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COLÉGIO PEDRO II

Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura


Mestrado Profissional em Práticas de
Educação Básica

Arthur Cordeiro

IDENTIDADE EM POIESIS:
possibilidades de práticas de desenho
inovadoras no ambiente escolar

Rio de Janeiro
2018
Arthur Cordeiro

IDENTIDADE EM POIESIS:
possibilidades de práticas de desenho inovadoras no ambiente escolar

Dissertação de Mestrado apresentada ao


Programa de Mestrado Profissional em Práticas
de Educação Básica, vinculado à Pró-Reitoria de
Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura do
Colégio Pedro II, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Práticas de
Educação Básica.

Orientador (a) Professor (a)


Dr. Marco Antonio Santoro Salvador

Rio de Janeiro
2018
COLÉGIO PEDRO II

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA, EXTENSÃO E CULTURA

BIBLIOTECA PROFESSORA SILVIA BECHER

CATALOGAÇÃO NA FONTE

Cód. Autor Nome do autor.


Título da dissertação e subtítulo / Nome do autor. - Ano.
X f. (total de folhas da dissertação)
Arthur Cordeiro

IDENTIDADE EM POIESIS
possibilidades de práticas de desenho inovadoras no ambiente escolar

Dissertação de Mestrado apresentada ao


Programa de Mestrado Profissional em
Práticas de Educação Básica, vinculado à
Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa,
Extensão e Cultura do Colégio Pedro II,
como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Práticas de Educação
Básica.

Aprovado em: _____/_____/_____.

Banca Examinadora:

_________________________________________
Prof. Dr. Marco Antonio Santoro Salvador (Orientador)
Mestrado Profissional em Práticas da Educação Básica
MPPEB – CP2

_________________________________________
Prof. Dr. Rogério da Costa Neves
Mestrado Profissional em Práticas da Educação Básica

_________________________________________
Profª. Drª. Maya Suemi Lemos
Universidade do Estado do Rio de Janeiro

_________________________________________
Profª. Drª. Aline Viégas
Mestrado Profissional em Práticas da Educação Básica
MPPEB – CP2

_________________________________________
Profª. Drª. Amparo Villa Cupolillo
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro
2018
RESUMO

CORDEIRO, Arthur. Identidade em poiesis: possibilidades de práticas de desenho


inovadoras em ambiente escolar. 2018. 133 f. Dissertação (Mestrado) – Colégio Pedro II, Pró-
Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Programa de Mestrado Profissional
em Práticas de Educação Básica, Rio de Janeiro, 2018.

Esta é uma pesquisa a/r/tografica que investiga as manifestações estéticas das relações
integradas pós-modernas na escola. Ao se debruçar no objetivo curricular de Artes Visuais de
Identidade na Educação Básica, diante dos novos problemas do mundo líquido, a pesquisa
conclui a intrínseca relação da identidade com os novos modelos de vínculos pessoais. A
partir da criação de Objeto de Arte Inserido em Aula – OAIA1 – são analisadas as
performances dos alunos.

Palavras-chave: Identidade; Relações Integradas; Pós-Modernidade; Ser-para; a/r/tografia.


LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - A TRAIÇÃO DA IMAGEM..............................................................................................................................................14


FIGURA 2 – OVER THE TOWN.........................................................................................................................................................27
FIGURA 3 - A CRIAÇÃO DE ADÃO..................................................................................................................................................28
FIGURA 4 - LAS MENINAS................................................................................................................................................................. 29
FIGURA 5 – LAS MENINAS (DETALHE)........................................................................................................................................ 32
FIGURA 6 - EXEMPLO DE FOTO-ENSAIO....................................................................................................................................43
FIGURA 7 - EXEMPLOS DE SÉRIE FRAGMENTO.......................................................................................................................44
FIGURA 8 - EXEMPLO DE SERIE ESTILO....................................................................................................................................45
FIGURA 9: TRECHO DO FILME LE MYSTÈRE PICASSO...........................................................................................................51
FIGURA 10: TRECHO DO FILME MOACIR ARTE BRUTA.........................................................................................................57
FIGURA 11 - OAIA0............................................................................................................................................................................. 63
FIGURA 12 - KLIMMEN EM DALEN................................................................................................................................................. 69
FIGURA 13 - DRAWING HANDS.......................................................................................................................................................74
FIGURA 14 - OAIO1............................................................................................................................................................................. 76
FIGURA 15 - TRECHO DO FILME MARINA ABRAMOVIC: A ARTISTA ESTÁ PRESENTE..............................................81
FIGURA 16 - REFLEXOS DO OLHAR..............................................................................................................................................82
FIGURA 17 - LE MYSTÈRE CASA.................................................................................................................................................. 90
FIGURA 18 - TRIÂNGULO-FRONTEIRA-CASA............................................................................................................................91
FIGURA 19 - LE MYSTÈRE PIZZA..................................................................................................................................................92
FIGURA 20 - LE MYSTÈRE CASA E SOL....................................................................................................................................96
FIGURA 21 - RECORDAÇÕES DA CASA AMARELA..................................................................................................................98
FIGURA 22 - COMO EU VOU DESENHAR DEUS DE UM QUADRADO?................................................................................99
FIGURA 23 - BEM-ESTAR INCONSCIENTE................................................................................................................................101
FIGURA 24 - LE MYSTÈRE TRAÇO DE SENTIMENTO..........................................................................................................103
FIGURA 25 - DUPLAS E COMPLEMENTOS...............................................................................................................................104
FIGURA 26 - DESCORPORELIZADAS...........................................................................................................................................106
FIGURA 27 - COR TÁTIL................................................................................................................................................................. 108
FIGURA 28 - LE MYSTÈRE ENCONTROS EPISÓDICOS.......................................................................................................110
FIGURA 29 - LE MYSTÈRE BRINCAR DE PIPA.......................................................................................................................115
FIGURA 30 - VARAL......................................................................................................................................................................... 121

Sumário
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................. 12

2 CONTEXTO HISTÓRICO............................................................................................... 16

3 O AUTOR.......................................................................................................................... 28

4 METODOLOGIA: AS BARRAS e o ENTRELUGAR...................................................34


4.1 a/r/tografia como estilo/método de pesquisa........................................................36
4.2 os processos do fazer a/r/tográficos.......................................................................... 38
4.2.1 Etapas da pesquisa.............................................................................................................. 39
4.2.2 Instrumentos de coleta de dados................................................................................41

5 O PRODUTO EDUCACIONAL....................................................................................... 48
5.1 As referências do Produto Educacional em POIESIS..............................................49
5.2 As referências do Produto Educacional em THEORIA............................................62
5.3 As referências do Produto Educacional em POIESIS/THEORIA...........................66
5.3.1 Cooperação, por quê?....................................................................................................... 72
5.3.2 Reafirmando a sensibilidade - o quebra cabeça do estar-com/ser-para
...................................................................................................................................................................................... 76
5.4 A abordagem...................................................................................................................... 81
5.5 O Produto Educacional em PRÁXIS............................................................................. 85
AULA 1..................................................................................................................................................... 86
AULA 2.................................................................................................................................................. 100

6 CONCLUSÃO.................................................................................................................. 121

REFERÊNCIAS.................................................................................................................. 125
12

1 INTRODUÇÃO

As raízes da construção da instituição escolar estão diretamente ligadas ao projeto


de país que cada governo ou poder dominante almejava como o ideal em sua época. Nesse
sentido, podemos pensar que a ideia de êxito e sucesso escolar, muda de definição
dependendo de fatores ideológicos e hegemônicos. Consequentemente, também altera os
métodos de ensino e pesquisa para o seu alcance. Nesse sentido, iremos alicerçar os
nossos objetivos no entrelaçar da escolha curricular de Artes/Desenho nas escolas com a
construção histórico-social, bem como tentaremos um salto de ação e análise estética numa
pesquisa arte-educativa.

Exploraremos os questionamentos de Santos (2011) sobre como o padrão


hegemônico e regulatório do conhecimento científico desenvolve a priorização da
fundamentação teórica e da escrita textual como base para o conhecimento e sua validação.
Submetendo a pesquisa empírica aos modelos de rigor da ciência que, por sua vez, são
externos ao campo da arte e, consequentemente, da escola e do ensino-aprendizagem de
artes.

Tomaremos a escolha de uma nova metodologia, própria do ensino de artes, como


uma atitude frente as necessidades históricas e sociais de uma academia/escola/sociedade
tramada sob o rigor de métodos científicos. Tais lugares, construídos num antigo paradigma
(onde as tradições disciplinarias dessa ciência fazem a pesquisa como um meio para
explicar o fenômeno ou para trazer a luz o seu significado), tendem a limitar as
possibilidades de pesquisa/perguntas/respostas diante das necessidades de um mundo pós-
moderno (SANTOS, 2011; BAUMAN, 2001).

Cabe ressaltar que não há pretensão de substituição das tradicionais metodologias


e/ou práticas de pesquisa, mas de optarmos para flexibilizações e diversidades que nos
permitam desenvolver estudos de forma mais autoral. Pois, como explica Celeste (2010) o
objetivo da pesquisa baseada em artes, ao diversificar o método, é criar possibilidades de
novas respostas e novas perguntas aos problemas de pesquisa.

Nesse sentido, tomaremos como percurso de análise prático/teórico/criacional o de


interligar/confrontar o conhecimento/questionamento que emergem através de obras de
artes à decisões e conceitos aplicados no âmbito das políticas públicas, filosofia para a
escola no que tange o ensino de Artes.
FIGURA 1 - A traição da imagem

Fonte: MAGRITTE, 1929 apud FOUCAULT. 1988.

“Isso não é um cachimbo”

MAGRITTE, 1929 apud FOUCAULT. 1988, p. 1

A arte tem o poder de evocar reflexões, sensações e sentimentos através de signos


próprios de sua linguagem. Negar o conhecimento das possibilidades da reflexão e
experiência estética ao homem é também negar uma parte de sua própria humanidade, de
sua construção como sujeito histórico.

A necessidade de representar do homem acompanha-nos desde a pré-história com


desenhos/pinturas rupestres, catedrais da idade média, pinturas barrocas e películas
hollywoodianas. Contudo, devemos tomar atenção em não restringir o significado da
necessidade de representar ao colocar o verbo representar na ótica daquilo que é figurativo
ou o substantivo necessidade naquilo que nos é conhecido.
A necessidade de representar a que tomaremos como referência e fio condutor
desse trabalho é aquela da intangilibidade. Aquilo que não é palpável e concreto suficiente
para ser medido e aferido, tal coisa só pode ser experimentada/sentida/corporeificada. Essa
é uma pesquisa que abarca na fruição da Arte que tem a necessidade de representar ideias,
dúvidas e questionamentos.

Não à toa Foucault (1988) se debruça em compreender a complexidade da obra A


Traição Da Imagem (1929), do pintor Rene Magritte, em um ensaio questionador sobre o
significado do quadro (já supracitado imageticamente). O filósofo elucida o hábito de leitura
textual e imagético que temos. Explica como esse costume tende a limitar o significado da
coisa significante ao que ela nos mostra superficialmente e, quando o executado é inverso -
quando a inscrição do desenho representativo e do texto alusivo não coincidem - somos
levados ao espaço da incerteza e do questionamento.

Como nesse quadro de Magritte (1929): vemos um cachimbo, temos um referencial


preciso de um desenho de cachimbo, mas o abaixo escrito nos diz que não o é. A essa ação
do pintor, Michel Foucault, ele nomeia como sendo um Caligrama:

O caligrama é, portanto, tautologia. Mas no oposto da retórica. Esta


emprega a pletora da linguagem, serve-se da possibilidade de dizer duas
coisas com palavras diferentes; usufrui da sobrecarga de riqueza que
permite dizer duas coisas diferentes com uma única e mesma palavra [...]. O
caligrama, quanto a ele, se serve dessa propriedade das letras que consiste
em valer ao mesmo tempo como elementos lineares que se pode dispor no
espaço e como sinais que se deve desenrolar segundo o encadeamento
único da substância sonora. Sinal, a letra permite fixar as palavras; linha, ela
permite figurar a coisa. Assim, o caligrama pretende apagar ludicamente as
mais velhas oposições de nossa civilização alfabética: mostrar e nomear;
figurar e dizer; reproduzir e articular; imitar e significar; olhar e ler.
(FOUCALT, 1988, p. 21)

Afinal - é bem simples - como pode alguém afirmar que a representação de um


cachimbo é um cachimbo? Não é possível fumar o cachimbo da pintura, nem mesmo sentir
seu cheiro ou segura-lo em nossas mãos. Evidenciar o que parece evidente através da
linguagem figurada da ironia desdobra novos significados ao leitor da peça. Ao desvendar o
absurdo do banal (ARGAN. 1992), já não vemos o cachimbo como víamos antes, já não
lemos a frase como o fazíamos segundos atrás. Em um átimo é feito o convite para nos
debruçar no raciocínio que não reside no senso comum. Acabaremos por encontrar que
naquela pintura não existe somente um cachimbo e uma frase, há entre os dois um espaço,
uma lacuna, existe o devir e/ou o rizoma de Deleuze e Guattari (2002).
Tal conjuntura só pode ser acionada pela experiência estética. Ora, para aqueles
quem esperam respostas corretas, quantitativos e/ou rigores científicos, não é um lugar
muito confortável para se estar, afinal, aqui não há certezas. Encontraremos nesse sítio o
indefinido como um substantivo a ser investigado, as ramificações de uma raiz de possíveis,
de um conceito que ainda não é possível nominar. Ao nos debruçarmos sobre esse desafio,
poderemos extrair respostas e, o que é ainda mais importante: mais perguntas, mais
desconfortos.

Nascido na Bélgica em 1898, René Magritte é um artista pertencente ao que Argan


(1992) chama de Vanguarda Moderna, mais especificamente, ao grupo dos Artistas
Surrealistas. A arte surreal não tinha pretensões de manter o leitor de sua obra em uma
situação de conforto. Ao contrário, através do escândalo, da figura de linguagem da ironia e
de absurdos visuais ela tentava despertar em seu espectador a antipatia e o comportamento
de incomodo com o ambiente criado pela civilização. Entendiam que só assim, com o ódio a
construção social daquela época, o homem será capaz de se isolar, entrar num estado de
retiro e, finalmente, reconhecer sua própria identidade. Quem ele o é, sem interferências
daquilo que desejam que ele o seja.

Na origem do movimento temos o julgamento radical que pretende escandalizar a


existência humana que segue rumo a um único fim: a produtividade.
2 CONTEXTO HISTÓRICO

Evidente, investigar a época em que a obra foi realizada nos trará informações
importantes em sua leitura (tanto na leitura histórica dos fatos quanto na apreciação estética
e seus desdobramentos reflexivos). Neste caso, falamos de 1929, o ano da queda da Bolsa
de Valores de Nova York1, falamos sobre o homem do final da década de 1920. Aquele
pertencente a geração que viu na virada do século XIX a consolidação do Estado Liberal e a
segunda Revolução Industrial2. Com a descoberta da eletricidade, do combustível fóssil e da
invenção de locomotivas, a velocidade de produção passou a ser o eixo condutor da
economia de potencias europeias e em seguida do norte da américa (HOBSBAWN, 1995).

No contexto nacional encontramos bases semelhantes. Estávamos caminhando as


primeiras décadas emancipados de Portugal, éramos uma jovem república, como aponta
Vicentino e Dorigo (2013). Mas nosso país sofria com a falta de mão de obra especializada
para os trabalhos industriais. Advindos de uma economia de séculos baseada no lucro
através da agricultura num regime escravocrata, ninguém tinha sido preparado para ser o
operário da indústria, tão pouco era alfabetizado. Nós tínhamos a matéria prima, a

1
Como explica Vicentino (2013) A queda da bolsa de valores em NY foi causada por uma
superprodução sem escoamento. Isso gerou uma grande estocagem que crescia devido ao
subconsumo. O trabalhador não detinha poder de compra, o consumo estava diminuindo e
levou a especulação financeira ao limite. Assim, o valor das ações ficou acima de seu valor
real, baseavam na confiança de que esses papéis (as ações) continuariam sendo
valorizados, e não baseavam nos lucros de suas vendas. Por sua vez, quando os valores
reais apareceram, e ações ficou acima de seu valor real, baseavam na confiança de que
esses papéis (as ações) continuariam sendo valorizados, e não baseavam nos lucros de
suas vendas. Por sua vez, quando os valores reais apareceram, e grandes empresários se
viram donos de papéis sem valor, a crise se espalhou. Ela afetou em cadeia todo o resto do
mundo. Pois os Estados Unidos era responsável pelo maior parque industrial existente e
responsável por cerca de 43% da produção. Com exceção da União Soviética, fechada em
si mesma e orientada segundo os planos quinquenais, sob o governo de Josef Stálin, todos
os outros países que mantinham relações de compra e venda de produtos com os EUA
sofreram economicamente.
2
Como a primeira revolução industrial estabeleceu a relação da nascente Burguesia
que explorava a força de trabalho do operário, na 2ª Revolução Industrial, temos
outro desenvolvimento. Como nos aponta Vicentino (2013), a especialização e
alienação do trabalhador sobre todo o processo industrial foi levada ao extremo.
Com o objetivo de obtenção de maiores lucros, surgiram as linhas de montagem,
esteiras rolantes e o transporte a vapor. Os EUA se tornaria o país com o maior
parque industrial do mundo, dada a sua expansão territorial e possibilidade de
transporte de material e produtos por via ferroviárias.
possibilidade de edificação de indústrias e o transporte de produtos pelas ferrovias,
entretanto, aqueles que trabalhariam precisavam ter conhecimento sobre conceitos basilares
do mundo do trabalho. Esse indivíduo nós não tínhamos.

Diante da necessidade de formar essa mão de obra especializada, dentro desse


cenário econômico mundial, entramos no âmbito da escola. Como nos conta Barbosa
(2010), é sobre essa ótica que surge a primeira reforma educacional em defesa de dar a
uma futura geração o preparo técnico, visando aquele embrião de um mercado de trabalho
que era tão urgente. E, um dos componentes curriculares classificados como de principal
importância foi o ensino do desenho.

Encontramos a seguinte citação feita por André Rebouças, importante engenheiro e


de grande participação política na época, em seu o artigo “Generalização do Ensino de
Desenho” de 1878 publicado em O Novo Mundo:

O Desenho é um complemento da escrita: da caligrafia e da ortografia. É o


meio de comunicar a ideia de uma figura do mesmo modo que a escrita é o
modo de comunicar um pensamento. Tendes a inspiração de uma bela
antítese ou de uma imaginosa metáfora, vós a escreveis; tendes a ideia de
uma forma nova, vós a desenhais imediatamente.
E assim que deve ser compreendida a necessidade de generalizar o ensino
do Desenho por todas as classes da sociedade.
Seria ocioso demonstrar a indispensabilidade do Desenho para os artistas,
para os operários, para os engenheiros e para todas as profissões conexas.
(ANDRÉ REBOUÇAS apud BARBOSA, 2010, p. 33)

Notemos que a defesa desse ensino não se baseava em experiências estéticas,


contestação, autonomia, identidade e nem mesmo no desenvolvimento imaginativo e criativo
do aluno, pois estes seriam objetivos específicos de um futuro ensino de artes. Por hora,
tínhamos apenas o ensino de desenho. E para tal, o conhecimento deste era focado na
técnica e tão somente com o fim de se alcançar a mão de obra especializada. Os objetivos
desse currículo escolar era formar aquilo que Argan (1992) já colocou que os artistas
modernos, como Magritte, tinham ojeriza: o ser humano com o único fim da produtividade.

Isto seria ainda mais incentivado na virada do século XIX para o XX e principalmente
a partir do ano de 1908, pois o vigoroso progresso da indústria Norte Americana, naquela
década, teria como responsável o modo do ensino de desenho no país, como nos diz
Barbosa (2010).

Cabe ressaltar, ainda, que já existia o ensino de artes no Brasil, mas esse era restrito
aos frequentadores de espaços como a Academia Imperial de Belas Artes (1926). Ou
destinada a classe social da aristocracia que, Barbosa (2010) afirma, na criação da imagem
burguesa, transformou a arte num oficio de luxo, uma prática como um “bibelô” de uma boa
imagem.

Quando finalmente os aristocratas chegam ao poder, agora na República Velha 3,


argumentariam que sendo diretamente ligado as práticas industriais, o ensino de desenho,
fortaleceria a economia do país e, logo, a posição social própria. O ensino de desenho
ganharia tal importância que seria ensinado até à mulheres. Nas palavras de Rebouças
(1878), assim elas seriam tiradas da “inutilidade e do parasitismo que as condenava
socialmente”.

O registro desse tipo de pensamento, distanciado em mais de 100 anos de nós, se


torna assustador ao concluirmos que ainda há quem o defenda. Ainda é possível ouvir e ler
o discurso de partidários de que o papel da escola é tão somente a produtividade, a
formação de mão de obra para o mercado de trabalho e, ainda, que o papel da mulher é
menor socialmente. Percebemos, em nossas raízes educacionais com os conceitos
burgueses foram sendo inseridos através dos objetivos do ensino de Artes/Desenho.

Tal rigidez, entretanto, apesar do rigor técnico do ensino baseado em aprendizagem


de linhas neoclássicas, precisão no traçado da linha e exercícios de observação, teve
algumas mudanças. Na reforma educacional de Rui Barbosa podemos identificar nuances
que ampliavam a aprendizagem técnica a outro campo. No que tange o ensino primário, o
desenho tinha a finalidade de combater os métodos verbalistas e orais herdados pelo ensino
dos Jesuítas no país. No entender de R. Barbosa, ao educar na escrita e na fala se
“asfixiava as faculdades criadoras da inteligência humana” (R. Barbosa apud BARBOSA
2010).

Apesar dos fins positivistas da inserção de desenho na escola, há um


reconhecimento de que ao tratar desse assunto se desenvolve no aluno determinadas áreas
de conhecimento que não eram valorizadas no ensino de tradição oral. Temos, então, um
novo caligrama.

Comparemos o quadro de A Traição da Imagem com os objetivos de desenho na


escola dessa época. A nossa imagem de cachimbo é a entrada do ensino de desenho com o
principal objetivo econômico, sua base é projetada nos escritos do progressista Walter
3
A proclamação da República em 1889 deu início ao período que conhecemos com
República Velha. Como nos diz Vicentino (2013), após a Guerra do Paraguai (1865-1870),
novos setores da sociedade que eram ligados ao cultivo do café (a emergente Aristocracia
brasileira), assim como alguns membros do Partido Liberal, exigiram reformas sociais.
Exigiam a ampliação do direito de voto, maior autonomia econômica provincial e a abolição
gradual da escravidão. Fundaram em 1870 o Partido Republicano e começaram a reversão
da ordem monárquica no país.
Smith, o fim é a produtividade; já o “ceci n’est pas une pipe” abaixo, nos diz que não é
exatamente isso. Sugere uma investigação mais profunda, um espaço de devir. Ou seja,
embaixo desse cachimbo de projeto econômico burguês, observamos também a inevitável
entrada de que ensinar desenho tende a facilitar as faculdades de criatividade humana e,
logo, começamos a tocar no ensino de Artes.

Na década de 1910 e 1920 surgiram escolas e professores que pensavam na prática


pedagógica de desenho como um exercício visual e motor importante no desenvolvimento
infantil. Entretanto, o desenho ressaltado fugia da cópia de figuras geométricas e do ensino
de instrumentos (régua, compasso, curvas...). Vemos, por exemplo, no comunicado da
Escola Normal de Piracicaba (São Paulo), durante um encontro nacional, afirmando “Fora do
desenho do natural, não há desenho” (BARBOSA, 2010, p. 95) o início de uma nova
tendência de ensino. O desenho da criança passaria a ser envolvido com a psicologia.

Entre uma diversidade de modelos de ensino de desenho onde alguns ensinavam


sólidos geométricos e outros as formas através da observação da natureza, nesse período,
surgem correntes psicológicas pararam de pensar a criança como um adulto em
desenvolvimento. Elas passaram a entende-la como um ente próprio. Começariam a entrar
na escola modelos de testes psicológicos para investigar o tal ente criança. Por usa vez,
esses testes baseavam o seu desenvolvimento na confecção de desenhos por elas.
Tomemos nota, entretanto, que ainda não temos a sua expressão da criança sendo levada
em consideração. Apenas o seu desenvolvimento cognitivo relacionado ao conteúdo a ser
ensinado na escola e, tão logo, o seu desenvolvimento profissional.

Os desenhos das crianças eram direcionados e tinham a função de ser um modelo


informativo da natureza psicológica sobre a criança. Era um instrumento do professor para
descobrir espaços de cultura da criança que não era possível de outra forma. O desenho
ganha a possibilidade de sair da ordem da produtividade, entretanto continua a ser visto
como um complemento a outras áreas de conhecimento.

