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Introdução

Esboço crítico da recente historiografia sobre a


independência do Brasil (c. 1980-2002)
Jurandir Malerba

uitas das questões que os historiadores da independência do Brasil se esfor-


çam para responder nos dias de hoje começaram a ser elaboradas há quase
dois séculos, praticamente desde os acontecimentos de 1822. Sucessivas gerações,
com maior ou menor sucesso, responderam a seu modo essas mesmas questões. Ao
longo das décadas, questionamentos diferentes foram também levantados. A recente
vaga revisionista da história da independência está aí a demonstrar que nem tudo é
consenso no que concerne a temas os mais visitados pela historiografia, relativos à
questão de por que, afinal de contas, ocorreu a independência do Brasil de Portugal.
As questões têm variado ao longo do tempo, mas algumas são recorrentes e serão
aqui priorizadas.
Os historiadores muito pesquisam e debatem sobre que fatores, forças, proces-
sos, atores conduziram ao desfecho da emancipação política. Não há unanimidade,
todavia, quanto a ter ou não havido algum projeto "nacional" fundamentando o
movimento, nem tampouco quanto à existência de algum tipo de unidade na Amé-
rica de colonização portuguesa à época da independência. Por outro lado, as diferen-
tes interpretações geraram, ao longo d a história dessa historiografia, diversas
periodizações mais ou menos consistentes, variando conforme as diversas linhagens
interpretativas. Por exemplo, um dos pontos abertos no debate sobre a periodização
gira em torno da questão de se a vinda da corte para o Rio de Janeiro teria protelado
ou deflagrado o processo de independência. O tipo de relação que a independência
guarda com os movimentos insurrecionais do final do século XVIII também depen-
20 A independência brasileira

de, por sua vez, do foco de cada abordagem. Os movimentos insurrecionais da se-
gunda metade do século XVIII, entre os quais se destaca a Inconfidência Mineira,
guardariam ou não alguma relação de continuidade com o processo separatista for-
malmente consolidado em 1825?
É debate antigo determinar qual teria sido o "caráter" da independência, se
conservadora, reformista ou revolucionária. Em outras palavras: o que haveria de
ruptura e o que de continuidade no processo de independência? Q u a n t o à inserção
do Brasil no contexto internacional da chamada "crise do antigo sistema colonial",
interpretações consagradas sobre os efeitos dessa crise no processo de independên-
cia vêm sendo ultimamente constestadas. O processo político foi razoavelmente
escrutinado, mas as novas abordagens derivadas do cultural turn na historiografia
têm permitido aos historiadores aquilatar melhor a significância de outros fatores
decisivos e até recentemente negligenciados. Por exemplo, que peso se deve atri-
buir às radicais transformações culturais geradas pela abertura de 1808 e pelo afluxo
de levas de migrantes de todos os pontos? O u às transformações civilizacionais
vividas pela população do Rio de Janeiro, geradas pela presença e pelas demandas
do rei na arte, na ciência, na educação, nas melhorias urbanas? Atesta-o a criação
do que se poderia chamar de uma "esfera pública" — ou pelo menos o surgimento
de uma opinião pública — , de que é rico testemunho o caloroso debate na im-
prensa nascente.
Novas dúvidas foram levantadas sobre o caráter dos movimentos insurrecionais
ocorridos durante os anos da independência. O período de turbulências regionais
que se seguiu à abdicação de d. Pedro I levou alguns a concluírem que a independên-
cia não estaria totalmente completada senão a partir do desmantelamento dos movi-
mentos contestatórios da primeira metade do século XIX, confundindo-se aqui in-
dependência com construção da nação. Este é um ponto controverso, que aguarda
mais pesquisa e debate. O mesmo pode ser dito do papel desempenhado por parti-
dos e ideologias no contexto da independência.
Se um longo caminho foi percorrido no entendimento das relações entre o movi-
mento de restauração de 1820 em Portugal e a independência do Brasil, o papel desem-
penhado pelo rei e sua casa dinástica foi praticamente ignorado pela historiografia nas
últimas três décadas, como se as interpretações dos antigos historiadores nos bastassem
ainda hoje. Novos estudos apareceram sobre a ação de grupos organizados, como a
maçonaria, por exemplo, ou sobre a participação popular no movimento de indepen-
dência. Essa ênfase na história das classes subalternas é outro desdobramento do cultu-
ral turn iniciado nos anos 1960. Esta última questão sobre a participação popular na
independência, sequer levantada até uma geração atrás, é caríssima à historiografia
E s b o ç o crítico da recente historiografia sobre a independência d o Brasil 21

social mais recente e longe está de ser resolvida. Como agiram ou reagiram os grupos
sociais nas diferentes províncias?
Velhas questões que pareciam esgotadas e que insistem em reabrir, como feridas
que não cicatrizam. Pois o tema da independência ainda divide opiniões históricas e
nutre paixões políticas. A história é viva.
Vejamos a seguir que tratamento receberam da historiografia algumas dessas
questões nas duas últimas décadas. 1
N o levantamento que fiz da historiografia da independência, 2 dividi essa pro-
dução em cinco períodos, assim didaticamente distribuídos:

Produção historiográfica sobre a independência do Brasil até 2002

Período Bibliografia geral Na RIHGB Total


Século XIX-1908 58 42 100
1908-C.1930 83 43 126
c.1930-1964 51 13 64
1964-C.1980 201 99 300
c.1980-2002 60 6 66
Total geral 453 203 656

Os critérios para o estabelecimento das datas-baliza apóiam-se no fato de que,


embora constituindo massa de material muito heterogêneo — crônicas, narrativas
de viagem, anais, biografias, compilações de documentos, memórias — , a bibliogra-
fia do século XIX mantém-se numa mesma linhagem historiográfica até 1908, ano
da publicação de D. João VI no Brasil, de Oliveira Lima. 3 De uma perspectiva emi-
nentemente política e diplomática, que marca a historiografia oitocentista — na qual
se inclui a História da independência do Brasil, de Francisco Adolfo de Varnhagen 4 — ,

1
Elaborei u m primeiro ensaio sobre a riqueza crítica d a historiografia da independência em Malerba, 2 0 0 4 .
Para escrever o texto que se segue beneficiei-me g r a n d e m e n t e de Costa, 2004. U m excelente balanço crítico
da historiografia americana (e brasileira!) sobre a independência d o Brasil encontra-se em Kraay, 2 0 0 4 . Estes
dois últimos ensaios estão e m vias de publicação nos anais do Seminário Internacional Independência do
Brasil: História e Historiografia, realizado na U S P e m 2003.
2
Trata-se de pesquisa e m a n d a m e n t o na qual se incluem tão-somente obras históricas cujo objeto é o proces-
so de emancipação política d o Brasil, não abordando, portanto, outros gêneros, c o m o literatura ficcional,
livros didáticos, histórias gerais etc.
3
Ver Lima, 1945.
4
Ver Varnhagen, s.d. Pronta desde 1877, a História da independência foi publicada p o s t u m a m e n t e apenas
em 1916, por iniciativa do I H G B , já no marco das comemorações d o primeiro cencenário.
22 A independência brasileira

com Oliveira Lima assiste-se à inclusão de aspectos sociais e culturais decisivos para o
processo de independência, até então negligenciados no debate historiográfico. 5
O quadro anterior permite perceber claramente que a produção histórica sobre
a independência tem dois momentos fortes no século XX, nos anos que precedem e
sucedem, respectivamente, as efemérides do centenário oficial (1922) e do
sesquicentenário (1972), quando um volume imenso de títulos veio a lume. Essas
duas datas — ou as efemérides em torno delas — imantam a produção historiográfica
e definem a periodização mais ou menos arbitrária que construí com objetivos mera-
mente heurísticos. Os meados do século XX assistiram a uma relativa desaceleração
dessa produção, que marcou igualmente os anos 1980. Na década de 1990, sobretu-
do a partir de sua segunda metade, nota-se uma significativa expansão dos estudos
históricos sobre a independência. O foco da presente análise é justamente essa pro-
dução mais recente, desde o início da década de 1980 até 2002. 6
E m b o r a sua qualidade aguarde ainda avaliação mais cuidadosa, o boom
historiográfico dos anos 1970 registrou a publicação de mais títulos sobre o tema da
independência do que toda a produção precedente. Comparativamente às décadas
de 1960 e 1970, muito pouco foi produzido durante os anos 1980. Basta lembar
que, entre os 79 títulos inicialmente encontrados entre 1980 e 2002, há inúmeras
reedições, de modo que a bibliografia efetivamente nova contabilizada reduz-se a 66
títulos, seis dos quais publicados pela Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasi-
leiro. Dos 60 volumes restantes, apenas três datam da década de 1980 7 e somente 11
são anteriores a 1995. O u seja, a maioria esmagadora da produção historiográfica
sobre a independência nas duas últimas décadas, cerca de 85% dos títulos, concen-
tra-se no último lustro do período.
Essa produção dos últimos 20 anos será o foco da análise a seguir. Deixemos de
lado, por um momento, as razões de tal fenômeno, da eclosão desse boom sobre a
independência, e olhemos para o que tem sido .publicado. Q u e questões têm instiga-

