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Um museu de simulacros: a experiência do espectador mediado por


tecnologias digitais

Conference Paper · January 2016

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Ricardo Artur Pereira Carvalho


Rio de Janeiro State University
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SPGD 2016
2º SIMPÓSIO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN DA ESDI
Rio de Janeiro, 9 a 11 de novembro de 2016

Um museu de simulacros: a
experiência do espectador
mediado por tecnologias digitais

A simulacra museum: the experience of the viewer
mediated by digital technologies.


LOPES, Renata; CARVALHO, Ricardo Artur



RESUMO: As tecnologias emergentes de produção de imagens oferecem formas
inovadoras de conhecer e ver a arte. Nesse campo, preenchido por diferentes funções
simbólicas das imagens e dos signos, este artigo busca refletir sobre a relação do
espectador com a obra de arte mediada por dispositivos tecnológicos de comunicação. Em
diálogo com o discurso de autores que abordam o tema da cultura visual e seus efeitos na
sociedade, serão analisadas especificamente as reproduções fotográficas dispostas no site
do museu The Metropolitan Museum of Art que fazem parte da websérie 82nd & 5th.
Pretendemos refletir, à luz dos estudos da reprodutibilidade técnica, como algumas
características podem ser obscurecidas ao mesmo tempo em que outras se sobressaem.
Nosso objetivo é analisar como os mecanismos de visualização no site se transformam em
signos que escapam aos seus referentes e instauram novas visualidades e modos de
percepção do espaço expositivo.

Palavras-chave: Arte e visualidade; Cultura e sociedade; Exposição; Museu; Espectador

ABSTRACT: The emerging technologies of the imaging offer innovative ways to meet and see
the art. In this field, filled by different functions of the symbolic images and signs, this paper
aim to think through the relation of the spectator with the work of art mediated by the
technological devices of communication. In dialogue with the speech of authors who address
the topic of visual culture and its effects on society, it will be specific analyzed, photographs
reproductions available in the website of the The Metropolitan Museum of Art, the ones that
composes part of the 82nd & 5th online series. We intend to consider in the light of the
technical reproducibility studies, how some features may be obscured while others stand out.
Our aim is to analyze how the viewing mechanisms on the site are transformed into signs
that escape their referents and establishing new visualities and modes of perception of the
exhibition space.

Keywords: Art and visuality; Culture and society; Exhibition; Museum; Spectator


LOPES; CARVALHO. Um museu de simulacros: a experiência do expectador mediado por tecnologias digitais.

1 — Introdução

Fotografias de obras de arte em alta qualidade se movem a partir de toques em telas
touchscreen. Animações do espaço interno de museus e galerias simulam o ponto de vista
do espectador. Diversos softwares e aplicativos fazem com que trabalhos artísticos sejam
conhecidos em detalhes. As tecnologias emergentes de produção de imagens oferecem
formas inovadoras de conhecer e ver a arte. Nesse campo, preenchido por diferentes
funções simbólicas das imagens e dos signos, este artigo busca refletir sobre a relação do
espectador com a obra de arte mediada por dispositivos móveis de comunicação.

A era da mobilidade, ou a modernidade líquida, da qual fala Bauman (2001), vem
transformando as formas de perceber e estar no mundo. Também denominado pós-
modernidade, com sua tendência a diluir o que antes era sólido – as grandes narrativas, as
verdades absolutas e os modelos clássicos da visão –, esse período vem transformando as
maneiras de agir e de se relacionar em sociedade, modificando as estruturas de trabalho e
de produção de conhecimento. Para Jonathan Crary, as tecnologias de produção de
imagens de que falamos “tornaram-se os modelos dominantes de visualização, de acordo
com os quais funcionam os principais processos sociais e instituições” (CRARY, 2012, p.
11). Crary destaca em seus estudos, referenciando Walter Benjamin, como “a modernidade
subverte até mesmo a possibilidade de uma percepção contemplativa” (Ibid, p. 28). O
autor indica com isso como, no espaço do museu ou da galeria, é difícil transcender um
mundo em que tudo está em circulação.

