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A FORMAÇÃO DO PROFESSOR PESQUISADOR

Marina Neiva Alvim1

DOI:
“Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino”
Paulo Freire – Pedagogia da Autonomia

Com frequência lemos ou escutamos que é necessário que o professor seja um


pesquisador. E ele é. Os seres humanos são. Dos inventores de fundo de garagem, passando pelos
cozinheiros, até o cientista de jaleco branco no laboratório, todas as pessoas buscam saber algo e
transmitir o que sabem. No dia a dia fazem isso de forma orgânica, automática, impensada... A
curiosidade nos é inata, assim como a transmissão dos nossos saberes. E é nisso que se baseia a
pesquisa: formular perguntas, buscar respostas e informar as descobertas. Então, por que a
insistência em afirmar que o professor deva ser pesquisador? Ele já o é. Talvez o discurso deva
recair sobre como construir perguntas com limites claros, buscar respostas com rigor e método e
informar descobertas de forma eficiente. E isso tudo nem sempre é fácil ou inato e sempre deve
ser feito de forma consciente de que não existe uma só verdade definitiva, pois como afirma
Paulo Freire, somos seres inacabados inseridos em processos também inacabados. Mas esse
discurso é generalista, pois poderia ser feito a respeito de qualquer profissão ou profissional. A
pesquisa é necessária para que existam avanços em qualquer linha de conhecimento.

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Doutora e Mestra em Fisiologia Vegetal pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Especialista em
Manejo e Gestão de Ambientes Florestais pela Universidade Federal de Lavras (UFLA) e em Educação Ambiental
pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Licenciada em Ciências Biológicas pelo Centro
Universitário Metodista Izabela Hendrix (CEUNIH). É professora do CEUNIH. E-mail: m_neiva@hotmail.com.
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Contudo, maior ênfase à necessidade do rigor e do método em pesquisa tem sido dada a
outras profissões que não a docente. Tal necessidade nos parece óbvia à prática médica, por
exemplo, realizando exames para elucidar os motivos da enfermidade. Mas historicamente, a
prática docente tem sido executada por meio da repetição, não discutida, de metodologias, que
apesar de serem frutos de pesquisas, são implementadas como verdades definitivas e pouco ou
nada avaliadas e registradas durante a prática profissional. Então, talvez, esse discurso de que o
professor deva ser um pesquisador rigoroso e metodológico é que seja o necessário. E, partindo
do princípio que tais características não fazem parte do senso comum no que diz respeito à
pesquisa, a formação docente deve se ater ainda mais, à construção de maiores espaços de
reflexão a isso.

Um professor não pode esperar eficiência do processo de ensino aprendizagem no qual ele
está inserido, se ele não se propuser a investigar continuamente a sua práxis. É impossível obter
sucesso desse processo simplesmente com a repetição anual, semestral ou, quiçá, semanal das
mesmas atividades, mas nunca para o mesmo público, ainda mais sem a reflexão sobre o que é o
sucesso ou como mensurá-lo. Da mesma forma, é impossível se conceber que um só professor,
por mais “pesquisador” que ele seja, consiga encontrar respostas para suas perguntas somente
com a sua pesquisa, é preciso conhecer também a pesquisa de seus pares.

Assim, entende-se que a pesquisa em educação e as questões de método da sua construção


são definitivas tanto para a formação quanto para a prática docente. A educação não é algo
descontextualizado, atemporal e previsível. Ela é uma prática social, humana e histórica que
requer avaliação, validação e reflexão contínuas. Enquanto pesquisadores, os professores são,
portanto, mais capazes de se inserirem efetivamente no processo de ensino e aprendizagem, pois
realmente aprenderiam enquanto buscam ensinar. Novamente, como afirma Paulo Freire, a
simples transmissão de conhecimento não é ensinar, o ensino se baseia na produção e na
construção conjunta do conhecimento por docentes e discentes. O professor, sempre inacabado,
constrói sua práxis ao permitir que o aluno construa a sua, num processo contínuo de
emancipação para ambos.

