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Universidade de Brasília (UnB)

Júlia Moury Fernandes Guimarães

Mulheres e negros:
Uma análise da projeção desses grupos minoritários na sociedade brasileira e seus efeitos
socioeconômicos.

Brasília
2018
RESUMO:

O presente trabalho tem por objeto a análise de grupos minoritários e sua expressão no âmbito
nacional, com comprovação pautada nos dados coletados, pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Tem como objetivo discorrer a respeito da situação dos
negros e das mulheres, e como são afetados socialmente e economicamente por possuírem
uma posição marginalizada na sociedade brasileira. São explorados tanto a importância da
plena realização do censo que inclua essas minorias, assim como os conceitos de racismo e
sua relação com a taxa de analfabetismo e o mercado de trabalho. Também esses dois últimos
tópicos foram analisados ao tratar a respeito da posição da mulher no campo social. Por meio
dessa análise foi possível perceber a clara discrepância entre a quantidade absoluta dessas
pessoas e a participação e reconhecimento social que elas possuem acompanhados do
reconhecimento de uma necessidade de mudança.

Palavras chaves: Racismo. Feminismo. Censo. Dados.


SUMÁRIO:

1 Introdução
2 Desenvolvimento
3 Conclusão
1. Introdução

Ao falar a respeito de pesquisas de campo e dados demográficos é intuitivo pensar em


algo generalista e que tenha a capacidade de representar todo o país, contudo isso pode não
ser necessariamente verídico. Muitas vezes, os dados são manipulados de acordo à política e
interesses específicos, e não refletem de fato a realidade brasileira. Isso pode ser percebido
devido à amostragem que se tem como base, sem levar em consideração muitos grupos
minoritários.

Outro ponto também importante é tentar fazer com que esses grupos minoritários sejam
reconhecidos como tais, comprovando essa realidade por meio da análise dos dados coletados.
Dessa forma, é importante o reconhecimento de uma dicotomia entre a amostragem atendida
para realização de tais pesquisas e a necessidade de empoderamento e reconhecimento de
grupos socialmente excluídos e prejudicados.

Antes de iniciar qualquer análise é fundamental perceber o peso numérico desses grupos.
Negros e mulheres correspondem a maioria numérica populacional e, em razão do preconceito
e da marginalização desses grupos esse número não é sobressalente na sociedade. As
mulheres correspondiam, em 2010, a 51,03% da população (IBGE,2010), enquanto os negros
(pretos e pardos – em seguida será explicada essa denominação), em 2016, correspondiam a
54,9% da população (IBGE, 2016). Desse modo, notasse que pelo contrário, esses números
são escondidos diante de uma supremacia exercida por homens brancos, como será
desenvolvido a seguir.
2. Desenvolvimento

Como fundamento de análise, é importante o reconhecimento da professora Elza Berquó


quando afirma que questões políticas determinam o resultado do censo. A professora
trabalhou durante muitos anos na elaboração do censo, o que fez com que percebesse que a
coleta de dados não é contínua, e os interesses políticos impedem a existência de uma
informação contínua. Para fins de exemplificação apresenta o censo de 1930, o qual não
ocorreu em razão da revolução. Também mudanças na análise da época do Regime Militar
foram feitas, quando tiraram a informação de cor/raça, em 1970, por reconhecerem nessa
informação o racismo (BERQUÓ, 2013).

Com isso, entra-se na questão da representatividade e reconhecimento das minorias tanto


discutida no texto de Antônio Guimarães. Em seu texto traz a ideia defendida na época da
ditadura militar, a qual vê como racista aquele que reconhece diferentes raças. Acrescenta
também a causalidade de existirem pessoas com diferentes cores, mas que isso não teria
relevância social, uma vez que todos são seres humanos. Essa ideia pode ser apresentada
como uma justificativa da democracia racial apontada por Gilberto Freyre, contudo,
desconstruída, uma vez que o próprio autor equipara o conceito prático de cor ao de raça
(GUIMARÃES, 2000).

