança de status da
obra de La Fontaine no Brasil. Com o passar do tempo, as
fábulas deixaram de ser leitura proibida, para ser leitura oficial
adotada nas escolas municipais da corte além de fazer parte
da biblioteca pessoal do Imperador.

Século XX e século XXI

As traduções de La Fontaine do século XX catalogadas


na BN somam um total de 60 publicações. Vinte e seis livros
são traduções de diversos autores e trinta e quatro de
Monteiro Lobato. A primeira tradução de Lobato data de
1922. Essa tradução foi reeditada com frequência e continua
a sê-lo. A última tradução lobatiana de fábulas de La
Fontaine, catalogada na BN, é uma edição de 2010 e trata-se
de um audiolivro. Pelo que podemos constatar nos catálo-
gos, há anos em que houve mais de uma edição das fábulas de
Lobato.
Assim como no século precedente, no século XXI as
vinte e duas traduções de La Fontaine são de fábulas. Dessas
vinte e duas traduções, dezoito foram realizadas por autores
variados e quatro são reedições de Lobato.
Alguns autores brasileiros além Monteiro Lobato e de
Paulo Coelho, já citados anteriormente, traduziram fábulas
lafontainianas. Entre eles estão Machado de Assis, Ferreira
Gullar e Mário Laranjeira.

10 Disponível em: http://www.cdpb.org.br/dic_bio_biblio


grafico_rochajustiniano.html. Acesso em 10/03/12

Sumário
28 | O fabulista e a biblioteca

Várias traduções são adaptações direcionadas para o


público infantil. Algumas editoras como a Kuarup de Porto
Alegre, a Escala Educacional, a Rideel, e a Scipione, todas
editoras de São Paulo, lançaram suas adaptações de fábulas
do autor francês.

Público alvo

O público alvo brasileiro de traduções de fábulas de La


Fontaine desde o século XIX sempre foi o infanto-juvenil. As
primeiras traduções brasileiras de La Fontaine, tanto a
tradução de Justiniano José da Rocha quanto à tradução do
Barão de Paranapiacaba, todas foram direcionadas ao públi-
co escolar. Mas, e quanto ao gênero textual das traduções?
Teria um público alvo força para mudar o gênero textual de
um texto fonte? Ao analisar as fichas catalográficas da BN,
pudemos constatar que poucas traduções de La Fontaine são
em verso, excetuando-se um pequeno número, a maioria é
de adaptações em prosa. Logo, a resposta à pergunta, for-
mulada anteriormente, é sim. A mudança no gênero textual
do texto fonte talvez possa ser explicada pelo público alvo ao
qual é direcionada a tradução, mas não apenas, é preciso
sublinhar. O fato de a grande maioria das reescrituras
brasileiras atuais serem em prosa seria explicado pelo seu
público alvo, mas também por características de nosso
sistema literário.

Conclusão

Ao analisar as fichas catalográficas da BN de traduções


de La Fontaine para o português brasileiro, pudemos
constatar mais fortemente o poder das reescrituras na criação
de algumas imagens atreladas ao autor. Em primeiro lugar, a

Sumário
Pesquisas em Tradução | 29

imagem construída pelas reescrituras de La Fontaine no


Brasil, é restrita a de um escritor de fábulas. Em segundo
lugar, poucas são as traduções em verso, excetuando-se um
pequeno número, a grande maioria é de adaptações em
prosa. Ou seja, a imagem das fábulas lafontainianas em
terras brasileiras é a de fábulas escritas em prosa. Em terceiro
lugar, outra imagem predominante no Brasil é a de que as
fábulas de La Fontaine são exclusivamente literatura infanto-
juvenil. Não queremos indicar com isso que La Fontaine não
tenha um público leitor infanto-juvenil, em seu país de
origem como em outros. Mas diferentemente daqui, em
muitos outros países, e sobretudo na França, suas obras
também são dirigidas ao público adulto.
Constatamos, ainda, que várias edições recentes das
fábulas são, na realidade, reedições de antologias antigas.
Essas reedições são todas compostas pelas mesmas fábulas e
pelas mesmas traduções. Os tradutores são escritores
brasileiros e portugueses do século XIX. Geral-mente essas
antologias possuem ilustrações de Gustave Doré, artista
francês também do século XIX. Ou seja, não há mais direitos
autorais a pagar nem para os tradutores nem para o
ilustrador.
A história das obras de La Fontaine no Brasil é, por-
tanto, uma história construída através de suas reescrituras. A
imagem do autor francês por aqui está reduzida a de um
fabulista infanto-juvenil. Essa construção é resultado de
diversos fatores que interagem em nosso sistema literário, no
qual tradutores, editores e leitores estão envolvidos. As
investigações nos catálogos da BN evidenciam a grande
importância da tradução como componente fundamental do
sistema literário brasileiro, na medida em que o forma e
modifica a partir de seu fluxo complexo, na interação com os
demais atores do sistema e na construção, muitas vezes
inconsciente, de imagens próprias de uma literatura e autor
estrangeiros.

Sumário
30 | O fabulista e a biblioteca

Referências

BERMAN, Antoine. A prova do estrangeiro: cultura e tradução na


Alemanha romântica. Trad. Maria Emília Pereira. Bauru: Editora da
Universidade do Sagrado Coração, 2002.
BUTOR, Michel. Petite histoire de la littérature française. Coffret
composto por 6 CDs, 1 DVD e 1 livro. Paris : Carnets Nord, 2008.
DANDREY, Patrick. Quand Versailles était conté - La cour de Louis
XIV par les écrivains de son temps. Paris :Les belleslettres, 2009.
GOMES, Laurentino. 1808: como uma rainha louca, um príncipe
medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a história
de Portugal e do Brasil. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2007.
LA FONTAINE, Jean de. Fábulas de La Fontaine. Trad. Milton
Amado e Eugênio Amado. Belo Horizonte: Itatiaia, 1989.
LEFEVERE, André. Tradução, reescrita e manipulação da fama literária.
Trad. Claudia Matos Seligmann. Bauru, SP: Edusc, 2007.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 31

Aglaé FERNANDES
Universidade Federal da Paraíba

Ao estrear em 1917, com A cinza das horas, Manuel


Bandeira (1886-1968) tinha mais de trinta anos de idade e já
acumulava boa experiência como leitor de poesia. Esta
maturidade intelectual aliada a um especial talento para a
assimilação de técnicas e estilos diversos favoreceu suas
atividades de poeta. De fato, encontra-se em sua obra
poética número elevado de textos assumidamente derivados
de temas, estilos e técnicas característicos de outros autores.
Para além das usuais paródias geralmente presentes
nas obras de poetas da primeira fase modernista, a poética
de Bandeira é marcada por uma frequência incomum de
transtextualidades. Este traço técnico-estilístico presente na
obra aponta para um projeto poético deliberadamente
focado no dialogismo.
Dentre as propostas teóricas de classificação das
relações textuais surgidas no século XX, a proposta de
Gérard Genette, em Palimpsestes (1982:11-12), parte da noção
de hipertextualidade, que ele define como sendo “toute
relation unissant un texte B à un texte antérieur A sur lequel
il se greffe d’une manière qui n’est pas celle du
commentaire”. Em seguida, o teórico distingue as relações
de transformação e imitação que unem os textos anteriores,
hipotextos, aos posteriores, hipertextos. Essas relações estão
classificadas segundo o regime ou funções, a saber: lúdico,
satírico e sério.
Acerca das relações entre textos, Berman (2007; p. 34)
avalia sua conexão com a tradução:

Sumário
32 | P o e s i a , tradução e hipertexto

Um texto pode imitar um outro texto, fazer um


pastiche, uma paródia, uma recriação livre, uma
paráfrase, uma citação, um comentário, ou ser uma
mescla de tudo isso. Como mostraram Bakhtin,
Genette ou Compagnon, há uma dimensão essencial
da “literatura”. Todas essas relações hipertextuais se
caracterizam por uma relação de engendramento
livre, quase lúdico, a partir de um “original”. Ora, do
ponto de vista da estrutura formal, essas relações
estão muito próximas da tradução.

Bandeira não tinha nenhum pudor em jogar, brincar


com os textos de outros poetas. Ele recorria às trans-
textualidades, ora desautomatizando clichês, ora como
instrumentos que promoviam, virtualmente, a dilatação do
seu próprio texto. Isto parecia constituir um verdadeiro
laboratório de experimentos lúdico-poéticos que, ao longo
dos anos, afinaram o poeta e o tradutor de poesia. Um dos
inúmeros exemplos está neste despretensioso A Guimarães
Rosa (BANDEIRA, 2009, p. 344), que retoma e modifica os
célebres versos da Canção do Exílio, de Gonçalves Dias:

Não permita Deus que eu morra


Sem que ainda vote em você;
Sem que, Rosa amigo, toda
Quinta-feira que Deus dê,
Tome chá na Academia
Ao lado de vosmecê,
(...).

Outro exemplo é o da Balada das Três Mulheres do


Sabonete Araxá, sobre a qual Bandeira disse que “O trabalho
de composição está em eu ter adequado às circunstâncias de
minha vida fragmentos de poetas queridos e decorados em
minha adolescência – Bilac, Castro Alves, Luís Delfino,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 33

Eugênio de Castro, Oscar Wilde”. (BANDEIRA, 2009, p. 600-


601).
Em um estudo detalhado dos hipertextos de sua obra
será possível encontrar todos os tipos categorizados por
Genette. Algumas vezes, as transtextualidades estão anun-
ciadas nos títulos, como em Nietzschiana; Poema desen-
tranhado de uma prosa de Augusto Frederico Schmidt;
Haicai tirado de uma falsa lira de Gonzaga; Soneto plagiado
de Augusto Frederico Schmidt etc. A última parte do Mafuá
do Malungo tem o título “À maneira de”, cujos poemas
trazem no título o nome do poeta homenageado, indicando o
estilo a partir do qual Bandeira compõe seu poema, a saber:
Alberto de Oliveira; Olagário Mariano; Augusto Frederico
Schmidt e E.E.Cummings.
Sobre este aspecto da poética bandeiriana, Lêdo Ivo (
2009, p. CCII) comentou:

Note-se que o virtuosismo parodístico integra a cons-


telação das habilidades de Bandeira, notável tradutor,
adaptador e até desentranhador de poemas ocultos na
prosa. E uma de suas realizações mais pessoais, o
“Profundamente”, é na realidade uma transplantação
comovente e magnífica de certos poemas do Spoon
River Anthology, do poeta norte-americano Edgar Lee
Masters, especialmente “The Hill” (...).

Massaud Moisés (2009, p. CCXVIII), não deixou de


perceber que

(...) Casimiro de Abreu empresta-lhe dois versos


inteiros em “Cotovia” – “Aurora da minha vida,/ Que
os anos não trazem mais!” -; Sá de Miranda, outros
tantos (“Elegia de verão”): “Ó sol grande. Ó coisas./
Todas vãs, todas mudaves!”.

Sumário
34 | P o e s i a , tradução e hipertexto

Alguns hipertextos foram escritos e publicados com a


expressa intenção de chacotear a “velha poesia” e divulgar o
espírito lúdico largamente ostentado nos primeiros anos
após a Semana. Sobre o poema Os sapos, Bandeira (2009, p.
579) confessou:

A propósito desta sátira, devo dizer que a dirigi mais


contra certos ridículos do pós-parnasianismo. É ver-
dade que nos versos
A grande arte é como
Lavor de joalheiro
parodiei o Bilac da “Profissão de fé” (“Imito o ourives
quando escrevo...”). Duas carapuças havia, endere-
çada uma ao Hermes Fontes, outra ao Goulart de
Andrade.

Adiante, ele comenta (op.cit., p. 580)

Naturalmente a sátira dos ”Sapos” estava a calhar


como número de combate e, com efeito, por ocasião
da Semana de Arte Moderna, três anos depois, foi o
meu poema bravamente declamado no Teatro Muni-
cipal de São Paulo pela voz de Ronald de Carvalho
sob os apupos, os assobios, a gritaria de “foi não foi”
da maioria do público, adversa ao movimento.

Três paródias, denominadas por Bandeira de “tradu-


ções para o moderno”, foram publicadas pela primeira vez
em 1925, na seção “Mês modernista” do jornal A noite.
Seguem os hipotextos de Bocage, Castro Alves e Joaquim
Manuel de Macedo, a partir dos quais Bandeira criou os
hipertextos, que aparecem à direita:

Sumário
Pesquisas em Tradução | 35

Bocage Bandeira

Se é doce no recente, ameno Estio Doçura de, no estio recente,


Ver toucar-se a manhã de etéreas Ver a manhã toucar-se de
flores, flôres,
E, lambendo as areias e os E o rio
verdores, mole
Mole e queixoso deslizar-se o rio; queixoso
Se é doce o inocente desafio Deslizar, lambendo areias e
Ouvirem-se os voláteis amadores, verduras:
Seus versos modulando e seus Doçura de ouvir as aves
ardores Em desafio de amôres
Dentre os aromas de pomar cantos
sombrio; risadas
Se é doce mares, céus ver anilados Na ramagem do pomar
Pela quadra gentil, de Amor sombrio
querida,
Que esperta os corações, floreia os
prados,
Mais doce é ver-te de meus ais
vencida,
Dar-me teus brandos olhos
desmaiados
Morte, morte de amor, melhor
que a vida.

Adeus de Teresa - Castro Alves Teresa – Bandeira

A vez primeira que vi Teresa, A primeira vez que vi


Como as plantas que arrasta a Teresa
correnteza, Achei que ela tinha pernas
A valsa nos levou nos giros seus... estúpidas
E amamos juntos... E depois na Achei também que a cara
sala parecia uma perna
"Adeus" eu lhe disse a tremer co'a Quando vi Teresa de novo
fala... Achei que os olhos eram
E ela, corando, murmurou-me: muito mais velhos que o
"adeus". resto do corpo

Sumário
36 | P o e s i a , tradução e hipertexto

(os olhos nasceram e


Uma noite... entreabriu-se um ficaram dez anos esperando
reposteiro... que o resto do corpo
E da alcova saía um cavaleiro nascesse)
Inda beijando uma mulher sem Da terceira vez não vi mais
véus... nada
Era eu... Era a pálida Teresa! Os céus se misturaram com
"Adeus" lhe disse conservando-a a terra
presa... E o espírito de Deus voltou
E ela entre beijos murmurou-me: a se mover sobre a face das
"adeus!" águas

Passaram tempos... séculos de


delírio
Prazeres divinais... gozos do
Empíreo...
...Mas um dia volvi aos lares
meus.
Partindo eu disse – "Voltarei!
descansa!..."
Ela, chorando mais que uma
criança,
E ela em soluços murmurou-me:
"adeus!"

Quando voltei... era o palácio em


festa!...
E a voz d'Ela e de um homem lá
na orquestra
Preenchiam de amor o azul dos
céus.
Entrei!... Ela me olhou branca...
surpresa!
Foi a última vez que vi Teresa!...
E ela arquejando murmurou-me:
"adeus!"

Sumário
Pesquisas em Tradução | 37

Macedo Bandeira

Mulher, irmã, escuta-me: não Teresa, se algum sujeito


ames. bancar o sentimental em
Quando a teus pés um homem cima de você
terno e curvo E te jurar uma paixão do
Jurar amor, chorar pranto de tamanho de um bonde
sangue, Se ele chorar
Não creias, não mulher: ele te Se ele se rasgar todo
engana! Não acredita não Teresa
As lágrimas são galas de mentira Se ele se ajoelhar
E o juramento manto da perfídia. É lágrima de cine
É tapeação
Mentira
CAI FORA.

Há caso em que a relação com outro texto vem citada


em epígrafe, como no poema Alegria de Nossa Senhora, de
Opus 10 (1952), onde se lê “(texto de oratório extraído do
poema de uma monja carmelita)”. Verifica-se também
inúmeros casos de auto-hipertextualidade, a exemplo dos
poemas Nova poética, que tem como hipotexto o poema
Poética, ou em Antologia, este último composto inteiramente
de versos de outros poemas.
À parte os hipertextos antecipados pelos títulos ou
indicados por outros elementos nos poemas, encontramos
em O ritmo dissoluto (1924) um caso particular de hiper-
textualidade no poema Balõezinhos. Nele, o leitor avisado
não pode deixar de perceber o quanto este texto carrega uma
poeticidade que, sob diversos aspectos, se aproxima do
poema “Les effarés”, de Rimbaud, (publicado em Les poètes
maudits, em 1884).
Seguem os poemas:

Sumário
38 | P o e s i a , tradução e hipertexto

Balõezinhos

Na feira-livre do arrabaldezinho
Um homem loquaz apregoa balõezinhos de cor:
- "O melhor divertimento para as crianças!"
Em redor dele há um ajuntamento de menininhos pobres,
Fitando com olhos muito redondos os grandes balõezinhos
muito redondos.

No entanto a feira burburinha.


Vão chegando as burguesinhas pobres,
E as criadas das burguesinhas ricas,
E as mulheres do povo, e as lavadeiras da redondeza.

Nas bancas de peixe,


Nas barraquinhas de cereais,
Junto às cestas de hortaliças
O tostão é regateado com acrimônia.

Os meninos pobres não vêem as ervilhas tenras,


Os tomatinhos vermelhos,
Nem as frutas,
Nem nada.

Sente-se bem que para eles ali na feira os balõezinhos de cor


são a única mercadoria útil
[e verdadeiramente indispensável.

O vendedor infatigável apregoa:


- "O melhor divertimento para as crianças!"
E em torno do homem loquaz os menininhos pobres fazem
um círculo inamovível de desejo
[e espanto.

Les Effarés

Noirs dans la neige et dans la brume,


Au grand soupirail qui s’allume,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 39

Leur culs en rond,

À genoux, cinq petits, - misère ! –


Regardent le boulanger faire
Le lourd pain blond.

Ils voient le fort bras blanc qui tourne


La pâte grise, et qui l’enfourne
Dans un trou clair.

Ils écoutent le bon pain cuire.


Le boulanger au gra sourire
Chante un vieil air.

Ils sont blottis, pas un ne bouge,


Au souffle du soupirail rouge,
Chaud comme un sein.

Quand, pour quelque médianoche,


Façonné comme une brioche,
On sort le pain,

Quand, sur les poutres enfumées,


Chantent les croûtes prfumées,
Et les grillons,

Comme ce trou chud souffle la vie,


Ils ont leur âme si ravie,
Sous leurs haillons,

Ils se sentent si bien vivre,


Les pauvres Jésus pleins de givre,
Qu’ils sont là, tous,

Collant leurs petits museaux roses


Au grillage, grognant des choses
Entre les trous,

Sumário
40 | P o e s i a , tradução e hipertexto

Tous bêtes, faisant leurs prières,


Et repliés vers ces lumières
Du ciel rouvert,

Si fort, qu’ils crèvent leur culotte,


Et que leur chemise tremblote
Au vent d’hiver.

Os poemas "Les effarés" e "Balõezinhos" se distinguem,


em primeiro lugar, pela forma. O primeiro, em forma fixa, é
composto de doze tercetos, cujos primeiro e segundo versos
são octossílabos e o terceiro tetrassílabo. Quanto à rima,
obedece ao padrão aab ccb, ou seja o tetrassílabo da primeira
estrofe rima com o da segunda, o da terceira com o da quarta
e assim sucessivamente. Já o poema de Bandeira é composto
de versos livres dispostos em seis estrofes, em que as quatro
primeiras são quadras. A quinta tem um só verso e a última
três versos. A diferença formal aponta, em cada um dos
poemas, para o momento histórico-literário dos poetas:
Rimbaud parnasiano e Bandeira deixando sua fase parna-
siana e consolidando sua fase modernista.
Ao fazermos uma leitura mimética dos poemas,
percebemos uma distinção evidente do ponto de vista
temático. Em “Les effarés”, Rimbaud colhe um instantâneo
de uma cena quotidiana, onde cinco meninos observam,
através de uma clarabóia, o interior de uma padaria onde um
padeiro prepara pães. Em Balõezinhos, Bandeira foca as
imagens de uma feira livre, onde um grupo de meninos
observa balõezinhos de cor que são oferecidos por um
vendedor.
Observamos que os temas de onde partem os dois
poemas são evidentemente diversos, porém os dois textos
revelam uma derivação hipertextual. O olhar do grupo de
crianças, focado em um objeto que representa o seu desejo,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 41

aparece no poema de Bandeira, resgatando aquele visto no


poema de Rimbaud.
Mas se esse olhar coletivo ante o objeto do desejo é
comum aos dois poemas, a maneira com que os poetas o tra-
tam é distinta: a partir mesmo do título, vemos que Rimbaud
destaca os sujeitos da ação, enfaticamente nominados no
adjetivo substantivado effarés. Já no poema de Bandeira, o
destaque é o próprio objeto do desejo: balõezinhos.
A ação narrada apresenta uma aproximação bem
evidente quanto às figuras humanas protagonistas da cena:
um adulto, do sexo masculino detém o poder sobre o objeto
do desejo do grupo de meninos pobres. Em ambos os casos,
vale notar, o objeto do desejo não está ao alcance. Essa
impossibilidade provoca a persistência do olhar que se
prolonga em torno do objeto e esse efeito de prolongamento
é obtido nos dois poemas de maneira similar: no poema de
Bandeira, a última estrofe retoma a descrição da visão
alumbrada inscrita na primeira estrofe. Em Rimbaud, as
últimas estrofes retomam a descrição dos meninos diante do
seu objeto de desejo, presente nas primeiras estrofes.
No desenvolvimento do poema, os dois poetas
descrevem o ambiente circundante, o contexto da cena. Em
Rimbaud, os detalhes da atividade do padeiro, sua atitude e
os detalhes da fabricação do pão. Em Bandeira, têm-se os
detalhes da feira, as consumidoras, a atividade comercial, os
produtos comercializados.
As precisões em Rimbaud estão principalmente na
menção às cores (negros, louro, branco, cinza, vermelho),
odores (crostas perfumadas) e sons (cantam, murmura).
Bandeira faz evocações visuais (o movimento das pessoas, as
cores das mercadorias - tomatinhos vermelhos, ou sugeridas
como em ervilhas tenras), o olfato também é sugerido nas
mercadorias (peixe, frutas etc.) e a audição vem no verbo
burburinha. Nos dois poemas, os adjetivos qualificativos são
igualmente abundantes.

Sumário
42 | P o e s i a , tradução e hipertexto

O dinamismo da ação é reforçado pela acumulação das


formas verbais que se encontram exclusivamente no
presente do indicativo e no gerúndio, em ambos os poemas.
No de Rimbaud, temos: regardent, enfourne, écoutent, grogne,
chantent, se ressentent, sont, crevent. E no participe présent,
modo que corresponde em português ao gerúndio: collant,
grognant, faisant. Em Bandeira encontramos: apregoa (duas
vezes), há, é, vêem, sente-se, são, fazem. E os gerúndios fitando e
chegando. Observe-se que são oito formas verbais no pre-
sente, em cada um dos poemas, enquanto as formas no
gerúndio aparecem três vezes em “Les effarés” e duas vezes
em Balõezinhos; há também o detalhe do verbo “sentir (-se)”
e “se ressentir” (em francês), aproveitado pelos dois autores.
Além desses aspectos, até aqui tratados, que aproxi-
mam os dois textos, vemos ainda como semelhante a atitude
do eu poético que não se presentifica no texto de maneira
tradicional (através de marcas de 1ª pessoa) mas deixa
transparecer a subjetividade através do uso de diminutivos.
A esse respeito, César Teixeira (2002, p. 226) aponta em sua
leitura de Balõezinhos:

Apenas aparentemente ausente, o eu lírico se inscreve


no texto através de uma linguagem afetiva que acusa,
desde o início, a proximidade com o ângulo de visão
das crianças Na seqüência, o diminutivo, embora com
sutis diferenças, continuará dando o tom fundamental
da enunciação, sendo elevado à condição de um
verdadeiro gesto lingüístico, já carrega uma alta dose
de expressividade ao colocar em evidência a atitude
do sujeito diante dos fatos observados.

Podemos falar então de um certo registro infantilizado


da linguagem que, como rendimento estético, além de pre-
sentificar o eu poético, ainda envolve o leitor e potencializa o
estado de alumbramento das crianças ao fitarem os
balõezinhos de cor. Rimbaud se vale do mesmo efeito do

Sumário
Pesquisas em Tradução | 43

diminutivo (petits museaux) ou ainda na repetição do adjetivo


pequeno: cinq petits.
O último verso do poema de Bandeira, e mais
especificamente a última palavra, merecem um comentário
especial. Eis o “quilométrico” verso: “E em torno do homem
loquaz os menininhos pobres fazem um círculo inamovível
de desejo e espanto”. Observe-se que esse último substantivo
do poema, espanto, encontra-se sob a forma adjetiva –
espantados - no título do poema de Rimbaud, em uma
tradução mais literal. Ivo Barroso (2000,p. 327), tradutor da
obra completa de Rimbaud, explica sua escolha pelo título
Os alumbrado1 para sua tradução do poema “Les effarés”:

Effaré tem o significado habitual de assustado, espan-


tado, sobressaltado, assombrado, espaventado. Mas
por constituir uma das palavras-chave de Rimbaud,
com acepções várias segundo o contexto, procuramos
dar-lhe aqui um sentido mais contundente, na linha
de maravilhado, transido, estupefato, estarrecido: daí
o título “os alumbrados”.

Ocorre que “alumbramento”, por sua vez, vem a ser


uma das palavras-chave de Bandeira, tendo inclusive com
esse título um poema em Carnaval (1919).
Percebe-se, em cada um dos poemas, uma profusão de
imagens que evocam a forma esférica. Eis aqui uma segunda
relação hipertextual entre os dois textos: a figuração do
redondo, essa forma a qual, frequentemente, é atribuído o
valor de perfeição. A ênfase do redondo, no poema de
Rimbaud, se verifica no adjetivo do terceiro verso, leur culs
en rond, na forma verbal tourne, e em termos que designam
ou evocam esferas: soupirail (duas vezes), trou (duas vezes) e
mais o plural trous, sein, brioche, blottis. Já em Bandeira, a
forma redonda está ostensivamente presente através dos

1 Ver a tradução de Barroso no Anexo I.

Sumário
44 | P o e s i a , tradução e hipertexto

substantivos balõezinhos, (três vezes) e mais o título, redon-


deza, círculo, ou ainda nomes que evocam a forma redonda,
como ervilhas e tomatinhos. À parte esses substantivos, temos
as expressões em redor, em torno e o próprio substantivo
redondos (duas vezes), intensificado pelo advérbio muito,
fazendo ainda mais ostensiva a presença do redondo.
Aqui, não podemos deixar de evocar a Fenomenologia
do redondo, desenvolvida por Bachelard (2000, p. 241-42), no
último capítulo de A Poética do Espaço. Ali, o filósofo especula
acerca da forma redonda, a partir de observações de um
filósofo (Jaspers: “Todo ser parece em si redondo”), um
pintor (Van Gogh: “Provavelmente, a vida é redonda”), um
poeta (Joë Bousquet: “Disseram-lhe que a vida é bela. Não! A
vida é redonda”) e um fabulista (La Fontaine: “Uma noz me
faz redondinha”). Para inferir que

O mundo é redondo ao redor do ser redondo (...). E,


para um sonhador de palavras, que paz na palavra
redondo! Como ela arredonda serenamente a boca, os
lábios, o ser do alento!

Finalmente, conclui que os poetas que evocam a forma


esférica, “sem se conhecerem, se respondem”. Apoiados
nessas observações poderíamos inferir que a recorrência da
forma redonda nos dois poemas produz um efeito de alento,
uma compensação à frustração pelo desejo não realizado dos
meninos pobres.
Depois de observar os pontos que aproximam os
elementos que dão poeticidade aos dois textos, somos
fortemente tentados a cogitar que, em Balõezinhos, Bandeira
transformou os elementos de “Les effarés” e, ao mesmo
tempo, imitou sua essência poética, produzindo, contudo,
um texto original.
Segundo Carvalhal (2006, p. 53),

Sumário
Pesquisas em Tradução | 45

Modernamente o conceito de imitação ou cópia perde


seu caráter pejorativo, diluindo a noção de dívida
antes firmada na identificação de influências. (...) To-
da repetição está carregada de uma intencionalidade
certa: quer dar continuidade ou quer modificar, quer
subverter, enfim, quer atuar com relação ao texto
antecessor. A verdade é que a repetição, quando
acontece, sacode a poeira do texto anterior, atualiza-o,
renova-o e (por que não dizê-lo?) o reinventa.

É pouco provável que a coincidência dos elementos


poéticos em Balõezinhos e “Les effarés” seja obra o acaso. De
fato, é mais provável que Bandeira tenha tomado por hipo-
texto o poema de Rimbaud para produzir um hipertexto, e se
o fez a partir do desvio deliberado dos elementos do original
(impregnados de símbolos da cultura europeia), logrou, no
entanto, recuperar com precisão a poeticidade do hipotexto.
Talvez o exercício poético aqui tenha partido de uma
vontade consciente de descolonizar a poesia. Bandeira,
imbuído do espírito modernista, teria escolhido resgatar
rendimentos estéticos presentes em “Les effarés” de maneira
que a poeticidade ali inscrita pudesse ser expressa em
Balõezinhos através e apesar da abstenção da estrita reescrita
do original, a exemplo de uma tradução. Dessa forma,
Bandeira estaria reafirmando sua adesão à proposta
antropófaga de Oswald de Andrade, que Carvalhal (2006, p.
80) resume nestes termos:

É agora o representante da cultura periférica e depen-


dente que investe contra a do colonizador, mutilando-
a, espremendo-lhe o suco para extrair dela apenas o
que lhe serve. Assimila somente o que lhe convém.

Neste caso, Bandeira teria realizado, a partir do poema


de Rimbaud, um hipertexto que se apresenta como um
exercício de tradução restrita aos elementos que dão

Sumário
46 | P o e s i a , tradução e hipertexto

poeticidade ao texto, e teria o objetivo de atualizar e


incorporar os elementos poéticos do hipotexto ao contexto
modernista. Assim, a boutade que Bandeira (2009, p. 596)
relembra no Itinerário de Pasárgada, a respeito da “tradução
para o moderno” do seu poema Teresa, o poema Balõezinhos
seria também uma tradução “tão afastada do original, que a
espíritos menos avisados pareceria criação”.
Resta lembrar que, ao contrário da tradução assumida,
em certos casos a forma hipertextual só é detectável pelo
leitor avisado. Desta forma, o hipertexto permite ao leitor
envolver-se ativamente nesse “engendramento livre, quase
lúdico”, no dizer Berman (2007, p. 34), já que a ele cabe
reconhecer os nexos, as similaridades e elementos que o
associam ao hipotexto. Esse jogo constitui um rendimento
extra e uma qualidade específica da forma hipertextual.

Referências

BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. Trad. Antonio de Pádua


Danesi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 2009.
____. Carnaval. In: ____. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 2009.
____. Itinerário de Pasárgada. In: ____. oesia completa e prosa. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar, 2009.
____. (2009). Mafuá do malungo. In:____. Poesia Completa e Prosa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, , 2009.
____. (2009). Opus 10. In:____. Poesia Completa e Prosa. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar, , 2009.
____. (2009). O ritmo dissoluto. In:____. (2009). Poesia Completa e
Prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar .
BERMAN, Antoine. A tradução e a letra ou o albergue do longínquo.
Trad. Marie-Hélène Catherine Torres, Mauri Furlan e Andréia
Guerini. Rio de Janeiro: 7 letras, 2007.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 47

CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura comparada. São Paulo:


Ática, 2006..
GENETTE, Gérard. Palimpsestes. La littérature au second dégré.
Paris: Seuil, 1982.
IVO, Lêdo. Estrela da vida inteira. In: “Cultura” de O Estado de
São Paulo, 13/4/1986.
MOISÉS, Massaud. História da literatura Brasileira: vol.3,
Modernismo. São Paulo: Cultrix, p. 91-97. In: BANDEIRA, Manuel.
Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2009.
RIMBAUD, Arthur. Arthur Rimbaud Poesia completa. Trad. Ivo
Barroso. Rio de Janeiro : Topbooks, 2000.
TEIXEIRA, César Mota. “A resistência do olhar”. In: Teresa Revista
de Literatura Brasileira. São Paulo: Ed. 34. Nº 3, 2002.

Sumário
48 | P o e s i a , tradução e hipertexto

ANEXO I

Os Alumbrados (trad. Ivo Barroso)

Negros na neve e na neblina,


À clarabóia que ilumina,
De cócoras se pondo.

Cinco meninos vêem – desgraça! –


Embaixo o padeiro que amassa
O louro pão redondo,

O forte braço branco aperta


A massa cinza e põe na aberta
Furna em que arde um clarão.

Ouvem o gordo pão que coze.


Ri-se o padeiro à grossa voz e
Engrola uma canção.

Grupo transido que se apóia


Ao rubro olor da clarabóia
Como um seio morno.

Quando nas noites de consoada


Sob o formato de uma empada,
Se tira o pão do forno.

Sob vigas toscas enfumadas


Cantam as crostas perfumadas
E também cantam grilos,

Como essa furna insufla vida,


A alma se põe tão comovida
Nos trapos a cobri-los,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 49

Tão bem se sentem, ajoelhados,


Meninos-Jesus engelhados,
Ali sem se mover.

Colando as fuças cor-de-rosa,


E a murmurar alguma cousa,
Entre os gradis, a ver,

Que tão simplórios dizem preces


E tanto se inclinam sobre esses
Clarões de um céu interno,

Que as calças se lhe despedaçam


E suas camisas esvoaçam
Ao vento vil do inverno.

Sumário
50 | P o e s i a , tradução e hipertexto

Sumário
Pesquisas em Tradução | 51

Garibaldi Dantas de OLIVEIRA


Universidade Federal de Campina Grande

Walter COSTA
Universidade Federal de Santa Catarina

Silence itself—the things one declines to say, or is forbidden


to name, the discretion that is required between the
different speakers—is less the absolute limit of discourse,
the other side from which it is separated by a strict
boundary, than an element that functions alongside the
things said, with them and in relation to them within over-
all strategies. There is no binary division to be made
between what one says and what one does not say; we must
try to determine the different ways of not saying such
things.… There is not one but many silences, and they are
an integral part of the strategies that underlie and permeate
discourses.
Michel Foucault, The History of Sexuality.

Publicado em 1972, dois anos após a sua morte aos 91


anos de idade, The other boat (FORSTER, 1989) é parte do
livro de contos The life to come and other stories, até o
momento um dos poucos livros de Edward Morgan Forster
(mais conhecido como E.M. Forster) não traduzidos para o
português. O presente texto é o início1 de uma tradução
comentada do conto citado acima (The other boat) onde
exponho minhas dúvidas, escolhas e dificuldades durante o

1 O texto completo tem trinta e três páginas.

Sumário
52 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

processo de trazer à luz do português do Brasil de hoje um


texto escrito originalmente em inglês em 1957-8.
O conto que escolhi para traduzir—diferente de
outros publicados quando o autor ainda estava vivo (seu
romance mais conhecido, A passage to India, publicado pela
primeira vez em 1924 foi seu último romance publicado em
vida2) que parecem mais sketches, fragmentos, estórias
incompletas3—tem todas as características de um texto de
ficção bem pensado: personagens sólidos, uma trama
complexa, uma tensão e uma densidade que crescem com a
narrativa, e uma modernidade explícita no que se refere aos
seus temas centrais: racismo e homofobia. Concordo com
Cortázar, quando ele escreve sobre o conto em geral e seus
temas:

Não é ruim pelo tema, porque em literatura não há


temas bons ou temas ruins, há apenas um tratamento
bom ou ruim do tema. Tampouco é ruim porque os
personagens careçam de interesse, já que até uma
pedra é interessante quando dela se ocupam um
Henry James ou um Franz Kafka. Um conto é ruim
quando é escrito sem a tensão que deve se manifestar desde
as primeiras palavras ou as primeiras cenas.
(CORTÁZAR, 1999, p. 353, itálicos meus.)

E mais tarde, mais poético e menos vago quando


perguntado sobre seu conceito de conto:

Muito severo: já o comparei a uma esfera. É uma coisa


que tem um ciclo perfeito e implacável. Uma coisa
que começa e termina tão satisfatoriamente como uma

2 Seu último livro de ficção publicado foi o livro de contos The


Eternal Moment and Other Stories, de 1928.
3 O livro de contos The cellestal omnibus, por exemplo, publicado

em 1911.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 53

esfera: nenhuma molécula pode estar fora de seus


limites precisos. (BERMEJO, 2002, p.28)

Mas não só por essa razão: o conto escolhido trata de


um encontro (homo) sexual entre o Ocidente e o Oriente, da
negação da (homo) sexualidade, de um estrangeiro—inglês,
jovem, de classe-média e militar de futuro—em espaços
exóticos e erotizados e há ainda a questão da linguagem e
poder, com variações sendo ridicularizadas e mal
interpretadas e personagens sendo apagados pelo silêncio do
preconceito e por um final quase previsivelmente infeliz:
morte por assassinato e suicídio. Há também o fato de o
conto ser umas das poucas obras de Forster ainda não
traduzidas para o português.
O conto tem dois tempos: o encontro dos dois
personagens principais quando crianças numa viagem da
Índia à Inglaterra e um segundo encontro, em um outro
barco, cerca de dez anos depois, numa viagem em sentido
contrário. Nesse texto, traduzo apenas as duas primeiras
páginas, o começo da estória trágica de amor entre Lionel e
Cocoanut, o início da primeira viagem:

I I
‘COCOANUT, come and ‘COCOANUT, venha brincar
play at soldiers.’ de soldado.’
‘I cannot, I am beesy.” ‘Não posso, tô ocupa-a-ado.’
‘Mas você tem que brincar,
‘But you must, Lion wants
Lion quer você.’
you.’
‘É, venha com a gente,’ disse
Yes, come along, man,’ said
Lionel, correndo com os outros
Lionel, running up with some chapéus de papel e faixas. Isso foi
paper cocked hats and a sash. It há tanto tanto tempo, e garotos
was long long ago, and little ainda iam ao encontro da morte
boys still went to their deaths sem se dobrar e vestidos com
stiffly, and dressed in as many tantas roupas quanto podiam
clothes as they could find. encontrar.
‘I cannot, I am beesy,’ ‘Não posso, tô ocupa-a-

Sumário
54 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

repeated Cocoanut. ado,’ repetiu Cocoanut’


‘But man, what are you ‘Mas você tá tão ocupado
busy about?’ com o quê?’
‘I have soh many things to ‘Tenho mui-i-itas coisas pra
arrange, man.’ arrumar.’
‘Let’s leave him and play by ‘Vamos deixar ele e brincar
ourselves,’ said Olive. ‘We’ve só a gente,’ disse Olive. ‘Temos
Joan and Noel and Baby and Joan e Noel e o tenente Bodkin.
Lieutenant Bodkin. Who wants Quem quer Cocoanut?’
Cocoanut?’ ‘Ah, cala a boca! Eu quero
‘Oh, shut up! I want him. ele. A gente tem que ter ele. Ele
We must have him. He’s the é o único que cai quando é
only one who falls down when morto. Todos vocês continuam
he’s killed. All you others go on lutando por muito muito
fighting long too long. The tempo. A batalha hoje de
battle this morning was a manhã foi muito fácil. Mamãe
perfect fast. Mother said so.’ que disse.’
‘Well, I’ll die.’ ‘Bem, eu vou morrer então.’
‘So you say beforehand, but ‘Você diz isso agora, mas
when it comes to the point you na hora não vai. Noel não vai.
won’t. Noel won’t. Joan won’t. Joan não vai. Baby não faz nada
Baby doesn’t do anything certo—é claro que ele é muito
properly — of course he’s too pequeno—e você não pode
little — and you can’t expect esperar que o tenente Bodkin
Lieutenant Bodkin to fall down. caia. Cocoanut, por favor,
Cocoanut, man, do.’ vamos lá.’
‘I — weel — not.’ ‘Eu—vo-o-u—não.’
‘Cocoanut cocoanut ‘Cocoanut cocoanut
cocoanut cocoanut cocoanut cocoanut cocoanut cocoanut
cocoanut,’ said Baby. cocoanut,’ disse Baby.
The little boy rolled on the O menino Cocoanut rolava no
deck screaming happily. He convés gritando alegremente. Ele
gostava de ser pressionado por
liked to be pressed by these
essas crianças bonitas e bondosas.
handsome good-natured
‘Eu tenho que ir e ver o m’m m’m
children. ‘I must go and see the m’m,’ele disse.
m’m m’m m’m,’ he said. ‘O o quê?’
‘The what?’
(FORSTER, 1989, p. 121)

Sumário
Pesquisas em Tradução | 55

Na primeira página do conto já encontro duas decisões


(escolhas) a fazer: o nome do conto e as falas de um dos
personagens principais – Cocoanut. O outro barco? Mesmo
sabendo que em português (e em inglês4) barco carrega essa
idéia que a embarcação não deve ser grande. Portanto The
other boat é traduzido como O outro barco. Uma das
personagens do primeiro romance publicado de Forster me
convenceu a traduzir “boat” como “barco”:

“And, Granny, when will the old ship get to Italy?’’


asked Irma.

“‘Grandmother,’ dear; not ‘Granny,’”said Mrs.


Herriton, giving her a kiss. “And we say ‘a boat’ or ‘a
steamer’, not ‘a ship.’ Ships have sails.”5

As falas de Cocoanut (“beesy”, “soh”, “weel”) soam


como se demorassem mais, como se fossem ditas de um
modo preguiçoso. Ao repetir as vogais e acrescentar o “h” o
narrador-autor parece querer apenas mostrar essa
particularidade do personagem—por enquanto. Na verdade
o que há é uma superposição de falares: o inglês padrão
coexistindo com um dialeto falado pelo personagem indiano.
Ao substituí-los por “ocupa-a-ado”, “mui-i-itas” e “vo-o-u”
não pude evitar de repetir o que o escritor, filósofo,
historiador e teórico da tradução francês Antoine Berman
(2007) aponta como uma das (treze) tendências defor-
madoras da tradução do texto em prosa6: a destruição ou a

4 A relatively small, usually open craft of a size that might be


carried aboard a ship. (Uma embarcação relativamente pequena e
geralmente aberta que pode ser carregada a bordo de um navio).
5 FORSTER, E. M. Where angels fear to tread. Edinburgh & London:

William Blackwood and Sons, 1905. p.07


6 A Racionalização, que concerne às estruturas sintáticas e à

pontuação do texto original; a clarificação, que define o indefinido

Sumário
56 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

exotização das redes de linguagens vernaculares—onde os


dialetos coexistem com a norma culta (BERMAN, 2007, p.
58), e também sucumbi, talvez inconscientemente (ibid., p.
45), à deformação de empobrecer quantitativamente o conto
original, já que há menos significantes na tradução (ibid.,
p.54). Há uma clara superposição de falares no conto original
(ibid., p. 61) que não está na tradução. Essa superposição de
línguas vai se repetir no conto inteiro.
Há também a questão de “man” que preferi omitir.
“Cara” soaria tão estranho quanto “Homem” se usado em
português por crianças. Desconfio que ao omitir o termo na
tradução enobreci meu texto (ibid., p. 52) talvez para evitar
cair no avesso dessa deformação (portanto noutra
deformação):

O avesso (e o complemento) do enobrecimento é, no


que concerne às passagens do original ditas “popu-
lares”, o recurso cego a uma pseudo-gíria que
vulgariza o texto, ou a uma linguagem “falada” que só
atesta a confusão entre o oral e o falado. (BERMAN,
2007, p. 53)

do original; o alongamento, que torna o texto traduzido mais


longo; o enobrecimento, que retoriciza elegantemente o original; o
empobrecimento qualitativo, que substitui termos que têm riqueza
sonora e icônica ; o empobrecimento quantitativo, que gera menos
significantes; a homogeneização, que unifica o que originalmente é
heterogêneo; a destruição dos ritmos, que a prosa assim como a
poesia tem; a destruição das redes subjacentes, que permeia a
prosa onde seus significantes se correspondem e se encadeiam; a
destruição dos sistematismos, que diz respeito ao tipos de frases e
construções; a destruição ou exotização das redes de linguagens
vernaculares; a destruição das locuções e o apagamento das
superposições de línguas.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 57

A fala de Lionel: ‘Oh, shut up! I want him. We must


have him. He’s the only one who falls down when he’s killed.’
(itálicos meus) como que prenuncia tanto o final do conto
quanto a relação entre sexo e morte e/ou amor e morte que
existe entre os personagens principais. Se a frase fosse
traduzida como ‘Ele é o único que cai quando abatido’
haveria uma conotação de passividade e vulgaridade—
ausentes no texto original, mas não implicando aqui em um
“enobrecimento” (ibid., p.52) citado acima.
Menino Cocoanut foi acrescentado para desambiguar.
Do jeito que está em inglês é preciso ler com atenção para
saber que o little boy não é Baby e sim Cocoanut. Acrescen-
tando assim uma informação extra que não consta no texto
original, acabei não apenas alongando como também
clarificando o original (ibid., p. 50-1).
A pontuação foi mantida na tradução embora não seja
comum lermos diálogos com aspas em português; o comum
seria substituí-las por travessões, destruindo assim o ritmo
original do texto (ibid., pp. 55-6).
Essas e outras observações foram feitas após a
tradução7, porque o texto de Berman foi um suporte a
posteriori; uma maneira de julgar o que posso ter feito de
uma maneira quase intuitiva, embora não de uma forma
ingênua8. Acredito como Berman que todo tradutor está,
inconscientemente ou não, exposto a um sistema de forças
deformadoras que desviam a tradução do seu foco real
(ibid., p. 45) já que “elas fazem parte de seu ser - tradutor e
determinam, a priori, seu desejo de traduzir”. A segunda e

7 “Não se trata apenas de que cada tradução seja de seu tempo,


mas que as questões, na tradução, vêm depois de feita.”
MESCHONIC, H.Poética do traduzir. São Paulo: Perspectiva, 2010.p.
33.
8 “A tradução pode perfeitamente passar sem teoria, não sem

pensamento” (BERMAN, 2007, p.19).