3
Cabe o registro, contudo, que D. João VIno Brasil, de Oliveira Lima, embora fundamental para o entendi-
mento da independência, centra-se no período joanino. Seu O movimento da independincia pode ser incluído
na mesma linhagem interpretativa que marca o século XIX.
® A endossar meu argumento de uma crescente retomada de interesse sobre a independência, o qual levou a
um relativo boom no último lustro, estão os dois eventos realizados em 2003 sobre o tema. O history workshop
New Approaches Co Brazilian Independence, realizado na Universidade de Oxford, em 29 e 30 de maio, patro-
cinado pelo Centre for Brazilian Studies daquela instituição (o conjunto de ensaios reunidos nesta coletânea
é fruto daquele debate), e o Seminário Internacional Independência do Brasil: História e Historiografia,
realizado em setembro pela USP, evento de grandes dimensões que reuniu cerca de 40 especialistas de vários
países.
7
Todos de autores não-brasileiros: ver Barman, 1988; Proença, 1999; e Silva, 1988.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 23

do essa leva recente de historiadores? A que linhagens problemáticas suas investiga-


ções se filiam? De que ângulos têm enfocado o processo de emancipação política? A
que respostas, ainda que provisórias, chegaram? O que há de efetivamente inovador
nessa produção?
Diante da impossibilidade de tratar de cada título levantado, desenvolverei meu
argumento procurando rastrear nessa recente historiografia os tópicos mais pesquisados
e debatidos. De imediato, o tema que mais tem atraído a atenção dos historiadores
da independência no Brasil é a "questão nacional".

Nação

A relação entre independência e nação pode ser definida, se me for permitida a


ironia, como a discussão sobre a anterioridade histórica do "ovo" e da "galinha", ou
quem nasceu primeiro: o Estado ou a nação? Há importantes precedentes, autores
ilustres que endossaram a hipótese da anterioridade de uma "nação" ou de uma "cons-
ciência nacional" em relação à independência. 8
Em um pequeno livro, publicado pela primeira vez em 1986 e reeditado 10
anos depois, Fernando Novais e Carlos Guilherme Mota mapearam rigorosamente
as principais questões históricas e vertentes historiográficas da independência. Ao
pensar o "caráter" do movimento, os autores observaram suas contradições latentes.
Ao mesmo tempo liberal e conservador, teria sido também "nacional", "por criar a
'nação', fabricação ideológica do senhoriato para manter sua rígida dominação social e
política. Q u e m desejou ir além morreu, como frei Caneca". 9 Tal interpretação é
marcante na historiografiajjue passo a analisar.
Maria de Lourdes Vianna Lyra, em ensaio sobre a construção do mito do 7 de
setembro, 10 entende que a emancipação "não implicava ruptura com a 'mãe-pátria',
pelo contrário, baseava-se no pressuposto da unidade nacional luso-brasileira". Con-
siderando-se o estatuto colonial do Brasil frente a Portugal, a idéia de um Império
luso-brasileiro, consagrada à época e pela historiografia posterior, parece-me definiti-
vamente mais apropriada que a de "nação" para designar as relações entre Brasil e

8
Kennech Maxwell, por exemplo, entende a Inconfidência Mineira como um movimento nacionalista. Em
Maxwell (1986:142 e segs.) propôs-se a pensar a seguinte questão: "Mas por que é que, em fins do século
XVIII, Minas Gerais foi a base do primeiro movimento autenticamente nacionalista da América portuguesa?
Uma revisão minuciosa da historiografia da inconfidência desde o século XDC encontra-se em Furtado, 2002.
9
Ver Novais e Mota, 1996:13.
10
Ver Lyra, 1995.
24 A independência brasileira

Portugal anteriormente à ruptura. Em outro momento do mesmo ensaio, expõem-se


as estratégias de investigação dessa "conjuntura inicial da história nacional'. Confor-
me explorarei em detalhe mais adiante, a considerar os estudos mais recentes sobre
formação da nação e construção do Estado imperial," é tese bem aceita pela histo-
riografia que a primeira é processo que se consolida bem posteriormente, por volta
de meados do século XIX.
Em dois momentos subseqüentes de sua formação, Ana Rosa Cloclet Silva de-
dicou-se à "questão nacional" à época da independência. Em sua pesquisa de mestrado
de 1996, publicada em 1999, a autora aborda o tema no pensamento de José
Bonifácio. 12 Nota-se no texto uma certa dubiedade conceituai de origem, na patente
indistinção das nuances históricas e conceituais entre construção do Estado eformação
da nação no Brasil. Categorias e processos absolutamente coextensivos são, não
obstante, específicos o bastante para serem considerados distintos entre si. O excerto
a seguir dá a medida da questão (Silva, 1999:8, grifo meu):

O debate historiografia) sobre a formação do Estado nacional brasileiro tem sido


marcado pela presença constante da temática da escravidão. A associação entre
estes dois temas — nação e escravidão — (...) deriva do fato de que, entender
nossa formação nacional implica buscar as especificidades do contexto a partir do
qual ela se gerou, o que, no caso do Brasil, significa considerar nossa origem
colonial e escravista. Neste sentido, a compreensão do processo de construção da
nação brasileira não se dissocia destes dois traços básicos de nossa formação social,
de forma que é a relação entre eles que deve ser buscada para efeitos de se compre-
ender a dinâmica do processo em questão.

A autora refere-se ao processo de emancipação política como "independência


nacional" (p. 15). Em sua tese de doutorado,- defendida em 2000, estendem-se o
período e o tema de sua pesquisa. Os mesmos desafios teóricos presentes em sua
dissertação de mestrado reincidem na tese de doutorado, particularmente na defini-
ção conceituai de Estado e nação. Ao introduzir o segundo volume de sua tese
(p. 174), centrado na análise do acirramento da guerra peninsular e na progressiva
dissolução do sistema luso-brasileiro, a autora refere-se ao surgimento de uma "cul-
tura política" entre 1808 e 1822, que seria "específica à época da independência nacio-

11
Cf. Jancsó, 2003.
12
Ver Silva, 1999. Sobre o papel do "patriarca", ver também uma compilação de documentos em Dolhnikoff,
1998.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 25

naV. O u mais adiante, ao tratar da "fragilização do Império na luta pela hegemonia


do poder", afirma que "a partir de janeiro de 1822, as tensões transferem-se, funda-
mentalmente, para o espaço nacional!',13 De fato, do lado português, a atitude dos
restauradores do Porto pode ser definida como a busca desesperada pela reinserção
de Portugal numa situação mais confortável no equilíbrio de poder — em uma pala-
vra, a recuperação do Império, com Lisboa novamente como sua sede. Da parte das
elites locais residentes nas várias regiões da América portuguesa, a meta era antes a
manutenção dos mecanismos garantidores de suas posições privilegiadas (monopóli-
os de comércio e escravidão) do que qualquer projeto assegurador da "unidade" entre
as diversas regiões — a qual, definitivamente, não existia à época.
A "questão nacional" também é central na pesquisa de Gladys Sabina Ribeiro,
defendida em 1997 e publicada em 2002, e que tem o Primeiro Reinado de d. Pedro I
como contexto de investigação da construção da identidade nacional. Nela, discute-
se o "início da formação identitária da nação", tendo como marcos cronológicos "os
acontecimentos que precederam e sucederam o Sete de Abril, quando o país foi
(re)descoberto com a abdicação de d. Pedro I e falou-se em nova e verdadeira Inde-
pendência, liberdade total do 'jugo português'". 14
Apesar de seu objeto consistir em período posterior à independência, este assunto
é tratado. Preocupada em perceber a atuação das "camadas populares" naqueles aconte-
cimentos, a autora sugere quais seriam as grandes questões em pauta no período (Ri-
beiro, 2002:18):

Trocando em miúdos, do período anterior e posterior à Revolução do Porto até a


época da Abdicação as contendas passaram a girar ao redor de questões como
Monarquia ou República, Federalismo ou Centralismo. Quanto à autoridade,
seria esta fundamentada sobre a Soberania Nacional ou sobre a Soberania Popular'.

