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DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAS

CURSO DE PSICOLOGIA DO TRABALHO

A NEUROCIENCIA SOB O OLHAR DA


PSICOMOTRICIDADE

Docente: xxxxxscshshhgghsahhfh
Discente: Dinis Quiassona Freitas

LUANDA 2020
RESUMO

O presente trabalho visa mostrar como a neurociência sob o olhar da psicomotricidade


pode proporcionar e orientar estudos ligados a aprendizagem, para aquisição de novos
comportamentos. Comportamentos resultam da atividade cerebral. O cérebro, portanto, é
o órgão da aprendizagem. A descoberta das neurociências possibilita o estudo de alguns
dos mecanismos cerebrais responsáveis por funções mentais importantes na
aprendizagem. No entanto, a aplicação desse conhecimento sob o olhar da
psicomotricidade no contexto educacional tem limitações. As neurociências não propõem
uma nova pedagogia, mas fundamentam a prática pedagógica que já se realiza,
demonstrando que estratégias pedagógicas, que respeitam a forma como o cérebro
funciona, tendem a ser mais eficientes. Conhecer a aprendizagem numa perspectiva
neurobiológica pode auxiliar educadores, professores e pais, a compreender alguns
aspectos das dificuldades para aprendizagem e inspirar práticas educacionais, mas não
possibilita a prescrição de receitas para a solução dos problemas da educação.
Aprendizagem não depende apenas do funcionamento cerebral. Diversos fatores, como
condições gerais de saúde, ambiente familiar, estímulos na infância, interação social, tipo
de escola, aspectos culturais, sócio-econômicos e até políticas públicas de educação,
também interferem na aprendizagem. Cabe, assim, uma reflexão sobre as possibilidades
e desafios do diálogo entre a neurociência e a educação.

Palavras-chave: Cérebro, aprendizagem, educação, neurociência,


psicomotricidade
Lista de Abreviaturas

SN - Sistema Nervoso
TDAH - Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
IPM - Intervenção Psicomotora
NEE - Necessidades educativas especiais
EE - Educação Especial
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO. ....................................................................................................... 5
2. Neurociências e Psicologia do desenvolvimento ...................................................... 7
2.1. Neurociências e Aprendizagem ....................................................................... 10
2.2. Neurociências e Plasticidade Neural ................................................................ 12
2.3. Funções executivas e mecanismos de aprendizagem ...................................... 12
3. Desenvolvimento Psicomotor ................................................................................. 16
4. CONCLUSÃO ........................................................................................................ 23
5. Referências Bibliográficas ...................................................................................... 24
1. INTRODUÇÃO.

O presente trabalho aborda sobre a neurociência sob o olhar da psicomotricidade


trata de temas actuais ligados a neuro educação, ou seja, como o funcionamento do
cérebro e suas funções atuam na aprendizagem. Ela descreve como os mecanismos
neurobiológicos de integração e associação das informações sensoriais e das respostas
motoras resultam perceções, decisões e comportamentos. Trata ainda, da importância do
contorno cultural e social para um bom desenvolvimento neuro psicomotor e sua
aplicabilidade prática no dia a dia de aprendizagens.

A psicomotricidade, atualmente, pode ser definida como o campo transdisciplinar


que estuda e investiga as relações e as influências recíprocas e sistêmicas entre o
psiquismo e a motricidade. O psiquismo, nesta perspectiva, é entendido como o conjunto
do funcionamento mental, ou seja, integra as sensações, as percepções, as emoções, as
simbolizações, as conceitualizações, as idéias, as construções mentais, etc., assim como
antecede as aquisições evolutivas anteriores. Já a motricidade, pode ser vista como uma
característica fundamental de todos os animais, por meio da qual asseguram a sua
adaptação ao meio natural e a sua autonomia em relação ao seu ecossistema específico
(FONSECA, 2008).

Viver é interagir. Desde o nascimento o homem interage com seu ambiente


através dos mais variados comportamentos. Os comportamentos que adquirimos ao longo
de nossas vidas resultam do que chamamos de aprendizagem. Aprender é uma
característica intrínseca do ser humano, essencial para sua sobrevivência (Kolb;
Whishaw, 2002). Comumente diz-se que alguém aprende quando adquire atitudes,
habilidades, conhecimentos, competências para se adaptar a novas situações, para
resolver problemas, para realizar tarefas diárias importantes para a sobrevivência e para
implementar estratégias em busca de saúde, de realização pessoal e em sociedade, de
melhor qualidade de vida, enfim, em busca de viver bem e em paz.

A educação visa ao desenvolvimento de novos comportamentos num indivíduo,


proporcionando-lhe recursos que lhe permitam transformar sua prática e o mundo em que
vive. Aprendemos o que é útil para a nossa sobrevivência e/ou que nos proporciona
prazer. Educar é proporcionar oportunidades e orientação para aprendizagem, para
aquisição de novos comportamentos. Aprendizagem, por sua vez, requer várias funções
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mentais como atenção, memória, percepção, emoção, função executiva, entre outras. E,
portanto, depende do cérebro.