Em diálogo com o discurso de autores que abordam o tema da cultura visual e seus efeitos
na sociedade, serão analisadas especificamente as reproduções fotográficas dispostas no
site do museu The Metropolitan Museum of Art1 que fazem parte da websérie 82nd & 5th.2
Inicialmente será desenvolvida uma análise sintática dos elementos de comunicação visual
contidos no projeto, tomando como referência os estudos de Lev Manovich (2001) sobre a
linguagem das novas mídias. Posteriormente abordaremos o conceito de simulacro,
entendido por Harvey como um processo de ocultamento de alguns “vestígios de origem”
(HARVEY, 2004) das obras de arte. Pretendemos refletir, à luz dos estudos da
reprodutibilidade técnica, como algumas características podem ser obscurecidas ao
mesmo tempo em que outras se sobressaem, observando então como os novos modos de
ver e conhecer a arte podem instaurar novas visualidades e modos de percepção do
espaço expositivo.

2 — Seguindo a série

O Metropolitan Museum de NY lançou, em 2013, uma websérie chamada 82th & 5th,3 na
qual 100 curadores tratam de 100 obras de arte que mudaram sua percepção de mundo. A
cada episódio, uma locução em off do curador – e em alguns casos, uma trilha sonora –
acompanha as fusões das imagens que mostram a obra em vários ângulos e detalhes. A
sala na qual a obra está em exibição também é apresentada, geralmente com alguns
visitantes percorrendo o espaço, o que nos permite ter a ideia do tamanho real da obra. Os
episódios duram cerca de dois minutos e estão dispostos lado a lado na página principal


1 http://www.metmuseum.org/
2 http://82nd-and-fifth.metmuseum.org/
3 O título que faz referência à localização do museu na cidade de Nova Iorque e tem como subtítulo: “um

lugar de interseção entre arte e ideias” (disponível em: http://www.metmuseum.org/. Acesso em: 8 jul.
2016).

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do projeto. A interface apresenta uma grid modular onde os episódios são representados
por meio de um detalhe da imagem da obra (thumbnail), que muda de acordo com o
posicionamento do cursor para a exibição de informações da ficha técnica: título, nome do
curador, nome e ano da obra (Figura 1). A grid apresenta os episódios de forma não linear,
com movimento randômico, mas o usuário pode optar por visualizá-los em lista, dispostos
em número crescente, na ordem em que foram sendo produzidos (Figura 2).



Figura 1 – Tela inicial da websérie e visualização das imagens. Fonte: 82nd-and-fifth.metmuseum.org



Figura 2 – Tela inicial da websérie no site do museu (em lista). Fonte: 82nd-and-fifth.metmuseum.org

Para tratar de alguns elementos visuais da websérie 82nd & 5th, recorremos a Manovich,
que aponta o modo como os modelos de interfaces podem ser organizados a partir de
outras formas culturais, como a palavra impressa e o cinema, para análise da narrativa
criada pela mídia digital. A partir de elementos da “percepção cinemática” como técnicas
de edição, representação do espaço e atividade do espectador (MANOVICH, 2001), foram
selecionados três vídeos que indicam algumas especificidades desse meio de
representação que aludem à linguagem técnica cinematográfica – a perspectiva e a
profundidade de campo.

A visualização e a análise dos vídeos da série com a possibilidade de controle de ângulos,

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assim como a aproximação da imagem e a fruição da experiência de estar dentro do objeto


representado, remontam à evolução do cinema nos termos da perspectiva monocular. Ou
seja, a representação fílmica que pressupõe um sujeito que a contempla – técnica
estabelecida pela pintura renascentista e correspondente, no quadro, ao olho do pintor
(AUMONT, 1995). Foi a partir dessa noção que selecionamos os vídeos descritos abaixo,
buscando com eles apontar as características próprias desse novo meio de representação.