Os erros que as crianças cometiam nos desenhos foram encarados como próprios de
seu ser criança. E, naturalmente seriam corrigidos. Considerava-se, ainda, um padrão
estético a ser atingido. De forma que, através da repetição motora e observação cada vez
mais atenta da natureza, a criança seria capaz de desenvolver desenhos “melhores”.

A principal herança que viria a ser considerada a posteriori, no período da Escola


Nova no Brasil, foi consequência desse. Pois com a entrada da psicologia na escola e a
utilização do desenho das crianças como instrumento avaliativo, o grafismo infantil ganhou
respeito. Entretanto, como nos afirma Barbosa (2010), o reconhecimento do valor estético
da arte da criança, ligados ao seu espontaneísmo, só seria ponto importante a partir das
experiências modernistas.

Não sem intenção, nesse espaço imagético criado, a partir dessa inserção curricular
vemos o despertar de importantes defensores de Artes no currículo e percussores de outras
reformas, tais como Mario de Andrade.

Pertencente à corrente dos artistas responsáveis pelo modernismo em nosso país,


Andrade e outros, em inúmeras obras, criticava e tomava a atenção dos leitores de sua obra
para as influências de culturas estrangeiras que o país sofria. Entendiam que a Academia
Imperial de Belas Artes, entre outras instituições, formavam artistas aos moldes europeus.
Artistas que não contextualizavam sua pátria, nem buscavam identidade. Repetidores de
técnicas que não conversavam com o momento do país.

O movimento modernista liderado por Andrade buscava uma reforma nas artes para
o nascimento de uma arte verdadeiramente brasileira.

[...]
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel
o burguês-burguês! A digestão bem-
feita de São Paulo!
O homem-curva! O homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampiões! Os condes Joões! Os duques zurros!
Que vivem dentro de muros sem pulos,
e gemem sangue de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam os “Printemps” com as unhas!

[...]

De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!


Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a central do meu rancor inebriante!
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o bom burguês!...

(ANDRADE, 2016, p. 16)


O trecho da poesia ODE AO BURGUÊS de Mario de Andrade reflete novamente a
crítica a produtividade e o ódio, ambos já citados anteriormente e expressos no quadro de
Magritte que, apesar de conter também traços de ironia, está aqui em outra linguagem:
poesia. É necessário atentarmos novamente a cada um desses substantivos de forma
individual. Assim, ao realizar uma costura intertextual, inter-imagética e histórica dos fatos e
simbolismos despertos, através dessa leitura, encontraremos novos significados e
reverberações no ensino de hoje.

O substantivo/sujeito escrito por Mario e declarado historicamente como burguês é


aquele que se preocupa com a acumulação de bens, e para isso, detém meios de produção.
Este, afirma Freitas (1999), é responsável pela noção de indivíduo tal qual a temos hoje. Ao
organizar a diferença entre o público e o privado também estabelece imagens (de
comportamento corporal a ser seguido) nas representações de seus respectivos papéis
sociais: o homem, como líder e porta-voz da família; a mulher, economista e organizadora
do lar; e as crianças com destino já traçado em arrolos pelos pais (profissões escolhidas,
casamentos arranjados), afinal, os herdeiros de acúmulo de bens de seu progenitor.

O início da República Velha em nosso país é também a ascensão da classe


burguesa ao poder. Essa, agora tendo domínio político, se preocupa com o acúmulo de
bens para usufruto restrito e na formação de uma mão de obra operária adequada as novas
demandas da recém-criada indústria. Andrade, por sua vez, demonstra preocupação e
revolta e sugere um caminho para superar a distinção e a segregação social. Como sujeito
histórico e homem de sua época, o substantivo adjetivado “ódio vermelho!” em seus versos
finais coloca a bandeira da esquerda comunista como solução.

O ódio à produtividade no ente que tem essa como sua única finalidade e definição
nos foi revelado com ironia na obra de Magritte (ARGAN. 1992); nos é colocado com revolta
e partidarismo em Andrade (1922), mas - apesar de estampada na arte e na literatura -
pareceu não ser levado em consideração nos caminhos das decisões curriculares da escola
e, ao que tange esse trabalho, a inserção de artes e seus objetivos atuais na escola.

Apesar disso, como mencionado, ao valorizarem a estética no desenho infantil, os


modernistas influenciaram a introdução de novos métodos de ensino de desenho. Agora já
intitulada como Artes, ela explorava o expressionismo e a espontaneidade da criança.

O experimentalismo psicológico com o desenho da criança, embora


considerando os produtos da atividade gráfica infantil, desvios da Arte,
imperfeições auto corrigíveis pela frequência da ação e pelo
desenvolvimento provocou a resultante metodológica de retirar os modelos
externos das aulas de desenho, levando a uma busca e enriquecimento de
modelos internos. (BARBOSA, 2010, p. 11).

Assim, o diálogo/briga entre o ensino da expressão do eu ou da expressão dos


materiais, puramente técnica, iria seguir por décadas. Os modernistas ingressariam com
propostas de valorização da expressão do sujeito dentro do ensino. Entretanto, na busca por
uma identidade própria para a nação e ao valorizarem a expressão pura da criança, não
poderiam prever que o ensino de artes se tornaria a partir dessas premissas em um “deixa
fazer” sem sentido.

Aquilo que eles desenvolviam com pesquisas bibliográficas, investigações sobre a


cultura, psicologia e expressão dos mais diversos materiais na arte, passou a ser na escola
uma atividade de lazer. Artes, sendo atividade não entendida como área do conhecimento e,
com isso, nem exigiria formação específica para quem fosse responsável pela sua prática
em sala de aula. Ao ressaltarem a expressão do eu e o modelo interno do aluno as crianças
passaram a não aumentar o seu repertório cultural imagético.

Aos alunos era vetado que tomassem conhecimento de obras de artistas e outras
imagens que pudessem influenciar a sua espontaneidade e expressão. O ensino de artes
pretendia ensinar a ler imagens, sem mostrar imagens. Barbosa (2014) compara esse gesto
como o de querer ensinar crianças a ler, mas não as permitir o contato com obras literárias.
A atividade de expressão do eu era na verdade alienadora.

Como ressalta Freire (1996), esse tipo de educação – alienadora – é perigosa. No


mesmo caminho de quando tínhamos o fim de produtividade, ao se recusar a fornecer
imagens aos alunos não se permitia o desenvolvimento de ser crítico. Por sua vez,
caminhávamos para formar pessoas que aprenderiam a não confrontar o status quo, mas
aceita-lo.

Ainda na ressonância da poesia de Andrade, o segundo substantivo analisado (o


ódio) irá servir como argumento para uma proposta de mudança educacional. O conceito de
ódio está revelado como “Justa Ira” na obra Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire:

Tenho o direito de ter raiva, de manifestá-la, de tê-la como motivação para


minha briga tal qual tenho o direito de amar, de expressar meu amor ao
mundo, de tê-lo como motivação de minha briga porque, histórico, vivo a
História como tempo de possibilidade não de determinação. Se a realidade
fosse assim porque estivesse dito que assim teria de ser não haveria sequer
por que ter raiva. Meu direito à raiva pressupõe que, na experiência histórica
da qual participo, o amanhã não é algo “pré-dado”, mas um desafio, um
problema. A minha raiva, minha justa ira, se funda na minha revolta em face
da negação do direito de “ser mais” inscrito na natureza dos seres humanos.
(FREIRE, 1996, p. 75)

Esse conceito abordado por Freire é uma tentativa de se opor ao que ele mesmo
declara como o fatalismo (FREIRE. 1996). Os dois conceitos podem ser
vistos/experienciados em diversas situações do cotidiano, mas nos ateremos a vida escolar.
O sujeito fatalista declara que a condição social vigente, aquilo que está posto, o padrão
hegemônico, não pode ser mudado. Assim, essa atitude emancipará a pessoa de quaisquer
responsabilidades sociais. Pois, ao considerar que o status quo não pode ser alterado e
(com raras ocasiões alguém consegue ultrapassar a sua realidade e emergir a outra classe
social) ele de antemão desistirá de tentar movimentar quaisquer mudanças.

Esse sujeito fatalista, como docente, ministra aulas só para quem quer ouvir; “sabe”
que não faz diferença estar na escola e estudar; aceita as suas condições como destino
imutável, bem como as de seus alunos.

Na teoria crítica de Freire a escola tem o papel principal de formar sujeitos históricos.
Ela objetiva dar ao estudante a percepção de seu papel como aquele que constrói e
participa da história e não apenas como um personagem que assiste os acontecimentos.
Nesse aspecto, o fatalismo é uma prática inaceitável, já que nos põe em posição passiva
historicamente.

Ao contrário, a Justa Ira (FREIRE. 1996), como já visto, é a mesma indignação, mas
usada como força motora para exercício da cidadania. É a potência que moverá aulas que
conversam com a realidade do aluno. Aulas que irão propor ao aluno
perceber/sentir/entender a sua condição, suas qualidades e sua própria potência.

Não sem propósito, quando falamos de percepção, de auto-conhecimento, de


identidade, falamos principalmente do Ensino de Artes. Nessa ideia, como afirma o PCN de

Artes, aprender artes se dá dentro e fora da escola. Dentro da experiência com a


diversidade de linguagens: pintura, desenho, escultura, dança, música, performance... a arte
movimenta a expressão e a comunicação individual. Ela dá amplitude à formação da
cidadania de todo aquele que nela se permite ser inserido. Ela também fortifica as relações
sociais e o conhecimento de si mesmo (BRASIL, 1997). Veremos, então, que o ensino de
artes busca o autoconhecimento e o encontro da identidade do aluno. Num caminho
diferente do isolamento proposto pela ironia e ódio dos surrealistas, da revolta em Mario de
Andrade, temos um componente curricular que vai contra a formação e limitação do ser para
finalidade única de produtividade.
Ao aprender arte na escola, o jovem poderá integrar os múltiplos sentidos
presentes na dimensão do concreto e do virtual, do sonho e da realidade.
Tal integração é fundamental na construção da identidade e da consciência
do jovem, que poderá assim compreender melhor sua inserção e
participação na sociedade. (BRASIL,1997, p. 20)

Essa pesquisa irá investigar novamente a experiência estética do desenho. Dado um


novo contexto-histórico de novas reformas políticas educacionais e trabalhistas.
Respectivamente, reformas como as da Base Nacional Comum Curricular 4 (BRASIL, 2016)
que transformaram a área de conhecimento de Artes novamente em atividade 5 (um
retrocesso de décadas) e as que retomam jornadas de trabalho abusivas, homens e
mulheres sujeitos a viverem pela produtividade e aceitarem sem nem perceberem as
circunstâncias de ironia no ódio de Magritte e/ou da revolta no ódio de Andrade. A escolha
desse estudo se faz com a Justa Ira de Freire.

Esse trabalho se faz no esforço descritivo, na evocação de ideias a partir de


repertório (imagético, bibliográfico, cultural, social e empírico) do professor-pesquisador e
dos alunos. Ao mesmo tempo que dialogará e se desdobrará com o repertório do leitor que
será convidado a imaginar e criar com ela. Pois a pesquisa se debruçará sobre conceitos
caligramáticos que devem ser experimentados e assim suscitar novos significados e
questionamentos a cada nova visita.

Também nesse sentido, percorreremos caminhos de instrumentação e análise


próprios do ensino e aprendizagem de Artes. Utilizaremos métodos de documentação
fotográfica que são tidos como da etnografia, mas terão suas operações realizadas a partir
de abordagens próprias da arte/educação: a PEBA (Pesquisa Educacional Baseada em
Artes) ou a/r/tografia (DIAS; IRWIN, 2013). Faremos isso no esforço para compreender e
manifestar esteticamente teorias e conceitos da pós-modernidade dentro de um ambiente de
aprendizagem na educação básica. A nossa investigação irá percorrer a formação de uma

4
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base nacional
comum curricular. Brasília, DF, 2016. Disponível em: <
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/#/site/inicio>.

5
No decorrer da redação desse projeto de pesquisa o texto da Base Nacional Comum
Curricular colocava Artes Visuais como um subcomponente da área de Linguagens já sofreu
alterações. A Medida Provisória 746/2016 após ter sido aprovada no início de 2017 sofreu
duras críticas de instituições e associações, tais como FAEB, ANPAP, UFPA, UFMS,
ANPED que podem ser encontradas em: https://www.faeb.com.br/notas-de-apoio-e-de-
repudio/
nova Identidade (BAUMAN, 2005) que é consequência direta das nossas novas formas de
relações humanas. Elaboraremos todos esses conceitos na Corporeidade (GONÇALVES,
1994), haja vista a necessidade emergente deles na prática de sala de aula na educação
básica.

Ao lidar com questões contemporâneas, encontraremos a necessidade de práticas e


abordagens de um novo paradigma na escola (SANTOS 2011), através de Jogos
Cooperativos (BROTTO, 1995) correlacionada a necessidade de inovação da Abordagem
Triangular para o Ensino de Artes (BARBOSA, 2011). Utilizaremos, como referências
bibliográficas, linguagem e documentos que não se detêm em formato escrito literário. Eles
são conceitos que se inscrevem em uma diversidade de formas, tais como em desenho,
pintura, dança, poesia, performances, práticas cubistas e vídeo.

Não hierarquizando os conceitos: a teoria sobre a prática e a estética ou qualquer


outra combinação possível de uma classificação e escalonamento desses três substantivos.
Condicionaremos os três (Práxis, Theoria e Poiesis) a uma espécie de
sobreposição/metáfora/metonímia/colagem com a pretensão de evitar a divisão e
classificação de caráter cartesiano.

Nossa pesquisa será estética e a partir da elaboração de um Produto Educacional


que pretende ser colocado a disposição de todos. Tentaremos encontrar, através dele,
manifestações estéticas dos conceitos pós-modernos que envolvem a identidade. Na prática
de sala de aula, tencionaremos esses conceitos com desafios que conduzam à dialógica do
individual/coletivo e do eu/outro.

Entretanto, nosso método é artístico/fenomenológico. O que abre possibilidades


próprias de um caminho estético. Como aponta Haar (2000) ao explicar o caminho de
análise e entendimento da fenomenologia sobre obras, é ilusório termos a pretensão de
buscar uma intenção prévia do autor ao analisar sua obra (aqui, leiamos “sua obra” como
“os resultados de sua pesquisa”). O autor (artista/pesquisador/educador) descobre, não
raras as ocasiões, ele mesmo o sentido durante seu fazer. A coerência e o sentido são mais
claros ao espectador/leitor do resultado do que para quem o faz.

Ou seja, um pintor, enquanto faz a sua obra, descobre ele mesmo técnicas,
conceitos. Os resultados finais, a ele são desconhecidos, mas ao leitor de sua obra pronta
parecem claros. Nessa pesquisa pretendemos uma metáfora para tal comportamento. Na
tentativa de encontrar manifestações da identidade líquida e da dialógica eu/outro,
ambicionamos descobrir técnicas e conceitos no decorrer prático. Assim, os resultados finais
que aspiramos, a nós, serão desconhecidos a priori, mas ao leitor da pesquisa, poderão
parecer notórios. Pois quem aqui lê já vê o resultado final do quadro, nós encaramos a tela
em branco.

No decorrer do preparo dessa tela que é nossa pesquisa, não isentaremos o leitor de
descobrir caminhos que deram errado, mudanças de sentidos e descobertas intuitivas. Tudo
isso faz parte de uma pesquisa que é da esfera das Artes (ZAMBONI, 1996). Algumas
teorias que julgávamos coerentes no início da pesquisa foram nos conduzindo a outros
autores e pesquisas, de modo que todas estarão presentes no percurso das páginas.
Entretanto, nem todas farão parte da tela ao final. Todos serão fragmentos de esboços
(hipóteses) descartados e/ou refeitos até encontrarmos a imagem final.

Evidente, não nos isentaremos de nossas escolhas. A elas, diferente de assumirmos


o teor/viés de parcialidade que pode ser inerente ao julgamento de pesquisas científicas
(não-estéticas), trataremos os caminhos e consequências de nossas escolhas com o
conceito fenomenológico descrito como Estilo (PONTY. 1964).

Ao explicar o que considera estilo, Ponty (1964) fala sobre como as imagens
ultrapassam tempo histórico, filosófico e simbólico. Destaca que o claro escuro do barroco,
os corpos das esculturas helenísticas e/ou um templo grego atingem-nos em nossa
sensibilidade. Na pintura, por exemplo, esse fator aparece na escolha das cores – da
tonalidade – de cada pintor.

É possível representar pictoricamente uma mesma cena de diversas formas,


entretanto, é possível reconhecer a diferença entre os artistas. Mesmo sem uma assinatura.

Pois o estilo, sua tonalidade, se sobressai.

FIGURA 2 – Over the town


Fonte: CHAGALL, Marc. Over The Town. 1918. 1 original de arte, óleo sobre tela, 45 x 56 cm.

Disponível em: https://arthive.com/marcchagall/works/366251~Over_the_city . Acesso em 6 de


abril de 2019.

FIGURA 3 - A criação de Adão

Fonte: MICHELANGELO. A criação de Adão. 1508-1515. 1 original de arte, afresco, 280 x 570 cm.

Disponível em: https://arthive.com/michelangelo/works/9225~The_Creation_Of_Adam . Acesso em


6 de abril de 2019.

Numa obra, um traço, “um gesto, nos entrega por inteiro a individualidade humana”
(HAAR, 2000, p. 110). O que se faz presente em formas, cores e traços é o autor
indissociável de seus conceitos/individualidade. Como as personagens que voam em
Chagall ou nos corpos maneiristas de Michelangelo. Essa presença se manifesta em uma
base mais profunda, não apenas figurativa. Ela está alicerçada, para o pintor, numa cor que
se repete na diversidade de matizes. Num fundo que não é base para as personagens, mas
também é forma, é informação, conceito e experiência.

Acreditamos que ao não o limitar de forma precisa, mas deixando aberto, futuros
professores poderão leva-lo às suas aulas. Essas aulas, apesar de terem o Objeto de Arte
Inserido em Aula podem (e devem) pesquisar outros conceitos, elaborar outras atividades e
tirar outras conclusões. E justamente por ser um objeto de arte em abertura com quem se
envolve, se replicadas as atividades, elas também podem trazer outras respostas, perguntas
e uma diversidade de caminhos.

Pois o estilo está intrinsecamente ligado a seu autor.


3 O AUTOR
FIGURA 4 - Las meninas

Fonte: VELASQUEZ, Diego. Las Meninas. 1656, 1 obra original, óleo sobre tela. 318 x 276 cm.

Disponível em: https://arthive.com/diegovelazquez/works/372618~Las_Meninas . Acesso em 6 de


abril de 2019.

O quadro Las Meninas (1656) do pintor Diego Velásquez narra uma cena que nos
demanda determinada atenção em sua lógica reflexiva. Há, é claro, um duplo sentido
quando falamos nas conotações de reflexão, posto que nossos apontamentos serão
conduzidos a partir não só dos movimentos que a luz realiza na pintura (o reflexo). A
estrutura de nossos pensamentos (a reflexão) abordará os possíveis caminhos dos reflexos.
Numa breve descrição da tela, vemos o aposento de Real Alcázar em Madrid e
alguns personagens da corte espanhola presentes, nele, de frente para nós. A principal, que
se encontra no meio da tela, nos encara. Ela é a jovem princesa Margarida Tereza. Um
pouco ao seu lado, à sua direita, observamos o próprio pintor/autor Diego Velásquez, numa
postura de curiosidade observando o que está a sua frente. Nesse caso, nós os leitores da
obra, somos postos como objetos da atenção do olhar dessa personagem do artista.
Também à sua frente, entre nós e o pintor há uma tela que não podemos ver nada se não o
seu suporte. Nessa troca de olhares, entretanto, uma pista: ao fundo da sala existe um
espelho.

Lá podemos identificar as figuras do Rei Filipe IV e da Rainha Maria Ana. Ora, nada
mais é refletido. Não vemos as costas do pintor, não a vemos nem em seu ângulo oposto,
não vemos as costas da infanta, nem mesmo alguma parte da sala ou vulto dela. Um único
detalhe nos é cedido ver: aquilo que para o olhar tão atento do pintor está se direcionando.
Somos os espectadores, somos o rei e a rainha, ao mesmo tempo também somos invisíveis
a nós.

O espetáculo que ele observa é, portanto, duas vezes invisível: uma vez que
não é representado no espaço do quadro e uma vez que se situa
precisamente nesse ponto cego, nesse esconderijo essencial onde nosso
olhar se furta a nós mesmos no momento em que olhamos. (FOUCALT,
1999, p. 20)

O eixo norteador da reflexão é a personagem do pintor – o próprio autor. Ele é


colocado em sua individualidade, seja a pintura ou o pintado que não vemos, os dois são
objetos de sua autoria. Aliás, autoria tal que se faz reafirmada na ironia de que o artista se
pintou no ato de seu ofício. Somos reféns, convidados apenas a discutir as possibilidades
reflexivas que se encontram ao mesmo tempo imutáveis em Las Meninas, mas volúveis na
infinitude de reflexividade sobre/pela a obra.

Ser autor, estar realizado em algo é o caminho contrário de se estar à margem, de


estar alienado. Entretanto, frente a novas fronteiras (ou o fim delas) alcançadas com as
revoluções digitais, a ascensão da internet e o acesso a novas tecnologias, estamos sendo
inseridos num mundo de diluição da autoria das coisas. A ideia do industrialismo que
organizava a sociedade moderna está sendo dissolvida devido as novas formas de trabalho,
o controle e a vigilância não presencial e a infinidade de possibilidades de escolhas. Não há
mais uma base sólida que dê certeza ao sujeito de que a sua escolha visando um futuro
será acertada, estamos numa modernidade líquida (BAUMAN, 2005) onde a conceito de
identidade se torna instável.

Ora, se o mundo do trabalho e da produtividade não são mais tão importantes como
foram no século passado, se eles foram substituídos pelo mundo do consumo, isso gera um
problema direto para um dos objetivos da escola brasileira. Já que uma de suas atribuições
(como instituição regida pela Lei de Diretrizes e Base 6 (BRASIL, 1996), em seu segundo
parágrafo) é “a educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social.”. Desse modo, a escola está intrinsecamente comprometida com essa nova forma de
estar no mundo.

E isso se agrava quando o mundo do consumo não se relaciona apenas com o


mundo do trabalho, mas com o próprio corpo e as relações entre eles e, por sua vez, com a
identidade do indivíduo. Num mundo pré-moderno a nossa identidade era herdada e
imutável, a modernidade inaugura a possibilidade dela ser construída ao ser trabalhada,
hoje as identidades se tornaram bens de consumo (BAUMAN, 2005). Isto é, deixaram de ser
uma construção e passaram a ser consumo.

Nosso corpo é estimulado a estar preparado e apto para qualquer ocasião, ao


mesmo tempo em que nunca estamos satisfeitos com o que foi alcançado. O conceito de
saúde é substituído por aptidão ou, como é enunciado para o consumo, pelo fitness.

Não obstante, também somos cada vez menos sólidos em nossas relações sociais e
individuais. Conhecemos lugares, espaços e pessoas novas sem necessariamente estar
fisicamente presente. O conceito de presença ultrapassou a fisicalidade. Na mesma medida,
e dialogicamente proporcional, nada mais é imutável. Tudo se torna perene, veloz e fugaz.

Nos afastamos da individualidade burguesa, ao mesmo tempo em que somos


afastados do aprendizado, conceito e/ou reflexão de que também somos indivíduos
pertencentes a uma cultura. A nossa singularidade e o senso de pertencimento tendem a se
diluir.

Encontramos o movimento dialógico que conecta e envolve o indivíduo com os


demais entes. Esse fluxo o faz se reconhecer na mesma medida em que reconhece e se
relaciona com o outro, em que a comunidade e o outro também se reconhecem e o
reconhecem em sua individualidade (IRWIN, 2010). Entretanto, tal cinesia, como veremos,
na pós-modernidade - dada a diluição das relações - perde sua concretude e se encontra
problematizada.
6
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: lei nº 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. – 7.
ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2012.
Assim, a liquidez e a fugacidade desse movimento criam espaço para que a não
singularidade signifique uma sociedade totalizante, totalitária e massificante. O caminho
para o totalitarismo, antes traçado pela alienação através da produtividade sem criticidade,
pode estar sendo trilhado através da construção de indivíduos insensíveis.

Estamos diante de mulheres e homens que deixaram de ser ente-produtivo e


passaram a existir como ente-consumista. Tornando-se, por sua vez, insensíveis mas
racionais, em um discurso lógico, motivados pelo medo da insegurança – por não se
importarem com os outros – democraticamente podem concluir que a solução é eleger o
fascismo (BAUMAN 2010). Tudo isso tem propriedade nas novas formas de relações que se
tornaram virtualizadas e na ética fragmentada.