O SN, por meio de seu integrante mais complexo, o cérebro, recebe e processa os
estímulos ambientais e elabora respostas adaptativas que garantem a sobrevivência do
indivíduo e a preservação da espécie (Halpern; O'Connell, 2000; Ferrari et al., 2001). A
evolução nos garantiu um cérebro capaz de aprender, para garantir nosso bem-estar e
sobrevivência e não para ter sucesso na escola. A menos que o bom desempenho escolar
signifique esse bem-estar e sobrevivência do indivíduo. Na escola o aluno aprende o que
é significativo e relevante para o contexto atual de sua vida. Se a “sobrevivência” é a nota,
o cérebro do aprendiz selecionará estratégias que levem à obtenção da nota e não,
necessariamente, à aquisição das novas competências, as estratégias pedagógicas
utilizadas por educadores durante o processo ensino-aprendizagem são estímulos que
produzem a reorganização do SN em desenvolvimento, resultando em mudanças
comportamentais

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2. Neurociências e Psicologia do desenvolvimento

As neurociências são ciências naturais, que descobrem os princípios da estrutura


e do funcionamento neurais, proporcionando compreensão dos fenômenos observados.
Entender sobre o desenvolvimento de habilidades mentais é fundamental para
compreender a organização e o funcionamento da mente humana. Uma abordagem
comum em neurociência é correlacionar à maturação de funções cognitivas específicas
com um estágio particular do desenvolvimento neural.

Segundo Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006), a diferença existente entre as


capacidades dos recém-nascidos e a dos adultos são visíveis. Recém-nascidos não
caminham, não seguram objetos, não falam nem compreendem quando falamos com eles.
Essas diferenças podem ser elucidadas de duas maneiras: os recém-nascidos podem ter
todas as capacidades dos adultos, mas ainda não obtiveram, pela experiência, suas
habilidades; e, em contraste, recém-nascidos podem diferir dos adultos em capacidades
neurais e/ou cognitivas. A primeira hipótese coloca os recém-nascidos como possuidores
de um circuito neural completamente formado, à espera das aferências e dos sinais do
ambiente para que o desenvolvimento ocorra. A última propõe que recém-nascidos ainda
não possuem estruturas neurais e cognitivas para agir como um adulto e que esse
desenvolvimento abarca mudanças radicais e qualitativas.

Essa visão tem sido amplamente aceita pelas teorias do desenvolvimento com base
em evidências tanto neurais quanto psicológicas. Uma teoria clássica de que recém-
nascidos diferem significativamente dos adultos vem do cientista suíço Jean Piaget.
Piaget considerava que a aquisição do conhecimento é um processo e como tal deveria
ser estudado de maneira histórica, abarcando o modo como o conhecimento muda e
evolui. Desse modo, define sua epistemologia genética como a disciplina que estuda os
mecanismos e processos mediante os quais se passa de “[...] estados de menor
conhecimento aos estados de conhecimento avançado.” (PIAGET, 1971,p.8).

Para Piaget, no processo de aquisição de novos conhecimentos, o sujeito é um


organismo activo que seleciona as informações que lhe chegam do mundo exterior,
filtrando-as e dando-lhes sentido. (PIAGET, 1971). Conhecer, em sua percepção, é actuar
diante da realidade modificando-a por meio de ações. Nesse sentido, atuar não significa
essencialmente realizar movimentos e ações externas, esse seria o caso de crianças

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pequenas que precisam manipular a realidade que as envolve, para entendê-la. Na maioria
dos casos, essa atividade é interna, mental, ainda que possa se basear em objetos físicos.
Ao contar, comparar, classificar, embora haja imobilidade do sujeito, ele está ativo
mentalmente.

De acordo com Piaget, todas as crianças passam por quatro estágios cognitivos
mais ou menos na mesma idade, independentemente da cultura em que vivem. Nenhum
estágio pode ser omitido, uma vez que as habilidades adquiridas em estágios anteriores
são essenciais para os estágios seguintes. No estágio sensório-motor a criança explora o
mundo e desenvolve seus esquemas principalmente por meio de seus sentidos e
actividades motoras. Vai do nascimento até o período de “linguagem significativa” (por
volta de 2 anos). Durante esse estágio, as crianças têm conceitos rudimentares dos objetos
do seu mundo.

Um conceito adquirido durante esse estágio é o de permanência do objeto:


habilidade de saber que um objeto não deixa de existir simplesmente porque saiu de nosso
campo de visão. Aos quatro meses, crianças que brincam com um objeto que será depois
escondido, agem como se ele jamais estivesse existido. Ao contrário, um bebê com 10
meses procura ativamente um objeto que foi escondido em baixo de um pano ou por trás
de uma tela. “Ele tem a consciência de que o objeto continua existindo, mesmo quando
não está visível.” (PIAGET; INHELDER, 2003, p.20).

Após vários estudos em cognição, Flavell et al. (1999) assim se manifestam a


respeito da teoria de Piaget, quanto aos estágios:

“A teoria de Piaget, entretanto, não faz afirmações apenas gerais,


mas muito fortes e específicas a respeito da preponderância dos
estágios da cognição em bebês, e estas afirmações não têm se
sustentado em pesquisas recentes. Existem simplesmente muitos
exemplos de competência mais precoce do que a esperada, muitas
discrepâncias no nível de desempenho que não parecem depender
dos processos construtivos de ação sobre o mundo com os quais
Piaget definiu seus estágios. (FLAVELL, et al., 1999, p.64)”.

No modelo de Piaget, temos ainda três estágios que seguem o estágio de


inteligência sensório-motora.