São questões polêmicas. A considerar os estudos sobre a Constituição de 1824


e o direito público no Império, desde o marquês de S. Vicente, nunca a soberania
esteve no "povo": a soberania era atributo do imperador, cuja vontade estava acima
da lei. 15 Por outro lado, nacional e popular não são conceitos necessariamente
excludentes. Q u a n t o à questão da nação, a complexidade analítica manifesta-se

Outros trabalhos recentes admitem o surgimento da nação antes ou durante o processo de independência.
Cf. Fernandes, 2000.
14
Ribeiro, 2002.
15
Bueno, 1978. Ver também Meneses, 1977a, 1977b e 1977c; e Saes, 1985.
26 A independência brasileira

claramente. A solução adotada na obra de reificar sentimentos e estados atribuindo-


lhes maiúsculas não soluciona satisfatoriamente o problema: "Em fins deste ano de
1821 e ao longo do seguinte, 1822, a causa da Liberdade tinha se transformado em
'Causa Nacional', entendida enquanto autonomia". 16
Muitos autores, como Sérgio Buarque de Holanda e Maria de Lourdes Lyra,
já demonstraram que a autonomia esteve sempre em pauta, pelo menos desde o
reformismo ilustrado. A manutenção da monarquia dual era perseguida pelas eli-
tes dos dois lados do Atlântico, que, todavia, diferiam quanto a questões impor-
tantes, como o papel e a ascendência de cada uma das partes na balança de poder.
"Causa nacional" é expressão problemática, talvez mesmo anacrônica, para retratar
esse momento.
Richard Graham 17 pintou um minucioso quadro historiográfico da construção
da nação no século XIX. Ele avalia a trajetória da polêmica sobre a precedência histó-
rica do Estado ou da nação e sustenta, coerentemente, a tese de que, no Brasil, "o
Estado levou à formação de uma nação, e não o contrário", embora reconheça que
não há qualquer linearidade no processo. N o que se refere ao Brasil, Graham argu-
menta que a tese de que "uma nação existiu antes do Estado independente pode ser
descartada".
Em suma, os avanços no debate historiográfico levam à conclusão de que uma
precisa distinção conceituai entre "processo de independência" e "formação da na-
ção" é um imperativo. Até em momento muito avançado da história da historiogra-
fia da independência não haveria tanto problema nessa definição: a maioria absoluta
de seus historiadores até, digamos, Sérgio Buarque de Holanda (e mesmo depois
dele) identifica a independência com o fim do jugo colonial que marcou os primei-
ros três séculos da história da América colonizada por portugueses, a serviço da coroa
lusitana. O u seja, consideram o processo da emancipação política, da separação de
Portugal daquilo que viria a ser o Brasil. Daí resulta definirem-se as principais
balizas cronológicas do acontecimento entre 1808, ano da chegada da família real
ao Brasil, ou 1821, ano do regresso do rei a Lisboa, até 1825, q u a n d o do reconhe-
cimento da independência pelas diplomacias internacionais, ou 1831, ano da ab-
dicação de d. Pedro.'

16
Ribeiro, 2002:19.
' ' Graham, 2001. Origmariamente publicado como Constructing a nation in nineteenth-century Brazil:
old and newvisions on class, culture, and che Scate. The Journal ofthe HistoricalSociety, v. 1, n. 2/3, p. 17-56,
2001. Utilizarei as citações da tradução brasileira.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 27

Com Sérgio Buarque de Holanda e, em sua linha, (Maria Odila da Silva Dias e
José Murilo de Carvalho 18 a historiografia começou a atentar para a complexidade
daquele fenômeno histórico, a partir da apropriada consideração, nele, de aspectos
correlatos que devem ser inseridos na análise da independência, como a construção
do Estado imperial e a formação da nação brasileira. Pode-se datar do texto de Maria
Odila Dias o início das periodizações que, guardando aquelas referências, estendem
o processo de independência até 1848 e além.
Em texto recente, István Jancsó e João Paulo Pimenta enveredam por tais emba-
tes historiográficos. A partir da análise dos discursos dos deputados brasileiros nas
cortes constituintes de Portugal, os autores procuram demonstrar a complexidade do
fenômeno de emergência de uma "identidade nacional", como se prefigura na dife-
renciação conceituai dos termos pátria, país e nação, veiculados naqueles discursos.
O primeiro estaria mais vinculado ao lugar de origem; "país" eqüivaleria à unidade
envolvente dessas províncias; "nação" seria um conceito mais fugidio, pois escaparia de
país e pátria. Uma nação "brasileira" inexistia ainda quando das cortes constituintes.
Jancsó e Pimenta argumentam que o processo de construção da nação — e, por
extensão, de consolidação da independência — se arrasta por pelo menos toda a
primeira metade do século XIX, ou até pouco mais além, como corroboram os mo-
vimentos insurrecionais eclodidos nas províncias. Sua hipótese é de que a instauração
do Estado brasileiro precede a difusão de um "espírito ou sentimento nacional"
(a expressão é minha), pois convive, de início, com um feixe amplo de diferenciadas
identidades políticas, com trajetórias próprias e respectivos projetos de futuro.
Os autores afirmam, com propriedade, que não se pode reduzir o processo de
formação do Estado à "ruptura unilateral do pacto político que integrava as partes da
América no império português".

Hoje é assente que não se deve tomar a declaração da vontade de emancipação


política como equivalente da constituição do Estado nacional brasileiro, assim
como o é o reconhecimento de que o nexo entre a emergência desse Estado com a
da nação em cujo nome ele foi instituído é uma das questões mais controversas da
nossa historiografia. 19

Os autores indicam em nota, com acerto, que foi obra da historiografia impe-
rial, em meio às crises recorrentes de afirmação do Império, procurar conferir ao

18
Holanda, 1970; Dias, 1972; e Carvalho, 1981 e 1988.
15
Jancsó e Pimenta, 2000:132 e segs.
28 A independência brasileira

Estado uma idealizada sustentação por meio do "resgate" do seu passado imediato,
do que resultou a elaboração do mito da "fundação tanto do Estado como da nação"
a partir do rompimento com Portugal. 20
Se atrelarmos a independência ao processo de consolidação da formação da na-
cionalidade brasileira, pode-se encontrar argumentos para afirmar que a independên-
cia é até hoje, parafraseando Carlos Guilherme Mota, uma "viagem incompleta". T ê m
razão autores como Maria Odila da Silva Dias, limar Mattos e todos aqueles elencados
por Jancsó e Pimenta, ao compreenderem que a construção da nação é^grg€esso_que se
arrasta, pelo menos, por praticamente toda a segunda metade do século XIX. Mas este
não pode se confundir com a formação do Estado ,£, menos ainda, com a independên-
cia do Brasil de Portugal, o processo da emancipação política brasileira. E é esse o proces-
so que nos interessa. A questão para a qual aqui se busca resposta é: por que aconteceu,
do modo e no momento em que se deu, a separação de Portugal e Brasil?

Unidade

A complexidade do tema torna-se patente ao se pensar a relação das distintas


regiões da América portuguesa, que em breve seriam designadas por províncias, com
o movimento emancipatório. Evaldo Cabral de Mello demonstra, com a maestria
que lhe é característica, as implicações históricas da construção do mito historiográfico
do separatismo e do republicanismo dos pernambucanos, forjado pelos segmentos
vencedores no processo da construção do Estado, na pena de seus porta-vozes cons-
pícuos: a "historiografia saquarema da Independência":

(...) isto é, a historiografia da corte fluminense e dos seus epígonos na República,


para quem a história da nossa emancipação política reduz-se à da construção de
um Estado unitário. Nesta perspectiva apõlogética, a unidade do Brasil foi conce-
bida e realizada por alguns indivíduos dotados de grande descortínio político, que
tiveram a felicidade de nascer no triângulo Rio-São Paulo-Minas e a quem a pátria

20
E apontam para as correntes historiogríficas que sustentaram as múltiplas possibilidades históricas inscri-
tas no momento do surgimento do Estado livre brasileiro, desde Caio Prado Jr. (1983) até hoje. A historio-
grafia da formação do Estado e da nação no Brasil recebeu recentemente contribuições de alta qualidade,
acrescidas aos crabalhos já clássicos de Sérgio Buarque de Holanda (1970) e de Maria Odila Leite da Silva
Dias (1972) ou limar R. de Mattos (1987). Tal historiografia revelou a alta complexidade do tema. U m
balanço dessas perspectivas encontra-se em Jancsó e Pimenta (2000:131-175), e na coletânea citada (Jancsó,
2003), que reúne os ensaios apresentados em congresso homônimo. Ver também Berbel, 1999; Souza, 1999;
Barman, 1988; Santos, 1992; e Oliveira, 1999, entre outros.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 29

ficou devendo o haverem-na salvo da voracidade dos interesses provinciais, como


se estes fossem por definição ilegítimos, e do gosto, digamos ibero-americano,
pela turbulência e pela agitação estéreis, como se Eusébio, Paulino ou Rodrigues
Torres não fossem representantes de reivindicações tão regionais quanto as de
Pernambuco, Rio Grande do Sul ou do Pará.21