FIGURA 5 – Las Meninas (detalhe)

Fonte: VELASQUEZ, Diego. Las Meninas. 1656, 1 obra original, óleo sobre tela. 318 x 276 cm.
Disponível em:
https://arthive.com/diegovelazquez/works/396794~Las_Meninas_Fragment_SelfPortrait_By_Diego_
Velzquez . Acesso em 6 de abril de 2019.
Nossa proposta é enxergar o aluno, e fazê-lo enxergar, como pintor de si. O que
exige do professor/pesquisador/artista não o entender como uma tábula rasa. Devemos nos
atentar de que não será possível abordar isso e desafiar a alienação e insensibilidade
refletida na escola com abordagens conteudistas e bancárias. Afinal, não podemos ser,
como salienta Freire (1986), alienadores de ignorância.

Nos distanciaremos da ideia de educadores como construtores de posicionamento


fixo e posicionamento invariável. Do professor sempre como ente que sabe, enquanto o
educando, o que não.

Tentaremos experienciar o que o aluno observa, como ele observa e como ele se
realiza em seus trabalhos. Caminharemos no sentido de orientar as nossas/suas
observações com o objetivo de construir um ser que consiga observar e fazer por si e com
os outros: um ente autônomo/cooperativo. Assim, trataremos a educação como eterno
processo de busca (FREIRE. 1986).

Ao propor ao aluno abordagens estéticas que proporcionem o reconhecimento de


autoria e da individualidade, bem como o seu inverso dialógico (ao se ver como individuo,
também será possível reconhecer o outro em suas individualidades, bem como pertencente
a um grupo e por sua vez o grupo/comunidade se reconhece nas individualidades de cada
um) este trabalho pretende estimular o despertar e o desenvolvimento da identidade no
estar com o outro. Tal como instrui o PCN-Artes Visuais:

A realização de trabalhos pessoais, assim como a apreciação de seus


trabalhos, os dos colegas e a produção de artistas, se dá mediante a
elaboração de ideias, sensações, hipóteses e esquemas pessoais que o
aluno vai estruturando e transformando, ao interagir com os diversos
conteúdos de arte manifestados nesse processo dialógico. (BRASIL,1997, p.
19)

Para isso, a partir da conceituação apresentada, caminhamos na construção de um


Objeto de Arte que será inserido em sala de aula com atividades de Jogos Cooperativos. Tal
desafio pretende possibilitar a realização de desenhos/pinturas/performances por parte dos
alunos e sua apreciação e criticidade nos diversos anos e ciclos. Entendendo que esse
embate não pode ser realizado pontualmente em uma ação unilateral, mas deve ser
enriquecida pela prática constante na idade e nos objetos de estudo. Numa ação que não
pretende repetir-se, mas se reafirmar constantemente.
Tal produto educacional, em sua confecção, permite que, com determinadas
adaptações das atividades, se tencione uma diversidade de conteúdos propostos pelos
Parâmetos Curriculares Nacionais de Artes Visuais e temas transversais (tais como os
éticos: Respeito Mútuo, Justiça, Diálogo, Solidariedade; os ambientais: manejo e
conservação ambiental; a Pluralidade Social: ...), bem como, ao que concerne o espaço de
trabalho do pesquisador, as Orientações Curriculares do Município do Rio de Janeiro.

Não sendo um Objeto de Arte fechado, e tendo a principal finalidade estética, sua
inserção deve ser entendida na ótica da abertura à criatividade do professor/educador/artista
que o coloque em sala, bem como para o aluno. Assim, o Jogo Cooperativo 7 não se finda
nesse trabalho, nem os temas abordados e desenhos/pinturas/performances construídos se
fecham em uma aula. Ele se torna eterno devir em sua possibilidade de abertura a
modificações práticas/conceituais de outros professores-pesquisadores, apesar de sua
finitude formal.

A elaboração do Objeto de Arte com possibilidade de desdobramentos, se faz com o


intuito também de respeitar um dos objetivos declarados pela UNESCO (2010) na
conferência em Seúl sobre a Educação artística:

2.c. Estimular el intercambio entre la investigación y la prática en Educación


Artistica.
2.c.1. Apoyar globalmente la investigación y la teoria en Educación Artística
y la relación entre teoria, investigación y prática.
2.c.2. Fomentar la cooperación para desarrollar la investigación en
Educación Artística y distribuir sus resultados asi como las prácticas
ejemplares a través de estructuras internacionales tales como instituciones
y observatórios. (UNESCO, 2010, p. 6-7)

Assim, pretende-se criar um Objeto de Arte que possa ser reproduzível e


adaptável aos mais diversos espaços de ensino-aprendizagem, bem como a outros
questionamentos e diversos profissionais. A análise de seus dados na pesquisa deve
fomentar, ao serem compartilhados, a produção de novos conhecimentos.

7
JOGOS COOPERATIVOS é uma abordagem advinda da area da Educação Física. Ela
pretende estimular o desenvolvimento do aluno a partir de práticas que desafiem o aluno a
cooperar. De maneira que não sera possível chegar ao objetivo final sem a união de
capacidades entre eles. Ao contrario de práticas competitivas, nas quais existe um vencedor
e, logo, um perdedor, na alternativa do Jogos Cooperativos não há essa divisão. Ela oferece
uma prática de ação social transformadora, como aponta Darido (2003).
4 METODOLOGIA: AS BARRAS e o ENTRELUGAR

Antes de seguirmos com a construção do produto educacional criado a fim da


pesquisa, os relatos e a análise da pesquisa, é preciso parar à reflexão sobre a constante
utilização da barra ( “/” ) durante o que já se seguiu no texto, bem como o que virá adiante.
Posto que ela ocupará papel fundamental na leitura e interpretação de todo o projeto como
elemento de escritura. O leitor deve acompanhar o seu emprego como a melhor opção
encontrada na representação gráfica textual do que se propõe a pesquisa.

Como já revelado inicialmente pela obra de Magritte (1929), aqui a presença da barra
é o que servirá para compor o movimento de caligrama que se dá no espaço vazio da falta
de palavras e limites textuais de representação/apresentação do/no processo e/ou do/no
problema. Tal como Irwin (2007) explica sobre a ótica do conceito de rizoma em Deleuze, o
elemento gráfico “barra” (“/”) nos servirá em/no sentido de aproximação daquilo que já é ente
em sensibilidade, contudo não o atingimos em forma declarada.

Não sendo possível classificar, pois também seria limita-lo, a opção é por manifestar
em grandeza e singeleza, o todo e a parte, ao mesmo tempo. Tocaremos a existência do
problema/hipótese/pesquisa assumindo a carência de uma definição mais apurada sobre o
que se dará. Concebendo que nesse tratamento do inominável rizomático, pela tangente das
palavras entre barras, o aprendizado dos envolvidos com/nesse texto poderá ter maior
aproveitamento e desdobramentos ao que se propõe essa pesquisa de criação/estética.

A realização dessa postura na escritura não deve ser vista como um descaso, uma
forma menor e preguiçosa de representação, mas como um aspecto próprio da arte.
Evidente que exigirá de todos um mergulho e aprofundamento, bem como um
desprendimento do padrão da forma de pensamento que se dá na academia, bem como nas
escolas. Exige-se uma humildade em reconhecer o nosso modus operandi da estrutura de
pensamento cartesiano, em nossa padronização de pesquisas e no conflito do encontro com
o novo ao nos depararmos com outras formas de escrita.

Esse conflito é histórico e está ligado a nossa base cultural e formação escolar
eurocêntrica. Sua origem se relaciona quando, ainda na Grécia Antiga, o filósofo Aristóteles
articula a existência de três formas de pensamento/saber. São elas: a práxis (prática), a
teoria (teórica) e a poesis (a criação) (DIAS; IRWIN, 2013). Essa classificação na história do
ocidente foi utilizada para fundamentar uma separação entre as formas de pensamento.
Séculos mais tarde o saber teórico (theoria).
Percorrendo o caminho do desenvolvimento do nosso próprio conhecimento durante
a história, o saber valorizado foi aquele que se baseava em formas de controle, estabilidade
e ordem: o método científico cartesiano. Dessa maneira era possível validar e abranger o
conhecimento ao maior número de pessoas. O alcance dele, pela sua simplificação,
linearidade e fragmentação do pensamento poderia ser aprendido com maior facilidade. Em
compensação, tudo aquilo que era incontrolável, instável e desordenado foi sendo deixado
de fora (ZAMBONI, 1998)

As questões relacionadas à razão (racionais) ganharam protagonismo pela sua


mensuração e aplicabilidade, enquanto as questões que envolviam o acaso, a emoção e
sensibilidade passaram, por serem imensuráveis e incontroláveis, a ter uma valorização
inferior.

Nesse sentido, quando pensamos na estruturação da escola tradicional não é sem


propósito a importância dada ao ensino de forma teórica e racional, ou seja, com as formas
de pensamento que se envolvem mais diretamente com as divisões claras, cálculos e
exatidão. Bem como, por sua vez, com suas formas de pesquisa e métodos (SANTOS,
2011). O seu formato arquitetônico e divisão de atividades com semelhanças no sistema
prisional (FOUCAULT, 1987) é, não só, um dos elementos de ordenação do conhecimento,
bem como uma ordenação social de controle e vigilância dos corpos.

A organização das salas com cadeiras enfileiradas, a valorização de áreas do


conhecimento cujos formatos de aulas e avaliações se envolvam mais facilmente com o
racional (precisão e exatidão) são enaltecidas. A disciplina como método de aprendizagem
ganha importância e relevância. Enquanto outras áreas que lidam com o conhecimento mais
prático, intuitivo, criativo, imaginativo e amplo se tornam menores. Há mais tempo na grade
curricular para o sentar e estudar descorporelizado e racional do que para a subjetividade e
a corporeificação.

E, ao lidarmos com a relação da teoria e da prática, ainda na história ocidental da


forma de pensar, temos ainda um comportamento de sobrepujamento da teoria e, logo, um
esquecimento e desvalorização do pensamento de criação (principalmente na academia e
nas escolas de ensino básico). Além disso, no que arrolam as pesquisas acadêmicas, as
suas estruturas de construção de saber são claramente teóricas nas graduações e pós-
graduações. Uma tentativa de combate a esse processo se dá em pós-graduações como
nos Mestrados Profissionais (que suscitam a valorização das práticas em conjunto com a
teoria). Entretanto, no que se refere a poiesis, pouco se estuda e aprofunda pesquisas e
métodos que criem.
Encontramos ainda outro problema, como aponta Dias e Irwin (2007), as pesquisas
em Educação e no Ensino tem se desenvolvido em grande quantidade na teoria, mas na
prática não desenvolveram nenhum método específico para seu campo. Elas se aproveitam
de métodos de pesquisa científica criados em outras áreas de conhecimento e próprios de
uma outra época (como os métodos etnográficos nas ciências sociais, por exemplo), e para
sua utilização se fazem algumas adaptações e adequação ao ensino. A própria formação
docente não ensina o profissional a ser “professor pesquisador”, mas, apenas, professor.
Apesar de terem ultrapassado a ideia de educação bancaria e conteudista (FREIRE, 1996),
a pesquisa na prática de ensino ainda é um problema.

4.1 a/r/tografia como estilo/método de pesquisa

Essa pesquisa tenta se fazer também no propósito de dar embasamento para o


método de pesquisa artístico. Isso se faz necessário ao compreender que os problemas de
hoje, na pós-modernidade, estão conectados diretamente com os modelos de conhecimento
baseados no saber científico. Pois, ao valorizar a estrutura de pensamento racional e
separar o sujeito do objeto de estudo, a distância entre os dois tornou o sujeito um ser
insensível. Ao descartar as possibilidades de pesquisa que envolviam o emocional, as
sensações e o acaso, acabamos por trilhar caminho rumo ao mundo líquido. Logo, é preciso
escapar destes numa tentativa de encontrar novas respostas e/ou novas perguntas.

O método artístico tem por diferencial a valorização da intuição, entretanto, essa


característica não é exclusividade desse modelo. Dentro do modelo de método científico a
intuição também é um parâmetro e uma fonte de escolhas na pesquisa (ZAMBONI, 1996). O
diferencial, no método artístico, é deixa-lo claro e não o caracterizar como algo fora do fazer
pesquisa.

Encontrar novas maneiras de se pesquisar não é um mérito do campo das Artes. A


academia já reconheceu essa necessidade dentro de suas próprias cadeiras relacionadas a
racionalidade. A Teoria da Relatividade de Einstein e a Física Quântica são exemplos
dessas tentativas. O que abordamos aqui não é novidade científica, é a necessidade de
adequar tais inquietações, que já são óbvias à ciência, ao universo da escola e de suas
pesquisas.

A arte/educação, talvez por lidar diretamente com questões de subjetividade,


intuição, emoção e sensibilidade, guardou características próprias que permitem esse salto
na busca por um método que abarque esses problemas. A primeira, e fundamental,
qualidade está no âmbito de que as artes se aprofundam especificamente na poiesis sem
descartar a teoria e a prática. Sua forma de pensar se dá na criação. Suas ideias, estruturas
filosóficas, referências, conceitos e leituras estão impostos/escritos em trompe d’oeil, em
rimas, em plié, em planos-sequência, em performances...

Isso permite que as ideias trabalhadas em obras e o conteúdo abordado em sala


(quando não estão diretamente envolvidas só com a parte teórica - história da arte e estética
- ou só com a parte prática - o ensino de técnicas de desenho, pintura...) transbordem
espaço e tempo. Além de se permitir, assim, a ter acesso aquilo (questões e soluções) que
ainda não está nomeado (o rizoma). Se permite a desvendar e vendar esse ente, a se
relacionar abertamente e corajosamente ao fenômeno do movimento: o caligrama.

A segunda especificidade de campo, se refere ao aspecto que diz respeito ao


profissional do ensino de Artes e seu envolvimento com as linguagens artísticas. Muitos,
além de pertencerem a área de ensino, são também artistas (pintores, dançarinos, atores,
músicos, desenhistas...) e desenvolvem trabalhos pessoais na criação de seus projetos e
obras. Entretanto, os objetos problemas de suas pesquisas artísticas pouco falam (ou não
falavam, como iremos ver) dos problemas da prática de ensino, da sala de aula.

Estamos lidando com um profissional que percorre os espaços do entrelugar de


“ensinar e criar, criar e ensinar” ou, como passaremos a escrever: com um profissional que
percorre os espaços do ensinar/criar. Assim, nesse movimento metodológico, como sugere
Irwin (2010) ao citar as pesquisas pesquisas e textos desenvolvidos por Read, Eisner e
Barone, se faz com processos próprios, instrumentos diversos e se insere no campo do
Ensino das Artes: a a/r/tografia8.

Essa metodologia pretende investigar com arte as questões de pesquisa. Evidente,


sem cair no parnasianismo de falar sobre si, consigo e para si. Ela foi realizada para abordar
problemas próprios da prática de ensino. Resguarda-se, entretanto, de ter elementos
característicos do campo artístico. Está situada “onde a teoria-como-prática-como-processo-
como-complicação intencionalmente altera a percepção e o conhecimento através da
pesquisa viva” (IRWIN et al., 2009).

8
O termo a/r/tografia é importado do original em ingles a/r/tography. As barras querem
ressaltar na palavra art (arte, em inglês) o acróstico Art Research Teacher, ou seja, numa
tradução mais literal seria algo como Professor-Pesquisador de Arte ou Professor
Pesquisador de Arte... No Brasil, o professor doutor Benedilson Dias utiliza o termo PEBA
(Pesquisa Educacional Baseada em Artes) emu ma publicação para se referir ao método.
Entretanto, dado o potencial semântico do termo escrito com as barras para o texto da
dissertação, tomou-se a opção por escrever o termo “a/r/tografia”.
A partir da concepção de que o caminho que traçamos, no contexto histórico-social
da inserção da disciplina de artes na escola brasileira, hoje precisa considerar o problema
pós-moderno da alienação relacionada com a nova identidade – através das recentes
maneiras de se relacionar (BAUMAN, 2011) e da mudança de finalidade do homem de ser
produtivo para ser consumo (BAUMAN, 2005) – e que, por sua vez, o saber identitário está
dialeticamente ligada na relação Eu e o Outro (IRWIN, 2009) - que pode se dar no
reconhecimento dialógico indivíduo/comunidade, professor/turma, aluno/turma - esse
trabalho escolhe, em forma de investigação e escrita, o processo da própria Arte.9

Isso será feito numa tríplice interação, ou seja, essa pesquisa tenta afastar-se da
dicotomia “práxis, theoria e poesis”, até mesmo da ideia de união “theoria e práxis” – como é
recorrente em Mestrados Profissionais – e ousa na aproximação de uma construção de
saber dialético “práxis/theoria/poesis”. Onde veremos os três corpos dançarem num
movimento constante e como um só corpo.

Posto o campo, os problemas da prática e possibilidade de criação, nesse tipo de


investigação poderemos percorrer no movimento caligramático os entrelugares, espaços
vazios, entes rizomáticos (apesar de já sentidos em fenômeno, ainda não delimitados por
nomes) e assim encontrar novas respostas para velhas perguntas.

4.2 os processos do fazer a/r/tográficos10

Como explicado por Telles (2006) há duas maneiras mais utilizadas para realização
de pesquisa artografica. São elas: 1) a vertente representacional: os participantes da
pesquisa se integram de todo o referencial teórico, compartilham dúvidas, soluções,
problemas e juntos constroem o(s) Objeto(s) de Arte que represente(m) e integre(m) os
conceitos estudados; 2) a vertente produtora de significados: Nessa, os participantes

9
Optamos por aprofundar os conceitos desse parágrafo nos capítulos dedicados a explicar
sobre o Produto Educacional. Essa escolha se valeu de que, sendo um Mestrado
Profissional, o OAIA1 terá uma encadernação a parte para consulta pública de como utiliza-
lo em aulas. Por esse motivo, ao professor que porventura só tenha acesso ao produto
(capítulo), as elucidações e o desenvolvimento estarão lá.

10
a/r/tografia é uma metodologia recente e ainda pouco difundida no Brasil. Não cabendo
nesse trabalho explorar as inúmeras variações de linguagens e modelos de apresentação
que ela permite, nem a história do seu desenvolvimento, indicamos o site
(http://artography.edcp.educ.ubc.ca/) como referência para trabalhos. Bem como a produção
acadêmica de autores como Rita Irwin (2009) e Marin Viadel (2011), ambos indicados por
Barbosa (2014) em seu livro Redesenhando o Desenho (vide bibliografia).
compartilham e constroem o(s) significado(s) ao entrarem em contato com o Objeto de Arte
que represente o referencial teórico, os conceitos e/ou os problemas da pesquisa.

Escolheu-se a 2ª vertente por perceber de que ela se adeque mais aos objetivos, ao
tempo hábil, a reprodutibilidade para nossos pares e aos participantes dessa pesquisa. Já
que o público alvo é uma turma de 8º ano da Educação Básica de uma escola municipal da
cidade do Rio de Janeiro não há como coloca-los, por exemplo, em contato com todo o
referencial teórico aqui desenvolvido. Pois o mesmo exige uma dedicação a leitura e
repertório que não é esperado de alunos nesse ano de escolaridade.

Além disso, a construção de um Objeto de Arte (o Produto Educacional), que será


inserido em sala, tem pretensão de levar os alunos ao contato com a teoria e os conceitos
abordados nesse trabalho de forma não literal, mas simbólica. Ou seja, não será de forma
escrita e restritamente visual, mas através da experiência estética corporeificada. Como
Telles nos esclarece:

As várias Artes, por elas mesmas, já trazem seu poder educacional; ou seja,
a Arte, per se, educa – não somente os sentidos, mas o ser humano em sua
totalidade – o espírito e o corpo, ambos em relação dialética, o que
Clandinin e Connely (2000) chamam de embodied knowledge ou
conhecimento corporeificado. (TELLES, 2006, p. 515)

A construção do Objeto de Arte Inserido em Aula nº1 (OAIA1) terá maior explicação
no capítulo dedicado a construção do Produto Educacional. Cabe aqui ressaltar apenas que
este se baseou em obras de artes (de diversas linguagens) que também investigassem os
conceitos/problemas desse trabalho. Já a sua inserção – tendo objetivos de ensino-
aprendizagem – se baseou em três abordagens educacionais distintas. A primeira é
específica da Educação Física: Jogos Cooperativos (BROTTO, 1995); as outras, das Artes
Visuais: numa aproximação da Abordagem Triangular (BARBOSA, 2010) com as propostas
de atividade de Sampaio Dória (1923).

4.2.1 Etapas da pesquisa

A primeira etapa da construção do presente projeto de pesquisa, refere-se ao


levantamento bibliográfico. Através de dissertações e teses publicadas (nacionais e
internacionais), revistas acadêmicas (nacionais e internacionais), artigos, livros e obras de
arte (pinturas, filmes, gravuras, história em quadrinhos, performances...) que abordassem a
temática.

A segunda etapa corresponde ao estudo e aprofundamento do tema para construção


do Produto Educacional, intitulado “Objeto de Arte Inserido em Aula nº1”, de maneira a
concretizar formalmente o objeto. Como sugere Telles (2006), a concretização do objeto a
ser inserido deve se realiza com base nas perguntas da pesquisa. Ou seja, em como (e se)
os problemas decorrentes do conceito de identidade na pós-modernidade manifestam-se de
forma estética nas aulas e como (e se) é possível visualiza-las/trabalha-las? Tudo isso a ser
realizado em forma estética.

O capítulo de confecção do Produto Educacional será copiado em um caderno a


parte dessa pesquisa. Com isso, almejamos que outros profissionais da área da
Arte/Educação possam se inspirar a inovarem as suas aulas, aliando o Produto aos mais
diversos problemas da contemporaneidade que possam emergir em suas aulas, sem
necessariamente realizar as mesmas atividades aqui escritas.

Nesse caminho, optou-se por um percurso metodológico que também corresponde


ao campo específico das artes, a a/r/tografia que também é chamada no Brasil de PEBA
(Pesquisa Educacional Baseada em Artes). Os instrumentos de coleta e análise de dados,
seguindo o mesmo exemplo, serão instrumentos artísticos. Especificamente, os Foto
Ensaios definidos por Viadel (2011) e explicado aqui no capítulo dedicado a este. Cabendo
relevância nesse parágrafo a nota de que todos os desafios terão, desse modo, seu registro
fotográfico durante performance.

A terceira etapa da pesquisa será a apresentação da pesquisa teórica e do produto


“Objeto de Arte Inserido em Aula nº” aos pais/responsáveis e aos alunos em reunião. Essa
apresentação se dará com a leitura deste projeto, com explicação em forma oral e com
auxílio de imagens ilustrativas (as FIGURAS contidas no próprio texto nessa redação) e tem
o objetivo de esclarecer as dúvidas que possam surgir sobre a pesquisa. Nesse momento
serão distribuídos o TCLE e a AUTORIZAÇÃO DO USO DE IMAGEM aos responsáveis
legais do menor; bem como o TERMO DE ASSENTIMENTO aos alunos.

Ainda na terceira etapa, acontecerá a apresentação do pesquisador a todos os


envolvidos na pesquisa que porventura ainda não o tenham conhecido. Dado que o
pesquisador também é professor titular de Artes Visuais da turma na escola, também será
esclarecido que não haverá nenhum prejuízo ao aluno que não quiser participar da pesquisa
(como, por exemplo, em nota).
A quarta etapa será a inserção do Objeto de Arte Inserido em Aula nº1 (OAIA1). Esta
acontecerá durante as aulas de Artes Visuais da turma, nas quais os alunos serão
convidados a participarem de alguns desafios de imaginação e criatividade. As atividades
serão realizadas em duplas e cada uma delas receberá o material necessário para
confecção das manifestações estéticas (tinta, sacolas plásticas, hidrocor, plástico filme).
Após a distribuição do material cada membro da dupla desenvolverá uma tarefa de
desenho/pintura e, por conseguinte, será completada pelo outro membro.

Durante todo o processo, os trabalhos serão fotografados respeitando o instrumento


metodológico da criação de Foto Ensaios (VIADEL, 2011) para futura análise de dados.
Como estamos lidando com material transparente (sacolas e plástico filme) é previsto que
os alunos apareçam durante a confecção dos trabalhos, bem como a inserção de sua
imagem fará parte da colagem a ser analisada.

Ao final, se montará uma produção fotográfica na tentativa de alcançar os caminhos


de aprendizados e o conhecimento em forma estética que foram manifestados em sala. Tal
como o trabalho desenvolvido por Galvani (2016) em sua pesquisa: “Uma nova lente para o
professor: potencialidade da fotografia como dispositivo de pesquisa para ações
pedagógicas”. Ou seja, as fotografias farão parte de um ensaio que demonstre, através das
imagens registradas, como foi a aula e as reflexões desenvolvidas em consonância com o
referencial teórico.

4.2.2 Instrumentos de coleta de dados

O processo de Foto-Ensaio consiste em fotografias de potencial narrativo que


exploram as teorias da pesquisa. Na prática, os participantes da pesquisa durante toda
produção das atividades serão fotografados em sequencias diversas. Essas imagens
corresponderão a coleta de dados visuais. Este ainda não é o dado por completo – apenas
parte do processo de sua construção.