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✓ Estágio pré-operacional (dos 2 aos 7 anos), a linguagem progride
substancialmente e a criança começa a pensar simbolicamente, usando
símbolos, tais como palavras, para representar conceitos. No entanto, a
criança ainda não consegue fazer operações ou processos mentais
reversíveis. Neste estágio, a criança também é egocêntrica, isto é, não
consegue distinguir suas próprias perspectivas das de outras pessoas, nem
consegue entender que há pontos de vista diferentes dos seus. (PIAGET,
1971).
✓ Estágio de operações concretas (dos 7 aos 11 anos), nesse período, há a
emergência de muitas habilidades importantes de raciocínio. O
pensamento da criança, agora mais organizado, possui características de
uma lógica de operações reversíveis. Entretanto, durante esse estágio, elas
inicialmente podem realizar operações quantitativas somente com eventos
concretos. Não é capaz de operar com hipóteses. (PIAGET, 1971).
✓ Estágio operações formais (dos 11 anos em diante), durante o estágio o
estágio de operações formais, as crianças aprendem a fazer representações
abstratas de relações, de acordo com Piaget. Crianças nessa idade podem
generalizar relações matemáticas e manifestar pensamento hipotético-
dedutivo, a habilidade de gerar e testar hipóteses sobre o mundo.

Piaget trouxe contribuições importantes, delimitando a linha do tempo do


desenvolvimento cognitivo e tentando mostrar quando as crianças são capazes de realizar
tarefas perceptivos, motoras e cognitivas complexas. O facto de que a idade exata para
um processo particular possa ocorrer ser antes do que Piaget propôs, ou de que os estágios
descritos por Piaget possam ser mais graduais do que os mencionados, não diminui
significativamente o valor de seu conceito de desenvolvimento cognitivo. Além disso,
descrever uma linha do tempo de maturação cognitiva é, com modificações adequadas,
útil, porque um objectivo da neurociência cognitiva é relacionar a linha do tempo de
desenvolvimento cognitivo com o desenvolvimento neural para esclarecer as bases
biológicas da cognição.

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2.1. Neurociências e Aprendizagem

Descobertas em neurociências não se aplicam directa e imediatamente na escola.


A aplicação desse conhecimento no contexto educacional tem limitações. As
neurociências podem informar a educação, mas não explicá-la ou fornecer prescrições,
receitas que garantam resultados. Teorias psicológicas baseadas nos mecanismos
cerebrais envolvidos na aprendizagem podem inspirar objectivos e estratégias
educacionais. O trabalho do educador pode ser mais significativo e eficiente se ele
conhece o funcionamento cerebral, o que lhe possibilita desenvolvimento de estratégias
pedagógicas mais adequadas

A criança que tem um SN diferente apresentará comportamentos, habilidades


limitações e potencialidades cognitivas distintas das demais e poderá demandar
estratégias de aprendizagem alternativas. Sabemos que os cuidados com o pré-natal são
fundamentais para o desenvolvimento adequado do SN. Neste período, estruturas
cerebrais são formadas e conexões entre células nervosas – sinapses - determinadas
geneticamente, são estabelecidas, garantindo a organização estrutural e funcional
fundamental para comportamentos típicos da espécie, como andar, se comunicar, sugar,
expressar emoções, entre outros.

Deficiências nutricionais, ingestão de certas substâncias químicas, infecção por


vírus e protozoários, exposição a radiações e até informações genéticas ou cromossômicas
erradas (síndromes de Williams, Down, Asperger, autismo, dislexia, etc.) podem alterar
a estrutura básica do SN. A criança que tem um SN diferente apresentará
comportamentos, habilidades limitações e potencialidades cognitivas distintas das demais
e poderá demandar estratégias de aprendizagem alternativas.

Após o nascimento, a interação do bebê com o meio em que vive e os cuidados na


primeira infância são muito significativos. Este é um período receptivo, de intenso
desenvolvimento do SN, no qual as redes neurais são mais sensíveis às mudanças, quando
novos comportamentos podem ser progressivamente adquiridos, preparando o cérebro
para novas e mais complexas aprendizagens. A educação infantil e a exposição a
estímulos sensoriais, motores, emocionais e sociais variados, frequentes e repetidos nessa
fase contribuirá para a manutenção das sinapses já estabelecidas, com preservação de

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comportamentos com os quais nascemos, e para a formação de novas sinapses, resultando
em novos comportamentos.

Falta de estimulação pode levar a perda de sinapses. Crianças pouco estimuladas


nos primeiros anos de vida podem apresentar dificuldade para a aprendizagem, porque o
cérebro delas ainda não teve a oportunidade de utilizar todo o potencial de reorganização
de suas redes neurais. Embora necessitem de mais estímulos e estratégias alternativas de
aprendizagem, ainda terão chance de recuperar o tempo perdido e as habilidades não
desenvolvidas até então. Um lar saudável, um ambiente familiar adequado, bons
exemplos e uma boa escola podem fazer grande diferença no desenvolvimento escolar.

Tabela 1. Princípios da neurociência com potencial aplicação no ambiente de sala de aula.

