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memória de ulisses

Narrativas sobre a fronteira na Grécia antiga

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Reitor Clélio Campolina Diniz
Vice-Reitora Rocksane de Carvalho Norton

EDITORA UFMG
Diretor Wander Melo Miranda
Vice-Diretor Roberto Alexandre do Carmo Said

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Márcio Gomes Soares
Maria Helena Damasceno e Silva Megale
Roberto Alexandre do Carmo Said

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François Hartog

memória de ulisses
Narrativas sobre a fronteira na Grécia antiga

2ª edição

Jacyntho Lins Brandão


Tradução

Belo Horizonte
Editora UFMG
2014

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© Éditions Gallimard, 1996
Título original Mémoire d’Ulysse: Récits sur la frontière en Grèce ancienne
© 2004, tradução brasileira, Editora UFMG
2014, 2ª ed.

Este livro ou parte dele não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização
escrita do Editor.
________________________________________________________________________

H334m.Pb Hartog, François.


Memória de Ulisses : narrativas sobre a fronteira na Grécia
antiga / François Hartog ; tradução de Jacyntho Lins Brandão. –
2. ed. – Belo Horizonte : Ed. UFMG, 2014.

316 p. – (Humanitas)

ISBN: 978-85-423-0057-4

1. Geografia antiga – História. 2. Grécia – Descrições e


viagens. 3. Antiguidades clássicas. I. Brandão, Jacyntho Lins.
II. Série. III. Título.

CDD: 94(38)
CDU: 938
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Elaborada pela DITTI – Setor de Tratamento da Informação


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Para Thomas

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Gostaria de agradecer ao Getty Center e seu diretor, Salvatore Settis,
por sua generosa hospitalidade. Meus agradecimentos dirigem-se tam-
bém aos alunos de meu seminário, que resistiram à experiência destas
páginas; a Michel Casevitz, Jacques Revel e Jean-Pierre Vernant, que
foram seus primeiros leitores; enfim, a Éric Vigne, por sua paciência.

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Há livros que são como viagens: quase nunca se segue
exatamente, ao fazer-se uns e outras, a rota que se
tinha proposto.
C. Perrault,
Paralelo entre os Antigos e os Modernos

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Sumário

Introdução
Viajantes e homens-fronteira 13

Capítulo I
O retorno de Ulisses
A viagem e o retorno 27
Antropologia 35
O retorno a Ítaca 41
As viagens de um nome 54

Capítulo II
viagens do egito 59
Ver o Egito 60
Olhares gregos 66
O Egito, primeiro civilizador? 87
De Hermes Três-Vezes-Grande a Champollion 99

Capítulo III
INVENÇÃO DO BÁRBARO E INVENTÁRIO
DO MUNDO 105
Bárbaros e gregos 106
Representar o mundo 116
Centro e confins 126
Ver o mundo a partir de Alexandria 135

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Capítulo IV
VIAGENS DA GRÉCIA 141
As viagens do velho Anácarsis e o
esquecimento das fronteiras 142
As fronteiras do interior ou as discriminações
ordinárias 153
Os limites da Arcádia 174
Alexandre entre Roma e a Grécia 195

Capítulo V
VIAGENS DE ROMA 209
As viagens de Políbio 212
A viagem de Dionísio de Halicarnasso 221
As viagens de Estrabão e de Élio Aristides 243

Conclusão
A MEMÓRIA DE APOLÔNIO E O NOME
DE PITÁGORAS 257

Notas 271

Índice remissivo 311

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Introdução
VIAJANTES E
HOMENS-FRONTEIRA

Qual é hoje o uso do nome de Ulisses? Uma sonda ameri-


cana e europeia de exploração espacial foi batizada de Ulisses.
Talvez porque se trata de uma viagem para muito longe, a fim
de ver o que jamais se pôde observar: os polos do sol? Mas
“Ulisses”, desta vez, não retornará! Essa viagem é, por hipó-
tese, sem retorno. Devemos também contabilizar, numa esfera
mais banal, um número expressivo de agências de viagem sob
a insígnia de Ulisses ou programas de cruzeiros que convidam
a seguir sua rota e aproveitar os encantos do Mediterrâneo.
Suporte para a indústria turística, seu nome mobiliza também
as agências espaciais. Como se, pela reativação desses velhos
nomes, se quisesse suscitar, sem se crer verdadeiramente nisso,
alguma moderna mitologia ou, simplesmente, entre ciência e
ficção, reciclar a antiga.1
Nos anos 60, a própria Grécia tornava-se um reduto privile-
giado do turismo mundial. Zorba, o grego (1964) dava volta ao
mundo, sob os traços de Anthony Quinn e de Irene Papas; logo,
Jacques Lacarrière, grande andarilho apaixonado pela Grécia,
iria evocar, com felicidade, uma memória grega: a memória
ameaçada, material e carnal, do país de que ele havia percorrido