Após a atividade, as fotos serão analisadas e montadas em diversas sequências


narrativas. Tais sequências devem suscitar ao professor-pesquisador reflexões sobre os
problemas próprios da investigação, seus objetivos e novos desdobramentos. De maneira
que essas ponderações emergirão tanto no momento que compete o durante a construção
da narrativa, bem como o após a imagem acabada.

Ao mesmo tempo que o processo estético de construção do dado e o dado por si


falaram da pesquisa, eles também evocarão autoavaliação do Objeto de Arte (Produto
Educacional), da atividade, do ensino-aprendizagem e do professor-pesquisador. O que
pode ou não alterar a atividade e a abordagem em encontros seguintes.

FIGURA 6 - Exemplo de Foto-Ensaio retirado do trabalho “uma nova lente para o professor:
potencialidade da fotografia como dispositivo de pesquisa para ações pedagógicas

Fonte: GALVANI (2016. p. 131).

A Serie Fragmento consiste em representar um conjunto de operações da atividade


através do destaque de pequenos elementos presentes nela. Roldán e Viadel (2013)
caracterizam esse processo como uma figura retórica que estimula a criação na ideia de “a
parte pelo o todo”. Os fragmentos podem ser enquadrados durante o processo ou retirados
no processo de edição da imagem. Essa série pretende revelar os processos da pesquisa
mais conectados a materialidade e trazer críticas a aplicabilidade, a construção do
conhecimento corporal.
FIGURA 7 - Exemplos de Série Fragmento retirados de Metodologias Artísticas de
Investigación en Educación (ROLDÁN e VIADEL, 2013, p49); e de “uma nova lente para o
professor: potencialidade da fotografia como dispositivo de pesquisa para ações
pedagógicas.

Fonte: GALVANI (2016. p.106).

E finalmente a Série Estilo. A utilização dessa é baseado em construção estéticas:


no estilo fotográfico e as escolhas artísticas da fotografia. Todas as fotos pertencentes a
essa instrumentação deverão ser subjugadas aos mesmos critérios de enquadramentos, luz,
espaço, simetria, composição... as decisões fotográficas, a sua montagem, será decidida
através da representação de um tema, de um conceito da pesquisa. Elas manterão, assim,
uma mesma unidade e trarão por sequência, similaridade e/ou contraste conceitos e
problemas da/para a pesquisa.
FIGURA 8 - Exemplo de Serie Estilo. Serie Estilo, exemplo retirado de “uma nova lente para
o professor: potencialidade da fotografia como dispositivo de pesquisa para ações
pedagógicas.

Fonte: GALVANI (2016. p.107).

Cabe ressaltar que as fotografias não serão exclusivamente retiradas pelo professor-
pesquisador e proponente dessa dissertação. Outros alunos poderão auxiliar na execução
dessa tarefa. Pois os dados coletados por esse instrumento, nessa pesquisa, estão mais
relacionados a montagem/criação/problematização que ficará sobre ofício do arte-educador.
Esse não pode ser considerado um viés, mas uma escolha estilística (PONTY. 1991). Pois o
referencial teórico, os objetivos da pesquisa, a elaboração do Produto Educacional e a
operação técnica de edição fotográfica estão intrinsicamente ligados ao domínio do
pesquisador. Sendo a linguagem, que é a montagem das imagens, para avaliação de dados
independente de quem fotografa, com poucas instruções estilísticas é possível que a tarefa
de capturar a cena seja realizada por outrem.

A análise será realizada tal qual a pesquisa desenvolvida por Galvani (2016)
intitulada “Uma nova lente para o professor: potencialidade da fotografia como dispositivo de
pesquisa para ações pedagógicas”. Desse modo, (1) os alunos serão fotografados durante a
atividade de criação de seus desenhos e, (2) após o registro, será realizada pelo
pesquisador Foto Ensaios (VIADEL, 2011) a partir desses registros, para (3) observar as
manifestações estéticas dos conceitos que cercam a Identidade pós-moderna (BAUMAN,
2005) que surgirem. Por tanto, a análise dos dados da pesquisa será qualitativa a partir das
fontes imagéticas realizadas.

Abordaremos os registros e as criações coletadas numa investigação de


aproximação, mesclagem, metaforização e metonímia (IRWIN et al., 2009) sobre como o
problema se comporta no/através do/em fenômeno estético, bem como as possíveis
respostas e novas perguntas para tal (esteticamente pelos envolvidos e em análise escrita
pelo autor da pesquisa).

Essa análise se dará em cima de dados visuais que pretendemos investigar. Tanto
no exercício desenvolvido e em sua forma pronta e acabada através do Objeto de Arte
Inserido em Aula nº1 (OAIA1), quanto no dado registro/criacional do imediato, do momento,
do ato. Ou seja, o incompleto e inacabado, a forma em seu desenvolvimento, antes de sua
finalização. Posto como afirma Sasso isso também é uma propriedade da metodologia
utilizada:

[...] A/r/tografia é um campo de pesquisa que desafia a linguagem


contextualizada e vernacular, por utilizar a linguagem expressiva e poética,
que tem a ambiguidade como estímulo e que utiliza a forma estética
relacionada ao conteúdo para apresentação do trabalho. (SASSO, 2014, p.
102)

A turma escolhida para o trabalho de campo foi uma turma do 8º ano da Educação
Básica do Ensino Fundamental municipal na cidade do Rio de Janeiro. Essa escolha se
valeu primeiro da restrita possibilidade de turmas em que o professor-pesquisador lecionava
no ano corrente da pesquisa. Quando iniciada a pesquisa a turma em que se pensava
trabalhar tal proposta seria uma turma de 2º ano dos anos iniciais.

A turma estava na fase do desenvolvimento da escrita e, nas orientações


curriculares de Artes Visuais do Município do Rio de Janeiro, tinha o eixo temático
“Identidade” em que uma das Habilidades era “valorizar a sua própria imagem,
reconhecendo-se como parte integrante de grupos de convívio” parecia ideal para o
trabalho. Entretanto, como esta turma não tinha atuação do professor, era preciso um
acordo entre a Professora de Núcleo Comum, a Direção e o Professor-Pesquisador.

Tal acordo, no decorrer da pesquisa não pode ser realizado. Devido a problemas
administrativos decorrentes da entrada e saída de professores na escola e licenças, não foi
possível a compatibilidade de horário entre as partes envolvidas. Para evitar que esse
problema pudesse acontecer com alguma outra turma após a pesquisa de campo já ter sido
iniciada, optou-se por efetuar a pesquisa em uma das turmas de exercício do professor.

Assim, dentro da distribuição do tempo de aula, na escola em que o profissional


atua, as aulas de Artes Visuais ficaram agrupadas apenas em turmas do 4º e do 8º ano.
Dessa maneira foi necessário escolher entre uma delas.

Atualmente, na secretaria municipal de educação do Rio de Janeiro, as turmas que


correspondem do 1º ao 5º ano tem apenas um tempo de 50 minutos por semana de aula de
Artes Visuais. O que, em um primeiro olhar, nos fez dar preferência para a turma do 8º ano,
mas ainda não inviabilizava a turma dos anos iniciais. Apenas as atividades teriam que ser
desenvolvidas com desafio de execução mais rápida.

Entretanto, ao se aprofundar no tema da pesquisa a relação da identidade com a


adolescência se mostrou mais relevante para a turma de maior faixa etária. É nessa fase da
vida, após a infância, em que tendo (ou devendo ter) a identidade mais consolida que o
adolescente tem que lidar com as vozes do “o que devo ser, como devo vestir-me,
comportar-me o que devo dizer, o que devo escolher” (BARBOSA, 2014). Circunstâncias
que hoje, na pós-modernidade, se mostram emergenciais.

Pois, não só por conta do número de vozes terem aumentado no mundo líquido
(devido ao acesso à informação pela internet, redes sociais, tv e outras mídias) e
potencializados pelo consumismo, também não só por conta das escolhas terem aumentado
e, por consequência as angústias de um não acerto. O que nos levou a escolher a turma
nessa fase da vida foi a ausência de ritualização da transição criança/adulto que a
sociedade moderna (e pós-moderna) se abdicou.

Antigamente, nos povos tradicionais, o momento da adolescência era


marcado por ritos de iniciação, que tinham a função precisa de introduzir o
indivíduo na SIGNIFICAÇÃO de ser adulto. A visão de mundo daquela
sociedade estava expressa em símbolos compartilhados por todos e tal
conhecimento era transmitido ao adolescente através de rituais que o
faziam passar por duras provas, marcavam-no, escreviam, às vezes no seu
corpo, na sua mente, o modo como aquele grupo humano entendia seu
estar no mundo.
Na nossa sociedade o adolescente recebe REGRAS e não
SIGNIFICAÇÕES. (...) Segundo Feldman, só existe crise de adolescência
em nosso mundo, porque tal crise não é RITUALIZADA por nenhum rito de
passagem. A arte então cumpriria um importante papel nesse sentido,
possibilitando ao indivíduo, através de sua expressão, confrontar-se com
suas crises. (MACHADO, apud BARBOSA, 2014, p. 31)
Assim, se tal necessidade de ritualizar esse momento transitório pode ser efetuado
pela arte e, logo, pela arte/educação na escola, decidimos pela turma de oitavo ano.
Ademais, de modo intuitivo e estilístico, também nos pareceu que tal fase da vida, apesar de
já ser nomeada pelo substantivo “adolescência”, guarda profundidade de caligrama e rizoma
por ser movimento criança/adulto. E, ao trazer à nossa pesquisa tal materialidade no próprio
campo, os significados das manifestações estéticas ganha ainda mais amplitude.
5 O PRODUTO EDUCACIONAL

Este Produto Educacional pretende fornecer aos profissionais da Arte/Educação


material e inspiração para atividades que trabalhem sob a ótica da pós-modernidade. Sendo
desenvolvido para uma pesquisa de Mestrado Profissional voltada para o Ensino na
Educação Básica (Mestrado Profissional em Práticas da Educação Básica – Colégio Pedro
II) o jogo se baseia em estudos de Zygmunt Bauman (2005, 2008, 2011) sobre a Identidade
no mundo líquido.

Nossa pesquisa nos levou a identificar que o Problema Identidade sendo próprio de
uma era moderna pode estar criando conflitos com a Educação e o Ensino na pós-
modernidade. Pois, quando temos inserido num currículo a “construção de identidade” e
hoje não temos mais construtores dela, mas consumidores, é necessário que a escola saiba
lidar com tal circunstância. Nesse ponto, a Arte/Educação, por lidar com modelos internos,
criatividade, imaginação e autoria nos pareceu ser a área do conhecimento mais própria
para lidar com isso.

Como aponta Bauman (2005) a Identidade é um problema e não devemos falar


sobre “problemas da identidade”, pois isso seria um erro tautológico. Entretanto, ela é um
problema próprio da Era Moderna, pois é com ela que a ideia do homem ser construtor de si
nasce. Antes, ente imutável que não poderia trocar a sua profissão, suas terras, suas
tradições, sua religião (entre outras coisas) desde o nascer, na modernidade, ente que se
faz.

Por tanto, se a sua identidade poderia ser construída, nada mais pertinente do que o
ambiente escolar oriente desde de tenra o como o fazer. Findando a Modernidade, estamos
hoje diante da Pós Modernidade que desfaz tudo que é sólido e durável, tal qual a prática de
construção. Esta, alicerçada em habilidades duráveis (como memória, tradição, técnica) e
sacrifícios (resiliência, estudo, abdicação de prazer momentâneo) visando o futuro, hoje é
rápida, fugidia e líquida. A construção se tornou consumo. Consumo de identidade.

Nos capítulos abaixo explicamos o método escolhido para trabalhar, a a/r/tografia.


Nele o artista/professor/pesquisador ao se debruçar sobre as questões elaborou uma obra
que, suponha, atingir os problemas e faze-los se manifestarem em modelos estéticos. Tais
modelos foram avaliados e mostraram pertinência ao campo.

A obra, em questão, foi Intitulada Objeto de Arte Inserido em Aula nº1 (OAIA1) e ele
pretende ser ipsi litteris o seu título: um objeto de arte inserido em aula. Ou seja, é aberto e
amplo. Assim, cada professor, artista e/ou pesquisador que decidir inseri-lo em suas aulas
está convidado a elaborar outras atividades que não só as demonstradas abaixo. Bem como
novas formas de avaliar as manifestações que possam surgir.

Os capítulos a seguir descrevem o percurso para elaboração do OAIA1 com


referências em teorias filosóficas, sociológicas, estéticas e suas respectivas manifestações
estéticas e/na prática. Na tentativa de entrelaçar novamente theoria, práxis e poiesis, as
atividades aqui descritas tiveram por base o trabalho em duplas, mas de modo algum o
Objeto de Arte só pode ser inserido nessa dinâmica.

5.1 As referências do Produto Educacional em POIESIS

A busca de uma forma que aborde um conceito, um pensamento, um problema e/ou


de uma ideia é o processo artístico em si. Entendendo o problema dessa pesquisa como tal
e na aproximação do ensino à arte, buscamos criar uma experiência estética através de um
Jogo Cooperativo inserido na sala de aula. Tal produto educacional pretende colocar, de
forma estética e prática, os alunos em contato com a substância do projeto de pesquisa.

Os primeiros passos para dar forma a ideia do jogo foram suscitados pela referência
da obra Las Meninas de Diego Velásquez. Já que, como abordado anteriormente, ela trazia
os conceitos desse trabalho elaborados de forma sensível (em pintura). Era fundamental
criarmos um jogo onde o movimento de ultrapassar a tela de pintura (a quarta parede) fosse
contemplado de alguma forma pelo aluno. Para tal, era importante também sobressair a
dialética pertencente ao conceito de identidade, onde o Eu e o Outro conversam e se
constroem mutuamente no encontro.
FIGURA 9: trecho do filme Le mystère Picasso
Fonte: trecho do filme LE MYSTÈRE Picasso. Diretor: Henri-Georges Clouzot avec Claude Renoir
avec Pablo Picasso. GAUMONT VIDÉO. 1956 (78 min)

Em 1956, o cineasta Clouzot (1956), na tentativa de entender o gênio por detrás das
figurações pictóricas de Pablo Picasso, se propôs desenvolver uma película intitulada Le
Mystère Picasso11. Os frames acima foram retirados desse filme. Eles compreendem os
minutos iniciais da película e tentam demonstrar imageticamente a forma que se deu essa
investigação.

Entre o artista e a câmera existiu uma tela de pintura, esta, ao ser filmada, não
permitia mais que câmera capturasse a imagem do artista. Entretanto, a execução do seu
11
O Mistério Picasso (tradução nossa)
ato artístico (Poiesis), a pintura, se mostraria durante seu desenvolvimento. Vemos
pinceladas, manchas e traços ritmados em diferentes compassos formarem, desformarem e
deformarem a nossa frente em composições imagéticas.

Como Clouzot (1956) afirma no início do filme, ele pensava que ver os quadros
sendo feitos traria explicações e compreensão sobre as pinturas do artista. Mas estava
enganado.

Como afirma Bazin (1991), o filme “não explica nada”. Mesmo que essa não fosse a
intenção primeira de Clouzot, esse fato dá caráter de importância maior ao que é exibido. As
imagens se impõem em outra ordem de entendimento (que não é racional ou que apenas
Theoria não é capaz de elucidar). A apreciar a projeção da película assistimos em narrativa
visual soluções e suspense de problemas que Picasso executa conforme eles acontecem.

Foram duas ideias principais, explicadas por Bazin (1991), que usamos como
referências imagéticas na hora da construção do Produto Educacional. Ambos são mote de
discussão em Um filme Bergsoniano: Le Mystère Picasso de André Bazin (1991):

1 - a imprevisibilidade do ato. A injunção de estar de mãos atadas frente ao que é


feito, e durante o ato de fazer, coloca a possibilidade de novos horizontes de ideias,
soluções e problemas. Diferente de quando se dá importância, na análise, apenas do dado
pronto, a forma estética de um dado no verbo em infinitivo tráz possibilidades potenciais pelo
estado posto em seu devir.

Assim, precisávamos construir uma forma que colocasse o aluno frente o ato de
desenhar/pintar dele mesmo, bem como o do outro. Dentro desse desafio há a pretensão de
que os envolvidos possam tocar esteticamente o auto-reconhecimento em sua dialógica.

A busca desse movimento se traduz numa proposta que não é apenas técnica, ou
seja, de demonstrar esboços, caminhos e pré-projetos do que virá a ser o
quadro/pintura/desenho final. Numa espécie de construção do saber cronológico e gradual.
Até mesmo fora de uma hipótese que pode ser provada ou não ao final da pesquisa.

Aqui a proposta não é somente pedagógica, é estética! Assim, tentaremos tratar os


"todos momentos" (ou a maioria deles) como todos obra, todos ato de criação. Os rabiscos e
machas não pretendem chegar a um acabado ou são parte de um esquema pré-
determinado, mas já estão acabados em sua propriedade de "forma gerúndia de acabando".

Como Bazin (1991) sanciona, a ideia é a de que um quadro dê lugar a outro, até
chegarmos ao resultado final. Assumindo termos passado pelo fim e recomeço de ideias que
dão lugar a novas propostas (imprevisíveis). Como diz Pablo Picasso ao tentar falar sobre
seu ato de criação: “ [para isso] é preciso mostrar os quadros que estão sobre os quadros”
(BAZIN, 1991, p. 181).;

Nessa circunstância, para conseguir apreender todas as partes da obra final,


entendendo que já eram obra acabada antes mesmo de uma nova interferência a
transformar em outra obra, dividiremos nossa atividade em turnos. Ou seja, um aluno em
seu turno faz a sua obra, em seguida, outro aluno interfere criando uma nova obra. Essa
sequência de obras (final/meio/final...) se dará até os alunos chegarem ao que será, de fato,
a obra final. O instrumento de coleta de dados escolhido pretende o registro fotográfico a
cada turno.

2- a transparência e o opaco. Para alcançarmos a dialética de ver/fazer,


apreciar/criar no Produto Educacional, a técnica de transparência empregada por Clouzot
(1956) foi fundamental como exemplo. Afinal, se a pretensão é estarmos em contato com o
fazer em seu ato e, a partir disso, tangenciar a identidade/autoria, temos o problema da
dialética do conceito. Pois seria preciso estar no lugar do outro para vê-lo fazer e, além de
vermos, fazermos com ele.

Como também é explicado no inicio do filme, Clouzot (1956), na tentativa de se


colocar no lugar do artista e como o artista, filmou a performance da pintura em uma tela
com transparência para a câmera capturar a tinta e o gesto. Ao mesmo tempo em que a tela
era opaca para o pintor, numa trucagem da montagem se inverte a película fílmica exibida.

Logo, pelo posicionamento da câmera, o nosso ponto de vista é idêntico ao que


pintor estava vendo. Desse modo, na exibição final, podemos ser colocados com o que seria
a tela que Picasso via enquanto pintava, bem como a sua pintura e seu ato de criação.

Entretanto, a opacidade aqui proposta por Clouzot (1956), não nos agradava como
solução. O fato deles (os alunos) não verem uns aos outros, incomodava. Já que, ao
seguirmos o exemplo do modelo proposto por Clouzot (1956), o contato com o outro se daria
de modo passivo. Todos seríamos meros espectadores dos traços e das manchas uns dos
outros, sem interferências dialógica nelas.

Na busca da solução para esse problema, o filme Moacir Arte Bruta (WALTER
CARVALHO, 2005) nos pareceu um caminho.
FIGURA 10: trecho do filme Moacir Arte Bruta
Fonte: MOACIR Arte Bruta. Diretor: Walter Carvalho.VIDEOFILMES. 2005. DVD (73 min).

Como demonstra os frames retirados do filme, o diretor (e também fotógrafo) Walter


Carvalho investiga o artista da Chapada dos Veadeiros em seu ato de criação, mas ao que
difere de Clouzot, o faz com transparência. Entre ele e a câmera não há um objeto opaco,
como em Le Mystère Picasso, há um vidro. À câmera, o artista está de frente. O que nos
permite dizer, pensando na quarta parede, que ela está por nós e para nós. Não nos
escondemos para poder ver, bem como, ao assumirmos a nossa presença, também
podemos ter/ver a presença do outro, do artista além de seus traços. Estamos em um
estado de mútua interferência, estamos em dialógica. Esse conceito nos levou a construção
de um primeiro rascunho do protótipo do Objeto de Arte que serviria como o Produto
Educacional dessa pesquisa.

5.2 As referências do Produto Educacional em THEORIA

FIGURA 11 - Primeiro modelo do Objeto de Arte Inserido em Aula nº0 (OAIA0)

Fonte: o autor (2017).

A escolha de produzir uma pesquisa de Ensino de Artes Visuais tendo o desenho


como prática principal em sala de aula não se deu de forma acidental. Ela se faz quando
conferimos a essa prática a importância de um gesto combativo frente aos sintomas sociais
já abordados anteriormente na introdução ao enfatizamos o contexto histórico-social. Como
avaliza Derdyk:

Numa sociedade com condições precárias de sobrevivência cultural como a


nossa, o desenho aponta uma grande vantagem: basta ao artista um lápis e
um papel e eis o seu tratado. Neste sentido, o desenho funciona, por suas
mínimas exigências de concretude material, como uma arma de combate,
instrumento de guerrilha, a arte do mínimo, a arte da sobrevivência.
(DERDYK, 2013, p. 52)
O Objeto de Arte a ser inserido em sala começou como uma peça em acrílico
posicionada perpendicular à mesa (FIGURA 34). Em sua primeira versão, os alunos em
duplas, cada aluno se posicionaria em um dos cantos da mesa e receberia instrumentos
para confecção de desenhos (hidrocor, pincéis, tinta...). Eles iriam ser desafiados a
construírem um desenho mutuamente ou em turnos, de modo que nenhum dos dois poderia
interferir no desenho do outro (já que estava posicionado do outro lado).

Um dos primeiros desafios para trabalharmos a identidade em dialógica (eu/outro)


no/através de conhecimento estético, está ilustrado acima.

Como exemplo de atividade, um dos jogadores sortearia ao acaso uma cartela com
uma letra. Essa cartela seria posta no vão da chapa acrílica, de modo que a sua inscrição
seria vista em ambos os lados. Em seguida, os dois alunos seriam convidados a
completar/imaginar um desenho a partir e com aquela inscrição. O aluno teria que lidar com
o outro, sem poder interferir no que era realizado (pois o outro e seu desenho estariam do
outro lado da chapa acrílica).

Entretanto, o desafio inicial que aparece ilustrado (FIGURA 34) não nos era
suficiente aos questionamentos da pesquisa, pois parecia tocar apenas numa dialógica
e/outro sem o afeto direto. Ou seja, abordava a percepção da existência do outro e não suas
interferências no eu (e vice-versa).

Eu e o outro eram reconhecidos em distância segura, separados por uma tela acrílica
asséptica. Eu via/reconhecia o outro e ele me via/reconhecia, eu me manifestava e outro se
manifestava, sem que isso, necessariamente construísse – ou desafiasse à – a
completar/complementar o que eu e o outro faz. A possibilidade de ser apenas expectador
passivo e autor egoísta era grande e nos preocupava.

Ora, passividade e egoísmo era o justo oposto do que estávamos buscando ao


aprofundar no problema da identidade que suscitou essa pesquisa.

Nessa trama da construção outros problemas surgiram. Indo de encontro a ilustração


inicial, tanto o custo para reprodução quanto o referencial teórico demonstraram falhas na
realização do trabalho.

Se ao final da pesquisa o Objeto de Arte demonstrasse aprofundamento pertinente


na temática abordada, seria interessante que pudesse ser replicado. Para isso, evidente, o
preço de custeio para a sua confecção, reprodução e utilização deveriam ser considerados,
bem como a aplicabilidade nos mais diversos anos, ciclos, salas de aula e os custos de seus
possíveis materiais de apoio.
Ao conversarmos com dois técnicos 12 sobre o assunto e explicar-lhes a intenção do
projeto, o embasamento teórico e para iniciar a confecção da estrutura basal do Produto, os
problemas relatados se tornaram mais evidentes.

A tela acrílica não era um material de custo barato e seriam precisos duas de medida
igual para montar um jogo. Além disso, como ele pretendia ser desmontável, criavam-se
riscos a integridade física das crianças e um dispendioso tempo de aula.

Pensando ainda que cada jogo proporcionaria o brincar de duas a quatro crianças,
numa sala, por exemplo, com 30 alunos, seria necessário montar pelo menos 7 a 8 (para
trabalho em grupo). Se cada um deles demorava em torno de 2 a 4 minutos para ser
montado, era possível prever um tempo de 30 minutos gastos só nesse processo.

A conclusão era a de que o produto precisava sofrer alterações para continuar


conduzindo a pesquisa.