Sumário
58 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

(início da) terceira página do conto apresentam mais


problemas:

‘The m’m m’m m’m. They ‘Os m’m m’m m’m . Eles
live—oh, so many of them—in vivem—ah, tantos deles—na
the thin part of the ship.’ parte mais estreita do navio.’
‘He means in the bow,’ said ‘Ele quer dizer na proa,’
Olive. ‘Oh, come along, Lion. disse Olive. ‘ Ah, venha, Lion.
He’s hopeless.’ Ele não tem jeito.’
‘What are m’m m’m m’m?’ ‘O que são m’m m’m m’m ?’
‘M’m.’ He whirled his arms ‘M’m’. Cocoanut girou os
about, and chalked some marks braços e desenhou com giz umas
on the planks. marcas nas tábuas do navio.
‘What are those?’ ‘ O que são eles?’
‘M’m.’ ‘M’m.’
‘What’s their name?’ ‘Qual o nome deles?’
‘They have no name.’ ‘Eles não têm nome’
‘What do they do?’ ‘O quê eles fazem?’
‘They just go so and oh! ‘Eles só vão e ah! E assim—
And so—ever—always—’ sempre—sempre—’
‘Flying fish? … Fairies? … ‘Peixes voadores?... Fadas?...
Noughts and crosses?’ Jogo da velha?’
‘They have no name.’ ‘Eles não têm nome. ’
‘Mother!’ said Olive to a ‘Mãe!’Disse Olive para uma
lady who was promenading senhora que estava passeando
with a gentleman, ‘hasn’t com um cavalheiro, ‘Tudo não
everything a name?’ tem nome?’
‘I suppose so.’ ‘Suponho que sim.’
‘Who’s this?’ asked the ‘ Quem é esse?’ Perguntou o
lady’s companion. acompanhante da senhora.
‘Ele está sempre na companhia
‘He’s always hanging on to
dos meus filhos. Não sei quem é.’
my children. I don’t know.’
‘ De raça misturada, não?’
‘Touch of the tar-brush,
‘É, mas nem importa, já que
eh?’
estamos viajando para casa. Eu
‘Yes, but it doesn’t matter
jamais permitiria se estivésse-
on a voyage home. I would
mos indo para a Índia. As
never allow it going to India.’
crianças passaram e a senhora
They passed on, Mrs March

Sumário
Pesquisas em Tradução | 59

calling back, ‘Shout as much as March disse, ‘Gritem tanto


you like, boys, but don’t quanto quiser meninos, mas não
scream, don’t scream.’ berrem, não berrem. ’
‘They must have a name,’ ‘Eles têm que ter um nome, ’
said Lionel, recollecting, disse Lionel, lembrando,
‘because Adam named all the ‘porque Adão deu um nome a
animals when the Bible was todos os animais no começo da
beginning.’ Bíblia. ’
‘They weren’t in the Bible, ‘Não estavam na Bíblia, os
m’m m’m m’m; they were all m’m m’m m’m; eles estavam na
the time up in the thin part of parte mais estreita do navilho, e
the sheep, and when you pop quando você aparece eles
out they pop in, so how could desaparecem, então como era
Adam have?’ que Adão ia fazer?’
‘Noah’s ark is what he’s got ‘A arca de Noé é o que ele
to now.’ tem agora. ’
Baby said ‘Noah’s ark, Baby disse, ‘Arca de Noé,
Noah’s ark, Noah’s ark,’ and Arca de Noé, Arca de Noé,’ e
they all bounced up and down eles todos pularam para cima e
and roared. Then, without any para baixo e fizeram barulho.
compact, they drifted from the Aí, sem fazerem qualquer
saloon deck on the lower, and acordo, passaram todo do
from the lower down the convés para o convés mais
staircase that led to the baixo, e de lá escada abaixo até
forecastle, much as the weeds o castelo de proa, como se
and jellies were drifting about fossem iguais as algas e as
outside in the tropical sea. águas-vivas que estavam
Soldiering was forgotten, passando lá do lado de fora, no
though Lionel said, ‘We may as mar tropical. Brincar de soldado
well wear our cocked hats.’ foi esquecido, embora Lionel
They played with a fox-terrier, tenha dito, ‘Nós podemos
who was in the charge of a também usar nossos chapéus. ’
sailor, and asked the sailor Eles brincaram com um Fox
himself if a roving life was a terrier que um marinheiro
happy one. Then, drifting estava tomando conta, e
forward again, they climbed perguntaram a esse mesmo
into the bows, where the m’m marinheiro se uma vida errante
m’m m’m were said to be. era uma vida feliz. Então,

Sumário
60 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

avançando novamente, subiram


na proa, onde disseram que os
m’m m’m m’m estavam.
(FORSTER, 1989, p. 203-4)

Logo no início da segunda página temos “ship” e bem


adiante “sheep” (que pela lógica da primeira página eu
traduziria como navi-i-o), um exemplo clássico de pares
mínimos em aulas tradicionais de fonética da língua inglesa
para mostrar a diferença que um simples segmento, um
fonema—no caso \I\ ou \i\ - pode causar se não usarmos a
pronúncia considerada certa já que ship é navio e sheep é
ovelha... Isso como se o contexto não existisse. Portanto,
considerando o contexto do conto, eu deveria traduzir como
apenas mais um exemplo do modo langoroso de falar do
Cocoanut, destruindo assim mais uma vez os vernaculares
ao invés de exotizá-los (BERMAN, 2007, p. 58-9) assim como
apagando a superposição de línguas do original (ibid., p. 61).
No entanto resolvi manter a semelhança sonora entre as
duas palavras em inglês, quase um trocadilho, e criei um
neologismo: “navilho”; uma palavra-valise (ou portmanteau)
que funde as palavras navio+ novilho.
Até visualmente (ver acima) notamos que o texto
traduzido é mais longo que o original (ibid., p.51), mas não
acho que seja um caso de “sobretradução” já que o inglês
falado predomina nas primeiras páginas do conto com suas
palavras curtas.
Os “m’m m’m m’m” são murmúrios que lembram a
palavra mãe em ambas as línguas e como não têm nome para
o personagem da história também não têm para mim, ou
melhor dizendo, ficam do jeito que estão no original. O conto
trará de volta essa questão no seu desenvolvimento, mas
como um bom texto, já nos dá avisos no que podemos
chamar de introdução.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 61

Planks eu traduzi como tábuas do navio, mais uma vez


alongando e clarificando (ibid., pp.50-1) e, portanto,
explicitando, não para desambiguar, mas, neste caso até para
redundar. É uma decisão tradutória inicial, podendo ser
eliminada no processo final da tradução do conto inteiro.
“Noughts and crosses”9 numa tradução “literal” seria
“Nadas e cruzes” ou “Zeros e cruzes”, mas no Português do
Brasil cruz é sempre a cruz cristã +, enquanto que no inglês
pode ser X ou +. Resolvi novamente destruir um modo de
dizer (ibid., p.59) substituindo-o por um equivalente “jogo
da velha”, separando assim a expressão “d(a) sua letra (...)
seu corpo mortal, (...) sua casca terrestre” (ibid., p.32).
Touch of the tar-brush, de acordo com o Wiktionary:

(Idiomatic, dated) pertaining to somebody of mixed


racial heritage; to signify someone is commonly
(though not exclusively) of South Asian or Afro-
Caribbean in their background and/or in their
appearance. Usage notes: it was not generally used for
people that were unambiguously and distinguishably
biracial. More often it referred to those for whom
evidence of mixed ethnic attributes were perceptibly
more subtle. Since the expression is deemed to be
fairly derogatory in overtone, even considered by
some to be unequivocally racist, it is seldom used
today.10

9 A aliteração em “Flying fishes...Fairies?” também não está na


tradução.
10 Wiktionary contributors, 'touch of the tar brush', Wiktionary,

The Free Dictionary. Disponível em:


<http://en.wiktionary.org/w/
index.php?title=touch_of_the_tar_brush&oldid=16562870>

Sumário
62 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

Uma expressão velha, fora de uso e racista que traduzi


como de raça misturada. Que é uma expressão equivalente,
uma destruição de uma elocução, um modo de dizer (ibid.,
p.59) que novamente foi substituído por um equivalente que
não tem a força negativa da expressão no conto em inglês.
No restante das páginas aqui traduzidas já se
encontram presentes temas que vão “navegar” pelo conto
inteiro: o inominável, as referências bíblicas, a presença da
mãe, o realismo quase cruel dos olhos dos outros, algo ou
alguma coisa que não se sabe ao certo onde está ou, como
um desejo reprimido, está em lugar nenhum—parado-
xalmente talvez em um lugar estreito, escondido, quase não-
dito—como esses “m’m m’m m’m”s.
Já presente também está a questão do espaço geo-
gráfico/ficcional e seus múltiplos significados especialmente
nesse conto onde a direção oriente ocidente (no início do
conto: ‘É, mas nem importa já que estamos viajando para casa. Eu
jamais permitiria se estivéssemos indo para a Índia.’) contrasta
com a direção oposta na segunda parte do mesmo, dez anos
depois.
Os próximos passos da pesquisa envolverão a busca
por respostas mais concretas para algumas questões que
apenas começam a se desenhar nesse começo de tradução.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 63

Referências

BERMEJO, Ernesto González. Conversas com Cortázar. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. Tradução Luís Carlos Cabral.
BERMAN, Antoine. A tradução e a letra ou o albergue do longínquo.
Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007. Tradução de Marie-Hélène Catherine
Torres, Mauri Furlan e Andréia Guerini.
CORTÁZAR, Julio. Obra crítica 2. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1999.
FORSTER, E.M. The life to come and other stories. Edited with an
introduction by Oliver Stalybrass. Harmondsworth: Penguin, 1989.

Sumário
64 | O outro Forster: iniciando uma tradução comentada

Sumário
Pesquisas em Tradução | 65

Carmen Verônica de A. R. NOBREGA


Universidade Federal Campina Grande

Marie Hélène C. TORRES


Universidade Federal Santa Catarina

Introdução

Este trabalho tem por objetivo estudar o cânone de


Guy de Maupassant na Biblioteca Nacional (doravante BN), -
Instituição Brasileira cujo nome oficial é Fundação Biblioteca
Nacional, considerada pela UNESCO uma das dez maiores
bibliotecas nacionais do mundo e a maior biblioteca da
América Latina que mantém um dos mais completos acervos
de livros do país. Para tanto, apresentaremos as ferramentas
colocadas on line à disposição de pesquisadores pela BN.
Usaremos como modelo o autor francês do século XIX,
Guy de Maupassant, considerado um dos maiores contistas
da história literária na França, apresentando a sua obra ali
disponível, destacando-se as traduzidas. Temos que
acrescentar que este estudo faz parte integrante de uma pes-
quisa maior, que estamos desenvolvendo no Doutorado em
Estudos da Tradução na Universidade Federal de Santa
Catarina (PGET/UFSC) que tem o objetivo de estabelecer o
cânone de Maupassant no Brasil, através do estudo do
paratexto e dos contos mais traduzidos nas antologias.
Assim, mostraremos Maupassant enquanto escritor
destacando a importância de sua obra no Brasil. Explicita-
remos, ainda, as diferentes etapas da pesquisa que possi-

Sumário
66 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

bilitaram o mapeamento das suas obras traduzidas, cadas-


trada na BN, para, em seguida, analisarmos os dados
coletados com o intuito de mostrar como o autor é apresen-
tado pela BN.

Maupassant: a vida do escritor e a obra

É importante ressaltar que a nossa escolha pelo


contista normando se deu pela sua importância no sistema
literário brasileiro e francês, visto que ele é considerado
como um clássico da Literatura Francesa (BENHAMOU,
2011:58), um dos mestres do romance francês (VERÍSSIMO,
1978:208) e um dos escritores franceses mais lido
(BENHAMOU, 2007:7).
Muitos escritores e críticos literários também consi-
deram Guy de Maupassant como um dos maiores contistas
de todos os tempos, a exemplo de Mário de Andrade que em
seu artigo, de 1938, Contos e Contistas, afirmou que ele era “o
maior dos contistas existentes” e declarou que: “Si me
obrigassem a escolher dentre os contos dele o que eu havia
de levar comigo para a minha ilha deserta, ou levaria uns
vinte de contrabando ou desistia da ilha” (ANDRADE,
1972:7).
Henry René Albert Guy de Maupassant nasceu em
Rouen, em 1850, na Normandia. Para Forestier (1974:LXIII),
o lugar exato do seu nascimento ainda é um problema não
resolvido e permanece no centro de uma discussão entre os
seus biógrafos, pois a maioria das biografias de Guy de
Maupassant relata que o mesmo nasceu no castelo de
Miromesnil, no povoado de Tourville-sur-Arques e outras
que foi em Fécamp, uma cidade litorânea da França, na
região da Normandia. Mas o que se sabe é que ele passou ali
os primeiros anos da sua juventude e o que importa nesta
discussão não é o lugar onde ele nasceu, mas o fato de que a

Sumário
Pesquisas em Tradução | 67

maioria dos seus textos trata desta região. (HERVOT,


2010:226).
Maupassant passou sua infância em companhia do
irmão mais novo Hervé e da mãe que obteve a guarda de
seus filhos, após a separação de seu pai, Gustave de
Maupassant, em 1860. Madame de Maupassant, nascida
Laure de Poittevin, (1821-1903) era uma mulher de uma
cultura literária relevante e pouco comum para a época,
apaixonada, especialmente, pela literatura clássica
(VASCONCELLOS, 2009:18). Segundo Hervot (2010:227), ela
foi iniciada ao mundo das letras pelo seu irmão mais velho
Alfred Le Poittevin, amigo de Flaubert. Com seu irmão, a
mãe de Maupassant “aprendeu a escrever cartas, a se
familiarizar com os clássicos, a amar Shakespeare e a falar
grego, latim e italiano”, passando assim, seus conhecimentos
aos filhos. A presença de Laure na vida de Maupassant foi
tão marcante que os biográfos e estudiosos deste contista
normando fazem menção recorrentemente a ela em seus
estudos, mostrando a sua importância na carreira de seu
filho como autor. Ela deu uma formação humanista aos
filhos e os orientava em sua formação educacional lendo
grandes obras literárias para eles (SATIAT, 2006:8).
Ela teve um papel essencial na formação literária de
seu filho mais velho, desde a sua mais tenra infância, e era
considerada “uma mulher inteligente, sensível, apaixonada
pelas artes, em especial pela literatura”, e foi a primeira e
eterna crítica “a quem Maupassant confiou seus projetos e
aventuras literárias” (HERVOT, 2010:225). Para Vasconcellos
(2009:18), Maupassant considerava a sua mãe como a única
confidente e conselheira. Ainda nesta perspectiva, Satiat
(2011:66), uma das maiores estudiosas de Maupassant,
afirma que ele foi para a sua mãe um filho leal e atencioso.
Ela nos conta que um dia, em conversa com a sobrinha de
Flaubert, Maupassant lhe disse que não acreditava na
virtude de nenhuma mulher, e esta lhe perguntou: “É? E sua

Sumário
68 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

mãe?” “Mamãe, sim”, respondeu ele, confirmando toda


admiração que tinha por ela que teve uma importância
fundamental tanto no lado afetivo como intelectual de
Maupassant e sempre o encorajava a escrever, despertando
nele o interesse pela literatura. Ao perceber que ele se
encaminhava para uma carreira literária, o apresentou a
Gustave Flaubert, célebre romancista normando, para que
ele dissesse se o seu filho estava no caminho correto
(VASCONCELLOS, 2009:18). Flaubert reconheceu o seu
talento imediatamente, se tornou o seu tutor e padrinho
literário, e o aconselhou a só publicar suas obras quando
atingisse a perfeição (SATIAT, 2006:9).
Louis Forestier (1974:LXIII-LXXIX) em um estudo
cronológico sobre o contista, relata que, após a separação de
seus pais, ele e seu irmão Hervé vão para Étretat viver com a
mãe, e o seu pai permanece em Paris, onde mais tarde Guy
vai dividir com ele, um apartamento. Em 1863, ele entrou no
Seminário de Yvetot, na Normandia e ali, parece que compõe
seus primeiros versos. Em uma carta escrita ao seu primo
Louis Le Poittevin, em abril de 1868, Maupassant relata a sua
tristeza por morar naquele lugar. Em 1868 ele foi estudar,
como interno, no Liceu de Rouen, e após o término de seus
estudos, partiu para Paris em 1870, onde teve contato com
vários escritores realistas e naturalistas da época, como Zola,
Flaubert e o russo Turgueniev e ali se firmou como contista.
Em Paris, ele vivia da pouca ajuda que seu pai lhe
dava, até que para melhor se sustentar, assumiu um em-
prego burocrático, inicialmente no Ministério da Marinha,
transferido, em seguida, para o Ministério da Instrução
Pública. Intentando fugir do tédio do escritório, ele
encontrou um passatempo: a canoagem, e com este esporte
participou de alguns salvamentos de pessoas que se
banhavam no Canal da Mancha, dentre estes o do poeta
inglês Charles Swinburne. Ainda com a canoagem, presen-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 69

ciou Corot, Courbet e Monet pintarem suas telas na praia


(KON, 2009:10,11).
Maupassant viveu no século de grandes inovações, tais
como a primeira fotografia (1816), o primeiro telefone (1876),
a vacina contra a raiva (1891) e o primeiro automóvel à
gasolina, em 1891 (POTELET, 2004:6). No final deste século,
a França passou por um período de crise profunda, sendo
neste período se percebe o rápido desenvolvimento das
ciências e muitos crêem que elas responderão a todas as
perguntas e resolverão todos os problemas, mas aos poucos
vão percebendo que as ciências não substituem a fé e a
religião, nem impedem os homens de morrer e de sofrer, não
respondendo assim, às questões essenciais (TAUVEL,
2004:7). Segundo Géraudelle (1994:182), um novo espaço se
abre para os escritores, no século XIX: a imprensa. Ele afirma
que durante todo este século, a tiragem dos jornais não para
de aumentar, atingindo todas as camadas da sociedade.
Graças a um regime político liberal, a alfabetização tem o seu
progresso, visto que o número de jovens de 15 a 24 anos que
sabem ler passou de 500 000 a seis milhões, desenvolvendo a
imprensa consideravelmente (1994:183). Com este cresci-
mento, esta pode oferecer aos escritores, como por exemplo,
Maupassant, um salário que lhes permitiu dedicação com-
pleta à sua vocação.
Segundo Agard (1986:8,420) o século XIX foi marcado
por mudanças econômicas, sociológicas e demográficas,
além de considerar que a Revolução Industrial, os progressos
das ciências exatas, experimentais e humanas criam, na se-
gunda metade do século, a crença pautada por um progresso
inevitável ligado à ciência. Mário de Andrade (1988:10)
explica que neste período, na Europa, a belle époque assiste “a
uma sucessão de movimentos artísticos revolucionários” e,
neste contexto, promoveu-se modificações profundas,
inclusive, no campo das artes. E no Brasil, para o autor, a
vida literária, principalmente, na cidade do Rio de Janeiro,

Sumário
70 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

era considerada ativa, uma vez que havia encontros de


escritores nas livrarias, onde eles discutiam literatura, vista
por ele como “novidades”. Eram nestes locais onde eles
formavam as conhecidas “rodinhas” de sociabilidades.
Para Veríssimo (1977:9), os primeiros anos do século
XIX são marcados pela decadência, pela completa estagnação
para as letras no Brasil. A literatura, considerada por ele
como “a expressão nacional”, resume-se na poesia, pois até a
segunda metade deste século, esta é quase exclusivamente
constituída da poesia, “se não o é totalmente”.
Nesta configuração política e social foi notável a
contribuição de Flaubert na vida literária de Maupassant.
Discípulo de Flaubert, a quem dedicou sua primeira obra
individual publicada com uma parte de seus poemas, a anto-
logia Des vers (1880), ele chama a atenção pela diversidade
temática de sua obra e por ter sido também, um dos maiores
expoentes da literatura fantástica1. Seu trabalho é conhecido
por retratar situações psicológicas e fazer críticas sociais.
Também é caracterizado pelo seu pessimismo, pois no
mundo descrito por ele, o mal parece ser mais forte que o
bem (POTELET, 2004:7).
O contexto citado acima influenciou também a lite-
ratura, e fez surgir a escola naturalista. Escritores escreveram
romances científicos tentando explicar o destino das pessoas
através de seu nascimento e suas doenças (TAUVEL, 2004:7).
Do ponto de vista social, considera-se que o século XIX, na
França, é o da burguesia, muito embora a população rural
fosse majoritariamente predominante. Naturalista e
fantástica, a obra de Maupassant é o reflexo de um fim de
século “científico, angustiante e pessimista” (TAUVEL, 2004:
8).

1 Uma literatura que se origina da imaginação, e está fundada na


ficção e não existe no mundo real. Não tem preocupação em relatar
fatos que existem na realidade.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 71

Otto Maria Carpeaux (1963:2425) considerava


Maupassant o “mais ‘natural’ dos realistas” e não propia-
mente naturalista, além de afirmar que ele era pessimista por
ser observador agudíssimo e que o seu nome estava ligado à
“Vie Parisienne!”. Carpeaux ainda afirma que Maupassant
confessou ter aprendido com Flaubert a “observação exata
dos fatos exteriores e a tradução exata das impressões
visuais para a língua” (1963:2424). Ele vai de um extremo a
outro quando se trata de Maupassant, pois o considera um
contista singular, “talvez o maior desde Boccaccio e
Cervantes”, divertido, mas ao mesmo tempo monótono e
sem muita cultura. Para ele, a inteligência de Maupassant
está limitada à sua experiência humana, o que fez com que
ele preferisse personagens simples e simplistas, mas foi com
“seus defeitos” que construiu, com maestria, a sua técnica de
“short story” e o chamou de mestre inigualável. Refletindo
ainda, acerca do contista francês, Carpeux ele diz que

... Maupassant não tem ideal algum; senão o ideal


literário de observar e reproduzir fielmente a reali-
dade, que é tão triste. Maupassant é profundo na
superficialidade, porque reconhece o “sem fundo” da
superficialidade, o vazio desta vida corporal, só pra-
zer, sempre o mesmo prazer; e, enfim, a destruição
total. A angústia do desfêcho. Maupassant sempre
vira o fantasma do Nada atrás das luzes impressio-
nistas. É um dos escritores mais tristes da literatura
universal (p. 2424).

A diversidade temática da obra de Maupassant é tão


relevante que, talvez, tenha permitido esta reflexão de
Carpeaux, visto que este autor afirma que “Maupassant
parece muito variado” (CARPEAUX, 1963:2423).
O que mais impressiona, dentre vários aspectos, na
leitura da obra de Guy de Maupassant, é que ela se caracte-
riza por sua extrema abundância e por sua concentração no

Sumário
72 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

tempo2: em dez anos (1880 – 1890) ele escreve toda a sua


obra. Lanoux (1974:IX), no prefácio do livro Contes et
Nouvelles, diz que destes dez anos surgem os romances Une
vie, Bel-Ami, Mont-Oriol, Pierre et Jean, Fort comme la mort e
Notre Coeur, os três volumes de narrativas de viagem (Au
Soleil, Sur l’eau, La vie errante). O autor ainda acrescenta que
em 1885 trinta e cinco contos e crônicas aparecem nos jornais
Gil Blas, Le Figaro e Le Gaulois. Maupassant também publicou
seis peças de teatro, em torno de oitocentas cartas, as quais
revelam a composição de sua obra, mais de duzentas e
cinquenta crônicas e um livro de poemas (POTELET, 2004:7).
E publicou, aproximadamente, trezentos contos e novelas,
reagrupadas pela crítica em três círculos: normando,
parisiense e fantástico (AGARD, 1986:412). Podemos per-
ceber que, apesar de ter tido uma vida breve, pois morreu
aos 43 anos, Maupassant, teve uma produção literária muito
intensa e relevante, e mesmo com a saúde precária, causada
pela sífilis contraída em sua juventude, escreveu freneti-
camente. O próprio Maupassant afirmou que entrara na vida
literária como um meteoro (AUBEL, 2011:56). A este
respeito, Lanoux (1974:X) ratifica esta afirmação ao dizer que
ele apareceu na literatura como um meteoro e que a sua vida
literária inteira foi meteórica.
Com grande a aceitação de sua obra, Maupassant
tornou-se rico e famoso. O sucesso e a riqueza abrem as
portas da alta sociedade para ele. Em seu artigo sobre este
contista normando, Noëlle Benhamou (2011:58) diz que para
que um escritor se torne famoso, clássico e célebre é preciso
certo tempo, mas Maupassant já o era quando vivo e foi o
público, a crítica e os leitores que o elevaram a esta categoria.
A autora acrescenta que o jornal Gil Blas, em 17 de junho de

2POTELET, Hélène et DÉCOTE, Georges. Guy de Maupassant –


Contes et nouvelles. Paris: Hatier, 2004:7.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 73

1885, publicou uma crítica na qual dá a Maupassant o status


de “jovem mestre” (BENHAMOU, 2011:58).
Em 1870, quando estudava Direito em Paris, foi
convocado como soldado na região de Rouen, durante a
guerra Franco-Prussiana. Em 1871, ele deixou o exército e
voltou para Paris, onde se instalou e assumiu o cargo de
funcionário público, mas seu sucesso como cronista e
contista nos jornais Le Gaulois (1880-1890) e Gil Blas (a partir
de 1881) fez com que ele se tornasse um dos escritores mais
bem pagos de Paris, o que lhe permitiu sair do emprego
(FORESTIER, 1974:LXIII-LXXIX).
A sua vida pessoal foi intensa, frequentou muitos
salões e, apesar de fazer muito sucesso com as mulheres, não
dividiu sua vida com nenhuma delas. Segundo Satiat
(2006:10) ele teve, secretamente, três filhos com uma
modista, os quais recusou reconhecer e educar. A partir de
1888, Maupassant passou por problemas físicos e psíquicos,
consequência da sífilis, e em 1892, após uma tentativa de
suicídio, ele foi internado numa clínica psiquiátrica. Armand
Lanoux (1974:IX) considera que foi neste momento que
Maupassant morreu para a literatura, pois o autor francês
não escreveu mais após este episódio.
Os primeiros gêneros literários3 a que Maupassant se
dedicou foram a poesia e o teatro, respectivamente. Somente
a partir de 1875 escreveu contos fantásticos, novelas e
romances e, em 1880, passou a escrever contos abandonando
assim, a poesia. Em 1891 ele deixou de escrever novos textos
em razão da doença que o consumia. No que concerne o
fantástico, Maupassant foi influenciado no gênero por Edgar
Allan Poe, Hoffmann e Tourgueniev. Aproximadamente
trinta novelas, ou seja, dez por cento de sua produção pode

3 NEVES, Angela das. Releituras de Guy de Maupassant. 2008.


Disponível em: http://seer.fclar.unesp.br/lettres/article/
view/2039/1667 Acesso 25/05/2012

Sumário
74 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

ser considerada pertencente a este gênero (FÄRNOLÖF,


2007:45).
Maupassant publicou sua primeira novela Boule de Suif
(Bola de Sebo), pela maison de Georges Charpentier, no
volume coletivo Les soirées de Médan [A noites de Médan],
patrocinado por Zola, sobre o tema da guerra (KON,
2009:13). Este volume trazia além de Maupassant, cinco
outros escritores como Émile Zola, Huysmans, Paul Céard,
Léon Hennique e Paul Alexis. Médan era o lugar do
naturalismo no final do século XIX, na França, onde jovens
escritores como Maupassant e Huysmans se encontravam
para discutir arte e literatura. O grupo era recebido por Zola
em sua casa de campo, perto de Paris (AGARD, 1986:543).
Flaubert considerou Bola de Sebo uma obra-prima e Otto
Maria Carpeaux (1963:2422) disse que ela “entrou no rol das
obras clássicas, com todas honras oficiais”.
Segundo Benhamou (2011:58), quando da morte de
Flaubert, em 1880, Maupassant se afastou, progressivamente,
do grupo dos naturalistas e passou a escrever aquilo que lhe
agradava, podendo voar com suas próprias asas. Para a
autora, esta escolha, considerada por ela, audaciosa,
permitiu à obra de Maupassant “escapar ao tempo”, lhe
dando um lugar no campo da história literária. Ele passou a
escrever para jornais como o Le Gaulois, Gil Blas, citados
anteriormente, além de contribuir, esporadicamente, para o
Le Figaro, entre 1883 a 1890, com cujo fundador teve a
oportunidade de conviver. Esta colaboração com vários
jornais de sua época, nos quais publicava seus contos e
crônicas, além de suas narrativas de viagens e novelas,
permitiu que seus escritos abordassem “preferencialmente
aspectos do cotidiano” (KON, 2009:13). Mas Maupassant foi
advertido constantemente por Flaubert contra os perigos e as
facilidades do jornalismo, que segundo ele, era mortífero
para todo escritor de respeito (RITCHIE, 2007:11). Ele ainda
escreveu para outros jornais, como por exemplo, o

Sumário
Pesquisas em Tradução | 75

L'Almanach Lorrain de Pont-à-Mousson, no qual ele publicou


seu primeiro conto em 1875, «La Main d'écorché»
(FORESTIER, 1974:XXVIII) sob o pseudônimo de Joseph
Prunier.
Conforme dito, a década de 80, do século XIX, foi
marcada por sua surpreendente produção. Segundo Kon
(2009:14), as coletâneas de contos surgem sucessivamente,
como vemos a seguir: em 1881 ele lança La maison Tellier;
Mademoiselle Fifi, em 1882; Contes de la Bécasse e Clair de Lune
em 1883; em 1884 ele publica Miss Harriett, Les soeurs Rondoli
e Yvette; no ano de 1885 Contes du jours et de la nuit; La petite
Roque, Monsieur Parent, Toine, em 1886; Le Horla em 1887; em
1888 Le rosier de Madame Husson; La main gauche, em 1889 e
L’inutile beauté, em 1890.
Maupassant descreveu, com espírito de justiça e de
humor, a vida de seus personagens. A concisão, recurso
estético que o tornou conhecido e admirado como um dos
maiores contistas de todos os tempos (DIAS, 2012:1) é
encontrada em suas obras e o fez ser tomado por modelo por
vários contistas no mundo inteiro. O seu estilo é antes de
tudo, o da forma breve, não é sutil, pois os efeitos estão
sempre evidentes nele e, ao fazer uma descrição, muda de
estilo, começando um novo parágrafo, enriquecendo as
imagens e prolongando as frases4. Benhamou (2011:58)
enfatiza, em seu artigo Faiseur ou précurseur?, que
Maupassant aliou, nos temas de sua obra, o antigo e o novo,
a tradição formal e a modernidade, o clássico e o moderno, e
Aubel (2011:56) o vê próximo, tanto quanto possível, de um
artista puro, à maneira de Van Gogh, com quem, segundo
ele, o escritor francês tem afinidades. No texto “Alguns
livros de 1900”, Veríssimo (1977:131) cita Ganton
Deschamps, cronista do Le Temps, quando este fez

4 http://www.french.hku.hk/dcmScreen/lang3035/
lang3035_maupassant.htm

Sumário
76 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

considerações mostrando a “filiação do conto nacional aos


fabliaux franceses medievais”, e diz que Maupassant possuía
“a veia libertina dos velhos poetas dos Fabliaux”, acrescida
de ceticismo, de ironia e de malícia moderna.
Ainda para Aubel (2011:56), Maupassant era um
homem próximo dos humildes, mas hostil com as ideias
revolucionárias, um pacifista que sonhava com a revanche
contra os prucianos, fiel no que diz respeito à amizade e que
proclamava, para quem quisesse ouvi-lo, a sua necessidade
de independência. Homem sensível, que conheceu o
sofrimento, por experiência própria, criou seus personagens
que vivem sempre sob pressões sociais e têm a hipocrísia, tão
desprezada por ele, como uma constante em suas narrativas.
O pessimismo, característico do escritor, não o permite ver
uma mudança nesta natureza humana, assim, ele retrata
personagens frustrados, tristes, ingênuos, operários
explorados, entre outros (MEYER, 2003:1).

Pesquisando na BN do Rio de Janeiro

A pesquisa referente a este autor francês foi realizada,


on line, na Biblioteca Nacional, do Rio de Janeio, visto que
esta oferece um acervo bastante significativo disponível ao
público tanto on line quanto em sua sede. A história da BN
começa quando a imprensa surgiu no Brasil, após a chegada
da família Real, em 1808 e com ela, a Real Biblioteca. Oscar
Mendes (1977:3), nos diz que a vantagem da vinda de D.
João VI e da Corte Portuguesa ao Brasil foi a instalação da
Imprensa Régia e de Tipografias no país, de onde come-
çaram a ser impressos livros, revistas e outras publicações. A
partir daí, as pessoas passaram a ter mais contato com estes
tipos de impressos, e puderam acompanhar os fatos culturais
e políticos da sociedade brasileira. A partir de 1812, segundo
o autor, surgiram várias revistas e as primeiras mani-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 77

festações da crítica literária no Brasil. O ano de 1810 é


considerado oficialmente como o da fundação da Real
Biblioteca.
O acervo da BN nos possibilitou ter acesso à relação
das obras originais de Maupassant, das traduzidas para a
língua portuguesa, para o inglês, espanhol, alemão e por-
tuguês de Portugal. Ao iniciarmos a nossa busca, escolhemos
no site o item Catálogo - “acervo – obras raras” visando
mapear as obras do autor acima citado, cadastradas nesta
categoria, contudo, não foi encontrado nenhum registro
neste sentido, fato pelo qual nos detivemos somente no item
Catálogo – acervo geral - livros.
Neste item encontramos 97 links e 156 palavras a partir
da entrada da palavra Maupassant na pesquisa livre. Quando
introduzimos também a palavra Guy na pesquisa com o
intuito de encontrar uma relação maior de obras, perce-
bemos que aparecem 358 links, mas não se referem somente
ao nosso autor, pois existem vários escritores cadastrados
com este nome, além de trabalhos de outros estudiosos que
têm o nome de Guy de Maupassant no título. Portanto, a
escolha pela palavra Maupassant foi feita por uma questão
prática.
A primeira obra original de Maupassant, que
encontramos registrada na BN, é uma crônica intitulada
Émile Zola publicada pela Editora A. Quantin, datada de
1883, em Paris. Maupassant passou a ser conhecido no Brasil
quando publicou, na França, sua primeira novela, Boule de
Suif, em 1880, cujo sucesso foi imediato (TAUVEL, 2004:6).
Neste período, o público brasileiro conheceu, através de
jornais e revistas, a sua obra, visto que ele foi lido e
comentado por jornais como Gazeta de Notícias, Correio
Paulistano, Jornal do Commercio e o Estado de São Paulo
(NEVES,2007:6). A partir de então, as traduções brasileiras
foram publicadas em livros. A primeira tradução, registrada
na BN, em língua portuguesa, foi Pedro e João, de 1895,

Sumário
78 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

publicada pela Livraria de A. M. Pereira. Posteriormente,


foram feitas e refeitas várias traduções de sua obra até
nossos dias.
O livro original de sua primeira novela, Boule de suif,
não consta no acervo on line da BN, o que nos impede dizer
em que data ela chegou ao Brasil, mas a sua tradução, Bola de
Sebo, publicada pela Gráfico Ed. Unitas, de São Paulo, está
registrada com a data de 1933(?). Esta interrogação nos leva a
crer que a data está ilegível. Um fator importante que deve
ser ressaltado é que constam, no site da Biblioteca Nacional,
obras originais e traduções cadastradas sem data, não nos
permitindo pontuá-las cronologicamente. Além disso, alguns
cadastros das traduções não citam o nome do tradutor, nos
impossibilitando saber se o seu nome não consta no livro
porque não era costume da época evidenciá-lo ou se o livro
está danificado e a identificação não foi possível durante a
catalogação. O nome do tradutor aparece pela primeira vez
no catálago da BN, na obra “Segredos do coração” (Notre
coeur), em 1944, pela Editora J. Olympio, com a tradução de
Alvaro Gonçalves.
O livro Les cousines de la Colonelle foi traduzido, em
1972, no Brasil, por Howard Nelson e está cadastrado na BN
como sendo de autoria de Guy de Maupassant (Guy de
Maupassant - As sobrinhas do coronel - Edições MM – 1972),
inclusive em sites de vendas de livros5. Publicado em dois
volumes, o livro é de autoria da Vicomtesse de Coeur
Brûlant (1881), um equívoco que foi corrigido na França em
1920, mas ignorado pelos editores brasileiros6.
Foram encontradas quarenta e duas obras em língua
estrangeira, sendo duas em alemão, uma em espanhol, trinta
e oito em francês e outra em inglês. A obra Le Horla aparece

5http://maupassant.free.fr/cadre.php?page=oeuvre
6 http://books.google.com.br/books/about/Les_cousines_de_la_
colonelle.html?id=0Xn_PQAACAAJ&redir_esc=y

Sumário
Pesquisas em Tradução | 79

em três momentos distintos: em 1887, 1905 e em 1987. O


romance Bel ami, em oito, sendo que só em uma consta o
nome do tradutor, o que não nos permite saber se as outras
sete obras são traduções, são originais ou edições brasileiras
em francês, visto que tanto em português como em francês o
título é o mesmo. As editoras mais presentes são da P.
Ollendorff, com treze publicações (1884, 1887, 1890, 1891,
1895, 19 ..(?), 1905, 1906, 1908, 1911, 1987, 19... (?), 19... (?) e
da Albin Michel com oito publicações, em uma delas não
pudemos identificar a data, (19 ...(?), quatro obras publicadas
em 1925 e três em 1927. A Editora Gallimard é a última que
se encontra resgistrada com data (1974 – 1979).
Encontramos na BN oitenta e três obras traduzidas
para o português, dentre as quais apenas trinta e seis citam
os tradutores. Os que mais traduziram Maupassant, foram
Paulo Mendes Campos e José Thomaz Brum. Esse último,
além de traduzir três obras, selecionou e prefaciou uma
delas, conforme cadastro.
Observamos que alguns títulos dos contos e/ou das
antologias são repetidos, mas que foram publicados em
datas diferentes, por isso, não podemos identificar se são
reedições ou novas traduções, visto que o cadastro não traz o
nome do tradutor nem diz a edição. Somente poderemos
sanar estas dúvidas após uma pesquisa in loco na BN.
A Biblioteca Nacional registra o ano de 1953 como o
que tem um maior número de traduções publicadas, com
dezesseis obras traduzidas, cuja relação se encontra em
anexo. A obra mais traduzida, publicada isoladamente,
encontrada na BN, é a Bola de Sebo com onze traduções, em
períodos diferentes (Ver anexo), seguida de Uma vida com
seis. Bel ami registra sete, mas como afirmamos ante-
riormente, não podemos classificá-las como tradução, pois só
uma traz o nome do tradutor. Maupassant continua sendo
traduzido até os dias de hoje e um dos últimos trabalhos de

Sumário
80 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

tradução de sua obra foi feito pelo escritor e tradutor gaúcho


Amilcar Bettega (2009) que traduziu 125 de seus contos.
As várias imagens das capas dos livros traduzidos de
Maupassant, no Brasil, fazem parte, também, da nossa
pesquisa. Dentre as várias existentes, selecionamos algumas,
para apresentarmos ao leitor, a título de conhecimento. As
primeiras trazem o nome do tradutor, as outras não o citam.

Traduzido por Tradutor: Augusto de Sousa


Paulo Mendes Campos

Tradução de Amilcar
Bettega Tradução de Elias Davidovich

Sumário
Pesquisas em Tradução | 81

Tradutor não mencionado:

Outras capas poderiam ter sido colocadas para título


de informação, mas como são inúmeras, optamos por estas
com o intuito de ilustramos o nosso trabalho.
A nossa pesquisa se concentrou nas traduções da obra
de Maupassant cadastrada na BN, mas salientamos que,
além das traduções para o português do Brasil, outras são
citadas em estudos sobre o contista normando. Farhat
(2007:103) fala sobre traduções da obra de Maupassant no
mundo arabe, Dranenko (2007:81) apresenta a tradução de

Sumário
82 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

sua obra na Ucrânia e Dulau (2007:91) mostra este trabalho


na Romênia7. O site da Câmara Municipal de Lisboa traz
uma informação importante referente à tradução de contos
de Maupassant em Portugal. Ele relata que José Saramago
prefaciou e traduziu trinta e cinco contos deste grande
escritor normando, o que evidencia cada vez mais a sua
importância como contista, dado o reconhecimento de
Saramago no sistema literário internacional8.
A Biblioteca Nacional, apresenta, on line, sete anto-
logias francesas, uma em inglês e vinte e seis brasileiras
cadastradas. Trinta e três obras são de edição francesa, e sete
originais, de edições brasileiras. As antologias traduzidas
para o português estão elencadas, a seguir, por ordem
crescente de data: Contos (1946), Bola de sebo e outros
contos (1948), Novelas e contos (1951), Bola de Sebo e outras
histórias (1953), Contos da galinhola (1953), As irmãs
Rondoli e contos do dia e da noite (1956), Contos da
galinhola (1956), Contos escolhidos (1956), Histórias eternas
(1959), Bola de sebo e outros contos e novelas (1970), Contos
escolhidos (1971), Contos de Guy de Maupassant (1985), O
Horla e outras histórias (1986), Bola de Sebo e outros contos
(1986), Bola de sebo e outros contos (1987), Bola de sebo e
outras histórias (1988), Os melhores contos de Guy de
Maupassant (1988), Bola de sebo e outras histórias (1993), O
abandonado e outros contos (1997), Contos fantásticos: O
Horla & outras histórias (1997), Os anos cor de Rosa e a casa
turca (1998), Bola de sebo e outras histórias (1998), Madame
Hermet e outros contos fantásticos (1999), Contos fantásticos:
O Horla & outras histórias (1999), Bola de sebo e outros
contos (2003), 125 contos de Guy de Maupassant (2009).

7http://www.numilog.com/LIVRES/FICHES/1878.Livre
8 Farhat (2007:103), Dranenko (2007:81) e Dulau (2007:91) In:
BENHAMOU, Noëlle. Guy de Maupassant – Études réunies par
Noëlle Benhamou. Amsterdam/New York: Rodopi, 2007.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 83

Podemos observar que, no cadastro da BN, as


antologias traduzidas têm um espaço de tempo considerável
entre uma publicação e outra. Por exemplo, Histórias eternas
foi cadastrada como que publicada em 1959 e somente em
1970 é que surge Bola de sebo e outros contos e novelas. Depois
de 1971, com contos escolhidos, apenas em 1985 aparece outra
publicação, Contos de Guy de Maupassant. A penúltima
publicação foi no ano de 2003 e a última seis anos depois, em
2009.

Conclusão

Este sobrevoo sobre a obra de Maupassant na


Biblioteca Nacional aponta para a necessidade de uma
ampliação da pesquisa, por considerarmos que esta apenas
introduz o leque de informações abrangentes existentes no
Brasil, no que concerne o contista normando, além de nos
indicar a importância da tradução para o sistema literário
nacional. Tradução que, ao longo do tempo, nos tem per-
mitido o acesso a várias culturas e a concepções de mundo e
de linguagem (ens), colocando-nos em contato direto com o
pensamento de uma época.
A imagem de Maupassant no Brasil passa obriga-
toriamente pela tradução de sua obra, a qual foi foi lida,
citada e discutida por vários críticos, escritores, historiadores
e leitores, dentre os quais destacamos José Veríssimo, Otto
Maria Carpeaux e Mário de Andrade, já citados ante-
riormente.
Apesar de Maupassant ter sido apresentado aos
leitores brasileiros positivamente, percebemos que a sua obra
e o material à disposição de pesquisadores e estudiosos
ainda é escasso o que torna mais difícil a nossa investigação.
Por que Maupassant? Pela riqueza das suas ideias, pela
diversidade de assuntos, pela variedade de temas, por sua

Sumário
84 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

contribuição à literatura francesa e à brasileira, enfim, pelo


escritor fantástico que soube descrever com um talento
magistral a sociedade da sua época e nos apresentar os
desejos e obsessões da alma humana. Jules Renard resumiu
Maupassant em uma frase, a qual foi publicada pelo Journal
em 13 de fevereiro de 1893: “Eu amo Maupassant porque ele
parece escrever para mim e não para ele” (“J’aime
Maupassant parce qu’il me semble écrire pour moi, non pour
lui. » Jules Renard (Journal, 13 février 1893)).

