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   Desde garoto, Ossain gostava mais de ficar sozinho vagando pela mata do que na
companhia da família. Muito cedo, ele saiu de casa e foi morar no meio da floresta,
onde se dedicou a estudar os poderes mágicos e medicinais das plantas. Depois de
algum tempo, ele sabia tudo  sobre o assunto e, quando alguém precisava de um
remédio ou feitiço, recorria a ele. Mas ele guardava as folhas numa cabaça e não
mostrava para ninguém. Os outros orixás ficaram aborrecidos por dependerem dele.
Decidiram fazer alguma coisa, e Iansã se dispôs a resolver o problema. Foi ao encontro
de Ossain e fez soprar uma ventania que derrubou a cabaça e espalhou as folhas. Então,
cada Orixá correu e pegou um pouco para si. Ossain só conseguiu guardar as mais
secretas, mas continuou dono do poder mágico, e por isso todos têm de lhe pedir licença
para usar as folhas.

Houve um rei que tinha três filhas muito bonita. Quando elas chegaram à idade de casar,
o rei disse que a mais velha casaria com quem adivinhasse o nome das três. Muitos
pretendentes apareceram, mas todos fracassaram; até que um dia chegou à cidade um
rapaz que todos chamavam de Aroni, o aleijado, porque tinha uma só perna. O aleijado
se apaixonou pela filha do rei e se apresentou como pretendente. O rei lhe deu um prazo
de três dias. Passeando perto do palácio, o aleijado descobriu um arvoredo onde as
princesas passeavam. Subiu num pé de Obi e, quando elas apareceram, fingiu ser o
Deus da Árvore e deu a cada uma noz de cola em troca delas dizerem seus nomes. No
dia marcado, foi à presença do rei, matou a charada e casou com a princesa. Só então
revelou que era Ossain, o deus das folhas.

Quando Ossain nasceu, os pais o deixaram nu. Por isso, ele cresceu cheio de
ressentimento contra eles. Vivia mais na floresta que em casa, e assim aprendeu os
segredos das folhas. Um dia, jogou um feitiço sobre o pai, que não conseguia respirar, e
só o curou quando o pai lhe deu uma roupa e um gorro; e assim Ossain não precisou
mais se vestir de folhas. Depois, jogou um feitiço na mãe, que ficou com dor de barriga;
e só a curou quando ela lhe deu um pano listado. Quando teve um filho, Ossain teve
medo de que ele o tratasse como ele tratara o pai; então, matou-o e fez um pó de seu
corpo. Mais tarde, usou esse pó para curar o rei, que em recompensa o cobriu de
honrarias.

Quando Ossain trabalhou para Olorum, recebeu a função de ajudante do adivinho


Orunmilá. Mas como ele sabia muito sobre ervas medicinais, não quis ser inferior ao
outro. Para testá-los, Olorum resolveu enterrar os filhos dos dois por 7 dias; o que
respondesse primeiro quando fosse chamado, venceria. Orunmilá consultou Ifá, que o
aconselhou a fazer oferendas a Exu. Orunmilá obedeceu e Exu mandou um coelho
levar comida para Sacrifício (o filho de Orunmilá). Remédio, o filho de Ossain, usou
seu poder mágico para falar com Sacrifício, a quem pediu comida; este lhe deu, com a
condição de que Remédio não respondesse quando o chamassem. Ele assim fez e
Orunmilá venceu a prova. Em agradecimento, compartilhou o poder de adivinhação
com Exu.

Òsanyin era o nome de um escravo que foi vendido a Orunmilá. Um dia ele foi à
floresta a lá conheceu Aroni, que sabia tudo sobre as plantas. Aroni, o gnomo de uma
perna só, ficou amigo de Òsanyin e ensinou-lhe todo o segredo das ervas. Um dia,
Orunmilá, desejoso de fazer uma grande plantação, ordenou a Òsanyin que roçasse o
mato de suas terras. Diante de uma planta que curava dores, Òsanyin exclamava: "Esta
não pode ser cortada, é as erva as dores". Diante de uma planta que curava
hemorragias, dizia: "Esta estanca o sangue, não deve ser cortada". Em frente de uma
planta que curava a febre, dizia: "Esta também não, porque refresca o corpo". E assim
por diante. Orunmilá, que era um babalaô muito procurado por doentes, interessou-se
então pelo poder curativo das plantas e ordenou que Òsanyin ficasse junto dele nos
momentos de consulta, que o ajudasse a curar os enfermos com o uso das ervas
miraculosas. E assim Òsanyin ajudava Orunmilá a receitar e acabou sendo conhecido
como o grande médico que é.