No aprofundamento do referencial teórico também fomos levados a questionar a


assepsia do material e o posicionamento dos corpos dos alunos (entre uma mesa e
sentados). Pois a medida em que nos aprofundamos bibliograficamente sobre o assunto
pesquisado, os autores pesquisados demostravam a importância do corpo e o afeto.
Conceitos problematizadores que necessitavam ser tocados pelo jogo e não reforçados
como estavam fazendo.

Para Bauman (2005) o corpo em sua liquidez deixava de ser o tal corpo produtivo - o
corpo máquina - para ser o corpo consumidor. Ou seja, na modernidade o corpo era
fundamental para produção, precisava ser educado para tal, aqui, na pós-modernidade,
estamos lidando com um corpo que não produz, ao contrário, é educado para consumir.

O homem na modernidade (ser produtivo) tinha elementos caros como valor para se
estar no mundo. Habilidades técnicas, memória e tradição são alguns que davam a ele a
segurança numa garantia de futuro acertada. Ser ente produtivo com projeção de uma vida
confortável na velhice também encorajava circunstâncias de abdicar de prazeres fugazes e
rápidos. No interesse de algo mais duradouro em um tempo a frente, os valores da
resistência, dedicação, resiliência se tornavam eficazes mecanismos de bem-estar.

A pós-modernidade, por sua velocidade de, e acesso à, informação, alcance e


mobilidade entre fronteiras se estreitando e, principalmente, a incerteza de um futuro certo
trouxe a esse ente produtivo incompatibilidade para continuar existindo. Os valores

12
Cabe ressaltar que essa conversa se deu em reuniões dentro do atelier de luthieria dos
técnicos mencionados. Ambos com formação universitária em Artes Visuais e desenvolvem
trabalhos com marcenaria, confecção e construção de instrumentos musicais.
anteriormente citados já não são mais relevantes para o bem-estar. Ao mesmo tempo em
que as possibilidades de escolhas e alternativas de futuro aumentam, há a angústia em não
ter mais certeza em nenhuma delas.

A intensidade do momento (o presente) é a única certeza que se tem. Pois privar-se


de algo, ao não se ter mais certeza de que o futuro está garantido, se tornou uma aposta -
que ninguém está disposto a pagar. Por usa vez a tradição (o passado) é escolher se fixar
em algo que também pode custar caro. Só nos restando o agora, o ente produtivo passou a
ser ente consumidor.

Devemos entender que problema do consumo é relacionado com o movimento


consumista. Isto é, todos nós somos obrigados a consumir pois essa ação é inerente à
sobrevivência. A necessidade de se alimentar, proteção, diversão e relacionamento é fator
basilar de bem-estar e sobrevivência. Só quando alcançados é que nos preocupamos com a
característica intitulada “qualidade de vida” (BAUMAN, 2005).

Na busca por qualidade de vida, a nossa preocupação com a base da sobrevivência,


estando garantida, pode ser aprimorada. Nos alimentamos melhor e nossa segurança está
garantida. Entretanto, esse passo guarda o risco de falta de medida. Quando a
sobrevivência deixa de ser o parâmetro para o consumo, no momento em que este passa a
ir além dela e se retroalimenta, entramos no âmbito do consumismo (BAUMAN, 2013).

Esse consumo se dá nos mais diversos campos: consumir alimentos com


intensidade de sabores (açúcar, sal, gordura), consumir modos de bem-estar/saúde,
consumir relacionamentos, consumir ideais, consumir identidades. Não operamos mais na
ordem de construir através de planejamento e tempo, na nossa relação com o tempo e com
a velocidade dele. Se tudo é rápido, para ser experimentado, necessariamente precisa ser
intenso, na mesma medida, passa a ser fluído.

Se pensarmos no modelo do jogo, não seria a tela acrílica uma Vitrine? E ela não o é
nem no movimento metafórico, o é em comparação simples e literal. E a vitrine, por sua vez,
não é um símbolo do consumismo? Uma "ilusão de intimidade" (BAUMAN, 2005), uma falsa
interação com o outro, com(o) o produto. Mais uma vez, esse trabalho quer se opor isso.

Dias e Irwin (2013) coloca o corpo como parte fundamental das pesquisas
a/r/tográficas quando constrói sua conceituação sob a fenomenologia. O método em si tenta
retomar o modo de saber sensível para além do campo da visão. Dado que na
contemporaneidade o sentido de ver passou a ser conhecido como saber (DIDI
HUBERMAN, 2013; DIAS; IRWIN, 2013; PONTY, 1991) e é o sentido mais explorado no
campo do consumo (BAUMAN. 2005). A frase “eu vejo” é frequentemente utilizada como
sinônimo de “ eu sei” e vice-eversa.

A priorização do sentido da visão, em detrimento dos demais, é chamado de


processo de descorporelização (GONÇALVES, 1994). Com o desenvolvimento da indústria
e o surgimento da máquina, o homem para a relação que ele tinha direta com o produto
desenvolvido. Ao mesmo tempo, se tornando um não participante do processo como um
todo, dentro da especificidade de seu campo de trabalho (no isolamento de sua atividade), o
trabalho e o produto desenvolvido passam a sofrer de indiferença.

Ao mesmo tempo em que o Estado Moderno vai sendo construído, a inércia corporal
que a tecnologia promove, ao facilitar movimentos, tornar cômodas as tarefas corporais ou
até anula-las (!), inumaniza. Em consequência o homem passa a sofrer de doenças
psicossomáticas geradas pela falta de movimento, de ação (GONÇALVES, 1994).

Hoje, um século depois, no turbilhão de uma nova revolução - a revolução digital - a


dissolução de fronteiras geográficas, do tempo e das relações humanas, encontramos um
aluno que nasceu na era da inércia corporal, do consumo e da descorporalização.

Colocados esses problemas teóricos que afetam diretamente a construção conceitual


do Objeto de Arte/Produto Educacional e, por sua vez, sua concretude e prática (processo
que se deu de maneira ambígua, dialógica, com um interferindo diretamente no outro e ao
mesmo tempo) foi necessário remodelarmos os jogos.

Até agora temos os problemas de ordem conceitual: (1) a estrutura de vitrine que
remetia ao consumismo; (2) a não utilização do corpo fora do espaço predominantemente
visual; e quanto aos problemas de ordem concretização: (3) a dificuldade de reprodução
pelo material utilizado para montagem; (4) o processo de montagem demorado; (6) a
dependência da estrutura da mesa;

5.3 As referências do Produto Educacional em POIESIS/THEORIA

Nesse ponto da pesquisa enfrentamos o problema da configuração do Produto


Educacional de forma que, ao analisarmos sua prática, fomos remetidos à representação de
uma vitrine. Desse modo, após apontarmos durante o texto os problemas da
descorporelização (GONÇALVES. 1994), bem como da sociedade de consumo (BAUMAN.
2011), decidimos revisita-lo antes de sua inserção. Pois tentamos formatar nosso objeto
educacional dentro de um fenômeno de aula que coloca o aluno frente a sua percepção de
autoria e da dialógica dele com o outro de maneira estética. Pois entendemos que o trabalho
de pesquisa com a identidade deve se envolver nesse sentido, já que Bauman aponta para
esse sentido em sua conceituação:

Afinal de contas, a essência da identidade (...) não pode ser constituída


senão por referência aos vínculos que conectam o eu a outras pessoas e ao
pressuposto de que tais vínculos são fidedignos e gozam de estabilidade
com o passar do tempo. (BAUMAN, 2005, p. 74)

Entretanto, como já mencionamos, essa experimentação em nosso suporte estava


na contramão de vínculo que conecta o eu as outras pessoas. Pois, além do suporte realizar
a sugestão de figura de uma vitrine, ainda temos uma diversidade de inconformidades
práticas com a nossa elaboração teórica. Tais como as ambiguidades, já em ideia, de
perceber na forma do objeto que busca o vínculo com outro, o afastamento; fugindo da
padronização de uma sala de aula, nos aprisionamos em uma mesa, ou seja, na busca por
liberdade da/na sala, nos fizemos cárcere da/na mesa; e, finalmente, mesmo reconhecendo
o problema da descorporelização, construímos um objeto que pouco exige corporalmente do
seu participante.

FIGURA 12 - Klimmen em dalen


Fonte: ESCHER. M. C. Klimmen en dalen (Subindo e descendo13). 1960. Disponível em:

http://www.mediotejo.net/m-c-escher-em-lisboa-por-massimo-esposito/ . Acesso em 6 de abril de

2019.

Tudo isso é como habitar um universo desenhado por Escher, onde


ninguém, em lugar algum, pode apontar a diferença entre um caminho
ascendente e um declive acentuado. (BAUMAN, 2005, p. 58)

Embora fosse possível já tornar a aplicação da pesquisa realizável nesse ponto, bem
como os resultados e apontamentos dessa proposta já trariam uma amostragem da
possibilidade de multiplicação dessa atividade e desses problemas de estudo para outros
pares, decidimos nos aprofundar ainda mais e remontar a estrutura do OAIA1. Essa decisão
foi encorajada principalmente pela responsabilidade com a pesquisa.

Se seguirmos, ao perceber essa fragilidade e não tentando resolvê-la, poderíamos


trazer prejuízo à imagem da Pesquisa Educacional em Baseada em Artes (PEBA). Esta que
já tem tão poucas publicações e ainda é vista com apartada frente a trabalhos ditos “mais
acadêmicos” - padronizados - não pode sofrer com a crítica do descompromisso. Assim,
assumindo nossa responsabilidade como artografos, investigamos a questão ainda mais.
Nesse percurso de imersão, encontramos os problemas das relações sociais na pós-
modernidade, que nos deram sendas as nossas inquietudes.

Como já mencionamos, as relações sociais dentro da sociedade líquida foram


virtualizadas e descorporelizadas. Não podendo ser encarada como um fenômeno que se
deu de uma hora para a outra, ela pertence a uma série de complexos outros fenômenos em
uma construção histórica. Assim, ao longo dos dois últimos séculos vimos o arquétipo
burguês sendo vendido e almejado como padrão de vida, imagem de sucesso e felicidade
(definindo e restringindo os papéis para o homem, para a mulher e para a criança); a
revolução industrial e a necessidade do comportamento do proletariado como máquina; a
hiper-valorização do racional e a desvalorização ao sensível; a formatação e construção de
mecanismos de controle e vigilância do Estado, tais como a escola; e a fragmentação e
especialização do conhecimento.

O capitalismo foi se desenvolvendo e deixando mais claro que a questão não era
apenas a exploração do operário. Mas a forma como sua desigualdade de distribuição de
renda gera lixo humano (BAUMAN. 2011). Nesse processo, durante os séculos, aqueles que
não conseguiam adentrar e adequar com e nas classes mais ricas da sociedade, foram
13
(tradução nossa)
excluídas e estereotipadas. Ao não se equilibrarem com o padrão esperado, elas têm suas
identidades impostas por outros, não são úteis ao processo geral do desenvolvimento de
capital e lucro. Assim, são descartadas num sistema de isolamento social. São eles os
imigrantes, mulheres, negros, pobres... um grupo composto por marginalizados e rejeitados
socialmente de modo geral.

Tudo isso foi amplificado, nos últimos 50 anos, quando o aspecto de poder/status
deixou de ser ter a posse de algo. Hoje, o poder/status está conectado a capacidade de
consumir algo. De maneira que após a revolução digital, com o advento da internet e a
liquefação das fronteiras internacionais, levamos à condenação social aqueles que não
detêm poder de compra ou não parecem o ter. Pois, para terem permissão para participar
dessas novas relações, se faz necessário ser ente que consome ou ser ente que demonstra
consumo. Em contrapartida, há o paradoxo desse modus operandi: ao buscar por relações
sociais na sociedade de consumo, procurando pertencer a algum lugar, ter algo que nos
preencha e encontrar afetos, cada vez mais não pertencemos a lugar algum, nunca temos
suficiente e estamos carentes.

O consumo a que nos referimos não pode ser resumido a itens de compra. Como
também já foi citado, ele perpassa pelo comportamento social, pela alimentação, pelo modo
de se vestir e pela imagem. Enquanto os afetos também se virtualizaram e são
(des)encontrados em likes e/ou o quão rápido somos respondidos em mensagens. A
angústia e o medo são sentimentos comuns (BAUMAN, 2005) que geram o sentimento de
insegurança.

Pertencemos a uma diversidade de lugares, temos uma diversidade de itens e nos


(des)encontramos com uma diversidade de pessoas. A nossa vida está dividida, ou como o
título do livro de Zygmunt Bauman sugere, temos “Vidas em Fragmentos”.

É no segundo capítulo desse livro que Bauman (2008) elabora três formas de
comportamentos nas relações sociais do mundo líquido que podem clarificar nossas ideias e
apontar para possíveis caminhos na solução do formato da vitrine do nosso trabalho. As
percepções do sociólogo, como pretendemos exemplificar, acontecem não só fora, mas
também no âmbito escolar. Podemos até inferir a dúvida: ensinamos assim? As concepções
são três: Estar-ao-lado;  Estar-com e Ser-para.

Todas as descrições do autor são elaboradas a partir do princípio central das


consequências de uma sociedade que fomenta o individualismo. Elas são frutos da relação
do incentivo ao esforço e a meritocracia individualista. E afetam a relação entre as pessoas
diretamente. Pois a individualidade não integra os seres, dessa maneira, não gera vínculos.
Ou seja, o encontro do eu com o outro não é de responsabilidade mútua, é de
inconsequência. Nossa disponibilidade de estar/existir no presente não tem história
passada, tão pouco se deseja existir história no futuro. Não estamos nos relacionando de
maneira a dar e receber, existimos desejosos em ser ente receptor e individualista nos
afetos. Aumentamos, assim, a necessidade da compra e dos acordos por afetos, num
mercado que só dispõe de uma variedade de bens não duráveis.

Estamos nos encontrando/existindo/relacionando de forma fragmentada e episódica


(ou ambas, dependendo das circunstâncias). Aceitamos a imagem de um falso
envolvimento, de forma a tratar o outro como algo, como um descartável. Não desejamos ter
mudanças futuras em nossas vidas, há preferência em existir numa rede social onde não se
é afetado pelo encontro. A costura entre o eu e o outro, nossa mútua existência no encontro,
enfim, não é dialógica nos afetos.

As três formas de existir em integração são descritas pelo autor na condição de


fragmentados ou episódicos, de modo que, como também sugere o sociólogo, é possível
caminhamos de uma para o outro. A ordem de afetos dos encontros nas possíveis relações,
se adotarmos os critérios de menor a maior envolvimento do eu com o outro são os
seguintes:

Na menor delas, a forma de integração descrita como “Estar-ao-lado”, as pessoas


não se encontram de frente uma com as outras. Elas, como literalmente descreve o termo,
estão ao lado uma das outras sem sequer interação do olhar direto (apenas o periférico). De
tal modo que não somos dotados de uma olhar panorâmico como os pássaros (BAUMAN.
2013), percebemos o outro perifericamente, enquanto nosso olhar segue outra direção.

A relevância da presença do outro não é levada em consideração essencial, pois o


outro, na mesma condição que o eu, está ao lado para não afetar. Estamos/somos no
mesmo trajeto, estamos/somos inseridos na mesma tarefa, embora os selves não sejam o
foco. O objeto está no trajeto e a tarefa, ou seja, nos fins. Mantemos o outro, o estranho, em
uma distância segura.

Apesar disso, a presença do outro não pode ser plenamente ignorada nessa
modalidade. Pois, de alguma forma o que o outro faz, ou deixa de fazer, interfere
indiretamente na viabilidade dos fins e nas possibilidades de se chegar nele.

As modalidades de exemplos dessa integração são muitas. Temos uma diversidade


delas citadas, tais como a móvel (encontros em shopping center); estacionária (encontros
em vagão de trem, sala de espera); moderada (encontros em prédios de escritórios ou
fábrica) e o estruturado (encontros regulados por espaço e horário, o ambiente de trabalho).
Aqui é preciso pararmos nesses exemplos para perceber o quão a escola, na sua
configuração física e organizacional, se enquadra em promover e ensinar tais relações. No
modelo tradicional de ensino a interação está em animação suspensa. O encontro dos
alunos com seus pares e os professores é passageiro, os professores aplicam exercícios,
provas, trabalhos individuais e pedem que os alunos ignorem a existência do outro. Estamos
no mesmo lugar, ao mesmo tempo, mas a interação trás prejuízo (ou é ensinada que sua
existência trará punição).

O aluno aprende na sala de aula como um ambiente de trabalho é estruturado em


animação suspensa. Qualquer interação pode gerar punições e/ou interpretações de
imoralidades diante de um comportamento reprovável para uma prova, trabalho ou teste.
Ensina-se o individualismo e o sucesso através do esforço meritocrático, a capacidade de
realizar tarefas sozinhos e de permanecer em silêncio são enaltecidos como grandes
atributos e conquistas enquanto, em contrapartida, aos poucos insensibiliza e torna o eu
indiferente ao outro.

Já que estamos fadados a nos encontrar, então, criamos estratégias de não sermos
afetados. De uma bolsa colocada em um banco para ocupar o assento de maneira a
ninguém se aproximar, à análise fugaz de figuras em revistas para não trocar olhares, até a
infinita verificação de atualizações do meu perfil na rede social em um celular. Na escola
esses comportamentos também são replicados (mais uma vez, me questiono: ensinados?).

Cadeiras enfileiradas ou móveis que não permitem encaixe para trabalhos se não os
individuais. Lugares marcados como estratégia de afastar os alunos que mais interagem e
atrapalham a preservação do contrato de “cumplicidade de silêncio” (BAUMAN, 2013, p.69).
E, ainda quando as interações são permitidas e exigidas curricularmente, tais como em
áreas do conhecimento como Educação Física, elas promovem a coletividade em
competitividade.

Isto é, a escola ensina práticas individualistas; dessensibiliza o eu do outro ao


fomentar o individualismo e a meritocracia como prática; promove encontros fragmentados e
que ensinam a indiferença quando estimulam a se ignorar a presença do outro e manter o
contrato de silêncio; e, até mesmo quando há interação, os indivíduos são postos uns contra
os outros.

Designs hábeis podem ajudar a mantê-los assim [...] o espaço transforma


ocupação física em vazio espiritual. Mas, se o design falhar, habilidades
pessoais de decretamento de vazio vêm ao auxílio: um jornal ou um livro
comprado às pressas antes do embarque são buracos portáteis da era da
superlotação. Pode-se enterrar os olhos na página impressa, ou virá-los
para longe, ou fechá-los. (BAUMAN, 2011, p. 69)

Não há aqui pretensão de condenação da instituição escola. Como se seguirá nas


próximas observações de Bauman, sobre as integrações na pós-modernidade, tomaremos
notas de outros tantos exemplos positivos nela. Assim como o autor ao definir o “estar-ao-
lado” o encontra numa diversidade de ambientes, também começamos a perceber que a
escola pode ser um deles. Ao que cabe esse capítulo, na avaliação e redesenho do Objeto
de Arte, pretendemos tomar outros propósitos.

A priori o nosso OAIA1 já demonstra ter ultrapassado a integração do estar-ao-lado,


pois em primeira instância o design dele coloca os alunos frente a frente. Também, diferente
de um contrato regulado de não afetos ou da possibilidade de ignorar a presença do outro, o
objetivo do trabalho é o justo de afetos no desenho do outro.

Não nos pareceu que a descrição desse comportamento relacional da sociedade


líquida é perpetuado pelo nosso Produto Educacional. De algum modo, intuitivamente,
ultrapassamos esse estado.

5.3.1 Cooperação, por quê?


FIGURA 13 - Drawing hands

Fonte: ESCHER. M. C. Drawing Hands.1948. Disponível em:


https://arthive.com/escher/works/200361~Drawing_hands . Acesso em 6 de abril de 2019.

Nesse ponto da pesquisa e do texto voltamos a tocar em um dos fatores


fundamentais da pesquisa baseada em artes. Como já declarado anteriormente por
ZAMBONI (1996), a grande diferenciação de pesquisas em métodos científicos e em
métodos artísticos é que a, apesar da intuição fazer parte dos dois, na pesquisa em artes
ela tem um peso maior.

Retomo o elemento da intuição para descrever ao leitor a experiência do conceito da


relação estar-com e ser-para atingida de forma estética intuitivamente. Pois tal vivência se
vale de um pensamento complexo e não linear próprio da Arte.

Imbuído da dúvida da pesquisa, do desafio em promover um objeto que pudesse de


alguma forma ultrapassar a relação de distanciamento promovido pela mesa e pelo acrílico
(que lembravam a vitrine) percebi que estávamos o tempo inteiro falando sobre suporte. Ou
seja, a saída da horizontalidade (mesa) promovida pelo posicionamento vertical do suporte
(acrílico) para o desenho era rígido. Dessa maneira, a materialidade isentava os autores de
dependência, enquanto tornavam tanto os objetos de uso interdependentes quanto os
autores independentes e não-responsáveis.
A conclusão a que se chegou foi a urgência em se alterar a materialidade do suporte.
De maneira que, se estávamos com a rigidez do material problematizando nossos objetivos,
por ironia, pesquisamos materiais mais fluídos. No mesmo caminho de interpretação
intuitiva, precisávamos buscar uma possibilidade de inverter a dependência do aluno com o
material. Estávamos a procura de fazer os alunos dependerem um do outro e não darem
essa responsabilidade aos materiais.

E foram nessas circunstâncias que nos fizeram encontrar em Broto (1995) e na ideia
de Jogos Cooperativos uma possível alternativa de saída. Aplicamos ao suporte (na sua
materialidade e mobilidade) a ideia de cooperação. Em si, ela se diferencia da competição
quando não cria um objetivo a ser conquistado apenas por uma pessoa ou grupo, gerando o
vitorioso e o derrotado. Ela é a busca para alcançar um objetivo em comum com a
necessidade intrínseca do outro, ou seja, sem o outro não é possível concluir a tarefa.
Nenhum dos dois (nem o eu, nem o outro) irão chegar ao final se não cooperarem.

Então, aplicando ao suporte essa definição e tornando os alunos responsáveis pela


gestão do próprio, alteramos para o seguinte desenho:

FIGURA 14 Modelo para Objeto de Arte Inserido em Aula n1 - OAIA1


Fonte: O autor (2018).

Substituímos o suporte-mesa pelos dois braços dos alunos e o suporte-acrílico por


material flexível (plástico). Essa pequena alteração da inserção de cooperatividade para a
possibilidade de produção ampliou todas as propostas de criação e imaginação que
tínhamos planejado. Bem como criou um novo critério para avaliação do produto
educacional. Ademais, no percurso, acabamos por conduzir uma solução para o problema
da imagem da vitrine.

A obrigatoriedade na utilização do braço para elaboração das propostas estéticas


daria ao aluno a relação de proximidade com o outro que o acrílico não o fazia. Isso
significava que, de alguma forma, estaríamos ultrapassando a imagem de vitrine que era o
problema que vínhamos discutindo. Pois, apesar de ainda ser possível reconhecer que a
película entre os alunos, atada aos braços deles, ainda poderia se assemelhar em forma
com a vitrine, em operação, se distanciava.

Enquanto na execução antiga o ente eu era espectador passivo e o ente outro um


mostruário, nesse o eu ganha o atributo de espectador ativo ao mesmo tempo em que, por
isso, o outro também adquiri a pré-condição de só executar a construção estética desejada
se o eu estiver em atividade. Como no quadro de ESCHER, Drawing Hands (1948), as mãos
dos entes se entrelaçavam de maneira que eles se desenham sem de fato conseguirmos
compreender até que ponto um não pertence ao desenho do outro, qual é o começo e o fim
dos entes e da produção e a quem pertence o desenhou. Intuitivamente, ao inserir a
cooperação na construção do suporte, a dialógica eu/outro se tornou mais complexa,
mergulhamos mais profundamente no mundo pós-moderno - flexível de definições não
rígidas - e isso também significava que estávamos modelando e movimentando a relação
entre os entes.

Desse modo, iremos retomar os estudos de Bauman sobre os modelos de integração


das relações sociais na pós-modernidade. Pois precisamos estabelecer melhor o critério na
avaliação futura do produto, dado que entendemos que a integração do eu/outro era
elemento influenciador na identidade nos dias de hoje. Já sabíamos que a proposta inicial,
quando no suporte mesa e suporte acrílico, ultrapassava o conceito/prática de estar-ao-lado,
portanto, estávamos no caminho.

A próxima integração de relação social descrita por Bauman (2008) é a estar-com.


Como já descrita, ela exercer maior envolvimento dos entes que a estar-ao-lado. Pois,
enquanto ao lado o ser não permanece tempo suficiente para ser notado como pessoa (ou
não lhe é dado essa circunscrição no tempo), no estar-com o ente é pessoa e objeto de
atenção.