O argumento do eminente historiador pernambucano é extremamente sagaz,


ao descortinar os vícios de uma historiografia que se impôs "nacional". Ao longo do
Império, Pernambuco viveu a permanente suspeita de separatismo por parte dos
grupos dirigentes da monarquia, em função do papel geopolítico desempenhado
pelo entreposto comercial recifense, sede administrativa de u m a i m p o r t a n t e
macrorregião. A historiografia oficial do regime imperial encampa a acusação, pois
angaria para as províncias do Sul o mérito da obra de construção da nacionalidade
brasileira. Só com o marquês de Paraná se realizaria a condição fundamental para a
unidade, que foi a abertura de espaço no poder central para as oligarquias nortistas.
O argumento de Evaldo Cabral de Melo é que não poderia ter havido separatismo
em 1817 e 1824, já que inexistia constituída uma nação brasileira nesse momento. 2 2
Essa mesma concepção, da precedência do Estado à nação, que certamente seria
defendida por Eric Hobsbawm (1990) também para o caso brasileiro, é reiterada
firmemente por Manuel Correia de Andrade em ensaio sobre os projetos políticos no
tempo da independência, no qual o autor afirma o isolamento das províncias, no
sentido de que não havia idéia ou sentimento de "unidade", de pertencimento, por-
tanto de nação, pátria ou algo que o valha naquele quadrante histórico. De acordo
com o autor, d. João tentou aliviar as tensões originadas da condição colonial com a
elevação do Brasil à categoria de reino, a ser unido a Portugal e Algarves. "A condição
de Reino Unido dava à elite dirigente uma idéia de Independência, com a manuten-
ção do status quo~, com isto, tentava-se unir as províncias que até então tinham pouca
vinculação entre si".23

21
Melo, 2001:16 e segs.
22
"É conhecida a antipatia de Varnhagen pela República de 1817, a cujo respeito confessa na História do
Brasil teria preferido silenciar, o que fará na História da Independência. Malgrado essa aversão, ele absteve-se
de caracterizá-la de separatista, cônscio provavelmente de que constituiria anacronismo criticá-la por isto,
quando o que existia então não era a unidade nacional, mas a unidade do Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves proclamado em 1815" (Mello, 2001:19). Evaldo Cabral de Mello desenvolveu sua "desconstrução"
da versão saquarema da independência em seu novo livro (ver Mello, 2005). O trabalho de Denis Bernardes
(2002) vem também contribuindo significativamente para a revisão do papel de Pernambuco no processo de
independência.
23
Andrade, 1999:60.
30 A independência brasileira

Manuel Correia de Andrade assim reitera tese já sustentada anteriormente em


ensaio clássico de Sérgio Buarque de Holanda (1970:9, 18), que magistralmente
sugeria que, "no Brasil, as duas aspirações — a da Independência e a da unidade —
não nascem juntas e, por longo tempo ainda, não caminham de mãos dadas":

(...) no tempo do rei velho o país parecia organizado como uma "espécie de fede-
ração, embora a unidade nacional devesse, ao contrário, ser mais favorável aos
progressos de toda ordem". Essa unidade, que a vinda da corte e a elevação do
Brasil a reino deixara de cimentar em bases mais sólidas, estará ao ponto de esface-
lar-se nos dias que imediatamente antecedem e sucedem à proclamação da Inde-
pendência. Daí por diante irá fazer-se a passo lento, de sorte que só em meados do
século pode dizer-se consumada.

Evaldo Cabral de Melo endossa a mesma tese, assim como Graham, no ensaio
já mencionado. Para este último, reiterando proposição clássica de Oliveira Lima, a
chegada da corte representou um marco definitivo da independência do Brasil. Mas
o "Brasil", em si, sequer existia. De acordo com Graham, independentemente do
desejo de liberdade que nutriam as pessoas das diferentes províncias em relação a
Portugal, a ninguém agradava a idéia do poder centralizado no Rio de Janeiro.
A unidade, nas colônias, não era assegurada por qualquer suposta identidade
nacional, mas pela eficácia da burocracia de Estado metropolitana, conforme de-
monstraram Afonso Carlos Marques dos Santos (1992:141). e István Jancsó
(2002:10).
Enfim, compartilho da periodização proposta por Sérgio Buarque de Holanda,
corroborada por Evaldo Cabral de Melo, que distingue a independência, entendida
como processo de emancipação política (que se pode situar entre 1808 e, no máxi-
mo, 1831), do processo de construção do Estado imperial (que, sem dúvida, se inicia
nesse interregno, com as atividades da Assembléia Constituinte em 1823, a outorga
da Carta em 1824 e a aprovação do Código Criminal em 1830 2 4 ) e da formação de
uma nacionalidade brasileira, esta ainda mais posterior. N ã o obstante, concordo em
que tais processos são umbilicalmente ligados e que a independência não estaria
consolidada antes da finalização da construção do Estado (vale lembrar que o Códi-
go Comercial, simulacro de um Código Civil que só aconteceu na República, é de

24
Para uma contextualização desses primórdios da estruturação do Estado imperial, ver Carvalho, 1981 e
1988; Malerba, 1994; e Saes, 1985.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 31

1850 25 ) e da difusão de uma concepção de nação (muito beneficiada por nosso ro-
mantismo nativista).

Periodização

Talvez a tentativa de estabelecimento de referenciais historiográficos do proces-


so de independência mais bem-sucedida seja a proposta por José Honório Rodrigues.
Pioneiro e entusiasta dos estudos historiográficos no Brasil, Rodrigues não poderia
deixar de incluir uma carta de orientação bibliográfica de estudos da independência
na grande obra histórica que deixou sobre o tema. Não cabe aqui entrar no mérito da
proposta de periodização do processo, situada entre abril de 1821, ano do regresso de
d. João a Portugal, e agosto de 1825, com o Tratado de Reconhecimento da Indepen-
dência. 26 Por entender a independência como revolução, José Honório enquadra
autores como Oliveira Lima na categoria dos "ortodoxos". Para tomar um exemplo
entre os clássicos, O movimento da independência seria, nesse sentido, "uma síntese
bem feita", cujo principal defeito seria ter negligenciado os aspectos econômicos e
sociais. A ortodoxia o situaria entre aqueles "que não só reconhecem os benefícios do
governo de d. João, como sua influência direta no movimento". O u seja, aqueles que
assumem o papel decisivo de d. João no processo de emancipação renegariam a inde-
pendência como revolução: seriam, portanto, ortodoxos e conservadores.
O problema da periodização da independência abre para as diversas interpreta-
ções e suas ênfases nos aspectos políticos/diplomáticos e econômicos e sociais, e incide
diretamente na questão da duração do movimento.
Maria de Lourdes Vianna Lyra (1995) produziu ensaio para discutir se o "7 de
setembro" representa ou não o turningpoint da independência, visando apreender a
dimensão simbólica dessa baliza com o objetivo de "buscar na forma de sua represen-
tação os condicionantes políticos que encaminharam à definição do Grito do Ipiranga
como marco fundante da nacionalidade brasileira". Tal abordagem produz resultados
análogos aos daquelas^outras, que buscam obstinadamente negar o mito da Functãçâor
como a obra de Morivalde Calvet Fagundes (1997). De suas investigações sobre ãs
correspondências e relatos referentes ao 7 de setembro, Vianna Lyra (1995:179, grifo
meu) pode inferir:

O olhar mais atento aos registros da imprensa ou aos discursos políticos sobre os
acontecimentos de 1822, e sobre as repercussões ocorridas na sociedade da época,

25
Saul, 1989.
26
Rodrigues, 1975, v. 3, p. 255.
32 A independência brasileira

revela não apenas omissões ou desencontros freqüentes quanto ao marco definidor


de ruptura da unidade luso-brasileira, isto é, sobre a data precisa da Independência,
mas evidencia ainda o completo silêncio quanto ao Sete de Setembro como o
marco definitivo da proclamação da Independência, representação que se tornaria
no símbolo maior da memória nacional.

A busca da data precisa" da fundação da nação tende à abordagem que


desconsidera, necessariamente, a independência como Drocesso, centrando o foco
exclusivamente em seu aspecto político. Em tal abordagem os condicionantes sociais
fundamentais, como a própria redefinição das elites no período 1808-20, acabam
em segundo plano.

