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A mais ou menos 4 meses o Governo em razão da descoberta dos primeiros casos de COVID-
19 no país determinou o fechamento de todos os estabelecimentos de ensino no pais, sejam
eles públicos ou privados, como forma intempestiva de prevenção dos estudantes e corpo
docente e administrativo contra o vírus.
Os maiores factores que impulsionaram tal medida foram em grande parte o total
desconhecimento dada a novidade viral, e a veiculação e ampla difusão do “estudo do
Imperial College” de Londres, o qual fazia previsões catastróficas, quase que apocalípticas
sobre a disseminação do vírus e as taxas de mortalidade que poderia gerar, chegando a
incríveis previsões de 94% da população moçambicana infectada, 190 mil pacientes
necessitados de leitos hospitalares e 32mil Moçambicanos em estado crítico. O que a
posterior veio a ser fortemente criticado dados os inúmeros vícios de variáveis do estudo,
desde o facto de o estudo não abarcar questões como uso de EPI’s, o distanciamento
comunitário (nas zonas rurais, que são a maioria em moçambique, entre uma casa e outra), os
índices demográficos e outros aspectos.
A medida de fechamento indiscriminado das escolas em todo o país, incluindo regiões que
até ao momento actual apresentam números “insignificativos” de contaminação por
coronavírus, teve por base (assim como em vários outros países do mundo) um estudo
alarmista, populista e em grande medida viciado.
Com isso não queremos invalidar as medidas de distanciamento social e nem legitimar a
actual retomada as aulas (por hora), mas tão-somente, demonstrar que, pelo menos o
momento e a modalidade de tomada de decisão de fechamento total dos estabelecimentos de
ensino foi precipitado, e não teve por base nenhum dado científico comprovado, mas tão
somente seguiu a tendência politica do momento, num sensacionalismo internacional sem
precedentes.
Evidentemente a decisão, quando ignorado o erro outrora cometido de fechamento total dos
estabelecimentos de ensino (permitindo um foco maior na questão relevante), permite-nos
uma enumeração dos pros e contras a reabertura das aulas.
A flexibilização das medidas de isolamento social que vem sendo efectivada a nível dos
vários Estados ao redor do mundo tem por premissas alguns pontos essenciais, e elas são
entre outras as mais importantes: a capacidade de testagem por mil habitantes em cada
região geográfica, uma vez que é necessário o conhecimento do nível de contaminação
permite o conhecimento sobre o pico de infecção e uma determinação mais consciente das
políticas a serem adoptadas em decorrência do risco de propagação e sobrecarga do sistema
de saúde; a disponibilidade de leitos hospitalares, EPI’s e respiradores por habitantes de
certa região em relação aos postos de saúde disponíveis; preparo social colectivo em
relação a educação sobre as medidas de higiene para o combate a pandemia.
Evidente que há a nós uma ausência de transparência em relação aos dados de capacidade de
testagem, e de disponibilidade de leitos por cada localidade, município, cidade ou até mesmo
províncias do Estado, sendo no entanto desconhecida a motivação.
Importa apenas fazer uma ressalva sobre o direito a informação revestir-se de caracter
constitucional e sendo ainda regulada pela Lei 34/2014, de 31 de Dezembro, e Decreto
35/2015 de 31 de Dezembro, e por isso não devendo ser negada. E a simples omissão de
dados relevantes a saúde pública, e ao bem-estar da sociedade nacional (como é o caso)
constitui uma violação do direito constitucional a informação. Aliás refere o artigo 6 da Lei
(strito sensu) referida que as entidades públicas e privadas abrangidas pela Lei tem o dever
de disponibilizar a informação de interesse público em seu poder, publicando através dos
diversos meios legalmente permitidos, que possam torna-la cada vez mais acessível ao
cidadão.
A divulgação da informação seria pertinente a análise da possibilidade ou não, no momento
para a abertura das aulas. Visto que é preciso no mínimo que haja uma descendência na curva
de contagio para que seja possível a flexibilização das medidas de emergência.
Posto isto, a retomada as aulas em moçambique, país que se caracteriza, entre outros
problemas, por uma desigualdade social de magnitudes lamentáveis, e que tendo um sistema
de educação presencial extremamente deficiente, e por força da dificuldades acrescidas dos
recursos, uma educação virtual utópica, mostra-se um tema de extrema delicadeza e
sensibilidade, de tal forma que suscita enumeras dúvidas e é de interesse especial para a
sociedade.
