Você está na página 1de 8

DESENHO DE OPERAÇÃO LOGÍSTICA INTERNACIONAL DE CURTO E MÉDIO PRAZOS

Data: 10/07/2008 
Fábio Abrahão e Juliana Eiras

INTRODUÇÃO 

O comércio exterior brasileiro vem acompanhando a tendência mundial de crescimento e evoluindo a


cada ano, como mostra a Figura 1. As condições encontradas para a movimentação internacional no país,
entretanto, são críticas em diversas áreas e modais. O escoamento de mercadorias enfrenta ineficiências
em rodovias, hidrovias, ferrovias e portos, afetando especialmente os produtos de menor valor agregado,
como as commodities agrícolas, responsáveis por grande parte da balança comercial brasileira.

Figura 1: Evolução com comércio internacional brasileiro

O Panorama de Portos 2007 do CEL/Coppead mostrou a insatisfação dos usuários do transporte


marítimo com os principais portos brasileiros. A nota média geral dos portos foi de apenas 6,3, em uma
escala que variou de 0 a 10 pontos (Figura 2). As principais reclamações dos usuários com relação aos
portos foram o acesso rodoviário, a infraestrutura de armazenagem e a saturação do porto. No
levantamento CEL/Coppead sobre as ferrovias brasileiras, o resultado não foi diferente: a nota média
atribuída pelos usuários foi de 6,6, em escala de 0 a 10 pontos. Alguns dos principais problemas citados
em relação às ferrovias foram a indisponibilidade de rotas e a baixa velocidade.
 Figura 2: Avaliação dos portos brasileiros na percepção das empresas industriais
exportadoras

Diante deste cenário de baixa eficiência dos modais de transporte, é necessário que as
empresas busquem as melhores opções de escoamento de exportações e de importações e
avaliem necessidades de investimentos em infraestrutura logística ao longo do tempo. É
primordial que a logística estruturada esteja orientada a minimizar os impactos do chamado
Custo Brasil, a fim de manter as empresas nacionais competitivas em relação aos seus
concorrentes internacionais.

Isto é válido não somente para as empresas que se responsabilizam pelo transporte de suas
mercadorias no sistema CIF –(Cost, Insurance and Freigth), mas também para aquelas que
optam pela modalidade FOB –(Free on Board). A eficiência ou ineficiência da movimentação e
o custo logístico e fiscal resultantes irão se refletir no custo final de seus produtos e, portanto,
em sua competitividade, em ambos os casos.

O estudo das opções de escoamento de mercadorias torna-se especialmente importante diante da


tendência de expansão de diversos setores no país, como o siderúrgico e o de celulose. O setor de
siderurgia já anunciou diversos investimentos para os próximos anos, entre eles as novas usinas da
Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Siderúrgica do Atlântico, ambas em Itaguaí, no Rio de
Janeiro, com compacidade de cinco milhões de toneladas anuais cada (vide Figura 3). O setor de
celulose também já anunciou expansões de capacidade e construções de novas fábricas na Bahia e no
Mato Grosso do Sul.
 Figura 3 – Descrição dos investimentos anunciados do setor siderúrgico (voltados à
exportação)

Mas como deve ser o posicionamento de um exportador ou importador em um ambiente


extremamente dinâmico e competitivo? As dúvidas aparecem diante das opções existentes de
combinações entre produtos, modais de escoamento, terminais portuários, e diante das más
condições da infraestrutura de transportes brasileira. É preciso avaliar, ainda, a necessidade de
investimentos em infraestrutura logística, melhorando ou expandindo a atual ou mesmo
construindo novos ativos.

A análise de custos das opções de escoamento e dos investimentos em infraestrutura logística


deve considerar os cenários atual e futuro da empresa e também dos diferentes players do
mercado. E as variáveis que afetam possíveis cenários de um corredor de movimentação de
bens podem referir-se a aspectos ambientais, sociais e políticos. A questão ambiental no país
está se tornando cada vez mais ativa, em sintonia com a tendência mundial de maior
preservação dos recursos naturais. Sendo assim, o tempo e exigências para obtenção de
licenças ambientais estão maiores. Um exemplo da influência do campo social em cenários
logísticos é o programa de remoção de famílias do entorno da ferrovia da MRS no acesso ao
porto do Rio de Janeiro, que possibilitou o aumento da segurança e velocidade da via, afetadas
durante muitos anos de ocupação.

Já as ações de outros atores do mercado, por sua vez, têm de ser mapeadas devido ao
impacto que podem gerar na capacidade de movimentação dos corredores, seja no sentido de
ampliá-la (provedores de serviços logísticos, por exemplo), seja no sentido da utilização da
mesma pelos usuários. Uma trading de soja, por exemplo, não compete por infraestrutura
logística apenas com outras empresas que movimentam soja. Os veículos graneleiros, a
capacidade da hidrovia, da ferrovia, de armazenagem, de movimentação no porto e de
atracação nos berços é compartilhada entre a soja e outros granéis agrícolas. Sendo assim, é
fundamental analisar as tendências de outros produtos que competem pelos mesmos ativos
logísticos – os concorrentes logísticos –, a fim de antecipar gargalos.

