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EDUCAÇÃO CRISTÃ

Educação Cristã: Definição e princípios

1. Definir para diferenciar

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão,
para a correção e para a instrução na justiça. 2 Tm 3.16

Educação é um termo cheio de significado. Pensamos em educação como algo


que “vem de casa”, que deve ser dada pelos pais às crianças. Também refere-
se ao aprendizado escolar, o ensino intencional e direcionado, que em nosso
país é regulamentado pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Mas ainda tem a
conotação de instrução, algo que se aprende no meio social, na vivência do
indivíduo ao ajustar-se na sociedade da qual faz parte.
Todas as definições estão corretas, porém, no que se refere ao ensino cristão, é
importante saber diferenciar essas variações para que possamos alcançar todas
as implicações de uma educação pautada pelos princípios da Palavra de Deus.
A Bíblia é o manual onde está toda a base para o ensino e a aprendizagem do
cristão, e nela encontramos inúmeras passagens onde os verbos instruir e
ensinar aparecem como um desejo e também uma necessidade de aproximar-
se de Deus, mas afinal, o que isso representa na prática?

Paulo diz em 2 Timóteo 3.16 que a Escritura, a Palavra de


Deus, é útil para o ensino, para a repreensão, para a correção
e para a instrução na justiça. Parece ambíguo colocar ensinar
e instruir numa mesma frase, já que muitas vezes usamos
essas palavras como sinônimos, mas há uma diferença na raiz
delas que pode nos esclarecer muito.

Ensinar vem do latim insignare, mesma origem de signo, de significado, o que


representa "por uma marca, distinguir, assinalar". Por outro lado, instruir é do
latim structo = edificar, construir, mais o prefixo in = dentro. Instructo in = construir
dentro. Assim, podemos dizer que é possível ensinar sem instruir mas não é
possível instruir sem ensinar. Uma informação ou ideia só pode ser construída
dentro de você se ela tiver algum significado, caso contrário, ruirá como uma
casa na areia.
David Ausubel, um judeu especialista em Psicologia Educacional, propôs o
conceito de aprendizagem significativa, em que o processo de ensino precisa
fazer algum sentido para o aluno. Dizia ele:


Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um
único princípio, diria isto: o fato isolado mais importante que
informação na aprendizagem é aquilo que o aprendiz já
conhece. Descubra o que ele sabe e baseie seus
ensinamentos nisso.

Para Ausubel, nenhum conhecimento novo pode ser incorporado pelo aprendiz
se não houver uma ideia previa para aquele conceito se ancorar. Em termos
práticos, a instrução (construção de novas ideias, conceitos, caminhos) só
acontece mediante ao que já foi ensinado (marcado, pontuado, significado).

Mas então, o que é EDUCAÇÃO? Vamos novamente à raiz da palavra:

educar, do latim educare


educere = verbo composto do prefixo ex (fora)

ducere (conduzir, levar)

Educar significa conduzir para fora. Juntando os conceitos, podemos dizer que
ensinamos para instruir a fim de educar. Ou seja, colocamos uma marca, dando
significado a algo, para que isso possa ser construído na mente e no coração do
aluno, de maneira que gere prática de vida.

2. Educação cristã e secular, uma diferença crucial!


Agora que já entendemos o que é educação, temos que distinguir a cristã da
secular. O professor e teólogo Valdecir Santos 1, define a educação secular de
maneira esclarecedora:

1
FIDES REFORMATA XIII, Nº 2 (2008): 155-174
http://cpaj.mackenzie.br/webnovo/fidesreformata/artigos.php#XIII

É aquela perspectiva educacional cuja atenção é
horizontalmente dirigida ao século atual. Neste caso, a
abordagem da educação é feita a partir da concepção da
realidade como um sistema fechado, regido por leis fixas e
universais de causa e efeito, cujas explicações passam pela
teoria evolucionista com relação do surgimento e
funcionamento do universo e do ser humano.