"Caráter" da independência

A discussão em torno do caráter da independência define o entendimento do


processo e sua periodização. A questão foi claramente enunciada pelos professores
Fernando Novais e Carlos Guilherme Mota. Teria sido revolucionária? Reformista?
Conservadora? Eles estão corretos ao afirmar que a historiografia varia no estabeleci-
mento das datas-baliza, tanto da deflagração quanto da conclusão do processo. Se-
guindo José Honório Rodrigues, a historiografia ora engloba o período joanino e
chega ao período regencial (1831 ou até mesmo 1840), ora restringe-se aos fatos
luminosos ocorridos entre 1821 (a volta de d. João a Portugal) e 1825, quando dos
primeiros tratados de reconhecimento pelas diplomacias internacionais. E acertam
novamente os autores uspianos na crítica à interpretação de José Honório, segundo a
qual as periodizações pautadas na periodização mais longa vincular-se-iam a uma
perspectiva conservadora, que acentua a continuidade, enquanto a perspectiva libe-
ral explicitaria a ruptura. Concluem Novais .e Mota\(1996:18):

Ora, colocada a questão nessa dicotomia, fica de fora um terceiro caminho, que
precisamente nos parece o mais acertado: encarar a independência como momento
inicial de um longo processo de ruptura, ou seja, a desagregação do sistema colonial
e a montagem do Estado nacional.

Quer-me parecer que essa terceira perspectiva indicada, post-factum, é eivada de


teleologia. Isso porque a questão da montagem do Estado nacional sequer estava
claramente enunciada no processo de ruptura. As pesquisas de Márcia Berbel e Ma-
ria de Lourdes Lyra demonstram categoricamente que a separação deveu-se mais à
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 33

falta de competência das elites de ambos os lados do Atlântico em preservar a monar-


quia dual — que era o mote da maioria dos constituintes brasileiros até avançado
momento da Assembléia — , do que a um desejo latente de implantar um Estado
"nacional".
Tnsere-se nessa discussão das balizas temporais, assim como do caráter da inde-
pendência, a avaliação sobre o peso da transferência da corte para o Rio de Janeiro.
Sierra y Mariscai (1920) talvez tenha sido o primeiro a enunciar claramente o proble-
ma. Entendia que a independência já era um processo em marcha, retardado, contu-
do, pela chegada da família real. Obras recentes acresceram pesquisa e argumentos ao
debate. 27 Q u a n t o a afirmar que a chegada da corte protelou a independência, eu
diria que sim e que não. Sim, porque a chegada do rei ao Brasil abriu para o lado
mais forte da contenda (as classes superiores brasileiras) a possibilidade de vislum-
brar saída menos traumática que a ruptura. Não, porque a vinda da corte significou
um passo decisivo, do qual não haveria como retroceder. De um modo ou de outro,
pela conciliação ou pela ruptura, estava lançada a pedra fundamental da indepen-
dência.
Esse debate sobre o caráter da independência tende, no âmbito da historiogra-
fia, a endossar interpretações cristalizadas, como as que contrapõem interesses e/ou
grupos "portugueses" e "brasileiros". Tal atitude acaba por obliterar a visão do papel
de agentes históricos importantíssimos, aos quais a historiografia recente não tem
prestado a devida atenção. Refiro-me especialmente ao papel decisivo desempenha-
do pelo rei, como chefe de sua casa dinástica, no processo de independência.
Foi Sérgio Buarque de Holanda, mais uma vez, quem teve sensibilidade para
observar que "(...) o 7 de setembro vai constituir simples episódio de uma guerra civil
portuguesa., e onde se vêem envolvidos os brasileiros apenas em sua condição de por-
tugueses do aquém-mar. O adversário comum está, agora, claramente nas cortes de
Lisboa \ 2 8 Deve ter ocorrido a d. João, ou a seus conselheiros, o trunfo que o Brasil
representava, após o rei ter sido desafiado pelas cortes de Lisboa. I s t v á n j a n c s ó
(2002:25) também assim percebeu, enfocando o projeto de formulação imperial dos
Bragança do ângulo de sua aceitabilidade em terras brasileiras:

Os Bragança formularam e implementaram o seu projeto imperial, e este se refor-


çou na América pois atendia às expectativas das elites locais. Aqui, ao contrário da

27
Cf. tese de doutorado de Kirsten Schultz pela N Y U em 1998, publicada como Schultz, 2001; Souza,
1999; Schwarcz, 1998; Sleiman, 2000; Malerba, 2000; e Lopez, 2001.
28
Holanda, 1970:13, grifo meu.
34 A independência brasileira

América hispânica, o conservadorismo político das elites encontrou no projeto


imperial o instrumento de sua efetividade e os meios para o rompimento dos
particularismos que no período anterior se apresentavam como demarcadores dos
limites de seus projetos políticos possíveis.

Mas há uma face oculta nesse ponto. Aceitando-se que d. João tenha sido
desafiado quanto às dimensões de seu poder pelos vintistas, pode-se entender a
independência do Brasil como um m o m e n t o dessa queda-de-braço. O s liberais de
1820 deflagraram um verdadeiro golpe de Estado contra o rei. ao lhe imporem a
aceitação de uma Constituição ainda por ser feita e seu retorno incondicional ao
reino, assim como a retomada da pauta de discussões sobre as relações bilaterais
entre Brasil e Portugal. 29 Por seu turno, o contragolpe do rei foi desferido contra as
cortes vintistas, um verdadeiro "contragolpe" de Estado, ao aceitar a Constituição
e o retorno, mas mantendo o príncipe herdeiro no Brasil. Esse ato sinalizou clara-
mente que o custo do acinte dos revolucionários vintistas seria a perda definitiva
da colônia, um preço caríssimo para os portugueses. Por outro lado, d. Pedro era
herdeiro de d. João e, morrendo o pai, ironicamente corria Portugal o risco de ser
colonizado pelo filho.
Até" então as discussões caminhavam bem, no sentido da construção de um
novo império liberal transoceânico. A pressão dos grupos brasileiros para a perma-
nência do príncipe e a ferrenha oposição a esta por parte das cortes de Lisboa podem
ser tomadas como o turning point da separação. A partir daí as possibilidades de
entendimento tornaram-se cada vez mais distantes. A partir daí, também, a capaci-
dade de arregimentação e liderança de Bonifácio foi decisiva para a unificação dos
discursos dos diversos grupos de interesses localizados no Brasil e, doravante, reves-
tiu-se o príncipe de papel político que até então lhe era totalmente estranho. A
simbologia construída em torno do "Fico" serve-lhe de testemunho.
Um segundo momento, este sim derradeiro, deu-se nos embates dentro das
cortes em Lisboa. Em certo sentido, faz nexo a afirmação de Maxwell (1986:387) de
que "o verdadeiro movimento pela independência da colônia verificou-se na Europa,
e foi ele a revolução portuguesa de 1820". Foi a ela que d. João respondeu com um
golpe de Estado, franqUéãnclõ a independência às elites brasileiras com o preço de
manter-se a coroa em sua casa.

Embora não se tratasse mais de restaurar a antiga condição colonial, completamente intangível naquele
momento, como provam as pesquisas mais recentes de Márcia Berbel.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 35

Se as juntas mais ativas do Brasil, como as de Sáo Paulo e Pernambuco, con-


cordavam com as de Portugal quanto à questão da integridade e da indivisibilidade
do Reino Unido, divergiam irreconciliavelmente quanto aos papéis de ambas as
partes e quanto ao local da sede da monarquia. A adesão de todos ao sistema libe-
ral, que significaria a extirpação da ameaça da independência absoluta do Brasil,
esbarrava nas diferentes posturas quanto ao poder de m a n d o na nova configuração
política que se buscava. N o início d e 1822, d e p u t a d o s brasileiros, c o m o o
pernambucano Muniz Tavares, já respondiam abertamente com a separação total
às posturas recolonizadoras, manifestadas, por exemplo, na ameaça de envio de
tropas militares portuguesas para o Brasil. C o m o observa acertadamente Maria de
Lourdes Lyra (1994:208):

O projeto de emancipação sem desligamento, ou seja, o modelo de Estado cons-


tituído em Reino Unido, começava a naufragar face à [jíc] insatisfação dos portu-
gueses da Europa em relação às démarches da política de unidade luso-brasileira.

A partir daí, os grupos de interesse elevaram o príncipe herdeiro a agente histó-


rico, sendo a radicalização o caminho seguido. O resto jaz na retórica panfletária, nas
memórias edificantes e no cipoal de fatos que preenchem a narrativa da vasta histo-
riografia sobre a "independência".