3 — Episódios

Os episódios serão descritos a partir do título da obra e do nome do artista. As análises
aqui expostas objetivam transmitir a experiência do usuário dessa interface. Foram
selecionados vídeos que representam características fílmicas e dialogam com técnica pela
qual o artista se expressou. Sendo assim, buscamos destacar a planaridade4 na pintura, a
tridimensionalidade na escultura e a profundidade na arquitetura.

#1. O Rapto de Rebecca (1846)5, de Eugène Delacroix. O curador Asher Miller
destaca nesse trabalho o “ato da pintura” para falar de movimento. Sua fluidez é
caracterizada pelas pinceladas desordenadas do artista e pelo contraste de nitidez entre as
figuras em primeiro plano e as formas fluidas do fundo (Figura 3). O contraste, juntamente
com a atenção dada aos detalhes e o reflexo da luz, permite ver o movimento numa
imagem estática e plana. O zoom, ferramenta disponível no final do vídeo, permite que o
usuário aproxime a imagem para observar detalhes da obra em alta resolução, o que
enfatiza a visão cinemática no ambiente digital.



Figura 3 – Tela do episódio nº 51 – detalhe de obra O rapto de Rebecca. Fonte: 82nd-and-fifth.metmuseum.org


4 “Planaridade” é um conceito desenvolvido por Clement Greenberg (1960) para falar das

especificidade da arte pictórica no modernismo. Achamos adequado seu uso aqui por caracterizar,
de maneira explicita, o plano bidimensional da obra de arte.
5 Tradução nossa: The Abduction of Rebeccca (1846) de Eugène Delacroix. Disponível em:

http://82nd-and-fifth.metmuseum.org/motion-picture. Acesso: 02 set. 2016.



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#2. Le Trait d’Union (1872)6, de Jean-Baptiste Carpeaux. Trata-se de uma


pequena escultura do século XIX. Le Trait d’Union é a expressão francesa para a palavra
hífen – sinal que liga as partes de uma palavra composta. Pai e mãe trocam afetos e estão
unidos pela presença da criança entre os dois (Figura 4). Nos dois minutos de fala do
curador, a obra é apresentada em diversos ângulos e principalmente com uma
proximidade quase impossível para o espectador que a contemplasse no espaço da
exposição. Nessa proximidade, a textura é retratada em detalhes e pode ser observada a
forma como o artista modelou a peça. No fim do episódio, o usuário também pode explorar
a escultura em planos e ângulos variados, além de obter uma leitura da história da família
representada (Figura 5).



Figura 4 – Detalhe do episódio nº 32 - Imagem Le Trait d’Union. Fonte: 82nd-and-fifth.metmuseum.org



Figura 5 – Telas do episódio nº 32 - Imagem da escultura Le Trait d’Union (vários ângulos). Fonte: 82nd-and-
fifth.metmuseum.org

#3. Sala de Estar da casa dos Little7 de Frank Lloyd Wright. As artes decorativas
norte-americanas também estão em exposição no Metropolitan Museum. O espaço do
arquiteto Frank Lloyd Wright representa aspectos do modernismo norte-americano, como
a composição geométrica e a unidade entre interior e exterior composta por diferentes
níveis horizontais. A entrada da luz natural nesse ambiente faz com que o tom terracota
sobressaia, dando ao ambiente a noção de conforto. O espaço pode ser visualizado do

6 Le Trait d’Union (1872) de Jean-Baptiste Carpeaux. Disponível em: http://82nd-and-

fifth.metmuseum.org/healer. Acesso: 02 set. 2016.


7 Tradução nossa: Living room from the Little House de Frank Lloyd Wright. Disponível em:

http://82nd-and-fifth.metmuseum.org/modern-living. Acesso: 02 set. 2016.