Princípios da neurociência Ambiente de sala de aula


1. Aprendizagem & memória e Aprendizagem sendo atividade social, alunos
emoções ficam interligadas quando precisam de oportunidades para discutir tópicos.
ativadas pelo processo de Ambiente tranquilo encoraja o estudante a expor
aprendizagem. seus sentimentos e ideias.
2. O cérebro se modifica aos poucos Aulas práticas/exercícios físicos com
fisiológica e estruturalmente como envolvimento ativo dos participantes fazem
resultado da experiência associações entre experiências prévias com o
entendimento atual.
3. o cérebro mostra períodos ótimos Ajuste de expectativas e padrões de desempenho
(períodos sensíveis) para certos tipos de às características etárias específicas dos alunos,
aprendizagem, que não se esgotam uso de unidades temáticas integradoras.
mesmo na idade adulta.
4. O cérebro mostra plasticidade Estudantes precisam sentir-se “detentores” das
neuronal (sinaptogênese), mas maior atividades e temas que são relevantes para suas
densidade sináptica não prevê maior vidas. Atividades pré-selecionadas com
capacidade generalizada de aprender possibilidade de escolha das tarefas, aumenta a
responsabilidade do aluno no seu aprendizado
5. Inúmeras áreas do córtex cerebral Situações que reflitam o contexto da vida real, de
são forma que a informação nova se “ancore” na
simultaneamente ativadas no compreensão anterior.
transcurso de nova experiência de
aprendizagem.
6. O cérebro foi evolutivamente Promover situações em que se aceite tentativas e
concebido para perceber e gerar aproximações ao gerar hipóteses e apresentação de
padrões quando testa hipóteses evidências. Uso de resolução de “casos” e
simulações.
7. O cérebro responde, devido a Propiciar ocasiões para alunos expressarem
herança primitiva, às gravuras, conhecimento através das artes visuais, música e
imagens e símbolos. dramatizações.
Fonte: (Modificado de Rushton & Larkin, 2001; Rushton et al., 2003).

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2.2. Neurociências e Plasticidade Neural

O termo plasticidade sináptica ou neural refere-se às respostas adaptativas do


sistema nervoso frente aos estímulos percebidos. A maioria dos sistemas no cérebro são
plásticos, ou seja, são modificados com a experiência, o que significa que as sinapses
envolvidas são alteradas por estímulos ambientais captados por alguma modalidade de
percepção sensorial.

O conceito de plasticidade sináptica foi definido há mais de um século pelo


fisiologista Charles Sherrington e é uma propriedade essencial do desenvolvimento e
uma das principais funções cerebrais.

A neuroplasticidade é a propriedade de “fazer e desfazer” conexões entre


neurônios. Ela possibilita a reorganização da estrutura do sistema nervoso (SN) e do
cérebro e constitui a base biológica da aprendizagem e do esquecimento. Preservamos as
sinapses e, portanto, redes neurais relacionadas aos comportamentos essenciais à nossa
sobrevivência. Aprendemos o que é significativo e necessário para vivermos bem e
esquecemos aquilo que não tem mais relevância para o nosso viver.

2.3. Funções executivas e mecanismos de aprendizagem

Atenção é importante função mental para a aprendizagem, pois nos permite


selecionar, num determinado momento, o estímulo mais relevante e significativo, dentre
vários. Ela é mobilizada pelo que é muito novo e pelos padrões (esquemas mentais) que
já temos em nossos arquivos cerebrais. Daí a importância da aprendizagem
contextualizada. É difícil prestar atenção por muito tempo. Intervalos ou mudanças de
atividades são importantes para recuperar nossa capacidade de focar atenção.
Dificilmente um aluno prestará atenção em informações que não tenham relação com o
seu arquivo de experiências, com seu cotidiano ou que não sejam significativas para ele.
O cérebro seleciona as informações mais relevantes para nosso bem estar e sobrevivência
e foca atenção nelas.

Memorizamos as experiências que passam pelo filtro da atenção. Memória é


imprescindível para a aprendizagem. As estratégias pedagógicas devem utilizar recursos
que sejam multissensoriais, para ativação de múltiplas redes neurais que estabelecerão
associação entre si. Se as informações/experiências forem repetidas, a atividade mais

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frequente dos neurônios relacionados a elas, resultará em neuroplasticidade e produzirá
sinapses mais consolidadas. Esse conjunto de neurônios associados numa rede é o
substrato biológico da memória.

Os registros transitórios - memória operacional - serão transformados em registros


mais definitivos - memória de longa duração. Quando estuda apenas na véspera da prova,
o aluno mantém as informações na memória operacional. Assim que as utiliza na prova,
garantindo a nota, as esquece. A consolidação das memórias ocorre, pouco a pouco, a
cada período de sono, quando as condições químicas cerebrais são propícias à
neuroplasticidade. Enquanto dormimos, o cérebro reorganiza suas sinapses, elimina
aquelas em desuso e fortalece as importantes para comportamentos do cotidiano do
indivíduo. Dormir pouco, dificulta a memorização. Para aprender, precisamos estar
despertos e atentos para absorver a experiência sensorial, perceptual e significativa, mas
necessitamos do sono para que essas experiências sejam memorizadas e, portanto,
apreendidas. Memória não se forma de imediato, “da noite para o dia”. A formação de
sinapses demanda reações químicas, produção de proteínas e tempo. Por isso, a
aprendizagem requer re-exposição aos conteúdos e diferentes experiências e
complexidade crescente.

Assim, compreendemos a importância da espiral da aprendizagem: Além disso,


preservamos na memória o que é importante no cotidiano. Esquecemos o que não tem
mais valor, significado ou aplicação para nossa vida. São as emoções que orientam a
aprendizagem. Neurônios das áreas cerebrais que regulam as emoções, relacionadas ao
medo, ansiedade, raiva, prazer, mantêm conexões com neurônios de áreas importantes
para formação de memórias.

