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GRUA – GENTLEMAN DE RUA

Pioneiro no pesquisar como a dança pode acontecer em espaços públicos, se


alterando e sendo alterada diretamente pela relação com o local, o GRUA é um
grupo de dançarinos que, desde 2002, se arrisca em desbravar o encontro entre
Dança e Espaço Urbano através de um afinado jogo de improviso entre os
intérpretes e os fluxos dos locais onde atua. Dirigido por Jorge Garcia, Willy Whelm e
Osmar Zampieri, GRUA é um coletivo cujo nome inventa uma sigla para o conceito
de Gentleman de Rua – os homens gentis do espaço urbano. Ao mesmo tempo
GRUA é também uma referência ao equipamento cinematográfico que permite às
câmeras de filmagem se deslocarem com agilidade, varrendo toda a extensão de
cenários em sobrevoo. GRUA acompanha o acontecimento em movimento.

Na trajetória do grupo, fundado por ex-integrantes de uma companhia oficial, o Balé


da Cidade de São Paulo, é marcante o fato de um único trabalho - “Corpos de
Passagem” - ter sido criado e vir sendo apresentado ao longo de todos estes anos.
Esta insistência em burilar e aprofundar uma mesma obra revela que os
questionamentos do GRUA vão além da re-proposição de espaços para a dança
acontecer, mas abrem também perguntas sobre os formatos e os meios de produção
de todo um cenário artístico. GRUA se afasta de uma companhia convencional com
membros e repertórios estáveis, pois se reinventa a cada nova apresentação,
alterando integrantes, variando estruturas de jogo, se abrindo às orquestrações do
acaso. Insistindo nesse fazer, o grupo aposta em uma linguagem estruturada no
treino da espontaneidade e na capacidade de adaptação como modos de uma
pesquisa perdurar.

Relevante na atuação do GRUA é a insistência em se relacionar com diferentes


espaços, buscando na ocupação e no acionamento dos mesmos, o criar de
possibilidades imagéticas e lúdicas que variam o comum abrindo o campo do
sensível - o que inaugura percepções. Este modo de atuar tem contorno biopolítico
na medida em que ressignifica contextos e espaços e abre, tanto para quem vê
quanto para quem atua, novas perspectivas sobre os locais de atuação e também
para a figura do homem urbano. Este homem urbano representado pelo arquétipo
do homem de terno escuro, cria um marcador estético para o grupo configurando
uma constante conceitual no figurino-aparato que acompanha o GRUA desde suas
primeiras experiências pelas ruas de São Paulo.

A figura do homem de terno preto tem a força de sintetizar um zeitgeist da


sociedade contemporânea, permitindo aos integrantes do grupo – os grueiros – se
confundirem e ao mesmo tempo se destacarem da paisagem humana das cidades.
Esta vestimenta padrão permite aos dançarinos atuarem como amplificadores de
personagens existentes, possíveis e também impossíveis nos locais onde as
performances ocorrem. A dança que se organiza no corpo destes gentlemen admite
a dimensão da empatia com o cidadão comum, com o homem qualquer, lhes
agenciando uma capacidade de variação infinita dentre as formas de composição
possíveis com a realidade. O corpo do grueiro é ao mesmo tempo extraordinário e
acessível.
A arte do GRUA vem configurando em si uma dimensão engajada, na medida em que
se situa nos espaços pela atuação sensível e ao mesmo tempo implicada de seus
intérpretes, atuando o tempo todo na expansão dos modos ser e perceber o
coletivo. O refinado jogo de percepção e escuta entre os grueiros alcança tamanho
sinergismo que estrutura um modo de improvisar e formula características próprias
de cooperação, de ocupação e uso dos espaços e de ressignificação dos paradigmas
do humano urbano.

Outro importante diferencial no GRUA é a pesquisa com a linguagem do vídeo,


borrando as noções de registro e de criação. Ter um integrante captando as imagens
desde dentro, ter um dançarino formulando as lógicas da edição, e ter na
dramaturgia da dança as lógicas do roteiro são fatores que permitem aos vídeos das
performances do GRUA a elaboração de novas hipóteses para a organização dos
fluxos dos acontecimentos, friccionando o real e o fictício, a imagem e
materialização. É nessa pesquisa com a criação em vídeo que se apontam novos
horizontes para as ações do grupo, que já demonstra contaminações com a lógica
cinematográfica em suas mais recentes atuações, extrapolando as premissas éticas,
estéticas e relacionais do grupo para um outro nível de aprofundamento e
elaboração.

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