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ponto de vista do espectador. Por meio da fusão das imagens é possível ter a noção de todo
o ambiente projetado para ser uma casa de verão da família Little. Outras visualizações
extras são a planta e o rascunho do projeto original e fotografias da casa e de seus
moradores na década de 1910 (Figura 6).



Figura 6 – Tela do episódio nº 3 – Sala de estar da casa dos Little. Fonte: 82nd-and-fifth.metmuseum.org

4 — Extras

A partir dessas possibilidades de visualização do trabalho de arte – o zoom de alta
definição, a visão a partir de vários ângulos, a noção de profundidade – entendemos que o
usuário dessa interface de computador se beneficia de uma invenção introduzida pelo
cinema, a “mobilidade de enquadramento” (MANOVICH, 2001, p. 89). A websérie
produzida pelo museu oferece a possibilidades de controlar esse enquadramento, fazendo
com que todo o processo de visualização seja caracterizado pela visão de quem a vê. Essa
análise envolve questões de interatividade e narrativa que fazem parte de um estudo mais
abrangente. Neste artigo, pretendemos apontar características que destacam esse meio de
representação e suas implicações na sociedade contemporânea.

A websérie produzida pelo Metropolitan é mais uma forma de representação de algumas
obras de arte que nos permite atualizar alguns conceitos de Walter Benjamin sobre a
reprodutibilidade técnica a partir dos apontamentos de Manovich sobre as novas formas
de representação e recepção nos dias atuais. O autor aponta:

a revolução causada pelos meios computacionais afeta todas as fases da comunicação,
incluindo a aquisição, manipulação, armazenamento e distribuição; ela também afeta
todos os tipos de media – texto, imagens estáticas e imagens em movimento, som e
construções espaciais (MANOVICH, 2001, p. 43) .

Dessa maneira, o espectador, também usuário e participante, conectado às redes, pode
utilizar essas ferramentas como nova forma de conhecimento e, por consequência, nova
forma de ver a arte. Talvez agora pudéssemos sugerir que tais ferramentas, também


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chamadas de reprodutibilidade técnica (Benjamin, [1985] 2012), permitem à obra ser


vista de um modo diferente do original. Apontamos acima algumas possibilidades de
visualização diante da tela do computador, porém outras formas de apreciação de arte se
manifestariam diante da obra no espaço expositivo. São as características específicas que
emergem das diferentes formas de apreciação da arte. Como notado por Lev Manovich
(2001), essas especificidades são evidenciadas pela ascensão das ciências cognitivas na
sociedade atual. Neste artigo, no entanto, buscamos aplicá-las também ao observador,
como demonstra, da mesma maneira, Jonathan Crary.

As tarefas do trabalhador na sociedade pós-industrial podem ser aplicadas ao espectador
de exposição, que passa a acessar o conteúdo de um museu mediante um dispositivo
tecnológico e, portanto, adquire novas capacidades como examinar telas e painéis, analisar
informações, tomar decisões e operar controles. Essas novas atividades, que caracterizam
muito mais o uso da mente que do corpo, explicitam o uso e o modo como operamos as
máquinas que, muitas vezes, tornam-se tão interessantes quanto a própria obra ali
apresentada (CRARY, 2013).

Essas questões são bastante referenciais para os autores aqui citados e junto aos quais
acrescentamos a fala de Freire: “na era da informação o que importa não é o que aparece
na tela, mas o que está por trás dela” (FREIRE, 2012). O uso de um dispositivo tecnológico
por parte do museu parece responder a um interesse crescente dos espectadores que hoje
percorrem o espaço expositivo. Esse espectador que hoje vemos diante de um trabalho
artístico está inserido no contexto de uma cultura visual permeada por dispositivos
móveis de interação. Usuário das redes de comunicação sem fio e participante da cultura
digital, o espectador é conectado às redes sociais, o que o torna também um interlocutor.