Poderíamos dizer que o desencadeamento de emoções favorece o estabelecimento


de memórias. Aprendemos aquilo que nos emociona. Aprender não depende só do
cérebro, mas, também, da saúde em geral. Exercícios físicos aumentam a quantidade de
fatores neurotróficos que contribuem para estabilização das sinapses e para manutenção
e formação de memórias. Uma dieta balanceada, incluindo proteínas, carboidratos,
gorduras, sais minerais e vitaminas, possibilita o funcionamento das células nervosas, a
formação de sinapses e a formação da mielina, estrutura que participa da condução das
informações entre redes neurais.

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Problemas respiratórios que perturbam o sono, anemia que reduz a oxigenação
dos neurônios, dificuldades auditivas e visuais não facilmente detectadas, entre outros
fatores, podem dificultar a aprendizagem. É importante o aprendiz estar em boas
condições de saúde para aprender bem. Aprendizes são indivíduos em transformação.
Seus cérebros, portanto, estão sempre mudando um pouco. O cérebro do adolescente
ainda está em desenvolvimento, principalmente na chamada área pré-frontal, parte mais
anterior do lobo frontal, envolvida com as funções executivas, ou seja, com a elaboração
das estratégias de comportamento para solução de problemas e auto-regulação do
comportamento (Herculano-Houzel, 2005). Cérebros adolescentes testam novos
comportamentos com o objetivo de selecionar habilidades, atitudes e conhecimentos de
fato proveitosos para a sobrevivência na vida adulta. Eles aprendem o que os motivam, o
que os emocionam, o que desejam, aquilo que tem significado para seu cotidiano.
Transformar o conteúdo programático de uma disciplina em algo relevante para o
aprendiz é um grande desafio para o professor.

Outros fatores também influenciam a aprendizagem (Rotta; Ohlweiler; Riesgo,


2006). Aprendizes privados de material escolar adequado, de ambiente para estudo em
casa, de acesso a livros e jornais, de incentivo ou estímulo dos pais e/ou dos professores,
e pouco expostos a experiências sensoriais, perceptuais, motoras, motivacionais e
emocionais essenciais ao funcionamento e reorganização do SN, podem ter dificuldades
para a aprendizagem, embora não sejam portadores de alterações cerebrais. Transtornos
psiquiátricos, como o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e
depressão, que demandam orientação médica e tratamento, podem dificultar a
aprendizagem. Transtornos, como a dislexia e discalculia, caracterizados por dificuldades
na aquisição de habilidades de escrita, leitura e do raciocínio lógico-matemático,
resultantes de organização cerebral diferente, de provável origem genética, também
comprometem a aprendizagem. Nesses casos, as crianças conseguirão aprender, mas
necessitarão de estratégias alternativas de aprendizagem, uma vez que seus cérebros
utilizam caminhos ou circuitos neuronais diferentes para atingir o mesmo aprendizado.

E quando não aprendemos, o problema está sempre no cérebro? Nem sempre.


Aprendizagem não depende apenas do funcionamento cerebral. A maioria dos casos tem
relação com outros fatores, e não com um “problema cerebral”. Fatores relacionados à
comunidade, família, escola, ao meio ambiente em que vive o aprendiz e à sua história de
vida interferem significativamente na aprendizagem. Além disso, ela é influenciada por
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aspectos culturais, sociais, econômicos e também pelas políticas públicas de educação,
que tornam as neurociências apenas mais uma contribuição para a abordagem da
aprendizagem. Devido à sua etiologia multifatorial, a abordagem de uma dificuldade para
a aprendizagem é necessariamente multidisciplinar.

Postula-se que o avanço do conhecimento neste milênio só será possível a partir


de uma perspectiva transdisciplinar. As diversas áreas do conhecimento deveriam utilizar
seus pressupostos para avançar em direção a novos conhecimentos. A educação pode se
beneficiar dos conhecimentos da neurobiologia para abordagem das dificuldades
escolares e suas intervenções terapêuticas. A reflexão sobre as possibilidades e desafios
do diálogo entre a neurociência e a educação pode trazer avanços para ambas as áreas.
Com conhecimento científico, intercâmbio de experiências, julgamento crítico, paciência,
vontade, disposição, energia, dedicação, mas sem euforia, poderemos fazer bom uso das
contribuições das neurociências. E assim, saber como o cérebro funciona, pode, de fato,
ajudar a educar.

Educação tem outra natureza e sua finalidade é criar condições (estratégias


pedagógicas, ambiente favorável, infra-estrutura material e recursos humanos) que
atendam a um objetivo específico, por exemplo, o desenvolvimento de competências pelo
aprendiz

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3. Desenvolvimento Psicomotor

O desenvolvimento psicomotor em um indivíduo é um processo contínuo que


ocorre desde o nascimento até a morte, por meio de mudanças no comportamento
sensório-motor (BUENO, 1998). A quantidade e a qualidade do estímulo recebido pela
criança interferem diretamente na formação e evolução dos elementos básicos da
psicomotricidade (BRÊTAS et al., 2005; BARROS et al, 2003; ANDRACA et al, 1998).