Camadas populares

Leslie Bethell (1985:166 e segs.) já afirmara certa vez que a independência foi
obra das elites, de segmentos superiores oriundos de ambos os lados do Atlântico.
Trata-se de questão fartamente trabalhada pela historiografia, mas que, ainda sim,
gera controvérsias.
Contundente — e menos simpático em função de seu aspecto aparentemente
conservador — é o entendimento de Manuel Correia de Andrade (1999:63) de que
"o povo não usufruiu das conquistas da Independência, pois foi um movimento de elites
para elites". Conforme mencionado anteriormente, José Honório Rodrigues designa
como ortodoxos e conservadores os historiadores que datam o início da independên-
cia ao tempo da chegada da corte ao Brasil. Tal entendimento negaria o caráter revo-
lucionário da guerra da independência, deixando prevalecer o papel desempenhado
por d. João e o decorrente caráter elitista e conciliatório do movimento. Contrarian-
do os rótulos de José Honório Rodrigues, diria que conservador não é o historiador
36 A independência brasileira

que atribui peso à obra de d. João, nem quem relativiza o papel desempenhado pelo
povo. Conservador foi o processo em si.30^
Mas o assunto é polêmico e, nas duas últimas décadas, não se avançou muito no
conhecimento do papel desempenhado pelas classes populares — escravos, libertos,
homens livres pobres — no processo de independência. Por exemplo, os esforços de
Gladys Sabina Ribeiro no sentido de enquadrar a participação popular no movimen-
to de independência acabam pintando o cenário com tintas estranhas ao quadro. Em
seu A liberdade em construção, a autora procura situar a participação do "povo", que
sempre surge em seu texto entre aspas e em caixa alta. Mas definir quem era esse
"povo" torna-se tarefa malgrada. Vê-se nos documentos de época "o povo" assinar
manifestos, posicionando-se contra ou a favor a independência, o povo contra o
povo. Falta saber quem escrevia em nome do povo!

O "Povo" tinha bastante nitidez quanto aos seus objetivos e sabia as potencialida-
des do país, lançando da mesma forma mão da ameaça. (...) O "Povo" era por
demais organizado. Tinha em mente, principalmente, os problemas econômicos,
que podiam abalar a "segurança" e a "prosperidade" do Reino.

Gladys Ribeiro (2002:38 e segs.) acaba por concluir que o "Povo" era o "partido
brasileiro", que pugnava pela preservação da unidade pela via monárquica e constitu-
cional.
Já os estudiosos da escravidão avançaram um passo largo na mesma problemática.
Em ensaio muito citado, publicado em 1989, João José Reis analisa a participação dos
negros nas lutas pela independência na Bahia. Para Reis, além dos tradicionais parti-
dos políticos, outros agentes disputavam interesses nas lutas da independência. E o
caso dos escravos, que a viam como uma possibilidade de alcançar sua alforria. A
indeterminação posterior ao contexto turbulento da revolução do Porto, que na Bahia
gerou forte reação militar ao 7 de setembro por parte das tropas portuguesas, possi-
bilitou o surgimento de um cenário tal que permitiu aos escravos participarem de
discussões sobre questões candentes como liberdade política. Sem dúvida, em suas
pesquisas pioneiras sobre os caminhos da liberdade no Brasil escravista, João José

Essas linhagens historiográficas, uma que entende a independência como processo revolucionário e outra
que não, perduram. Na linha de Honório Rodrigues, ver Diégues (2004). Nessa obra, a independência é
analisada pelo viés da estratégia e da guerra e, nela, se encontra a ação de Bonifácio, rejeitando o "mito"de
uma independência incruenta.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 37

Reis contribuiu para a abertura de outras dimensões do processo de independência


até então negligenciadas pela historiografia. 31
No mesmo sentido avançam os resultados de pesquisa de Hendrik Kraay (2001).
Vou tomar seu artigo sobre o recrutamento de escravos na Bahia à época da indepen-
dência 32 como pretexto para demonstrar meu ponto de vista sobre a dificuldade de
se investigar o papel das camadas populares no processo de independência.
Kraay mostra que o recrutamento de escravos na Bahia "fora um esforço impro-
visado, que não foi ordenado nem regulado por decreto". O problema estava na
alforria que os escravos alistados esperavam e na posição de seus senhores perante o
Estado, no sentido da expectativa de indenização. Kraay insiste na necessidade de
diferenciar entre "escravo" e "liberto" na análise do recrutamento. A participação dos
últimos não trouxe maiores problemas. Em 1823, Pierre Labatut os recrutara. Mas...

A questão dos escravos era bem diversa. Há indícios de que, já em setembro de


1822 (antes da chegada de Labatut), patriotas pretendiam usá-los. Maria Quitéria
de Jesus contou depois a Maria Dundas Graham que patriotras então queriam
obrigar seu pai, um português, a contribuir com um escravo, pois não tinha filhos
para dar ao exército. A resposta dele — "que interesse tem um escravo para lutar
pela Independência do Brasil?" — sem dúvida refletia atitudes bem difundidas...
(Kraay, 2002:112)

Esse é ponto central para mim. O ensaio de Kraay trata com propriedade a
questão de como a independência, indiretamente, pela via do recrutamento (ou por
outras vias mais sutis, como a boataria, o imaginário) mexeu com assuntos delicados
como a condição dos cativos e os horizontes de liberdade que a guerra suscitara. Mas
avia contrária não faz parte de seu objeto, nem de outros estudos que eu conheça: em
que medida a escravidão, enquanto instituição, e os escravos, enquanto grupo ou classe
social, contribuíram -para o processo de independência do Brasil ante Portugal?. Isso é
muito diferente de se analisar os vários grupos sociais ou camadas populares à época
da independência, ou como a independência incidiu em suas vidas. Sem dúvida, os
trabalhos de autores como Reis, Kraay e Luiz Geraldo Santos da Silva33 contribuem

31
Cf. Reis, 1989:79-98. Para uma abordagem mais ampla do papel da Bahia no processo da independência,
ver Wisiak, 2001.
32
Kraay, 2002.
33
Ver os capítulos 10, de Kraay, e 11, de Silva, neste livro.
38 A independência brasileira

significativamente para sanar essa lacuna historiográfica, a qual, contudo, reclama


contínuo investimento de pesquisa.

O "sentido" da independência

Nas próximas duas seções vou tentar sintetizar, numa abordagem ampla, o que
me parece ser o mote que fez avançar as interpretações sobre a independência e o
caminho a seguir para continuar esse avanço. Nesse sentido, talvez seja necessário um
deslocamento do eixo da discussão do plano historiográfico para u m plano um pou-
co mais estritamente teórico.
Não parece exagero afirmar que o enquadramento teórico predominante e mais
influente na historiografia da independência, pelo menos desde os anos 1960, é aquele
derivado da abordagem de Caio Prado Jr. Partindo de um ponto de vista marxista,
ele procurou entender o "sentido" da colonização, inserindo a história do Brasil n u m
contexto senão planetário, pelo menos ocidental. A história do Brasil explicar-se-ia,
nessa ótica, como um derivativo da história européia, no contexto da expansão do
capitalismo comercial. Nessa tese jaz a base das teorias da dependência.
Quem melhor definiu a independência a partir dessa perspectiva foram Fernando
Novais e Carlos Guilherme Mota, no já clássico 1822: dimensões, organizado por
Mota (1972). Para os professores da USP, é a subordinação do Brasil a um sistema
econômico mundial, unificado sob o capitalismo comercial, que dá sentido ao curso
da independência.

(...) qualquer estudo que vise uma síntese compreensiva da emanciapação política
da América portuguesa [deve] situar o processo político da separação colônia-
metrópole no contexto global de que faz parte, e que lhe dá sentido-, e, só então,
acompanhar o encaminhamento das forças em jogo, marcando sua peculiaridade.
(Novais e Mota, 1996:17, grifo meu)

Esse ponto de vista é desenvolvido no capítulo "Contexto" (1996:22 e segs.). A


colonização seria um instrumento de "acumulação primitiva (isto é, acumulação pré-
via necessária à formação do capitalismo) de capital comercial nas áreas centrais do siste-
ma)" — e a independência do Brasil não mais que um efeito do desmantelamento da
sociedade do Antigo Regime, ou, como dizem os próprios autores, da passagem do
feudalismo para o capitalismo, de longuíssima duração.
Por certo ninguém nega a importância dessa contextualização histórica. O
desmantelamento da sociedade feudal, cuja falência do absolutismo e a crise do An-
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 39

tigo Regime são dois aspectos derradeiros, são o pano de fundo da cena histórica.
Para usar a metáfora teatral, o pano de f u n d o enquadra, estabelece os limites em que
agem os personagens, mas absolutamente não lhes determina as falas e ações. É um
equívoco teórico procurar explicar um fenômeno eminentemente político com ex-
plicações macroestruturais de longa duração. E usar a ferramenta errada, como atirar
um míssil para derrubar uma ave. A política, como ensinou Gramsci (1975), é o
lugar da luta dos grupos e indivíduos, onde projetos e desejos individuais e coletivos
digladiam-se por estabelecer uma hegemonia. Se fôssemos buscar as razões (o senti-
do, por que não?) da independência em movimentos estruturais de longa duração,
poderíamos então atribuí-la à queda do Império romano, precursora da formação da
sociedade feudal, da qual a crise do Antigo Regime marca o ocaso.
Trata-se de uma interpretação engessada em quadros interpretativos de ferro,
que retiram do processo histórico toda a cor e todo o brilho das relações sociais
vividas pelos agentes. U m processo eminentemente social e político torna-se uma
derivação de um macroprocesso econômico. O conceito de "sistema", com seus me-
canismos, deságua numa estrutura rígida, como o autômato de Walter Benjamin 34
ou as maquinarias com que T h o m p s o n (1978) ironizou Althusser:

Eis aí as peças do antigo sistema colonial: dominação política, comércio exclusivo


e trabalho compulsório. Assim se promovia a acumulação de capital no centro do
sistema. Mas, ao promovê-la, criam-se ao mesmo tempo as condições para a emer-
gência final do capitalismo, isto é, para a eclosão da Revolução Industrial. E, dessa
forma, o sistema colonial engendrava sua própria crise, pois o desenvolvimento
do industrialismo torna-se pouco a pouco incompatível com o comércio exclusi-
vo, com a escravidão e com a dominação política, enfim, com o antigo sistema
colonial (...) A crise do antigo sistema colonial parece, portanto, ser o mecanismo de
base que lastreia o fenômeno da separação das colônias (...) Trata-se, antes de tudo, de
inserir o movimento de Independência no quadro da crise geral do colonialismo
mercantilista.
(Novais e Mota, 1996:22-23, grifo meu)

Entendido o funcionamento da máquina, sua "dialética", está dada a história...


Assim, a partir de tal enquadramento teórico, a discussão sobre o caráter da inde-
pendência torna-se totalmente epifenomenal. Seriam meras "vertentes do mesmo

' Benjamin, 1992:245-255. U m a excelente interpretação das "teses" de Benjamin encontra-se em Cardoso
Jr., 1996:51-60.
40 A independência brasileira

processo de reajustamento e ruptura na passagem para o capitalismo moderno, na


segunda metade do Setecentos e primeira metade do Oitocentos". 35 Contida nessa
definição encontra-se veladamente o pressuposto de que a independência não foi
senão um ponto no longo processo de desmantelamento do Antigo Regime europeu
e do antigo sistema colonial.
Se, por um lado, pode-se aceitar sem maiores dificuldades que o planeta forma-
va um "sistema-mundo" desde a expansão européia na era moderna, tal como pro-
posto por Fernand Braudel e Immanuel Wallerstein, 36 isso não deve necessariamente
fazer derivar as histórias de diferentes povos do globo desse processo unilinear que é
o da suposta vitória da civilização ocidental e sua afirmação econômica, política,
militar e cultural sobre as partes conquistadas. N o âmbito da consciência histórica e
da produção historiográfica, a aceitação de tal proposição fundamenta-se na aceita-
ção de uma master narrative,37 justamente a daquela marcha vitoriosa de um projeto
de humanidade, ao qual todas as demais histórias estariam subsumidas. A concessão
de uma suposta "autonomia relativa" do processo nas colônias não supera a viga
mestra do argumento, segundo a qual o que se passa na periferia é um eco do proces-
so europeu. É desse enquadramento que os estudos históricos precisam libertar-se
para fazer avançar o conhecimento não apenas da independência, mas de toda a
história da América portuguesa.

Considerações finais: centrando o foco nos agentes


da independência

Única tentativa de análise do processo de emancipação numa perspectiva não


apenas continental mas global é o ensaio de István Jancsó já referido. A premissa é
correta: o Estado nacional brasileiro se diferencia das variantes latino-americanas no
sentido da manutenção da unidade, e m b o r a n ã o houvesse nenhuma inexorabilidade
histórica em qualquer um dos casos. A formação dos Estados nacionais europeus
deve ser compreendida dentro da crise do Antigo Regime, conforme mencionado
anteriormente. O desdobramento latino-americano dessa crise seria uma dimensão

35
Tal interpretação influenciou enormemente e continua a influenciar a historiografia brasileira. Ana Rosa
C. Silva (1999:160 e 167) é u m exemplo, entre vários.
36
Ver Braudel, 1985; e Wallerstein, 1979, 1984 e 1989.
3/
A bibliografia sobre o problema das master narratives é imensa. Uma boa compilação do debate é Roberts,
2001. Ver também Rüsen, 1996. As críticas de historiadores e filósofos pós-modernos e pós-colonialistas
tratam diretamente do assunto. Ver Crowell, 1998; Klein, 1995; e Nandy, 1995.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 41

particular do fenômeno geral, "mas que preserva especificidades, inclusive no caso


brasileiro". Também é absolutamente correta a percepção do problema "nacional":

para os homens da época, vivessem em qualquer região que fosse da América


ibérica, ao menos até o final do século XVIII e início do XIX, a sua identidade
política passava pelo reconhecimento ou pela negação de realidades entre as quais a
nacional era a menos nitidamente definida.
(Jancsó, 2002, grifo meu)

As especificidades a que se refere Jancsó são fundamentadas teoricamente com o


conceito althusseriano de "autonomia relativa" do processo nas colônias. Seu avanço
em relação às formulações de Novais está em que, de acordo com Jancsó, a crise do
Antigo Regime europeu e do sistema colonial são panos de fundo, cenários, que
estabelecem os limites de ação e as possibilidades de solução para os homens da
época em suas diferentes realidades coloniais. A crise européia seria um pressuposto,
um ponto de partida. Os processos emancipatórios precisam ser entendidos e expli-
cados em suas nuances locais.38
Se assim não fosse, como explicar os comportamentos diferenciados das di-
versas regiões do Brasil no tocante à adesão ou à refração ante a independência
encabeçada pelo Centro-Sul? E necessário olhar de perto os interesses que motiva-
ram as ações de indivíduos pertencentes a grupos — ou configurações — específi-
cos. O exemplo do c o m p o r t a m e n t o das províncias em resposta ao anúncio das
cortes de Lisboa dá a medida da complexidade da questão. E dá a medida para a
compreensão disso que a historiografia quer entender como entidade una: "Bra-
sil". Foi o Pará a primeira província a aderir aos chamados de Lisboa, em janeiro de
1821. Na Bahia, a 10 de fevereiro, nas palavras de Maria Beatriz Nizza da Silva, "os
comandantes e a oficialidade da tropa de linha da guarnição da cidade decidiram
jurar a Constituição que fosse feita em Portugal e, interinamente, adotarem a Cons-
tituição da Espanha":

Quando a notícia da adesão da Bahia às cortes de Lisboa chegou ao Rio, a 17 de


fevereiro, a crise política agudizou-se. Caíra por terra a tese do autor do folheto
francês de que d. João VI estava numa posição de força porque o Brasil lhe perma-
neceria fiel...35

38
Jancsó, 2002:6.
39
Silva, 1986, v. 8, p. 405. Também Lyra, 1994:193; e Silva, 2000:291 e segs.
42 A independência brasileira