Retomando Jonathan Crary, esse espectador, inserido no espaço expositivo, atua como
observador, que “é aquele que vê em um determinado conjunto de possibilidades, estando
inscrito em um sistema de convenções e restrições” (CRARY, 2012, p. 15). O observador
seria então uma consequência (ou um produto) de um contexto – social ou tecnológico –
no qual estaria inserido. Em decorrência disso, sugerimos, é que novas estratégias vêm
sendo desenvolvidas no ambiente digital de museus e galerias de arte. Essas estratégias,
que deslocam a obra de arte do local original, ampliam a audiência e aproximam
espectadores interligados à rede mundial de computadores.

5 — Produção

As imagens de trabalhos artísticos que se multiplicam fora do espaço da galeria – nos sites,
blogs, redes sociais e aplicativos de armazenamento de fotos – fazem parte da construção
de novos sistemas de signos e constituem um aspecto importante da condição pós-
moderna. David Harvey (2004) considera que esse “bombardeio” de produção de imagens
se dá pela volatilidade com a qual ela se processa, reduzindo o “tempo de giro” de
produtos e processos de produção. Como indica o autor, os materiais de produção e
reprodução dessas imagens, como os citados acima, tornam-se eles mesmos o foco da
inovação, principalmente quando os originais não estão acessíveis. Isso nos leva a
considerar as imagens de reprodução como simulacros, segundo a concepção do autor,
que afirma: “Por simulacro designa-se um estado de réplica tão próxima da perfeição que a
diferença entre o original e a cópia é quase impossível de ser percebida” (HARVEY, 2004,
p. 261). O conceito de simulacro é importante aqui para pensar na experiência do usuário
– amante das artes – que teve acesso à série 82nd & 5th no site do Metroplitan Museum.


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Talvez não seja tão relevante refletir se o espectador sequer se lembra da obra original e
do local onde esta teria o seu valor de “culto”, preferindo-se dirigir o foco para a tentativa
de compreender como o momento aurático pode se manifestar nessa nova forma de
conhecer obras de arte mediada por tecnologias de produção de imagens. Podemos
pensar, por exemplo, na escultura de Jean-Baptiste Carpeaux, cuja visualização a partir de
alguns ângulos não seria possível no espaço expositivo porque derivada unicamente do
dispositivo que a reproduziu – nessa mesma ordem, podemos ressaltar o zoom de alta
resolução ou o controle na rotação em 360 graus. Nesses casos, é possível indagar que o
espectador esteja com a atenção voltada à sua interação com a máquina.

Podemos relacionar, no jogo da representação, a websérie aqui apresentada, com suas
fotografias em alta resolução e seus efeitos, à maneira como Baudrillard fala das fases da
simulação da imagem, que “não tem relação com qualquer realidade: ela é o seu próprio
simulacro puro” (BAUDRILLARD, 1991, p. 13). A esse respeito, é importante considerar
para o presente estudo como é possível aproximar o mundo de simulacros ou o museu de
simulacros de algum tipo de identidade, coletiva ou individual. E quais seriam os efeitos
dessa aproximação sobre o espectador atual.

De acordo com Baudrillard em Para uma crítica da economia política do signo8, a produção
desenfreada do real transforma valores e impõe uma cultura de simulacros. A troca de
mensagens e a incessante produção de imagens do nosso contexto sociocultural –
podemos citar também as novas estratégias do Metropolitan Museum – apresentam
práticas de simulações da obra de arte que capturam a atenção do espectador e, muitas
vezes, fazem com que sejam mais lembradas que a própria arte. Nesse sentido, parece
interessante destacar a participação do designer nos meios de produção desses
simulacros. Seguindo com Baudrillard, o conceito geral de design – analisado em última
instância como a produção de comunicação entre homem e signo, signos entre si e sujeitos
entre si – corresponde a um conceito de ambiente no qual tudo seria projetado: “corpo,
sexualidade, relações sociais, políticas e também, necessidades e aspirações”9
(BAUDRILLARD, 1981, p. 201). Para o autor, o design está inserido em todos os níveis de
valores de trocas entre os signos.

