Através do uso da etnofilosofia presente de maneira expressiva na narrativa de
Mãe, Materno Mar estruturam-se o maior número de aportes filosóficos ministrados
constantemente ao leitor pela narrativa cardosiana.
Identidade, pois, é atribuição de algo que é idêntico, remetendo imediatamente à
ideia de semelhança, parecença, espelhamento, similitude. Tendo afirmado que a identidade é uma construção imaginal, a esta altura, faz-se imprescindível esclarecer o conceito de imaginário que está em uso nesta investigação. Para Gilbert Durand, o imaginário é uma
Re-presentação incontornável, a faculdade da simbolização de onde
todos os medos, todas as esperanças e seus frutos culturais jorram continuamente desde os cerca de um milhão e meio de anos que o homo erectus ficou em pé na face da terra. (DURAND, 1998; p.117)
Então o imaginário é produto dos encontros e desencontros da sensibilidade
humana com o mundo. Esta substância imaginal primordial e seus conteúdos se afigurtam na realidade e a ordenam, conforme descreve Peter Berger e Thomas Luckmann:
O universo simbólico também ordena a história. Localiza todos os
acontecimentos numa unidade coerente, que inclui o passado, o presente e o futuro. Com relação ao passado, estabelece uma “memória” que é compartilhada por todos os indivíduos socializados na coletividade. (BERGER & LUCKMANN, 1985; p.1140)
Apesar das muitas divergências teóricas, a concepção de imaginário adotada por
Sérgio Paulo Rouanet segue na mesma linha de pensamento de Maffesoli, enfatizando o nomadismo imaginal que caracteriza um tipo de vagueza peculiar, contingente. Ele diz que:
O imaginário se traduz num conjunto de imagens articuladas, com
recorrência temporal e trânsito transcultural, atravessadas por sensibilidades igualmente sócio-históricas, não enquanto um depósito de referências, um arquivo a ser vasculhado, mas numa dinâmica interativa entre os tempos históricos. (ROUANET, 2002; p.14-15)
Esta descrição toma o imaginárioo como um espaço onde se dá todo o pensamento
humano, todo o processo de formação de epistemes; nas suas palavras: “o horizonte portanto que se descortina na esfera do conhecimento é o do imaginário como forma de pensar, um imaginário-pensar”.