Nesta edição da Revista Formação@Docente frutos da pesquisa em educação podem ser


encontrados, trazendo importantes reflexões sobre a profissão docente, tanto quanto aos
parâmetros atuais e futuros que a norteia, quanto sobre a própria práxis. Furletti, em sua reflexão
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sobre os avanços e desafios do PNE 2014-2024, propõe um recorte exploratório das metas de
acesso e universalização do ensino e os desdobramentos no Plano Estadual de educação de Minas
Gerais. Segundo o autor, projeta-se um cenário desafiador para atingir, até 2014, tais metas de
acesso e universalização, com avanços possíveis e importantes, mas talvez não expressivos.

Pensando a educação superior de engenheiros de produção, Azevedo e Gontijo analisam


as habilidades, competências e o perfil necessários ao profissional de Engenharia de Produção, no
sudeste brasileiro, para sua inserção no mercado de trabalho. Os autores destacam que as
formações pragmáticas e estáticas atuais não são consonantes com as demandas do mercado,
sendo estas mais direcionadas para a capacidade pesquisadora dos profissionais. Os autores
verificaram a importância da habilidade de identificar e solucionar problemas, algo que demanda
sólida formação em pesquisa.

Uma importante contribuição para a educação infantil também é apresentada na presente


edição. Feio e colaboradores buscaram investigar a perspectiva de didática presente no trabalho
do professor em sala de aula e seus impactos no processo ensino-aprendizagem de crianças, a
partir dos pressupostos da pedagogia histórico-crítica. Eles concluíram, no caso estudado, que a
prática empregada não contribuiu para a emancipação dos educandos e retomaram a discussão da
importância da atividade docente na formação cidadã.

Uma reflexão bem específica à formação do professor pesquisador aparece no trabalho de


Duarte e Sá. As pesquisadoras apresentam uma análise bibliométrica dos trabalhos de conclusão
do curso de Pedagogia do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix (2010-2015). A análise
identifica as principais áreas e temas de pesquisa no âmbito da Pedagogia mais e menos
abordados em um contexto específico, demonstrando o interesse dos docentes em formação e
sugerindo lacunas de investigação que podem ser abordadas no futuro.

O ensino de matemática em uma classe multisseriada de educação básica no contexto


rural é discutido no estudo de Muniz e Ciríaco. Os autores tiveram como objetivo apresentar
considerações sobre como uma professora organiza suas aulas tendo em vista as distintas faixas
etárias dos educandos e sugerem que a problematização nas aulas de Matemática apresenta-se
como um possível caminho para o processo de ensino e aprendizagem dessa disciplina. Ainda, os
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autores salientam a importância da pesquisa com o professor e não apenas sobre o professor a fim
de se contribuir para a construção da práxis.

Outra análise sobre a formação profissional é trazida por Paixão, desta vez para o
professor de Educação Física. O autor analisa, a partir do conceito de profissionalismo
emergente, aspectos subjacentes ao processo de aprendizagem de professores de Educação Física
no início de carreira em academias de ginástica. Novamente, observa-se a necessidade, na prática
profissional, da busca de respostas para situações problemas, o que deve ser refletido
academicamente por meio do fomento à emancipação do educador físico em formação.

Gonçalves e Crepalde apresentam uma análise quantitativa sobre a presença do rádio no


consumo de músicas de um modo geral, bem como sua força atual como veículo de difusão de
novos artistas e o seu potencial junto a um público interessado em música.

Assim, professores pesquisadores, quando apresentados com situações problemas,


identificaram e delimitaram suas perguntas. Metodologicamente, buscaram respostas e
rigorosamente apresentaram seus achados nesta edição da Revista Formação@Docente,
contribuindo para a produção e construção do conhecimento não só dos autores mas também para
os demais colegas de profissão atuais e futuros. Pode-se perceber nesta edição que mais um ciclo
de pesquisa se conclui. Não será o último. E que sejam sempre mais numerosos.

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