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86 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

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Sumário
Pesquisas em Tradução | 87

ANEXOS

1. As obras originais em língua francesa cadastradas na BN

Autor Título Editora Ano


1.Guy de Émile Zola A. Quantin 1883
Maupassant
2.Guy de Les soeurs Rondoli P. Ollendorff 1884
Maupassant
3.Guy de La petite Roque V. Havard 1886
Maupassant
4.Guy de Le Horla Paul Ollendorff 1887
Maupassant
5.Guy de Au soleil V. Harvard 1888
Maupassant
6.Guy de L’inutile beauté Victor – 1890
Maupassant Havard
7.Guy de Notre coeur P. Ollendorff 1890
Maupassant
8.Guy de Musotte, pièce en P. Ollendorff 1891
Maupassant trois actes
9.Guy de Bel-ami P. Ollendorff 1895
Maupassant
10.Guy de Miss Harriet P. Ollendorff 19.. (?)
Maupassant
11.Guy de La petite Roque Michel 19.. (?)
Maupassant
12.Guy de Contes choisis P. Ollendorff 1905
Maupassant
13.Guy de Le horla Société 1905
Maupassant D’Éditions
Littéraires et
Artistiques –
Libr. P.
Ollendorff

Sumário
88 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

14.Guy de Fort comme la Société 1905


Maupassant mort D’Éditions
Littéraires et
Artistiques –
Libr. P.
Ollendorff
15.Guy de Yvette P. Ollendorff 1906
Maupassant
16.Guy de Pierre et Jean P. Ollendorff 1908
Maupassant
17.Guy de Contes de La Paris: L. 1908
Maupassant bécasse Conard,

18.Guy de Oeuvres L. Conard 1908 –


Maupassant complètes de Guy 10
de Maupassant
19.Guy de Contes de Lib. D. 1911
Maupassant Normandie Ollendorff
et d’ailleurs
20.Guy de Oeuvres choisies C.Delagrave 1911
Maupassant de Guy de
Maupassant;
poésies, contes,
Roman et
nouvelles, théatre
21.Guy de Sur l’eau C. Marpon et E. 1925
Maupassant Flammarion
22.Guy de Sur l’eau A. Michel 1925
Maupassant
23.Guy de Monsieur parent A. Michel 1925
Maupassant
24.Guy de Au soleil A. Michel 1925
Maupassant
25.Guy de Les manches d’un A. Michel 1925
Maupassant bourgeois de Paris
26.Guy de Le rosier de Mme. Albin Michel 1927
Maupassant Husson
27.Guy de Les soeurs Rondeli A. Michel 1927
Maupassant

Sumário
Pesquisas em Tradução | 89

28.Guy de Des vers A. Michel 1927


Maupassant
29.Guy de Yvette Amerc. Edit. 1943 ?
Maupassant
30Guy de Vingt contes Americ-Edit. 194 ?
Maupassant
31.Guy de Pierre et Jean Americ. Edit. 194 ?
Maupassant
32.Guy de Fort comme la Americ Edit. 1944
Maupassant mort
33.Guy de Correspondance D. Wapler 1951
Maupassant inédite
34.Guy de Le Horla Paul Ollendorff 1987
Maupassant
35.Guy de Conte et nouvelles Gallimard 1974 –
Maupassant 1979
36.Guy de Le rosier de Mme P. Ollendorff 19 ?
Maupassant Husson
37.Guy de Fort comme la P. Ollendorff ?
Maupassant mort
38.Guy de L’héritage C. Marpon et E. ?
Maupassant Flammarion

2. Obras traduzidas de Maupassant cadastradas na BN

Autor Título Tradutor Editora Ano


1.Guy de Pedro e ------------- Liv. de A. 1895
Maupassant João M. Pereira
2.Guy de Vogando ------------- Laemmert 1896
Maupassant
3.Guy de Forte ------------- Laemmert 1897
Maupassant como a
morte
4.Guy de Pedro e ------------- Laemmert 18- ?
Maupassant João

Sumário
90 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

5.Guy de Pedro e ------------- Ed. 1932


Maupassant João Universal
6.Guy de Bola de ------------- Gráfico Ed. 1933 ?
Maupassant Sebo Unitas
7.Guy de Segredos Tradução J. Olympio 1944
Maupassant do de Alvaro
coração Gonçalves
8.Guy de Forte Tradução J. Olympio 1944
Maupassant como a de
morte Accioly
Neto
9.Guy de As termas ------------- Ed. Vecch 1944
Maupassant de Mont-
Oriol
10.Guy de Contos ------------- Liv. Globo 1946
Maupassant
11.Guy de
Maupassant
12.Guy de Bola de ------------- Edições 1948
Maupassant sebo e Miniatura
outros
contos
13.Guy de Novelas e ------------- Ed. Globo 1951
Maupassant contos
14.Guy de Uma ------------- W. M. 1952
Maupassant vida, Jackson
Pedro e
João
15.Guy de Bola de ------------- Ed. Saraiva 1953
Maupassant Sebo e
outras
histórias

16.Guy de O vestal Wilson Martins 1953


Maupassant da Martins e
senhora Joaquim
Husson Novas
Teixeira

Sumário
Pesquisas em Tradução | 91

17.Guy de Forte ------------- Liv. 1953


Maupassant como a Martins
morte
18.Guy de Pai Milon ------------- Liv. 1953
Maupassant Martins
19.Guy de Nosso ------------- Liv. 1953
Maupassant Coração Martins
20.Guy de Bel – Ami ------------- Liv. 1953
Maupassant Martins
21.Guy de Uma vida ------------- Liv. 1953
Maupassant Martins
22.Guy de Monte ------------- Liv. 1953
Maupassant Oriel Martins
23.Guy de Contos da ------------- Liv. 1953
Maupassant galinhola Martins
24.Guy de Monsieur ------------- Liv. 1953
Maupassant Parent Martins
25.Guy de A pensão ------------- Liv. 1953
Maupassant Tellier Martins
26.Guy de Os ------------- Liv. 1953
Maupassant domingos Martins
de um
burguês
de Paris
27.Guy de As irmãs ------------- Liv. 1953
Maupassant Rondoli Martins
28.Guy de Tonico ------------- Liv. 1953
Maupassant Martins
29.Guy de Ivete ------------- Liv. 1953
Maupassant Martins
30.Guy de Caprichos ------------- Liv. 1953
Maupassant do Martins
coração
31.Guy de Luisa La ------------- Liv. 1953
Maupassant Roque e o Martins
Horla

Sumário
92 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

32.Guy de Mademoi- ------------- Liv. 1953


Maupassant selle Fifi Martins
33.Guy de Pedro e ------------- Liv. 1953
Maupassant João Martins
34.Guy de Bel – Ami ------------- Liv. 1953,
Maupassant Martins 1956
35.Guy de O Prazer ------------- Casa Ed. 1954
Maupassant Vecchi
36.Guy de A pensão ------------- Liv. 1955
Maupassant Tellier Martins
37.Guy de Ivete ------------- Liv. 1955
Maupassant Martins
38.Guy de Vogando ------------- Livraria ?
Maupassant Americana

39.Guy de Os ------------- Liv. 1955


Maupassant domingos Martins
de um
burguês
de Paris
40.Guy de Caprichos ------------- Liv. 1955
Maupassant do Martins
coração e
Misti.
41.Guy de As irmãs ------------- Liv. 1956
Maupassant Rondoli e Martins
contos do
dia e da
noite
42.Guy de Contos da ------------ Liv. 1956
Maupassant galinhola Martins

43.Guy de Luisa La Lauro Liv. 1956


Maupassant Roque Almeida Martins

44.Guy de Bel-ami ------------- Liv. 1956


Maupassant Martins

Sumário
Pesquisas em Tradução | 93

45.Guy de Contos ------------- Ed.Melhora 1956


Maupassant escolhi- mentos
dos
46.Guy de Uma vida Departa- W.M. 1959
Maupassant mento Jackson Inc.
Editorial
de W. M.
Jackson
Inc.

47.Guy de Histórias ------------- Ed. Cultrix 1959


Maupassant eternas
48.Guy de Bola de ------------ Civilização 1970
Maupassant sebo e Brasileira
outros
contos e
novelas
49.Guy de Bola de Bruguera 1971
Maupassant Sebo Edmundo
Lys

50.Guy de Mademoi- Aurea Bruguera 1971


Maupassant selle Fifi Brito
Weisem-
berg
51.Guy de Contos Edmundo Bruguera 1971
Maupassant escolhi- Lys
dos
52.Guy de Mille. Fifi ------------- Ed. Três 1974
Maupassant
53.Guy de A incons- ------------- Clube do 1976
Maupassant tante Livro
54.Guy de Bel Ami ------------- Circulo do 1981 (?)
Maupassant Livro

55.Guy de Bel Ami Clovis Ra- Abril 1981


Maupassant malhete Cultural

Sumário
94 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

56.Guy de Contos de Ondina Cultrix 1985


Maupassant Guy de Ferreira
Maupas-
sant
57.Guy de Uma vida Ascen- Abril 1985
Maupassant dino Leite Cultural
58.Guy de O Horla e José L&M 1986
Maupassant outras Thomaz
histórias Brum
59.Guy de Bola de Mario Globo 1986
Maupassant Sebo e Quintana,
outros Casimiro
contos Fernande
s e Justino
Martins
60.Guy de Uma vida Marques Tecnoprint 1986 (?)
Maupassant Rebelo

61.Guy de Bola de Mario Globo 1987


Maupassant sebo e Quintana,
outros Casimiro
contos Fernande
s e Justino
Martins

62.Guy de Bola de Paulo Scipione 1988


Maupassant sebo e Mendes
outras Campos
histórias
63.Guy de Pensão Augusto Tecnoprint 1988
Maupassant Tellier de Sousa
64.Guy de Os Ondina Círculo do 1988
Maupassant melhores Ferreira Livro
contos de
Guy de
Maupas-
sant

Sumário
Pesquisas em Tradução | 95

65.Guy de Gustave Betty Pontes 1990


Maupassant Flaubert Joyce
66.Guy de Uma vida Elias Tecnoprint 1991
Maupassant Davido-
vich

67.Guy de Pensão Augusto Ediouro 1993


Maupassant Tellier de Sousa

68.Guy de O cordão Elisa Paraula 1993


Maupassant Tamajusu
ku ... [et
al]
69.Guy de Bola de Paulo Scipione 1993
Maupassant sebo e Mendes
outras Campos
histórias
70.Guy de Forte Sergio Ediouro 1993
Maupassant como a Rubens
morte

71.Guy de Uma vida Marques Ediouro 1993


Maupassant Rebelo
72.Guy de O Plínio Scrinium 1997
Maupassant abandona Augusto
do e Coelho
outros
contos

73.Guy de A herança Augusto Ediouro 1997


Maupassant de Souza

74.Guy de Contos José L&M 1997


Maupassant fantástico Thomaz
s: O Horla Brum
& outras
histórias

Sumário
96 | G u y de Maupassant no Brasil: uma questão de canone

75.Guy de Os anos Clémence Cone Sul 1998


Maupassant cor de M. C.
Rosa, casa Jouët-
turca Pastré
76.Guy de Bola de Paulo Scipione 1998
Maupassant sebo e Mendes
outras Campos
histórias
77.Guy de Madame Carmen Editora da 1999
Maupassant Hermet e Lúcia UFSC
outros Cruz
contos Lima
fantásti- Gerlach e
cos Maria
Jose
Werner
Salles
78.Guy de Contos José L&PM 1999
Maupassant fantásti- Thomaz
cos: O Brum
Horla &
outras
histórias
79.Guy de Bola de Pietro M. Claret 2003
Maupassant sebo e Nassetti
outros
contos
80.Guy de A noite: José Bento CosacNaify 2004
Maupassant pesadelo Ferreira
81.Guy de 125 Amilcar Companhia 2009
Maupassant contos Bettega das Letras

82.Guy de Bel Ami Leila de Estação 2011


Maupassant Aguiar Liberdade
Costa
83.Guy de O Horla ------------- Artes e
Maupassant Ofícios

Sumário
Pesquisas em Tradução | 97

3.Obras de Maupassant em espanhol, alemão e inglês

1.Guy de La loca Casa Ed. 1905


Maupassant Mauci
2.Guy de Ein E. Fleischel 1919
Maupassant menschenleben
(roman)
3.Guy de Die schnepfe E. Fleisachel 1919
Maupassant & co.
4.Guy de Short Stories J. M. Dent & 1951
Maupassant sons itd

Sumário
98 | P o e no Brasil: uma análise dos paratextos...

Sumário
Pesquisas em Tradução | 99

Francisco Francimar de Sousa ALVES


Universidade Federal de Campina Grande

Andreia GUERINI
PGET/UFSC

Luana Ferreira de FREITAS


Universidade Federal do Ceará

Genette em Paratextos Editoriais define paratexto como


“o reforço e o acompanhamento de certo número de
produções, verbais ou não, como um nome de autor, um
título, um prefácio, ilustrações, que nunca sabemos se deve-
mos considerar parte dele”, mas que, de qualquer forma,
cercam e prolongam o texto, “exatamente para apresentá-lo”
(2009, p. 9, grifo do autor).
Os paratextos consistem, portanto, de elementos infor-
mativos e significantes na construção de uma obra e
caracterizam-se por serem “facilitadores” da leitura, ajudan-
do a explicá-la. Esses componentes podem ser também
subtítulo, dados sobre o autor, posfácio, glossário, notas de
pé de página, além de outros. Assumindo a função de me-
diadores entre o texto e o leitor podem, como observa Fi-
gueiredo, “potencialmente influenciar a leitura e a recepção
do texto” (2010, p. 118), e ainda serem decisivos no momento
de comprar ou não uma obra traduzida, pois dentre as várias
funções exercidas pelos paratextos estão a informativa, a

Sumário
100 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

comercial, a explicativa, a metatradutória e a canônica


(FIGUEIREDO, 2005, sp).
Devido à importância que esses textos de acompanha-
mento assumem nos livros traduzidos, o objetivo deste
artigo é examinar alguns paratextos presentes em duas cole-
tâneas de contos de Edgar Allan Poe traduzidas para o por-
tuguês do Brasil: Histórias Extraordinárias (1970), de Brenno
Silveira, e Histórias Extraordinárias de Allan Poe (2003), de
Clarice Lispector. O fato de as antologias escolhidas para
análise terem sido publicadas com um lapso de mais de 30
anos foi determinante para que se verificasse eventuais
semelhanças quanto aos elementos paratextuais, e por uma
apresentar tradução integral (Histórias Extraordinárias/1970)
e a outra ser uma adaptação (Histórias Extraordinárias de Allan
Poe/2003).
Como se sabe, Edgar Allan Poe (1809-1849) teve um
percurso de vida conturbado, desregrado e aventureiro.
Apesar de seus desacertos, deixou um legado de grandes
obras como poemas românticos, histórias de horror e mis-
tério, sátiras, contos policiais e ensaios críticos e filosóficos.
Sua criatividade atraiu a admiração e o elogio de renomados
simbolistas franceses, como Baudelaire, Mallarmé e Valéry, e
a simpatia do famoso poeta português, Fernando Pessoa.
A crítica é unânime ao informar que a fama de Poe
está relacionada à sua genialidade como escritor de histórias
fantásticas e poemas românticos e que o seu sucesso veio a se
consolidar através da França, especialmente a partir da
publicação de Baudelaire do primeiro volume de traduções
de treze contos com o título de Histoires Extraordinaires
(1856), dos originais de Poe (25 contos), escritos entre 1832 e
1845, que o escritor americano teve sua obra reconhecida na
França e, em seguida, em várias partes do mundo ocidental.
A primeira edição (tradução anônima a partir do
francês) de contos de Poe no Brasil foi a coletânea Novellas
Extraordinárias, publicada por H. Garnier, Livreiro-Editor, no
ano de 1903. O livro, que traz como título “Traducção

Sumário
Pesquisas em Tradução | 101

Brasileira”, é composto de dezoito contos e o poema “O


Corvo (Gênese de um poema)”, versão em prosa de “The
Raven”, elaborada por Baudelaire. Contudo, sobre esta
edição, Denise Bottmann diz não poder afirmar se é simples-
mente cópia ou se realmente é uma “traducção brasileira” de
direito próprio, pois não lhe são atribuídos os devidos
créditos e também há posteriores menções a uma tradução
portuguesa idêntica a ela (2010, p. 3). A primeira tradução
efetivamente brasileira (a partir do francês), ainda segundo
Bottmann1, tem como autor Affonso de Escragnolles Taunay,
publicada em 1927 pela Editora Melhoramentos, coletânea
composta de nove contos sob o título de Histórias Exquisitas.
Entretanto, a primeira tradução2 de quase toda a obra
do autor, em português brasileiro, foi publicada pela Editora
Globo de Porto Alegre, em 1944. Araújo acredita tratar-se do
melhor material de tradução das obras de Poe para o
português, mesmo contendo muitos erros e, apesar da capa
aludir a ‘Obras Completas’, não contém toda a produção de
Poe (2002, p. 139). Dos 69 contos do autor, 66 foram
lançados nessa edição3. Oscar Mendes organizou o volume e
traduziu a prosa, e Milton Amado a poesia (DAGHLIAN,
2003, p. 46).
Foi em 1965 que uma nova e bem apresentada edição
desta tradução, publicada em papel-bíblia pela Editora
Aguilar, passou a ser considerada como uma espécie de
edição definitiva das obras de Poe (Idem). É importante
salientar que, antes da publicação das obras completas em
1944, outras coletâneas (não-completas) foram apresentadas

1 Ver “sobra e falta, Poe X” e “XLVII, primeiro livro de Poe em


tradução brasileira”. Disponível em:
<www.naogostodeplagio.blogspot.com.br>. Acesso em: 18.06.12.
2 Poesia e Prosa de Edgar Allan Poe. Porto Alegre, Globo, 1944, 3

vols., 1500p. (Araújo, 2002, p. 139).


3 Ver “Poe XLII, primeira parcial”. Disponível em:

<www.naogostodeplagio.blogspot.com.br>. Acesso em: 06.06.12.

Sumário
102 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

ao público brasileiro. Outrossim, o reconhecimento literário


de Poe no Brasil é notável pelo significativo número de
traduções publicadas e de tradutores envolvidos4.
Figueiredo, ao tratar das traduções de contos de Poe
em Portugal, observa que, a partir do início do século XX, as
antologias e os livros independentes têm apresentado para-
textos muito variados, sobretudo prefácios de vários tipos,
sendo mais frequentes os biográficos e/ou biobibliográficos,
aqueles que se centram sobre a vida e a obra do poeta (2009,
p. 90).
Quanto às traduções do autor no Brasil, os elementos
paratextuais também têm se apresentado de forma bastante
diversificada, principalmente no que diz respeito aos títulos
e desenhos de capa, que chamam imediatamente a atenção
do leitor. Títulos como Histórias Extraordinárias, Contos de
Terror e Mistério, A Carta Roubada e outras histórias de crime e
mistério são alguns dentre os muitos já lançados no mercado.
Após esse breve relato biobibliográfico de Poe e con-
forme informado na introdução deste capítulo, uma das
antologias aqui analisadas é a intitulada Histórias Extraor-
dinárias5, publicada pela Civilização Brasileira, em 1970. O
livro traz uma seleção de treze contos traduzidos (em sua
maioria) por Brenno Silveira. Quanto ao tradutor e essa
tradução, Bottmann afirma:

4 José Paulo Paes, Brenno Silveira e Oscar Mendes são alguns entre
os muitos que traduziram contos de Poe no Brasil.
5 Inicialmente uma seleção de onze contos traduzidos por Brenno

Silveira foi publicada com o título de Antologia de contos de Edgar


Allan Poe, pela Civilização Brasileira, em 1959. Em 1970, a mesma
editora relança a coletânea com o título de Histórias Extraordinárias
acrescida de dois contos: “William Wilson” (tradução de Berenice
Xavier) e “Nunca Aposte a Cabeça com o Diabo” (tradução de
Oscar Mendes e Milton Amado). (Ver “as histórias extraordinárias
começam a se espalhar”. Disponível em:
<www.eapoe.blogspot.com.br>. Acesso em: 08.06.12).

Sumário
Pesquisas em Tradução | 103

As traduções de Brenno Silveira analisadas pelas


articulistas saíram inicialmente em 1959, numa cole-
tânea que ele próprio selecionou e traduziu, publicada
pela editora Civilização Brasileira com o título de
Antologia de Contos de Edgard Allan Poe, dado este que
não consta do referido artigo.
Apenas em 1970, a Civilização Brasileira altera o título
dessa coletânea para Histórias Extraordinárias, que
então se manteve por várias décadas em seus licencia-
mentos para o Círculo do Livro, a Abril Cultural e a
Nova Cultural, até data recente, quando a mesma
coletânea foi reeditada pela Best Bolso com o título de
Antologia de contos extraordinários, com a devida
menção à responsabilidade de Brenno pela seleção
dos contos.6

Partindo dos aspectos morfológicos (capa, contracapa,


página de rosto), essa edição, de 245 páginas, exibe na capa o
nome do autor (na cor verde), o título da obra (em letras
maiúsculas grandes na cor vermelha) e o nome da editora
também na cor vermelha, mas em fonte pequena. Além
desses dados, a capa traz uma ilustração (na cor preta) de
dois morcegos e um rosto humano. O título da obra (em
letras maiúsculas na cor preta) e o nome do autor (em letras
minúsculas na cor laranja) são repetidos na lombada do
livro. A contracapa fornece alguma descrição sobre o autor e
a obra traduzida, tipo de informação batizado por Genette
de press release, ou seja, “um texto curto (geralmente de meia
a uma página) que descreve, à maneira de resumo ou de
qualquer outro meio, e de modo normalmente elogioso, a
obra a que se refere” (2009, p. 97). Sendo assim, o título da

6BOTTMANN, Denise. Em defesa de Brenno Silveira. Domínios de


Lingu@gem. Revista Eletrônica de Linguística. Vol. 6, n° 1 – 1°
Semestre 2012 - ISSN 1980-5799, pp. 560-564). Disponível em:
<http://www.seer.ufu.br/index.php/dominiosdelinguagem>.

Sumário
104 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

obra (em letras maiúsculas na cor verde) e o nome do autor


(em maiúsculas nas cores verde e preta) são apresentados da
seguinte forma:

HISTÓRIAS EXTRAORDINÁRIAS reúne as melhores


e mais famosas narrativas de
EDGAR ALLAN POE – inclusive os contos
Nunca Aposte Sua Cabeça Com o Diabo, Metzengerstein e
William Wilson, que foram recentemente filmados por
Frederico Fellini, Louis Malle e Roger Vadim.
Mestre do conto de terror e de mistério, criador do
gênero policial, EDGAR ALLAN POE é uma das
figuras máximas da literatura norte-americana e
universal, sabendo, como poucos escritores, aliar, em
suas imortais histórias, fantasia e equilíbrio, devaneio
e realismo, lirismo e pânico.

No final da contracapa há também uma informação


acerca da editora, resumida na frase (de autoelogio): “Mais
um lançamento de categoria da CIVILIZAÇÃO
BRASILEIRA”:

Sumário
Pesquisas em Tradução | 105

O livro também consta de badanas (orelhas), uma na


capa, outra na contracapa, apresentando um texto que
mescla informações sobre a obra, como: “Esta antologia
reúne alguns dos melhores e mais famosos contos de Edgar
Allan Poe...”; sobre Poe: “Homem de vida inquieta, ser
atormentado pela angústia, alma possuída de súcubos e
íncubos...”; sua teoria do conto: “Em famoso ensaio sobre o
conto, Poe ressalta as condições essenciais para a sua
execução: brevidade e unidade de impressão...”, e finaliza
apontando a importância da obra do autor para a literatura
universal: “Poe é, reconhecidamente, um momento alto do
espírito criativo que reformula o universo e o devolve ao
comum dos homens sob a forma de arte imperecível”. Esse
texto informativo que tem como título “Edgar Allan Poe e o
conto policial, de mistério e de terror” é assinado por
Mariano Torres. É importante frisar que nada é dito a
respeito de Torres ou do tradutor, figuras que contribuíram
(em maior ou menor grau), para que a obra existisse. No
entanto, não conhecemos o perfil desses agentes respon-
sáveis, direta (o tradutor) ou indiretamente (Torres), pela
obra traduzida. Enquanto muitas referências são atribuídas a
Poe e sua obra, nenhum comentário é atribuído ao tradutor.
No que toca ao interior do livro, a página de rosto
consta apenas o título; no verso desta a editora informa o
nome da coleção ao passo que a divulga, podendo ser,
portanto, uma estratégia comercial, pois induz (indireta-
mente) o leitor a ler outras obras da mesma coleção:

COLEÇÃO SEMPRE-VIVA
Obras Célebres da Literatura Universal
Volume 8

Na página seguinte, constam o nome do autor, o título


da obra (na cor verde) e o nome do tradutor, organizador e
prefaciador, Brenno Silveira. Na parte inferior da página,

Sumário
106 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

aparece o nome da editora acompanhado do logotipo. O


verso desta traz o número do exemplar, o nome de quem
desenhou a capa, e o endereço da editora precedido da
observação: “Direitos desta tradução reservados à EDITORA
CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA S.A.”, e, por fim, data da
publicação (1970) acompanhada da frase nos dois idiomas:
“Impresso no Brasil/Printed in Brazil”.
A página posterior traz o índice com a relação dos
treze contos7 narrados na obra: “A Queda da Casa de
Usher”, “O Barril de Amontillado”, “O Gato Preto”, “Bere-
nice”, “Manuscrito Encontrado numa Garrafa”, “William
Wilson”, “Os Crimes da Rua Morgue”, “O Mistério de Marie
Rogêt”, “A Carta Roubada”, “Metzengerstein”, “Nunca
Aposte a Cabeça com o Diabo”, “O Duque de L’Omelette” e
“O Poço e o Pêndulo”. Vale ressaltar que, na primeira página
de “William Wilson”, há uma nota de rodapé informando
que a tradução é de Berenice Xavier; outra, na última página
de “Nunca Aposte a Cabeça com o Diabo”, informa em nota:
“A tradução deste conto foi gentilmente cedida pela Editora
Globo, Porto Alegre”, sendo, portanto, de Oscar Mendes,
tradutor de quase toda a obra de Poe em prosa. O verso da
página que contém o índice aparece em branco.
Em seguida, há um prefácio assinado por Brenno
Silveira que se estende por cerca de dez páginas dedicadas à
biografia do autor e sua obra. Na página seguinte, cujo verso
se encontra em branco, o título da coletânea e o nome do
autor se repetem. A última página da obra informa o nome
da gráfica onde o livro foi impresso, acompanhado do

7Títulos originais: “The Fall of the House of Usher”, “The Cask of


Amontillado”, “The Black Cat”, “Berenice”, “Manuscript Found in
a Bottle”, “William Wilson”, “The Murders in the Rue Morgue”,
“The Mystery of Marie Roget”, “The Purloined Letter”,
“Metzengerstein”, “Never Bet the Devil Your Head”, “The Duc de
L’Omelette”, and “The Pit and the Pendulum”.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 107

logotipo, e se soma a endereço, telefones, cidade, país, ano


de publicação e caixa postal. Essas informações, a princípio,
podem parecer desnecessárias; contudo, elas são importantes
para o receptor da publicação que valoriza o título que está
adquirindo. Por um lado, o leitor tem o direito de saber a
origem da obra, por outro, a editora adquire maior credibi-
lidade diante do seu público. Genette (2009, p. 34), ao se
referir à descrição de elementos tipográficos de uma obra,
observa que “o leitor tem o direito e até às vezes o dever de
saber em que caracteres é composto o livro que tem em
mãos, e não se pode exigir dele que saiba reconhecê-los por
si só” (grifo do autor).
A segunda antologia é uma adaptação da escritora,
jornalista e tradutora Clarice Lispector, uma reedição da
Ediouro (2003), intitulada Histórias Extraordinárias de Allan
Poe. A coletânea, com dezoito contos selecionados e adapta-
dos por Lispector, recebeu esse título em 1985, ano da
primeira edição8 na Coleção Elefante, mais tarde na Coleção
Clássicos para o jovem leitor. Em 2005, a Ediouro lança a
mesma seleção com o título de Histórias Extraordinárias.
A capa exibe título (na cor preta e em plano de fundo
branco), nome do autor, logotipo da editora além de outras
informações inerentes ao tipo de leitura presente na obra:
1. título da série (clássicos para o jovem leitor) no alto
da página, à direita, deixando claro que se trata de
uma leitura dirigida a um público específico;

8 Em 1974, a Ediouro lança a coletânea 7 de Allan Poe, seleção e


adaptação de Clarice Lispector, Coleção Calouro. Em 1975, a
editora lança na mesma coleção, 11 de Allan Poe, também com
seleção e adaptação de Lispector. Em 1985, esses dezoito contos
foram reunidos e lançados com o título de Histórias Extraordinárias
de Allan Poe [uma das várias antologias publicadas com o título de
Histórias Extraordinárias], primeiro na Coleção Elefante, depois em
outras (Ver “Poe contista em o livro no Brasil I”. Disponível em:
<www.eapoebrasil.blogspot.com.br>. Acesso em: 18.06.12).

Sumário
108 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

2. nome de quem traduziu e adaptou os contos (abaixo


do nome do autor) ao pé da página, sinalizando
tratar-se de uma tradução/adaptação, não de uma
tradução em si, como na antologia anterior. Devo
observar que, raramente, o nome do tradutor é
apresentado nas capas das publicações, mas, tendo
em vista a fama da Clarice escritora, é possível
inferir que a decisão do editor em colocar o seu
nome na capa tenha sido uma estratégia comercial.
3. gravura (colorida) de um cemitério no centro da
página, o que leva o leitor imaginar que a coletânea
narra histórias relacionadas à morte, tema recor-
rente nos contos de Poe. Exceto a ilustração toda a
parte externa do livro (capa, contracapa e lombada)
apresenta-se na cor rosa.

Quanto ao fato de Histórias Extraordinárias de Allan Poe


ser um texto adaptado para um público-alvo, resultando em
um tipo de reescritura que visa atrair o leitor infanto-juvenil,
diferentemente de uma tradução em si, que pretende atingir
um público mais adulto, como é o caso da coletânea tradu-
zida por Brenno Silveira, vale citar a afirmação de Torres
(2011), que vai diferenciar os dois termos em questão,
“tradução” e “adaptação”:

A adaptação não é, então, aceita como sendo uma


tradução, ou ainda, como o precisa Bastin, o conceito de
adaptação requer reconhecimento da tradução como não
adaptação. A tradução é uma não adaptação, mas a
adaptação comporta operações tradutórias ligadas a
um texto-fonte. E é esse último ponto de interseção
entre tradução e adaptação que, finalmente, permite
aproximar os dois termos.
A adaptação, na maioria das vezes, sugere rearranjo e
modificação, quando se trata de passar de um gênero
a outro (romance-teatro, cinema-romance-literatura

Sumário
Pesquisas em Tradução | 109

para crianças). O fato de encontrar tradução e adaptação


juntas traz à tona a hipótese de uma tradução bastante
livre, as duas noções estando ligadas a um texto-fonte
(pp. 28-9).

Ao considerar a citação acima, o leitor, portanto, não


pode esperar de um texto adaptado ou de uma adaptação
cinematográfica, uma correspondência “fiel” ao texto-fonte,
visto que em qualquer adaptação haverá sempre uma maior
liberdade de escolhas de quem está manipulando um texto
alheio. Torres ao afirmar que “A tradução é uma não adapta-
ção” (op.cit., p. 28), sugere que o tradutor não tem
exatamente a mesma liberdade de escolhas de quem, ao
mesmo tempo, traduz e adapta uma obra, pois tais opções
interferem bruscamente no texto original, como é o caso de
omissões, acréscimos, alterações frasais entre outras. Isso
pode ser per-cebido na grande diferença referente ao
número de páginas entre as duas coletâneas em análise: a
primeira, tradução de treze contos, consta de 237 páginas de
texto narrado; a segunda, adaptação de dezoito contos, é
composta de 134 páginas de narrativa. Vale lembrar que, na
maioria das vezes, a adaptação sugere rearranjo e
modificação, quando se trata de passar de um gênero a outro
e, a combinação de tradução e adaptação possibilita a
escritura de um texto bastante livre (cf. TORRES, op.cit., p.
29).
Com relação à lombada do livro, o título, o nome do
autor e o logotipo da editora são repetidos, contudo, também
aparece uma numeração que leva a crer ser o número da
série. Já a contracapa repete o título da obra (como apre-
sentado na capa) centralizado no alto da página. O ISBN, o
logotipo e o site da editora estão localizados linearmente ao
pé da página. Entre esses dois blocos de informação há um
breve texto que se inicia com duas perguntas que dão
indícios sobre o tipo de narrativa existente na coletânea:

Sumário
110 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

“Quem nunca sentiu medo, em um lugar sombrio ou de-


serto? Quem não adora a sensação de pavor suscitada por
um bom livro de mistério ou um filme de terror?”. O mesmo
texto também fornece comentários elogiosos sobre o autor:
“Edgar Allan Poe, um dos maiores escritores americanos do
século XIX, foi o precursor de um gênero (...)” e sobre a
tradutora: “Clarice Lispector, grande escritora que colaborou
para a renovação da literatura brasileira a partir da década
de 1940”. As duas perguntas iniciais buscam despertar no
leitor a curiosidade em uma leitura voltada para a temática
fantasmagórica das histórias presentes na obra. A mesma
estratégia que visa atingir o leitor adepto ao gênero gótico
pode ser justificada em relação aos elogios tecidos, simul-
taneamente, a autor e tradutora. Poe, escritor canônico da
literatura universal; Lispector, conceituada escritora no
âmbito nacional.

No que concerne ao interior do livro, a página de rosto


traz, exceto a ilustração, as mesmas informações contidas na
capa (títulos da coletânea e da série, nomes do autor e da

Sumário
Pesquisas em Tradução | 111

tradutora, e nome/logotipo da editora), acrescidas da edição


(“reformulada”), do número de (re)impressões (3ª reim-
pressão) e site da editora. No verso há uma série de infor-
mações, que um leitor mais atento poderá buscar, conforme
sequência apresentada na própria página:
1. No alto, indicação dos direitos autorais (Copyright
© Ediouro Publicações S.A.).
2. Observação quanto aos direitos autorais (Todos os
direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de
19/02/1998. É proibida a reprodução total ou
parcial, por quaisquer meios, sem autorização
prévia, por escrito, da Editora).
3. Corpo editorial com os nomes dos profissionais
e/ou empresas gráficas responsáveis por: Coorde-
nação editorial, Revisão de texto, Edição de arte,
Coordenação de produção editorial, Coordenação
de PCP (Planejamento e Controle da Produção),
Editoração eletrônica, e Imagem da capa.
4. Ficha catalográfica acompanhada do enunciado:
“Dados Internacionais de Catalogação na Publica-
ção (CIP)/(Câmara Brasileira do Livro, SP, Bra-
sil)”. Uma das informações contidas nesta ficha é o
ano de nascimento e morte da escritora-tradutora
(1925-1977). É pertinente observar que Clarice
nasceu em 1920, contrariamente à informação
anunciada.
5. Menção ao “Índice para catálogo sistemático: 1.
Literatura infanto-juvenil; 2. Literatura juvenil”.
6. Nome da editora (Ediouro Publicações S/A), se-
guido do nome da cidade (Rio de Janeiro), ende-
reço, telefone, fax, e-mail e site.

Na terceira página, consta o índice com a lista do


conteúdo, incluindo “Introdução”, “Biobibliografia” e os de-

Sumário
112 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

zoito contos9 selecionados e adaptados para a coletânea: “O


gato preto”, “A máscara da morte rubra”, “O caso do
Valdemar”, “Manuscrito encontrado numa garrafa”, “Enter-
ro prematuro”, “Os crimes da rua Morgue”, “A queda da
Casa de Usher”, “Os dentes de Berenice”, “Nunca aposte sua
cabeça com o Diabo”, “O Duque De L’Omelette”, “William
Wilson”, “O retrato oval”, “O coração denunciador”, “O
Diabo no campanário”, “O barril de Amontillado”,
“Metezengerstein”, “Ligéia” e “Deus (Revelação Magné-
tica)”. O verso dessa página apresenta-se em branco.
Na quinta e sexta páginas, há introdução (sem assi-
natura), cujo primeiro parágrafo é “do comentário de
Charles Baudelaire, grande amigo do poeta”, conforme indi-
cado entre parênteses, abaixo da palavra “introdução”. Nos
próximos cinco parágrafos são tecidos comentários elogiosos
sobre Poe com frases do tipo: “Como poeta, Edgar Allan Poe
representa, quase sozinho, o movimento romântico na Amé-
rica”, “Nenhum homem jamais contou com maior magia as
exceções da vida humana e da natureza”, “Não é fácil
recontar, resumindo, uma história de Edgar A. Poe”.
Em seguida, entre as páginas 7 e 140, os contos são
recontados. As três páginas subsequentes apresentam uma
“Biobibliografia” do autor. Finalmente, ao pé da última
página do livro, é encontrada a seguinte informação: “Esta
obra foi impressa com miolo em papel offset 75g e capa em
cartão supremo 250g na Ediouro Gráfica”.

9 Títulos originais: “The Black Cat”, “The Masque of the Red


Death”, “The Facts in the Case of M. Valdemar”, “MS Found in a
Bottle”, “The Premature Burial”, “The Murders in the Rue
Morgue”, “The Fall of the House of Usher”, “Berenice”, “Never Bet
the Devil your Head”, “The Duc de L’Omelette”, “William
Wilson”, “The Oval Portrait”, “The Tell-Tale Heart”, “The Devil in
the Belfry”, “The Cask of Amontillado”, “Metzengerstein”,
“Ligeia”, and “Mesmeric Revelation”.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 113

Em suma, vale salientar algumas diferenças e seme-


lhanças que podem ser verificadas entre as duas publicações:
a Ediouro tece (na contracapa) algum comentário acerca da
tradutora; a Civilização Brasileira, ao contrário, nada diz a
respeito do tradutor. Esta lacuna é indicativa da invisi-
bilidade do tradutor, o que será discutido oportunamente. A
edição da Civilização Brasileira apresenta notas de pé de
página (seis delas são do tradutor); a Ediouro não apresenta
qualquer nota, mas, por tratar-se de uma adaptação, a
linguagem está voltada para um público mais jovem; assim,
a nota de rodapé poderia se tornar enfadonha para o leitor;
nenhuma das antologias presta informações a respeito dos
critérios utilizados pelos tradutores no processo tradutório;
dez contos se repetem nas duas coletâneas: “O gato preto”,
“Manuscrito encontrado numa garrafa”, “Os crimes da rua
Morgue”, “A queda da Casa de Usher”, “Berenice”10 “Nunca
aposte sua cabeça com o Diabo”11, “O Duque De
L’Omelette”, “William Wilson”, “O barril de Amontillado”,
“Metezengerstein”. Vale observar que alguns contos são
recorrentes na maioria das antologias.
Para concluir, podemos afirmar que os paratextos
presentes nas duas antologias apresentam pelo menos três
funções: informativa, comercial e canonizadora. Assim, no
que concerne à função informativa, ambas as publicações
fornecem dados referentes à vida, obra e temática do autor,
contudo, a coletânea traduzida e adaptada por Lispector
concentra menos informações do que a traduzida por
Silveira, talvez por se tratar de uma adaptação dirigida a um
público mais jovem, a editora não tenha se preocupado em
fornecer maiores detalhes nesse aspecto. As duas antologias
têm cunho comercial no sentido de apelarem para a atenção

Na tradução de Lispector o título é “Os dentes de Berenice”.


10

Na tradução de Silveira o título é “Nunca Aposte a Cabeça com o


11

Diabo”.

Sumário
114 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

do leitor através do título, das ilustrações de capa (cemitério


e morcegos) e de resumo na contracapa (press release). A
grande maioria de títulos e capas de coletâneas traduzidas
de Poe está relacionada ao mistério, ao sombrio, ao pavor, ao
crime. As coletâneas analisadas também detêm uma função
canonizadora: primeiro, por serem narrativas de um escritor
de fama mundial (o mestre do conto fantástico); segundo,
por serem publicações de editoras bem conceituadas; e
terceiro, por serem traduções de escritores-tradutores consa-
grados na década de 70. Nesse ponto, Figueiredo observa
que “a antologização e os prefácios da autoria de figuras
consagradas ou pelo menos detentoras de algum peso
cultural no sistema importador funcionam como tentativa de
canonizar [perpetuar, no caso de Poe] os autores antolo-
giados” (2009, p. 91).
Silveira é autor de um dos primeiros livros sobre
tradução (A arte de traduzir), uma referência no Brasil. Além
de contos de Poe, também traduziu obras de escritores como
Vladimir Nabokov e Henry James. Lispector foi jornalista,
tradutora e, principalmente, renomada romancista e escrito-
ra de contos de destaque como “A hora da estrela”, “Água
Viva” e “Laços de Família” além de crônicas e obras de
literatura infantil.
No que concerne aos paratextos das edições acima
analisadas, podemos dizer que é marcante a presença de
certos discursos de acompanhamento como prefácio, intro-
dução, apresentação, elementos que buscam uma melhor
receptividade no polissistema literário nacional dos contos
de Poe. Por se tratar de um escritor de fama mundial é
promissor ao mercado editorial publicar traduções de suas
obras, o que justifica o interesse de muitas editoras. Globo,
Ediouro, Civilização Brasileira, Cultrix e L&PM, estão entre
as muitas que já publicaram a prosa e/ou a poesia do autor.
Vale ressaltar que, nos últimos oito meses de 2012, três
editoras lançaram coletâneas de contos de Poe no Brasil, a

Sumário
Pesquisas em Tradução | 115

saber: Martin Claret, Tordesilhas e Besouro Box. O montante


de 528 traduções desde a primeira antologia lançada em 1903
está distribuído em 145 publicações12, variando de um a 22
contos (por publicação) e envolvendo o trabalho de cerca de
80 tradutores.

Referências

ARAÚJO, Ricardo. Edgar Allan Poe: um homem em sua sombra.


Cotia/SP: Ateliê Editorial, 2002.
BOTTMANN, Denise. “Alguns aspectos da presença de Edgar
Allan Poe no Brasil”. Tradução em Revista, vol. 8, 2010/1, pp. 01-19.
DAGHLIAN, Carlos. “A recepção de Poe na literatura brasileira”.
Fragmentos (UFSC), nº 25, Florianópolis, jul-dez/2003, p. 45-54.
Disponível em:
<http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/fragmentos>
FIGUEIREDO, Vivina Almeida Carreira de Campos. “Fortuna
literária de Edgar Allan Poe traduzido em Portugal”. Cadernos de
Tradução (UFSC), v. 2, n0 24. Florianópolis: Núcleo de tradução,
2009, p. 65-94. Disponível em:
<http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/tradução>
___________. “A paratextualidade na reescrita portuguesa dos
contos de Edgar Allan Poe”. In: Revista Anglo Saxonica, Ser. III, n. 1,
2010. Disponível em:
<dspace.uevora.pt/rdpc/bitstream/10174/3955/1/as28-iii-web-
jpgs.pdf>
___________. “Joyce em Português europeu. As funções dos
paratextos em Dubliners e A Portrait of the Artist as a Young Man”. O
Língua. Revista Digital sobre Tradução, n. 6, abril/2005. Disponível
em:
<cvc.instituto-camoes.pt/olingua/06/index.html>
GENETTE, Gerard. Paratextos editoriais. Tradução de Álvaro
Faleiros. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009.

12Agradecemos a Denise Bottmann por essa informação. Devo


observar que nesse número inclui The Narrative of Arthur Gordon
Pym of Nantucket, único romance de Poe.

Sumário
116 | P o e n o B r a s i l : u m a a n á l i s e d o s p a r a t e xt o s . . .

POE, Edgar Allan. Histórias Extraordinárias. Tradução de Brenno


Silveira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970.
________. Histórias Extraordinárias de Allan Poe. Trad. e adaptação
de Clarice Lispector. São Paulo: Ediouro, 2003.
TORRES, Marie Hélène Catherine Torres. Traduzir o Brasil Literário:
Paratexto e discurso de acompanhamento. Trad. do francês:
Marlova Aseff e Eleonora Castelli. Tubarão: Copiart, 2011, vol. 1.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 117

Lavínia Teixeira GOMES


Universidade Federal da Paraíba

Maria Lúcia VASCONCELLOS


Universidade Federal de Santa Catarina

Breve panorama da tradução audiovisual nos Estudos da


Tradução

O presente artigo situa-se na área de conhecimento da


tradução audiovisual (doravante TAV), ramo que ganhou
interesse no meio acadêmico, enquanto modo de tradução, a
partir dos anos 80, atingindo seu auge na década de 90
(DIAZ CINTAS, 2008, FRANCO; ARAÚJO, 2011). Objeti-
vamos apresentar algumas reflexões sobre o tratamento
dado ao que Lewis (1985) denomina “nós textuais de
significado” nas legendas do documentário Saudade do
Futuro.
Antes de explanarmos o que sejam “nós textuais de
significado” faz-se necessário distinguirmos os termos
“legenda” e “legendagem” que são utilizados ao longo deste
artigo e que podem ser indevidamente confundidos.
Tomamos a definição dada por Dias Cintas que define o
termo “legenda” como sendo

1 Direção de Marie-Clémence e Cesar Paes. Produção Franco-


brasileira, 2000. Duração 94 minutos.