Sob esse aspecto, podemos perceber claramente que a educação secular está
na contramão da cristã por seus princípios. O objetivo da educação secular é
horizontal, terreno, com o objetivo de preparar o aluno para conquistar coisas,
ter status dentro da sociedade e torna-se dono do seu destino, especificamente
no que diz respeito ao que pode ser realizado nesse século. Em nenhum
momento a educação secular está preocupada com o espiritual, com aquilo que
é de cima, que não perece, mas é eterno, e Paulo diz em Colossenses 3.2:
Mantenham o pensamento nas coisas do alto, e não nas coisas terrenas.

Educação cristã, contudo, não é ensino religioso. A escola secular pode oferecer
ensino religioso, sem que este seja, de fato, educação cristã. O ensino religioso
é a transmissão de valores religiosos sobre o universo, o indivíduo, a família e a
vida diária onde abre-se espaço para discutir questões éticas, morais e
religiosas, mas que, não necessariamente, são fundamentadas em Cristo.
A perspectiva da educação cristã é uma prática de vida pautada nos princípios
bíblicos, onde o progresso reflete-se na santificação do indivíduo. Podemos
compreender essa prática nas palavras de Paulo:
Mas agora que vocês foram libertados do pecado e se tornaram escravos de
Deus, o fruto que colhem leva à santidade, e o seu fim é a vida eterna. Rm 6.22
É interessante notar que o cristão produz mas também colhe fruto, de maneira
que, tanto o que ele produz como o que colhe, o aperfeiçoa para uma vida
dedicada a Deus. É um processo, como tudo o que remete à educação, mas o
seu alvo consiste em vida eterna. Assim, uma educação cristã sem princípios,
descompromissada do deu propósito, tem consequências desastrosas, pois
compromete a eternidade do indivíduo, diferente da secular, que traz desconforto
momentâneo.

3. Princípios do ensino e da instrução na educação cristã


Deus inspirou o salmista a cantar: Eu o instruirei e o ensinarei no caminho que
você deve seguir; eu o aconselharei e cuidarei de você. Sl 32.8. Instruir aqui
aparece com a intenção de fazer fluir como água e ensinar, de lançar como uma
flecha. Dois princípios bem distintos, que se aplicam com perfeição ao que essas
palavras significam.
Diferente da educação secular, que tem como princípio o crescimento individual
e geralmente promove uma prática de vida egocêntrica, a instrução da educação
cristã flui como água, pois é algo que se desenvolve dentro e jorra para fora,
saciando a sede de outros (Jo 4.14; 7.38).
Esse princípio está intimamente ligado ao conceito dar, repartir, tornar
conhecido. Como sabemos, o cristão deve dar muito fruto (Jo 15.8), ou seja,
produzir para benefício do outro. Cada cristão é uma árvore potencialmente apta
para alimentar e fartar o outro de amor, alegria, paz, paciência, amabilidade,
bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio (Gl 5.22-23). À medida que
damos muito fruto e ele é bom, mais pessoas se aproximam com o desejo de se
alimentar do que produzimos, e essa é a marca do educador cristão: atrair para
si aprendizes famintos da Palavra de Deus.
O ensino da educação cristã, por sua vez, deixa marcas sem ferir, e acerta o
alvo determinado por Deus (Is 49.2; 1 Pe 1.9; Fl 3.13-14). Isso porque, como o
próprio termo remete, a educação cristã está centrada em Cristo, e esta deixa
uma marca em nós que é inconfundível.
Em Gálatas 6.17 Paulo afirma que traz em seu corpo “as marcas de Cristo”, uma
referência a mortificar-se, abrindo mão dos seus próprios interesses para que o
evangelho fosse proclamado. Em 2 Coríntios e Efésios 1.13 Paulo diz que Cristo
nos selou como sua propriedade através do Espírito Santo.
O ensino centrado em Jesus gera em nós uma marca que nos diferencia dos
demais, que nos dá a garantia de que não somos donos da nossa vida, mas a
entregamos nas mãos do Senhor a fim de obter a vida eterna (2 Tm 2.19).
John Price classifica o ensino de Jesus em sete princípios:
- Formar ideais justos
- Firmar convicções fortes
- Converter o homem a Deus
- Relacionamentos com os outros
- Resolver problemas da vida
- Formar um caráter maduro
- Preparar para o serviço cristão
Para quem trabalha com escola bíblica, esses princípios são a base da educação
cristã, e devem ser tratados com muito zelo pelo professor. Negligenciar
qualquer um desses princípios na formação do aluno é como construir um
edifício sem usar os fundamentos necessários para que ele mantenha-se firme
e não desabe.
Sobre esse assunto, o pastor Gilmar Chaves comenta:

Para que alguém se torne um verdadeiro educador cristão, é
preciso ter uma compreensão do valor e da responsabilidade
do ministério do ensino e uma disposição contínua para a
autoavaliação e a busca de aperfeiçoamento, na certeza de
que aquele que começou a boa obra a aperfeiçoará até o Dia
de Jesus Cristo (Fp 1.6).

Somos edificados sobre o fundamento que é Cristo, mas ao educador cristão


cabe compreender que o aperfeiçoamento da obra está também sob sua
responsabilidade, conforme está escrito: E ele designou alguns para apóstolos,
outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres,
com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de
Cristo seja edificado. Ef 4.11-12

O reino de Deus é das crianças

1. O resgate do papel da criança


Jesus foi especialista em trazer à luz situações e questões que homens, por suas
próprias concepções, passaram a considerar causa menor ou insignificante. A
exemplo disso vemos a mulher, a criança e o aleijado como páreas da sociedade
judaica. Claro que o pecado trouxe consequências terríveis e que a organização
do povo judeu, de acordo com os princípios divinos, ajustou os papéis de cada
indivíduo, mas se Deus cuida e atrai, o homem humilha e exclui.
Jesus resgata, de maneira primorosa, a condição de cada grupo marginalizado
na sociedade judaica, entre eles, a criança. Vale ressaltar que Deus ensinou à
Israel como deveria tratar a criança:


Ensine-as [leis do Senhor] com persistência a seus filhos.
Converse sobre elas quando estiver sentado em casa,
quando estiver andando pelo caminho, quando se deitar e
quando se levantar. Dt 6.7

Essa referência mostra o cuidado que o judeu deveria ter com seus filhos, pois
o amor de Deus deveria ser revelado e ensinado pela presença constante dos
pais. Não se trata de uma ordenança aleatória, mas um contraponto aos
costumes pagãos dos povos que Israel não deveria se relacionar, onde as
crianças muitas vezes eram oferecidas em sacrifício aos deuses, fato que
ocorreu entre o povo de Deus (Lv 20.1-6; Jr 32.35).
O pecado e suas práticas levam a sociedade ao caos, e hoje temos a
responsabilidade de trazer a criança ao centro da discussão sobre o cristianismo
que pregamos e praticamos. A ideologia marxista tem propagado a ideia de que
a criança deve ter liberdade de escolha e estar apta ao prazer, mas o que se
pretende de fato é descontruir o ideal de Deus para os pequeninos.
Mateus 18 traz o relato de Jesus em meio a uma discussão dos seus discípulos;
queriam saber quem seria o maior no Reino dos céus. Jesus toma uma criança
e traz para seu colo, ensinando que, quem quisesse ser o maior, deveria ser
como aquele pequenino. O Mestre resgata o papel da criança na sociedade. Sua
inocência, sua simplicidade no modo de pensar e ver as coisas, sua pureza em
enxergar as pessoas e sua capacidade de acreditar deveriam ser tidas como um
princípio para aqueles que almejavam (e almejam) o Reino.