Para Vygotsky (1978), tanto os fatores biológicos como os sociais e relacionais


são essenciais para a evolução da espécie humana; são eles que propiciam os instrumentos
e os símbolos, assim como os fatores civilizacionais impregnados de significação cultural
que estão presentes no ambiente. Tais componentes ilustram o surgimento de novas
relações entre o indivíduo e o mundo, uma vez que elas acabam por fornecer também
novos procedimentos psicológicos e novas formas de motricidade para agir neste mundo.
(VYGOTSKY, 1978 apud FONSECA, 2008)

Segundo Vygotsky, Vieira (2004) afirmam que o desenvolvimento humano ocorre


através de mudanças que decorrerão ao longo do tempo, através da vida e depende de
influências genéticas e ambientais. Neste sentido, o desenvolvimento acontece
gradativamente em diferentes dimensões, como: a cognitiva, a afetiva, a social e a motora,
dimensões que fazem parte de um processo contínuo e de inter-relação, ou seja,
necessitam estar harmonicamente estruturadas ao longo da vida.

Para Fonseca (1995), os elementos psicomotores são equivalentes as noções de


função, pois traduzem as atividades complexas e adaptativas do ser humano,
contribuindo, de forma específica, para um todo funcional. São eles: o esquema corporal,
a lateralidade, o equilíbrio, a estruturação espacial, a estruturação temporal e as
motricidades fina e grossa. Abaixo, descreveremos cada um destes elementos.

O Esquema corporal compreende a recepção, análise e armazenamento das


informações vindas do corpo. A evolução da criança é sinônima de conscientização e
conhecimento cada vez mais profundo do seu corpo, pois é através dele que ela elabora
todas as experiências vitais e organiza toda sua personalidade. (FONSECA, 1995)

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Um esquema corporal bem estabelecido pressupõe conhecer a imagem do nosso
próprio corpo, saber que ele faz parte da nossa identidade. Perceber cada parte, mas sem
perder a noção de unidade. A percepção da globalidade corporal é posterior à percepção
dos elementos separados, porque obriga a um nível mais alto de simbolização e
organização (MATTOS e NEIRA, 2007).

Seguem-se exemplos específicos de como a IPM intervém ao nível dos diferentes


fatores psicomotores:

▪ Tonicidade – recurso a técnicas de relaxação e jogos que facilitem a


interação com o outro, o diálogo e o vínculo (Ferreira, 2011);
▪ Equilibração – marcha em equilíbrio dinâmico e estático sobre diferentes
superfícies (e.g..: blocos ou banco sueco), saltos e transposição de obstáculos (Ferreira,
2011);
▪ Noção do Corpo - jogos de imitação, nomeação e trabalho com as
diferentes partes do corpo, desenho corporal (Ferreira, 2011);
▪ Lateralidade – jogos com orientações específicas – identificar esquerda e
direita; levantar pé esquerdo e mão direita; colocar a mão esquerda na orelha direita, entre
múltiplas combinações possíveis (Ferreira, 2011).
▪ Estruturação espaciotemporal - deslocação do corpo no espaço livre,
representação gráfica de espaços, trabalho de diferentes noções através do corpo próprio
e de objetos (Ferreira, 2011).
▪ Praxia global - transposição de obstáculos com grandes blocos de espuma,
rastejar, saltar acompanhando diferentes ritmos, atirar bolas, alternância entre correr e
parar obedecendo a um sinal sonoro, jogo de estátuas, passar por dentro de túneis, caixas,
saltar e alcançar objetos suspensos; recurso à música e ao corpo em movimento para
perceção de estruturas rítmicas (Bueno, 2014);
▪ Praxia fina - jogos com bolas pequenas e outros objetos, de diferentes
pesos, volumes, trabalhos manuais; e exercícios de grafismo, com recurso a diferentes
mediadores de expressão gráfica (giz, pincéis, lápis, objetivo de realizar traçados
progressivamente mais precisos e regulares - Ferreira, 2011).

Dada a sua abordagem centrada na ludicidade e no desenvolvimento dos fatores


referidos, basilares de todas as aprendizagens, e enquanto terapia potenciadora do
desenvolvimento global da criança, a IPM é considerada a base de toda a educação infantil

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(Dominguez & Rosales, 2007). O seu trabalho não pode, por isso, apenas focar-se no
desenvolvimento de uma ou outra competência (e.g.: linguagem, motricidade, perceção
visual), ou num ou outro fator psicomotor, até porque essa atuação iria contra a perspetiva
holística na qual se fundamenta (Fonseca, 2011).

A Lateralidade é resultado da integração bilateral postural do corpo e ocorre


respeitando a progressiva especialização dos dois hemisférios cerebrais que resultaram
das funções sócio-históricas da motricidade laboral e da linguagem. A lateralização
manual surge no fim do primeiro ano, mas só se estabelece por volta dos 4-5 anos
(FONSECA, 1995).

A lateralidade é definida como a predominância de um dos hemisférios cerebrais


(direito ou esquerdo) sobre o outro, levando-se em consideração que esta predominância
irá controlar motoramente o lado oposto do corpo. Ou seja, se o hemisfério esquerdo do
cérebro é o que domina, o indivíduo será destro e vice-versa (NEGRINE, 1986).

Apesar da lateralidade não se referir apenas à questão de qual mão é usada, mas
também na lateralidade ocular, auditiva e pedal, o foco estará, predominantemente, na
manual, pois se acredita que ela seja de fundamental relevância no processo de
alfabetização, principalmente no que se trata da escrita.