Sumário
118 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

[...] uma prática de tradução que consiste em apre-


sentar, em geral sobre a parte inferior da tela, mas
nem sempre (no Japão as legendas são colocadas na
vertical do lado direito da tela), um texto escrito que
tenta restituir: o diálogo original dos locutores, que
eles estejam ou não na tela; os elementos discursivos
que aparecem na imagem [...]; outros elementos
discursivos que fazem parte da trilha sonora, como as
músicas, as vozes que emanam da televisão, da rádio,
ou de computadores, etc.” (2008, p. 27-28).2

Deste modo, a legenda3 refere-se ao material textual


que será inserido na tela, enquanto que o termo “legen-
dagem” refere-se a todo o processo, i.e, da etapa de marca-
ção das legendas até sua revisão e gravação (ARAÚJO, 2006,
p. 158).
Quanto ao profissional que traduz os diálogos em
legendas e as insere na tela, eles podem ser dois: o legen-
dador e o legendista. Alvarenga (1998, p. 215) define “legen-
dador” como sendo o técnico que insere as legendas no
material visual, enquanto que o “legendista” é aquele que
faz a tradução do texto oral para o texto escrito (a legenda).
Muitas vezes o próprio o legendista (o tradutor) é o próprio
legendador. Autores como Martinez (2007) e Carvalho
(2010) preferem chamar os tradutores para legendas de
legendadores. Neste artigo é utilizado o termo “legendador”

2 Original : Le sous-titre peut être défini comme une pratique de


traduction qui consiste à présenter en général sur la partie inférieure de
l’écran, mais pas toujours (au Japon, les sous-titres sont disposés
verticalement sur le côté droit de l’écran) un texte écrit qui s’attache à
restituer : le dialogue original des locuteurs, qu’ils soient ou non à
l’écran ; les éléments discursifs qui apparaissent à l’image […] ; d’autres
éléments discursifs qui font partie de la bande son, comme les chansons,
les voix émanant de postes de télévision, de radios ou d’ordinateurs, etc.
3 Fazemos referência aqui às legendas para ouvintes.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 119

para fazer referência ao profissional que traduz os diálogos


orais para, em seguida, inseri-los no formato das legendas.
O artigo “La traduction audiovisuelle: un genre en
expansion”4 de Gambier (2004, p. 2-3) é bastante esclarecedor
ao situar a legendagem dentro do campo de conhecimento
da TAV, distinguindo, com mais detalhes, outros modos de
tradução pertencentes a este campo disciplinar, a saber: tra-
dução de roteiro, feita para projetos de realização cinema-
tográfica ou televisiva; legendagem intralinguística (ou closed
caption) para surdos e deficientes auditivos; legendagem
interlinguística (ou open caption) legendagem monolíngue ou
bilíngue; legendagem em tempo real; dublagem; interpre-
tação consecutiva ou simultânea em rádio ou televisão; o
voice-over ou meia-dublagem (superposição da voz na língua
de chegada sobre a da língua de partida); o comentário livre,
com explicitações, informações, comentários; o subtítulo
(utilizado em peças de teatro ou ópera e projetado em tempo
real); tradução à prima vista, realizada a partir de um roteiro
ou de uma legenda já feita em outra língua; a audiodescrição
(intra ou interlingual); e, por fim, a produção multilin-
guística ou remakes de filmes adaptados para um mercado
e/ou público específico(s).
Essa classificação desenvolvida por Gambier retrata a
complexidade e extensão do campo da tradução audiovisual,
onde a imagem, o verbal e o áudio se entrelaçam. O autor,
querendo combater a visão reducionista que ainda permeia a
TAV, salienta que

[...] ela (A TAV) é uma tradução seletiva com


adaptação, compensação, reformulação e não somente
perdas! [...] Ela é tradução se ela é vista como um
todo, levando em conta o gênero, os estilos de filmes e
programas, os receptores na sua diversidade sócio-

4 Tradução: A tradução audiovisual: un gênero em expansão.

Sumário
120 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

cultural e em sua diversidade de hábitos de leitura,


assim como a multimodalidade da comunicação AV
(visual, verbal, áudio). (GAMBIER, ibid., p. 5)5. [itálico
meu]

Considerada também tradução, mas com suas espe-


cificidades, a legendagem somente começou a interessar ao
meio acadêmico a partir dos anos 90. Esse interesse tardio da
comunidade acadêmica, aponta Diaz Cintas (2008), vem do
fato de que muitos estudiosos não consideravam a legen-
dagem uma verdadeira tradução, em função das restrições
impostas pelo espaço e tempo e que limitam considera-
velmente o produto final. A evolução do conceito de tradução
nos Estudos da Tradução (doravante ET) contribuiu conside-
ravelmente para a aceitação de novas práticas tradutórias
derivadas das novas realidades, como afirma Diaz Cintas:

[...] começamos há pouco a considerar o conceito de


tradução de um ponto de vista mais flexível, mais
heterogêneo e menos rígido, que deve necessaria-
mente levar em conta uma grande variedade de reali-
dades empíricas e que permite reconhecer a natureza
evolutiva das práticas profissionais no campo do
audiovisual. [...] a tradução é considerada de agora
em diante, pela maioria dos pesquisadores, como um
termo mais flexível e mais geral, que pode se adaptar
às novas realidades em vez de negligenciar práticas

5 Original : La TAV est une traduction qui n'est pas plus


"contrainte", pas plus "un mal nécessaire" que d'autres types ; elle
est une traduction sélective avec adaptation, compensation,
reformulation et pas seulement pertes ! […]. Elle est traduction si
celle-ci est vue comme un tout, prenant en compte les genres, les
styles de films et de programmes, les récepteurs dans leur diversité
socio-culturelle et leur diversité dans les habitudes de lecture, ainsi
que la multimodalité de la communication AV (visuel, verbal,
audio).

Sumário
Pesquisas em Tradução | 121

que não entrariam no quadro pomposo e ultrapassado


de um conceito inventado há vários séculos quando o
cinema, a televisão e computadores ainda não
existiam.” (DIAZ CINTAS, 2008, p. 28)6

Graças à evolução do conceito de tradução, a legen-


dagem foi, aos poucos, obtendo espaço e sendo considerado
como um legítimo campo disciplinar. Gambier (2006)
também chama a atenção para o ganho de interesse da TAV
nos anos 90 em seu artigo “Orientations de la recherche en
traduction audiovisuelle” 7 , salientando o início de pesquisas
que dão ênfase a questões ligadas à legendagem, como teses
de doutorado (WHITMAN-LINSEN, 1992; MACHADO,
1993; TOMASZKIEWCZ, 1993; DANAN, 1994) ou o trabalho
de Baker et al. de 1984 sobre a legenda para surdos e defi-
cientes auditivos. Esses foram alguns trabalhos que contri-
buíram, segundo o autor, “para a emergência da TAV como
ao menos um sub-domínio dos Estudos da Tradução”
(GAMBIER, 2006, p. 263). Assim percebe-se a integração da
TAV como parte do campo disciplinar Estudos da Tradução
e como objeto de investigação legitimado na área, com siste-
matização técnico-científica e metalinguagem próprias,
impondo-se enquanto novo campo de conhecimento na co-
munidade acadêmica.

6 Original : […] on commence depuis peu à considérer le concept


de traduction d’un point de vue beaucoup plus souple, plus
hétérogène et moins figé, qui doit nécessairement prendre en
compte une grande variété de réalités empiriques et qui permet de
reconnaître la nature évolutive des pratiques professionnelles dans
le domaine de l’audiovisuel. […] la traduction est désormais
considérée, par la plupart des chercheurs, comme un terme plus
flexible et plus général, qui peut s’adapter aux nouvelles réalités au
lieu de négliger des pratiques qui n’entreraient pas dans le cadre
guindé et dépassé d’un concept inventé il y a plusieurs siècles alors
que le cinéma, la télévision et les ordinateurs n’existaient pas
encore.
7 Tradução : Orientações da pesquisa em tradução audiovisual.

Sumário
122 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

A legenda de documentários: um gênero à parte

A escolha pelo gênero documentário se justifica pelo


fato de que este gênero ainda é pouco explorado nos ET. Os
estudos sobre legendagem tratam essencialmente de filmes
de ficção de longa ou curta metragem, de seriados, novelas,
teatro filmado, ou de filmes com audiodescrição nos quais o
material textual é “claramente definido, visível, e que serve
subsequentemente de eventuais modificações”
(KAUFFMANN, 2008, p. 70); em outras palavras, antes de
ser levado à tela, a obra de ficção é inicialmente um texto
escrito (roteiro). Kaufmann8 (2008) tenta explicar o motivo
desta falta de interesse pelos gêneros não-ficcionais e
pressupõe que

[...] os filmes de ficção exijam primeiro uma exegese


para serem compreendidos e depois traduzidos, da
mesma maneira em que traduzimos uma obra literária
e o vouloir-dire de seu autor, enquanto que os filmes e
programas que refletem a realidade ou a comentam
podem ser simplesmente traduzidos reproduzindo
objetivamente o que foi gravado na hora. (p.70).

De acordo com Franco (2000, 2001) e Kauffmann (2004,


2008) pode-se pensar que há uma exigência maior em torno
da tradução de filmes ficcionais, que demandaria um
trabalho mais complexo em torno da língua, enquanto que
os documentários (ou filmes não-ficcionais), gênero artístico
considerado menor (cf. KAUFFMANN, 2004), por se
preocupar em reproduzir a ‘realidade’ tal e qual, não exigiria

8 Original : […] les films de fiction exigent d’abord une exégèse


pour être compris puis traduits, à la manière dont on analyse une
œuvre littéraire et le vouloir-dire de son auteur, tandis que les
films, émission et programmes qui rendent compte de la réalité ou
la commentent peuvent être simplement traduits en reproduisant
objectivement ce qui a été enregistré sur le vif.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 123

tanta criatividade e, portanto, seria “aos olhos dos pesqui-


sadores uma atividade objetiva, sem problemas (e então sem
interesse)” (KAUFFMAN, 2004, p. 149). Gambier e Sumoela-
Salmifonte (1994) ressaltam “a forte tradição literária que
permeia os Estudos da Tradução em geral e os Estudos de
Tradução audiovisual em particular” (apud. FRANCO, 2002,
p. 67), estabelecendo modelos teóricos e de análise baseados
na ficção.
O documentário nos estudos sobre TAV, segundo
Kauffman (2008, p. 69), além de ser um gênero pouco
explorado é também um gênero à parte. Isto se dá pelas
diferenças encontradas entre o gênero ficcional do não-
ficcional. Dentre elas, está o fato de que, diferentemente dos
filmes para cinema ou televisão e dos seriados, o
documentário não se apoia em um texto redigido por um
autor antes de ir para a tela. Ele é produzido com a intenção
de tentar dar conta da realidade in situ aos espectadores.
Portanto, o legendador terá de dar conta dos diálogos que
não foram escritos anteriormente, mas sobretudo gravados
in loco.
O termo documentário, na área do Cinema e História
é, segundo Dias (2009), difícil de definir. Os intensos debates
na área não encontraram um consenso. Ramos (2008), reno-
mado pesquisador em Cinema, em sua obra “Mas afinal...o
que é mesmo documentário?” busca essa definição. De
acordo com o autor, o conceito não evoluiu juntamente com
a evolução do documentário, ficando atrelado a sua forma
clássica até o fim dos anos 50. Somente nos anos 90 os filmes
não-ficcionais, que fugiam à forma clássica do documentário,
ganharam o status de documentário. O autor define o termo
documentário a partir de sua diferença com o filme de ficção
e afirma que o documentário estabelece uma ligação com o
mundo histórico, com a linha do tempo da humanidade,
enquanto que a narrativa ficcional se constrói graças ao
campo da imaginação. Mas o autor reconhece que essas duas

Sumário
124 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

formas de narração podem se nutrir uma da outra. Por isso,


tenta estabelecer suas diferenças através de parâmetros
formais:

Em sua forma de estabelecer asserções sobre o


mundo, o documentário caracteriza-se pela presença
de procedimentos que o singularizam com relação ao
campo ficcional. O documentário, antes de tudo, é
definido pela intenção de seu autor de fazer um
documentário [...]. Podemos, igualmente, destacar
como próprios à narrativa documentária: presença de
locução (voz over), presença de entrevistas ou depoi-
mentos, utilização de imagens de arquivo, rara utili-
zação de atores profissionais [...]. Procedimentos como
câmara na mão, imagem tremida, improvisação,
utilização de roteiros abertos, ênfase na indetermi-
nação da tomada pertencem ao campo estilístico do
documentário, embora não exclusivamente. (RAMOS,
2008, p.25) [itálico do autor]

Nesse sentido, mesmo que o filme de ficção busque


recursos do documentário, como a locução, câmera na mão
ou imagens de arquivo, características fílmicas inicialmente
do documentário, a intenção do cineasta de filmes ficcionais
não será a mesma. Enquanto que o objetivo do filme é
entreter o espectador, o documentário tem a intenção de
querer fazer asserções sobre fatos ou realidades existente no
mundo histórico.
O estudo das legendas do documentário “Saudade do
futuro”, objeto de estudo da presente pesquisa, vem assim
trazer uma contribuição para a área dos ET, visto que o
gênero documentário ainda é pouco explorado. Ao ter como
objetivo registrar/documentar eventos ou aspectos de um
grupo social, o documentário se apresenta como ilustração
de uma fonte de material de pesquisa a ser explorado.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 125

Documentário “Saudade do Futuro”: contexto de produção


e recepção

O presente trabalho examina uma seleção de legendas


retiradas do documentário “Saudade do Futuro”, produção
francesa9 de 2000 e legendado em francês, inglês, espanhol e
italiano. Dirigido e filmado no Brasil por Marie-Clémence e
Cesar Paes, o documentário busca registrar o cotidiano e as
vivências de uma parte do povo nordestino que imigra para
São Paulo, em busca de melhores condições de trabalho e de
vida, e que se instala em situação de cidadão de fronteira,
um pouco paulistano e um pouco nordestino. Durante 90
minutos, os protagonistas, provindos de diversos meios
sociais, narram sua trajetória na grande metrópole ao som de
ritmos do nordeste. De acordo com a informação veiculada
em seu site oficial10, o documentário foi produzido para um
público estrangeiro, essencialmente europeu. Exibido nas
salas de cinema na Suíça, França e na cidade de Nova York,
participou de 68 festivais, dos quais 3 no Brasil, 11 na França,
11 nos Estados Unidos, 3 na Suíça, 3 no Canadá, 6 na Itália, 5
na Bélgica, 1 na Colômbia, 1 no Equador, 3 no Portugal, 4 na
Espanha, 1 em Israel, 2 na República Tcheca, 3 na Inglaterra,
1 na Turquia, 3 na Alemanha, 1 na Austrália, 2 na Argentina,
2 na Dinamarca, 1 nos Países Baixos e 1 na Noruega. Foi
também comercializado o CD “Saudade do Futuro” com 20
músicas, sendo 19 contempladas gravadas em estúdio
durante a filmagem do documentário. As canções foram
todas traduzidas em francês e inglês.
Em relação ao trabalho de legendagem, de acordo com
as informações cedidas por Cesar Paes, os procedimentos
adotados pelos produtores foram os seguintes: (i) transcrição
do material sonoro da montagem definitiva do documen-
tário; (ii) realização de uma primeira legendagem do

9 Co-produção: Portugal, Bélgica, Brasil.


10 Site oficial: www.saudadedofuturo.com

Sumário
126 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

português para o francês; (iii) revisão das legendas, pelo


escritor Yvez Nilly (releitura e ajustes); (iv) realização da
legenda em inglês a partir das legendas em francês; (iv)
realização das legendas em espanhol e alemão a partir de
todas as legendas anteriores.

Quadro teórico, objetivo e procedimentos da análise

A análise, de caráter essencialmente qualitativo, tem


como objeto de estudo os termos ligados à cultura nordes-
tina, i.e, às referências culturais, coletadas a partir das
legendas em francês; segundo Mailhac (1996, p. 173),
entende-se como ‘referência cultural’ “qualquer referência a
uma entidade cultural que, por causa de sua distância a
partir da cultura de destino, é caracterizada por um grau
suficiente de opacidade do ponto de vista do leitor alvo, a
fim de constituir um problema de tradução".
Essas referências culturais são observadas com o apoio
do conceito de “nós textuais de significado”, que, segundo
Lewis (1985, p. 271) se referem aos momentos no texto de
partida carregados de significado semântico ou proposi-
cional. No sentido adotado no estudo de Medeiros (2003, p.
12) sobre as legendas em inglês de filmes brasileiros de
termos ligados à cultura, esses “nós” são referências a
componentes culturais tais como: referências a locais,
alimentos ou bebidas regionais, costumes sociais ligados a
crenças religiosas, festivais locais, referências históricas,
celebridades contemporâneas, empresas locais, marcas,
instituições locais e elementos tipicamente ligados a uma
determinada região, país, cidade ou vilarejo.
Em seu artigo Culture’s specific itens in translation,
Aixelá (1996) adota o termo culture-specific itens (CSIs) para
se referir ao que chamamos de Itens de Especificidade
Cultural (IECs). Segundo o autor, um IEC se expressa “por
meio de objetos e de sistemas de classificação e medição cuja

Sumário
Pesquisas em Tradução | 127

utilização é restrita à cultura de origem, ou por meio da


transcrição de opiniões, e a descrição de hábitos igualmente
alheios à cultura receptora11”(p.56). O autor estabelece uma
classificação das estratégias de tradução relacionadas aos
IECs a partir da natureza de conservação ou de substituição
desses “nós textuais de significado. Para Aixelá (op.cit.), a
condensação é percebida através de cinco (05) tipos de
estratégias: (a) repetição – quando o termo original
permanece no texto-alvo; (b) adaptação ortográfica – quando
o texto-alvo se adapta ao alfabeto da cultura receptora; (c)
tradução linguística – quando há transparência linguística
entre os itens ou uma tradução pré-estabelecida na língua de
chegada; (d) glosa extratextual – quando o tradutor oferece
uma informação extra ao leitor; (e) glosa intratextual –
quando a glosa faz parte integrante do texto-alvo. E a
substituição pelas seguintes estratégias: (a) sinonímia –
quando o tradutor evita a repetição do item através de um
sinônimo; (b) universalização limitada – substituição de um
termo obscuro para o leitor, por um item da cultura-fonte
mais próximo; (c) universalização absoluta – escolha por um
item neutro apagando qualquer conotação estrangeira; (d)
naturalização – o tradutor trás o item para o contexto da
cultura alvo; (e) exclusão – o tradutor exclui o item ou
porque não o acha relevante ou muito obscuro; (f) criação
autônoma – acréscimo de referência cultural ao texto-alvo.
Outras estratégias são definidas por Aixelá como a “com-
pensação”, ou seja, a exclusão e depois criação autônoma no
texto-alvo, o “deslocamento”, quando o item é deslocado
para outra parte do texto e por fim a atenuação, quando o
termo é atenuado por outro mais adequado à cultura
receptora.

11Original: Are usually expressed in a text by means of objects and


of systems of classification and measurement whose use is
restricted to the source culture, or by means of the transcrition of
opinions and the description of habits equally alien to the receiving
cultures.

Sumário
128 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

Portanto, a partir da localização dos “nós textuais de


significado”, procedeu-se à classificação acima, desenvolvida
por Aixelá (1996), para analisar os itens de especificidade
cultural (IEC) e seu tratamento dado pelo legendador.
A seleção e análise do tratamento dos nós textuais de
significados nas legendas do documentário “Saudade do
futuro” é um estudo preliminar de um projeto de doutorado
em andamento. Portanto, a utilização dessa classificação não
é definitiva, podendo ser reformulada posteriormente por
outras contribuições do mesmo gênero.

Análise dos dados

A análise dos dados da pesquisa gerou os resultados


descritos e comentados abaixo. Os dados selecionados
contêm 44 itens de especificidade cultural, dos quais 10
foram excluídos (Ex), conforme apresentado nos quadros 1 e
2. As colunas dos quadros representam respectivamente: o
IEC (item de especificidade cultural) seguido de seu código
de localização no documentário (inicial do nome do capítulo
do documentário) e número de localização da legenda (ex.
E1) em parênteses; a legenda em francês (LF), e sua Back
Translation (BT), i.e., uma tradução direta em português da
legenda em francês, sem levar em conta as rimas dos versos;
e por fim, os tipos de categoria, baseado na classificação de
Aixelá (op.cit.) utilizados na tradução do texto oral em
português para a legenda em francês.

IEC LF BT Categoria
Levar peia Des mots Palavras Universaliza-
(C18) blessants afiadas ção absoluta
Nordestino é “Nordestinos” os Repetição
chamado sont appelés nordestinos
baiano (P8) “Baianos” são
chamados
baianos

Sumário
Pesquisas em Tradução | 129

Viola (P12) fiers fieis Universaliza-


instruments instrumentos ção absoluta
Caboclo(P16) Les paysans os Universaliza-
métis camponeses ção limitada
mestiços
Choro na Porte le deuil Está de luto Universaliza-
guela (P22) ção absoluta
Favelas (P24) favelas favelas Repetição

Favela (P5) bidonville favela Universaliza-


ção limitada
Viola (P31) guitare Violão Universaliza-
ção limitada
Câmara Câmara Câmara Repetição
Cascudo Cascudo Cascudo
(P39)
Repente repente repente Repetição
(P48)
Cantador troubadour trovador Universaliza-
(P49) ção limitada
preto, branco noir, blanc ou negro, Universaliza-
e sarará rouquin branco ou ção absoluta
(No1) ruivo
FEBEM orphelinat orfanato Universaliza-
(No6) ção absoluta
Guaraná guaraná guaraná Repetição
(No15)
Forró e Forró e Forró e Repetição
mazurka mazurka mazurka
(No21)
Saudade (I2) saudade saudade Repetição
O crente e o Le sobre du O sóbrio do Universaliza-
cachaceiro soûl bêbado ção limitada
(I14)
Falar Trainer les Arrastar as Universaliza-
arrastadinho mots palavras ção absoluta
(Ex1)

Sumário
130 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

Tem neto de Les petits-fils os netos de Universaliza-


italiano d’italiens italianos ção absoluta
dizendo rajoutent les acrescentam
“oxente mains as mãos
bichinho”
(Ex2)
Forró pé de Forró pied-de- Forró pé de Universaliza-
serra (Ex3) la-butte colina ção limitada
Pé de serra talus serra Universaliza-
(Ex4) ção limitada
Mundiça famille Família Universaliza-
(I19) ção absoluta
Caipirinha caipirinhas caipirinhas Repetição
(No27)
Côco (I16) Noix de coco Côco Universaliza-
ção limitada
Lascando insulter insultar Universaliza-
(I19) ção limitada
Abraçar embrasser beijar Universaliza-
(C13) ção limitada
Coalhada Petit caillé Pequeno Universaliza-
(C17) qualhado ção limitada
Cuscuz (C17) coucous cuscuz Universaliza-
ção limitada
Itapemirim bus ônibus Universaliza-
(C21) ção absoluta
Galinhada Poulet au pot Prato à base Universaliza-
(S6) de galinha ção limitada
Macaxeira manioc mandioca Universaliza-
(S10) ção limitada
Sem baratin Blá blá blá Universaliza-
vergonheza ção limitada
(S14)
Pandeiro tambourin tambourin Universaliza-
(S16) ção limitada
trombadinha C’est mal famé Tem má Compensação
(No29) fama

Sumário
Pesquisas em Tradução | 131

Quadro 1 – Itens de especificidade cultural presentes na legenda

Itens Excluídos
Cenas de “repente” Cenas de “cantoria”
ou “repente de
viola”12
Dança/ Côco (No16, I2, S5);
Gênero cantoria (No40); embolada
musical (S5); embolar (No16)
Ali- Batata (No18), cará (No18),
mentos rapadura (I16); cana de
açúcar (No21)

Festa Reizado (No22)


popu-lar
Dialeto “de coca”13 (I5); buchu
(C14);14 embuchada (C15)15;
Quadro 2 - Itens de especificidade cultural excluídos na legenda

Em relação ao Quadro 2 - Itens de especificidade


cultural excluídos na legenda, foi observado que houve um
maior número de exclusões nas cenas de “repente” do que
nas de “cantoria”. O que pode levar à suposição de que a
exclusão poderia ser induzida pelo fator tempo/espaço, pois
o repente é um gênero musical com velocidade mais rápida
do que a cantoria. Além dessa hipótese motivada por limites

12 O termo repente nordestino remete, mais comumente, a dois


tipos de poéticas improvisadas distintas. Uma que se utiliza da
viola, denomidada repente de viola, e outra acompanhada pelo
pendeiro ou pelo ganzá (espécie de chocalho), denominada de coco
de embolada. Apesar de ambas pautarem-se no improviso dos
versos cantados, são poéticas orais regidas por regras
diferenciadas.
13 De cócoras.
14 Barriga.
15 Engravidar.

Sumário
132 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

espaço-temporais, outra hipótese emitida está relacionada ao


fato de que o item excluído seja um item não pertencente à
cultura de chegada, como nos exemplos dos itens acima.
Deste modo, elaborou-se uma classificação das exclusões
conforme o tema: dança ou gênero musical, alimentos, festa
popular e dialeto.

Categoria
Número de ocorrências (Total = 34)
Substituição Conservação
Universalização limitada 16 Repetição 08
Universalização absoluta 09
Compensação 01
Quadro 3 – Ocorrência dos IECs

Percebe-se no Quadro 03, sobre a ocorrência dos IECs,


que dos 34 IEC traduzidos, houve mais Substituição dos que
Conservação dos IECs. Entre as ocorrências de Substituição,
perceberam-se três tipos de tratamento dado pelo legen-
dador. Houve 16 casos de Universalização limitada, i.e.,
quando o tradutor substitui um termo obscuro para o leitor
por um item da cultura-fonte mais próximo; 09 ocorrências
de Universalização absoluta, no qual privilegia-se um item
neutro apagando qualquer conotação estrangeira e 01 caso
de Compensação, i. e., quando o legendador exclui um item,
mas acrescenta algum tipo de referência cultural ao texto-
alvo (criação autônoma). Entre as ocorrências caracterizando
a natureza de Conservação dos IECs, percebeu-se somente 08
casos de Repetição, quando o termo original permanece no
texto-alvo, reforçando o caráter exótico ou arcaico do item.
Portanto, constata-se que o tradutor utilizou mais o
procedimento de Substituição do que Conservação dos IECs.
Quanto aos itens repetidos na legenda, percebe-se que ele
confirma o que disse Aixelá sobre o reforço da imagem
“exótico” do item, como por exemplos, os itens “nordes-
tinos/baianos” (P8), “favelas” (P24), “repente” P(48), “guara-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 133

ná”(N15), “forró”(N21), “saudade”(I12). O item “favela” (P5)


foi retomado em outro momento e substituído por
“bidonville”, item mais conhecido para a cultura receptora,
sendo classificado pela categoria “Universalização limitada”.
Quanto a essa categoria, ela teve o maior número de
ocorrências dentre o tratamento por Substituição. O tradutor
substituiu o item considerado obscuro para a cultura
receptora por um item já conhecido. Como por exemplo nos
itens “guitarre” (P31) para “viola”, “troubadour” (P49) para
“cantador”, “forró pied-de-la-butte” (EX3) para “forró pé de
serra”, “embrasser” (C13) para “abraçar”, “le sobre et le
soûl”(I14) para “crente e cachaceiro” ou ainda “Noix de
coco”(I16) para “côco”. Quanto às escolhas por um item
neutro que apague qualquer conotação estrangeira (Univer-
zalização absoluta), as ocorrências foram menores que a
Universalização limitada. A exemplo do itens “choro na
guela” P22 “porte le deuil”, “trainer les mots” (EX1), ou
“famille” (I19) para o item “mundiça”, nos levando a emitir a
hipótese de que o legendador tenta preservar a cultura do
texto-fonte.

Conclusão

Apresentamos uma análise preliminar de nossa fonte


de dados retirada do documentário “Saudade do futuro” de
Marie-Clémence e Cesar Paes (2000). Alguns trechos das
legendas do documentário foram analisados de acordo com
o conceito de “nós textuais de significado” de Lewis (1985) e
as categorias de “itens de especificidade cultural” IEC
proposta por Aixelá (1996). “Nós textuais” remetem ao
“sistema de nós que é a cadeia de valores que liga o costume,

Sumário
134 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

o uso útil, e linguística comum”.16 Essa cadeia de valores


representa os momentos no texto-fonte carregados de
significado semântico ou proposicional de uma cultura
específica. Neste estudo piloto, após a localização dos nós
textuais de significado, procedeu-se a uma categorização
através da tipologia de análise dos “itens de especificidade
cultural”. Dos 44 IECS analisados, 16 foram apresentaram
uma Universalização limitada, i.e, quando o tradutor procu-
ra um item mais próximo à cultura de chegada. Algumas
hipóteses foram levantadas em relação à exclusão de alguns
IECs. A primeira está relacionada ao tempo/espaço das
legendas em trechos de repente e de cantoria devido à
diferença de ritmo entre esses dois gêneros musicais. A
segunda hipótese diz respeito à ausência do IEC na cultura
de chegada, o que levaria o tradutor a excluir totalmente o
referido item no texto de chegada.
Os resultados do estudo piloto aqui relatado apontam
para a necessidade de ampliação dos quadros teóricos que
informam a pesquisa, uma vez que, para dar conta da
natureza complexa dos IEC na TAV, e no tratamento dado à
cultura de um povo, de uma região, no caso, à cultura
nordestina, de suas referências, de suas expressões regionais,
dos ditados populares, e de suas representações, conforme
“imaginada” pelos produtores do documentário. A
ampliação do quadro teórico-metodológico em análises
posteriores será parte da contribuição pretendida pela
pesquisa de doutorado, em andamento.

16Original : The us-system, that is, the chain of values linking the
usual, the useful, and common linguistic usage. [Tradução da
autora]

Sumário
Pesquisas em Tradução | 135

Referências

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Tradução, Intepretação e Cultura na Era da Globalização. São
Paulo: UNIBERO, 1998. p. 214-216.
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ARAÚJO, V. L. S. O processo de legendagem no Brasil. Revista do
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CARVALHO, C. A. Singularidade, transgressão e ética na
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FRANCO, E. P. C. “Voiced-over Television Documentaires:
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GAMBIER, Y.“Orientations de la recherche en traduction
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KAUFMANN, F. “Les sous-titrage des documentaires: défis et
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audiovisuelle: Approche interdisciplinaire du sous-titrage. Coll.
Traducto. Bruxelles: De Boeck, pp. 69-83, 2008.

Sumário
136 | O s “ N ó s T e xt u a i s d e S i g n i f i c a d o ” n a s l e g e n d a s . . .

______. “Un exemple d’effet pervers de l’uniformisation


linguistique dans La traduction d’un documentaire: de l’hébreu
dês immigrants de “Saint-Jean” au français normatif d’ARTE” in
Meta: journal des traducteurs, vol 149, n˚ 1, pp. 148-160, 2004.
LEWIS, P. E. (1985). “The measure of translation effects” in Venuti,
L. (Ed.) The translation studies reader. London/New York:
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MAILHAC, J-P. “Evaluation criteria for the translation of cultual
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film. Amsterdam/Atlanta: Rodopi, pp. 173-188, 1996.
MARTINEZ, S. L. Tradução para legendas: uma proposta para a
formação de profissionais. Rio de Janeiro, 2007. Dissertação
(Mestrado em Letras Estudos da Linguagem). Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro.
RAMOS, F. P. Mas afinal...o que é documentário? São Paulo: SENAC,
SP, pp. 376-377, 2008.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 137

Marcílio Garcia de QUEIROGA


Universidade Federal de Campina Grande

As reflexões acerca da presença do tradutor no texto


traduzido têm sido cada vez mais constantes e profícuas no
âmbito acadêmico e de maneira mais acentuada na área dos
estudos da tradução. Especificamente, os tópicos mais
discutidos discorrem acerca de estilo – principalmente no
que concerne às idiossincrasias dos tradutores – e voz ou
presença discursiva. Vários são os teóricos que se debru-
çaram sobre a questão da presença/ voz do tradutor em
textos traduzidos, lançando olhares distintos sobre ela. Entre
esses estudiosos destacamos: Baker (2000), Hermans (2010) e
Schiavi (1996), nos quais nos concentraremos com maior
afinco. A título de esclarecimento, pontuamos que as refle-
xões que ora se iniciam acerca do tradutor estão centradas
especificamente naquele que traduz textos narrativos
ficcionais.
A discussão sobre a presença do tradutor suscita uma
série de questões que circundam a própria atividade, o
processo e o produto “tradução”. Tradicionalmente vista
como produto de qualidade e importância secundárias, a
tradução no meio cultural da sociedade ocidental deve ser
transparente e reproduzir de maneira similar, integral e
fluida o original (HERMANS, 2010, p. 209). Diante desta
visão limitam-se os espaços no que concerne às conside-
rações acerca da manifestação explícita do tradutor e, como

Sumário
138 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

assinala Baker (2000), impossibilita-se a percepção e/ou a


análise do estilo do tradutor.
Venuti (1995) usa o termo “invisibilidade” para apre-
sentar a situação e a atividade do tradutor da cultura anglo-
americana contemporânea. O estudioso aponta aspectos
como as decisões coercivas advindas de grupos políticos/
sociais ou daqueles que ditam o mercado editorial, como
argumento para a invisibilidade do tradutor. Dois termos
são cunhados por Venuti com o intuito de explicitar as
estratégias de tradução adotadas por aquela cultura, são eles:
domesticação e estrangeirização. O primeiro é apontado
como o método que envolve uma redução do texto estran-
geiro aos valores culturais da língua-alvo, enquanto que o
segundo é assinalado como o método de pressão etno-
desviante dos valores da língua-alvo com o intuito de
registrar as diferenças linguísticas e culturais do texto
estrangeiro. Na tradução estrangeirizante, assinalada por
Venuti como aquela a ser adotada, o tradutor e a tradução
tornam-se visíveis, convenções da cultura-alvo são quebra-
das a fim de que se mantenham as características do
“estrangeiro”. Já as traduções domesticadoras primam pela
transparência, leiturabilidade e fluidez dos textos criando a
ilusão de que não são traduções, o objetivo é minimizar os
traços que denunciariam a obra como sendo uma tradução.
Este cerceamento do outro estrangeiro enfatiza a hegemonia
da cultura-alvo permitindo que a cultura dominante, no caso
a anglófona, estabeleça cada vez mais o seu papel de
dominadora, perpetuando os antigos papeis de colonizador
e colonizado, este último sempre submisso aos ditames do
primeiro. Optando-se por uma tradução domesticadora
privamos o leitor do contato com o ‘Outro estrangeiro’
(BRITTO, 2010). Conforme Britto (2010, p. 138), “é preciso
forçar o leitor a sair da tranquilidade de seu mundo
conhecido e obrigá-lo a enfrentar o Outro em toda a sua
estranheza. Assim, a atitude estrangeirizante seria, ao menos

Sumário
Pesquisas em Tradução | 139

nesse caso, mais ética do que a domesticadora.” Jeremy


Munday (2001, p.148) esclarece que, embora advogue pela
estrangeirização, Venuti é consciente das contradições
geradas pelo termo. A tradução estrangeirizante é, também,
um ato domesticador, pois ao traduzir um texto-fonte para
uma cultura-alvo cria-se uma dependência em relação aos
valores dessa cultura para que o texto se torne visível.
Independente de serem traduções estrangeirizantes ou
domesticadoras, Hermans (2010) defende que o tradutor está
sempre presente no texto traduzido, embora a ilusão de
transparência faça com que os leitores acreditem que não
estão lendo uma tradução. Esse jogo ilusório causa, assim,
uma espécie de “apagamento” do tradutor. Hermans (2010)
compara a paradoxal relação da tradução feita por intér-
pretes à do texto escrito e ficcional. No caso do intérprete, a
presença física dos dois atores é partilhada em um dado
espaço, ainda que se crie a ilusão de que o intérprete é o
porta-voz fiel do discurso traduzido, enquanto que na ficção
traduzida o que se encontra diante de nós é somente o texto;
a voz primeira está ausente e por mais que consideremos
que o que se encontra ali é a presença discursiva do tradutor,
o leitor requererá a única voz na qual depositará confiança: a
do autor. Nesse sentido torna-se válido o questionamento
de Hermans (2010, p.197): “De quem é a voz que chega até
nós quando lemos um romance traduzido?”. Muitas são as
indagações do teórico acerca desta questão:

A ilusão de “Estou lendo Dostoiévski” resume-se a


isto? O tradutor, o trabalho manual realizado, desa-
parece sem deixar qualquer traço textual, falando
inteiramente sob apagamento? Os tradutores podem

Sumário
140 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

usurpar a voz original e ao mesmo tempo marcar o


seu próprio espaço enunciativo?1 (2010, p.197)

Na tentativa de responder às questões apontadas,


Hermans recorre à narratologia2 e apresenta um esquema
padrão em que não há distinção entre textos traduzidos e
originais. Assim, aparecem nesta ordem na primeira parte do
esquema: Autor biográfico → Autor implicado → Narrador
→ Texto; e na segunda parte: Leitor biográfico → Leitor
implicado → Narratário → Texto. Seguindo esta lógica e
transferindo-a para o campo da tradução, Hermans (2010, p.
197-8) lança uma série de perguntas: há um Tradutor
biográfico que ocupa de forma semelhante o lugar do Autor
biográfico e se firma como uma entidade firmemente
localizada fora do discurso narrativo? Concernente à
tradução há uma manutenção dos elementos narrativos da
mesma forma que no original? Se no texto-fonte o que lemos
é o discurso produzido por um narrador, no texto traduzido
quem articula o discurso? O narrador é o mesmo que opera
no texto-fonte?

1 Is the illusion of ‘I am reading Dostoyevsky’ all there is to it?


Does the translator, the manual labour done, disappear without
textual trace, speaking entirely ‘under erasure’? Can translators
usurp the original voice and in the same move evacuate their own
enunciatory space? Todas as traduções do inglês para o português
realizadas neste artigo são minhas.
2 A narratologia é uma área de reflexão teórico-metodológica

autônoma centrada na narrativa como modo de representação


literária e não-literária, bem como na análise de textos narrativos.
(...) Ao contemplar prioritariamente as propriedades modais da
narrativa, não privilegia exclusivamente os textos narrativos
literários, nem se restringe aos textos narrativos verbais; ela visa
também práticas narrativas como o cinema, a história em
quadrinhos ou a narrativa de imprensa. (REIS & LOPES, 2002, 79-
80)

Sumário
Pesquisas em Tradução | 141

Considerando que a narratologia - área de estudo da


qual o teórico em apreço lança mão para por em prática sua
tese - não faz distinção entre originais e traduções, pode-se
afirmar que os modelos narratológicos disponíveis podem
ser aplicados tanto a textos originais quanto traduzidos.
Hermans (id. Ibid.) alerta para o fato de que esses modelos
negligenciam um aspecto relevante nos textos traduzidos e
que não pode ser suprimido deles: a presença do tradutor.
Em suma: o que diferencia textos traduzidos de originais é o
fato de aqueles conterem a voz do tradutor.

O discurso narrativo traduzido, afirma-se, sempre


implica mais que uma voz no texto, mais que uma
presença discursiva. Em algumas narrativas, talvez,
esta ‘outra’ voz nunca se manifeste de forma clara,
embora seja postulada sob a força daqueles casos em
que está manifestamente presente e discernível. É
somente, creio eu, a ideologia da tradução, a ilusão de
transparência e coincidência, a ilusão de uma voz
única no texto, que nos cega para a presença desta
outra voz. [grifo nosso] (HERMANS, 2010, p. 198) 3

Hermans não nos oferece um modelo que possa situar


o tradutor no esquema narratológico acima apresentado.
Essa é uma das lacunas apresentadas em seu trabalho. Nesse
sentido, o trabalho de Schiavi (1996) colabora para uma
ampliação da discussão acerca da presença do tradutor.

3 Translated narrative discourse, it will be claimed, always implies


more than one voice in the text, more than one discursive presence.
It may be that in many narratives this ‘other’ voice never clearly
manifests itself, nevertheless be postulated, on the strength of
those cases where it is manifestly present and discernible. And it is
only, I submit, the ideology of translation, the illusion of
transparency and coincidence, the illusion of the one voice, that
blinds us to the presence of this other voice.

Sumário
142 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

Apoiando-se em Chatman (1990, p. 75), cujo argumento é o


de que “o autor real se retira do texto logo que ele é impresso
e o que permanece são os princípios inventivos e a intenção
do texto”, Schiavi apresenta o tradutor como uma espécie de
interceptor do processo comunicativo, que transmite a
mensagem reprocessada para o leitor. Ao interpretar o texto
original, ao adotar certas normas, estratégias e métodos
específicos, o tradutor constroi uma nova relação entre o que
chamamos “texto traduzido” e o novo grupo de leitores
(SCHIAVI, 1996, p. 15). Ou seja, o leitor implicado do texto
original é diferente do leitor implicado da tradução, criado
pelo tradutor, e mesmo que haja pontos comuns eles não são
idênticos.
O modelo narratológico do texto narrativo traduzido
proposto por Schiavi se resume à seguinte forma: Autor real
→ Autor implicado → Narrador do texto-fonte → Narrador
do texto-fonte → Leitor Implicado do texto-fonte → Tradutor
implicado do texto-alvo → Narrador do texto-alvo →
Narratário do texto-alvo → Leitor implicado do texto-alvo →
Leitor real da tradução. O autor real do texto fonte e o leitor
real da tradução, situados nos dois pólos do modelo,
comunicam-se através do tradutor real, o qual ocupa uma
posição externa. É o tradutor real que, mantendo o papel de
transmissor, possibilita a condução do texto-fonte através do
tradutor implicado, elemento textual interno. Narrador,
narratário e leitor implicado do texto-alvo, gerados pelo
tradutor implicado, tanto podem se assemelhar quanto
diferir dos mesmos elementos presentes no texto-fonte.

Schiavi argumenta que, se há um tradutor implicado,


logo há um leitor de tradução implicado, mas não
explica como o tradutor se relaciona com o tradutor
implícito e como este se relaciona com o narrador.
Dito isso, o diagrama de Schiavi mostra que o
narrador não é apenas uma entidade inventada pelo

Sumário
Pesquisas em Tradução | 143

autor implicado, mas uma entidade re-processada por


um tradutor implícito. (BOSSEUAUX, 2007, p.20)4

O modelo apresentado por Schiavi, mesmo não sendo


tão esclarecedor no que se refere às relações estabelecidas
por/entre os diversos elementos internos da narrativa
traduzida e externos a ela, é admirável no destaque dado à
elaboração de um modelo comunicativo que salienta a
presença da voz do tradutor. Segundo O’Sullivan (2006) “a
presença discursiva do tradutor (implicado) está de fato nos
textos traduzidos e pode manifestar-se como uma voz que
não é a do narrador do texto-fonte”. O que se pode concluir
do que já foi exposto até aqui partindo das considerações de
Hermans e Schiavi, principalmente, é que há, no texto
traduzido, duas vozes que se fazem notar (implícita ou
explicitamente): a do narrador do texto-fonte e a do tradutor.
Essa segunda voz é o que Hermans (2010) intitula “voz do
tradutor”, um indício da presença discursiva deste, que pode
se dar de forma mais ou menos presente ou permanecer
completamente escondida sob a figura do narrador. Como,
afinal, o tradutor se manifesta através do texto traduzido?
Vejamos as considerações de Hermans e Baker acerca deste
tópico.
Hermans (2010, p.199) assinala que o seu interesse na
investigação sobre a voz do tradutor reside em exemplos
onde o tradutor mostra traços de uma presença discursiva
que difere da do narrador e aponta casos onde a voz do
narrador “surge das sombras” para intervir diretamente em

4 Schiavi argues that because there is an implied translator, there is


also an implied reader of translation but she does not explain how
the translator relates to the implied translator and how the latter
relates to the narrator. Having said this, Schiavi’s diagram shows
that the narrator is no longer merely an entity invented by an
implied author, but an entity that is re-processed by an implied
translator.