Em nossa opinião, a volta as aulas não é só uma questão de discutir-se apenas os mecanismos
de segurança a serem adoptados por forma a proteger os estudantes, mas antes de tudo fazer
uma avaliação do impacto danoso da política de “estudo em casa” no aprendizado dos
estudantes, nos problemas de natureza sociocultural que sempre se minimizam pela
continuada ida as escolas, e mais ainda o grau de eficiência das medidas de distanciamento
social dos estudantes, quando eles “ficam em casa”.
Um artigo recente publicado no site oficial das Nações Unidas, que envolve profissionais de
alto escalão da UNESCO (Directora-Geral adjunta de educação da UNESCO), UNICEF
(Chefe de Educação e Director Associado da UNICEF), BANCO MUNDIAL (Director
Global de Educação do Banco Mundial), afirma que “quanto mais cedo as escolas puderem
reabri, menores serão os riscos de ocorrerem danos de longo prazo nas jornadas de
aprendizagem e no bem-estar de milhões de crianças”.
Segundo o estudo feito por estes três órgãos mundiais, há um temor notável pela experiencia
na mitigação das crises ao longo da historia humana de que ”o fechamento prolongado das
escolas exacerbe as desigualdades, aprofunde a crise de aprendizagem e exponha as
crianças mais vulneráveis a um maior risco de exploração”.
Em regra, as crianças mais vulneráveis que permanecem por períodos longos fora das escolas
têm menor probabilidade de a frequenta-las. E acrescido a isso, o distanciamento social é um
potencial catalisador do aumento nas taxas de exploração sexual e de gravidez na
adolescência, facto este que é realidade social solida ainda em varias localidades
moçambicanas.
Um artigo publicado em 2008 por João Bartolomeu SIXPENDE e Amina Saibo Pereira
MUTISSE da conta de que em 2004 cerca de 20% das moças em idade escolar declararam
existir um problema de abuso sexual, e outros 32% de crianças com idades compreendidas
entre 7 e 17 anos estão envolvidas em algum tipo de actividade económica.
Estes dados demonstram claramente que uma paralisação na educação pode ter
consequências irreversíveis, causando danos não só ao individuo mas também a sociedade em
geral, que sofre em muito, com os efeitos do analfabetismo e da desvalorização das
potencialidades produtivas dos estudantes, que abandonam por completo as aulas.
Por outro lado não podem ser relativizados os meios de protecção necessários e
indispensáveis a que a retomada as aulas seja feita de forma eficiente e garantindo o mais
escrupulosos possíveis protocolos de segurança e distanciamento social, desde:
Algumas medidas encontram entraves claros e que já são como que enraizadas nas
comunidades mais recônditas, com o grosso das escolas sem as condições mínimas de
saneamento, tornando muito difícil, se não impossível o sustento logístico pelas escolas, face
as necessidades próprias deste período.
Outro dado importante e que deve ser tomado em conta é todo o processo precedente a ida as
aulas, desde os meios de transporte a serem usados, os terminais e pontos de paragem de
transportes públicos, o previsível aumento exponencial dos utentes de serviços de transporte
publico.
É pertinente ainda por outro lado referir que para além das crianças e dos jovens não
comporem os grupos de risco, um estudo foi realizado pela CBS americana fez um
levantamento de 22 países Europeus que retomaram as aulas, e publicou no dia 21 de maio
uma matéria que concluiu que a reabertura não trouxe novos picos de contaminação pelo
coronavírus, sendo notável que todos esses países teriam maior transparência sobre os dados
de leitos hospitalares e índice de contágio por milhão de habitantes em cada região, o que
permitiu o conhecimento do momento mais favorável a retomada das aulas.
Conclusão:
Medidas que tenham por objecto matéria que periga a saúde pública, e quando acima de tudo
faltem fundamentos científicos para sua adopção ou não, devem a princípio ser mais ou
menos consensuais. Em nossa opinião haveria antes de tudo um dever pelos órgãos
governamentais de elaborar junto a comunidade e aos pais ou encarregados pela educação o
plano de regresso as aulas. Devendo ser esses e não um único órgão do Estado a decidir sobre
a vida daqueles que estão sobre sua tutela, ainda que fosse para que estes ganhassem maior
segurança e ciência sobre a razão do regresso as aulas neste momento. Lembrando ainda que
a representatividade não tem valor absoluto.
Facto é que todos os Estados que optaram pelo regresso as aulas já haviam atingido seus
picos de contágio, e estavam em trajectória descendente da curva de contágio, e ainda que
sejam ocultos alguns dados que nos permitem com maior clareza perceber a situação actual,
não podem restar qualquer dúvidas de que a cada dia só aumentam os números de
contaminados por coronavírus no país, o que nos coloca claramente na contramão da
tendência mundial de flexibilização das medidas de emergência.