Segundo Holle (1979), a lateralidade é uma sensação interna de que o corpo possui
dois lados, que existem duas metades do corpo e que estas não são exatamente iguais. Ser
capaz de perceber a lateralidade revela a sensação de que os dois lados do corpo não são
exatamente os mesmos, que uma das mãos é usada mais facilmente que a outra,
discriminando entre direita e esquerda. O conhecimento estável da esquerda e da direita
só é possível entre 6 e 7 anos de idade e a reversibilidade (possibilidade de reconhecer a
mão direita ou a mão esquerda de uma pessoa à sua frente) não é possível antes dos 6
anos de idade.

O Equilíbrio é o conjunto de aptidões estáticas e dinâmicas que abrange o controle


postural e o desenvolvimento das aquisições de locomoção; reflete a resposta motora
vigilante e integrada face à força da gravidade que atua sobre o indivíduo (FONSECA,
2005). O Equilíbrio é um dos fatores essenciais para que a criança adquira independência.

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Segundo Gobbi e Patla (1997), para que a criança consiga perceber e agir com
sucesso no ambiente é necessário extrair e integrar os sistemas exteroceptivos,
exproprioceptivos e cinestésicos. Os sinais exteroceptivos estão relacionados à
identificação da localização e forma dos objetos e da superfície do ambiente, os
exproprioceptivos referem-se à identificação das partes do corpo relativas umas as outras,
aos objetos e ao ambiente, e os sinestésicos são a posição a velocidade e a orientação do
corpo, sendo estes provenientes dos receptores musculares e articulares do corpo.

Os sinais exteroceptivos e exproprioceptivos são integrados principalmente pela


percepção visual e também são necessários para o equilíbrio dinâmico do corpo. A
integração destes sinais tem a finalidade de modular o sistema efetor para a execução de
um padrão motor seguro com baixo gasto energético.

A Estruturação Espacial é um conceito desenvolvido pelo próprio cérebro através


de atividades neuro, tônico, sensório, perceptiva e psicomotora.

4. As Unidades Funcionais

Muitas das dificuldades de aprendizagem e perturbações do desenvolvimento,


podem ser explicadas por imaturidade e/ou alterações ao nível dos substratos
neurológicos das diferentes unidades lurianas (Fonseca, 2010). Na IPM estas alterações
designam-se de distúrbios ou perturbações psicomotoras (Leite, 2012). Na prática, os
distúrbios psicomotores podem ser definidos como “dificuldades na execução de
movimentos e na percepção do próprio corpo, do espaço, da postura do corpo e do tempo”
(p.70, Leite, 2012).

Luria pensou o sistema nervoso central como estruturado hierarquicamente de


uma forma vertical. As estruturas inferiores serviriam de base para as atividades das
estruturas superiores. O funcionamento adequado das estruturas superiores, portanto,
dependeria do funcionamento das estruturas inferiores. Quanto mais acima na hierarquia,
mais as estruturas seriam novas na filogênese e na ontogênese3, mais seriam elaboradas
e seria, até mesmo, mais frágeis.

19
A divisão dentro desta hierarquia foi em três grandes unidades funcionais. A
primeira unidade funcional foi descrita como a responsável pela vigília e pelo tônus
cortical. A segunda unidade funcional era a encarregada de receber, processar e
armazenar as informações que chegavam do mundo externo e interno. E a terceira unidade
funcional regularia e verificaria as estratégias comportamentais e a própria atividade
mental.

Figura 01 - Primeira, segunda e terceira unidade funcional

Fonte:

4.1. Primeira unidade funcional

Começamos por analisar a primeira unidade funcional. Esta unidade depende


principalmente de uma estrutura chamada tronco cerebral (também conhecido como
tronco encefálico). O tronco situa-se entre a medula e o cérebro propriamente dito. Na
parte de trás do tronco há uma rede de neurônios chamada de formação reticular. Este
nome se origina exatamente do formato de rede que esta região possui, diferente do
agrupamento linear por feixes, conforme se percebe na maior parte do sistema nervoso.

Além de possuir uma configuração estrutural diferente, a formação reticular


também não obedece à lei do tudo-ou-nada, conforme a maioria dos neurônios. Se um
determinado potencial de ação, uma determinada carga elétrica, chega até o terminal
sináptico, assim ela é transmitida. Isto garante intensidades diferentes na transmissão
sináptica: estímulos fracos, moderados e fortes são transmitidos de acordo com sua
intensidade.

20
A compreensão disto é importante para que entendamos as funções do tronco
cerebral. A primeira delas é a regulação do ciclo sono-vigília. É esta área cerebral que
determina o quanto estamos lúcidos ou o quanto estamos a cair no sono. E todos os
estados atencionais entre o sono e a vigília. É por isso que não conseguimos acordar ou
dormir de uma vez só. A condução a estes estágios é gradual, tal qual a transmissão
nervosa do sistema reticular. Apenas conseguimos nos despertar e adormecer lentamente,
tentar apressar o processo pode trazer consequências indesejáveis. Pois não se trata de
nada mais do que a estimulação e a desestimulação que o tronco cerebral (em especial a
formação reticular) realiza sobre o córtex cerebral1.

Lúria nomeia o fenômeno como regulação do tônus cortical. Para atuar


adequadamente o córtex precisa estar em um estado ótimo de tonificação, ou seja, deve
estar preparado para executar suas funções. E quem “liga” e “desliga” e dá toda a gradação
de tonicidade ao córtex é justamente a primeira unidade funcional. Para executar uma
tarefa mais longa, o tronco prepara o cérebro para isto. Para tarefas mais curtas, idem.