Sumário
144 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

um texto no qual o leitor foi levado a acreditar que apenas


uma voz se manifestava. No primeiro caso, o autor explicita
que as traduções escritas normalmente visam a um público
que está afastado temporal, linguística e geograficamente do
endereçado pelo texto-fonte, de tal forma que o texto
traduzido, em toda a sua orquestração narrativa, se refere a
um leitor implicado diferente daquele do texto-fonte e o
discurso opera em um novo contexto pragmático. Nesse caso
situam-se esclarecimentos sobre aspectos culturais e
históricos incorporados aos textos ou referências e alusões
necessárias para a comunicação efetiva com o novo público
leitor. O tradutor precisará se fazer notar no texto ao prestar
esclarecimentos durante o desenvolvimento da narrativa. No
segundo caso podemos inserir exemplos de auto-
referencialidade linguística, não restritos apenas a textos
narrativos, incluindo-se, aqui, as notas e comentários
acrescentados pelos tradutores com vistas ao esclarecimento
de especificidades das línguas traduzidas (HERMANS, 2010,
p.199).
A conclusão de Hermans após analisar o romance Max
Havelaar de Multatuli (a edição analisada pelo autor é a de
1875) é de que a voz do tradutor está “sempre” presente no
texto traduzido, atuando como co-produtor do discurso,
ainda que em alguns momentos esteja escondido sob a figura
do narrador. O texto de Hermans discute diversos aspectos
do romance de Multatuli apresentados de acordo com os
casos supracitados, mas, como percebemos, a preocupação
do teórico está em analisar a voz do tradutor por meio de
paratextos ou notas auto-referenciais através das quais o
sujeito da fala é identificado, e estão presentes em número
considerável no romance analisado. O que é problemático é
que nem todos os textos traduzidos apresentam elementos
paratextuais em volume suficiente para uma análise mais
acurada da presença do tradutor. Há casos de traduções em
que não figura o nome do tradutor na capa ou contracapa –

Sumário
Pesquisas em Tradução | 145

exceto na ficha catalográfica -, quaisquer tipos de notas,


sejam elas finais ou de rodapé ou informações acerca do
tradutor. Se as possibilidades apresentadas pelo teórico não
são aplicáveis em alguns casos, dada a ausência ou inexis-
tência dos elementos paratextuais usados como exemplo,
questionamo-nos sobre quais seriam os elementos a serem
utilizados como referência para análise/detecção da voz ou
presença discursiva do tradutor.
O viés adotado por Baker (2000) é diferenciado do de
Hermans e Schiavi - considerando que ambos tiveram como
ponto de entrada o campo da narratologia - e parece surgir
como uma possibilidade para o estudo da voz do tradutor.
Baker apresenta elementos para um estudo da voz do
tradutor mais centrado no estilo, considerando a descrição
de padrões preferidos ou recorrentes de comportamento
linguístico dos tradutores. A estudiosa faz um levantamento
dos estudos feitos acerca da presença discursiva ou voz do
tradutor visando encontrar indícios para uma análise mais
profunda concernente ao estilo. No entanto, conclui diante
do material analisado que muito pouco foi feito na área dos
estudos da tradução acerca deste tópico. Embora considere a
abordagem de Hermans superficial para a análise da voz do
tradutor, Baker considera de suma importância o conceito de
voz do tradutor apresentado por aquele teórico.
Estilo, na compreensão de Baker (2000, p. 245), “é um
tipo de impressão digital que se expressa em uma variedade
de características linguísticas ou não-linguísticas”. Esta
concepção vai além do que propõe o conceito de voz do
tradutor de Hermans, uma vez que

a noção de estilo deve incluir a escolha do tradutor


(literário) quanto ao tipo de material a traduzir, onde
este será aplicável, o uso consistente de estratégias
específicas, incluindo-se aqui o uso de prefácios ou
posfácios, notas de rodapé, comentários no corpo do

Sumário
146 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

texto etc. Mais relevante: o estudo do estilo do


tradutor deve focar na forma de expressão típica de
um tradutor, ao invés de casos de intervenção aberta.
(BAKER, 2000, p.245)5

Em outras palavras, o interesse de Baker acerca do


estilo do tradutor centra-se em características linguísticas
mais que literárias em sintonia com a estilística forense, cujo
foco “são os hábitos linguísticos sutis que estão além do
controle do escritor e nós, como receptores, registramos de
forma subliminar, na maioria das vezes” (BAKER, 2010,
p.246)6. Ao invés de escolhas individuais Baker declara estar
interessada em padrões de escolha, sejam eles conscientes ou
não. Essa seleção justifica-se, segundo a autora, por não
possuir uma ferramenta metodológica capaz de isolar
características estilísticas que possam ser atribuídas ao
tradutor e confrontá-las com as marcas que são mero reflexo
de características estilísticas do original. Baker apresenta as
dificuldades encontradas para a realização de sua pesquisa,
tais como: a falta de um banco de dados consistente para a
análise de hábitos linguísticos e, mais especificamente, de
um banco de dados de traduções, excluídas pela linguística
de corpus, por serem considerados textos sem representação
para o estudo da língua.

5 the notion of style might include the (literary) translator’s choice


of the type of material to translate, where applicable, and his or her
consistent use of specific strategies, including the use of prefaces or
afterwords, footnotes, glossing in the body of the text, etc. More
crucially, a study of a translator’s style must focus on the manner
of expression that is typical of a translator, rather than simply
instances of open intervention.
6 linguistic habits which are largely beyond the conscious control

of the writer and which we, as receivers, register mostly


subliminally.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 147

Para a realização de seu estudo a pesquisadora recorre


aos dados do Translational English Corpus (TEC) e nos oferece
uma série de questionamentos que podem ser considerados
quando do estudo do estilo individual do tradutor:

(a) A preferência do tradutor por opções linguísticas


específicas é independente do estilo do autor original?
; (b) É independente das preferências gerais da língua-
fonte, e possivelmente das normas e poéticas de dado
socioleto? ; (c) se a resposta por positiva em ambos os
casos, é possível explicar estas preferências em termos
de posicionamento social, cultural ou ideológico do
tradutor? (BAKER, 2000, p.248)7

Embora Baker legitime as indagações supracitadas,


admite não ter resposta para elas, uma vez que exigem um
período de tempo razoável para serem satisfatoriamente
respondidas e, de no período da realização da pesquisa,
haver uma lacuna nos estudos descritivos com larga escala
de dados. O desafio de continuidade do trabalho é lançado
para os pesquisadores da área. O que se segue após essas
considerações é a apresentação de um estudo de caso no
qual Baker analisou a frequência do verbo SAY nos textos de
dois tradutores: Peter Bush e Peter Clark, o primeiro
traduzindo do português brasileiro a obra Turbulence (Chico
Buarque) e do espanhol as obras Quarantine (Juan
Goytisolo), Strawberry and Chocolate (Senel Paz) Forbidden
Territory e Realms of Strife (Juan Goytisolo) e o segundo

7 (a) Is a translator’s preference for specific linguistic options


independent of the style of the original author?; (b) Is it
independent of general preferences of the source language, and
possibly the norms or poetics of a given sociolect?; (c) If the answer
is yes in both cases, is it possible to explain those preferences in
terms of the social, cultural or ideological positioning of the
individual translator?

Sumário
148 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

traduzindo do árabe as obras Dubai Tales (Muhammad al


Murr) Grandfather’s Tale e Sabriya (Ulfat Idilbi). Em ambos os
casos a língua de chegada foi o inglês. Os textos analisados
estão elencados no TEC nas categorias de ficção e biografia/
autobiografia. Foram observadas a razão forma/item, o
tamanho médio da sentença, variação entre textos, frequên-
cia e padronização do verbo SAY. Um dado importante é
que não foram acessados os dados dos textos originais. Baker
declara que parece razoável que consultas ao texto-fonte
sejam feitas a posteriori, assim como observações acerca das
influências da língua fonte ou do autor no estilo do tradutor.
Por não ter proficiência nas línguas dos tradutores que
pesquisou, a autora afirma que não foi possível realizar tais
ações em sua pesquisa.
A pesquisadora em tela admite que a sua pesquisa
tenha muitos aspectos a serem desenvolvidos e a metodo-
logia aplicada em pequena escala impossibilitou-a de fixar
variáveis que englobassem todo um conjunto de caracterís-
ticas atribuídas aos tradutores. Baker (2000) conclui sua
pesquisa com uma incitação aos teóricos da tradução,
convocando-os a desenvolver mais estudos acerca do estilo e
da voz do tradutor, ao menos na tradução literária, com o
argumento de que a tradução é uma atividade criativa e não
uma reprodução, sendo assim, devemos explorar o estilo do
ponto de vista do tradutor, invés do autor.
Mesmo apresentando lacunas em seus trabalhos, como
vimos ao longo deste artigo, Hermans, Schiavi e Baker
trouxeram contribuições relevantes para as pesquisas acerca
da voz e estilo do tradutor. Antes de tudo, deram visibi-
lidade a este tópico no âmbito dos estudos da tradução,
provando, através de suas pesquisas, que o tradutor, de fato,
se imprime no texto traduzido, seja através de elementos
narrativos, paratextuais ou linguísticos. Os espaços em suas
pesquisas não são apontados aqui como falhas, mas como
desafios para os pesquisadores da área. Bastante desafiador

Sumário
Pesquisas em Tradução | 149

seria um trabalho que pudesse considerar senão todos, mas


parte dos elementos propostos pelos três pesquisadores aqui
discutidos. Baker, por exemplo, sugere que elementos da
linguística podem ser analisados em conjunto com elementos
paratextuais na busca por uma caracterização do estilo.
Schiavi sugere a ampliação de um modelo que, embora
pautado no campo da narratologia também se apropriará em
algum momento de aspectos linguísticos. Como se pode
perceber, há um longo caminho a percorrer, principalmente
no que concerne ao desenvolvimento de uma metodologia
efetiva, capaz de capturar as marcas deixadas pelo tradutor
no texto traduzido.

Referências

BAKER, Mona. Towards a Methodology for Investigating the Style


of a Literary Translator’. In: Target 12 (2): 241-266.
BOUSSEAUX, Charlotte. How Does it Feel? Point of View in
Translation. New York: Rodopi, 2007.
BRITTO, Paulo Henriques. O tradutor como mediador cultural.
Synergies Brésil, PUC-Rio, n. 2, 2010, pp. 135-41.
CHATMAN, Seymour. Coming to Terms: The Rhetoric of Narrative
in Fiction and Film.
Ithaca-London: Cornell University Press, 1990.
HERMANS, Theo. The translator’s voice in translated narrative. In:
BAKER, Mona. Critical readings in Translation Studies. London:
Routledge, 2010. pp. 193-212.
MUNDAY, Jeremy. Introducing Translation studies: theories and
applications. London and New York: Routledge, 2001.
O’SULLIVAN, Emer. Narratology meets Translation Studies, or
the voice of the translator in children’s literature. In: LATHEY,
Gillian. The translation of Children’s Literature: a reader. United
Kingdom: Multilingual Matters, 2006. pp.98-109.

Sumário
150 | A ( i n ) v i s í v e l p r e s e n ç a : o t r a d u t o r n o t e xt o . . .

REIS, Carlos & LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de teoria da


narrativa. São Paulo: Ática, 2000. pp.78.
SCHIAVI, Giuliana. ‘There Is Always a Teller in a Tale’. In: Target
8(1): 1-21, 1996.
VENUTI, Lawrence. The Translator’s Invisibility. New York and
London: Routledge, 1995.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 151

Daniel ALVES
Universidade Federal da Paraíba

Maria Lúcia VASCONCELLOS


Universidade Federal de Santa Catarina

INTRODUÇÃO

O artigo aqui apresentado faz parte de uma pesquisa


de doutoramento, desenvolvida no âmbito do projeto Dinter
Novas Fronteiras – um convênio de aperfeiçoamento docen-
te firmado entre as Universidades Federais de Santa
Catarina, da Paraíba e de Campina Grande. Trata-se de uma
pesquisa em andamento, desenvolvida a partir do corpus
paralelo constituído pelos romances Grande Sertão: Veredas
(de Guimarães Rosa) e sua tradução The Devil to Pay in the
Backlands (por James L. Taylor e Harriet de Onís).
Este artigo apresenta um recorte da pesquisa, em que é
analisada a representação dos líderes de bandos litigantes no
romance Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Para
tanto, são adotados procedimentos de levantamento de
dados com desenho metodológico baseado em premissas da
Linguística de Corpus.

Sumário
152 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

A classificação dos dados, por sua vez, é baseada em


categorias do sistema de transitividade da Linguística
Sistêmico-Funcional Hallidayana, a partir do levantamento
de processos na configuração experiencial.O levantamento
de dados tem como ponto de partida dois nódulos, a saber:
‘Joca Ramiro’ e ‘Hermógenes’. A escolha desses nódulos foi
baseada no papel desempenhado por esses personagens no
romance: ambos constituem figuras de liderança de dife-
rentes bandos de jagunços litigantes.
A partir dessa análise, o artigo aqui apresentado tenta
responder às seguintes perguntas de pesquisa: há diferenças
nos perfis ideacionais dos líderes analisados? Em caso
afirmativo, como essas diferenças contribuem para dife-
rentes construções dos líderes dos grupos?
O artigo está organizado em quatro seções, além desta
introdução, a saber: Revisão Teórica, que apresenta o sistema
de transitividade da Linguística Sistêmico-Funcional
Hallidayana; Metodologia, que apresenta a seleção e a cons-
trução do corpus de pesquisa, bem como os passos adotados
para levantar os dados e os procedimentos adotados para
classificá-los; Análise de dados e discussão, em que são feitas
análises dos dados selecionados e apontadas leituras desses
dados; e Considerações finais, em que são retomadas as
observações feitas ao longo do trabalho e são apontados
futuros desenvolvimentos previstos para esta pesquisa de
doutoramento.

O Sistema de Hallydaiano de Transitividade

Nesta seção, serão apresentados os principais elemen-


tos que constituem o sistema Hallydaiano de Transitividade,
bem como a visão da Linguística Sistêmico-Funcional acerca
da realidade e alguns estudos que empregam esse sistema
para fazer análises linguístico-literárias.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 153

A partir de uma perspectiva baseada na Linguística


Sistêmico-Funcional, a realidade pode ser vista como um
fluxo contínuo de eventos (goings-on), com diferentes graus
de (in)dependência entre eles. A percepção humana acerca
desse fluxo de eventos, no entanto, é limitada – o que nos
leva, como seres humanos, a desenvolver uma percepção
fracionada acerca da realidade. Segundo Halliday e
Matthiessen (2004), já na infância começamos a separar o que
acontece em nossa realidade externa e o que acontece em
nossa realidade interna – e assim passamos a desenvolver
processos materiais e mentais para construir essa diferença.
Posteriormente, começamos a precisar de processos que nos
ajudem a formular generalizações e a relacionar itens – o que
nos leva a desenvolver processos relacionais.
A separação entre os três processos principais (ma-
terial, mental e relacional), no entanto, não é rígida, havendo
processos intermediários que respondem pela transição entre
eles. Assim, desenvolvemos outros processos intermediários
para nos auxiliar na representação de nossa experiência no
mundo. Esses processos intermediários são os compor-
tamentais, que nos permitem representar manifestações
externas de fenômenos da consciência (como sorrir, e estados
fisiológicos, como dormir – por exemplo); os processos
verbais, que nos permitem dizer e construir significados por
processos de fala; e os processos existenciais, que nos per-
mitem representar a existência e os acontecimentos.
Essa formulação do sistema de transitividade apre-
sentada por Halliday e Matthiessen (2004) segue uma linha
teórica desenvolvida por Halliday ao longo das décadas de
1960, 1970, 1980 e 1990 e não pretende se apresentar como
uma proposta de categorias estanques, mas de uma classi-
ficação que vê divisões fluídas entre os processos. Meta-
foricamente, os seis processos frequentemente são repre-
sentados em um círculo de cores, como o mostrado a seguir
(retirado de Barroso, 2009 p. 51).

Sumário
154 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

Figura 1 – Disco de processos, retirado de Barroso (2009, p.51)

A disposição dos processos e a representação por cores


indicam a fluidez entre as diferentes categorias e a não-
adoção de divisões estanques entre eles.
Ao postular diferenças entre os tipos de processos, a
Linguística Sistêmico-Funcional também postula diferenças
entre os participantes envolvidos nesses processos. A seguir,
é apresentado um esquema desses participantes e os papéis
que eles desempenham em orações. Antes de apresentar o
esquema, no entanto, vale ressaltar que as divisões entre os
tipos de participantes, assim como dos processos, também
não são estanques:

Sumário
Pesquisas em Tradução | 155

Tipo de
Participante
Processo
Participante obrigatório em
processos materiais, o ator é
responsável pela ação que altera a
realidade externa a ele.
O ator pode ser responsável por
processos que têm resultado
Ator restrito a ele próprio (em orações
intransitivas) ou que têm impacto
sobre outros participantes (em
orações transitivas) e pode ser
representado de duas formas:
operativo (ativo) ou receptivo
(passivo).
Em orações transitivas, é o
participante que sofre o impacto da
Material ação do ator.
Meta Apesar de o termo meta implicar
uma relação de direcionalidade, a
ideia mais central é ‘aquele a quem
o processo se estende’.
O escopo pode construir o domínio
em que o processo se desenvolve
ou construir o processo em si, por
termos gerais ou específicos.
A distinção entre Escopo e Meta
Escopo nem sempre é simples: um mesmo
grupo nominal pode ser
interpretado como Escopo ou Meta
– um critério para identificar o
Escopo é que ele não é afetado de
qualquer forma pelo processo.

Sumário
156 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

Beneficiários ocorrem em orações


transitivas transformativas de
extensão e, nessa categoria,
ocorrem em orações que denotam
Beneficiário
transferência de bens. Assim como
a meta, tanto cliente quanto
beneficiário são afetados pelo
processo
Cliente pode ser construído de
forma semelhante à meta,
especialmente em orações materiais
do tipo criativo. Realizado por um
grupo nominal que denota a
existência de um ser humano (em
Cliente
especial um pronome pessoal) e
mais comumente um papel de fala.
Assim como a meta, cliente e
beneficiário são afetados pelo
processo (o cliente, beneficiando-se
do processo).
Fortemente ligado a orações
relacionais, o atributo pode
aparecer em orações materiais, mas
de forma mais restrita: indicando a
Atributo elaboração de um resultado do
processo e podendo ser usado para
a construção do resultado
qualitativo do ator ou da meta
(após o processo ser concluído).
Em orações que indicam percepção,
o experienciador é construído como
um ser dotado de consciência
Experiencia- (podendo ser: a) um ser humano; b)
Mental
dor um ser não-humano, mas
humanizado; ou c) uma entidade
coletiva com características
humanas).

Sumário
Pesquisas em Tradução | 157

Aquilo que é sentido, pensado,


Fenômeno desejado ou percebido em orações
mentais.
Em orações relacionais atributivas,
é o grupo nominal caracterizado
pelo atributo ou, em outras
palavras, o grupo que “carrega”
Portador
(fazendo aqui referência a uma
possível tradução da palavra
‘Carry’, da qual ‘carrier’ se deriva,
em inglês) o atributo.
Em orações relacionais atributivas,
Relacio- é o grupo nominal que caracteriza o
nal Atributo portador; normalmente, esse grupo
nominal é indefinido, não podendo
ser um nome próprio ou pronome.
Em orações relacionais
Identificado identificadoras, é o participante
identificado pelo identificador.
Em orações relacionais
identificadoras, é o participante que
Identificador
traz uma identificação do
identificado.
O dizente é o participante que
Dizente expressa uma fala ou se posiciona,
em uma situação de elocução.
Receptor é aquele para quem a fala
é dirigida; realizado por um grupo
nominal que tipicamente denota
um ser dotado de consciência, um
Receptor
Verbal coletivo ou instituição. As
possibilidades de realização do
receptor dependem da seleção do
grupo verbal.
Função que corresponde ao que é
dito ou relatado; pode ser o
Verbiagem
conteúdo do que é dito, o nome da
situação de fala.

Sumário
158 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

Ocorre apenas em um sub-tipo de


oração verbal, construindo a
Alvo
entidade relacionada ao processo
de fala.
Participante que apresenta um
comportamento. Normalmente, é
um ser dotado de consciência, já
que se trata de um participante
Comportante
ligado a processos tipicamente
Comporta humanos, mas que realiza
mental processos com características
materiais.
Participante análogo ao ‘Escopo’
dos processos materiais, apresenta
Behaviour
o comportamento em orações
comportamentais.
Entidade que existe ou evento que
acontece; qualquer tipo de
Existen- fenômeno pode ser construído em
Existente
cial um processo existencial: pessoa,
objeto, instituição, abstração, ação
ou evento.
Quadro 1 – Resumo de participantes segundo o tipo de processo,
formulado a partir de Halliday e Matthiessen (2004, p. 170-259)

Outros detalhes sobre a diferenciação entre os tipos de


processos serão apresentados na seção 0 deste artigo, ao
serem expostos os critérios para classificação dos dados aqui
analisados. Neste ponto do artigo, será apontada a maleabi-
lidade dessa teoria como ferramenta para estudar a repre-
sentação da realidade. A seguir, serão resumidos os resul-
tados de Souza (2008) e Rosa Jr. (2010), de forma a mostrar a
a atualidade do sistema de transitividade hallidayano como
ferramenta de análise.
Souza (2008) investiga 18 hinos nacionais de países de
língua inglesa, distribuídos em três partes do mundo, Ca-
ribe, América do Sul e África, observando estrutura genérica,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 159

configurações de transitividade e recursos atitudinais em-


pregados para construir significados interpessoais. Os
resultados de Souza (2008) mostraram uma predileção por
processos materiais (56% dos casos), o que indica que os
hinos constroem imagens de ações concretas nos domínios
da experiência humana, realizadas pelos cidadãos, que são
apresentados como atores de tais ações.
Rosa Jr. (2010), por sua vez, se propõe a analisar os
textos verbais e visuais de cartas de tarô. Utilizando a Gra-
mática do Design Visual de Kress e van Leeuwen (1996) e a
Linguística Sistêmico-Funcional de Halliday e Matthiessen
(2004) como aportes teóricos, o pesquisador analisa a
transitividade dos processos para investigar a construção de
significados. A análise da transitividade feita por Rosa Jr.
mostra que, na construção textual apresentada nas cartas de
tarô, são privilegiadas as construções fatos e acontecimentos
(representados, nos dados, pela alta ocorrência de processos
materiais: 45,2%), seguidas, de perto, pela construção de
descrições e caracterizações (caracterizada, nas cartas, pela
também alta frequência de processos relacionais: 41,1%). Por
fim, são identificáveis nas cartas construções de sentimentos
e percepções (pelo uso de processos mentais, mas com um
percentual inferior aos dois anteriores: 13,7%). Os resultados,
para Rosa Jr. (2010) podem ser considerados esperados,
considerando a estrutura prototípica de consultas taroló-
gicas. Não foram encontradas, no corpus de Rosa Jr.,
ocorrências de processos comportamentais, existenciais ou
verbais – fato também esperado, segundo o autor, por não se
tratar de processos que fazem parte do universo de
expectativas de uma consulta tarológica prototípica.
Após vislumbrar, por meio das pesquisas de Souza
(2008) e de Rosa Jr. (2010), a viabilidade de uso do sistema
hallidayano de transitividade como ferramenta de análise, a
próxima seção apresentará brevemente o corpus desta

Sumário
160 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

pesquisa e também delineará os passos adotados para o


levantamento dos dados e sua classificação para análise.

Levantamento de dados

O corpus investigado neste trabalho foi composto pelo


romance Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Publi-
cado em 19561, o romance apresenta a narrativa de Riobaldo,
um ex-jagunço que conta sua história de vida a um
interlocutor não identificado. Adotando uma estrutura não
linear, sem divisões de capítulos, com digressões e omissões,
Riobaldo narra histórias de conflitos, disputas de poder,
acordos faustianos e amores impossíveis no sertão brasileiro,
mais especificamente, na região do sertão localizada entre os
estados de Minas Gerais, Goiás e Bahia.
Para o trabalho aqui apresentado, foi analisada uma
versão digitalizada do corpus, por meio do software AntConc
(versão 3.2.4w). Trata-se de um software gratuito que
permite levantar dados de forma sistemática, para serem
analisados semi-automaticamente. O software emprega
conceitos da Linguística de Corpus em sua concepção e per-
mite, ao pesquisador, adotar essa abordagem metodológica.
Utilizando a função de concordanciador do software
AntConc (versão 3.2.4w), foram levantadas todas as ocor-
rências dos nódulos ‘Joca Ramiro’ e ‘Hermógenes’. A escolha
dos nódulos, mencionada anteriormente, foi relacionada ao
tema aqui pesquisado: Joca Ramiro representa, na narrativa,
a idealização do líder, enquanto Hermógenes representa o
antagonista (líder do bando antagonista). Os exemplos a

1GUIMARÃES ROSA, João. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro:


Nova Aguilar, 1994. Disponível em: <http://goo.gl/ahtCQ> -
último acesso em: 12 de outubro de 2011.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 161

seguir, retirados do corpus da pesquisa, buscam mostrar


isso:

Exemplo 1. Que um homem antigo... Seu Joãozinho


Bem-Bem, o mais bravo de todos, ninguém nunca
pôde decifrar como ele por dentro consistia. Joca
Ramiro grande homem príncipe! era político.
Exemplo 2. Como que brilhava ele todo. Porque Joca
Ramiro era mesmo assim sobre os homens, ele tinha
uma luz, rei da natureza.
Exemplo 3. Mas o Hermógenes era fel dormido,
flagelo com frieza. Ele gostava de matar, por seu
miúdo regozijo. Nem contava valentias, vivia dizendo
que não era mau.
Exemplo 4. E – para o resto – ele apontou com o dedo.
O Hermógenes, mor maldito! Ele vinha errado de
mim, os Hermógenes, eles. Davam arte de contornar
da banda do norte, às tantas.

Os exemplos 1 e 2 mostram a idealização da imagem


de Joca Ramiro – construído com características de bravura e
nobreza; enquanto os exemplos 3 e 4 mostram que a imagem
de Hermógenes é construída de forma antagônica, como um
ser monstruoso, cuja maldade é um dos seus atributos mais
destacados. Essa construção da imagem de Hermógenes
como inimigo condiz com a afirmação de Baker (2010, p.198)
de que em narrativas, o inimigo tende a ser o “mal,
ameaçador, perigosamente fora de controle e intransigente”,
representando o oposto de tudo que o grupo que se opõe a
esse inimigo valoriza e preza.
Foram levantadas 185 ocorrências do nódulo ‘Joca
Ramiro’ e 282 ocorrências do nódulo ‘Hermógenes’. A
diferença está ligada, principalmente, à participação de cada
personagem no romance. Enquanto Joca Ramiro tem uma
participação limitada (por ser assassinado por Hermógenes,
na metade do romance), Hermógenes se mantém vivo, e

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162 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

presente, do começo ao fim da narrativa. As figuras a seguir


representam graficamente a participação dos dois perso-
nagens em Grande Sertão: Veredas. Cada traço preto
representa, graficamente, um ponto em que o nome (de cada
um deles) aparece no romance. Na Figura 2, é possível ver a
concentração da participação de Joca Ramiro até a metade do
romance, enquanto na Figura 3, é possível ver que a
presença de Hermógenes no romance abrange do princípio
ao fim da história.

Figura 2- Representação gráfica da distribuição de ‘Joca Ramiro’ no


corpus analisado

Figura 3- Representação gráfica da distribuição de ‘Hermógenes’


no corpus analisado

Para efetuar a análise aqui proposta, o primeiro passo


foi delimitar os dados levantados. Inicialmente, foram
excluídas as linhas de ocorrência em que os nódulos pesqui-
sados (‘Joca Ramiro’ e ‘Hermógenes’) não eram participantes
plenos de algum processo. Essa decisão teve como objetivo
selecionar as linhas de concordância que permitissem traçar
um perfil ideacional dos personagens a partir dos processos
realizados por eles. Foram excluídas, assim, ocorrências
como as apresentadas nos exemplos listados a seguir (em
que os nódulos, em negrito, não se mostram diretamente
ligados a processos):

Sumário
Pesquisas em Tradução | 163

Exemplo 5. Todo o mundo, então, todos, tinham de


viver honrando a figura daquele, de Joca Ramiro,
feito fosse Cristo Nosso Senhor, o exato?! E por aí eu
já tinha pitado dois cigarros.
Exemplo 6. Seria que me desvalesse a presença dele
comigo, pelos perigos que eu visse virem a ele, no
meio do combate; ou seria que a lembrança de ter
Diadorim junto, naquilo, me desgostasse, por me
enfraquecer, agora eu assim, duro ferro diante do
Hermógenes, leão coração? Se sei, sei. Porque era
como eu estava.

Em seguida, no caso do nódulo de pesquisa ‘Hermó-


genes’, foram excluídas as ocorrências em que a palavra se
referia ao ‘bando dos Hermógenes’ e não ao personagem
‘Hermógenes’, como mostram os exemplos a seguir (em que
Hermógenes se refere a uma entidade coletiva e não ao
personagem Hermógenes em si):

Exemplo 7. Constava que João Goanhá torasse para a


Bahia, e que o Antenor seguindo rumo em beira do
Ramalhada, com um punhado dos Hermógenes.
Novas ordens, muitas ordens. Alaripe ia vir com Titão
Passos. Titão Passos chamou a gente: Diadorim e eu.
Se tinha um roteiro, sendo para ser:
Exemplo 8. Zé Bebelo Vaz Ramiro-viva o nome! A
gente vinha sobre o rastro deles, dos Hermógenes –
por matar, por acabar com eles, por perseguir. No
borrusco, o Hermógenes corria, longes, de nós,
sempre. Às artes que fugiam.

Após essas etapas de delimitação dos dados, das 185


linhas de concordância com o nódulo ‘Joca Ramiro’ que
foram levantadas, 107 não foram consideradas para a
análise. E das 282 linhas de concordância de ‘Hermógenes’,
188 não foram consideradas para a análise aqui proposta.

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Para facilitar a leitura, essas informações foram diagramadas


na tabela a seguir:

Joca Ramiro Hermógenes

Total de ocorrências levantadas 185 100,0% 282 100,0%


Total de linhas de concordância 107 57,8% 188 66,7%
excluídas
Total de processos classificados 78 42,2% 94 33,3%

Tabela 1- Total de ocorrências levantadas e de dados selecionados


para análise
A próxima seção apresenta os critérios utilizados na
classificação das 78 ocorrências de ‘Joca Ramiro’ e das 94
ocorrências de ‘Hermógenes’ analisadas neste trabalho.

Classificação dos dados

Como explicado na seção 0, para este trabalho, foram


levantadas todas as ocorrências de ‘Joca Ramiro’ e ‘Hermó-
genes’ no corpus analisado. As ocorrências foram analisadas
contextualmente em suas linhas de concordância e foram
selecionadas para análise as linhas de concordância em que
esses personagens eram participantes plenos de processos.
Das linhas de concordância selecionadas, foram anali-
sados os processos ligados a cada um dos personagens,
seguindo a proposta de transitividade de Halliday e
Matthiessen (2004). Assim, os processos foram classificados
em seis tipos (materiais, mentais, relacionais, comporta-
mentais, verbais e existenciais), seguindo os seguintes
critérios:

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Pesquisas em Tradução | 165

a) Foram classificadas como orações materiais as


marcadas por processos que indicam ações e
acontecimentos cujo fluxo de eventos realizado se
dá na realidade concreta. A seguir, exemplos de
processos classificados como materiais, no corpus.
Exemplo 9. Aí o forte bando tinha de se
aluir para adiante, em redobro de marcha –
iam para ferrar fogo, em lugar e hora
determinados – semelhante se soube. Tempo
de beberem um café. Mas Joca Ramiro veio de
lá, em alargados vagarosos passos, queria
correr o acampamento, saudar um e outro, a
palavrinha que fosse, um dito de apreço e
apraz.
Exemplo 10. Parecia mesmo querer fazer
raiva no outro, em vez de tomar cautela? Vi
que tudo era enfinta; mas podia dar em mal.
O Hermógenes pulou passo, fez menção de
reluzir faca. Se teve mão em si, foi por forte
costume. E Joca Ramiro também tinha
atalhado, com uma aspação:

Os exemplos 9 e 10 mostram que os processos (nos


casos, os verbos vir, e pular, em suas formas finitas) indicam
ações e movimentos que ocorrem na realidade exterior aos
participantes (Joca Ramiro e Hermógenes, respectivamente)
a que estão ligados.

b) Foram classificadas como orações mentais as


marcadas por processos que se desenvolvem na
realidade interna dos personagens, mostrando a
forma como o mundo é experienciado no âmbito
da consciência. Como a narrativa é contada por
um narrador participante, não onisciente, no
entanto, o número desses processos foi baixo.

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Exemplo 11. O Hermógenes botava pontas


de olhar, some escuro, nuns visos. Só Cande-
lário, ficado em pé, sacudia o moroso das
pernas. Joca Ramiro deve de ter percebido
aquele repiquete. Porque ele sobre se virou,
para Só Candelário, ao de indagar: – “Meu
compadre, que é que se acha?”
Exemplo 12. Noção dos inimigos nossos,
que, seja lá por onde, puxavam posse de sua
munição e de suas montadas e cargas, socor-
ridos de tudo quanto careciam. – “Um
Hermógenes quer tomar conta do sertão dos
Gerais...” eu tirei liberdade para dizer.

Os processos nos exemplos 11 e 12 (respectivamente,


os verbos perceber e querer, em suas formas finitas) apontam
aspectos relativos a percepções, conhecimentos e intenções
dos personagens – revelando, portanto, traços da realidade
interna (mental) desses personagens.

c) Foram classificadas como orações relacionais


as marcadas por processos que indicam caracte-
rizações e definições. Os exemplos a seguir mos-
tram exemplos de orações relacionais em que essas
caracterizações e definições são mais marcadas,
mas também podem ser classificadas como rela-
cionais as orações (e os processos) que apresentam
noções de intensidade, posse ou circunstância.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 167

Exemplo 13. Ser dono definito de mim, era o


que eu queria, queria. Mas Diadorim sabia
disso, parece que não deixava: – “Riobaldo,
escuta, pois então: Joca Ramiro era o meu
pai...” – ele disse – não sei se estava pálido
muito, e depois foi que se avermelhou.
Devido o que, abaixou o rosto, para mais
perto de mim
Exemplo 14. Desarreei, peei o animal, caí e
dormi. Mas, no extremo de adormecer, ainda
intruji duas coisas, em cruz: que Medeiro Vaz
estava insensato? – e que o Hermógenes era
pactário! Tomo que essas traves fecharam
meus olhos. De Diadorim, aí jaz que descan-
sando do meu lado, assim ouvi:

O verbo ‘ser’, que pode ser visto nos exemplos 13 e 14,


foi o mais frequente entre os processos relacionais veri-
ficados – o que corresponde às expectativas da classificação,
dada a frequente utilização desse verbo na realização de
orações relacionais de caracterização/definição.
d) Foram classificadas como orações compor-
tamentais as marcadas por processos que denotam
comportamentos fisiológicos e/ou psicológicos.
Trata-se de processos tipicamente humanos que
podem ser vistos como parcialmente materiais e
parcialmente mentais. A seguir, alguns exemplos
retirados do corpus.
Exemplo 15. brincando com a morte, que
para cada hora livrava. Ao que bastava Joca
Ramiro perder um ponto da paciência, um
pouco. Só que, por sorte, paciência Joca
Ramiro nunca perdia; motejou, não mais: –
“Adianta querer saber muita coisa? O senhor
sabia, lá para cima – me disseram.

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Exemplo 16. – foi um tirotear forte, fogo por


salvas. Ah, então era outra partida de zé-be-
belos que deviam de estar chegando, drongo
deles, cavaleiros. O Hermógenes esticou o
pescoço, rijo ouvindo. Soante que atiravam,
sucedidos, o tiroteio foi mudando de feição.

Nos exemplos 15 e 16, são apresentados exemplos de


orações classificadas como comportamentais. No primeiro
caso, é apresentada a situação de ‘Perder a paciência’ e no
segundo, ‘esticar o pescoço, ouvindo’. Nesses casos, os
comportantes são seres conscientes, mas os processos têm
um grau de materialidade – o que justifica a classificação
como processos comportamentais.
e) Foram classificadas como orações verbais as
marcadas por processos introdutores da fala, que
possibilitam o estabelecimento de passagens dialó-
gicas. A seguir, alguns exemplos de processos
verbais.
Exemplo 17. Com o que, todo o mundo
parado, formaram uns silêncios. Menos no
mais, Joca Ramiro ia falar as palavras con-
sagradas? – “O senhor pediu julgamento...” –
ele perguntou, com voz cheia, em beleza de
calma.
Exemplo 18. Do escurão, tudo é mesmo pos-
sível. No outro lado, o Hermógenes sussurrou
ordens. Deitamos. Eu estava atrás duma
árvore, uma almêcega. Mais atrás de mim, o
riacho, passante por suas pedras.

Nos exemplos 17 e 18, são apresentadas orações de


processos verbais, marcadas pelos de elocução ‘falar’ e
‘sussurrar’.

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Pesquisas em Tradução | 169

f) Por fim, foram classificadas como orações


existenciais as marcadas por processos que indi-
cam existências ou acontecimentos. A seguir, são
mostrados alguns exemplos.
Exemplo 19. O Gavião-Cujo levantou um
braço, pedindo prazo. À fé, quase gritou: –
“Mataram Joca Ramiro!...” Aí estralasse tudo
– no meio ouvi um uivo doido de Diadorim :
todos os homens se encostavam nas armas. Aí,
ei, feras!
Exemplo 20. – “O Hermógenes está morto,
remorto matado...” – quem falou foi o João
Curiol. Morto... Remorto... O do Demo...
Havia nenhum Hermógenes mais. Assim de
certo resumido – do jeito de quem cravado
com um rombo esfaqueante se sangra todo, no
vão-do-pescoço:

O exemplo 20 é marcante dos processos existenciais: ao


empregar o verbo ‘haver’, com o sentido de ‘existir’, é
apontada uma relação de existência mais clara. Em relação
ao primeiro e ao segundo exemplos, no entanto, a
classificação da oração como existencial foi baseada na
posposição do sujeito (nos casos, Joca Ramiro) em relação ao
processo – o que nos permite enxergá-lo como um
participante introduzido no texto – de forma que é possível
ver a estrutura como agnata de ‘surgiu/apareceu/
desapareceu o Joca Ramiro’. Assim como no caso dos
processos mentais, não houve muitas ocorrências de orações
existenciais nos dados levantados para este artigo.
g) Por fim, nos casos problemáticos - no que diz
respeito à definição da natureza do processo -
foram classificados por uma lógica de formações
agnatas. Os exemplos apresentados a seguir foram
considerados casos problemáticos:

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170 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

Exemplo 21. por gestos que Zé Bebelo estava


gira da idéia, outros quadrando um calado de
mau sinal. Até o que disse: – “De lá não sai
barca!” Assim se diz. Joca Ramiro não reveio
logo. Mexeu com as sobrancelhas. Só, daí: –
“O senhor veio querendo desnortear,
desencaminhar os sertanejos de seu costume
velho de lei.
Exemplo 22. Eu ainda mudei distância de
uns passos: aproveitei tapação duma árvore
de boa grossura – um araçáde-pomba,
fechado. De sovigia, o Hermógenes não me
largava. Doesse na gente, mesmo aquele
principiozinho de madrugada. Apertava a
necessidade.

O exemplo 21 foi classificado como oração verbal, por


partir do entendimento de que ‘reveio’ estava sendo utili-
zados com um sentido próximo ao do verbo ‘ordenar’, que,
por sua vez. Já o exemplo 22 foi classificado como com-
portamental, por entender que ‘me largava’ estava sendo
utilizado com um sentido próximo de ‘obser-vava/vigiava’.
Ao utilizar o critério de buscar sentidos próximos, a
metodologia aqui empregada adotou um prin-cípio
semelhante ao apontado por Halliday e Matthiessen (2004)
de utilizar formas ágnatas para classificar processos.
A próxima seção apresentará os números resultantes
da classificação descrita nesta seção, tentando apresentar
possíveis leituras de seu significado.

ANÁLISE DE DADOS E DISCUSSÃO

Como descrito na seção Erro! Fonte de referência não


encontrada., os dados referentes às ocorrências de ‘Joca

Sumário
Pesquisas em Tradução | 171

Ramiro’ e ‘Hermógenes’ foram levantados e classificados,


seguindo a proposta de Halliday e Matthiessen (2004). Em
seguida, os resultados foram esquematizados numerica-
mente e organizados na tabela apresentada a seguir:

Joca Ramiro Hermógenes


Freq. % Freq. %
Material 17 21,8% 24 25,5%
Mental 5 6,4% 1 1,1%
Relacional 22 28,2% 38 40,4%
Comportamental 9 11,5% 11 11,7%
Verbal 23 29,5% 18 19,1%
Existencial 2 2,6% 2 2,1%
Total de processos 78 100,0% 94 100,0%
classificados

Tabela 2- Transitividade dos processos ligados aos personagens


Joca Ramiro e Hermógenes

A tabela 2 apresenta os processos que têm Joca Ramiro


como participante. Desses, os principais são de natureza
verbal (29,5%), seguidos de perto pelos de natureza
relacional (28,2%). Já no caso de Hermógenes, os principais
processos são de natureza relacional (40,4%), seguidos pelos
de natureza material (25,5%). Isso indica que a construção do
personagem de Joca Ramiro tende a privilegiar passagens
dialógicas (o que mostra uma característica de maior
comunicação, em que o personagem fala, pergunta, diz)
enquanto a construção do personagem de Hermógenes
privilegia a construção do mundo físico.
Interessante verificar, nessa primazia dos processos
verbais que têm Joca Ramiro como participante, a presença
de processos que remetem a ações que se concluem na fala

Sumário
172 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

(atos de fala). A seguir, são apresentados alguns desses


exemplos.
Exemplo 23. Trabalho de idéia em aperto,
pelo pão de salvar sua vida da estrosca. Ime-
diato, Joca Ramiro deu a vez a Só Candelário,
não deixando frouxura de tempo para mais
motim: – “Hê, e você, compadre? Qual é a
acusação que se tem?”
Exemplo 24. Se afundava para os altos. –
“Apraz ao senhor, compadre Ricardão?” –
Joca Ramiro solicitou, passando a vez.
Aquele retardou tanto para começar a dizer,
que pensei fosse ficar para sempre calado. Ele
era o famoso Ricardão, o homem
Exemplo 25. Só que uns peixes tem, que
nadam rio-arriba, da barra às cabeceiras. Lei é
lei? Loas! Quem julga, já morreu. Viver é
muito perigoso, mesmo. Nisso, Joca Ramiro já
tinha transferido a mão de fala a Titão Passos
– esse era como um filho de Joca Ramiro, esta-
va com ele nos segredos simples da amizade.

Essa característica verbal (como dizente) de Joca


Ramiro seria um dos fatores que contribuem para a cons-
trução da liderança do personagem de forma idealizada,
como mencionado anteriormente neste trabalho. O
personagem não apenas se comunica com seus jagunços
como também sua fala tem a legitimidade suficiente para,
por si só, executar ações – como se pode ver nos exemplos
23, 24 e 25, que mostram Joca Ramiro passando o turno de
fala a seus companheiros – um ato que, pode-se assim dizer,
legitimado a partir do momento que é pronunciado pelo
líder.
Nos perfis ideacionais também se destaca a diferença
(proporcional) entre os processos mentais: 6,4% dos pro-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 173

cessos cujo participante é Joca Ramiro são mentais, contra


1,1% dos processos cujo participante é Hermógenes (um
número quase seis vezes menor). O exemplo 26, mostrado a
seguir, apresenta um dos processos mentais ligados a Joca
Ramiro e o exemplo 27, também a seguir, apresenta o único
processo mental ligado a Hermógenes (entre os dados
levantados):

Exemplo 26. Questionou-se a respeito disso?


Tinham barulhos na voz. Mesmo os chefes
entre si cochicharam. Mas Joca Ramiro sabia
represar os excessos, Joca Ramiro era mesmo
o tutumumbuca, grande maioral. Temperou
somente: – “Mas ele não falou o nome-da-
mãe, amigo...”
Exemplo 27. Noção dos inimigos nossos,
que, seja lá por onde, puxavam posse de sua
munição e de suas montadas e cargas,
socorridos de tudo quanto careciam. – “Um
Hermógenes quer tomar conta do sertão dos
Gerais...” – eu tirei liberdade para dizer.
Mesmo mais indiretas disse; e isso me
realiviou, no dizer, pouco somente

O exemplo 26 mostra Joca Ramiro como expe-rienciador do


processo mental ‘sabia’. Já o exemplo 27 mostra Hermógenes
experienciador do processo represen-tado pelo sintagma
verbal ‘querer tomar conta’. Como apontado na
Tabela 2, proporcionalmente, Joca Ramiro se apresenta
como participante em processos mentais mais frequen-
temente – o que, de certa forma, reforça sua característica
humana como ser dotado de consciência – do que
Hermógenes.
Pode-se dizer que as diferenças nos perfis ideacionais
dos personagens Joca Ramiro e Hermógenes contribuem

Sumário
174 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

para a construção de uma contraposição entre eles: se por


um lado há um líder (Joca Ramiro) com mais características
dialógicas e reflexivas, por outro, há um líder (Hermógenes)
com mais características mais ligada à construção do mundo
físico e à execução de processos na realidade material. Essa
contraposição condiz com a proposição de Baker (2010,
p.198) de que em narrativas, um lado tende a representar seu
o inimigo ressaltando, nele, as características que são opostas
a tudo que esse lado inimigo valoriza e preza, de forma a
justificar a necessidade do conflito contra esse inimigo.
A seção seguinte apresenta as considerações finais
deste trabalho, fazendo um apanhado dos objetivos, das
perguntas de pesquisa e apresentando as próximas etapas da
pesquisa em desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo se propôs a analisar os perfis ideacionais


dos personagens ‘Joca Ramiro’ e ‘Hermógenes’ no romance
Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, com vistas a
estabelecer as diferenças linguísticas na construção dos
personagens que se apresentam em uma relação de conflito
no romance.
A escolha dos dois personagens foi tomada pelo fato
de se tratar de líderes de bandos litigantes e, como tal, como
figuras representativas do litígio em questão. Os dados
foram levantados por meio de uma metodologia de corpus e
classificados segundo o modelo de transitividade de
Halliday e Matthiessen (2004).
A análise dos perfis ideacionais permitiu visualizar
diferenças na construção dos personagens analisados: Joca
Ramiro é participante de mais processos de natureza verbal
(29,5%) e de natureza relacional (28,2%); enquanto Hermó-
genes é participante de mais processos de natureza rela-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 175

cional (40,4%) e de natureza material (25,5%). Construções


que destacam a natureza dos dois líderes e o papel de
liderança que eles desempenham em seus bandos.
Desenvolvimentos futuros deste trabalho analisarão os
perfis ideacionais dos personagens ‘Joca Ramiro’ e
‘Hermógenes’ na tradução do romance Grande Sertão: Veredas
para o inglês – intitulada The devil to pay in the backlands2,
traduzida por James L. Taylor e Harriet de Onís, publicada
em 1963, tentando aprofundar as investigações a construção
linguística do conflito e sua relação com a investigação aqui
proposta. A partir dessa análise, objetiva-se verificar se há
diferenças na construção do conflito nas duas línguas
(português e inglês) e se tais diferenças – caso elas sejam
verificadas – se devem a questões relativas aos dois sistemas
linguísticos em contato, ou ao resultado de decisões dos
tradutores.

Referências

ANTHONY, Laurence. AntConc3.2.4w. Tokyo, Japão: Waseda


University, 2011 – disponível em: <http://goo.gl/3GVS> - último
acesso em 4 de janeiro de 2012.
BAKER, Mona. ‘Interpreters and Translators in the War Zone:
Narrated and Narrators’. In: The Translator. Vol. 16, N. 2, p. 197-
222, 2010.