Os investimentos em infraestrutura precisam ser vistos com grande antecedência, dado o


tempo necessário para o desenvolvimento do projeto, obtenção de licenças e a construção em
si. O planejamento, e não ações reativas às necessidades, é extremamente importante e traz
vantagens competitivas para aqueles que o desenvolverem.

Os concorrentes logísticos competem por capacidade de modais e armazenagem em um


mesmo corredor logístico, isto é, em uma sequência de modais composta por diversos elos de
infraestrutura logística iniciada na porta da fábrica, passando por pontos de transbordo
intermodais e portos, até o cliente final. A soja, por exemplo, utiliza-se de diversos corredores
para a movimentação entre a principal região produtora, o Centro-Oeste do Brasil, e o Porto de
Santos. O percurso pode ser feito através da combinação de hidrovia e rodovia, ferrovia e
rodovia e somente rodovia.
Respeitando-se o lead-time e níveis de serviço exigidos pelo cliente, a melhor opção de
movimentação de insumos e produtos será a que for operacionalmente viável e trouxer o
menor custo total associado. A dificuldade reside, então, no desenho desta operação ótima e
no mapeamento de como esta pode ser afetada.

Dois grandes conceitos devem ser considerados neste processo: o Custo Cadeia e a Análise
de Viabilidade Operacional. O primeiro se refere aos custos logísticos e fiscais incorridos desde
a saída do produto da empresa até sua chegada ao cliente final internacional, no caso da
exportação, e desde a saída do produto do fornecedor estrangeiro até o site da empresa de
destino, no caso da importação. A análise da viabilidade operacional, por sua vez, avalia a
eficiência dos ativos, a conjuntura ambiental, social e política dos sistemas analisados e
permite o estudo e mapeamento de áreas de greenfield para a construção de novos portos e
terminais.

ANÁLISE DO CUSTO CADEIA

O Custo Cadeia compreende a somatória dos custos de transporte, portuários e fiscais e o frete marítimo
incorridos em uma movimentação internacional desde a origem da carga.

Figura 4: Custo Cadeia

- Custos de transporte: custo rodoviário, hidroviário, dutoviário e ferroviário (e a combinação


destes modais) incorridos na transferência de carga entre a origem e o porto nacional de
destino, incluindo os gastos de transbordo entre os modais;

- Custos portuários: compreendem as taxas de demurrage/detention ou sobreestadia, os custos


de operação portuária (manuseio de carga e taxas de operação portuária) e de armazenagem
incorridos nos portos;

- Frete marítimo internacional: baseia-se na diária do navio durante o percurso marítimo e a


atracação no porto, e no custo de combustível (bunker) utilizado no percurso marítimo e
durante a atracação;

- Custos fiscais: são mapeados os impostos que podem interferir na escolha de um corredor de
movimentação, como o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o
AFRMM (Adicional ao Frete da Marinha Mercante), além de benefícios fiscais localizados.

O frete marítimo internacional é o item de custo de maior valor na operação terrestre e marítima de
exportação ou importação. Considerando uma operação média de diversos tipos de navio, carga e
produto, o frete marítimo internacional é responsável por 52% do custo total, como mostra a Figura 5.
 
Figura 5: Custo de operação terrestre e marítima internacional

Dentre os custos com frete marítimo e despesas portuárias, em uma visão mais detalhada, os gastos com
as diárias do navio no período em que este está em alto-mar são os mais relevantes (como se vê na
Figura 6). Em seguida, encontra-se o custo com as diárias do navio no próprio porto, altamente
influenciado pela produtividade de carregamento. Uma prancha de carregamento mais produtiva impõe
menos tempo do navio atracado para carregamento, reduzindo os gastos com diária e combustível no
porto. Os custos mantêm, portanto, uma relação de interdependência.

Figura 6: Distribuição percentual dos custos de frete marítimo internacional e despesas


portuárias

O levantamento do Custo Cadeia deve ser acompanhado do mapeamento de capacidades,


interesses comerciais e condições operacionais dos modais de transferência ao longo do
tempo. A aderência de cada modal com os produtos, volumes e necessidades da empresa é
avaliada trecho a trecho, e ainda são verificados os interesses comerciais do operador logístico
em realizar aquela operação.

A hidrovia Tietê-Paraná, por exemplo, aumentou o volume movimentado em 27% de 2006 para
2007. A utilização da hidrovia, entretanto, ainda é baixa e permite a movimentação de maiores
volumes. Segundo o Departamento Hidroviário de São Paulo, a via estará ambientalmente
habilitada a movimentar etanol em alguns meses, configurando-se como mais uma opção de
escoamento do combustível.

