Você está na página 1de 3

Aula 03_Parte B - A Arte de Ensinar de Wolfgan Ratke

 Temática: A Arte de Ensinar de Wolfgan Ratke

   

Finalizamos a aula anterior apontando como Ratke concebia o ofício do mestre


do ensino e a necessidade de estudo constante “Sobre o Método e a própria
Arte de Ensinar e Aprender” (RATKE, 2008, p. 41). Nesta aula vamos destacar
a concepção de Didática de Ratke como “arte”. Repare que, apesar de Ratke
estar sintonizado com a discussão intelectual do seu tempo, com a questão do
Método, e intitular um dos seus escritos como “Método Geral da Didática”
(RATKE, 2008, p. 37-45), sua obra refere-se à Arte de Ensinar e Aprender. O
que poderia significaria “Arte de Ensinar e Aprender” para Ratke? Estaria a
Didática relacionada com a Estética? Com a Poética (poiesis)? Com a Beleza?

Vamos procurar informações complementares para responder a essas


indagações. Vamos começar com o conceito de Estética. A Estética é um ramo
da Filosofia que trata da Arte, das questões sobre a beleza, o gosto, a
percepção artística, entre outras. Em seu uso corrente, entende-se a Estética
associada à beleza. Aí estão os cabeleireiros, as academias de ginástica e
muitos outros exemplos nas ruas de qualquer cidade, porém o vocábulo
Estética tem suas origens no grego, Aisthesis, que se refere ao conhecimento
sensível, a possibilidade de conhecermos por meio dos nossos sentidos, das
sensações, a percepção totalizante.

Assmann (1996) indica que Aisthesis é o termo grego para a experiência da


beleza, daí estética, que expressa etimologicamente a ação − corporal e
anímica− de sugar para dentro, inspirar, agarrar envolvendo. Nesse sentido,
Aisthesis se relaciona com a percepção vital, ao invés de esteticismo. Este
autor lamenta que uma palavra tão expressiva, que alude à percepção e
sensação, a uma sensualizada intuição, se desvirtuasse para sugerir
contemplação e esnobismo artístico-elitista. Assmann (1996) observa que a
palavra grega kósmos nunca significou apenas ordem, mas, sobretudo
conjunto bonito, do que derivou a palavra cosmética. O autor sinaliza que
debaixo de todos esses termos encontramos a noção da experiência única da
espécie humana diante da harmonia e beleza do cosmo.

Seria essa experiência da humanidade diante da harmonia e beleza do kósmos


que nos levaria à poiesis.Poiesis é uma palavra de origem grega que, em suas
origens significou criação, ação, confecção, fabricação até que chegou a
significar o modo de fazer, a arte da poesia e a faculdade poética.

Nesse sentido a poética refere-se ao que produz, que cria, que forma.

Com essas informações adicionais nós podemos supor qual seria o conceito de
arte de Wolfgang Ratke. Na Antiguidade e na Idade Média, o que nós
chamados hoje de arte era considerado como artesanato utilitário. Na
Antiguidade não havia diferença entre fazer uma estátua de mármore, fazer um
baixo relevo ou fabricar uma sandália, pois a arte era uma fazer habilidoso,
uma técnica a ser empregada. Não diferenciar arte e artesanato implica uma
concepção de arte como habilidade, como fazer bem determinado trabalho e,
em geral, um trabalho manual, por isso não se diferenciava quem produzia um
baixo relevo ou uma sandália.

Vamos consultar o Dicionário da Língua Portuguesa, pois o Dicionário


sistematiza os diversos sentidos que são dados pela sociedade a cada palavra.
Consultando o Dicionário (FERREIRA, 1999), vamos encontrar que o primeiro
sentido dado á palavra arte é o da capacidade que tem o ser humano de
colocar em prática uma determinada ideia valendo-se da faculdade de dominar
a matéria. O segundo sentido dado à palavra arte vai nessa mesma direção:
utilizar a capacidade de fazer algo para se conseguir um resultado. Agora
vamos estar atentos aos outros sentidos dados á palavra arte, que é o da
capacidade natural ou adquirida de fazer alguma coisa bem, o que nos leva
diretamente aos demais sentidos de dom, habilidade, jeito, chegando ao último
sentido que é o de ofício, profissão, especialmente nas artes manuais.

Lembre-se de que nas aulas anteriores nós já indicamos que Ratke introduziu o
modo de produção da época, a manufatura, a produção em série com as mãos,
na Educação, por isso mesmo refere-se ao “ofício do mestre do ensino”
(RATKE, 2008, p. 40). Com todos esses elementos reunidos, nós podemos
concluir que a noção da arte de ensinar e aprender de Ratke refere-se à
capacidade de fazer bem dominando o modo, o jeito, os instrumentos
necessários para esse fazer. 

Ao longo dos séculos vários filósofos têm apontado a prática educativa como
sendo uma arte. FULLAT (1994) observa que o entendimento de Educação
como arte não se dá no sentido estético de belo, mas inspira-se na
etimologia da palavra grega artuêin, que significa arrumar, dispor. Nessa
acepção, nesse sentido dado à palavra arte se concebe a arte como atividade,
logo a Educação como arte é uma atividade, uma prática que dá forma aos
homens e mulheres, e os educadores são os agentes que possuem a
habilidade para desenvolver essa atividade.  Nesse sentido a metáfora da
Didática como arte, utilizada por Ratke, aponta para o domínio do fazer, ou
seja, Didática como aplicação de uma técnica. É certo que Ratke compreendia
a arte de ensinar e aprender como a aplicação de uma técnica, porém, hoje, no
século XXI, nós podemos nos apropriar dessa mesma metáfora de Ratke e
ampliarmos a concepção de arte como técnica. Temos que ter clareza que
quando Ratke referia-se à Didática como arte ele estava pensando em aplicar
uma técnica para ensinar, porém nós, leitores de Ratke no século XXI,
podemos questionar essa metáfora de arte como técnica e ampliar essa
concepção lembrando que: por meio do domínio de uma técnica também se
expressa um modo singular, um modo único, de ver a realidade. O que isso
quer dizer? Isso quer dizer que também pode haver um aspecto de criação na
aplicação de uma técnica. Para compreender esse aspecto criativo no domínio
de uma técnica vamos recorrer ao exemplo do artista brasileiro Cândido
Portinari (1903-1962).

Portinari dominava com tanta destreza a técnica da pintura que conseguiu se


expressar de um modo singular com essa técnica, ou seja, criou um estilo
próprio, por isso quando visualizamos um quadro de Portinari reconhecemos
que se trata de um “Portinari”. Isso quer dizer que, apesar de dominar o jeito e
os instrumentos do fazer também há um aspecto de criatividade que não pode
ser desprezado nesse fazer, e esse será o tema da nossa próxima aula.

  

Para refletir:

Se você está se questionando sobre o que vem a ser o processo de criação,


sugerimos a visita ao Projeto Portinari. Vale a pena conferir a produção de
Cândido Portinari (1903-1962)   

Você também pode gostar