2 GUIMARÃES ROSA, João. The Devil to Pay in the Backlands. Trad.


James L. Taylor e Harriet de Onís. New York: Knopf, 1963.

Sumário
176 | E s f e r a d e c o n f l i t o e m G r a n d e S e r t ã o: V e r e d a s . . .

BARROSO, Suzana de Carvalho. Tematização e representação da


prática docente: análise sistêmico-funcional da construção discursiva da
profissão e da identidade doprofessor de inglês como língua estrangeira.
Rio de Janeiro: dissertação (mestrado). Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, 2009 – disponível em
<http://goo.gl/SLhSi> - último acesso em 4 de outubro de 2012.
KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T.. Reading images. London/New
York, Routledge.1996.
PARO, Vitor Henrique. ‘Implicações do caráter político da
educação para a administração da escola pública’ In: Educação e
Pesquisa, São Paulo, v.28, n.2, p. 11-23, jul./dez. 2002 – disponível
em: <http://goo.gl/OF2NC> - último acesso em 20 de janeiro de
2012.
ROSA Jr, Carlos Alberto Ribeiro Santa. Cartas Marcadas:
Multimodalidade discursiva e Transitividade em baralhos de tarô.
Recife: dissertação (mestrado). Universidade Federal de
Pernambuco, 2010 – disponível em: <http://goo.gl/TXxN2> -
último acesso em 30 de dezembro de 2011.
SOUZA, Anderson Alves de. "Do the right, be firm, be fair": A
systemic functional investigation of national anthems written in
English. Santa Catarina: Tese (doutorado) Universidade Federal de
Santa Catarina, 2008 – disponível em: <http://goo.gl/V0Bv5> -
último acesso em 30 de dezembro de 2011.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 177

Letícia Caporlíngua GIESTA


Universidade Federal de Campina Grande

Introdução

O título desse capítulo reflete a essência do trabalho


que objetivou analisar as concepções de alunos de cursos de
graduação acerca da articulação entre ensino de inglês
instrumental e tradução. O texto relata um estudo com
pressupostos epistemológicos qualitativos, no qual a consi-
deração das concepções dos sujeitos do processo de ensino-
aprendizagem é relevante, tanto na construção do conhe-
cimento científico, como na comunicação, sensibilização,
interação, dialogicidade e, consequentemente, na aprendiza-
gem significativa. Valoriza as concepções dos estudantes na
veiculação de conhecimentos inerentes à teoria e à prática
cotidiana de sala de aula e, no caso específico da abordagem
temática desse capítulo, o uso ou não da tradução no ensinar
e aprender língua inglesa (LI) na disciplina de inglês
instrumental (I.I.).
O tema tradução raramente aparece na teoria sobre I.I.
e está presente na sala de aula. Assim, a consolidação de um
panorama exploratório acerca das concepções de alunos que
cursam a disciplina de I.I. em cursos de graduação pode
elucidar o que os sujeitos empiricamente adquiriram ao
longo de sua história de vida, de aprendizagem e no I.I. na
escola.

Sumário
178 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

Então, a partir de entrevistas feitas com alunos da


educação superior, este estudo torna possível ampliar o
escopo de contextualização de um estudo mais aprofundado
sobre o tema: ensino de I.I. e tradução. Nessa perpectiva, os
resultados dessa pesquisa exploratória podem contribuir na
ampliação das discussões e surgimento de novos questiona-
mentos que motivem estudos ou práticas pedagógicas no I.I.
e nos Estudos da Tradução.
Este capítulo expõe uma síntese de trabalhos realiza-
dos acerca do uso da tradução no ensino de Língua
Estrangeira (LE); aponta considerações sobre estudos de
concepções de estudantes acerca de tradução no ensino de
LE; e uma análise de concepções de estudantes universitários
acerca de tradução no ensino de LE, na disciplina de I.I., e ao
longo de suas experiências na aprendizagem de inglês no
cotidiano e na escola.

Tradução no ensino de língua estrangeira

Não é desconhecido que a discussão sobre a utilização


da tradução no ensino de LE é vasta em posicionamentos
“contra” e “a favor” desta prática, bem como, a relevância
desta discussão; entretanto, não é objetivo deste texto fazer
este aprofundamento. Aqui é feita uma referência a opiniões
de autores para subsidiar, de forma sucinta, a problemati-
zação do estudo aqui relatado, o qual, como afirmado no
início deste capítulo, está apoiado na concepção de que não
pode ser negado que, tácita ou explicitamente, em práticas
pedagógicas ou não, ao acessar um texto em LE, estudantes
fazem uso da tradução nas mais variadas formas, como
estratégia para entender o que leem. Este procedimento de
tradução usado pelos estudantes não significa seguir passos
formais de uma tradução técnica, nem que o professor de LE
tenha que ensinar como se traduz um texto, constitui uma

Sumário
Pesquisas em Tradução | 179

estratégia buscada por alunos para aproximar o texto escrito


em LE à língua materna (LM) e entender o que lê.
Os benefícios da tradução, no entender de Ridd (2000),
ultrapassam os seus possíveis efeitos negativos. Para o autor,
a presença da tradução em aulas com propósitos comuni-
cativos, ensino por tarefas, aprendizagem centrada no aluno
e pedagogia crítica combinam perfeitamente. Juntam-se a
esta opinião ideias de Cook (1998), Malmkjaer (1998), entre
outros, que reconhecem a tradução como elemento presente
e fundamental nas aulas de ensino de LE, e ainda que os
referidos autores considerem a contribuição de outros
autores que se colocam “contra” o uso da tradução no ensino
de LE, julgam que a tradução pedagógica conquistou espaço
e respeitabilidade como procedimento e objeto de investi-
gação. Ridd considera que:

Se antes era necessário abordar com cautela extrema a


questão da tradução no ensino de línguas [...] hoje é
possível pensar e pesquisar a questão em ambiente de
maior distensão e menor ranço, ainda que algumas
instituições insistam em rejeitá-la de antemão. Não se
discute mais se a tradução tem lugar relevante no
ensino/aprendizagem de línguas. Discute-se agora
que funções ela pode e deve desempenhar e por que
meios obter o maior proveito de uma atividade com-
plexa, rica, instigante e necessária. É uma atividade
que exige uma postura mais aberta e reflexiva de
quem ensina línguas, muitos ainda muito acostu-
mados às certezas e facilidades propiciadas por méto-
dos e abordagens desenvolvidos no século 20, pouco
apropriados aos desafios lançados pelo mundo em
fluxo que conhecemos no século 21 (RIDD, 2009, p.
142).

Com objetivo de discutir sobre o uso da tradução no


ensino-aprendizagem de LE, Romanelli (2009) propõe

Sumário
180 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

analisar os “motivos não somente linguísticos, mas também


ideológicos e políticos que essa discussão envolve, e rea-
valiar as vantagens desta técnica didática” (ROMANELLI,
2009, p. 200), atentando a trabalhos publicados sobre o
assunto no Brasil e no exterior.
O autor esclarece que não faz apologia ao uso da
tradução no ensino-aprendizagem de LE, por reconhecer que
o emprego excessivo ou inapropriado pode ser negativo para
fins didáticos. Romanelli (2009) considera que a discussão
sobre o uso da tradução no ensino de LE diminuiu com a
adesão de teóricos e práticos aos pressupostos da abordagem
comunicativa, pois houve a redução do uso da tradução de
forma explícita e afirma que para os adeptos a esta
abordagem o uso da tradução no ensino de LE passou, em
geral, a ser julgado “desnecessário e até desaconselhável”
(ROMANELLI, 2009, p. 200). Para Romanelli, apesar das
críticas e obscuridade do papel da tradução por algum
tempo, é comum identificar professores e estudantes que
usam a LM para se aproximarem da LE com o uso da
tradução. Romanelli (2009) extrapola a argumentação teórica
apresentando atividades didáticas utilizando a tradução em
aulas de LE.
Calvo-Capilla e Ridd (2009), em artigo que tratam da
tradução na aprendizagem de línguas próximas, assinalam
que antes de ser rejeitada no ensino de LE, a tradução ocorria
na transposição de palavras, muitas vezes descontex-
tualizadas, ou “como empreitada de cunho literário além da
capacidade comunicativa dos aprendizes” (CALVO-
CAPILLA; RIDD, 2009, p. 162). Ao longo do tempo, em
abordagens que acompanhavam propostas linguísticas e/ou
pedagógicas, não se ensinava a traduzir para auxiliar a
aprender a LE. A tradução como instrumento pedagógico
comunicativo, para estes autores, passa a ser apontada em
trabalhos publicados por, entre outros, Lavault (1985), que
estimula a recuperação da tradução com fins pedagógicos,

Sumário
Pesquisas em Tradução | 181

tendo como modelo o ensino de tradução profissional e o


conceito de tradução interpretativa de Delisle (1988). A
tradução “volta a figurar entre as propostas de pesqui-
sadores como atividade comunicativa com foco no sentido
que, dada a alta carga cognitiva, permite trabalhar de forma
consciente o contraste entre as línguas” (CALVO-CAPILLA;
RIDD, 2009, p. 150).
Em uma leitura crítica de trabalhos acadêmicos
brasileiros, como de Romanelli (2006), Welker (2004),
Hargreaves (2004), Checchia (2002) e Hinojosa e Lima (2008),
que versam sobre as possíveis vantagens e desvantagens do
uso da tradução no ensino de LE, Bohunovsky (2011) afirma
que trabalhos, ao abordarem a tradução no contexto de
ensino de LE, são fundamentados em conceitos de tradução
na visão do senso comum, fragilizando a reflexão teórica
sobre essa atividade e desconsiderando as indagações feitas
há décadas por estudiosos da área. A autora conclui que a
consequência da falta de clareza argumentativa e termino-
lógica encontrada na análise pode ser atribuída à falta de
diálogo entre a área de ensino de LE e os Estudos da
Tradução que “há algumas décadas, vem colocando em
questão a visão do senso comum a respeito do processo
tradutório” (BOHUNOVSKY, 2011, p. 215). Sugere a intensi-
ficação do diálogo entre os que se dedicam aos Estudos da
Tradução no ensino de LE, pois contribuiriam “para
discussões mais esclarecedoras e ricas sobre esse tema, se
levassem em consideração as teorias e os debates que têm
sido desenvolvidos na área da tradução nas últimas
décadas” (BOHUNOVSKY, 2011, p. 215).
Objetivando instigar essa discussão, o presente traba-
lho traz o relato de um estudo junto a estudantes de cursos
de graduação, de modo a conhecer suas percepções acerca
da tradução no I.I.. Focaliza concepções desses alunos sobre
tradução e seu uso, ou não, no processo de ensino-
aprendizagem de LE, tanto nessa disciplina no curso atual,

Sumário
182 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

como em sua vida escolar. Dessa forma, este trabalho


ressalta as construções conceituais dos alunos, a princípio
formuladas a partir do senso comum sobre o uso de
tradução no ensinar e no aprender uma LE através da
disciplina de I.I..
A suposição de que as concepções sejam fundamen-
tadas no senso comum se dá devido ao fato de que os alunos
não necessitem se apropriar de conceitos teóricos acerca do
tema. Valoriza-se aqui o ponto de vista dos estudantes, suas
ações, reações e percepções diante do que lhes é proposto em
práticas pedagógicas do I.I..

Estudo de concepções e sua importância para o uso da


tradução no ensino de LE

O objetivo do I.I. não é traduzir, nem formar


tradutores. Conforme Pinto (2009, p. 85):

[...]o ensino de inglês instrumental sofreu uma série


de modificações ao longo dos anos. Houve, a
princípio, uma mudança de enfoque, que passou do
controle sobre a compreensão do leitor para o controle
interno do aluno. A ênfase inicial no uso de materiais
de ensino refletiu-se no interesse posterior nos
processos mentais que ajudassem os leitores a
adquirir o autocontrole sobre suas próprias estratégias
de compreensão.

Implícito neste estudo está o conceito de concepção


fundamentado em Giordan e De Vecchi (1996, p. 94-95),
considerado:

[...] um processo pessoal, através do qual um apren-


dente estrutura progressivamente os conhecimentos
que integra. [...] A 'concepção', tal como a reconhe-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 183

cemos, não é portanto produto, mas sim o processo de


uma atividade de construção mental do real. Essa
elaboração efetua-se, é claro, a partir das informações
que o aprendente recebe pelo intermédio de seus
sentidos, mas também das relações que mantém com
outrem, indivíduos ou grupos, durante sua história, e
que permanecem gravadas em sua memória.

No estudo acerca de concepções, é importante elucidar


o que se entende por informação-conhecimento-saber. Neste
estudo, são articulados conceitos de Charlot (2000; 2005), que
considera a informação como um dado exterior ao sujeito,
que pode ser armazenada e utilizada em qualquer momento.
Conhecimento é decorrência da vivência pessoal, é subjetiva
e intransmissível.

Assim como a informação, o saber está "sob a


primazia da objetividade"; mas, é uma informação de
que o sujeito se apropria. Desse ponto de vista, é
também conhecimento, porém desvinculado do "invó-
lucro dogmático no qual a subjetividade tende a
instalá-lo" (CHARLOT, 2000, p. 61).

O saber é, portanto,

[...] produzido pelo sujeito confrontado a outros


sujeitos, é construído em "quadros metodológicos".
[...] A análise parece-me pertinente: não há saber
senão para um sujeito, não há saber senão organizado
de acordo com relações internas, não há saber se não
produzido em uma "confrontação interpessoal"
(CHARLOT, 2000, p. 61).

Nesse enfoque, o estudo de concepções de estudantes


no ensino de LE pode favorecer a identificação de signi-
ficados atribuídos por eles na construção do conhecimento,
nas relações que estabelecem no cotidiano e espaços

Sumário
184 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

educativos em contato com a LE, bem como, considerar a


característica do I.I. de preparação das atividades a partir das
necessidades discentes. Implica valorizar a interação,
estimulando compartilhamento de uma intenção particular,
que pode repassar informações, modificar pontos de vistas,
construindo conhecimentos, desconstruindo preconceitos,
transformando potencialidades, sedimentando saberes. A
negociação de significados na explicitação de concepções
pelos aprendizes permite que discentes e docentes com-
preendam que certas ações e concepções podem ser influen-
ciadas pela cultura, contexto espaço-temporal, comunicação
interpessoal e concepções individuais ou do grupo, inter-
ferindo na assimilação consciente de conhecimentos e
habilidades.
Esta declaração não implica a ideia de que o processo
dialógico não ocorra em abordagens de ensino de LE com
outras características, apenas aqui é enfatizada a importância
atribuída ao fato de que a aprendizagem ocorre no processo
de efetiva comunicação e que esta não é uma prática
generalizada e explícita em aulas de I.I.. Como saber o que o
aluno almeja, pensa, vivenciou se não se pergunta e não se
analisa sua resposta? O estudo de concepções dos estudantes
pode representar uma diferença de como o ensino-
aprendizagem é percebido.

Método

Como procedimento de coleta de dados foram


realizadas entrevistas com roteiro semiestruturado, que, com
a autorização dos sujeitos pesquisados, foram anotadas e
posteriormente revistas por eles. Também, contou-se com a
observação realizada durante cada entrevista. Para a análise
de dados utilizou-se a análise de conteúdo, fundamentada
em Triviños (1987). Foram entrevistados 50 alunos da

Sumário
Pesquisas em Tradução | 185

disciplina I.I. dos cursos de: Licenciatura em Ciências


Biológicas, Física, Matemática e Química; Bacharelado em
Enfermagem e Farmácia.
Desta forma, o estudo aqui relatado reafirma princí-
pios da pesquisa qualitativa, ao buscar entender os sujeitos a
partir de seus pontos de vista, considerando que “'ponto de
vista' é um construto de investigação. Entender os sujeitos
com base nesta ideia pode, consequentemente, forçar a
experiência que os sujeitos têm do mundo a algo que lhes é
estranho" (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.54). E, por ser uma
pesquisa exploratória que aborda o ensinar e aprender em
sala de aula, envolve ideias como as Giordan e De Vecchi
(1996) que explicam:

[...] a construção do conhecimento passa pela tomada


em consideração das concepções dos aprendentes, que
essas evoluem a partir de um questionamento através
de atividades de confrontação com as concepções dos
outros e com os fatos. Essas atividades permitem
formular problemas científicos, procurar elementos de
resposta, analisar esses últimos, estabelecer assim
novas relações entre as aquisições pontuais, e isso em
ligação com as representações prévias (GIORDAN;
DE VECCHI, 1996, p. 195).

As reflexões acerca das informações obtidas, analisadas


à luz do aporte teórico, serão sintetizadas a seguir.

As concepções dos estudantes: tradução e o seu uso no


ensino de I.I.

A entrevista teve roteiro com questões que buscaram


saber: (1) se os professores de inglês nos ensinos
Fundamental e Médio eram formados em Letras- Inglês; (2)
o que o aluno entrevistado faz primeiro quando vai ler um

Sumário
186 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

texto em LI; (2) qual a maior dificuldade na leitura de um


texto em inglês; (4) se é possível que um aprendiz iniciante
de inglês leia um texto nessa língua sem traduzir; (5) para
que o aluno necessita do I.I.; (6) se havia algum tema de seu
interesse específico para a leitura em inglês na sua vida
acadêmica atual; (7) quais as características das aulas de
inglês na escola; (8) quais as principais atividades propor-
cionadas neste âmbito voltadas ao ensino de inglês; (9) como
eram sugeridas as atividades de ensino-aprendizagem. A
característica da entrevista permitiu que entrevistados e
entrevistadora extrapolassem o roteiro das perguntas,
acrescentando explicitações, exemplos, comentários, depen-
dendo da emoção, envolvimento, memória, significado dado
à questão pelos respondentes.
Aqui são descritos resultados do estudo na ordem do
roteiro de entrevista, apontando os principais elementos
analisados, visando favorecer a compreensão por parte do
leitor, que segue a narrativa da seção da forma como foi
conduzida no processo de coleta de dados.
O capítulo apresenta um estudo de concepções numa
pesquisa qualitativa, que, por natureza, não estabelece
hipóteses, nem prejulga os sujeitos pesquisados. As questões
são objetivas, exigindo respostas discursivas, subjetivas,
típicas de entrevista com roteiro semiestruturado. A
entrevista obtém dados descritivos na linguagem do sujeito,
embebido em sua subjetividade, assim, o pesquisador pode
desenvolver de forma intuitiva uma ideia sobre como os
sujeitos interpretam aspectos do mundo (BOGDAN;
BIKLEN, 1994).
Em resposta à primeira questão, todos citaram a
formação de seus professores de Inglês nos ensino Funda-
mental e Médio, manifestando certa criticidade a esse
respeito, o que pode ser visualizado na apresentação dos
resultados, que indicou uma diversidade na formação dos
professores.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 187

Os professores de I.I., na escolarização anterior dos


alunos entrevistados, são, em suas lembranças, em geral,
formados em Letras e até alguns em Letras e Pedagogia.
Houve quem julgasse que seus professores tivessem sido
improvisados e quem avaliou terem seus professores um
“inglês bem básico”. Dois entrevistados mencionaram que os
professores lecionavam outras disciplinas na escola, como
Geografia, Matemática e Física.
A inclusão dessa questão se dá pelo fato de valorizar a
formação do professor de Inglês. A formação em Letras
Inglês pode supor um conhecimento teórico mais amplo
acerca dos pressupostos de I.I.. Isso realmente acontece? O
aluno percebe essa diferença? O fato de o aluno ter
conhecimento sobre a formação do docente e informar qual
é, pode ser decisiva na compreensão do comportamento
didático desse professor.
À pergunta “O que você faz primeiro quando vai ler
um texto em língua inglesa”, as respostas apontam que os
alunos: procuram as palavras conhecidas num primeiro
contato com o texto; outros procuram identificar do que trata
o texto; e dois afirmaram logo procurar um dicionário,
embora não tenham explicitado como o utilizariam. Foi
frequente a alusão à tradução como um recurso nos
procedimentos.
Esta questão realça a expectativa positiva do docente e
do pesquisador em relação ao que os alunos podem oferecer,
já que são sujeitos complexos, pensantes, reflexivos,
produtores de conhecimento, protagonistas de sua própria
história e formação acadêmica e profissional. Não houve
hesitação dos alunos para responder a esta pergunta. Todos
eles sabiam descrever os procedimentos que utilizavam.
Estas respostas podem, na perspectiva da pesquisa
qualitativa, constituir um achado importante por evidenciar
o conhecimento e reação dos estudantes diante de um texto
em LE, inclusive quebrando preconceitos que circundam a

Sumário
188 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

questão. As respostas denotaram que os alunos têm adotado


estratégias para ler texto em inglês, que podem ter sido
ensinadas ou adotadas espontaneamente; as quais vêm
sendo bem-sucedidas ou não, na leitura de qualquer tipo de
texto; mas constitui um dado a ser conhecido sem
preconceitos pelo professor de I.I., de modo a que este possa
planejar aulas mais aproximadas às características discentes,
a um diálogo profícuo para os auxiliar a aperfeiçoar a leitura
que faz em LI.
Perguntados sobre qual a maior dificuldade na leitura
de um texto em inglês, os entrevistados apontaram: (a)
conjugação verbal; (b) restrição de vocabulário; (c) diferenças
do idioma; (d) ordem das palavras nas frases; (e) gramática;
(f) tentar entender o sentido das frases no contexto do texto;
(g) diversidade de significados de uma mesma palavra
dependendo do contexto; (h) as gírias, palavras desconhe-
cidas. Pouco menos de um quarto dos entrevistados afirmou
ser a pronúncia sua maior dificuldade, pois afeta a
compreensão do texto, mesmo em leitura silenciosa. Um dos
alunos disse não ter ideia acerca de suas dificuldades; dois
consideram que tudo é difícil; um explicou que “por não
saber a língua, não passa nada na cabeça”.
A quarta questão da entrevista tratava se é possível
que um aprendiz iniciante de inglês leia um texto nessa
língua sem traduzir. Com exceção de um aluno entrevistado,
todos fazem uso da tradução para ler textos em LE. Desses,
dez dizem que para abrirem mão da tradução como
estratégia na leitura em inglês “depende do texto”. Seis
consideram que, embora não consigam entender o texto
todo, conseguem identificar o sentido do texto. O estudante
que respondeu não utilizar a tradução na leitura em LE, diz
ser possível ao leitor recorrer a associações para com-
preender o texto.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 189

Aqui se busca conhecer através das respostas dos


estudantes sua concepção de tradução e a forma como a
utilizam e se a utilizam no contato com o texto em LE.
A seguir, foi perguntado aos estudantes para que o I.I.
é necessário. No entender dos estudantes, a necessidade do
I.I. se concentra na importância para ampliar os conheci-
mentos gerais e aprimorar a leitura. Seis destes disseram
ainda ser para aperfeiçoar a gramática; houve também quem
julgasse necessário para ajudar na tradução de textos e
outros três de que ajudaria na pronúncia. Um destacou a
necessidade de I.I. para “abrir novos caminhos, conhecer
novas culturas e ler artigos” e outros, ainda, destacaram a
leitura de textos de sua área de estudos.
Ao responderem sobre algum tema de seu interesse
específico para a leitura em inglês na sua vida acadêmica
atual, foram apontados pelos entrevistados textos sobre sua
área específica e indicações de acordo com interesses
individuais tais como: microbiologia clínica; fisiologia
humana; e gírias (o entrevistado que afirmou ter dificul-
dades em ler textos em que encontre tais palavras).
Com a intenção de compreender como os alunos, que
estudaram inglês por cerca de sete anos na escola básica, têm
concebido esta atividade em sua formação foi perguntado:
quais as características das aulas de inglês na escola; quais as
principais atividades; como eram sugeridas as atividades?
Os alunos foram bastante espontâneos em suas respostas e
em síntese responderam que as características das aulas de
inglês na escola tinham forte foco na gramática, sendo
enfatizado o verbo “to be”, além da tradução de textos,
principalmente de letras de músicas. Os alunos descreveram
que utilizavam dicionários para a realização das atividades e
houve comentários sobre a dificuldade em saber a palavra
correspondente correta, devido à quantidade de opções
presentes no dicionário. Referiram-se, também, a atividades
que envolviam características de diferentes gêneros textuais.

Sumário
190 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

Ao citar algumas das falas dos estudantes, parte de


suas manifestações a esta questão é aqui ilustrada e a seguir
comentada:

“As aulas de inglês que eu mais gostava eram do


Fundamental, aonde a professora fazia dinâmicas, músicas,
brincadeiras, etc.”.
“O professor dava um pouco de gramática e pedia
para traduzir texto”.
“Aplicava a parte gramatical, trabalhava com textos,
traduções e interpretações”.
“Um pouco de tradução de texto, e tive um professor
que parecia mais que dava aula de português (gramática) só
que em inglês”.
“Passava música para a gente traduzir, dava gramá-
tica, raramente dava um texto para interpretação”.
“Verbo to be”.
“O meu professor ensinava várias coisas, pois ele
tentava fazer com que os alunos aprendessem o inglês se
divertindo, fazendo leituras, gramática, estudando letras
musicais, etc.”.
“Professor dava gramática e textos complementares
para auxiliar na fixação. Também pedia para montar um
dicionário com as palavras já dominadas ao longo do ano”.
“O professor colocava frases em inglês no quadro e
todos tinham que colocar a frase em português”.
“Eu tinha mais aulas com o monitor do que com o
professor”.
“Aprendíamos letras, números, cores. Depois vocabu-
lário, falsos cognatos, ‘to be’ e mais tarde textos e inter-
pretação com o dicionário”.
“Usava o Google Tradutor e copiava textos para
treinar a escrita”.
Quadro 1: Excertos de falas dos estudantes

Sumário
Pesquisas em Tradução | 191

Nas falas dos estudantes, há evidências de que o inglês


trabalhado na escola visou diversificar os procedimentos de
ensino nas aulas com músicas e atividades que pudessem ser
mais atraentes e voltadas ao cotidiano dos estudantes,
aliando à leitura e à gramática, na tentativa de atender
requisitos presentes nos programas curriculares, no
vestibular ou no Exame Nacional de Ensino Médio - ENEM.
Entretanto, segundo os alunos, muitos professores se
mostravam desmotivados e sem acreditar que poderiam
realmente fazer a diferença na formação dos estudantes. Um
dos alunos mencionou que a característica da prova do
ENEM é diferente do que é feito na escola, e que ficou
assustado ao deparar-se com questões na prova que jamais
vira nem parecidas, tanto no conteúdo quanto na forma. Ele
acredita que o inglês da escola deveria tê-lo preparado para
fazer tais questões, pois estas tinham relação com o que se
discute na atualidade.
Na concepção dos alunos, as aulas de inglês cumpriam
os objetivos numa ação meramente didática. Para alguns dos
entrevistados, sua própria relação com a LE nas aulas era de
realizar exercícios com fins de avaliação em provas internas
ou externas ao meio escolar. Entretanto, implícito em suas
falas também é possível perceber o interesse em que a
interação consciente com o texto favorecesse sua formação
de leitores responsáveis e autônomos. Ainda que os entre-
vistados desconheçam pressupostos teóricos que defendem
atividades que incentivem e permitam tal interação, eles
desejariam ter aulas de LE que contribuíssem também para
tomarem decisões mais independentes, utilizando aquilo que
aprenderam em aula em outros momentos da vida,
incorporando o conhecimento à sua identidade e fazendo
novas associações. Pode-se inferir sobre esta expectativa dos
entrevistados ao considerar suas indicações sobre as
necessidades do I.I. em sua formação, quais sejam: para
ampliar os conhecimentos gerais e aprimorar a leitura;

Sumário
192 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

aperfeiçoar a gramática; ajudar na tradução de textos, ajudar


na pronúncia; e “abrir novos caminhos, conhecer novas
culturas e ler artigos” bem como, a leitura de textos de sua
área de estudos.
Expectativas que remetem a características do I.I. com
ênfase em tarefas comunicativas. Segundo Corte e Fischer
(2010), baseadas em Nunan (2004), essas tarefas envolvem:

- criar situações de aprendizagem para que os alunos


desempenhem no contexto escolar tarefas semelhan-
tes às que vivenciarão na vida real, o professor deve
tomar o cuidado de fornecer as ferramentas neces-
sárias para a execução da tarefa solicitada e, ao
mesmo tempo, retirar o apoio na medida em que os
alunos tornam-se independentes;
- criar uma seqüência instrucional em que as tarefas
fluam de uma para outra, de forma lógica e coerente,
guiando os alunos em uma seqüência até o momento
de serem capazes de realizar a tarefa pedagógica final;
- os alunos devem ter contato com os itens lingüísticos
em uma variedade de contextos ao longo de um
período de tempo;
- a maior parte da aula deveria ser voltada à criação de
oportunidades para os alunos usarem a língua;
- o aluno precisa entender claramente as relações
sistêmicas entre forma, função e significado;
- as tarefas reprodutivas precedem as tarefas criativas;
- criarem oportunidades para que os alunos reflitam
sobre o quê e de que forma aprendem
(CORTE; FISCHER, 2010, p. 5-7).

As aulas de inglês, nas concepções em geral dos


alunos, apresentam características semelhantes em suas
descrições individuais e trouxeram uma reflexão que
tacitamente denuncia a falta de uma proposta contínua de
aulas de inglês, considerando o conhecimento prévio dos
alunos e com metas definidas quanto ao que se pretende

Sumário
Pesquisas em Tradução | 193

alcançar a cada período letivo. Manifestaram que, em muitos


casos, as aulas de inglês desde o Ensino Fundamental ao
final do Ensino Médio têm o mesmo conteúdo.
A tradução integra as atividades de leitura em LE, na
fala dos alunos. Todos eles mencionaram mais de uma vez o
uso da tradução no ensino de inglês, com exceção de um
aluno que acredita ser prejudicial traduzir. Todos os outros
entrevistados afirmaram terem sido estimulados a traduzir,
seja utilizando o dicionário, seja procurando as palavras
mais conhecidas e parecidas com português e, em outra
etapa da leitura, traduzir os textos para interpretação. O
aluno que disse defender a leitura sem tradução deu o
exemplo da palavra “butterfly”, que, segundo seus
professores anteriores, mostra que é inútil traduzir, já que
“butter” é manteiga e “fly” é voar, dessa forma os alunos não
têm como saber o que significa realmente a palavra no
contexto. A defesa desse aluno é, então, que em níveis
iniciais o estudante faça associações e só traduza em alguns
casos. Manifesta-se aqui a escolha teórico-metodológica,
pedagógica ou linguística do professor e a adesão do aluno a
ela, que como foi focalizado neste texto, integra a discussão
acerca da pertinência ou não do uso da tradução no ensino
de LE e, como tal deve ser respeitada, ainda que se
valorizem e se defendam as produções acadêmicas e práticas
pedagógicas que adotam a tradução neste ensino, desde que
comprometidas com a informação, o conhecimento e o saber
do aluno.
Nesse comprometimento, ressalta-se que a distinção de
informações relevantes das irrelevantes em textos
acadêmicos trabalhados com estudantes tem se mostrado um
obstáculo no entendimento de textos na LE, segundo autores
como Corte e Fischer (2010), tendo esta distinção, ligação
direta com os objetivos de leitura dos textos. As autoras
valorizam ações pedagógicas em que os estudantes sejam
incentivados a “tomar decisões sobre o quê, quando e como

Sumário
194 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

selecionar as informações, tornando-se cientes da impor-


tância do desenvolvimento dessa competência para sua
prática cotidiana de leitura de textos acadêmicos” (CORTE;
FISCHER, 2010, p. 3).

Considerações finais

Este estudo, que objetivou analisar concepções de


estudantes universitários sobre a tradução no I.I. na edu-
cação básica e superior, permitiu reunir elementos de
contextualização para uma pesquisa e para planejamento de
aulas dessa disciplina que visem focalizar tradução como
estratégia no ensino de LE. A pesquisa viabilizou identificar
necessidades dos alunos, valorizar conhecimentos prévios
dos mesmos, nem sempre para conservá-los, mas também
para que seja objeto de discussão e de desconstrução por eles
mesmos, por professores e por pesquisadores voltados aos
Estudos da Tradução e àqueles que tratam do ensino de LE.
O estudo possibilitou, como defendem autores citados,
sublinhar a necessidade de que se explicite o papel da
tradução no ensino de LE, no caso específico, na percepção
dos estudantes entrevistados.
Os relatos mostram que, com uma exceção, os alunos
não acreditam ser possível ler em uma LE com a qual não se
têm familiaridade sem traduzir; para todos os alunos a
tradução era uma prática constante nas aulas de LE nas
escolas, em sua maioria sendo apresentada em diferentes
etapas da leitura e diversos gêneros textuais. No entanto,
nenhum aluno acusou ter sido incentivado a refletir sobre o
fazer tradutório ao traduzir. O que aponta para a constatação
de que as aulas de LE geral ou de I.I. não visam preparar
tradutores ou treinar para traduzir, objetivam sim, entre
outros objetivos e em diversas abordagens teórico-
metodológicas, favorecer aos estudantes o uso desta LE na

Sumário
Pesquisas em Tradução | 195

leitura de textos, nas mais variadas fontes, para que ampliem


sua busca de informação acerca de conteúdos específicos da
licenciatura que cursam.
Este texto destaca a valorização da formação de alunos
autônomos, que aprendam a tomar decisões conscientes
quando necessárias, buscando informações, adquirindo
conhecimento de como selecionar as informações do texto;
que saibam fazer uso da tradução como atividade que per-
mita, na aproximação da LE com a LM, que se conscientize
de aspectos culturais e linguísticos, identifique coincidências
e diferenças, promovendo uma aprendizagem mais signi-
ficativa; assim como, a formação de alunos universitários e
profissionais que buscam e se responsabilizam pelo seu
próprio conhecimento utilizando a LE a favor desse intento.
O texto ressalta, ainda, a importância de que os
Estudos da Tradução estimulem pesquisas e discussões que
focalizem o ensinar e aprender no I.I., levando em consi-
deração as concepções de alunos desta disciplina acerca de
conceitos e práticas pedagógicas, de modo a explicitar
teorias implícitas nestes conceitos e práticas, em âmbitos da
educação básica e superior.

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Sumário
198 | E n s i n o de inglês instrumental e tradução...

Sumário
Pesquisas em Tradução | 199

Cleydstone Chaves dos SANTOS


Universidade Federal de Campina Grande

Introdução

Recentemente com o advento da internet, as ferra-


mentas de tradução automática (doravante TA) têm ganhado
cada vez mais espaço no mundo moderno, fazendo parte de
seu cotidiano e adentrando em diversos setores da sociedade
(SMITH, 2001). Seja para uma simples consulta de um termo
desconhecido na língua estrangeira por usuários leigos e/ou
até mesmo para a tradução em massa de manuais de
instrução, boletins de tempo, listas de especificações técnicas
por empresas como: Xerox, Ericsson, Osram, SAP, Ford,
General Motors dentre outras (SMITH, 2001), pode-se
afirmar que a TA faz parte da vida da sociedade digitalizada.
Como resultado, não se pode negar que tais ferramentas
realizam uma tradução que atende a diversos fins sociais.
Além disso, desde o aparecimento delas tem se observado
um avanço (SOMERS, 1998; KOEHN, 2010) no que diz
respeito à qualidade das suas traduções (NIÑO, 2004; 2009;
PYM, 2011; SANTOS, 2011).
Consequentemente, muitas dessas ferramentas podem
ser facilmente acessadas através de diversos dispositivos
eletrônicos, tais como: desktops, laptops, ipads, tablets,
aparelhos de celulares, dentre outros. Atualmente, o público
acadêmico tem constantemente recorrido a tais ferramentas

Sumário
200 | A retextualização da tradução automática...

para traduções de alguns gêneros textuais da esfera acadê-


mica (SANTOS, 2011), de modo que se torna imprescindível
lançar mãos da TA no contexto de ensino acadêmico. Isto
porque segundo Niño (2004) muitos aprendizes de línguas
estrangeiras, nesse caso específico a língua inglesa, têm
recorrido a este tipo de tradução, acessando-a através de
dispositivos eletrônicos diversos a partir dos quais ela pode
ser facilmente utilizada.
Assim, imerso numa abordagem pedagógica dessas
ferramentas de TA, o aluno usuário pode vir a compreender
a dimensão de suas potencialidades bem como a extensão de
suas limitações na crescente relação homem-máquina no
contexto atual de ensino-aprendizagem de uma língua
estrangeira.
Além do mais, lançar mão dos mecanismos de
ferramentas de TA em sala de aula pode fomentar um
momento de reflexão, tanto para professores quanto para
alunos, sobre algumas questões de caráter fundamental no
que tange às distinções e particularidades de ambas as
línguas envolvidas nos processos da TA, conforme sugere
Santos (2012):a) reconhecimento da TA enquanto ferramenta
de acesso à informação e ao conhecimento como inclusão
social e b) uso da TA como fomento à importância da
tradução nas diversas áreas do saber. Consequentemente
precisa-se levar em conta o papel da tradução e novas
tecnologias na mediação do saber e na formação acadêmica e
profissional.
Embarcando nessa perspectiva, este capítulo visa
analisar o relato de alunos de inglês instrumental sobre o
desempenho do Google Tradutor na tradução automática de
abstracts, com o intuito de discutir até que ponto atividades
de retextualização da TA podem trazer benefícios para o
ensino-aprendizagem de língua inglesa instrumental.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 201

A aula de língua inglesa instrumental e a tradução


automática

Segundo Celani (1998), foi em meados da década de


70 que a abordagem da língua inglesa (doravante L2) com
enfoque instrumental em leitura ganhou força no Brasil. Isto
se deu em virtude da necessidade de leitura de textos
acadêmicos de cunho científicos pela comunidade discente
dos centros universitários.
Consequentemente, por volta dos anos oitenta,
iniciava-se a transição das práticas de leitura em L2 oriundas
dos preceitos da Gramática e Tradução para a abordagem
das estratégias de leitura: skimming, scanning, inferência
contextual, reconhecimento de cognatos e falsos cognatos dentre
outras, mesmo embora fossem marcante traços de uma
prática de leitura através da decodificação do código
linguístico (GRELLET, 1981), e da tradução literal, desconsi-
derando os fins comunicativos da mesma.
O uso dessas estratégias na aula de inglês instru-
mental, todavia, foi revelando uma prática de leitura de
caráter especulativo (HOLLAS, 2002). Isto porque tinha
como ênfase o emprego constante de inferências, visando
checar a compreensão do assunto do texto sem levar em
conta a importância das relações intra e extratextuais através
das estruturas linguísticas.
Atualmente, o boom da abordagem de gêneros textuais,
que se configura como a “nova tendência” no ensino de
língua materna (L1), também vem encontrando espaço na
aula de língua inglesa instrumental, no entanto ainda
associada às práticas anteriormente citadas (FIORI &
SOUZA, 2005).
Nesse contexto atual, sabe-se que uma disciplina de
língua inglesa instrumental, no ensino superior federal,
usualmente compreende um curso de 60h ou 75h aula que,
por sua vez, pode não dar conta da gama de particularidades

Sumário
202 | A retextualização da tradução automática...

inerentes a um idioma, mesmo embora seja direcionado


unicamente a desenvolver a habilidade de leitura. Além do
mais, como toda outra disciplina dessa natureza, para que
ela possa conceder aos seus aprendizes subsídios sólidos
favoráveis a uma leitura que lhes permita compreender as
relações intra e extratextuais, é necessário que tais apren-
dizes pelo menos apresentem um conhecimento prévio de
natureza linguística.
Em virtude dessa realidade, surge mais um dilema na
sala de aula de inglês instrumental resultante do tamanho
abismo entre “leitores em L2” e a gama de gêneros textuais
de cunho acadêmico que esses leitores, oriundos dos cursos
de graduação, precisam compreender na esfera acadêmica.
Nesse contexto, no entanto, há como restringir o número de
textos, os gêneros textuais em que se configuram bem como
os meios utilizados para suporte à compreensão. Em
contrapartida, fora dele não há como lidar com os artifícios
que graduandos não proficientes utilizam para suas leituras
de textos acadêmicos diversos em L2.
Em vista disso, na tentativa de minimizar tal dilema,
algumas pesquisas apontam o uso de dicionários conven-
cionais e eletrônicos (LEFFA, 2001) bem como programas de
tradução automática (NIÑO, 2004; 2005; 2009) como apoio à
leitura de textos acadêmicos diversos dentro e fora do
contexto de sala de aula de inglês instrumental (SANTOS,
2011a; 20112b). Como resultado desse uso de artifícios
diversos a fim de compreender tal lacuna em L2, e possivel-
mente preenchê-la, alunos de alguns cursos de graduação,
diante da gama de textos acadêmicos de leitura obrigatória
na L2, acaba recorrendo a programas de tradução automática
nas leituras extraclasse, e os subutilizando já que não tem
havido devida instrução formal para isso (NIÑO, 2004; 2009;
PYM, 2011; SANTOS, 2011) novamente.
Contudo, essa subutilização dos sistemas de TA tem
corroborando para sua marginalização em face da tradução

Sumário
Pesquisas em Tradução | 203

humana, de modo que muitos usuários, leigos concernente


ao seu escopo e limitações, acabam fazendo comparações
grosseiras entre ambos os resultados((HUTCHINS &
SOMERS, 1992; WEININGER, 2004) . E, portanto, revela-se a
tal ignorância acerca dos propósitos projetados para os
atuais sistemas de TA, ou seja, o de ferramentas digitais a
serviço imediato da própria tradução e da comunicação
humana.
Em face de tal inovação tecnológica, num curso de
língua inglesa instrumental, não basta transferir conheci-
mento linguístico e ou sobre estratégias de leitura. Ou ainda
sobre como lidar com a diversidade de gêneros textuais
acadêmicos, se falta aos alunos leitores em L2 tempo para
maturidade da língua alvo bem como o conhecimento
adequado de uma gama de dispositivos e aplicativos que
podem auxiliar o processo de ensino-aprendizagem da
leitura em L2. Se em sala de aula, o aluno de leitura em L2
alcança com muita dificuldade a compreensão de partes de
um texto, ainda que tenha tido um conjunto de técnicas
aliado ao discurso do professor lhe guiando a uma possível
compreensão (CORACINI, 1998), o que esperar fora dele?
Assim, não há como mensurar até que ponto um curso dessa
natureza possa contribuir para o desenvolvimento da
proficiência de leitura em L2 de um aprendiz iniciante.
Em contrapartida, outros estudos apontam que a busca
por programas de TA vem aumentando, para fins diversos
nos contextos de sala de aula bem como fora dela (SANTOS,
2012), de modo que não se pode ignorar sua existência
(SOMERS, 2001), sua eficácia de acordo com o contexto de
uso (SMITH, 2001) nem sequer suas aplicações na aula de
línguas estrangeiras (NIÑO, 2005).
Entretanto, não se pretende aqui a consagração da TA
como solução dos problemas existentes no ensino de leitura
em L2. Ao contrário, discute-se o seu uso como uma das
novas tecnologias que pode dar suporte no contexto de sala

Sumário
204 | A retextualização da tradução automática...

de aula. A TA, no entanto, poderia servir como mais uma


ferramenta pedagógica na abordagem à leitura em L2, uma
vez que, como já mencionado, um número considerável de
indivíduos vem lançando mão de aplicativos e ferra-mentas
dessa natureza na tradução de certa quantidade de gêneros
textuais na esfera acadêmica (SANTOS, 2012).

O advento da relação homem-máquina

Desde os primórdios da história da humanidade, o


homem tem buscado ferramentas para facilitar a realização
do seu trabalho (cf. MANACORDA, 1995). Um grande
exemplo dessa proeza de natureza humana se deu durante a
Revolução Industrial, que, por sua vez, culminou numa série
de novos aparatos de caráter maquinofatureiro influen-
ciando e permeando não apenas o setor industrial, bem
como outros setores da sociedade: imprensa, educação,
comunicação, música etc. Desde então, a máquina tem
existido como ferramenta de apoio ao homem nas mais
diversas atividades de natureza distinta: doméstica,
profissional e acadêmica. No entanto, a aceitação da inserção
desses aparatos no seio das sociedades tem sido vista, de
certa forma, como uma tendência de substituição à mão de
obra humana.
A chamada terceira revolução industrial, resultante do
advento da inteligência artificial, vem concretizando de
alguma forma tal receio por parte das sociedades que
testemunharam a primeira e segunda revolução industrial.
Muitos setores da sociedade admitiram máquinas (indus-
trial, bancário, educacional dentre outros) como verdadeiros
funcionários devido a uma série de características que elas
podem apresentar em virtude de seu caráter de automação,
tais como: agilidade, precisão e produção em massa. Além
disso, o baixo custo para os empresários, tendo apenas que

Sumário
Pesquisas em Tradução | 205

gastar com a manutenção e não mais com salários, férias e


planos de saúde de seus funcionários. Portanto, o que, a
princípio pode parecer um assustador devaneio, tornou-se,
na verdade, um reflexo do boom tecnológico da contem-
poraneidade, exigindo agora da mão de obra humana mais
qualificação para operação dessas máquinas.
No setor educacional, por exemplo, tem-se as ativida-
des acadêmicas referentes às ciências humanas. Nelas, o
impacto de novas tecnologias apesar de constante ainda é de
lenta absorção, andando a verdadeiros passos largos, sendo
então subutilizadas até sua utilização adequada. Isso pode
ser explicado a partir do próprio desenvolvimento tecnoló-
gico, que, por sua vez, visa a atender o mercado industrial
com fins lucrativos para os seus patenteadores, sendo em
grande parte, resultante de pesquisas de cursos de gradua-
ção, mestrado e doutorado dos centros de ciências
tecnológicas.
Exemplificando esse discurso, tem-se o advento do
computador. E, como se pode testemunhar, ele se tornou
uma ferramenta tecnológica indispensável nos diversos
setores da sociedade, incluindo a educação, resultando nos
dias atuais na corrida para inclusão digital.

