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CEITIS

Artigo pelo Eng. Paulo de Lemos,


Publicado na Revista Moeda nº 2/2004
CEITIS artigo do Eng. Paulo de Lemos

O Eng° Paulo Augusto Ferreira de Lemos (1912-2003), deixou-nos em 16 de Dezembro último,


com 91 anos de idade. Figura sobejamente conhecida do meio numismático, dedicou-se
essencialmente às moedas batidas a martelo. Via nesses exemplares muitos aspectos atractivos,
dignos de serem estudados no seu todo, ao contrário das moedas datadas, que não gostava de
coleccionar, por normalmente ser a data o único pormenor responsável pela raridade da moeda
Colaborou em vários órgãos de comunicação especializados e também na Revista Moeda, onde
os seus artigos foram muito apreciados, nomeadamente os que dedicou aos "ceitis ". Em sua
homenagem insere-se o presente artigo, publicado em Junho de 1973 - ano da fundação da
Revista Moeda - e que foi seleccionado dos muitos com que nos presenteou durante a sua vida

A numaria portuguesa durante a da corrosão, quer, por outro lado,


2ª. Dinastia apresenta uma moeda ao muito tempo em que correram
que não muda, fundamentalmente, como moeda divisionária.
de tipo durante cerca de 140 anos A cunhagem desta moeda
ao 1ongo dos reinados de D. Afonso denominada "Ceitil", começou,
V, D. João II, D. Manuel I, D. João segundo Aragão, no reinado de D.
III e D. Sebastião; essa moeda em João I, aquando da tomada de
cobre foi chamada “Ceitil", o seu Ceuta, com inscrição árabe no
nome deriva de Ceuta e de alguma reverso, mas o facto não está
forma está ligada à tomada desta totalmente demonstrado.
cidade do Norte de Africa ocorrida D. Duarte lavrou também moeda
em 1415, no reinado de D. João I. de cobre a que se tem chamado
É extremamente vulgar, mesmo a "Ceitis", mas as peças monetárias
mais vulgar de toda a série a que nos queremos referir serão
portuguesa, não sendo exagero somente as que ostentam as
computar em muitos milhares a "torres de Ceuta batidas pelo mar".
existência em poder dos A descrição sumária e geral para
colecionadores e todos os dias, em este tipo de moeda é,
especial no Alentejo, vão invariavelmente, a mesma ao,
aparecendo mais e mais. longo dos reinados de D. Afonso V
Infelizmente não é vulgar apresen- até D. Sebastião ou seja desde
tarem-se em muito bom estado de cerca de 1438 a 1578 e resume -se
conservação, derivado sem dúvida a:
quer ao material em que foram Dum lado o escudo de Portugal,
batidas (cobre) que, como se sabe, sob vários modelos, rodeado por le-
resiste muito pouco à acção genda e na outra face três torres de
destruidora fortaleza banhada pelo mar com
legenda que vulgarmente consiste
no nome do monarca.
Podem ou não ter indicada, por cunhados, tomando como base o
letra monetária, a oficina de catálogo Ferraro Vaz e comple-
fabrico, (Lisboa, L; Porto, P; Ceuta, tando-o por conhecimento directo
C ou C-E) dum lado ou outro das de moedas nele não referenciadas
torres, não sendo conhecida a quer por desconhecimento do autor
moeda com L à esquerda e querido quer por lapso.
as letras monetárias soo C-E, é
evidente que o C será à esquerda e
o E à direita. D- AFONSO V
Tem sido pouco tratada a sua
sistematização pelos numismó- É a mais extensa série caracte-
grafos, devido, sem dúvida, à rizada por um escudo lanceolado
dificuldade de atender à variação de (escudo antigo), assente sobre a
todos os elementos que os cruz de Avis, os escudetes laterais
integram: variação do escudo, das das quinas, virados para o centro.
torres, das letras monetárias ou Cunhados em Lisboa, Porto e
sua ausência, das legendas e até do Ceuta (L, P, C e C-E) e muitos sem
aspecto do numisma derivado da letra monetária; são raros: os
sua manufactura. marcados com a letra L, com a
letra C à direita e ainda, muito
mais, os marcados com C-E.