Segundo o autor, estar-com é a relação que dá ao outro caráter de participação na


ação de dependência mútua. Entretanto, essa ainda está interessada no objeto/objetivo e
não no outro. Como o próprio sociólogo coloca, é um interesse ad hoc, pois ao mesmo
tempo em que a dependência mútua é geradora do elo, ele se limita nela. Ou seja, o que faz
e mantém essa relação existindo não é o outro, mas o interesse.

A ocasião do encontro onde os entes estão-com se limitam em circunstâncias


temporais. Elas não ultrapassam o presente em direção ao futuro, tão pouco habitam o
passado dos envolvidos. O eu e o outro estão semi-presentes, pois não comparecem a
estrutura do encontro por completo. Os envolvidos entregam apenas o suficiente de si para
manter a distância e diminuir o tempo de permanência entre eles.

Nesse ponto, mais uma vez, problematizamos o nosso Objeto de Arte, pois aqui nos
parece que os encontros e integrações a serem promovidas por ele serão do tipo estar-com.
Mesmo ao replanejar os suportes e aumentar a interação entre os entes participantes,
racionalmente nos parece que eles estarão dependentes da/pela circunstância e limitados
temporalmente por ela. Enfrentando tal conjuntura, nos perguntamos o que seria preciso
para ultrapassarmos também esse encontro superficial e alcançarmos o ser-para (último
grau de relação descrito por Bauman e o único em que os entes estão completos).

Entretanto, apesar do sociólogo afirmar que há passagem do estar-com ao ser-para,


ele também deixa claro que não há como mensurar quais são os parâmetros e os caminhos
para o fazê-lo. A descrição do ser-para é o encontro não fragmentado, não episódico, é
pleno e de doação. É o encontro no compromisso de um com o outro, onde os selves
podem se mostrar sem dissimulação. A entrega que cria vínculo, compromisso e, na
inscrição no tempo, afeta o futuro de ambos.

Assim, a razão de não conseguirmos ponderar e qualificar o que é a essência de tal


ente para ao entender, replica-lo; a razão de não ser mensurável e escapar a racionalização
é justamente por não pertencer à Razão.

[...] o ser para é um escândalo em termos de razão; para a falar a verdade,


é o escândalo da razão, uma vez que a razão se tinha declarado, e segue a
se redeclarar, na oposição a, e em luta contra, qualquer coisa que escapa à
rede de ponderação. E o ser-para é o maior peixe a escapar à rede - tão
grande e difícil de dominar que rasga a rede ao sair dela. (BAUMAN, 2011,
p. 79)
Diferente da passagem do estar-ao-lado ao estar-com, não há nada pré-frabricado
que possa oferecer o caminho do estar-com ao ser-para. Todo encontro é potencialmente
uma possibilidade de transcendência ao ser-para, mas nenhuma delas nos previne de seu
acontecimento. Sendo colocada essa premissa, dada a impossibilidade de compreensão
dessa ação/fenômeno - que transforma, caminha ou liga até o ser-para - no campo que
pertence à Razão, é possível que uma investigação Estética nos tragar luz ao assunto.

Reafirmando, assim, a necessidade e a importância da pesquisa baseada em artes


para uma compreensão mais ampla dos questionamentos diante da identidade e das
relações sociais nas circunstâncias da pós-modernidade.

5.3.2 Reafirmando a sensibilidade - o quebra cabeça do estar-com/ser-para

Sim, há um monte de pecinhas na mesa que você espera poder juntar


formando um todo significativo – mas a imagem que deverá aparecer ao fim
do seu trabalho não é dada antecipadamente, de modo que você não pode
ter certeza de ter todas as peças necessárias para montá-la, de haver
selecionado as peças certas entre as que estão sobre a mesa, de as ter
colocado no lugar adequado ou de que elas realmente se encaixam para
formar a figura final. (BAUMAN, 2005, p. 54)

Apesar de Bauman não nos dar um caminho possível para realização da transição
do estar-com ao ser-para, ele consegue definir o que é o ente ser-para. Acreditamos que
nessa descrição poderemos encontrar pistas de como elaborar nosso OAIA1 para que
possa tocar o ser-para.

Zygmunt descreve que tal integração é encontrada quando há comprometimento


mútuo, com responsabilidade e sem a imposição do medo. Isto é, o vínculo não é criado, ou
motivado, pelo medo da punição. Além dele existir sem nenhum motivo que possa ser
identificado pela razão, para tal, ele habita na e com a livre decisão de ver/saber o outro
bem. Tal atitude é mútua, ou seja, as partes envolvidas agem para estarem bem.

O próprio autor já consegue observar em sua definição um dos motivos para nos
afastar dessa integração e seu acontecimento existir mais como uma exceção
contemporânea do que como norma. A causa relatada reside na fundamentação do
entendimento do que é ético. Pois no campo do discurso, sua base é a compreensão de um
bem maior. Ou seja, o sujeito, ao entender os alicerces de uma vida em comunidade
equilibrada e sadia, ele se autorregulará em um comportamento que beneficie o todo.
Entretanto, no campo prático, ela é entendida como o comportamento que devemos ter para
não ser punido (BAUMAN, 2011).

O dever ético na pós modernidade sofre com a liquidez de seus entendimentos que
distam no discurso e na prática dele. Logo, o medo se torna o motivador para o exercício do
dever ético e faz com que os entes tomem decisões de comportamento. De tal maneira que
para Bauman (2011), ao analisar através de citações de Vetlesen, a interpretação do caso
Eichmann, também se opõe a conclusão de Hanna Arendt.

Vetlesen se opõe à interpretação de Hanna Arendt do mal como produto da


incapacidade para pensar - o que sugere, em vez disso, que “Eichmann não
era meramente irrefletido, mas antes de mais nada insensível”. Aquilo que
deixou o mal agir livremente foi a “indiferença de Eichmann ao significado
do sofrimento, à imposição da dor. (BAUMAN, 2011, p. 84)

Ao optarmos pelo caminho da conscientização e da reflexibilidade, também


racionalizamos o que deveria pertencer ao campo do sensível. A característica que é se
importar com outro parou de ser sentida, passou a ser entendida. Desse modo,
conseguimos construir uma sociedade de entes que são capazes de criar lógica na defesa
de eliminação do outro, o cidadão de bem que - cumpridor da lei e pagante de seus
impostos - democraticamente elege a eliminação do outro como uma solução para os
problemas da humanidade (BAUMAN, 2011). Diante desse cenário, cada vez mais
emergente, reafirmamos mais uma vez a necessidade urgente de investir em pesquisa de
sensibilidade.

O ser-para é o nosso exemplo de relação e comportamento que se perdeu.


Esquecemos o caminho para alcançá-lo, mas conseguimos dar características e exemplos
concretos desse comportamento. O principal deles, citados por Bauman (2008), é a troca de
olhar. É a abertura ao diálogo que não é forçada, mas que acontece espontaneamente, sem
reservas, no que o autor chama de “sentar a mesa” (BAUMAN, 2005). Como estamos
fragmentando nossas relações a ação de sentar a mesa para jantar, ter conversas
corriqueiras e olho-no-olho com os familiares e amigos, são comportamentos escassos.
Eram em momentos como esse, por exemplo, que encontramos o comportamento descrito
pelo autor: “Os olhos param de vaguear em torno e evitar corpos em movimento, encontram
outros olhos e permanecem fixos - e um compromisso surge, aparentemente do nada, sem
intenção, instrução e norma prévia.” (BAUMAN. 2011, p. 83)
Ao procurarmos exemplos, a partir dessa premissa de comportamento descrita pelo
autor, o acontecimento dessa relação na escola, é irônico constatar que o sentar à mesa
promovido nesse ambiente é descorporeificador. De modo que em sala se fomentam os
corpos inertes (GONÇALVES, 1994) e execra as possibilidades de relação num mecanismo
de vigilância (FOUCAULT, 1987), estamos ensinando a indiferença, estamos
insensibilizando o eu ao/para outro.

Aqui, uma questão central ainda não resolvida em nossa análise precisa ser
colocada. Posto que já conseguimos alcançar o reconhecimento de exemplos ser-para e
perceber que há a necessidade de promoção desse comportamento em ambiente escolar
(que nos parece realizar-se e ratificar-se em justo oposto na sua construção histórica e
modus operandis): é possível promover esse comportamento espontâneo artificialmente? Se
sim, como coloca-lo em nosso modelo de Objeto de Arte Inserido em Aula?

Mais uma vez, escapando a racionalidade, buscamos exemplos que pesquisem o


assunto através de sensibilidade. E, na arte contemporânea, podemos tomar um modelo de
reflexão-sensível sobre o ser-para como caminho.

FIGURA 15 - trecho do filme Marina Abramovic: A Artista Está Presente

Fon
te: trecho do filme MARINA ABRAMOVIC – A Artista Está Presente. Diretor: Matthew Akers. SHOW
OF FORCE. 2012 (106 min)
A performance apresentada pela artista Marina Abramovic em 2010, intitulada “A
artista está presente”, registrada no documentário de Matthew Akers (2012), pode nos trazer
mais pistas sobre um modelo de promoção do ser-para e, tão logo, as atividades a serem
preparadas para os alunos. Nessa performance foi pedido pela artista que se
disponibilizassem uma mesa e duas cadeiras em um dos salões do MOMA. Ela se
posicionaria sentada em uma das cadeiras durante o período da exposição (3 meses) todos
os dias. Por sua vez, o público, um a um, sentaria na outra cadeira a sua frente e seria
convidado a olhar para a artista. A proposta inicial era a de que ela nada falaria, nem
mesmo com a expressão facial. Seria entregue a quem sentasse na cadeira, um olhar
direto, um olhar “olho no olho”

FIGURA 16 - Reflexos do olhar

Reflexos do olhar. Foto ensaio composto por fragmentos do filme MARINA ABRAMOVIC – A Artista
Está Presente (AKERS. 2012) e detalhes da pintura Las Meninas (VELÁSQUEZ. 1656). Fonte: o
autor (2018)
Ora, não nos parece que essa é a nossa busca desde o início? É o próprio
movimento caligramático de Magritte acontecendo no eu/outro em Abramovic/Público; a
reflexibilidade - em todos os sentidos - de Las Meninas onde o autor da obra é
pintor/rei/público e, enfim, o movimento rizomático estar-com/ser-para, que buscamos
alcançar, acontecendo.

As características do sentar-se à mesa e do olho no olho descritos por Bauman


como qualidades próprias da integração ser-para, rizomáticas e não pertencente a razão,
foram alcançadas em “A artista está presente”. Entretanto, como próprio da arte, seu
significado e controle não foi exato e de resposta quantitativa para todas as pessoas. Nem o
poderia ser, pois a sua abrangência, amplitude e diversidade é o que define o campo.

Foram diversos exemplos de integração durante a exposição. Algumas pessoas


tocaram esses aspectos em sua permanência de minutos frente a artista e, imersos na obra,
se emocionaram. Algumas outras permaneceram 7 horas inteiras em uma troca de olhar.
Outras não demonstraram emoção, pareceram não ser tocadas. Por fim, até o olhar
emancipado da artista, e sua postura incólume, também foi afetada.

Como já esperado por uma pesquisa em arte, nosso OAIA1 pretende diversificar as
suas formas de afetar eu/outro. De forma que será avaliada, como em “A artista está
presente” a sua abrangência, amplitude e diversidade em registrar as integrações. Com o
foco em encontrar estar-com/ser-para, mas sem restringir outras possibilidades.

Outra individualidade da obra é a atualização do espaço artista-obra, público-obra.


Aqui já não temos o distanciamento e a definição clara de linguagens artísticas clássicas
(como pinturas, esculturas, teatro, fotografia…). A constituição da performance quebra
paradigmas e dialoga de forma direta com a falta de fronteiras e liquidez da pós-
modernidade. “A artista está presente” é artista/obra/público de uma vez só. A experiência
estética acontece e permanece no eu/outro, mas, fora do registro, a obra é só fenômeno
pueril.

Ao adotar a comparação com nosso OAIA1 para aproximar da obra da performancer


e, assim, caminharmos ao encontro do “senta-se à mesa” e “olho no olho” (BAUMAN. 2005),
percebemos já os tangenciar em estrutura. Nós promovemos o sentar-se à mesa, mesmo
sem o objeto mesa, ao criarmos a circunstância de compromisso. De certa forma, com
menor liberdade que a referenciada, pois o nosso espaço e os corpos estão atados (pelo
braço e a atividade cooperativa do desenho, pintura…).

Entretanto, não vemos menos potência nisso. Apenas uma possibilidade diferente de
encontrar a experiência estética dos conceitos de sentar-se à mesa e de olho no olho que
são, no final, sinônimos de compromisso e vínculo. No âmbito prático, quando estivermos
em campo, teremos diante de nós o momento de avaliar se essa estrutura (em sua
materialidade e atividades) favorece o despertar dessa qualidade. Assim, a elaboração das
atividades de desenho e pintura, pretendem incentivar o mesmo compromisso e vínculo.

Como aponta BAUMAN, o nosso principal objeto de estudo, a identidade, parece


habitar nessas características:

Afinal de contas, a essência da identidade [...] não pode ser constituída


senão por referência aos vínculos que conectam o eu a outras pessoas e ao
pressuposto de que tais vínculos são fidedignos e gozam de estabilidade
com o passar do tempo. (BAUMAN, 2005, p. 74)

5.4 A abordagem

Com a intenção de esclarecer melhor o caminho das atividades a serem elaboradas


na proposta do Produto Educacional, voltamos a lidar com o problema da abordagem
educacional. Posto que a questão da vitrine nos parece ter sido ultrapassada (ou, pelo
menos, seguida adiante) com a materialidade do suporte alterada e de modo que -
intuitivamente – ao entendermos ir na direção da integração estar-com na intenção do ser-
para. Nos parece que a possibilidade de ir do estar-com ao ser-para está configurada na
abordagem das atividades a serem realizadas. A estas caberão o principal aprofundamento
no pensamento estético.

Quando investigamos em uma leitura os Parâmetros Curriculares Nacional de Artes


é possível perceber as suas bases na Abordagem Triangular da teórica Ana Mae Barbosa.
Os eixos norteadores para o texto são escritos sobre três objetivos principais no ensino de
artes para educação básica, que são: fazer arte, contextualizar arte e apreciar a arte.

A abordagem triangular de Barbosa (2011) é considerada um marco para o ensino


de artes no país. Pois, em cima de sua construção prática/teórica foi possível legitimar a
área do ensino de artes e afasta-la do entendimento de “atividade”. Ela foi responsável por
dar aos arte-educadores o reconhecimento e esclarecer os objetivos e caminhos com os
alunos em sala.

Não devendo ser compreendida como etapas estanques, as aulas de artes devem
contemplar essas três vertentes para construir o ensino de artes como um diálogo
(BARBOSA, 2011). Na sua primeira elaboração tais etapas em diálogo, sempre giravam em
ordem. Uma década depois, revisitando a própria teoria, já se falava em um aspecto zigue-
zague, onde de um dos vértices pode se caminhar qualquer um dos outros dois e, por sua
vez,  retornar ou seguir adiante - se preciso o for.

A Proposta Triangular teve como motivador para seu desenvolvimento a ausência do


uso da imagem na sala de aula. Advindo dos estudos modernos e do escolanovismo, as
aulas de arte, em busca da identidade do aluno, tinham medo da inserção de imagens na
aula. Os professores temiam influenciar a verdade do aluno, tirar a virgindade da
originalidade do traço e/ou da pintura daquele estudante. Era como ensinar a escrever e ler
sem ter contato com obras literárias (BARBOSA, 2014).

Assim, para que os estudantes pudessem desenvolver sua sensibilidade e os


professores pudessem entender a importância do (e como inserir) uso da imagem nas aulas
de artes, Barbosa desenvolveu sua proposta. A triangulação (e depois o zigue-zague)
tinham nas imagens inseridas o norteador das aulas e da construção do repertório do aluno.

O uso da imagem em sala não se limita, entretanto, no mainstream ou de


reconhecimento e valorização histórica já legitimada. Ela vai desde o design de móveis,
estampas de blusas, vinhetas, embalagens de produtos, grafites no bairro… as aulas são
alimentadas também por imagens do repertório local, do cotidiano e que fazem, assim, parte
da vida escolar. Com isso, Barbosa, torna possível aos professores, independente da
tecnologia que tem em mãos, de sua localidade geográfica e de suas possibilidades
financeiras, o conhecimento estético.

Se faz necessário, entretanto, ponderarmos algumas críticas a essa abordagem.


Pois, em cima da nossa construção de pensamento e do que pretendemos tocar com nosso
Objeto de Arte, o uso dela não nos parece adequado esteticamente. Mesmo
compreendendo a sua importância histórica e toda sua contribuição ao campo da
arte/educação, a esta pesquisa, ela parece que distanciar-nos dos nossos propósitos. Já
que, durante todo o nosso fluxo de ideias, a fragmentação do conhecimento ocasionada
pela racionalidade e o consumo de imagens sofreram críticas.

Para encontrarmos com os problemas inerentes ao nosso objeto de estudo no


produto educacional (pois a ligação estar-com/ser-para nos parece até aqui estar no
conjunto do pensar estético) tal divisão (fazer, contextualizar e apreciar) não nos parece
sensata. Desse modo, tentaremos, ainda citando Barbosa, elaborar uma ação sem separar
tais atividades. Ou seja, nossa proposta é a ação fazer/apreciar/contextualizar.

Tal objetivo estará presente durante as atividades. Estas serão desenvolvidas para
acontecerem em turnos, pois, pretendemos mesclar o fazer e o apreciar. Enquanto um dos
alunos desenha e aprecia o que é feito pelo outro (por ser transparência), aquele que
aprecia o desenho que está sendo execução também elabora o seu fazer do próximo turno.
Ao mesmo tempo em que o repertório individual e coletivo será compartilhado e integrado
em uma obra só (tanto pela orientação do arte-educador quanto pelo eu/outro envolvidos
diretamente no processo performático). Pretendemos, assim, ter o
fazer/apreciar/contextualizar como uma nova ação.

A partir disso, procuramos nos basear em uma abordagem anterior a triangular, uma
em que ainda não tivéssemos a divisão dessas ações.

Por esses motivos, buscamos desenvolver as atividades numa aproximação com


outras abordagens. De modo antropofágico, adotaremos uma aproximação à proposta do
modernista em atividades de artes para o ensino básico. Tais atividades, influenciadas pelos
estudos do grafismo infantil e da psicologia foram alicerce para inserção de desenho ainda
na Educação Infantil de Rui Barbosa. Enquanto estudávamos e revisamos o contexto
histórico da inserção da disciplina de artes na educação básica, esta nos pareceu ir de
encontro com nossa busca do problema da identidade por reforçar o modelo interno do
aluno durante seu fazer.

Como sujeitos históricos, não esquivaremos com a negação de que os nossos


problemas são os mesmo que os dos modernistas. Entendemos, de antemão, que a
necessidade da nova configuração de identidade no mundo pós moderno não é a mesma
que a da modernidade (consumo de X construção de, respectivamente). Assim, como
antropofagistas, mastigaremos a proposta de desenho junto com os temperos dos conceitos
de corporeidade (uso dos braços como suporte) e as relações sociais na pós-modernidade
(estar-com ao ser-para).

Ao procurar referências de trabalhos dessa época, onde o objetivo era o


desenvolvimento da individualidade, expressão e identidade do aluno, resgatamos um
modelo da década de 20 do século passado. Essa proposta de trabalho estético aparece
documentada na Reforma da instrução pública no Estado de São Paulo  desenvolvida em
São Paulo, em que o objetivo se valoriza a espontaneidade e expressividade dos alunos.

Os assuntos escolhidos para o desenho serão tirados da vida local,


exprimindo sempre um fato cotidiano, a sucessão de estações, a vida
agrícola, pastoril ou industrial; diferentes aspectos da vida doméstica da
localidade serão um manancial inesgotável de motivos que as crianças
gostam de desenhar.
Quanto ao método, recomenda-se uma ativação dos conceitos e elementos
visualizados através de diálogo:
a. indagar o que as crianças têm feito;
b. o que seus companheiros têm feito;
c. o têm visto;
d. o que sabem sobre qualquer coisa;
e. o que imaginam;
f. lembrando as noções de sólidos geométricos já estudados, desenhar
alguma coisa (ex. casa, igreja ou monumentos) que recorde tais formas etc.
Os desenhos serão feitos sem modelos. As crianças desenharão como
souberem evocando apenas a imagem que possuem sobre tais assuntos.
Deve o aluno habituar-se a pensar pelo desenho sobre ideias suscetíveis de
serem representadas graficamente por uma imagem. Quanto ao assunto a
estudar, pode ser considerado pela sua natureza em estado de repouso ou
movimento. (SÃO PAULO, apud BARBOSA, 2010, p. 113)

Relembrando que a busca nessa época (moderna) era pelo enriquecimento de


modelos internos, sem a utilização de modelos externos. Incentivando o aluno a se
expressar seus modelos internos livremente. O aprendizado era, de maneira que a
autocorreção, com repetições de movimentos de forma mecânica por parte do aluno, era
individual.  E em nossa prática, iremos modificar algumas dessas etapas de maneira a
conciliar com a pós modernidade.

Quanto a “os assuntos escolhidos ainda serão da vida cotidiana do aluno”


manteremos esse enfoque por se tratar de uma necessidade de sensibilização e significado
ao aprendizado. Entretanto, a questão “local” abordada no texto já não será mais dominada,
dado os fatores da globalização e da liquidez das fronteiras em nossa época.

Do mesmo modo, entendendo que o trecho “sucessão de estações, a vida agrícola,


pastoril e industrial; os diferentes aspectos da vida doméstica…” trata-se de uma questão
moderna, do ser em produtividade, ainda com o pensamento educacional estruturado no
ente que constrói identidade. Assim, essa passagem será adaptada levando em conta as
questões da pós modernidade: consumo, angústia e medo acarretados pela incerteza do
futuro, fragmentação do conhecimento e os novos modos de interação e integração social.

Entendemos que as etapas de “a” a “e” são partes inerentes a qualquer aula que se
mantenha aberta ao diálogo constante com o aluno e fazem parte assim, do cotidiano do
professor-pesquisador que tem prioridade de desenvolver a autonomia do aluno. Daremos
ênfase, então, em “f” que, a priori, nos parece ser a etapa que pertence diretamente ao
pensamento estético.

Assim, nossas atividades pretendem ter progresso em adequar os objetos de estudo


e habilidades curriculares com o desenvolvimento estético. Este, por sua vez, é baseado no
modelo interno do aluno iniciado através da própria performance com o OAIA1. As
avaliações do processo de produção, da técnica, do repertório do aluno acontecerão
apoiados em um tema inicial proposto pelo professor-pesquisador-artista.

Pretende-se, dessa maneira, enfrentando a incerteza, utilizando as peças que temos


até agora, que o nosso quebra-cabeça caminhe a uma imagem mesmo que na ausência de
peças ou de um referencial final.

5.5 O Produto Educacional em PRÁXIS

ATIVIDADES PROPOSTAS

Neste capítulo colocaremos disponível as propostas de atividades que iremos levar a


campo para a avaliação do Produto Educacional. Elas devem ser entendidas como
possibilidades que podem ser modificadas e ampliadas dependendo da intenção, do tempo,
do espaço e dos materiais disponíveis pelo artista-educador.

Como a pesquisa acontecerá em uma turma do oitavo ano do Município do Rio de


Janeiro, os objetivos de estudos e habilidades do OAIA1 serão adaptados às orientações
curriculares disponibilizadas pela Secretaria Municipal de Educação. Da mesma maneira,
são apenas possibilidades e não diretrizes, assim, futuras adaptações são bem-vindas.

AULA 1

O primeiro ingresso da pesquisa junto a turma, após os procedimentos éticos de


explicar aos responsáveis e alunos a pesquisa, aconteceu em uma das aulas de Artes
Visuais da turma de oitavo ano. Nela, foi pedido aos alunos que escolhessem duplas para o
trabalho e a cada uma dela foi distribuída a transparência (sacolas plásticas), tintas para
pintura com o dedo e exemplificado como os materiais deveriam ser utilizados.

Após a explanação, com as duplas posicionadas e prontas para o desafio, foi pedido
que eles realizassem um desenho na transparência, de modo que o trabalho pertenceria aos
dois e seria feito em turno e rodadas, de modo que:

Uma rodada teria dois turnos. No primeiro turno um dos lados deveria desenhar uma
forma geométrica à mão livre. Por sua vez, no segundo turno o outro lado deveria utilizar
aquela informação para desenhar “algo que não pode viver sem”.

Na segunda rodada, as ações dos lados se inverteria e assim, sucessivamente, até a


transparência, aos poucos, ser completamente preenchida com desenhos.
Os objetivos dessa investigação estética foram abordados com os alunos durante a
execução do trabalho em conversas com professor-pesquisador. As principais, no que
pertence ao currículo era o de verificar o domínio dos elementos visuais na composição
gráfica; refletir sobre o caráter efêmero da arte contemporânea; realizar o fazer artístico de
forma intencional, contextualizada, reflexiva e criativa; nas habilidades: perceber o processo
de simplificação da forma (construção e desconstrução da imagem) e o exercício da poiesis.