A relação homem-máquina através da TA

Em meados da década de 50, através do advento do


computador, a tradução encontrou seu viés automático, o
que, a princípio, parecia uma tentativa mascarada de substi-
tuir a tradução humana, tornou-se uma ferramenta cuja
função é de auxiliar “o usuário que também é tradutor” a partir
de “um sistema de tradução por máquina que é uma ferramenta
válida e confiável, que pode lhe fazer ganhar tempo e eficiência”
(ALFARO & DIAS, 1998, p. 370). A TA, como atualmente é

Sumário
206 | A retextualização da tradução automática...

conhecida, resulta da convergência do constante diálogo


entre várias áreas do saber:

“(...) o desenvolvimento da TA no cenário interna-


cional pode ser atribuído a fatores, tais como: primei-
ramente, a crescente produção científica das seguintes
áreas: 1) Ciências da computação (GOUTE et al., 2009;
KOEHN, 2010) no Canadá e nos Estados Unidos; 2)
Inteligência artificial (RUSSEL & NORVIG, 2004)
Inglaterra e Estados Unidos; 3) Linguística computa-
cional (WILKS, 2009) no Japão (...)”. (SANTOS, 2011,
pp. 167-177)

Nesse âmbito, Smith (2001) também acredita que


tradutores humanos possam se beneficiar de ferramentas de
TA. Para ele, elas podem desempenhar tarefas mais mecâ-
nicas que tomariam muito tempo dos tradutores humanos,
restando-lhes o trabalho de revisão do estilo:

“(...)it frees him/her from the most boring and


toilsome part of the translation process. Although
some technical translators insist on seeing MT as a
threat, in fact it is more of an aid, since it handles the
most mechanical aspects of the work while the human
translator continues to be essential to translate more
complex text and to review the MT output
(...)”(SMITH, 2001, p. 40)1.

1 Eles os dispensam das partes mais chatas e trabalhosas do


processo de tradução. Embora alguns tradutores técnicos insistem
em ver a TA como uma ameaça, na verdade, é mais um auxílio,
uma vez que lida com os aspectos mais mecânicos do trabalho,
enquanto o tradutor humano continua a ser essencial para traduzir
o texto mais complexo e para rever a produção da TA.(Tradução
automática fornecida pelo Google tradutor- acesso em 28 de
setembro de 2011- Revisão minha)

Sumário
Pesquisas em Tradução | 207

Experiências com retextualização em tradução automática


em sala de aula:

Segundo Niño (2009), a tarefa de retextualização é


denominada de atividade de pós-edição em TA, uma vez
que passa necessariamente por alguns estágios, os quais
podem permitir ao seu usuário uma maior reflexão sobre
ambas as línguas, a de partida e a de chegada, uma vez que
lhes concede a revisão de pontos gramaticais, lexicais e de
precisão estilística, ficando, assim, entre uma atividade de
leitura e escrita:

the nature of MT post-editing lies somewhere in the


middle of translation and writing skills as it involves
being constrained by a source text and still having to
consider correction and revision issues such as
grammatical, lexical and stylistic accuracy(NIÑO,
2004, p. 116)

Para Allen (2003), todavia, a tarefa de retextualização é


sinônimo de pós-edição, já que pode ser caracterizada como
uma atividade que exige do aluno-usuário da TA modificar e
ou corrigir de um texto pré-traduzido por processos
automáticos:

The task of the post editor is to edit, modify and/or


correct a pre-translated text that has been processed
by a machine translation system from a source
language into (a) target language(s). He goes on to say
that “post-editing entalis correction of a pre-translated text
rather than translation from scratch) (ALLEN 2003, p.
26).

Nessa linha de pensamento, os procedimentos de


retextualização seguem a noção descrita na tabela a seguir
segundo a visão do seguintes teóricos: Flower & Hayes

Sumário
208 | A retextualização da tradução automática...

(1981) na linha da geração de revisão; Beeby (1996) com a


proposta de reformulação e finalmente Hutchins & Somers
(1992) com a noção de pós-edição.

GERAÇÃO COMPREENSÃO ANÁLISE


DEVERBAZAÇÃO TRANSFERÊNCIA/
INTERLÍNGUA
TRADUÇÃO REFORMULAÇÃO GERAÇÃO
REVISÃO EDIÇÃO PÓS-EDIÇÃO EM TA
Flower & Hayes Beeby (1996) Hutchins & Somers
(1981) (1992)
Tabela 01- Modelos de retextualização

Entretanto, será a proposta de Hutchins & Somers


(1992) que se adequa à discussão ao longo deste capítulo, já
que lança mão da pós-edição em TA, eixo que melhor
descreve questões de retextualização.
Como resultado, não se pode negar, a existência de
pontos convergentes entre a tarefa de retextualização no
contexto da tradução automática com a noção de Interlíngua
de Selinker (1969), como se percebe na figura abaixo:

Língua materna Interlíngua


Língua alvo

Figura 01- A noção de interlíngua.

Contudo, a ideia consolidada anteriormente ainda


pode ser adaptada para a seguinte noção na figura 02 logo
abaixo:

Língua materna Tradução automática


Língua alvo

Figura 02- A tradução automática enquanto produto inacabado.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 209

Além do mais, é possível, segundo Niño, observar a


importância de se compreender a Teoria da não-binariedade
(PYM, 1992) que defende que uma tradução não pode
simplesmente resultar num produto de natureza dicotômica
certa ou errada. Tal teoria serve de suporte na compreensão
dos processos de retextualização, como se pode conferir na
figura abaixo:

Tradução errada

Figura 03- Teoria da não binariedade

Consequentemente, adaptando essa concepção à TA,


pode-se conceber que não há uma versão definitiva de seus
resultados, nem tampouco uma tradução errada, como se
observa na figura anterior. Isto ocorre porque são
disponibilizadas ao usuário cerca de três ou cinco TA
alternativas para as partes do texto fonte, de modo que é
decisão do usuário e não da máquina, a partir de seu
conhecimento sobre ambas as línguas envolvidas, através de
retextualizações do resultado apresentado, tomar as decisões
cabíveis, como se vê na figura a seguir:

Sumário
210 | A retextualização da tradução automática...

Retextualização da
TA TA

Figura 04- traduções alternativas da TA

Metodologia

O presente estudo, de natureza quantitativo-quali-


tativa, foi realizado com alunos do curso de graduação em
Música do Campus I da UFCG no período de 2012.1, dentre
outros 11 cursos de graduação. Tais cursos são atendidos
pela disciplina língua inglesa instrumental, vinculada à
Unidade Acadêmica de Letras-UAL. A escolha ocorreu em
virtude do alto percentual de usuários da TA neste curso,
segundo os relatos de Santos (2012)2 num estudo sobre a
tradução automática de gêneros textuais na esfera acadê-
mica. Nele o referido autor investiga a incidência e as razões
de textos traduzidos automaticamente por alunos de 12
cursos de graduação na UFCG. Como se vê nas tabelas 02 e
03 a seguir:

2 SANTOS, Cleydstone Chaves. A tradução automática de gêneros


textuais na esfera acadêmica. III SINALGE, UEPB, Campina
Grande, 2012. –

Sumário
Pesquisas em Tradução | 211

ÁREAS 1 - Exatas ÁREAS 2 - Área 3 - Saúde.


Humanas
Curso 1- Engenharia Curso 1- Letras Curso 1-
Civil Medicina
Curso 2- Engenharia Curso 2- História Curso 2-
Elétrica Fisioterapia
Curso 3 - Engenharia Curso 3- Música Curso 3-
Mecânica Psicologia
Curso 4-Engenharia de Curso 4- Curso 4-
Minas Geografia Odontologia
Curso 5-Ciências da
Computação

Tabela 02- Identificação da área e do curso.

Ou seja:

A1 A2 A3
C1 C1 C1
C2 C2 C2
C3 C3 C3
C4 C4 C4
C5

Tabela 03- Referência do curso

Consequentemente, o autor revela a maior recorrência


à TA por usuários da área das Ciências Humanas perten-
centes ao curso de graduação de música. No gráfico abaixo o
curso é representado pela referência C3.

Sumário
212 | A retextualização da tradução automática...

Gráfico – 01- Percentual de usuários e não-usuários de alguns


cursos de A2

A investigação dos abstracts, todavia, também resulta


dos relatos do mesmo estudo. Santos argumenta que tais
gêneros, devido a sua constância na esfera acadêmica, são
mais frequentemente traduzidos automaticamente.

Gráfico 02- Percentual dos gêneros textuais mais traduzidos


automaticamente por áreas.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 213

Gráfico 03- Percentual dos gêneros textuais mais traduzidos


automaticamente por áreas.
Procedimentos da coleta - Instrução formal sobre o uso da
TA

Após levar em conta o estudo realizado por Santos


(2012) para escolha do grupo e do gênero textual a ser
investigado, partiu-se para a instrução formal sobre a
retextualização com a TA. Os alunos-participantes do estudo
tiveram 60hs aula na disciplina de inglês instrumental sendo
um ¼ das aulas voltado para o estudo das características
macro e microestruturais do gênero textual acadêmico
“abstract”, outro ¼ das aulas foi dedicado à instrução formal
de retextualização em TA tomando como parâmetro os
estudos de Niño (2004; 2005; 2009).

A coleta de dados

Baseado em Niño (op. cit), foram realizados alguns


relatórios sobre o desempenho da tradução automática de
abstracts por alunos do curso de graduação em Música
divididos em dez grupos com quatro componentes cada.
Nos relatórios, os alunos-participantes observaram o
desempenho da TA, através da ferramenta gratuita online
Google Tradutor tendo em vista seu fácil acesso e alto índice
de usuários conforme dados cedidos pelo, na reconstrução

Sumário
214 | A retextualização da tradução automática...

de aspectos macro e microestruturais do texto fonte no par


linguístico inglês-português. Isto porque processo de leitura
da disciplina inglês instrumental, ofertada pela UAL (UFCG-
Campus I), aborda textos em inglês para sua compreensão
através da língua materna do aprendiz, ou seja, o português.
Como resultado, foram obtidos dez relatórios. A
discussão a seguir contempla os resultados apresentados
apenas por um relatório devido à extensão de cada um deles
para o presente capítulo.

Discussão dos dados

O relatório de desempenho do tradutor automático


realizado pelos alunos de música sobre o desempenho do
Google Tradutor apresenta duas partes, uma voltada para o
relato dos aspectos macroestruturais da TA do abstract, e
outro para os microestruturais, como é reforçado na
introdução do relatório pelos próprios alunos-partcipantes.

“(...) O objetivo desse relatório é analisar parâmetros macroes-


truturais e microestruturais, da tradução de um resumo do por-
tuguês para o inglês usando a ferramenta Google Tradutor (...)”

Primeiramente, tem-se o texto fonte apresentado pelo


grupo de alunos-participantes, seguido da TA do mesmo:

Resumo: Este trabalho apresenta uma análise do comercial


KOMPLETE 8 ULTIMATE da empresa Native Instruments.
Descreve-se o comercial baseado nas teorias de Durandi (1997),
Marcushi (2004) e Rebouças (2010). Nesse estudo, observou-se,
de forma crítica, a linguagem referente às características do
gênero textual bem como alguns aspectos do comercial: efeitos
visuais e sonoros. Concluí-se a importância dessa análise no
que diz respeito aos meios utilizados durante o processo da
repercussão publicitária.
Palavras-chave: Tecnologia musical, gênero textual e comercial.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 215

A TA do texto fonte anterior:

Abstract: This paper presents an analysis of the


commercial/advertisement KOMPLETE 8 ULTIMATE from
the Native Instruments company. It describes the commercial
based on the theories of Durandin (1997), Marcushi (2004) e
Rebouças (2010). In this study, we observed in a critical way
the language regarding to the characteristics of the genre as
well as some aspects of the commercial/advertisement: visual
and sound effects. We concluded the importance of this
analysis concerning to the means used during the publicity
replication process.
Keywords: Music technology, genre and commercial.

Referente aos aspectos macroestruturais do gênero


textual abstract, o referido grupo aborda as seguintes partes:
objetivo, temática, abordagem, resultados e conclusão, que foram
contemplados no processo de TA, a partir de um texto fonte,
resumo acadêmico, para um texto de chegada, um abstract
automaticamente traduzido, de modo que ao receber o input
desse gênero textual, a ferramenta analisa os seus padrões
macroestruturais: organização, padronização, marcas for-
mais do estilo, formatação, dentre outros.
Considerando o processo anterior, percebe-se que para
cada trecho traduzido automaticamente, é possível se
observar uma ligeira reflexão sobre o processo de tradução
através dos resultados apresentados pela TA por parte dos
alunos-participantes, dado que vem corroborar as pesquisas
de Niño (2009) quando relata que a pós-edição ou retex-
tualização em TA proporciona ao aluno-usuário um momen-
to de reflexão e aprendizagem sobre o funcionamento de
ambas as línguas envolvidas.
A princípio, esta noção pode ser identificada, até
mesmo no trecho inicial do relato apresentado, sobre a

Sumário
216 | A retextualização da tradução automática...

manutenção da ideia principal do texto fonte na TA do


abstract:

A partir dos dados fornecidos ao programa de tradução


automática (Google Tradutor), foi feita a tradução do português
para o inglês e não houve modificações no gênero textual,
mantendo sua idéia principal, como se ver a seguir.
Trecho 01 – Introdução do Relatório.

Quanto à reconstrução do objetivo e da temática do


texto fonte, eles são apenas vagamente explorados, de modo
que não se identifica no relato fortes indícios do caráter do
gênero textual do texto fonte e ou da TA:

a) This paper presents an analysis of commercial KOMPLETE 8


ULTIMATE company Native Instruments. It describes the
commercial based on the theories of Durandin (1997), Marcush
(2004) and Reboucas (2010).
Objetivo e temática claramente traduzidos, manteve a mesma
estrutura do texto em português.

Trecho 02 – Objetivo e temática.

Tal relato vem de encontro à noção da TA enquanto


produto inacabado, gerando um paradoxo no que diz
respeito ao próprio sistema da TA em sua atual conjuntura,
já que adaptando à Teoria da Interlíngua (SELINKER, 1969)
aos textos traduzidos automaticamente, obtêm-se resultados
caracteristicamente de natureza interlingual.
Esse não aprofundamento do relato da macroestrutura
da TA do texto fonte é também visto no relato sobre a
reconstrução das seguintes partes do abstract: resultados,
abordagem e conclusão, como se pode verificar nos trechos
abaixo:

Sumário
Pesquisas em Tradução | 217

b) In this study, is in a critical way, the language regarding the


characteristics of the genre as well as some aspects of business:
visual and sound effects.
Resultado e abordagem não sofreram nenhuma modifição
siguinificativa.

Trecho 03 – Abordagem e resultados.

c) We concluded the importance of this analysis with regard to


the means used during the publicity value.
Conclusão permaneceu com a mesma definição morfológico
macroestrutural.

Trecho 04 – Conclusão.

É importante lembrar que embora não tenha havido


ênfase no relato da macroestrutura da TA do referido
abstract, é visível que o tradutor automático não a negli-
genciou dado esse também enfatizado no relato dos alunos-
participantes em todos os trechos citados anteriormente, de
modo que se pode concluir que na reconstrução macroes-
trutural do texto fonte, o tradutor automático gera um texto
alvo, que embora apresente incoerências em sua microes-
trutura, reconhece e reconstrói sua macroestrutura, de modo
binário, contradizendo à Teoria de Pym (1992):

Sumário
218 | A retextualização da tradução automática...

Reconstrução da Macroestrutura do Texto fonte

Macroestrutura TA da Macroestrutura
do Texto fontedo Texto fonte

Resumo: Este trabalho Abstract: This paper presents


apresenta uma análise do an analysis of the
comercial KOMPLETE 8 commercial/advertisement
ULTIMATE da empresa KOMPLETE 8 ULTIMATE
Native Instruments. from the Native Instruments
Descreve-se o comercial company. It describes the
baseado nas teorias de commercial based on the
Durandi (1997), Marcushi theories of Durandin (1997),
(2004) e Rebouças (2010). Marcushi (2004) e Rebouças
Nesse estudo, observou-se, (2010). In this study, we
de forma crítica, a linguagem observed in a critical way the
referente às características do language regarding to the
gênero textual bem como
characteristics of the genre as
alguns aspectos do
well as some aspects of the
comercial: efeitos visuais e
commercial/ advertisement:
sonoros. Concluí-se a
visual and sound effects. We
importância dessa análise no
concluded the importance of
que diz respeito aos meios
utilizados durante o this analysis concerning to
processo da repercussão the means used during the
publicitária. publicity replication process.
Palavras-chave: Tecnologia Keywords: Music technology,
musical, gênero textual e genre and commercial.
comercial.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 219

Neste sentido, é plausível afirmar que na reconstrução


da macroestrutura do abstract em questão, a TA apresenta
um comportamento de caráter binário. Sendo assim, para
cada dado macroestrutural do texto fonte, a TA disponibiliza
um equivalente, rejeitando a noção de traduções alternativas,
como na figura abaixo:

Macroestrutura
da TA do Macroestrutu
resumo ra da TA do
acadêmico resumo
acadêmico

Figura 05- Rejeição das traduções alternativas da TA

Concernente aos aspectos microestruturais, os usuários


são mais minuciosos, apontando incoerências de cunho
morfológico, sintático, semântico e pragmático. Contudo, apesar
de os alunos–participantes terem relatado questões de
ordem sintática e pragmática, o fizeram “inconsciente-
mente”, uma vez que mencionam apenas o morfológico e o
semântico. Constatação essa que pode ser encontrada nos
relatos a seguir.
No relato inicial dos aspectos microestruturais da TA
do abstract, percebe-se a visão que o grupo tem dos resulta-
dos da ferramenta. A noção de problema atribuída à ativi-
dade de retextualização retrata a TA como uma ferramenta
de natureza mecânica e de cunho tradicional, podendo ser
rotulada enquanto mera tarefa de correção de erros, nem
sequer uma análise contrastiva de ambos os idiomas

Sumário
220 | A retextualização da tradução automática...

envolvidos. Essa descrição pode ser encontrada logo a


seguir:

Ao analisarmos os parâmetros microestruturais, observamos


alguns problemas:
1. Problema morfológico, o artigo (the), não foi utilizado na
tradução instantânea, porém, ao clicar na palavra, observamos
que a ferramenta mostra a opção correta com o artigo incluído,
como mostra a figura 1.

Figura 1
Trecho 05- Questão de ordem morfológica

Esta proposta difere consideravelmente da tarefa de


retextualização, que por sua vez, visa muito além de apenas
corrigir a interlíngua da TA, mas, sobretudo gerar uma
reflexão com relação ao funcionamento de ambas as línguas
envolvidas e dos mecanismos que a ferramenta de TA
dispõe para reconstruir o texto fonte em questão, como se
marca no trecho 06, apesar da troca entre natureza semântica
e sintática:

Trecho 06- Questão de ordem sintática.


2. Na figura 2, o contexto apresenta um problema semântico, a
palavra (observou-se) simplesmente é excluída do contexto, pois
esse tipo de flexão verbal não existe na língua inglesa, o
tradutor apenas mostra a palavra (study) uma melhor
contextualização empregada seria: (It was observed).

Figura 2

Sumário
Pesquisas em Tradução | 221

É notável que a ideia de retextualização enquanto


resolução de problemas persista ao longo do relato dos
alunos-participantes. O trecho 07 a seguir traz exemplos
evidentes desta questão.

3. Na figura 3, o contexto apresenta um problema morfológico,


na tradução instantânea o tradutor não inclui a preposição (to),
porém, o mesmo nos dar a opção correta ao clicarmos na palavra.

Figura 3
Trecho 07- Retextualização enquanto resolução de problemas.

Ao relatarem as escolhas do tradutor automático no


trecho 08, os parte dos alunos-participantes, cerca de 45%,
evidenciam o caráter de correção de um texto pré-traduzido,
conforme acredita Allen (2003), bem como refletem
maturidade diante das escolhas propostas, tendo em vista o
repertório linguístico que a ferramenta de TA disponibiliza
para seu usuário dado o gênero textual em questão. Dados
esse que poder comprovado no trecho a seguir da referida
TA do abstract em questão:

Sumário
222 | A retextualização da tradução automática...

4. Na figura 4, apresenta um erro não de natureza semân-


tica, e sim uma situação denominada, expansão de memória,
com a palavra composta, (gênero textual), na tradução a palavra
(textual) é omitida, pois, a palavra do inglês (genre), refere-se
somente a (gênero textual), ao clicar na palavra a ferramenta nos
apresenta novas opções, incluindo a menos usual (textual
genre).

Figura 4

Trecho 08- Repertório da ferramenta de TA.

Não obstante às particularidades de cada idioma no


trecho anterior, o aspecto pragmático das línguas envolvidas
não é substancialmente explorado, de modo que a ênfase do
relato está na escolha lexical e não no porquê e/ou no
“como” essa escolha ocorrera.
Alguns aspectos morfológicos, do idioma do texto de
chegada, são mais explorados em detrimento da própria
sintaxe do texto automaticamente traduzido, como se
verifica no trecho 09 abaixo:
Trecho 09- Aspectos morfológicos em detrimento dos sintáticos.
5. Na figura 5 mais um erro morfológico de mesma natureza da
figura 2.

Figura 5

Sumário
Pesquisas em Tradução | 223

6. Na figura 6, outro problema semântico surge, ao traduzir a


palavra (comercial), a ferramenta traduz a palavra para (business),
que quer dizer negócios, mas, apresenta a opção correta
(commercial) ao buscarmos nas opções do programa.
7.

Figura 6

Trecho 10- Aspectos semânticos equivalentes na microestrutura


fornecida pela TA.

Enfim, nos dois últimos trechos dos relatos da


microestrutura da TA fornecida pela ferramenta em questão,
pode-se verificar a concepção de equivalência e não-
equivalência como postula Baker (2011)3 na reconstrução de
elementos microestruturais através da semântica de ambos
os textos, por parte dos alunos-participantes:
Retomando o trecho anterior, é possível hipotetizar
que caso os alunos-participantes não tivessem conhecimento
de alguns aspectos pragmáticos da língua-alvo do texto de
chegada, referente aos termos “business” e “commercial”,
poderiam não atribuir as traduções alternativas fornecidas
pela TA o teor de equivalência para o qual foram desen-
volvidas. Contudo, ainda continuem chamando de erro ou

3 Neste contexto equivalências remetem ao fluxo de informação do


texto fonte no texto de chegada, não apenas no plano dos
significados, mas como também dos sentidos.

Sumário
224 | A retextualização da tradução automática...

problema os primeiros resultados disponibilizados pela


ferramenta.
Semelhantemente, no último trecho do relatório, os
alunos-participantes se deparam com um caso de não-equi-
valência, de modo que nem o resultado parcial fornecido
pela ferramenta de TA tampouco as traduções alternativas
reconstroem o sentido esperado.

8. O sentido da expressão (processo da repercussão publicitária),


foi alterado na tradução por (publicity value) que quer dizer,
(valor da publicidade), apresentando então, mais um erro
semântico, como mostra a figura 7.

Figura 7

Trecho 10- Aspectos semânticos não-equivalentes na micro-


estrutura fornecida pela TA.

Por conseguinte, observando a conclusão do relatório


de desempenho da ferramenta de tradução automática,
percebe-se em primeira instância que os resultados ana-
lisados revelam que a realização dessa atividade, no contexto
de ensino de inglês instrumental, pode permitir ao aluno-
usuário da TA a escolha de uma opção, dentre um leque de
opções, oferecida pela ferramenta Google Tradutor.
Isto ocorre não apenas acerca dos diversos aspectos de
natureza linguística que possam convergir ou divergir entre
o par linguístico envolvido, mas como também pode
proporcionar à compreensão da relação homem-máquina
através da variada gama de dispositivos eletrônicos e suas
ferramentas de trabalho a serviço da comunicação, cons-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 225

truindo uma base sólida de cunho interativo entre o aluno-


usuário da TA e o par-linguístico que se deseja traduzir.

CONCLUSÃO
Após o relato de desempenho do programa na tradução do então
abstract, concluí-se que houve alterações ao longo do texto nos
níveis: semântico e morfológico surgiram também, casos de
expansão de memória como foi apresentado em alguns dos
exemplos. Ao verificarmos usando os artifícios do programa, em
que ele nos fornece outras opções de tradução, na maioria das
vezes as opções fornecia trechos apropriados. Em fim,
apresentamos o resumo e o abstract remodelados.

Trecho 11- Conclusão do relatório de TA apresentado pelos alunos-


participantes.

Consequentemente, pode-se haver maior entendi-


mento acerca das potencialidades da TA bem como maior
tolerância no que concerne seus resultados de acordo com
suas limitações, na abrangência de seu escopo, e do seu
papel fundamental enquanto ferramenta de apoio ao
usuário.

Considerações finais

Este capítulo buscou analisar o relato de alunos de


inglês instrumental sobre o desempenho do Google Tradutor
na tradução automática de abstracts e consequentemente
discutir até que ponto atividades de retextualização
realizadas com TA podem trazer benefícios para o ensino-
aprendizagem de língua inglesa instrumental.

Sumário
226 | A retextualização da tradução automática...

Ao longo dessa discussão, constatou-se que a TA passa


a ser reconhecida enquanto ferramenta de acesso à infor-
mação, contribuindo, assim, para possível armazenamento
de conhecimento, uma vez que através dela muita infor-
mação de trechos de textos ou até textos completos são
disponibilizados ao aluno-usuário.
Também, verificou-se que o uso das ferramentas de
TA, no contexto de sala de aula de inglês instrumental, acaba
fomentando o valor da tradução em detrimento do
conhecimento de uma língua estrangeira, evidenciando que
saber uma língua estrangeira não significa necessariamente
saber traduzir, embora a recíproca seja verdadeira.
No que se refere ao relatório de desempenho da
ferramenta de TA de abstracts, constatou-se uma tendência
de cunho superficial com relação ao relato dos aspectos de
cunho macroestruturais, não sendo enfatizados os passos
tomados pela ferramenta na reconstrução da reorganização
do abstract enquanto gênero textual. Contudo, também
houve reflexão acerca das marcas formais do referido gênero
no par linguístico envolvido.
Quanto ao relato dos aspectos microestruturais, apesar
da omissão de aspectos caracteristicamente pragmáticos ou
troca entre sintaxe e semântica, observou-se maior cuidado
dos alunos-participantes na busca pela compreensão da TA
do abstract e do texto fonte em língua materna. Não obstante
à tentativa de compreender o funcionamento do mecanismo
de escolhas da ferramenta de TA, o relatório apresenta
clareza no que diz respeito ao relato da reconstrução da
microestrutura, evidenciando o envolvimento dos alunos-
participantes envolvidos nesta tarefa.
Portanto, percebe-se que o caminho trilhado até então
na utilização de uma ferramenta de TA , gratuita e
disponível online, como é o caso do Google Tradutor, cada
vez mais permite aguçar a criatividade de qualquer
educador de línguas na busca pela melhoria de sua prática

Sumário
Pesquisas em Tradução | 227

de ensino inserida numa concepção multimodal mediante o


desenfreado e constante avanço tecnológico.

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Sumário
228 | A retextualização da tradução automática...

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Sumário
Pesquisas em Tradução | 229

Sinara de Oliveira BRANCO


Universidade Federal de Campina Grande

Introdução

O objetivo deste capítulo é de apresentar atividades de


ensino de língua inglesa utilizando estratégias e categorias
de tradução implementadas no projeto de pesquisa desen-
volvido no Programa de Pós-Graduação em Linguagem e
Ensino da Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG). O projeto Estratégias de Tradução e sua Relação
com o Ensino de Língua Estrangeira teve início no ano de
2009 e será concluído no ano de 2014. Os resultados
demonstram como a área de Estudos da Tradução tem
dialogado com o Ensino de Línguas Estrangeiras no Brasil,
desde a primeira década do século XXI, e como o
desenvolvimento de pesquisas na área interdisciplinar de
tradução e ensino vem ocorrendo, segundo pesquisadores e
teorias específicas. O projeto tem como foco o discurso oral e
escrito, bem como um estudo utilizando imagens, eluci-

1 Agradeço ao POSLE-UFCG pelo apoio recebido para o desen-


volvimento desta pesquisa, bem como aos alunos da graduação e
da pós-graduação, que me auxiliaram ora na coleta ora na
aplicação e discussão das atividades, concordando com gravações
de aulas e com o uso de dados coletados das aulas em publicações
aqui citadas. Agradeço também o apoio do Grupo de Pesquisa
cadastrado no CNPq Tradução: Teoria, Prática e Formação do
Professor.

Sumário
230 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

dando a tradução intersemiótica. O objetivo inicial do


projeto foi identificar quais Estratégias de Tradução, de
acordo com Chesterman (1997), são utilizadas pelos
estudantes de nível intermediário de língua inglesa do Curso
de Letras-Inglês da UFCG, em atividades orais e escritas,
levando em consideração a Abordagem Funcionalista da
Tradução de Nord (1997). Com o avanço da pesquisa, o
objetivo inicial foi ampliado, a partir da visão sobre as
Categorias de Tradução (JAKOBSON, 2000) e sobre a
Semiótica (PEIRCE, 1839-1914), e decidiu-se observar,
também, de que forma as Categorias de Tradução são apli-
cadas no ensino de língua inglesa como língua estrangeira
por alunos e professores. Para discussão dos resultados,
serão apresentados modelos de atividades de tradução
desenvolvidas com os estudantes da graduação que, além de
terem cursado disciplinas de Língua Inglesa, também
cursaram a disciplina Teoria e Prática de Tradução e Língua
Inglesa. Espera-se que os modelos de atividades sejam úteis
para ilustrar como a tradução pode auxiliar os estudantes
não apenas em questões tradutórias, mas também para fazer
associações entre teoria e prática de questões linguísticas e
literárias, além de reforçar a necessidade de uma formação
de professores que inclua aspectos que envolvam teorias da
Tradução.
Ainda são escassas as pesquisas envolvendo os
Estudos da Tradução e o Ensino de Línguas Estrangeiras.
Segundo Carreres (2006)2, a rejeição ao Método Gramática e
Tradução, que foi acompanhada pela chegada do Método
Áudio-lingual e do Método Comunicativo, ofereceu opor-
tunidade para que se examinasse com mais cuidado o
potencial e as limitações do uso da tradução no ensino de
línguas estrangeiras. Segundo a autora, após a década de

2 Disponível em <www.cttic.org/ACTI/2006/papers/
Carreres.pdf>, acesso em 05 de setembro de 2008.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 231

1990, importantes trabalhos têm sido desenvolvidos,


especificamente na área de Ensino da Tradução. Entretanto,
é necessário que haja mais pesquisa que envolva a prática e a
aplicação da tradução ao ensino de línguas estrangeiras. Tal
necessidade pode ser comprovada ao se observar estudantes
de cursos de Licenciatura em Letras-Inglês no Brasil. Esses
professores em formação compartilham a mesma língua
materna (LM) e, portanto, tendem a recorrer a traduções ou
adaptações da língua portuguesa ao produzirem discursos
orais e/ou escritos em língua estrangeira sem que tal fato
seja questionado ou discutido em sala de aula, o que gera a
conclusão de que a tradução continua, de fato, negligenciada
da formação de professores em cursos de Letras. Seguindo
esse raciocínio, reforça-se a importância de um estudo mais
aprofundado de como o uso da tradução pode ser utilizado
de maneira eficaz em sala de aula, contribuindo para um uso
mais eficiente da língua materna no ensino de línguas
estrangeiras.
Pensando especificamente nos Estudos da Tradução,
Holmes (1988, p. 111, tradução minha) afirma que a tradução
representa um modelo crítico e conclusivo do que acontece
na interface entre os estudos linguísticos, literários e
culturais. Assim sendo, segundo o autor, é natural que disci-
plinas divergentes, como Linguística, Literatura, Estudos
Culturais, Semiótica, Teoria da Comunicação, Filosofia,
Psicologia e outras, levem em consideração os Estudos da
Tradução (ET). O comentário de Holmes deixa clara a
natureza interdisciplinar dos ET e demonstra que as mais
diferentes correntes teóricas podem contribuir para o
desenvolvimento do fenômeno tradutório, assim como o
fenômeno tradutório também pode contribuir para o
desenvolvimento de diferentes correntes teóricas, como é o
caso do Ensino de Línguas Estrangeiras relacionado à
tradução. Os ET não podem ser considerados um estudo
isolado e independente de outras disciplinas. Para que a

Sumário
232 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

tradução aconteça, de forma prática e teórica, ela se nutre do


que acontece no mundo científico como um todo.
Na pesquisa em relato, o interesse é, primordialmente,
investigar produções orais e escritas em sala de aula que
demonstrem ter influência da tradução, devido à pouca
familiaridade com a língua estrangeira e, consequentemente,
fazendo com que se recorra à língua materna. Para tanto, os
autores que servem de base são Nord (1991 e 1997), com a
Abordagem Funcionalista; Chesterman (1997) e sua sugestão
de Estratégias de Tradução; Bassnett e Lefèvere (1990) e os
Estudos Culturais relacionados à Tradução; Venuti (2000),
apresentando questões relacionadas ao poder entre línguas
no contexto atual; Jakobson e as Categorias de Tradução
(1959, publicado em VENUTI, 2000); Baker (1995 e 1998),
com seus Estudos de Corpora e outros que foram sendo
incluídos à medida que o estudo se desenvolvia, como
Santaella (2005), citando Pierce (1839-1914) e os estudos
semióticos, e Oustinoff (2011), com a descrição histórico-
metodológica dos ET.
A tradução pode ser definida como uma operação de
transmissão de mensagem de um sistema linguístico para
outro. Ela foi utilizada como ferramenta principal para
atingir o objetivo de aprender Latim para leitura. Esta foi a
origem do Método de Ensino Gramática e Tradução, que, de
acordo com Leffa (1988), funcionava da seguinte maneira: i)
o professor dava explicações utilizando a língua materna dos
alunos; ii) os aprendizes memorizavam uma lista de palavras
em Latim; iii) os aprendizes aprendiam regras linguísticas
para relacionar as palavras memorizadas em frases; e iv) os
aprendizes faziam exercícios de tradução. O principal
objetivo do método era capacitar os aprendizes a lerem
textos literários e religiosos, e o método atendia a esse
objetivo. No século XIX, o Método Gramática e Tradução foi
deixado de lado, pois outras línguas entraram em cena e a
comunicação falada tornou-se o ponto mais importante para

Sumário
Pesquisas em Tradução | 233

o aprendizado de línguas estrangeiras. Atualmente, a


tradução está retornando, com novos conceitos e uma
definição e propósito bem diferentes daquele utilizado para
o aprendizado do Latim. O sutil retorno da tradução à sala
de aula de LE faz com que seja repensada como ela pode ser
utilizada de maneira positiva no contexto de ensino de
línguas estrangeiras.
No Século XXI, pode-se afirmar que a tradução é vista
como uma atividade comunicativa, utilizada em vários
contextos e situações, em linguagem verbal e não verbal. De
acordo com Lucindo (1997), o uso da tradução em sala de
aula torna os alunos mais ativos e eles passam a participar
mais das atividades em sala de aula. Essa afirmação pode ser
comprovada através das atividades desenvolvidas e
aplicadas em sala de aula durante a vigência deste projeto.
Hurtado Albir (1998), por sua vez, acredita que o uso da
tradução em sala de aula possui dois aspectos: i) tradução
interiorizada – feita por todo aprendiz de língua estrangeira;
ii) tradução pedagógica – utilizada em sala de aula como
ferramenta pedagógica para reforçar e verificar a apren-
dizagem utilizando textos, análise contrastiva e reflexão. A
tradução também pode ser utilizada como atividade para
explicação de conteúdo específico ou como exercícios
variados trabalhando as quatro habilidades (leitura, escrita,
escuta e fala). Entretanto, seu uso através de estratégias de
tradução literal ou da categoria de tradução interlingual
deve ser controlado e restrito a determinadas situações. A
tradução deve ser usada em contextos específicos e não para
traduzir palavras ou frases isoladas. Como exercício e em
contexto verbal, a tradução está dividida em três fases:
compreensão; entendimento da idéia exposta de forma oral
ou escrita e, então, ‘esquecimento’ das palavras, desver-
balizando o texto, tendo em mente o significado. Finalmente,
deve-se encontrar a melhor forma de reexpressar tal discurso
na língua-alvo, mantendo a mensagem do texto original o

Sumário
234 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

mais próximo possível do texto-alvo. Tais atividades devem


ainda envolver aspectos linguísticos e não linguísticos para
que os alunos percebam a necessidade de mudar e adequar a
linguagem a cada (con)texto e situação. A intenção é de
desenvolver o léxico, a visão crítica de língua e aspectos
culturais das línguas envolvidas de forma dinâmica.
Seguindo as idéias acima, Costa (1988) afirma que, ao
usar a tradução em sala de aula, o professor deve levar em
consideração alguns pontos: i) a orientação da tradução; ii) a
tradução oral e escrita e iii) a sua utilização como proce-
dimento de aprendizado e/ou avaliação. O autor afirma
ainda que o ensino de línguas pode ganhar uma perspectiva
cultural, ajudando a identificar dificuldades de aprendi-
zagem relacionadas a aspectos culturais das línguas.
Com relação a aspectos cognitivos, Rodrigues (1997)
afirma que analisar o processo tradutório oferece a
possibilidade de se criar um novo caminho para o ensino da
tradução e também para o ensino de línguas, uma vez que a
tradução está ligada a outras disciplinas e áreas, como o
Ensino de Línguas Estrangeiras, Cognição, Psicolinguística,
Análise do Discurso e outras. Nord (1988), por sua vez,
propõe que o ensino da tradução deva ser dirigido à análise
textual. A autora sugere ainda que há a possibilidade de usar
a prática da tradução em aulas de tradução utilizando estra-
tégias de tradução, pois elas auxiliam o processo tradutório,
e essa ideia foi seguida durante o desenvolvimento deste
projeto de pesquisa, com foco não ao ensino de tradução,
mas de LE.
Em si tratando do uso de tradução na perspectiva do
professor, Holden e Rogers (2001) afirmam que nem sempre
o professor não nativo está seguro a respeito do uso de
algumas estruturas e usos específicos de língua, devido ao
fato de não ter conhecimento suficiente sobre o contexto
cultural de algumas destas estruturas ou de textos escritos
em inglês, também tendo dificuldade com relação à

Sumário
Pesquisas em Tradução | 235

pronúncia de palavras desconhecidas. Em alguns casos, o


pouco conhecimento da própria língua materna gera
dificuldades para a comunicação em língua estrangeira. Para
sanar essas dificuldades, um estudo comparativo das duas
línguas utilizando corpora específicos, por exemplo, pode
contribuir para um maior conhecimento sintático, semântico
e pragmático das estruturas identificadas, facilitando uma
comunicação – oral e escrita – mais segura por parte de
professores e alunos. Medgyes (1994) complementa essa
ideia afirmando que, ao ensinar língua inglesa como falantes
não nativos do inglês, deve-se desenvolver três componentes
específicos: a) proficiência na língua; b) compreensão
cultural e da língua em si; e c) habilidade pedagógica. Por-
tanto, a investigação sobre tradução no sentido de desen-
volver um estudo comparativo das duas línguas contribui
para tal proficiência, compreensão e habilidade pedagógica.

Concepção do Termo ‘Tradução’

Baker (1998, p. 273) apresenta uma definição para o


termo ‘Translatability’ [Traduzibilidade] na enciclopédia
Routledge Encyclopedia of Translation Studies, explicando que o
termo é compreendido como a capacidade que alguns tipos
de significados têm de serem transferidos de uma língua
para outra sem que haja mudanças radicais. Esta parece ser
uma definição mais linguística e ‘tradicional’, baseada na
transferência de significado e estrutura de uma língua para
outra. Bell (1991, pp. 05, 06 e 13), por sua vez, afirma que
tradução é a expressão em outra língua (ou língua-alvo) de
algo que foi expresso na língua de origem, preservando a
equivalência semântica e estilística. Essa também é uma
visão mais tradicional, semelhante à de Baker, que parece
favorecer o texto original.

Sumário
236 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Holz-Mänttäri (1984, p. 17), citada por Nord (1997),


assume uma abordagem funcionalista para a Tradução e
afirma que evita utilizar o termo tradução, pois pretende
evitar conceitos tradicionais e expectativas ligadas ao termo.
Para Holz-Mänttäri, tradução é a cooperação intercultural – é
o processo de produção de certo tipo de transmissor de men-
sagem, coordenando a cooperação de ação e comunicação.
Para Holz-Mänttäri, tradução é mais que um termo a ser
definido. É, de fato, um processo utilizado para atingir certos
propósitos – a visão da autora é, portanto, mais pragmática.
Seguindo com uma linha mais funcionalista, antes de definir
o termo, Nord (ibid.) também cita Vermeer ([1978] 1983b, 49),
que inclui a interpretação na definição por ele oferecida,
afirmando que tradução é um tipo de transferência na qual
signos comunicativos verbais e não verbais são transferidos
de uma língua para outra, sendo um tipo de ação humana.
Esta definição parece ser mais apropriada ao contexto de
investigação apresentado aqui, pois lida com um contexto de
comunicação verbal, com usos de linguagem não verbal que
influencia a fala.
Finalmente, Nord (ibid., p. 28) apresenta a sua
contribuição e define tradução como sendo a produção de
um texto-alvo funcional, mantendo relação com um dado
texto original (neste caso, a tradução imediata de uma
estrutura de língua portuguesa para língua inglesa) que é
especificado de acordo com a função pretendida do texto
alvo (escopo da tradução). Nord acrescenta a idéia de que a
tradução promove um ato comunicativo que não seria
possível de acontecer devido a barreiras culturais e
linguísticas. Este é, precisamente, o trabalho de traduzir –
comunicação não apenas de palavras, mas, principalmente,
de idéias direcionadas a um contexto específico.
Ao falar sobre as Estratégias de Tradução, Chesterman
(2000) argumenta que a tradução pode ter duas funções,
dependendo do propósito do trabalho de tradução: transferir

Sumário
Pesquisas em Tradução | 237

e/ou preservar o significado. Tal idéia está relacionada à


colocação de Nord acima, oferecendo um olhar funcionalista
à tradução. Klein-Braley e Franklin (1998, p. 55-56), por sua
vez, definem o termo como “transferência de conteúdo de
uma cultura para outra”, sendo a definição que mais parece
se adequar ao contexto da pesquisa e, portanto, sendo a
definição aqui adotada, sem descartar as considerações dos
demais autores totalmente, pois apresentam detalhes
relevantes e que se complementam com relação à definição
de tradução.

Estudos da Tradução: Estratégias de Tradução de


Chesterman (1997) e Categorias de Tradução de Jakobson
(1959/2000)

Na área de Estudos da Tradução, Chesterman3 (1997)


afirma que significados não são mais vistos seguindo uma
visão tradicional e convencional, como sendo algo objetivo,
estável, fora de um contexto específico. Os significados em
contexto de tradução são, na verdade, mutáveis, apresentam
deslizes, nunca sendo originais; mas sempre relativos. Esta
afirmação ilumina a visão da tradução que se pretende
lançar aqui – uma visão funcional, descritiva, que vai além
da estrutura, significado e propósito imediatos do texto
original, sem foco em estruturas linguísticas específicas e
com foco na tradução produzida em sala de aula pelos
alunos de língua inglesa.
Chesterman (ibid.) aponta duas classes de estratégias
como sendo principais: ‘estratégias de redução’, que mudam
ou reduzem a mensagem de alguma forma, e ‘estratégias de
realização’, que buscam preservar a mensagem mudando o

3 Idéia original de Chesterman (1997, p. 29): “Meanings are no longer


seen as primarily conventional, objective, stable, existing ‘out there’;
rather, they are ever-shifting, ever-slippery, never original, always
relative.”

Sumário
238 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

meio, tal como o uso de paráfrase, aproximação, reestru-


turação, etc. O autor parece favorecer um tipo de tradução
que oferece maior liberdade para o tradutor produzir seu
trabalho, reduzindo informações ou utilizando outra
estratégia (parafraseando, reestruturando, etc.) para chegar a
um texto-alvo que comunique a mensagem de maneira
satisfatória. Chesterman (ibid., p. 92) apresenta uma taxo-
nomia de estratégias de tradução que está dividida em três
grupos:

Estratégias Estratégias Estratégias


Sintáticas Semânticas Pragmáticas
G1: Tradução S1: Sinonímia Pr1: Filtro Cultural
Literal
G2: Calque, S2: Antonímia Pr2: Mudança de
Empréstimo Explicitação
G3: Transposição S3: Hiponímia Pr3: Mudança de
Informação
G4: Deslocamento S4: Conversão Pr4: Mudança
de Unidade Interpessoal
G5: Mudança S5: Mudança de Pr5: Mudança de
Estrutural de Abstração Elocução
Frase
G6: Mudança S6: Mudança de Pr6: Mudança de
Estrutural de Distribuição Coerência
Oração
G7: Mudança S7: Mudança de Pr7: Tradução Parcial
Estrutural de Ênfase
Período
G8: Mudança de S8: Paráfrase Pr8: Mudança de
Coesão Visibilidade
G9: Deslocamento S9: Mudança de Pr9: Reedição
de Nível tropos
G10: Mudança de S10: Outras Pr10: Outras
Esquema mudanças mudanças pragmáticas
semânticas
Tabela 1. Estratégias de Tradução de Chesterman (1997).

