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Elomar Tambara*
Resumo
Este trabalho tem como objetivo analisar alguns aspectos relacionados à peculiar relação que
se estabelece entre o sistema escolar brasileiro e a constituição da identidade nacional. A ideia
motriz é demonstrar que tanto um como outro estão vinculados aos processos constitutivos
originários de sua formação, marcadamente o século XIX. Tais “cicatrizes” constituem os
elementos fundamentais da identidade brasileira que hodiernamente ainda está se consoli-
dando.
1 Introdução
1
Esta análise da ideologia positivista, sob certo aspecto, é um complemento do trabalho
“Educação e Positivismo no Brasil” – publicado em Histórias e memórias da educação no Brasil
organizado por Maria Stephanou e Maria Helena Câmara Bastos – e está principalmente
direcionado à identificação da influência paulista na construção desta forma de pensar.
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dificuldades e desafios em criar e, principalmente, expandir sua rede ensino.
A culpa disso se deve, em muito, à ideologia positivista, de modo especial,
ao seu ramo político-religioso mais ortodoxo e, sob certo aspecto, mais mi-
litante.
De meados do século XIX em diante, o positivismo, lenta e gradual-
mente, embora nem sempre de forma homogênea e ortodoxa, espalhou-se
por diversos segmentos da sociedade brasileira.
Há muitos pontos ainda a esclarecer a propósito desse espírito po-
sitivo que animou a cultura brasileira a partir de 1870 e que foi bem mais
relevante que o drama dos positivistas ortodoxos. Em verdade, sob certo
prisma, Miguel Lemos e Teixeira Mendes representaram fatores negativos
no movimento renovador das ideias, por terem querido seguir A. Comte
até as suas últimas consequências, aceitando, com admirável devoção, as
suas ideias socioreligiosas: coube-lhes, assim, o papel paradoxal de continu-
adores da velha tradição dogmática e autoritária, embora sob a roupagem
da revolução científica, enquanto desempenhavam mais um papel de ca-
ráter crítico. Precisamente esse foi o papel desempenhado por Alberto Sa-
les, impregnado de espírito positivo, sem nenhum dogmatismo, aberto e
receptivo, aceitando ora Comte, ora Spencer, contrapondo-os, superando-os
(VITA, 1965, p. 15).
A prática do positivismo em seu aspecto mais ortodoxo revela o en-
tendimento de caráter ideológico que era exigido de seus adeptos, principal-
mente daqueles mais ortodoxos. De modo geral, requerir-se-ia dos proséli-
tos um comportamento que inibia, em muito, o proselitismo. Havia sérias
restrições à participação na esfera política, na jornalística e na acadêmica,
mormente aquela de cunho mais cotidiano e profissional.
Para os positivistas ortodoxos, havia uma série de restrições compor-
tamentais, entre elas:
a) não ocupar cargos políticos durante a fase empírica e de transi-
ção, segundo foi definida por Augusto Comte;
b) não exercer funções acadêmicas, quer no ensino das nossas
faculdades superiores, Instituto Nacional, e estabelecimentos
congêneres, quer como membros de associações científicas ou
literárias;
c) não colaborar no jornalismo, diário ou não, nem auferir lucros
pecuniários dos seus escritos;
d) assinar com o seu nome todas as suas publicações, cuja inteira
responsabilidade moral e legal deveriam assumir.
Essas restrições estavam vinculadas justamente à ideia de que o pró-
cer positivista não podia separar sua função de adepto de uma determinada
concepção de mundo daquela função vinculada a sua atividade profissio-
nal. Evidentemente que esse comportamento mais “puro” esteve associado
ao que comumente se denomina “positivismo ortodoxo”, representado pe-
las figuras emblemáticas de Teixeira Mendes e Miguel Lemos, os grandes
apóstolos do positivismo no Brasil cujo ícone é “o Apostolado Positivista do
Brasil”.
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Contudo, o grande influxo de ideias e concepções positivistas no
Brasil esteve vinculado a matrizes ecléticas que, sob certo aspecto, em-
bora bebessem da fonte comtiana, agregavam em suas concepções outras
tradições teóricas que tornavam suas contribuições de caráter híbrido.
Ademais, é preciso considerar que esse segundo grupo “liberalizou” sig-
nificativamente as concepções de Comte, de modo geral associando ao
totalitarismo deste as concepções liberais de Herbert Spencer.
Houve então uma política de conciliação entre diversas tradições
teóricas, as quais possibilitaram o surgimento de embasamento ideo-
lógico que, mesclando-as, tornaram mais factível a explicação tanto da
realidade vivida pela sociedade brasileira como do modo como se cons-
tituíram em base para os ideais de transformação social e política que
gestaram a gênese do período republicano.
Entretanto, em relação ao ensino, houve questões que indelevel-
mente marcaram comportamentos excludentes entre positivistas e libe-
rais, sendo um deles a questão da liberdade de ensino, particularmente
a questão da participação do Estado na administração do ensino. Nessa
questão, as duas doutrinas, por caminhos diferentes, contribuíram para
inibir a participação governamental na oferta de instrução à população
brasileira:
Continua o autor:
3 Conclusão
Abstract
This paper aims to analyze some aspects related to the peculiar relationship established
between the Brazilian school system and the constitution of the national identity. The driving
idea is to show that either one or the other are bound to the constitutive processes, originating
from its formation, markedly in the nineteenth century. Such “scars” are the key elements of
the Brazilian identity that is still consolidating.
Referências