Já que o estar-com é condição a priori do Produto Educacional, ainda há a dúvida se


as atividades de imaginação e criação nos dariam momentos de ser-para.

Assim, indo ao que investigamos como objeto/problema de pesquisa, queríamos


experienciar no desafio de imaginar “algo que não posso viver sem”, nas condições pré-
estabelecidas do OAIA1, se o estímulo à cooperação física (braços e turnos) também se
equilibra com encontrar o “algo” que fosse comum (já que o desenho pertence aos dois). E
se esse diálogo, existindo, aconteceria verbalmente, com comunicação corporal e/ou não
verbal, se ele seria fluído ou estanque.

Assume-se também que existia a intenção de estimular um possível debate sobre a


sociedade de consumo caso o resultado fosse direcionado a bens de consumo (objetos de
desejo). Dessa maneira, ao abrir os trabalhos para análise de todos os envolvidos, seria
possível apresentar obras e artistas que tratassem do tema. Convergindo o tema de estudo
estético dos alunos com o tema da pesquisa sobre a identidade contemporânea. Entretanto,
não foi isso o que aconteceu.
FIGURA 17 - Le Mystère Casa

Le Mystère Casa. Série Estilo composto por duas fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)
FIGURA 18 - Triângulo-Fronteira-Casa

Triângulo-Fronteira-Casa. Foto-ensaio composto por duas fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)
FIGURA 19 - Le Mystère Pizza

Le Mystère Pizza. Série estilo composto por uma fotografia digital. Fonte: o autor (2018)

Nessa análise dos primeiros Foto Ensaios já diagnosticamos uma primeira


dificuldade na utilização do instrumento de Foto Ensaio Estilo. Pois ao se tratar de uma
referência à obra original Le Mystère Picasso não conseguimos a fidelidade esperada.
Apesar da tentativa de preservação do enquadramento e de poder equilibrar a cor, luz e
brilho numa pós-produção digital, a sequência de fotos que pertenciam aos turnos se
perdeu. Fazendo assim que também ficasse perdido a primeira proposta de analisar os
turnos pertencendo cada um a uma esfera própria de manifestação estética.

Isso se deveu por alguns fatores que só puderam ser avaliados no decorrer da aula.
O primeiro deles foi a quantidade de duplas e o outro foi realização simultânea de todos os
trabalhos. Sendo o pesquisador apenas um, alguns trabalhos não tiveram a possibilidade de
ter, ao menos, uma foto em cada etapa. Nesse sentido, o instrumento do registro de
algumas falas dos alunos veio a acrescentar na análise.
Nessa primeira avaliação, decidimos reunir na sequência de fotos (Figura 17 a 19)
trabalhos que dialogassem com o comportamento estar-com. Na sequência acima, Le
Mystère Casa (FIGURA 17), a casa foi realizada - a primeira vista - com independência do
triângulo. Atitude que se repetiu também no desenho em vermelho, Le Mystère Pizza
(FIGURA 19), quando a fatia de pizza foi desenhada sem utilização gráfica do círculo.
Entretanto, todos os alunos envolvidos demonstraram pensamento estético sobre a
circunstância imposta pelo desafio.

Tratando-se do desenho em azul, percebemos uma linha formada pela dobra do


plástico que resultou numa divisão na composição do quadro final. Quando no 1º turno, o
triângulo desenhado se posicionou de um dos lados da dobra, por sua vez, a casa não só se
posicionou do lado oposto, como também se compôs em uma linha diagonal mais alta. Há
aqui uma manifestação estética do conceito de estar-ao-lado.

O desafio da integração no e do desenho não foi realizado, de maneira que, talvez


por influência da dobra do plástico, a configuração e a dinâmica apresentou o
distanciamento próprio da relação estar-ao-lado. O desenho, inclusive, retira-se do que
pensamos que o desafio obrigaria. Isto é, o estar-com. Pois, se a condição da divisão de
turnos pretendia impor o comportamento característico de estar-com que é o vínculo na
participação de dependência mútua, ela não aconteceu. E, se estávamos esperando
encontrar a manifestação estética do estar-com ao ser-para, presenciamos - esteticamente -
o estar-ao-lado.

O que nos trouxe a dúvida, a ser testada numa próxima aplicação, se isto se deve a
condição própria da materialidade. Já que a dobra do saco pode ter sugerido uma fronteira e
colaborou para esse posicionamento na realização da imagem.

É preciso observar também que há influência do triângulo para a escolha da casa


para cumprir o desafio. Pois, apesar de não utilizar nenhum dos traços executados no
primeiro turno para realização da forma geométrica, a casa foi elaborada a partir do triângulo
que compõe o desenho do telhado. O que, para além da cor, faz com que a composição
tenha um diálogo possível entre as formas. Por mais que este tenha a demonstração gráfica
de separação entre os elementos - distância citada em Triângulo – Fronteira – Casa
(FIGURA 41).

Já, a imagem de vermelho abaixo, Le Mystère Pizza (FIGURA 19), mantém o mesmo
diálogo com os conceitos de estar-ao-lado e estar-com. Apenas com uma pequena variação.
Quando no primeiro turno do desafio, a imagem do círculo é colocada no centro da folha.
Vê-se nisso uma atitude gráfica de diálogo com a linha divisória do plástico. Diferente do
desenho anteriormente analisado, o aluno desse primeiro turno faz a sua imagem maior
conceitualmente que o conceito da linha/divisão. Ou seja, não será esta linha (própria do
material que é a dobra do saco plástico) o guia para realização do desenho. Este, será
conduzido pela autoria imposta pelo elemento recém pintado.

Entretanto, após esse primeiro enfrentamento contrário à fronteira da ruga plástica,


no segundo turno a outra manifestação também desregula e reconduz o desenvolvimento do
desenho. A conexão escolhida para realização da “fatia de pizza” não foi nenhum dos traços
do círculo, mas a transformação de seu significado conceitual. Ou seja, o círculo continua
compondo a configuração da imagem, mas sem uma alteração em sua forma, ele já não é
mais uma forma geométrica. E sim o restante da pizza, uma tábua, um prato...

Ainda não temos a dependência mútua que é propriedade do estar-com, mas não
podemos situar essa manifestação numa relação de estar-ao-lado. Pois o vínculo existe, só
não é completo, nem mútuo.

A fatia de pizza existe isenta do círculo. Logo, ela dá significado ao círculo e altera o
desenho como um todo, direcionando-o. Na mesma medida e inversamente proporcional,
ela não permite que o círculo faça o mesmo com ela. A fatia interage de forma egoísta e
independente. É elemento que não constrói significado, mas o traz pronto e o impõe como
se o anterior nada tivesse a lhe oferecer. Desse ponto de vista, o comportamento estético
pode ser comparado a uma prática bancária pedagógica (FREIRE. 1996). Criticada
exatamente pelo professor-fatia se comportar dessa maneira quando com o aluno-círculo.

Essa relação, como já referida, não nos parece poder ser alocarmos no estar-ao-
lado, como a anterior. Pois, diferente, existe uma interação mútua - apesar de não ser
dialógica. Entendemos estar diante do movimento estar-ao-lado/estar-com.

Outra possibilidade de análise que se mostrou fértil está guardada na característica


transparente do material. Ao fotografar os trabalhos também é possível visualizar (numa
diversidade de “segundos planos”) a corporeidade dos autores das outras obras enquanto
executam as mesmas.

Quando tratamos dos autores das obras em primeiro plano, observamos um


afastamento para não ter sua imagem exibida. Os autores exibem suas obras, mas se
escondem. Por sua vez, pouco se importam (ou não percebem) que outras pessoas irão
aparecer. Podemos observar uma imagem representativa no círculo. Onde a autora, para
não aparecer, esconde seus olhos. Atitude esta que se repetiu em inúmeras outras fotos
durante toda a pesquisa.

Não pretendemos aqui uma avaliação psicológica de aprofundamento em como a


ação de esconder os próprios olhos quer invisibilizar o ser na fotografia. Essa atitude
(diagnosticada corriqueira no raciocínio infantil, onde se acha eficaz tampar a própria visão
para se esconder por completo), ao que nos importa, se faz presente como uma evasiva do
ser-para.

A obra em vermelho foi realizada em uma ação descorporelizada (onde os autores


nem se levantaram da mesa), assim, ao ser fotografada, não tendo como se esquivar da
lente, optou-se por tampar os próprios olhos. Ora, se a característica principal do ser-para é
a troca de olhar, aqui o registro do corpo do autor ratifica nossa avaliação da obra de não
estarmos em ser-para.

De outro modo, no segundo plano da obra casa/triângulo registrada no mesmo foto


ensaio, podemos visualizar um compromisso expresso em corporeificação muito maior. Os
alunos estão em pé, se ajudam na realização dos trabalhos com apoio das mãos. Podemos
observar alguns alunos escorados em mesas, mas estes, por sua vez, não se encontram no
turno da elaboração estética. Em compensação, os alunos que estão em pé, se encontram
no momento de sua emersão de criatividade. Os corpos manifestam as suas entregas e
relações integradas (com a imagem e com seu par).

Abaixo (FIGURA 20), podemos observar nas fotos das obras finais desses alunos
que, diferente das anteriores, a integração com os elementos formais foi muito mais intensa.
Criando imagens que, apesar de difusas, demonstraram compromisso e confiança entre os
pares.
FIGURA 20 - Le Mystère Casa e Sol

Le Mystère Casa e Sol. Série estilo composto por duas fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)
Já Le Mystère Casa e Sol nos dá um vislumbre da manifestação que podemos
nomear como estar-com/ser-para. Observamos, esteticamente, que além da integração total
do triângulo para elaboração da casa, há um segundo gesto de relação manifesto no círculo.
Após ter desenhado a casa, quando agora se encontrava na vez de realizar a forma, a
escolha foi a de um círculo posicionado ao alto. A intenção que é o desejo do seu par
continuar o desenho planejado e elaborasse um sol comporta uma das qualidades do ser-
para: confiança. Esta é correspondida.

A ação do autor do círculo não pode ser enquadrada plenamente no ser-para, pois
como autor da casa e modificador do triângulo, ele passou a ser o condutor do desenho. Já,
a ação de correspondência na confecção do sol é uma resposta positiva de aceite e de
entrega. O que nos sugere que estávamos, nessa segunda rodada, a caminho de sair da
integração estar-com e talvez irmos ao ser-para. Mas infelizmente esse anseio não pode ser
apurado. O tempo de aula foi interrompido. O trabalho se encerrou no segundo turno da
segunda rodada. Ficamos sem uma possível resposta estética se a dialógica de
compromisso aconteceria.

Avaliamos, desse modo, que OAIA1 pode proporcionar as manifestações estar-


com/ser-para, mas é preciso uma dedicação de tempo que nem sempre se tem dentro de
uma grade escolar fragmentada. Os alunos, a aula, o professor e a pesquisa sofreram juntos
quando a necessidade de encerrar abruptamente as manifestações estéticas se deu com o
toque do sinal.
FIGURA 21 - Recordações da Casa Amarela

Recordações da Casa Amarela. Série Fragmento composto por uma fotografia digital. Fonte: o autor
(2018)

Em mais uma análise dos trabalhos nessa primeira inserção do Produto Educacional,
mostraremos um trabalho ímpar as demais relatadas.
FIGURA 22 - Como eu vou desenhar deus de um quadrado?

Como eu vou desenhar deus de um quadrado?. Foto ensaio composto por duas fotografias digitais.
Fonte: o autor (2018)
Ao se ver diante do quadrado desenhado pela sua dupla no primeiro turno e
ponderando sobre a resposta que daria ao desafio de “algo que você não possa viver sem”,
a aluna fez essa pergunta retórica.

Nesse desenho temos a manifestação estética de uma integração completa do


desenho feito no primeiro turno. De modo que ele teve tamanho aprofundamento que se
tornou o desenho de uma pessoa só. Não existindo outra rodada, não por descaso, ou pela
tarefa já ter sido cumprida, mas pelo desenho não ter sido encerrado. Nessa atitude de
entrega e mergulho estético ao desenho podemos observar o estar-com. Pois o objetivo e o
objeto ainda eram de interesse principal e, pela falta de uma segunda rodada, não podemos
apurar se o inverso aconteceria.

Entretanto, do ponto de vista do aluno que fez o quadrado, no primeiro turno, não foi
demonstrado repúdio e reclamação diante disso. Ao contrário, se teve certa acomodação
em não precisar elaborar nenhum trabalho de criatividade e imaginação enquanto sua dupla
o fazia. Se permitiu que a entrega da aluna na segunda rodada acontecesse dessa forma
numa acomodação de interesses mútuos, ou como estamos chamando nessa pesquisa,
num estar-com: ”ela gosta de desenhar e eu só preciso segurar” somado “eu posso
desenhar à vontade porque ela só vai querer segurar”

Dentro desse aprofundamento no desenho de deus, podemos observar também a


realização de uma personagem com características da própria autora. Notamos,
principalmente na construção dos cabelos, uma semelhança imagética. O que abriu para
discussões mais complexas dentro das outras aulas. Reflexões sobre as representações
divinas e até sobre os dedos sujos de tinta que não se tocavam.

É notado, através desses exemplos, que para uma investigação acerca das
possibilidades de manifestação do estar-com/ser-para dentro dessa atividade, se faz
necessário maior tempo de imersão, para a execução de, ao menos, duas rodadas. Nessa
circunstância, com a fotografia sequencial dos trabalhos somada a documentação
pedagógica, seria mais possível fazer ponderações mais abrangentes.

Por último, ao finalizando a análise do produto nessa primeira aula e realizando


ponderações de melhoras para a realização de próximas atividades, ao visualizar todos os
trabalhos executados um conceito nos chamou atenção. Apresentamos ele na próxima
imagem:
FIGURA 23 - Bem-estar inconsciente
Bem-estar inconsciente. Série Fragmento composta por quatro fotografias digitais. Fonte: o autor
(2018)

Quando observamos que os alunos, no geral, desenharam a alimentação


(representado na comida), o lar (representado nas casas), o lazer (representada na criança
e a pipa) e ainda acrescentaram a espiritualidade como resposta, concluímos que a turma
está refletindo em consonância com a teoria de Bauman.

Quando o autor evoca a definição de “bem-estar social” (BAUMAN. 2005) nos é


explicado que ele emerge a partir do momento em que todas as necessidades humanas são
supridas. De modo que o consumismo só passa a existir quando o ato de consumir excede
tais necessidades. Nessa circunstância é preciso concluir que as manifestações estéticas,
quando desafiados a responder sobre “algo que não podem viver sem”, abordaram o
consumo/sobrevivência e não o consumismo/além da necessidade.

AULA 2

Para a segunda entrada em campo, após análise, consideramos algumas alterações


na atividade e na abordagem. Para nos aprofundarmos mais nos problemas da pesquisa,
tentamos eliminar problemas que aconteceram e só puderam ser diagnosticados em campo.

Quanto a abordagem, (1) o problema da ruga no plástico foi resolvido com a troca do
material. Passando a ser utilizadas as mesmas sacolas próprias de frutas e legumes, mas
dessa vez sem amassados; (2) A entrada do pesquisador para o trabalho aconteceu em
uma aula em que a grade permitisse mais tempo de dedicação (para ser preciso, essa
segunda entrada foi realizada com o dobro do tempo da primeira. Pois foi arranjado que os
dois tempos não consecutivos de artes, 50 minutos cada, se organizassem juntos); (3) Os
dois turnos terão trabalhos de criatividade, mesmo o primeiro. Assim, pretendemos evitar
ações de acomodação com o trabalho da dupla; (4) seria disponibilizado para as duplas uma
maior quantidade de cores espalhadas em diversos pontos pela sala, desse modo se
esperava tanto incentivar a criatividade quanto a movimentação pelo espaço na busca de
outras cores; (5) por fim, uma aluna foi instruída a também fotografar os trabalhos em
desenvolvimento na tentativa de capturar mais etapas.

Para essa atividade, a entrada em campo e a explicação de como a tarefa deveria


ser executada foi mais rápida. O desafio agora proposto foi que os alunos elaborassem em
desenhar “algo que desejassem” no primeiro turno. Enquanto no segundo turno o aluno
seria responsável por realizar alguma alteração no desenho realizado pela sua dupla. Na
segunda rodada aconteceria a inversão dos turnos. A ação seria cíclica até o suporte ser
preenchido.

FIGURA 24 - Le Mystère traço de sentimento

Le Mystère traço de sentimento. Série estilo composta por duas fotografias digitais. Fonte: o autor
(2018)
FIGURA 25 - Duplas e Complementos

Duplas e Complementos. Série fragmento composto por uma fotografia digital. Fonte: o autor (2018)

Durante a análise dos dados sobre a aula, a série fragmento Le Mystère traço de
sentimento (FIGURA 24) foi primeira imagem realizada. Ela investiga as manifestações
estéticas e a corporeidade que, supomos, estar intrínseca ao desenvolvimento do desafio.
De modo que a nossa investigação para encontrar a possibilidade de estar-com/estar-para,
nesse trabalho, nos pareceu não ser alcançada.
Mais uma vez, observamos como, mesmo a propósito de criar uma circunstância do
estar-com, a partir do vínculo com os braços e a interação de dependência mútua (tanto no
suporte quanto na confecção do desenho), é plenamente possível agir com insensibilidade e
transformar a situação em estar-ao-lado.

Nossa primeira análise do Le Mystère traço de sentimento (FIGURA 24), e por


conseguinte Duplas e Complementos (FIGURA 25), aborda a falta de criatividade e
imaginação exposta na composição do trabalho diante das ações de cada turno. As ações
do segundo turno foram modificadas, elas passaram a não realizar alterações no desenho
da dupla. Arbitrariamente os turnos passaram a ser: o primeiro “algo que eu desejo”,
enquanto o segundo “algo que eu desejo”. De modo a todos os itens, mesmo sem a ruga
plástica da aula anterior, se posicionarem no respeito de seus espaços. Ou seja, ao lado.

Existiram duas pequenas variações nesse comportamento dos turnos. De modo que
a manifestação estética se apresentou como uma pequena variação do estar-ao-lado para o
estar-com.

É preciso primeiro tomar nota da ordem sequencial das obras. Sendo realizadas na
primeira dupla a ordem: (em verde) celular, celular, (em azul) nuvem, nuvem e, finalmente
(em vermelho) coração. Aqui se fez um caminho do concreto e racional até o abstrato
emocional, de modo que a transição esteve num elemento simbólico. Em outras palavras, o
racional foi exposto pelo item - celular - em dobro, o pensamento simbólico de refrescar
representado em dobro na sombra/nuvem (estava um dia de calor, de fato), e o abstrato
emocional no coração.

Ora, é justamente quando aparece a representação de um ente-emoção que a cópia


gráfica do que o turno anterior tinha realizado não acontece. Os elementos do desenho
deixam de estar em par e se tornam ímpar e, apesar disso, não desequilibram. Ao contrário,
este componente emocional que emergiu é dinâmico, fugaz e ambíguo. Essas
características se fazem na configuração da obra quando o movimentar está no dar e
receber completude, cumplicidade e centralidade a si próprio e aos demais entes ali
presentes. Temos na ação da aluna que desenha metade do coração em seu turno e, por
sua vez, na outra que o completa - inesperadamente - um vínculo. Elas estão de acordo em
se completarem na representação ilustrativa do desejo de uma emoção, pois este só é
possível existir no conjunto de qualidades do ser-para.

De alguma forma, ao evocar o desejo por emoção de forma estética, fica claro para a
dupla que esta necessidade é mútua, dialógica e cooperativa.
FIGURA 26 - descorporelizadas

descorporelizadas. Foto ensaio composto por cinco fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)
Se tratando do descorporelizadas (FIGURA 26) acima, a análise foi feita no processo
de descorporeificação que foi diagnosticado. As personagens aqui representadas
apresentaram a performance do trabalho sem um corpo interessado. É possível perceber a
quebra do vínculo dos braços e a utilização da mesa como suporte/apoio. Bem como a
desatenção dada ao processo de autoria da própria dupla em alguns turnos. Enquanto uma
elabora de forma gráfica um de seus desejos, a outra manipula seu smartphone enquanto
aguarda sua vez. Não existindo vínculo e/ou troca de olhar, a relação dos corpos estão
plenamente em estar-ao-lado. Ademais, quando relacionamos com o Recordações da Casa
Amarela (FIGURA 44), começamos a perceber a resposta estética em uma sintonia
dialógica com a resposta da corporeificação.

Isto é, começou a ficar mais claro para nós que o processo de entrega performático -
a corporeificação do desafio estético - está conectado à resposta gráfica da manifestação de
integração no desenho. Seja no estar-ao-lado, estar-com ou ser-para (bem como seus
respectivos movimentos de um para a outro), o corpo age vinculado ao que está sendo
esboçado. Nesse sentido, nos parece que o suporte é o responsável por essa ação e que
realizar a tarefa na sala pode ser um fator que gera a acomodação dos corpos. Se não gera,
ao menos, em alguma medida, inibe essa corporeificação.
FIGURA 27 - Cor tátil

Cor tátil. Série Fragmento composta por duas fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)

O processo da corporeificação, entretanto, parece ter sido – literalmente - tocado a


partir do borrão presente na parte superior da transparência (vide FIGURA 27). Sem querer,
enquanto alterava as cores das tintas com suas mãos, uma das alunas manchou a ponta de
um dos suportes (na mistura de cores surge um azul violetado). Notando a alteração
cromática, a mesma começou a lambuzar suas mãos com a tinta, ao passo em que sua
ação foi também estímulo para outras alunas (pertencentes ao mesmo grupo) também
repetirem o gesto.

Aqui, mais uma vez, não vamos fazer uma análise psicológica do gesto
(característico, novamente, da infância), nos deteremos na circunstância da ação
performática da experiência corporeificada do saber estético sobre a cor. A expressão de
repetição do gesto de manchar as mãos pelas alunas, aqui, por ser contida aquelas duas
duplas, nos suscitou o pertencimento de Bauman.

Esta é uma qualidade própria da identidade nacional que é o pertencimento a uma


localidade, um vínculo pela natalidade. Hoje, com as fronteiras dissolvidas, isto se torna
mais volátil. Entretanto, na necessidade de pertencer se vê que as relações se adaptaram
em circunstâncias episódicas. Ela é a reunião de indivíduos que, ao formarem uma massa
de interesse/ideia comum, também apagam a sua individualidade e passam a ser um.

Ela é “o alívio da carga da individualidade” (BAUMAN, 2011, p. 71) que ao ser


dividida com todos também isenta todos de quaisquer consequências e responsabilidades.
Segundo o autor, o local de construção de identidade (locais de rotina, tarefas cotidianas e
fadiga, tais como a escola) é o solo para nascer a integração-manifesta.

Essa integração-manifesta realizada pelo gesto de pintar as mãos na formalização


de um grupo de experiência nos faz entender que, apesar de estarmos ainda em estar-ao-
lado/estar-com, a escola se mostra para esses alunos como local de construção de
identidade. Percebemos o problema de não ser verificado o movimento de integração que
estávamos buscando encontrar, entretanto há alívio em certificar-se que a escola ainda é
local para construção da identidade.
FIGURA 28 - Le Mystère Encontros Episódicos
Le Mystère Encontros Episódicos. Série estilo composta por três fotografias digitalizadas. Fonte: o
autor (2018)
Em Le Mystère Encontros Episódicos (FIGURA 28) que contém uma sequência de
etapas do trabalho realizado por uma das duplas, observamos uma composição confusa. As
imagens não parecem conversar entre si na formatação de um único desenho, mas se faz
uma tela que é composta por uma diversidade de cenas. Tais grafismos (difusos, espaçados
e fragmentados) interagem uns com os outros em uma demonstração de relação líquida.

Podemos observar na primeira imagem da sequência (respectiva ao primeiro turno)


que existiu um diálogo e uma correspondência. Vemos uma composição sólida, a de um
garoto no skate e o desenho de um sol (sendo realizadas no primeiro e no segundo turno,
respectivamente). Ela demonstra que existiu um diálogo entre os pares e um movimento de
cumplicidade e confiança nessa primeira rodada.

Seguindo para a segunda rodada e, logo, para a imagem concernente a ela,


podemos verificar a primeira ação de quebra na relação. O desenho realizado no primeiro
turno foi a de um casal de namorados, onde a representação do homem carrega em uma
das mãos um bouquet de flores e a mulher tem a seus pés um coração. É preciso notar que
o desenho dessa imagem estabelece um distanciamento por completo da primeira e começa
a contribuir para a composição se tornar difusa.

A priori, não há relação nenhuma entre o desenho da primeira rodada com o que
acabou de ser realizado. As imagens, literalmente, pertencem ao estar-ao-lado quando se
fazem presentes na condição do local, mas no contrato silencioso não se atrapalham, nem
cooperam entre si. Tão pouco se afetando ou tocando, elas se mantem em distanciamento
seguro através do vazio transparente entre elas.