2. Onde erramos
O primeiro ponto a ser levado em consideração no ensino de Mateus 18 é a
necessidade de transformação. Aquele que almeja o Reino deve mudar a sua
rota e a maneira de ser (v.3-4), pois não é possível habitar em santidade com
Deus sem compreender que a simplicidade e a humildade são requisitos para
estar na Sua presença (pv 22.4; Ef 4.2; Cl 3.12; Tg 3.3; Sl 116.6).
Jesus enfatiza no versículo 5 que quem recebe uma criança, o recebe. Muitas
vezes a interpretação dada a esse texto é Jesus de fato não se referia a criança,
e embora seja totalmente coerente aplicar o exemplo ao novo na fé, ao simples
de entendimento, o certo é que a criança foi trazida para o meio dos discípulos
como uma referência concreta. Livre de qualquer interpretação, se nos
detivermos apenas a cena apresentada, a pergunta que fica é: Temos recebido
a criança em nosso meio, valorizando o seu status?
Com base na Shemá judaica (Dt 6.4-9), a criança tinha lugar de importância na
sociedade e deveria ter uma educação contínua dos princípios divinos, algo que
precisamos resgatar.
Afastar a criança do seio familiar foi a primeira estratégia de Satanás para
implementar seu reino maligno. A mulher deixou o lar e foi em direção ao
mercado de trabalho, deixando a educação dos filhos nas mãos de cuidadores,
um movimento que educadores classificam como “terceirização do papel
parental”. A escola passou a ditar regras e a instruir nossos filhos na verdade
relativista e humanista de um novo âmbito social. A estratégia aqui é clara, a
família já não é mais a detentora da educação, e sendo parte do processo, já
não determina sozinha sobre a formação da criança. Achamos essa ideia
interessante (de partilhar a responsabilidade) e apoiamos.
A desconstrução da família gerou a necessidade de novas regras familiares,
onde a recolocação no mercado de trabalho e engajamento da mulher foi
empurrado pelo empoderamento feminino. Mais atividades, mais
responsabilidades, mais autonomia individual, mais desgaste físico e emocional
levaram as relações familiares a se desgastarem.
Como consequência da nova estrutura social, o cristão voltou-se para Deus, mas
negligenciou o espaço infantil. Por espaço não nos referimos apenas ao lugar
físico, mas ao tempo, ao cuidado e às necessidades desse segmento que requer
tanta atenção, afinal, quando o adulto se perde, a criança o segue e se perde
junto. Quando o adulto adoece emocionalmente, a criança sem parâmetro,
adoece também. Quando o pai e a mãe travam uma guerra em busca de mostrar
quem está mais certo ou errado, a criança é alvejada pela insegurança e pelo
medo.
Jesus coloca a criança no meio de uma discussão sobre quem é mais para
ensinar que é necessário menos para conquistar Seu Reino. Menos autonomia
individual, arrogância, verdade absoluta, poder e capacidade.

3. Como tratar a criança na igreja


O diabo travou uma estratégia centrada na família e na criança e hoje estamos
numa batalha para proteger nossos pequenos da erotização precoce e
destruição da sua inocência. Jesus nos apontou o caminho, já ciente de que o
mundo chegaria aqui, na desconstrução da pureza.
A igreja como instituição, mais do que nunca, precisa investir no segmento
infantil, valorizando a criança como membro do corpo de Cristo, que merece ser
edificado através do ensino dos apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e
mestres.
À criança deve-se dar o tratamento adequado às suas necessidades, com a
utilização de linguagem própria para cada faixa etária, mobiliário e recursos
didáticos. Mas não apenas isso, o ensino deve estar pautado na Palavra de
Deus, e o tempo investido pelos professores em aplicar as verdades bíblicas de
maneira simples e objetiva, para que o aluno possa praticar o que aprendeu.
O diabo tem utilizado os mais poderosos recursos ao longo dos tempos para
atrair os pequenos: animações, programas de TV, jogos eletrônicos e interativos,
sons, cores e formas. Será que nos empenhamos de igual maneira? Um fato é
que, sempre que negligenciamos algo, o diabo abraça. E sempre que deixamos
de instruir as crianças, uma geração inteira é destruída e fracassamos no nosso
propósito diante de Deus.
Jesus trouxe uma criança ao centro, e pelo costume judaico, sua presença ali
merecia repreensão, mas em vez disso foi honrada. Que o Senhor nos ajude a
compreender a Sua instrução, a fim de que esteja no cerne do nosso ministério
edificar os membros menores e mais frágeis, para que todo o corpo esteja em
plena saúde espiritual.
Que o meu ensino caia como chuva
e as minhas palavras desçam como orvalho,
como chuva branda sobre o pasto novo,
como garoa sobre tenras plantas.

Deuteronômio 32:2

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