O autor cita também Florestan Fernandes para defender a existência do mito da


democracia apresentada em Casa Grande, Senzala. Em seu discurso reconhece essa afirmativa
como uma forma de dominação, usada apenas para desmobilizar a comunidade negra. Nesse
contexto, aparece o Movimento Negro Unificado. Esse movimento passa a reintroduzir o
conceito de raça, priorizando o conhecimento às origens negras e trazendo à tona, mais uma
vez, a discussão do preconceito velado. Uniram as categorias “pretos” e “pardos” no censo em
uma única, denominada negros, para ter maior aproximação com a realidade visto que muitos
negros não se autodenominavam pretos. Começa a ser percebido, então, que esse preconceito
é evidente quando se analisa de fato a sociedade (GUIMARÃES, 2000).

Segundo o IBGE, essa distinção social existente entre raças é gritante até os dias atuais. A
taxa de analfabetismo, em 2016, entre brancos corresponde à 4,2% enquanto entre negros e
pardos esse número chega a quase 10%. Enquanto o trabalho infantil desse grupo minoritário
corresponde a quase o dobro da quantidade de crianças brancas trabalhando: 63,8% e 35,8%,
respectivamente (IBGE, 2016). Dessa forma é notório o posicionamento do Guimarães
quando ele afirma a persistência do conceito de raça intrínseco na sociedade, ainda que com a
diferente denominação: de cor (GUIMARÃES, 2000).

Os dados apresentados servem como forma de comprovação da persistência de um


assunto que é visto como superado desde a época do Gilberto Freyre. Junto a isso, é
importante perceber que o preconceito não afeta apenas o âmbito psicológico, mas também na
qualidade de vida desse segmento da população. É evidente que em decorrência do
preconceito, muitos jovens são excluídos do mercado de trabalho formal, comprovado pelo
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o qual apresenta uma porcentagem de
6,6% de homens negros enquanto homens brancos correspondem à 5,3%. Esses números são
ainda mais alarmantes quando se soma à minoria racial ao gênero. As mulheres brancas já
possuem um índice de trabalho formal correspondente à 9,2% e ao ter como objeto as
mulheres negras, minorias tanto em relação ao seu gênero como à sua cor, esse número chega
a 12,5% (IPEA, 2011).

Com isso, é importante ressaltar que não apenas o racismo é um objeto de preconceito em
nossa sociedade. Discriminação de gênero é extremamente comum na sociedade patriarcal
que vivemos. Essa desigualdade constante deu voz a mulheres que encontraram na escrita
uma forma de protesto. A exemplo desse tipo de manifestação, está a autora Chimamanda
Ngozi, de obras como “Sejamos Todos Feministas” e “Hibisco Roxo”. Em suas obras, ela
descreve tanto seu cotidiano e sua história como uma mulher negra em uma sociedade racista
e patriarcal, ao passo que, ao mesmo tempo, descreve também a realidade de muitas pessoas,
já que o preconceito está extremamente presente.

Comprovações de que vivemos em uma sociedade extremamente machista e patriarcal são


inúmeras. O IBGE trás dados nos quais é nítida essa dispare realidade, os quais afirmam que,
apesar das mulheres trabalharem mais que os homens – 54,4 horas semanais contra 51,4 horas
semanais masculinas – e possuírem maiores níveis de educação – 73,5% feminino contra
63,2% masculino – ainda possuem menores salários. O rendimento das mulheres ainda
correspondia, em 2016, a 76,5% do rendimento dos homens (IBGE, 2016). Isso mostra uma
clara discrepância, visto que mesmo possuindo maiores níveis educacionais e trabalharem por
mais horas semanais, as mulheres ainda possuem salários inferiores apenas por serem
mulheres.

A partir disso, são possíveis o reconhecimento e a visualização dos dados apresentados na


tabela a seguir, a qual mostra claramente a relação desigual entre homens e mulheres (IBGE,
2018). Nota-se também que essa desigualdade está presente em todos os aspectos da vida
cotidiana, sendo os homens exaltados em comparação à classe feminina. Essa realidade é
evidente, inclusive, em áreas da esfera pública, principalmente naquelas relacionadas à
tomadas de decisão o que, além de estimular o preconceito, prejudica e corrompe o lugar de
fala.