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as estradas e os caminhos, de que havia tomado emprestado
os barcos, entre 1946 e 1966; a memória anterior às grandes
marés de turistas e à ditadura dos coronéis; enfim, a memória
que, desde milênios, habita a língua, nela se concentrou ou se
refugiou: imaterial, frágil e, todavia, sempre viva para quem
sabe entender. Basta um poema de Seféris para que comece
ou recomece a viagem pela Grécia — e então se encontra “a
grande respiração do corpo histórico da Grécia”.2
Trata-se, nas páginas seguintes, de antropologia e de
história da Grécia antiga — ou de uma história cultural de
longa duração, que toma como balizas e escolhe como guias
algumas figuras de “viajantes”. Começando pelo primeiro
e o mais famoso deles: Ulisses, o herói que “durante muitos
anos errou / vendo muitas cidades, descobrindo muitos costu-
mes”.3 Outros o seguirão, valendo-se dele, viajantes efetivos
ou fictícios, que nos levam ao Egito, ao coração da Grécia, a
Roma ou ao redor do mundo. Ulisses é aquele que viu e que
sabe porque viu, indicando, de imediato, uma relação com o
mundo que é o cerne da civilização grega: o privilégio do olho
como modo de conhecimento. Ver, ver por si mesmo e saber “é
uma só coisa”.4 “Preferimos a vista a todo o resto — declara
Aristóteles. A causa disso é que a vista é, de todos os sentidos,
o que nos faz adquirir mais conhecimentos e que nos revela
mais diferenças.”5
Quer se trate de viagens longínquas — até os limites dos
limites, como no caso de Ulisses — ou de viagens na própria
Grécia ou a Roma, quer se trate de viagens literárias — tal
qual a de Apolônio de Tiana, no espaço de uma língua e de
uma cultura — é de narrativas de viagens que tratamos.6 O
objetivo, aqui, não é delinear um mapa dessa cultura antiga,
extenso e pesado aparelho sinótico desdobrado sob os olhos
do leitor, em que as mudanças são marcadas por uma lenta ou,
ao contrário, uma brusca contração das curvas de nível, mas
se visa tão somente escolher alguns viajantes e segui-los por
um tempo. Portanto, nem a topografia, nem a geografia, mas

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o movimento e o olhar, a topologia e o itinerário. Pois seus
percursos no espaço do mundo inscrevem-se também como
certo número de itinerários, de traços mais ou menos profundos
e perenes, em sua própria cultura.
Ulisses, em suas viagens, pelo próprio movimento desse
retorno sem cessar contrariado e diferido, traça os contornos
de uma identidade grega. Ele a enclausura. Ele marca as fron-
teiras (entre o humano e o divino, por exemplo), ou, sobretudo,
ele, o Resistente, prova-as ou experimenta-as, arriscando-se a
perder-se totalmente. Móvel, agitado pelas ondas, tendo sempre
de partir de novo, ele próprio é um homem-fronteira e um
homem-memória. Ele avança o mais longe possível, até além
do que não permitiria mais retorno: aos limites extremos do
mundo de baixo, onde reina o Hades, tão perto quanto possí-
vel das margens da ilha das Sereias, encantadoras de morte,
onde se veem empilhados “os ossos dos corpos decompostos,
cujas carnes se desfazem”. Junto dos lotófagos, mesmo na
casa de Circe, a maga, ele não esqueceu, apesar de tudo, o dia
do retorno, e, na casa de Calipso, “assentado sobre as pedras
da praia”, “ele chorava contemplando o mar sem colheitas”.
Esses viajantes inaugurais deslocam-se até as fronteiras,
são eles próprios marcos de fronteira, embora móveis. Vão e
estão, por assim dizer, dos dois lados das fronteiras, grandes
ou pequenas: ao mesmo tempo dentro e fora, intermediários,
barqueiros, tradutores. Ao lado da viagem extrema, há o
“aventureiro” que sulcou e correu o mundo: ele é chamado de
polyplanés. Assim Pitágoras, reconhecido pela tradição como
um grande viajante: impaciente em deixar Samos, sua ilha
natal, visitou o Egito, parou em Creta, frequentou os caldeus
e os magos, antes de aportar na Magna Grécia. Mas, segundo
outros biógrafos, ele seria de origem tirrena ou mesmo síria. Era
também um viajante no tempo, ele que guardara memória de
todas suas vidas passadas. Assim também Hecateu de Mileto,
igualmente qualificado de polyplanés, o autor de um Percurso
do mundo e visitante, antes de Heródoto, do Egito.7 Assim

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