Òsanyin, filho de Nanã e irmão de Osumare, Ewá e Obaluayê, era o senhor das
folhas, da ciência e das ervas, o Orisá que conhece o segredo da cura e o mistério da
vida. Todos os Orisás recorriam a Òsanyin para curar qualquer moléstia, qualquer mal
do corpo. Todos dependiam de Òsanyin na luta contra a doença. Todos iam à casa de
Òsanyin oferecer seus sacrifícios. Em troca Òsanyin lhes dava preparados mágicos:
banhos, chás, infusões, pomadas, abô, beberagens. Curava as dores, as feridas, os
sangramentos; as disenterias, os inchaços e fraturas; curava as pestes, febres, órgãos
corrompidos; limpava a pele purulenta e o sangue pisado; livrava o corpo de todos os
males. Um dia Sango, que era o deus da justiça, julgou que todos os Orisás deveriam
compartilhar o poder de Òsanyin, conhecendo o segredo das ervas e o dom da cura.
Sango sentenciou que Òsanyin dividisse suas folhas com os outros Orisás. Mas
Òsanyin negou-se a dividir suas folhas com os outros Orisás. Sango então ordenou que
Iansã soltasse o vento e trouxesse ao seu palácio todas as folhas das matas de Òsanyin
para que fossem distribuídas aos Orisás. Iansã fez o que Sango determinara. Gerou um
furacão que derrubou as folhas das plantas e as arrastou pelo ar em direção ao palácio de
Sango. Òsanyin percebeu o que estava acontecendo e gritou: - "Euê Uassá!". "As
folhas funcionam!" Òsanyin ordenou às folhas que voltassem às suas matas e as folhas
obedeceram às ordens de Òsanyin. Quase todas as folhas retornaram para Òsanyin. As
que já estavam em poder de Sango perderam o Axé, perderam o poder da cura.
O Orisá Rei, que era um Orisá justo, admitiu a vitória de Òsanyin. Entendeu que o
poder das folhas devia ser exclusivo de Òsanyin e que assim devia permanecer através
dos séculos. Òsanyin, contudo, deu uma folha para cada Orisá, deu uma ewe para cada
um deles. Cada folha com seus axés e seus efós, que são as cantigas de encantamento,
sem as quais as folhas não funcionam. Òsanyin distribuiu as folhas aos Orisás para que
eles não mais o invejassem. Eles também podiam realizar proezas com as ervas, mas os
segredos mais profundos ele guardou para si. Òsanyin não conta seus segredos para
ninguém, Òsanyin nem mesmo fala. Fala por ele seu criado Aroni. Os Orisás ficaram
gratos a Òsanyin e sempre o reverenciam quando usam as folhas.  

Òrúnmílá dá a Òsanyìn o nome das plantas. Ifá foi consultado por Òrúnmílá que
estava partindo da terra para o céu e que estava indo apanhar todas as folhas. Quando
Òrúnmílá chegou ao céu Olódùmaré disse: eis todas as folhas que queria pega o que
fará com elas? Òrùnmílá respondeu que iria usá-las, disse que, iria usá-las para
beneficio dos seres humanos da Terra. Todas as folhas que Òrunmílá estava pegando,
Òrúnmílá carregaria para a Terra. Quando chegou à pedra Àgbàsaláààrin ayé lòrun
(pedra que se encontra no meio do caminho entre o céu e a terra) Aí Òrúnmílá
encontrou Òsanyìn no caminho. Perguntou: Òsanyìn onde vai? Òsanyìn disse; "Vou ao
céu, disse ele, vou buscar folhas e remédios". Òrúnmílá disse, muito bem, disse, que já
havia ido buscar folhas no céu, disse, para benefício dos seres humanos da terra. Disse,
olhe todas essas folhas, Òsanyìn pode apenas arrebatar todas as folhas. Ele poderia
fazer remédios (feitiços) com elas, porém não conhecia seus nomes. Foi Òrúnmílá
quem deu nome a todas as folhas. Assim Òrúnmílá nomeou todas as folhas naquele
dia. Ele disse, você Òsanyìn carrega todas as folhas para a terra, disse, volte, iremos
para terra juntos. Foi assim que Òrúnmílá entregou todas as folhas para Òsanyìn
naquele dia. Foi ele quem ensinou a Òsanyìn o nome das folhas apanhadas.
Desde pequeno Òsanyìn andava metido mata adentro. Conhecia todas as folhas,
sabendo empregá-las na cura de doenças e outros males. Um dia Òsanyìn resolveu
partir pelo mundo. Por onde andava era aclamado como o grande curandeiro.
Certa vez salvou a vida de um rei, que em recompensa deu-lhe muitas riquezas.
Òsanyìn não aceitou nada daquilo; disse que aceitaria somente os honorários que
seriam pagos a qualquer médico. Tempos depois, a mãe de Òsanyìn adoeceu. Sendo
procurado por seus irmãos e para espanto destes, Òsanyìn exigiu o pagamento de sete
cauris por seus serviços, pois não poderia trabalhar para quem quer que fosse ao mundo,
sem receber algo. Mesmo contrariados os irmãos pagaram-lhe os sete cauris e sua mãe
foi salva. Òsanyìn curou a mãe e seguiu caminho, pois ele é a folha e tinha que estar
livre para o mundo.

Òsanyìn havia recebido de Olodumaré o segredo das ervas. Estas eram de sua
propriedade e ele não as dava a ninguém, até o dia em que Sangô se queixou à sua
mulher, Yansan-Oyá, senhora dos ventos, de que somente Òsanyìn conhecia o segredo
de cada uma dessas folhas e que os outros deuses estavam no mundo sem possuir poder
sobre nenhuma planta. Oyá levantou as saias e agitou-as, impetuosamente. Um vento
violento começou a soprar. Òsanyìn guardava o segredo das ervas numa cabaça
pendurada num galho de iroco. Quando viu que o vento havia soltado a cabaça e que
esta tinha se quebrado ao bater no chão, ele gritou "Ewê O!! Ewê O!" (Oh! as folhas!!
Oh! as folhas!!). As folhas voaram pelo mundo e os Orisás se apoderaram de algumas
delas, mas Òsanyìn continuou dono do segredo das suas virtudes e dos cantos e
palavras que devem se dizer para que sua força, Axé, apareça.
Referência Bibliográfica:
VERGER, Pierre;  Orixás, Deuses Iorubás na Africa e no Novo Mundo;   5.ª ed; Currupio, Salvador, 1997.
VERGER, Pierre; Notas sobre o culto aos orixás e voduns; Edusp, São Paulo, 1999.
e vários sites.

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