Há um feixe de neurônios que conecta a primeira unidade funcional com a terceira,


chamado de Sistema Reticular Ascendente. Este sistema leva impulsos pra o córtex pré-
frontal, ou seja, para o topo da hierarquia neural: por isto ascendente. Há também um
grupo de feixe neuronal que faz o caminho inverso, do córtex pré-frontal para o tronco, o
Sistema Reticular Ascendente. É a partir deles que conseguimos regular uma certa
intenção para nos mantermos despertos, atentos ou adormecidos.

Lesões na terceira unidade funcional podem levar à dificuldades atencionais, na


desregulação do ciclo sono-vigília ou até mesmo o coma, dependendo da localização e
extensão desta lesão.

4.2. Segunda unidade funcional,

Tem a função de receber, analisar e armazenas as informações, é composta pela


parte posterior do córtex cerebral. Entre o lobo frontal e o parietal há um sulco cerebral,
chamado de sulco central. É justamente este elemento anatômico que divide o cérebro em

1
É possível acordar ou adormecer de uma vez só, instantaneamente? Não, justamente pelo sistema reticular não
trabalhar com a lei do tudo-ou-nada. É por isso que conseguimos adormecer lentamente e acordar lentamente, nunca
de supetão. Se os neurônios desta região fossem diferentes, quem sabe se o nosso comportamento de sono e vigília não
seria muito diferente?

21
sua parte anterior e posterior. A segunda unidade funcional, esta portanto na parte
posterior, abarca os lobos occipital, temporal e parietal.

Entre as funções processadas estão a visão, a percepção tátil-cinestésica, a


audição, a orientação espacial e a linguagem receptiva. É na segunda unidade funcional
que ocorre a sensação e a percepção a partir dos sentidos. Cabe a ela receber e analisar as
informações que chegam os órgãos sensoriais, interpretando-as e atribuindo significado.
A memória também está relacionada com esta unidade funcional.

4.3. Terceira unidade funcional,

Finalmente a terceira unidade funcional, tem o papel de programar, regular e


verificar a atividade mental. É constituída pelo córtex cerebral situado na região anterior
do cérebro, a saber, o lobo frontal. A motricidade, a intencionalidade, o planejamento e a
linguagem expressiva encontram-se entre as funções mentais envolvidas. É possível
afirmar, genericamente, que a terceira unidade funcional é responsável pelas funções
executivas.

Esta unidade é a última a surgir tanto na filogênese e como na ontogênese. O ser


humano é a espécie que, proporcionalmente ao tamanho do corpo, possui o lobo frontal
mais desenvolvido. Tanto em relação ao seu tamanho físico quanto na relação entre a
qualidade das ligações neuronais nesta região. E a terceira unidade funcional é também a
última região do Sistema Nervoso a completar sua mielinização, consolidando fortemente
em torno dos 6 anos de idade, aos 12 e concluindo apenas no início da idade adulta. Por
mais que estudemos as unidades funcionais e mesmo as funções mentais isoladamente,
sempre é necessário que fique claro que todas elas atuam sempre em conjunto. Uma
função mental nunca é o resultado de apenas uma unidade funcional, mas das três. A
percepção, por exemplo. É necessário que a primeira unidade forneça o tônus cortical
necessário, a segunda realize a analise e a síntese das informações que chega e a terceira
execute os movimentos de busca controlados que conferem à percepção o seu caráter
ativo.

22
5. CONCLUSÃO

A neurociência oferece um grande potencial para nortear a pesquisa educacional


e futura aplicação em sala de aula. Contudo, faz-se necessário construir pontes entre a
neurociência e a prática educacional. Há forte indicação de que a neurociência cognitiva
está bem colocada para fazer esta ligação de saberes. Políticas educacionais devem ser
planeadas através da alfabetização em neurociência, como forma de envolver o público
em geral além dos educadores. É preciso aprofundar o estudo de ambientes educativos
não tradicionais, que privilegiem oportunidades para que os alunos desenvolvam
entendimento, e que possam construir significado à partir de aplicações no mundo real.

Apesar da evolução das práticas educativas ao longo do tempo, o modelo


tradicional vai permanecendo ainda como processo privilegiado de ensino, enfatizado
pelo método expositivo, e atribuindo um papel passivo ao aluno na sala de aula. Embora
a preocupação com a inclusão seja cada vez maior, a educação está ainda muito centrada
na aquisição de conhecimentos e presa ao ensino tradicional (mesa, cadeira, papeis), a par
de uma crescente competitividade que afasta as atuais gerações de necessidades
existenciais, relacionadas com a emoção e a relação.

A escola é hoje um espaço para todas as crianças, independentemente das suas


características e/ou dificuldades, uma vez que o objetivo é responder aos desígnios da
educação inclusiva. Uma escola saudável é aquela que espelha a heterogeneidade da
sociedade. A IPM surge aqui, como uma terapia abrangente que, no contexto da EE, se
destina a crianças com alterações/problemas psicomotoras, atuando sobre as estruturas
motoras dos diferentes fatores psicomotores e sobre as capacidades de relação e
comunicação do corpo.

A IPM é uma abordagem que pretende reinventar e reimplementar o movimento


na escola, contrariando uma realidade que obriga as crianças a longos períodos de rigidez
postural e, também, comportamental, para realização de tarefas sistematizadas. Neste
contexto, o movimento pode, por vezes, ser sinónimo de desordem e/ou desobediência.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Sem a Outra Não Está no Seu Perfeito Juízo. 2ª edição. Porto: Porto Editora.7

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