Lugar de fala este que é um tema central e delicado ao discorrer sobre minorias e grupos
socialmente excluídos. É extremamente importante reconhecer que na sociedade que vivemos,
homens brancos são responsáveis, majoritariamente, pela tomada de decisão de todos os
grupos sociais. Isso dificulta que àqueles oprimidos sejam devidamente ouvidos, causando até
o efeito inverso, os oprimem e silenciam ainda mais. Esse assunto foi trazido à tona através do
livro de poemas “Outros Jeitos de Usar a Boca” da feminista Rupi Kaur, por meio de uma
clara relação de submissão feminina:

você tinha tanto medo


da minha voz
que eu decidi
ter medo também
(KAUR, 2017, p.17)
3. Conclusão

Com isso, nota-se que é fundamental o apoio à lutas de minorias, contudo deve-se tomar
cuidado para não querer lutar por algo pelo qual não foi oprimido, não se pode tomar decisões
por essas minorias sem fazer parte delas. Um homem branco jamais conseguirá sentir a
opressão sofrida tanto por negros como por mulheres, sendo importante que essas pessoas
sejam escutadas. Além de tudo, dar voz a uma determinada ação apenas porque foi dita por
alguém com certo privilégio social contribui também para a marginalização de certos grupos
na sociedade, ainda que as decisões lhes sejam favoráveis. Não se pode definir sobre assuntos
como assédio com uma maioria masculina no Congresso Nacional que nunca passou por isso.
Não se pode tomar decisões sobre o racismo sem tê-lo sofrido.

Para finalizar é importante ressaltar que a luta constante pela devida inserção desses
grupos minoritários na sociedade é de extrema importância. Assim, acabar com a cultura
preconceituosa é uma necessidade, contudo exigirá muita luta.

meu coração sangra pelas irmãs em primeiro lugar


sangra por mulheres que ajudam mulheres
como as flores anseiam pela primavera (KAUR, 2017, p. 187)

Referências:

Barbosa, Rogério Jerônimo, & ali. (2013). Ciências sociais, censo e informação
quantitativa no Brasil: entrevista com Elza Berquó e Nelson do Valle Silva. Novos estudos
CEBRAP, (95), 143-155. https://dx.doi.org/10.1590/S0101-33002013000100008

GUIMARÃES, Antônio S. (2003) Como trabalhar com “raça” em sociologia. Educação e


Pesquisa (USP), São Paulo, v . 29, n.01, p. 93-108.

IBGE. Brasil em síntese. 2018. Disponível em:


<https://brasilemsintese.ibge.gov.br/populacao/distribuicao-da-populacao-por-sexo.html>.
Acesso em: 28 jun. 2018.

IBGE. Estatísticas de Gênero: Indicadores sociais das mulheres no Brasil. 2018. Disponível


em:
<https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/media/com_mediaibge/arquivos/9d6f4faeda1f1fb7532
be7a9240cc233.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2018.

IBGE. IBGE mostra as cores da desigualdade. Retratos: a revista do IBGE, Brasilia, p.15-19,


11 maio 2018. Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-
agencia-de-noticias/noticias/21206-ibge-mostra-as-cores-da-desigualdade.html>. Acesso em:
28 jun. 2018.

IBGE. Mulher estuda mais, trabalha mais e ganha menos do que o homem. 2018.


Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-
noticias/noticias/20234-mulher-estuda-mais-trabalha-mais-e-ganha-menos-do-que-o-
homem.html>. Acesso em: 28 jun. 2018.

KAUR, Rupi. Outros Jeitos de Usar a Boca. 13. ed. São Paulo: Planeta, 2017. 204 p.

RETRATO DAS DESIGUALDADES: de gênero e raça. Brasilia: Ipea, 2011. Disponível


em: <http://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/revista.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2018.

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