Sumário
Pesquisas em Tradução | 239

Em outro artigo, acrescentei que Chesterman utiliza


uma ordem crescente de estratégias, sendo as primeiras
relacionadas às menores representações linguísticas, como a
palavra, por exemplo, e as maiores, sendo mais generalistas,
buscando englobar ideias gerais. Como Chesterman utiliza a
divisão de sua taxonomia em estratégias sintáticas, semân-
ticas e pragmáticas, o autor utiliza as abreviações ‘G’ para as
estratégias sintáticas, que estão mais próximas do nível
estrutural das línguas (gramática); ‘S’ para as estratégias
Semânticas; e ‘Pr’ para as estratégias Pragmáticas (BRANCO,
2010).
Seguindo as ideias apresentadas, é proposta aqui a
utilização de atividades que apliquem estes conceitos, junta-
mente com as Categorias de Tradução de Jakobson (1959/
2000, p. 114), a saber:
1. Intralingual: interpretação de signos verbais através
de outros signos da mesma língua.
2. Interlingual: interpretação de signos verbais através
de outra língua.
3. Intersemiótica: tradução ou ‘transmutação’ –
interpretação de signos verbais através de sistemas
de signos não verbais (In: VENUTI, 2000, p. 114).

Jakobson apresenta uma proposta de categorias de


tradução que vão além da tradução de textos verbais de uma
língua para outra, sugerindo a prática de tradução dentro da
mesma língua, com uso de paráfrase, por exemplo. A
utilização de figuras e expressões faciais são possibilidades
de tradução intersemiótica. Já a tradução entre línguas pode
ocorrer em situações e atividades específicas, sem causar
prejuízo ao desenvolvimento da aula ou à assimilação da
língua estrangeira por parte do estudante, desde que bem
preparada e com objetivos definidos, tanto para o professor
quanto para os aprendizes.

Sumário
240 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Durante as aulas de Língua Inglesa em nível interme-


diário, foi observado que a estratégia literal é utilizada com
frequência em linguagem oral, produzindo discursos não
comuns em língua inglesa, como por exemplo:
a) “My brother lives in a house very large.”
b) “Top models are weaks.”
c) “Second Bakhtin, language…” 4

Mesmo em fase já considerada com conhecimento


linguístico a respeito de ordem estrutural de adjetivos e uso
da forma plural, ao se comunicarem oralmente e também em
forma escrita, os estudantes tendem a manter a forma
estrutural da língua materna e usar traduções literais em
nível estrutural, utilizando a categoria de tradução interlin-
gual de forma equivocada. O mesmo ocorre ao utilizar ex-
pressões ou outras formas gramaticais, como foi a tentativa
da estudante ao mencionar Bakhtin utilizando ‘second’ ao
invés de ‘according to’ (de acordo com, segundo), por
exemplo.
Apesar de esses erros acontecerem com certa fre-
quência, é importante alertar que, mesmo tendo consciência
das limitações linguísticas, ao terem conhecimento a respeito
das categorias de tradução e das estratégias de tradução, os
estudantes geralmente demonstram, de fato, maior moti-
vação para utilizar a língua inglesa, recorrendo ao apoio da
língua materna em tradução interlingual em último caso, o
que considero positivo no desenvolvimento linguístico e na
construção de um falante de LE mais autônomo e consciente.

Estudos da Tradução: A Abordagem Funcionalista de Nord


(1997)

A Abordagem Funcionalista de Nord (1997) defende


que, ao traduzir, é importante levar em consideração o leitor

4 Exemplos extraídos de Branco (2009).

Sumário
Pesquisas em Tradução | 241

do texto traduzido e o contexto como pontos principais para


uma tradução ser realizada. O texto original deve servir
como ajuda para o desenvolvimento do produto tradutório,
embora o texto traduzido não deva necessariamente refletir a
‘imagem idêntica’ do texto original. Esta posição indica que
o tradutor tem uma idéia clara de qual é o propósito de seu
trabalho e segue uma forma de guia que o ajuda a se manter
no caminho almejado para a realização de um trabalho que
atinja as expectativas esperadas. O guia seguido pelo
tradutor pode ser uma série de estratégias de tradução, por
exemplo. Seguindo esta idéia, as estratégias de Chesterman
(1997) apresentadas anteriormente parecem estar em
harmonia com os pontos apresentados sobre a Abordagem
Funcionalista de Nord. Os dois teóricos percebem a impor-
tância de oferecer um texto-alvo que siga uma orientação
voltada ao leitor de tal texto, sem ignorar o texto original. As
teorias de Nord e Chesterman foram, portanto, utilizadas
para direcionar o trabalho voltado ao ensino de LE, objeti-
vando a utilização de estratégias e categorias de tradução
mais adequadas ao contexto de sala de aula.
De acordo com Nord (1991, p. 28), não pode haver um
processo de ‘tradução’ sem um texto original. Deve haver
certa relação entre o texto original e o texto-alvo. Entretanto,
a qualidade e quantidade dessa relação são especificadas
pelo escopo (função) da tradução. O escopo da tradução
oferecerá os critérios para a decisão sobre que elementos do
texto original podem ser ‘preservados’ e quais podem ou
devem ser adaptados ao texto-alvo. Como pode ser
observado, apesar da Abordagem Funcionalista marcar a
importância do texto-alvo, ela não negligencia a importância
do texto original e destaca a importância do texto original
para a produção de um texto-alvo aceito pelo público alvo.
Neste sentido, Nord (ibid., p. 72) destaca que na cultura
ocidental são esperados dois pontos específicos de um texto
alvo: funcionalidade e também lealdade ao remetente do

Sumário
242 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

texto original e sua intenção. Nord explica que ser ‘leal’,


segundo o Funcionalismo, diz respeito à intenção do autor
do texto original, e não à estrutura do texto em si. Cada texto
deve ter uma função específica, mas o tradutor deve ser leal
à intenção do autor, adaptando a estrutura do texto-alvo a
uma função (escopo) diferente, se for o caso. Para ter uma
idéia clara sobre o que o texto original trata e qual a intenção
do autor, o tradutor tem que analisar o texto original
cuidadosamente. O tradutor profissional lê cada novo texto
original usando sua experiência de leitor crítico além de
tradutor. Esta experiência forma um modelo no qual o
tradutor integra os resultados de cada novo texto original. O
conhecimento a respeito da cultura estrangeira deve torná-lo
apto para reconstruir as reações possíveis de um leitor do
texto original (no caso do texto alvo – escrito ou falado –
necessitar de uma ‘imitação’ das funções do texto original),
considerando que o seu conhecimento da cultura brasileira o
ajude a antecipar as reações possíveis do leitor do texto
brasileiro e, assim, verificar a adequação funcional da
tradução produzida (NORD, 1991, p. 11). Nesse caso, de
acordo com Nord, para o texto alvo alcançar seus propósitos
específicos, é necessário que o tradutor preencha os
seguintes requisitos: (i) O tradutor deve ter conhecimento
suficiente tanto da língua e cultura original quanto da língua
e cultura-alvo; (ii) O tradutor deve saber lidar com ambas as
línguas para analisar o texto original, produzir um texto-alvo
e fazer pesquisa para realizar seu trabalho.
Se o tradutor preencher os requisitos acima, significa
dizer que o mesmo tem consciência de que ele não é o
remetente da mensagem do texto original, mas um produtor
textual na cultura-alvo (NORD, ibid., p. 11), usando um texto
produzido anteriormente em outro contexto e cultura para
comunicar as idéias a uma audiência específica. Portanto, ao
falar em competência tradutória, o processo de tradução está
longe de ser considerado ‘simples’ e exige alto nível de

Sumário
Pesquisas em Tradução | 243

comando de ambas as línguas envolvidas, além de concen-


tração e atenção para manter a idéia principal do texto
original presente no texto-alvo e também manter a comu-
nicação ‘bem sincronizada’. Estes são pontos importantes ao
se considerar o contexto de ensino de línguas estrangeiras,
pois, evidentemente, os estudantes ainda não têm tal
domínio das línguas e não são tradutores. Os estudantes
(professores em formação, neste caso), semelhantemente ao
tradutor em formação, devem ser expostos a (con)textos
diferentes, tendo a oportunidade de encarar situações de
tomadas de decisão envolvendo situações específicas e
contextos culturais diferentes entre a língua inglesa e a
portuguesa. Tal exposição é importante, pois, segundo Nord
(ibid.), usos de língua específicos estão presentes em locais
diferentes, com variações linguísticas específicas, em contex-
tos e situações específicos, influenciando como o tradutor
deve analisar o texto original. Portanto, alguns aspectos,
além dos aspectos linguísticos, devem ser destacados, tais
como condições políticas, culturais e também o processo de
comunicação intercultural – (i) quem produz o texto original;
(ii) quem solicita a tradução do texto original; (iii) o texto
original em si; (iv) quem recebe o texto original e o traduz;
(v) o texto-alvo em si; e (vi) quem lê o texto-alvo. Como pode
ser observado, o processo tradutório envolve participantes
diferentes, incluindo leitores. Tal processo não pode estar
relacionado apenas ao propósito do texto original, mas,
principalmente, a como o texto-alvo vai funcionar no
contexto a que ele se destina, baseando-se na função
comunicativa do texto original. De acordo com a Abordagem
Funcionalista, o processo para a produção de um texto
traduzido com orientação voltada ao leitor-alvo vai da
análise do texto original até quem receberá o texto-alvo –
sendo todos estes passos necessários.
A Abordagem Funcionalista é baseada na importância
de saber qual é o propósito de um trabalho de tradução,

Sumário
244 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

marcando, portanto, que o texto original não é a referência


principal para uma tradução. Nord (1997, p. 04) cita Reiss e
Vermeer (1978/1983) ao dizer que o que deve prevalecer é o
propósito do texto traduzido para determinar métodos e
estratégias de tradução, e não a função do texto original.
Nord (1991, p. 16) já tinha mencionado que, de acordo com a
visão dinâmica do texto adotada por ela, um texto não tem
uma função; a função só é atribuída ao texto através do leitor
no ato da recepção do texto. É a recepção do texto que
encerra a situação comunicativa e define a função do texto: o
texto como um ato comunicativo torna-se ‘completo’ pelo
leitor.
Vermeer (2002, p. 221) defende a idéia de que qualquer
tradução é uma ação com um propósito. O autor apresenta
uma explicação para o termo skopos como sendo um termo
técnico, utilizado para especificar o objetivo ou propósito de
uma tradução. Vermeer enfatiza que o tradutor precisa ter
uma noção clara do objetivo de um determinado trabalho de
tradução. Após conhecer o objetivo da tradução, o tradutor
pode produzir um texto-alvo que atenda às necessidades do
cliente e do leitor.
Vermeer (ibid.) apresenta ainda a orientação de cada
texto – o texto original orientado para a cultura original e o
texto alvo orientado para a cultura alvo, definindo, assim, o
papel do texto original e do texto alvo. O autor explica o
papel dos textos original e alvo dizendo que os dois textos
podem diferir bastante, não apenas na formulação e
distribuição do conteúdo, mas também no que diz respeito
aos objetivos que são traçados para cada texto.
Nord (1991, p. 28) concorda com a visão acima ao
mencionar que tradução é a produção de um texto alvo
funcional, mantendo relação com um texto original. Tal
relação é especificada de acordo com a função pretendida ou
exigida do texto alvo (escopo da tradução). A autora quer
dizer que, embora não seguindo a produção de uma tradu-

Sumário
Pesquisas em Tradução | 245

ção baseada na orientação do texto original, é necessário


manter uma relação entre texto original e texto alvo.
Entretanto, até onde essa relação existe depende do escopo
da tradução e também da decisão de quais elementos do
texto original podem ser ‘preservados’, que elementos po-
dem ser ‘adaptados’ ou mesmo que elementos podem ser
deixados fora da tradução.

Apresentação de Modelos de Atividades de Tradução para


Aplicação em Aulas de LE

Esta sessão é dedicada à descrição das atividades


utilizadas nas aulas de Língua Inglesa durante os semestres
de 2009 a 2011 no Curso de Letras-Inglês da UFCG. É
necessário informar que grande parte das atividades não foi
criada no projeto, mas adaptada de livros didáticos ou de
antigas aplicações em sala de aula. Ou seja, muitas podem
ser consideradas tradicionais. O que importa, no entanto, é o
objetivo atual de aplicação de cada uma delas e o olhar
voltado à tradução e ao grupo e contexto. À medida que as
atividades eram aplicadas, seguiam-se discussões com o
grupo, gerando reflexão relevante do ponto de vista da
pesquisa e do professor em formação. Passo agora a
descrever as atividades.

Sumário
246 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Quadrinhos
Atividade Descrição
Aqui, duas versões dos
quadrinhos são
apresentadas para
promover uma discussão
partindo das estratégias de
tradução utilizadas até a
temática explorada.
Dependendo do nível da
turma, a discussão pode ser
conduzida em LE, com
espaços para o uso da LM
quando necessário.
Habilidades trabalhadas:
leitura, escrita, escuta e fala.
Nesse caso, os quadrinhos
foram apresentados na LE e
os alunos leram a história e
interpretaram o tema:
Salário de professores e
trabalhar ‘por amor’. Em
seguida, os alunos
produziram versões em LM
para a história e adaptaram
os quadrinhos ao ambiente
de ensino deles, propondo,
inclusive, mudança do
nome de alguns
personagens. Por exemplo,
a professora recebeu o nome
de uma professora do curso.
Habilidades trabalhadas:
leitura, escrita, escuta e fala.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 247

Música
Atividades Descrição
Qualquer estilo de a) A música pode ser trabalhada como uma
música: Rock, Rap, atividade de preencher lacunas ou de observar
Country, Clássica etc. uma figura e marcar os pontos da figura que
correspondem à letra da música (envolvendo
atividade intersemiótica). Após o
preenchimento dos espaços, é promovida uma
discussão sobre a letra evitando a tradução
literal e promovendo o uso da categoria de
tradução intralingual, com interpretação da
mensagem da música.
Habilidades trabalhadas: leitura, escrita, escuta
e fala.
b) Os alunos acompanham a música assistindo
ao vídeo clipe e depois observam letra e
tradução e fazem observações acerca da letra e
da temática explorada, podendo mencionar o
vídeo clipe para interpretação da letra
(atividade intersemiótica). Também podem ser
incluídos textos críticos que comentem sobre a
música, cantor, banda para que sejam incluídos
na discussão. Após a conclusão da discussão,
pedir que os alunos produzam um texto escrito
sobre o tema abordado5.
Habilidades trabalhadas: leitura, escrita, escuta
e fala.

5 Ver exemplo de uma atividade nesse estilo em Branco (2010),


disponível em
<http://www.revistaeutomia.com.br/volumes/Ano3-
Volume2/linguistica-artigos/linguistica_sinara_branco.pdf>
acesso em 03 de abril de 2012.

Sumário
248 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Poesia
Atividades Descrição
The Philosophers Nesse caso, o objetivo da atividade pode ser
Russell Edson (1994) promover uma discussão com os estudantes
sobre a importância do ato reflexivo e sobre
I think, therefore I am, said a questões gerais evolvendo o ensino e a vida
man whose mother quickly acadêmica, por exemplo. Como a aula é de
hit him on língua, o poema é utilizado para instigar a
the head, saying, I hit my discussão e não exatamente para promover
son on his head, therefore I uma discussão sobre literatura. Um auxílio
am. à interpretação pode ser o uso de imagens
No, no, you’ve got it all que auxiliem na questão interpretativa, por
wrong, cried the man. exemplo:
So she hit him on the head
again and cried, therefore I
am.
You’re not, not that way;
you’re supposed to think, not
hit, cried the
man.

...I think, therefore I am, said


the man.
I hit, therefore we both are,
the hitter and the one who
gets hit, said
the man’s mother.
But at this point the man
had ceased to be;
unconscious he could not Habilidades trabalhadas: leitura, escrita,
think. But hit mother could. escuta e fala.
So she thought, I am, and so
is my unconscious
son, even if he doesn’t know
it...

Sumário
Pesquisas em Tradução | 249

Texto Literário
Atividades Descrição
Textos literários O trabalho com texto literário e com poesia aproxima o
em geral estudante do mundo literário e o motiva para a leitura
podem ser e trabalho com mais criatividade em sala de aula. A
utilizados, por partir da leitura do texto, são marcadas discussões
exemplo, As sobre a história e tarefas são desenvolvidas pelo grupo,
Viagens de como teatro – os estudantes representam cenas da
Gulliver, obra; comparação da obra em língua inglesa e da obra
Chapeuzinho em LM, discutindo questões culturais de adaptação,
Vermelho, Peter estratégias e categorias de tradução etc.; os alunos
Pan, Alice no produzem uma nova história em LM, adaptando a
País das história a uma realidade cultural brasileira escolhida6.
Maravilhas, etc. Habilidades trabalhadas: leitura, escrita, escuta e fala.

Texto Jornalístico
Atividades Descrição
Qualquer Apresenta-se o tema aos estudantes e promove-se
notícia de jornal uma discussão sobre o assunto. Em seguida, eles
ou revista recebem o texto em inglês e, após a leitura, o professor
(entretenimento, propõe uma tradução de tal texto, informando qual
política, esporte, será o propósito do trabalho (uma nova publicação em
notícia local ou jornal local, por exemplo). Após traduzirem o texto, os
internacional, estudantes recebem uma tradução oficial do texto e
etc.) pode ser comparam o trabalho por eles realizado com o de um
usada. profissional. Em muitos pontos eles vão mostrar onde
o trabalho em sala de aula apresentou falhas, bem
como pontos em que o trabalho deles pode ter
apresentado tão bons (ou melhores) resultados quanto
o texto produzido por um tradutor profissional.
Habilidades trabalhadas: leitura, escrita, escuta e fala.

6 Ver exemplo de uma atividade nesse estilo em Branco (2010),


disponível em <http://www.revistaeutomia.com.br/
volumes/Ano3-Volume2/linguistica-
artigos/linguistica_sinara_branco.pdf>, acesso em 03 de abril de
2012.

Sumário
250 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Linguística
Atividades Descrição
Back translation Para essa atividade, é importante trabalhar o
Exemplo: conceito de back translation (retradução)
Translate the following anteriormente e escolher um texto que já
sentences into English: tenha sido traduzido. Os alunos traduzem
a) O ex-governador da para o português e depois traduzem as frases
Califórnia, Arnold de volta para o inglês, finalmente
Schwarzenegger, disse comparando suas produções com o texto
que teve um filho com original e apontando as falhas de produção.
uma empregada há mais Com uma atividade desse tipo, é possível
de dez anos. (Former trabalhar questões de sintaxe, por exemplo,
California Governor tanto em LM quanto em LE, além de questões
Arnold Schwarzenegger semânticas e pragmáticas envolvendo as
has acknowledged he estratégias de Chesterman7.
fathered a child with a Habilidades trabalhadas: leitura, escrita,
member of his household escuta e fala.
staff more than 10 years
ago.)
b) O episódio levou à
separação do casal,
anunciada oficialmente
na semana passada,
depois de uma união de
25 anos e quatro filhos.
(The former actor and his
wife Maria Shriver said
they were separating after
25 years of marriage.)
c) Observe os dois textos
e aponte diferenças
(linguísticas, textuais, de
conteúdo, oferecendo
explicações baseadas na
leitura do texto sobre
back translation.

7 Ver exemplo de uma atividade nesse estilo em Branco (2012),


disponível em <http://seer.bce.unb.br/index.php/traduzires>
acesso em 30 de junho de 2012.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 251

Traduzindo idioms Nessa atividade, os estudantes têm a


(expressões idiomáticas) oportunidade de discutir questões culturais e
Exemplo: temporais relevantes ao desenvolvimento da
Translate the following tarefa. Eles observam que, nesse caso, a
idioms into Portuguese tradução literal geralmente não é a melhor
and check which opção, funcionando bem em casos específicos.
translation strategies you Eles vão buscando os procedimentos que
use to do it. Explain why consideram mais apropriados e, ao concluir a
you possibly use different tarefa, discute-se as opções e quais traduções
strategies for some of the parecem mais apropriadas.
idioms: Habilidades trabalhadas: leitura, escrita,
a) Birds of a feather escuta e fala.
flock together.
b) In unity there is
strength.
c) It takes two to
tango.
d) A man is known
by the company he keeps.
e) Misery loves
company.
f) There’s no place
like home.
g) Too many cooks
spoil the broth.
h) Two heads are
better than one.
i) Two’s company,
but three’s a crowd.
j) A miss is as good
as a mile.
Parafraseando e O trabalho com metalinguagem faz com que o
explicando o significado estudante desenvolva a habilidade de se
de termos e frases expressar de formas variadas para exprimir
a) Rewrite each pair of suas ideias, tornando-o mais seguro sobre
sentence as one sentence, suas argumentações. As atividades aqui
and include the word propostas são comuns em livros didáticos,
given. Make any necessary nesse caso, estão presentes no livro Recycling
changes. Advanced English, de Clare West, reforçando a
b) Rewrite each formal ideia de que a Tradução sempre esteve em
sentence as an informal sala de aula de LE.
one, ending with the word Habilidades trabalhadas: leitura, escrita,
given. escuta e fala.

Sumário
252 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

c) Match each phrasal verb


with the correct definition.
d) Complete each sentence
so that it means the same
as the one before.
e) Explain the difference in
meaning between each pair
of sentences.

Imagens

Atividades Descrição

Mesmo estando em LM, a charge ao


lado pode ser utilizada em aula de
LE para discussão sobre variação
linguística, por exemplo, e para
tratar de questões envolvendo
tradução interlingual e estratégias de
tradução. Além da discussão sobre o
que a imagem representa em
contexto brasileiro, a questão da
linguagem pode ser trabalhada para
discussão sobre linguagem
formal/informal, contexto e situação,
tradução e genros textuais.
Habilidades trabalhadas: leitura,
escrita, escuta e fala.

Os estudantes recebem cópia da


imagem com balões em branco e
produzem a história de acordo com a
imaginação de cada um. Após a
conclusão da história, eles trabalham
em pares para comparar os textos e,
finalmente, recebem a história
original e discutem até que ponto
eles fizeram uma interpretação
diferente do original e discutem,
também, questões sobre

Sumário
Pesquisas em Tradução | 253

interpretação, adaptação e
adequação voltadas ao propósito do
grupo – se estudantes de curso de
Leitura, Tradução, LE etc.
Habilidades trabalhadas: escuta,
leitura e fala.

Picture Dictation a) Os estudantes ouvem a leitura de


Once upon a time, there was a little um texto, que pode ser descritivo ou
girl who lived in a village near the de qualquer outro gênero e, à
forest. Whenever she went out, the medida que escutam a leitura, vão
little girl wore a red riding cloak, so produzindo um desenho que
everyone in the village called her represente o que ouvem. Ao
Little Red Riding Hood. concluírem, comparam as imagens e
One morning, Little Red Riding discutem sobre o que lhes chamou
Hood asked her mother if she could mais atenção com relação à leitura.
go to visit her grandmother as it had b) Após essa primeira atividade,
been awhile since they'd seen each cada estudante recebe uma figura e
other. vai descrevê-la para um colega criar
"That's a good idea," her mother
a imagem do que está ouvindo. Mais
said. So they packed a nice basket for
uma vez, ao concluírem a atividade,
Little Red Riding Hood to take to her
eles comparam o desenho com a
grandmother.
imagem descrita e discutem o
When the basket was ready, the little
desenvolvimento da tarefa. Mesmo
girl put on her red cloak and kissed
her mother goodbye. reclamando, a princípio, do fato que
"Remember, go straight to ‘não sabem desenhar’ a atividade é
Grandma's house," her mother geralmente desenvolvida com
cautioned. "Don't dawdle along the envolvimento e o resultado é
way and please don't talk to satisfatório, pois o propósito não é
strangers! The woods are criar desenhos perfeitos, mas
dangerous." representação não verbal do que se
"Don't worry, mommy," said Little ouve.
Red Riding Hood, "I'll be careful." Habilidades trabalhadas: leitura,
But when Little Red Riding Hood escuta e fala.
noticed some lovely flowers in the

Sumário
254 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

woods, she forgot her promise to her


mother. She picked a few, watched
the butterflies flit about for awhile,
listened to the frogs croaking and
then picked a few more.
Little Red Riding Hood was
enjoying the warm summer day so
much, that she didn't notice a dark
shadow approaching out of the forest
behind her...
Disponível em <
http://www.dltk-
teach.com/rhymes/littlered/1.ht
m> acesso em 04 de abril de 2012.

Cinema
Atividades Descrição
Aplicação de cinema em sala de aula
tem usos variados. Cenas podem ser
trabalhadas para discussão de temas
específicos, ou pontos gramaticais
podem ser explorados nos diálogos de
personagens. Há ainda a possibilidade
de se trabalhar de forma intersemiótica
unindo cenas, imagens específicas, trilha
sonora e artigos, entrevistas sobre a obra
cinematográfica com grupos de níveis
variados, além da possibilidade de
discussão sobre legendagem, auxílio das
imagens na interpretação das cenas etc.
Nesse caso, são utilizadas imagens dos
filmes Cidade de Deus e Gangues de Nova
York com a possibilidade de se discutir
questões sobre violência e formação de
gangues/quadrilhas em grandes
capitais, por exemplo.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 255

Internet
Atividades Descrição
http://www.youtube.com/ Os recursos fornecidos na
?gl=BR&hl=pt atualidade através da Internet
http://www.ingredientx.com/ são infinitos. Muitos sites
watch/tales/ educativos podem ser
http://www.bbc.co.uk/ utilizados em sala de aula para
http://googlebr.englishtown.com/ desenvolvimento de temas
online/lp/ BRD_STD_PP_LP26&ps=y específicos e sites como
Youtube, tales of mere existance,
BBC e de cursos de idiomas
podem ser trabalhados em
momentos específicos de uma
aula proporcionando atividades
motivadoras e desafiadoras.

Corpora Linguísticos
Atividades Descrição
British National Corpus (BNC) - Os corpora linguísticos podem ser
http://www.natcorp.ox.ac.uk/ utilizados em sala de aula para
About the BNC promover discussões sobre temas
The British National Corpus (BNC) is específicos e sobre uso de
a 100 million word collection of linguagem de forma mais realista.
samples of written and spoken Questões sobre uso de língua
language from a wide range of sources, podem ser verificadas
designed to represent a wide cross- instantaneamente em sala de aula
section of current British English, both ou pesquisas podem ser feitas
spoken and written. [more] pelos estudantes, que desenvolvem
Search the Corpus familiaridade e maior curiosidade
Type a word or phrase in the search sobre usos de língua a partir do
box and press the Go button to see up conhecimento sobre corpora.
to 50 random hits from the corpus.
Parte superior do formulário
Look up:
You can search for a single word or a
phrase, restrict searches by part of
speech, search in parts of the corpus
only, and much more.
The search result will show the total
frequency in the corpus and up to 50
examples. [more information]

Sumário
256 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Conclusão

Pesquisadores da área de Estudos da Tradução e


Ensino de Línguas Estrangeiras têm se esforçado para coletar
amostras de atividades variadas para exemplificar a eficácia
do uso de tradução no ensino de LE no Século XXI e reforçar
as teorias discutidas e descritas, com o intuito de buscar
respostas e sugestões de como auxiliar o aprendiz de LE a se
tornar um falante de LE mais autônomo, fazendo melhor uso
do seu conhecimento prévio de LM. O uso de atividades de
tradução tem se mostrado válido e necessário para favorecer
a pesquisa na área, tornando-a cada vez mais representativa,
bem como auxiliando professores e estudantes em sala de
aula de LE. Outro ponto positivo sobre o uso de atividades
de tradução em sala de aula de LE é que, apesar da ainda
possível resistência que esse tipo de trabalho apresenta, é
compensador ver os resultados após a compilação, organi-
zação e investigação do corpus e seus resultados.
Pensando nesses pontos e mantendo o foco no am-
biente de sala de aula de LE discutido neste capítulo, volto a
afirmar a importância de envolver o estudante (de tradução
ou de LE) e o professor em formação em um trabalho de
análise da(s) língua(s) estudada(s) por um ângulo mais
abrangente, não reprimindo o estudante e professor em for-
mação em sua forma de pensar e trabalhar as línguas envol-
vidas no processo de aprendizagem de LE ou de tradução.
Rajagopalan (2003) afirma que a consequência de uma
visão limitadora sobre as línguas gera uma visão de superio-
ridade da LE sobre a LM, fazendo com que os esforços
didáticos se voltem para a aquisição de uma ‘competência
perfeita’, que é um conceito suspeito relacionado ao domínio
que o falante nativo supostamente possui da sua língua. Essa
visão é antiquada e preconceituosa, fazendo com que o
estudante crie a ilusão de que vai aprender um idioma
superior a sua LM e que, a partir de um ilusório domínio da

Sumário
Pesquisas em Tradução | 257

LE, como se fosse um falante nativo, sua autoestima será


maior. Essa expectativa gera uma influência negativa na
motivação, segurança e, consequentemente, na aprendi-
zagem do aprendiz. Segundo o autor, deve-se respeitar o
espaço da LM em sala de aula, pois ela faz parte da formação
do estudante, além de constituir a sua base de informação
para que possa desenvolver conhecimentos sobre outros
códigos linguísticos. Quanto melhor e maior for o conhe-
cimento e domínio do estudante de sua LM, melhor será o
seu desenvolvimento em LE. Ainda segundo Rajagopalan
(ibid., p. 69), “quem transita entre diversos idiomas está
redefinindo sua própria identidade. Quem aprende uma
língua nova está se redefinindo como uma nova pessoa”.
Levando em consideração os pontos argumentados
acima, Rajagopalan (ibid., p. 70) segue afirmando que “é na
linguagem e através dela que as nossas personalidades são
constantemente submetidas a um processo de reformu-
lação”. O autor parece sugerir formas de análise linguística e
de aplicação destas análises ao ensino de LE, de forma que
apresentem novas propostas de atividades que facilitem o
uso das línguas em sala de aula; e eu acrescento que tais
considerações podem também ser aplicadas em contexto de
ensino de tradução, bem como da aplicação da tradução ao
ensino de LE, como aqui demonstrado. A aplicação de
atividades de tradução ao ensino de LE ou ao ensino de
tradução, bem como à pesquisa na área de Estudos da
Tradução, apresenta o uso da linguagem de forma real,
trazendo ao ambiente de ensino a cultura estudada e outras
formas de pensar e agir que podem ser discutidas e descritas
em sala de aula através de diversos enfoques linguísticos,
fazendo com que a ideia do ‘uso real da língua’ ganhe outras
dimensões.

Sumário
258 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

Referências

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Sumário
Pesquisas em Tradução | 259

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Budapest, Hungary: Scholastica, 1997, p. 27-36.
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TAGNIN, S. E. O. e VIANA, V. (Org.). Corpora no ensino de línguas
estrangeiras. São Paulo: Hub Editorial, 2010.

Sumário
260 | A tradução e suas relações com o ensino de línguas

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2000.
VERMEER, H. Skopos and Comission in Translation Action.
Translated by VERMEER, H. Ein Rahmen für eine allgemeine
Translationstheorie. Lebende Sprachen 23(1), 2002, p. 99-102.
Reprinted in Vermeer 1983, p. 48-88. [A Framework for a General
Theory of Translation].
WEST, C. Recycling Advanced English. Jersey: Georgian Press
Limited, 1995.
WILLIS, J. e WILLIS, D. Challenge and Change in Language Teaching.
Oxford: Heinemann, 1996.
WOORDWARD, T. Planning Lessons and Courses: Designing
Sequences of Work for the Language Classroom. Cambridge:
Cambridge University Press, 2001.

Sumário
Pesquisas em Tradução | 261

AGLAÉ FERNANDES, professora de Língua e Literatura


Francesa no Departamento de Letras Estrangeiras Moder-
nas, da Universidade Federal da Paraíba. É mestre em
Letras, com a dissertação “Palavras navegáveis: um estudo
da poética de Lúcio Lins”. É doutoranda do Projeto Dinter
em Estudos da Tradução UFSC/UFPB/UFCG.
(aglaefernandes@gmail.com)

ANA CRISTINA BEZERRIL CARDOSO é professora de


língua francesa e de teorias da tradução no Departamento de
Letras Estrangeiras Modernas da Universidade Federal da
Paraíba. Graduada em Direito e em Letras-Francês pela
UFPB e mestre em Letras pela mesma universidade, com a
dissertação “Les Serments de Strasbourg”: importância histórica
e filológica na consolidação do francês.É doutoranda do Projeto
Dinter em Estudos da Tradução UFSC/UFPB/UFCG, onde
desenvolve uma pesquisa sobre história e análise de
traduções brasileiras de fábulas La Fontaine.
(anacristinaufpb@gmail.com)

CARMEN VERÔNICA DE ALMEIDA RIBEIRO NÓBREGA,


graduada em Letras – Português/Francês pela Universidade
Estadual da Paraíba/UEPB, mestrado em Educação pela
Universidade Federal da Paraíba/UFPB e professora da área
de Línguas Estrangeiras na Unidade Acadêmica de Letras da
Universidade Federal de Campina Grande/UFCG, Campus
I desde janeiro de 1995. É doutoranda do Projeto Dinter em
Estudos da Tradução UFSC/UFPB/UFCG.
(carmenbisous@yahoo.com.br)

Sumário
262 | N o t a s bio-bliográficas das organizadoras e dos autores

CLEYDSTONE CHAVES DOS SANTOS possui graduação


em Letras Estrangeiras Modernas - Inglês pela UFPB (1999) -
Francês pela UFCG (2004) e mestrado em Letras pela UFPB
(2006). Também tem formação linguística em alemão e
espanhol pela UFCG (2005). Atualmente é professor
assistente padrão II na Unidade Acadêmica de Letras - UAL
na UFCG. Tem experiência na área de Letras com ênfase em
linguística aplicada, atuando principalmente nos seguintes
temas: novas tecnologias no processo ensino-aprendizagem
de língua estrangeira sob uma perspectiva sociocultural; e o
papel da língua materna no processo ensino-aprendizagem
de língua estrangeira. É doutorando do Projeto Dinter em
Estudos da Tradução UFSC/UFPB/UFCG, pesquisando
sobre as implicações pedagógicas da tradução automática na
aula de língua inglesa instrumental.
(teachertone@gmail.com)

DANIEL ALVES é mestre em linguística aplicada pela


Universidade Federal de Minas Gerais, Doutorando em
Estudos da Tradução do programa de Estudos da Tradução
(PGET/UFSC) e professor do curso de Bacharelado em
Tradução da Universidade Federal da Paraíba.
(daniel.alves.ufpb@gmail.com)

FRANCISCO FRANCIMAR DE SOUSA ALVES possui


graduação em Letras – Português/Inglês pela Universidade
Estadual da Paraíba/UEPB, mestrado em Letras/Inglês pela
Universidade Federal da Paraíba/UFPB e é professor da
área de Língua Inglesa na Universidade Federal de Campina
Grande/UFCG, Campus de Cajazeiras-PB, desde julho/
2002. É doutorando do Projeto Dinter em Estudos da
Tradução UFSC/UFPB/UFCG.

GARIBALDI DANTAS DE OLIVEIRA é professor na


Unidade Acadêmica de Letras da Universidade Federal de
Campina Grande (UFCG), onde leciona Literatura Ameri-
cana e Literatura Inglesa. É doutorando do Projeto Dinter
em Estudos da Tradução UFSC/UFPB/UFCG.
(gagahdantas@gmail.com)

Sumário
Pesquisas em Tradução | 263

LAVÍNIA TEIXEIRA GOMES é professora Assistente II (DE)


de Língua Francesa no curso de Letras da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB) e é doutoranda do Programa de
Pós-Graduação em Estudos da Tradução (PGET) da
Universidade Federal de Santa Catarina onde desenvolve
sua pesquisa sobre a tradução audiovisual de gêneros não
ficcionais. Possui graduação em Letras, licenciatura em
vernáculo e francês pela Universidade Federal da Paraíba
(2002). Obteve em 2001 o Máster I em Francês Língua
Estrangeira pela Universidade de Poitiers, França, e realizou
o Mestrado em "Didactologie des langues et des cultures"
pela Universidade Paris III Sorbonne-Nouvelle em 2004.
(lavinia.teixeira.gomes@gmail.com)

LETÍCIA CAPORLINGUA GIESTA é doutoranda DINTER


em Estudos da Tradução UFSC/UFPB/ UFCG. Possui
mestrado em Letras pela Universidade Federal do Rio Gran-
de do Sul (2007) e graduação em Letras Português Inglês
pela Universidade Federal do Rio Grande (2000). Atual-
mente é Professora na Universidade Federal de Campina
Grande. Atua e realiza estudos na área de Estudos da
tradução; Ensino de Língua inglesa e Linguística, com ênfase
em Linguística Aplicada, principalmente nos seguintes
temas: aquisição da linguagem, linguagem e desenvol-
vimento, leitura, livros didáticos, concepções sobre o ensinar
e aprender, inglês instrumental e inglês para crianças.
(legiesta@gmail.com)

LUANA FERREIRA DE FREITAS concluiu doutorado em


Teoria Literária na Universidade Federal de Santa Catarina
em 2007 e pós-doutorado em Estudos da Traduação, na
mesma instituição, em 2010. Atua na área de Letras, pes-
quisando literatura inglesa do século XVIII (sobretudo a
obra de Lawrence Sterne) e Estudos da Tradução (especial-
mente autoria, tradução literária e estilo, literatura brasileira
traduzida e literatura estrangeira traduzida no Brasil).
(luanafreitas.luana@gmail.com)

Sumário
264 | N o t a s bio-bliográficas das organizadoras e dos autores

MARCÍLIO GARCIA DE QUEIROGA possui graduação em


Letras – Português/Inglês pela Universidade Federal de
Campina Grande (UFCG/CFP), é mestre em Literatura e
Cultura pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB e
professor da área de Língua Inglesa da Universidade Fede-
ral de Campina Grande (UFCG/₢FP). É doutorando do
Projeto Dinter em Estudos da Tradução UFSC/UFPB/
UFCG, onde desenvolve pesquisa acerca da voz do tradutor
na literatura infanto-juvenil. (marciliogq@gmail.com)

MARIA LUCIA VASCONCELLOS é Professora Associada


da Universidade Federal de Santa Catarina, com atuação nos
Programas de Pós-Graduação em Estudos da Tradução
(PGET) e Pós-Graduação em Inglês (PGI). Seus interesses de
pesquisa concentram-se em : (1) Análise Textual e Tradução,
dimensão explorada na interface entre Estudos da Tradução
e Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), com o apoio de
meto-dologias de corpus; (ii) Mapeamentos do campo disci-
plinar Estudos da Tradução, inlcuindo-se aqui a gradual
inserção de Tradução e Interpretação de Línguas de Sinal
TILS, no cenário da pós-graduação brasileira ; (iii) Formação
de tradutores. Em 2012, realizou etapa internacional de
estágio pós-doutoral, junto ao Departament de Traducció y
Interpretació da Universitat Autònoma de Barcelona (UAB),
sob a supervisão da Profª Drª Amparo Hurtado Albir,
catedrática e pesquisadora principal do Grupo de Pesquisa
PACTE (grupsderecerca.uab.cat/pacte/en). A partir desse
estágio, inclui-se entre seus interesses de pesquisa a Didática
de Tradução com base na Abordagem por Tarefas de
Tradução e na Formação baseada em Competência Tradu-
tória. (marialuciabv@gmail.com)

MARIE HÉLÈNE CATHERINE TORRES é professora


Associada da Universidade Federal de Santa Catarina onde
atua na graduação em Letras Estrangeiras e no Programa de
Pós-Graduação em Estudos da Tradução. Possui Pós-
Doutorado pela Universidade de Minas Gerais (2011) e
Doutorado em Estudos em Tradução - Katholieke

Sumário
Pesquisas em Tradução | 265

Universiteit Leuven (2001). Foi coordenadora da Pós-


Graduação em Estudos da Tradução de 2003 a 2007 e
coorde-nadora da Especialização em Formação de
Professores de Tradu-ção Literária de 2008 a 2009. Coordena
atualmente o Doutorado Interinstitucional (DINTER) da
PGET/UFSC com a UFPB de 2010 a 2014. Tem experiência
na área de Letras, com ênfase em Literatura e em Tradução,
atuando principalmente nos seguintes temas: literatura
nacional e literatura traduzida, teoria e história da tradução,
literatura de língua francesa traduzida no Brasil e estudos
em tradução. Publicou recentemente entre outros Variations
sur l´étranger dans les lettres: cent ans de traductions françaises
des lettres brésiliennes (2004, pela Artois Presses Université),
Literatura Traduzida/Literatura Nacional (em co-autoria, pela
7Letras em2008), o Dicionário de Tradutores Literários do Brasil
(em co-autoria online), Literatura e tradução : textos
selecionados de José Lambert (em co-autoria, pela 7Letras
em2011), Traduzir o Brasil Literário : paratexto e discurso de
acompanhamento (2011). Traduziu A tradução e a letra ou o
albergue do longinquo de Antoine Berman (2007).
(marie.helene.torres@gmail.com)

MAURA REGINA DOURADO possui Mestrado (1991) e


Doutorado (1999) em Língua Inglesa pela Universidade
Federal de Santa Catarina. Cursou estágio pós-doutoral na
Universidade de Estocolmo (2005-2007), período em que
trabalhou com a transposição dos Parâmetros Curriculares
Nacionais e dos Referencias Curriculares para línguas
estrangeiras do estado da Paraíba para uma série didática
adotada pela Secretaria de Educação do Estado da Paraíba
(SEC-PB). È professora associada da UFPB, onde atua nas
áreas de Estágio Super-visionado e Linguística no
Departamento de Letras Estran-geiras Modernas (DLEM). É
Coordenadora Operacional do Dinter em Estudos da
Tradução entre a UFSC, UFPB e UFCG (2009-2014) e
Coorde-nadora PIBID de Licenciatura Inglês (2014-2018).
Sua área de pesquisa e produção acadê-mica envolve o
processo deensino e aprendizagem de línguas estrangeiras

Sumário
266 | N o t a s bio-bliográficas das organizadoras e dos autores

em contexto escolar no ensino básico e superior, formação


de professores, avaliação e elaboração de materiais
didáticos, avaliação da aprendizagem, currículo, abordagens
críticas de ensino de línguas, tradução de ensi-namentos
sagrados e terminologia na área da espiritua-lidade.
(mauradourado@hotmail.com)

PABLO DANIEL ANDRADA é escritor e tradutor argentino


que leciona língua espanhola na UFPB – Universidade
Federal da Paraíba. Exerceu as atividades de músico, pintor
e jornalista, cursou letras e se dedicou ao ensino e pesquisa
de literatura e teoria literária. Como pesquisador começou
na UFPA de Belém do Pará, mas logo fez mestrado no Rio,
na UFF, com pesquisa na área de literatura hispano-
americana. Começou o doutorado em Literatura Compa-
rada, mas mudou para a área de Estudos da Tradução na
UFSC. Sua pesquisa atual, focalizada na poesia de Augusto
dos Anjos, procura aproximar a prosódia da estética,
tentando dar conta dos laços que existem com a essência da
metáfora. (pabloandrada33@hotmail.com)

SINARA DE OLIVEIRA BRANCO é Mestre (2000) e Doutora


(2007) pelo Programa de Pós-Graduação em Inglês (PGI) da
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professora
e pesquisadora do Curso de Letras da Univer-sidade Federal
de Campina Grande (UFCG) com pesquisa na área de
Estudos da Tradução. Coordenadora da área de Língua
Inglesa da Unidade Acadêmica de Letras e Coorde-nadora
do Laboratório de Pesquisa do Programa de Pós-Graduação
em Linguagem e Ensino (POSLE). Membro do Núcleo
Docente Estruturante (NDE) do Curso de Letras-Inglês da
UFCG. Orientadora de Monografia, PIBIC, Mestra-do e
Doutorado. Líder do Grupo de Pesquisa cadas-trado no
Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq Tradução: Teoria,
Prática e Formação do Professor. Membro do Corpo Edito-
rial das Revistas Ariús, Leia Escola, Fólio, Littera e Ciência e
Saúde. Pesquisadora com produção bibliográfica e partici-
pação em eventos nacionais e internacionais. Tradutora

Sumário
Pesquisas em Tradução | 267

técnica de textos acadêmicos (inglês/português e portu-


guês/inglês) nas áreas de saúde e tecnologia.
(sinarabranco@gmail.com)

WALTER CARLOS COSTA estudou filologia românica ena


Katholieke Universiteit Leuven, Bélgica. Realizou doutorado
sobre as traduções de Jorge Luis Borges para o inglês pela
University of Birmingham, Reino Unido, e pós-doutorado
pela UFMG. É professor do Departamento de Língua e Lite-
ratura Estrangeiras da Universidade Federal de Santa
Catarina, pesquisando literatura hispano-americana (sobre-
tudo a obra de Jorge Luis Borges), literatura comparada,
estudos da tradução (especialmente a conexão entre litera-
tura traduzida e literatura nacional) e literatura fantástica
francesa. Atualmente está em colaboração técnica no Depar-
tamento de Letras Estrangeiras da Universidade Federal do
Ceará. (waltercosta@gmail.com)

Sumário
268 | N o t a s bio-bliográficas das organizadoras e dos autores

Sumário
Pesquisas em Tradução | 269

Sumário
270 | N o t a s bio-bliográficas das organizadoras e dos autores

Sumário

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