Não vou, portanto, dadas as


dificuldades apontadas, refazer
uma classificação que é extrema-
mente difícil mas tão somente
abordar algumas considerações
sobre a raridade de alguns
espécimes.
Poderá logo de início parecer
paradoxal falar de raridade quando
se trata de uma moeda extrema-
mente vulgar, mas o paradoxo é O "Ceitil" A5.114 (Ferraro, Vaz),
somente aparente pois a raridade cuja torre central é encimada com
consiste em particularismos um A, é extremamente raro, (só
próprios de um numisma, como conheço a exemplar que hoje figura
p.ex; a existência de uma coroa real no meu medalheiro).
sobre o escudo, normalmente sem São muito raros o "Ceitil"
este coroamento; o hibridismo de A5-115, com escudo sem castelos a
moedas; etc. cantonar as quinas e o "Ceitil"
Por outro aspecto também os "Cei A5-ll6 com arcos envolvendo as
tis": são raros, refiro-me àquele que torres.
diz respeito ao bom estado, e uma
norma bem estabelecida diz-nos D. JOÃO II
que qualquer "Ceitil" em muito boa
conservação, com legendas Durante este reinado deixa o
completas ou quase e gravura das escudo de repousar sobre a cruz de
torres e do escudo sem mácula é Avis; os escudetes laterais são
peça muito rara e valiosa. endireitados, isto é, passam a ler
Vamos então, dentro destas uma posição vertical igual à dos
coordenadas, ("Ceitis" com torres outras três; não são conhecidos
banhadas pelo mar) tentar dar numismas com letras monetárias e
uma noção da raridade dos portanto são considerados como
numismas dentro de cada um dos batidos em Lisboa.
reinados em que foram
As legendas apresentam varia- "Ceitil" coroado de D João II-J2-57,
ções na forma gráfica do ordinal lá citado) e o raríssimo "Ceitil"
que se segue ao nome do rei coroado El-67 com letras árabes.
encontrando-se a grafia SECVNDVS no reverso cuja tradução é -
ou I.I. ou até uma destas no Manuel rei de Portugal -.
anverso e a outra no reverso. Na minha colecção há
Todos os "Ceitis" deste reinado exemplares de um "Ceitil", que
são em geral mais raros do que os reputo raro, em que o traço de
vulgares de Afonso V mas o "Ceitil" fecho superior não é recto mas
J2-57 (Ferrar, Vaz), com escudo constituído por dois arcos cujo bico
coroado e tendo no centro o escudo é virado para cima (escudo suíço) e
dos quinas rodeado de 7 castelos é "Ceitis" que não reputo raros, de
extremamente raro e precioso. escudo redondo, não referenciados
em Ferraro Vaz, semelhantes aos
de D. João III -J3-203

Ceitil híbrido

D JOÃO III

Escudo Suiço Seguindo a evolução já


processada na numaria de D.
Manuel I, as torres apresentam-se
D.MANUEL I sob outras expressões de gravura; o
escudo que no começo do reinado
Representação do escudo ligeira- foi representado com 4 castelos a
mente diferente do usado em D. cantonar os escudetes, deixa de o
João II (menos agudo) e para o fim ser, bem como o ordinal III que
do reinado passa a ser repre- passa a ser substituído pelo
sentado com base redonda; ligeiras algarismo árabe 3 (como é do co-
variações na representação das nhecimento geral, data dos meados
torres, aparecendo mais isoladas e do século XVI a introdução em
por vezes ladeadas de arruelas. Portugal dos algarismos árabes).
As legendas são exclusivamente Legendas constituídas exclusiva-
com o nome do rei e seus títulos. mente pela nome do rei e pelos
Peças raras deste reinado: as seus títulos. Círculos lisos ou de
catalogadas com os números pérolas envolvendo o escudo e as
E1-58, "Ceitil" híbrido, E1- 62, torres, que de futuro, no reinado de
"Ceitil" coroado (note-se o escudo D. Sebastião, como veremos,
das quinas incorporado num desaparecerá deixando o escudo c
escudo com 7 castelos tal como o as torres livres dentro da legenda.
Notem-se os 3 "Ceitis" híbridos
J3-199, 200 e 210; os rarissímos
"Ceitis" J3-208, com quinas soltas,
isto é, sem escudo e sem círculo em
volta das torres, prenunciando a Escudo pequeno coroado
evolução acima referida; e o "Ceitil"
coroado J3-212, com o escudo das
quinas cercado por 7 castelos Iodos
estes espécimes são extremamente
raros.
Do meu conhecimento e da
minha colecção existe ainda um IOHANES -3
híbrido coroado com o nome de
I-EMANVEL do lado do escudo e de
IOHANES da face das torres.
Escudo com 7 castelos
Ainda no meu conjunto de
Ceitil D. Sebastião
moedas de D. João III se encontram:
outro "Ceitil" híbrido, não referen-
ciado em Ferraro Vaz, pois apre- D. SEBASTIÃO
senta o escudo arredondado e torres Continuação no estilo das
como J3-200; um "Ceitil" coroado moedas de D. João III Já citadas
com duas grandes arruelas dum e J3-208; legendas com o nome do
doutro lado do escudo cuja coroa é rei, por vezes seguido do anverso
muito diferenciada da representada para o reverso para completar o
em Ferraro Vaz; e um outro "Ceitil" titulo p.ex..
com um pequeno escudo coroado e SEBASTIANVS.I.R.P no anverso,
com torres igualmente bem seguida de ALGARBIORUM ou
diferentes. PORTUGAL no reverso.
Note-se ainda a falta no catálogo Os "Ceitis" deste reinado são
de um "Ceitil" do tipo de J3-207 em mais raros na generalidade do que
que a legenda do lado das torres é os dos outros reinados e mais
PORTUGAL; e para terminar quero diminuídos em modulo e peso.
referir um curioso e raro "Ceitil" em No catálogo não se encontra
que a legenda IOANES . 3 . começa relacionada um "Ceitil" cuja
do lado esquerdo das torres em legenda do lado do escudo é
baixo; o escudo é constituído pelo
escudete das quinas tendo em volta REX PORTUGAL
sete torre s como é uso nos "Ceitis"
e que julgo relativamente raro.
coroados.

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