É importante perceber que, neste momento, devem ser considerados não apenas o aumento de volume e
possíveis investimentos para aumento de capacidade de escoamento da própria empresa, mas também
do mercado como um todo. A competição por espaço nos modais se dará por todos os competidores
logísticos daquele corredor, e a influência nesta capacidade pode ser alterada por diversos players. Desta
forma, é mapeada a projeção de volumes e investimentos em capacidade de cada corredor logístico
utilizado, objetivando-se formar um gráfico de capacidade versus utilização ao longo do tempo (conforme
exemplificado na Figura 7). A ferrovia da MRS, por exemplo, no trecho da Cremalheira (SP), deverá ter
sua capacidade ampliada devido à alocação do volume de minério transportado em uma correia
transportadora de longa distância, o que liberará capacidade na ferrovia.

Figura 7: Evolução da capacidade x utilização – Ferrovia A

ANÁLISE DE VIABILIDADE OPERACIONAL

A análise de viabilidade operacional complementa a análise do Custo Cadeia. No caso da


avaliação do desempenho portuário, a análise está baseada em quatro grandes dimensões:
atracabilidade, disponibilidade de áreas para armazenagem, condições operacionais e acesso
terrestre ao porto.
Figura 8: Viabilidade Operacional – Desempenho Portuário

- Atracabilidade: avaliação da disponibilidade de infraestrutura de atracação considerando a


quantidade e extensão de berços disponíveis, o calado dos berços, do canal de acesso e da
bacia de evolução e a disponibilidade dos berços;

- Disponibilidade de áreas: avaliação da disponibilidade de área para armazenagem dos


produtos movimentados, identificando disponibilidade imediata de áreas ou armazéns em
condições de uso e de espaço para o desenvolvimento de novas estruturas de armazenagem,
dentro e fora do porto organizado;

- Condições operacionais: avaliação dos aspectos operacionais da movimentação interna no


porto e de restrições de ordem social ou ambiental e de questões políticas que resultem em
interferências na operação portuária;

- Acesso terrestre: Avaliação da condição do acesso rodoviário e vias internas dos portos e
condição da via férrea e sua conectividade com as plantas da empresa. O acesso ferroviário é
avaliado segundo os aspectos de condições dos trechos, ocupação da linha, necessidade de
investimentos em material rodante e em terminais de transbordo e licença ambiental dos
terminais.

Além destes aspectos, são levantadas possíveis opções de greenfield para a construção de
novos portos. Para tal, são consideradas a disponibilidade de terras amplas e planas, a
facilidade de acesso, a estabilidade geomorfológica e sedimentológica (que dirá se é
necessária ou não a realização de dragagens, e em que frequência) e a possibilidade de
crescimento sustentável.

A partir de todo o levantamento feito na análise do Custo Cadeia e da viabilidade operacional, é


possível construir um modelo matemático de otimização que objetive encontrar o melhor
desenho das operações logísticas internacionais de curto e médio prazos da empresa, e assim
avaliar possíveis cenários para a operação.

A análise de cenários permite avaliar qual o impacto de um aumento de capacidade de


escoamento em diferentes corredores logísticos, com o objetivo de mapear a necessidade de
investimentos em infraestrutura. Diante dos cenários de volumes futuros da empresa, por
exemplo, pode-se analisar qual o impacto da construção de um novo terminal marítimo, qual
seria o seu nível de utilização e que cargas seriam atraídas por ele versus os terminais já
existentes. A melhoria de um trecho de ferrovia, por exemplo, também poderia ser simulada na
análise de cenários, vislumbrado o resultado do aumento de velocidade e, consequentemente,
de capacidade da mesma.

Os cenários eleitos como mais interessantes são avaliados financeiramente, esclarecendo quais
investimentos em infraestrutura logística devem ser realizados e quando devem ter sua construção
iniciada.
 
 Figura 9: Modelo de desenho de operação logística internacional

CONCLUSÃO

As empresas importadoras e exportadoras no Brasil estão inseridas em um ambiente dinâmico


e competitivo por infraestrutura de transporte e armazenagem. Sendo assim, a avaliação para a
tomada de decisões deve ser sistêmica, considerando os diversos elementos de influência,
como mudanças de capacidades dos modais e aumento da utilização por outros usuários.

A metodologia sugerida tem como foco garantir a viabilidade e competitividade das operações
da empresa ao longo do tempo, e traz ainda a visualização de oportunidades. O mapeamento
de gargalos do sistema logístico utilizado ressalta oportunidades para a prestação de serviços
logísticos. O gargalo percebido pela empresa pode afetar a operação de outras organizações, e
desta forma investimentos para o aumento de capacidade daquele ponto podem originar a
criação de outros modelos de negócio. Esta visão reforça ainda mais a importância do desenho
das operações logísticas futuras.

BIBLIOGRAFIA

Panorama CEL/Coppead – Análise e Avaliação dos Portos Brasileiros. Centro de Estudos em


Logística – Coppead/UFRJ, 2008

Panorama CEL/ Coppead – Os Melhores Prestadores de Serviço Logístico e Ferrovias do


Brasil. Centro de Estudos em Logística – Coppead/UFRJ, 2007

Você também pode gostar