Mas "quem" era o Brasil? Já me referi à questão da unidade, ou da falta dela,


quando do movimento da independência. J á não é mais cabível a tese simplista de
que o "Brasil" se libertava de Portugal. Não se pode precisar em que medida contri-
bui para o e n t e n d i m e n t o do processo a prática do velho hábito idealista de
antropomorfizar entidades inumanas, como faz a determinada altura de sua tese Ana
Cloclet Silva (2000:162), ao atribuir à Colônia (o Brasil) o papel de sujeito: "(...) o
fato de o m u n d o colonial emergir como o objeto privilegiado das investigações em-
preendidas pelos espreitadores da natureza' sediados no Reino não eliminava a con-
dição de sujeito que, simultaneamente, o mesmo assumia nesse processo de reorien-
tação da política imperial". Se a idéia é mudar o foco das determinações estruturais
para a ação dos "sujeitos", ações movidas com respeito a fins, por interesses, torna-se
um imperativo precisar quem são efetivamente esses "sujeitos".
A discussão atinge aqui um ponto bastante complexo. Vale notar que a historio-
grafia é atenta à existência de projetos políticos diferentes e em confronto nos anos
decisivos da independência. Renato Lopes Leite (2000) dedicou-se ao estudo do
republicanismo e dos republicanos no Rio de Janeiro à época da independência.
Manuseando prodigiosa documentação primária, que enriquece fartamente seu li-
vro, sua pesquisa centra-se particularmente na figura de João Soares Lisboa, redator
do Correio do Rio de Janeiro, que circulou em 1822, em meio a um turbilhão de
outros periódicos. Ainda que em seu capítulo primeiro faça uma diferenciação do
conceito de "republicano" à época e no século XX, é necessário grande esforço para
concordar com sua tese de que não teria havido contradição no apoio dos republica-
nos à monarquia constitucional representativa de 1822. Segundo o autor, o "com-
promisso monárquico-constitucional" dos "libertários" para com o novo príncipe
não é suficiente para se negar, como fez a historiografia da independência até então,
a existência e a importância do republicanismo naquele período. D e seu ponto de
vista, o Fico, o 7 de Setembro e a Coroaçao são "meras construções simbólicas que
(...) não justificam ou explicam o monopólio da visão 'verdadeira' e correta' do 'não-
separatismo da nação'". 40 O autor propõe a hipótese instigante, por exemplo, de que
a suposta unanimidade em prol da permanência de d. Pedro no Brasil é uma "inven-
ção simbólica do imaginário político da época", já que os republicanos eram contrá-
rios à permanência do príncipe.
Mas como se explicaria, então, tão abruptas mudanças de opinião e de partido?
Se ficarmos no plano das idéias, jamais conseguiremos responder com clareza à ques-

40
Leite, 2000:52 e segs., grifo meu.
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 43

tão. O manuseio desse tipo de fontes (periódicos e panfletos) não pode prescindir do
imperativo da dúvida pirrônica. Não é possível se aproximar do contexto de enunciação
de seu sentido sem se duvidar, a princípio, do teor do que é veiculado, único modo
de se evitar o chamado "fetichismo do objeto". As idéias, numa guerra, são armas que
são utilizadas conforme o calor da batalha — e o historiador tem que ter o distancia-
mento crítico necessário para não se deixar convencer pela retórica da época. O fato
de que pessoas se diziam republicanas, ou mesmo por vezes defendiam em panfletos
teses "libertárias", não faz daquelas pessoas republicanos ou libertários. Nesse parti-
cular, foi Isabel Lustosa quem melhor apreendeu o sentido das práticas de jornalistas
e panfletários na época da independência.

O maior grau de adesão do auditório ao que se discursa faz parte dos méritos do
bom orador, independentemente do maior ou menor grau de verdade contido na
mensagem que se propõe transmitir. (...) Tal como o pregador do alto do seu
púlpito, encarando sua platéia e apurando a garganta para soltar a voz, o jornalisrta
defronte da escrivaninha apontava sua pena de pato e pensava na reação de quem
iria ler as linhas que lançaria sobre o papel. Seu objetivo, principalmente naquele
momento em que se dividiam tão radicalmente as opiniões, era ganhar para sua causa
o público leitor.:41

Não é dizer que aqueles homens a quem Leite categorizou de republicanos e


libertários, como Joaquim Ledo, Januário da Cunha Barbosa, José Clemente Pereira
e João Soares Lisboa, não acreditassem nas palavras, teses e estratégias que professa-
vam. Mas parece faltar maiores investigações sobre os motivos que levaram homens
de idéias tão claras e determinadas a mudar de opinião, sem qualquer vacilo, em
determinadas circunstâncias. Não obstante, o livro de Lopes Leite traz uma contri-
buição fundamental ao debate, que precisa ser mais explorada, ao resgatar o papel
desempenhado pelos projetos perdedores no processo de independência.
Aquela dificuldade metodológica básica sobre a relação entre discurso, agente e
ato pode ser estendida a outras formações sociais gregárias da época. Quero dizer, as
pessoas não se engajaram contra ou a favor da independência apenas por professar
ideais republicanos ou monárquico-constitucionais ou monárquico-absolutistas. Nem
porque pertenciam ou deixavam de pertencer a esta ou aquela confraria ou sociedade
secreta. O exemplo da maçonaria é bastante feliz nesse caso. Alexandre Barata, em

41
Cf. Lustosa, 2000:422, grifo meu.
44 A independência brasileira

sua tese sobre a maçonaria à época da independência, partindo exatamente da leitura


de Lopes Leite, sustenta convincentemente f> argumento de que as facções dentro da
maçonaria estavam sensivelmente pulverizadas. E questiona seu papel:

os anos que antecederam a Independência foram marcados inicialmente pelo con-


fronto entre projetos políticos diferenciados, dos quais a opção pela "República"
estava no horizonte, [e é] necessário também perceber que nesse período a maço-
naria não era de um todo monolítico. Ao contrário, o espaço maçônico era cruzado por
diferentes tendências, projetos e idéias...
(Barata, 2000:260)

Ora, a questão é então: se todos eram maçons, revolucionários e republicanos,


se todos esses movimentos e facções eram cindidos e possuíam projetos e estratégias
diferentes para o Brasil, se todos podiam mudar de opinião e de partido ao sabor dos
acontecimentos — como efetivamente mudavam — , as abordagens centradas em
grupos, partidos e facções — assim como as macroestuturais — parecem não ser
também suficientes para fazer avançar mais o conhecimento sobre a independência,
como um dia já foram.
Refinando a questão: como explicar o fato de que, entre tantas forças sociais e
políticas, tantos projetos e anseios, foi exatamente a solução monárquica, com o
herdeiro português à frente, aquela que se sagrou vitoriosa? O u ainda: no contexto
da crise do Antigo Regime e do antigo sistema colonial, no contexto das guerras de
Independência na América Latina, como explicar que a independência do Brasil
tenha acontecido naquele momento e do modo como aconteceu?
Em minha opinão, é preciso refinar ainda mais os instrumentos, observar ainda
mais ao microscópio, utilizando a imagem de Hobsbawm (1980). Parece, pois, faltar
uma abordagem mais focada na ação de indivíduos concretos, inseridos em configura-
ções específicas, mas guiados por opções racionais indelevelmente orientadas com respeito a
fins, como propõem Max Weber e mesmo as mais recentes teorias da ação, como a
de Pierre Bourdieu. Estou falando de agentes históricos, de pessoas que pertenci-
am a diferentes grupos, mas que tinham cambiantes projetos e interesses, indivi-
duais e de grupo.
Senão, como se explica, mesmo que com certa resistência de início, a aceita-
ção pelas elites econômicas do país do projeto político das elites do Centro-Sul,
que se uniram ao p r o j e t o imperial b r a g a n t i n o , l a n ç a n d o o p r í n c i p e c o m o
"outorgante" da emancipação? Quais os interesses em jogo? A resposta a essa ques-
tão aponta para aquela classe que conseguiu se garantir à testa da empresa de cons-
trução do Estado imperial. C o m o ensina Richard Graham (2001), dessa contenda
Esboço crítico da recente historiografia sobre a independência do Brasil 45

os proprietários de terras e os escravocratas brasileiros emergiram triunfantes. De-


les era o novo Estado.

Por fim, duas palavras sobre o que este ensaio inclui e omite. Conforme procu-
rei mostrar, na última década os estudos sobre a independência avançaram significa-
tivamente no que respeita à discussão sobre nação, no conhecimento das implicações
do período joanino sobre a independência, a composição social dos partidos e facções
políticas, os debates nas cortes de Lisboa, o debate político na imprensa, sobre as di-
mensões simbólicas do poder e, em alguma medida, no conhecimento da participação
das camadas populares no processo, particularmente no que se refere aos escravos.
As lacunas mais notáveis deste ensaio refletem as próprias opções e exclusões da
historiografia que ele analisou. Nesse sentido, parece-me que, nos próximos anos, os
historiadores da independência deverão se voltar para esses e outros temas ultima-
mente neglicenciados. Assim, necessita-se de mais pesquisas sobre a participação
popular na independência. O papel diferenciado das diversas províncias, particular-
mente Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e Pará, merece maior atenção. Talvez
em função do cultural turn nos estudos históricos nos últimos anos, muito pouco se
avançou em campos mais "tradicionais", mas igualmente importantes, como, por
exemplo, na história militar do período. Do mesmo modo, a história diplomática,
particularmente no que se refere ao papel desempenhado pela Grã-Bretanha no pro-
cesso de emancipação política brasileira, aguarda maiores avanços. Por fim, o desco-
nhecimento mútuo das historiografias brasileira e hispano-americanas persiste e muito
investimento em pesquisa e intercâmbio acadêmico ainda tem que ser feito para se
construir um quadro amplo do processo de independência na América Latina. Aná-
lises comparativas entre o m u n d o hispânico e a América portuguesa praticamente
inexistem. 42

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Lacuna a ser minimizada com o texto de Anrhony McFarlane que compõe o capítulo 12 deste livro.
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