O vazio é completamente diferente do vazio rizomático em “A Traição da Imagem”


entre os elementos de Magritte. Este não permite uma troca e uma ligação entre as
imagens. O vazio no trabalho dos alunos é o afastamento, a quebra de conexão com o outro
e a segurança do bem-estar garantida pelo espaço do individualismo.

O elemento da emoção é evocado como um desejo por uma das partes, mas já
sendo apresentado completo. Ainda na segunda rodada, o segundo turno toma uma ação
de quebra. A alteração proposta é o traço que refaz o significado do coração de paixão à
decepção amorosa.

Essa atitude é o estopim de uma profusão de imagens de desejos destruídos e


alheios uns aos outros. Elas são individualistas e só é possível estabelecer interpretação
pontual em cada uma, rodada por rodada. A única interpretação possível do todo é a
fragmentação de suas relações, a liquidez na relação entre elas e a impossibilidade de uni-
las em um conjunto uniforme. Basicamente, um resumo da pós-modernidade.

Entretanto, apesar das decepções que ocupam a maior parte da imagem, temos um
vislumbre de uma boa relação ao final. Após a sequência de rodadas, onde foram feitos os
seguintes desenhos: 3) cesta de basquete, meteoro destruindo; 4) prato de macarrão, mofo;
5) prancha de surf, prancha quebrada; no limiar de término da tarefa (pelo tempo) e com
pouco espaço para realização de outras manifestações, na sexta rodada o primeiro turno faz
o desenho de um homem posando como forte. Ao que o segundo turno, aquele que tinha
sido responsável pela destruição do coração, dá ao traçado mais corpo (uma representação
de massa muscular) e coloca um halter sendo levantado.

Quando agora, no limite de espaço da folha (já que o suporte traz dificuldade na
realização da tarefa por muito tempo e em traçar na parte inferior da folha) na sétima rodada
o primeiro turno desenha um hamburger e o segundo fritas e refrigerante.

Há dois aspectos de conexão nesses dois últimos turnos de trabalho que tocam a
teoria abordada. O primeiro deles é sobre o ser que deixou de ser produtivo e passou a ser
consumidor. No que tange ao novo ser, na pós-modernidade, ele também é consumidor do
corpo. Vemos o aluno demonstrando o desejo em ter o corpo apto, forte e considerado
padrão de beleza. Tal ação é endossada no segundo turno quando a alteração não só
compactua com o desejo, mas o intensifica (dando músculos e peso). A série de
interferências negativas é interrompida justamente quando aquilo que você deseja pertence
a esfera do que é consideravelmente aceito na pós-modernidade.

Essa reflexão pode ser mais aprofundada quando separamos os episódios e vemos
que toda a destruição dos desejos do outro começou na evocação de um anseio emocional.
Ao coração, simbolizando no desenho uma relação estável, de vínculos de confiança e
responsabilidade mútuas (o ser-para), é dado o corte que gera todas as outras ações de
interferência. Assim, a relação entre as imagens passa de estar-com a estar-ao-lado, bem
como a relação entre os turnos.

A negação da emoção que gera conflitos só foi estabilizada quando aparece um


elemento desejado pela sociedade de consumo (o corpo apto) e ele é assentido. Tal
manifestação estética ainda tem uma resposta conflituosa e paradoxal ao desejo por saúde
na rodada seguinte. Nela é desenhado um hambúrguer que, por sua vez, é alterado,
também em complementação e endossamento, em um lanche de fast food completo.

Assim como consideramos o coração o símbolo para emoção, aqui o hambúrguer


ganha a conotação de um símbolo possível para a sociedade de consumo - representada
pela comida rápida. Observemos que na quarta rodada, por exemplo, o prato de macarrão
(que nutritivamente é uma ingestão mais salutar e saudável) foi recusado com mofo,
enquanto a gordura e o açúcar do lanche são aceitos.

Também devemos considerar que existe a inversão de pessoas propiciadas pela


troca de rodada. Isso significa que as imagens, mesmo guardando um significado de relação
episódica e individual no espaço entre elas, demonstram um movimento nas escolhas.
Atitudes que estão em equilibrio e desequilibrio, concordância e discordância no diálogo
estético a cada ação ilustrativa do outro.

Isso nos chama atenção para o fluxo de movimento de escolhas em cada rodada
que hora é cooperativa, hora é destrutiva. E, inegavelmente, elas, de um movimento ao
outro, por mais que pareçam independentes e difusas na forma, geram consequências
diretas ao seguinte.

De modo que ao produzir uma alteração cooperativa no desenho do aluno 1 quando


fez uma pessoa acima do skate e o sol, na rodada seguinte a cooperação não aconteceu. O
gesto da demonstração de desejo (a imagem da namorada), permeado de sensibilidade,
conta com a cumplicidade do outro ao confia-lo para alterações. Entretanto, a resposta é
sádica: o coração rompido.

A partir da ação não cooperativa desse turno, as rodadas seguintes também


acompanharam essa lógica. A mesma só sucumbiu na rodada do homem forte. Nela, mais
uma vez o aluno (o mesmo da namorada) confiou o seu desejo a alteração do outro, mas
dessa vez foi correspondido. Iniciando, dessa forma, na rodada seguinte, um novo ciclo
cooperativo.

Mais uma vez o tempo da aula e o limite da folha não nos permitem avaliar se esse
ciclo se repetiria. Entretanto, como uma pesquisa de artes, intuitivamente, vemos uma pista
de solucionar (ou amenizar) as angústias e medos pós-modernos: possibilitar a cooperação.
FIGURA 29 - Le Mystère Brincar de Pipa
Le Mystère Brincar de Pipa. Série estilo composta por quatro fotografias digitais. Fonte: o autor
(2018)

Em nossa última análise separamos Le Mystère Brincar de Pipa (FIGURA 29) que
conta a sequência de realização desses quadros, bem como a atitude inédita - até aquele
momento - de se preocupar em guarda-lo. A principal característica que nos chama atenção
em análise é a unicidade na composição.

Essa composição não tem uma diversidade de elementos em uma relação episódica
e fragmentada uns com os outros, tampouco tem poucos elementos. Esses que habitam e
configuram a obra foram pensados e realizados em turnos, lados e por pessoas diferentes.
Mas, apesar disso, comunicam desejo claro e complexo: brincar de pipa em um lugar
bucólico, perto de casa e num dia ensolarado.

Os dois autores da imagem elaboraram tudo que viria a ser o cenário final em cima
da convergência de um mesmo desejo/consumo. Tal objetivo se torna ainda mais elaborado
quando entendemos que os mesmos não se colocaram no quadro. Optaram por um ente
ontológico que, sem uma identidade definida, pudesse representar os dois (ou qualquer um
que tivesse tal anseio). O desenho da pessoa não tem características restritivas, mas é
volátil e aberto na sua simplicidade.

Tal qualidade, é preciso observar, não pertence somente ao personagem. Ela faz
parte de toda a obra e se fez presente desde o início. Ao investigarmos a primeira
composição é possível perceber que logo no primeiro turno todo o suporte foi utilizado
graficamente. Em cima, em baixo, no centro, nos lados. O primeiro aluno já marcou o
domínio de sua manifestação estética organizando e objetivando o caminho que o trabalho
seguiria. Mas ele não o fez num formato de caráter fechado e restrito.

Há espaços vazios, tal como em todas as obras aqui analisadas. Ainda não é o
espaço de movimento rizomático de magritte, já que a permissão do movimento do nosso
olhar, aqui, não remonta nada externo/interno a obra. Nossos olhos passeiam entre os
espaços na simples função de capturar e entender a gestalt. Tão pouco eles falam sobre o
movimento da autoria em Velásquez, pois não há assinatura/estilo, nem uma característica
fundamental de individualidade. Muito menos, o da segurança pós-moderna. Pois o vázio
não está ali como ente de afastamento, que pretende a criação de uma limitação invisível e
impenetrável a outro elemento. O espaço da transparência não é demarcação individualista
e inibitória.

Ao se apropriar da forma e utilizar a amplitude do suporte, na mesma medida em que


todos os espaços são preenchidos, os vazios são convidativos. A árvore estabelece o que é
o chão, mas não o desenha. Uma bola azul lá em cima estabelece o céu, mas não
completa. Por sua vez, a pipa e a personagem estabelecem o vento, o movimento e o
sentido. Esses últimos elementos terminam por preencher o todo, sem terem ocupado
quase espaço nenhum.

Ao concordar com o mesmo desejo, tendo o mesmo objetivo, não há dúvidas no


segundo turno de que a sua função ali é a de melhorar e intensificar o que já foi feito. A
alteração que lhe cabe é conduzida pela resposta no dever ético em seu sentido pleno.
Aquele o qual Bauman explica que o seu cumprimento não é dado pelo medo da punição,
mas em cima de um entendimento de bem maior e vida em sociedade.

A tarefa precisa ser realizada, a alteração é um dever. Tendo consciência disso o


aluno opta por aceitar o convite dos espaços vazios e contribuir para melhorar a imagem
final. Cabe ressaltar que nos parece que os dois autores envolvidos concordaram com o
desejo e isso é um facilitador no exercício do dever ético ideal. Entretanto, isso não
desqualifica o que foi feito.
É possível observar que a cooperação que surge tem a emergência de cores e é
sobrecarregada de significado em sua ação. Quando o aluno do segundo turno não
pretende fazer a sua parte na mesma cor, pela vontade de dinamizar a obra através do
cromatismo, ele também assina a obra e se coloca como co-autor dela. Ele cria mais um
espaço, estabelece o que pertence a ele e o que é do outro. Ao mesmo tempo também
passa a pertencer ao outro e o outro passa a pertencer a ele. O desenho da grama começa
na obra o espaço/movimento, o único/duplo, meu/seu e o eu/outro. Estamos em contato
com o vínculo e a reciprocidade, uma responsabilidade mútua com a composição da
imagem que não perde sua identidade e autonomia. Estamos em ser-para.

O movimento significativo em ser-para continua na alternância cromática e é


semelhante no que tange aos raios de sol e às maçãs na árvore. Entretanto, ele é diferente
no que aborda o elemento da casa. Ela abre mais um espaço dentro da obra: a
profundidade.

Ao desenhar (tudo isso no segundo turno) o aluno preenche um espaço que estava
em desequilíbrio em um dos lados. Sendo a personagem com a pipa um elemento central,
somente em um dos seus lados nós tivemos a inserção de outros entes por parte do aluno
responsável pelo primeiro turno. De modo que o sol e a árvore ocupavam de cima a baixo
todo o lado esquerdo/direito da obra, a nuvem e a pipa fechavam a imagem da tela criando
um circuito quadrado (com as arestas dessa forma geométrica posicionadas mais ou menos
no sol, na raíz da árvore, no fim da rabiola da pipa até a nuvem).

O desenho da grama já tinha ampliado o espaço dessa configuração, entretanto a


casa amplia ainda mais. Pois o cálculo de equilíbrio dela é dinamicamente preciso,
complexo e autoral. Vejamos: (a) A casa dialoga cromaticamente, tendo a mesma cor que
as maçãs, com o outro lado da obra; (b) ao se posicionar no centro direito/esquerdo, ela faz
conexão com o chão e com o céu; ( c ) ela amplia o movimento do vento na pipa quando o
seu traço do telhado é uma continuidade do traço da rabiola; (d) o seu posicionamento
central não está ao lado (está-ao-lado) da pipa, ela não rouba espaço desse elemento. Ao
contrário, ao optar por ser desenhada nessa proporção - criando profundidade - ela amplia o
espaço entre os elementos, dando, inclusive, mais espaço para a própria pipa; (e) ela
reconfigura a obra quando amplia a imagem, deixando de ser uma configuração quadrada e
passando a ser triangular e aberta. Deixa de ter base e teto e passa a dar abertura para
obra a fazendo apontar para o céu, o espaço infinito.

Ressaltando o ponto “e”, devemos perceber que o sol se inscreve numa distância de
infinitude com o chão, por ser elemento flutuante (celeste). Apesar de abrir o espaço infinito,
ele era elemento de uma configuração cíclica quadrada, vertical/horizontal. A casa, por sua
vez, abre essa configuração não só em seu posicionamento e peso, mas por (f) ser o maior
de todos os elementos (imageticamente: no peso, na cor quente, na ocupação do espaço),
ela não se inscreve em seu tamanho total. Ela brinca com a lógica racional.

Nós sabemos que a pipa, a personagem, as maçãs e até a árvore cabem na casa. E
mesmo assim ela é diminuta. Sua “maioridade” não pretende ocupar mais que o necessário,
nem se vale disso. Mais uma vez ela quer ocupar o lugar dela, sem brigar com o elemento
central. Ela, por poder o ser, escolhe equilíbrio ao invés de imposição quando opta por fazer
parte e ser independente sem ser mais do que o que já estava ali.

Ao dar profundidade a obra, acrescenta ao movimento cima/baixo e esquerda/direita


(chapado) a possibilidade de ser também perto/longe. Se adotarmos uma linguagem
matemática, nós tínhamos os eixos cartesianos “x” e “y”, a casa acrescenta o “z”. E, por ser
transparência, transforma o que está na frente e é profundidade, em seu verso no que é
raso. Ao mesmo tempo em que o aluno desenha a casa e a joga na direção do aluno que
segura a obra, para o aluno que segura (da sua perspectiva) a casa está chamando atenção
para quem a desenha, por se afastar dele. É uma espécie de movimento que ao empurrar,
ela também aproxima. Age para no lugar.

Enfim, ela é tudo ao mesmo tempo:

frente/verso/raso/profundo/grande/pequena/longe/perto/movimento/estático/aberta/f
echada… e é também só uma casa naif: singela/complexa

Por fim, o espaço vazio é adotado como pertencente e pertinente a obra. Não há
segunda rodada, a confecção da obra acabou. A pintura está tão completa e segura que
nenhum dos dois autores está sensibilizado à dúvida de que falta algo. Não falta. O vazio
faz tanta parte da obra quanto qualquer um dos outros elementos. Diferente da angústia da
pós modernidade, não se opta em preencher o vazio ocupando espaços com qualquer
coisa. O vazio também tem o seu valor e este é dado a ele.

A partir da decisão de término os alunos ainda encontram um problema impensado:


como guardar a obra?

A completude da realização da obra é tão grande que amplia também a abrangência


do Objeto de Arte em uma dúvida de outra ordem. Agora que o desejo dos alunos é de
guarda-la, como o fazer se os dois lados estão pintados?

FIGURA 30 - Varal
Varal. Série fragmentos composta por duas fotografias digitais. Fonte: o autor (2018)
A solução foi pendurar a obra como num varal. O trabalho é significativo para os dois
em tal escala que a referência deles é mola motriz para que outros alunos também desejem
pendurar suas respectivas obras. Eles também querem fazer parte daquilo, eles têm essa
possibilidade e interagem com o desejo dos primeiros autores.

Afinal, nos resta algumas dúvidas. Dentre elas: se todo esse movimento inspiratório
e dinâmico teve embrião na convergência do desejo (de soltar pipa) entre os alunos, estaria
o movimento estar-com/ser-para sendo possível na união cooperativa entre o desejo de dois
entes? É possível dirigir os desejos/consumo em um bem-estar social e não em egoísmo
individualista? Estaria no aprendizado da cooperação a possível chave para as angústias do
mundo líquido?

Não há pretensão alguma de responder essas questões. Ao que tange essa


pesquisa, o Produto Educacional parece apto trazer à tona em manifestações estéticas a
identidade, autoria e as relações de integração que parecem afogadas na pós-modernidade.
De longe não é uma resposta. Foi só um mergulho nesse mundo líquido que nos mostrou
que ainda podemos vir até a superfície e respirar.
6 CONCLUSÃO

Após toda a pesquisa em campo, a análise dos dados e avaliação do produto, esse
último capítulo da dissertação pretende indicar como conclusões os possíveis novos
caminhos de pesquisa. Estes puderam ser realizados por nós através de questionamentos
que surgiram durante o processo, bem como pelos leitores dela.

Primeiro é preciso ressaltar que os capítulos de Análise de Dados e a Avaliação do


Produto nos pareceram ser suficientes aos objetivos da pesquisa e para um trabalho de
mestrado. Mas, de maneira alguma, conseguimos nos aprofundar em todas as
possibilidades reflexivas possíveis que os instrumentos de foto ensaios podem nos
proporcionar.

Este demonstrou ser uma ferramenta com uma característica própria, pois, ao
trabalhar esteticamente os dados, permitiu que a pesquisa se intensificasse e criaram-se
novas ramificações temáticas. De maneira que foi necessário, após uma diversidade de
realizações e projetos de possíveis foto ensaios como dado, selecionar os que se tornaram
mais representativos ao tema central. Pois o tempo de trabalho para realização da pesquisa
exigiu do artista-pesquisador-educador a cruel tarefa de seleção.

Ademais, percebe-se que a seleção de foto ensaios nessa pesquisa também se


valeu intuitivamente de traçar um caminho de influência nas aulas posteriores e trouxeram
benefícios na avaliação das partes envolvidas que não só no tema. A análise de dados a
cada fim de atividade em campo, por exemplo, influenciou diretamente a próxima aula, o
professor, o aluno e a sua inserção na escola. Ou seja, a criação dessas obras (foto
ensaios) como instrumento de análise, sendo realizada entre o período de tempo que foi o
término de uma aula e o início da outra, resultou em alterar diretamente a forma como a aula
seguinte se realizaria.

Isso demonstra a viabilidade desse método em ser utilizado como um instrumento de


avaliação pelo profissional professor (que não só de artes) durante suas aulas. A
possibilidade técnica da fotografia de registrar muito além do que notamos inicialmente,
somada a uma investigação estética aberta às possibilidades intuitivas inerentes a qualquer
pesquisa, apresentou-se eficaz e útil a preparação de aulas. O que já configura por si só
uma análise interligada diretamente ao planejamento do professor.
Há também de se expor que, no seu decorrer, foi possível perceber a facilidade em
realizar análise de dados com interlocução entre as aulas. O que criaria um diálogo
imagético e conceitual entre as aulas e possibilitaria - talvez - outra avaliação do tema.
Apesar de possível, não se optou por esse caminho, mais uma vez, pela demanda de tempo
para a pesquisa e pelas dificuldades tocantes à profissão docente.

As aulas que vieram a posteriori das aqui analisadas seguiram com o modelo do
produto educacional OAIA1 com outras dinâmicas de criação e possibilidades de trabalho
cooperativo (em trios e grupos com 4 a 5 alunos). Assim como na primeira aula a dobra do
plástico – vista como uma interferência - nos levou a modificações para pensar uma
segunda aula, nas aulas seguintes dois pontos foram modificados: observação de modelo
vivo e espaços da escola fora da sala de aula. Isso se mostrou eficaz na aprendizagem de
objetos de estudo específicos do ano letivo, bem como surgiram novos conflitos e outras
novas possibilidades.

Entretanto, pela demanda de trabalho em realizar uma análise de dados com foto
ensaio semanalmente, de uma aula para a outra a dedicação exclusiva a uma turma se
mostrou cansativa.

O que nos leva a falar sobre a valorização desse profissional. Já que o tempo
disponibilizado para trabalho extraclasse (correção de provas, planejamento de aulas e
pesquisa), legitimado pela Lei Federal nº 11738/200 e que é equivalente a no mínimo ⅓ de
sua jornada total de trabalho, não foi respeitado pela Secretaria Municipal de Educação na
época dessa pesquisa. Sendo assim, algumas escolhas aqui tomadas estiveram atreladas
diretamente com o fato dela acontecer além do período de trabalho. Inclusive o
encerramento da pesquisa com análise de duas aulas.

A pesquisa, em si, também acabou por fazer parte de um exercício de criação da


própria profissão quando se “reinventou” o tempo da jornada de trabalho para assegurar a
investigação do tema. Exercício que não é incomum, pois, na impossibilidade de realização
de trabalhos extraclasse dentro da jornada de trabalho, professores já vivem a liquidez
profissional pós-moderna. Aderem essa ação ao assumirem essas tarefas no tempo em que
poderiam dedicar ao seu lazer, descanso e/ou outras tantas coisas. Coisas como família,
amigos e relações sociais do cotidiano são condenadas a estar-ao-lado para se cumprir a
produtividade científica de conhecimento ou, o que nos frustra ainda mais, apenas mão de
obra.

Assim, quase numa avaliação curricular, atendendo a todos os pré-requisitos,


percebemos que o trabalho docente desrespeitado é a vanguarda das profissões e das
angústias instaladas pela falta de tempo e ausência de integração social no mundo líquido.
Cabendo à futuras pesquisas responder se tal fato se dá pelo desrespeito, pelo contexto
histórico ou pelos dois.

Em cima dessa mesma premissa esta pesquisa, de maneira alguma, pretende


representar ou ser utilizada como justificativa de qualquer discurso que fomente a
possibilidade de outras ações como esta: construídas em cima de engajamento e busca
pessoal, compromisso com a educação e o conhecimento, apesar dos direitos profissionais
adquiridos estarem sendo desrespeitados pelo contratante. Ou seja, não queremos ser
exemplo motivador da viabilidade de se fazer pesquisa sem direitos respeitados.

Não se pretende ratificar o discurso do sucesso através do esforço individual. Pois,


por mais que apenas um autor assine esses escritos, eles não são fruto individualista. Essa
ilusão precisa se encerrar. É preciso tornar claro que em cada entrelinha, há o ser-para
invisível da dedicação de amigos, familiares, alunos e colegas de profissão.

Outro ponto pertinente a ser tocado é a nossa avaliação sobre a investigação do


tema. Examinamos que o caminho trilhado durante a revisão bibliográfica dele, que
inicialmente nos parecia ser a identidade na pós-modernidade, sofreu alterações. Pois no
decorrer da pesquisa percebemos que se atrelava com os novos modos de relações sociais
(consequências de um contexto histórico da escola, da disciplina de artes e de sua inevitável
inserção nos problemas do mundo líquido). Isto nos levou a formatação de um Produto
Educacional que de forma estética pareça tocar mais nas relações sociais, mas é preciso se
atentar que a sua abordagem e seus desafios não se encerram no tema proposto.

Esperamos que os professores/pesquisadores/artistas possam utilizar o OAIA1 como


exemplo e/ou modelo para as mais diversas atividades, alocados na abordagem que melhor
lhes convir. Podendo, desse modo, ser utilizado, inclusive, para futuras pesquisas que
aborde temas diversos que estejam entrelaçados com as relações sociais na pós-
modernidade, tão logo, a identidade.

No que confere ao tema de Identidade, percebemos a inevitabilidade de uma


investigação mais aprofundada do tema no âmbito prático da educação em futuras
pesquisas. Encontramos muito material acadêmico discutindo o assunto do comportamento
social na pós-modernidade de forma filosófica e sociológica e suas implicações na nova
forma de se construir/consumir identidades. Entretanto não há ainda formas de
aplicabilidade prática desses estudos no ensino - apesar de urgente.

Esperamos que futuras pesquisas possam utilizar os dados aqui levantados para
desdobramentos do tema. Pois os alunos que chegam todos os dias às escolas já nascem
na pós-modernidade, já se encontram enfrentando os problemas angustiantes da sociedade
contemporânea.

No que compete aos escritos utilizados para costurar e construir esta pesquisa,
Bauman se mostra um autor complexo e que ainda trará grandes contribuições a futuras
pesquisas ao tema. Esse texto tentou se aprofundar em algumas poucas obras do autor e
artigos de base para complementarem a investigação. Mas queremos ressaltar o valor
contributivo principalmente do capitulo dois do livro Vidas em Fragmentos e do livro
Identidade.

Enfim, sobre esse trabalho, entendemos que todas as atividades em dupla, trio ou
grupo possibilita aprendizagem nas questões aqui abordadas como temática – independente
da área de conhecimento. Por esse reconhecimento não vemos essa investigação
acadêmica como um movimento de ineditismo. A educação afetiva, a cooperatividade e a
necessidade de uma educação e ensino menos fragmentado já é discutido e trabalhado em
âmbito escolar há décadas. O diferencial aqui foi tentar alocar a relação/integração como
exigência intrínseca a ser (auto)avaliada para construção do saber, em nosso caso, estético.

Também não pretendemos combater a abordagem triangular ou retomar ao


escolanovismo. Sugerimos uma alternativa de soma, uma outra via que vem acrescentar ao
ensino e não negar o que já foi feito. Diante disso, à nossa tentativa, o método da
a/r/tografia (PEBA) e os instrumentos de coleta de dados (Foto Ensaios) foram
indissociáveis ao que aqui se fez como pesquisa de ensino em artes. Bem como a pesquisa
e a experiência estética do professor ao aluno, do aluno ao professor e dos alunos entre si,
nos pareceram ser elemento fundamental na constituição de oportunidades de construção e
caminhos para o profissional artista/educador.
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