Analisamos aqui alguns mecanismos do site que dialogam com esses valores. Em outras
palavras, buscamos destacar novas formas de ver um objeto artístico por meio de
mecanismos que, muitas vezes, nos levam a produção de novos signos – rotacionar uma
escultura, o zoom numa pintura ou se posicionar dentro de um ambiente virtual. Novas
práticas e experiências que vem moldando o espectador-usuário-partícipe e também o
espaço expositivo.

6 — Finale

Se considerarmos a reflexão de Bruno Latour (2008) sobre a expansão da palavra design e
sua mudança na forma como lidamos com objetos e ações, poderemos compreender como
o modo processual do design – que inclui, entre outras coisas, a atenção aos detalhes, à
moral e à política – se aplica aos vários artefatos tecnológicos hoje disponíveis no
mercado. Não é necessário enumerar aqui as especialidades e disciplinas do design que

8 Tradução nossa: For a critique of the political economy of the sign.
9 Tradução nossa: (...) whether it says so or not: the body is designed, sexuality is designed, political,

social, human relations are designed, just as are needs and aspirations, etc.


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tornam possível a construção da interface de apresentação e divulgação da websérie do


Metropolitan Museum. Cabe observar que o design, entre outras especialidades, precisa
atuar na heterogeneidade de linguagens que a atual sociedade demanda. Afinal, parece
estar claro que o espectador atual aprova as várias iniciativas dos museus – como a
crescente permissão do uso de câmeras digitais, as telas touchscreen e os equipamentos
audiovisuais para contemplação e interação com arte.

Observando esse cenário, é válido sugerir que as estratégias que incluem o design de
exposição possam levar em conta o espectador agora tido como usuário das mídias digitais
– podem ser considerados, participantes e interlocutores uma vez que podem
compartilhar sua forma de ver e conhecer a arte. A atenção e a distração são elementos
que se desenvolvem juntamente com as novas formas tecnológicas de espetáculo,
exposição, projeção, atração e registro. Procuramos destacar neste artigo a contrapartida
do museu, que possibilitou novas formas de conhecer a arte. Nesse contexto heterogêneo,
de novas tecnologias e diferentes técnicas de apreensão da atenção, os vídeos da websérie
apresentada são apenas uma estratégia entre tantas outras que ainda estão por vir.

REFERÊNCIAS

AUMONT, Jacques et al. A estética do filme. Tradução Marina Appenzeller; revisão técnica
Nuno Cesar P. de Abreu - Campinas, SP: Papirus, 1995.

BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e simulação. Lisboa: Antropos, 1991.

_________________, Jean. For a critique of the political economy of the sign. Telos Press LTD.,
1981.

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da reprodutibilidade técnica. Tradução e
notas Francisco de Ambrosis Pinheiro Machado. 1. Reimpr. – Porto Alegre: Zouk, 2012.

CRARY, Jonathan. Técnicas do observador: visão e modernidade no século XIX. Rio de
Janeiro: Contraponto, 2012.

______. Suspensões da percepção: atenção, espetáculo e cultura. Tradução: Tina
Montenegro. São Paulo: Cosac Naify, 2013.

FREIRE, Emerson. Da sensação ausente à sensação como potência: tema e variações
sobre a relação arte e tecnologia / Emerson Freire. Campinas, SP : [s. n.], 2012.

HARVEY, David. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança
cultural. São Paulo: Edições Loyola, 2004.

LATOUR, Bruno. Um Prometeu cauteloso? Alguns passos rumo a uma filosofia do design
(com especial atenção a Peter Slotedijk). Palestra para o encontro Networks of Design, da
Design History Society. Falmouth, Cornualha, 3 de setembro de 2008.
http://filosofiadodesign.com/wp content/uploads/2014/10/Prometeu-cauteloso.pdf

MANOVICH, L. The language of new media. Cambridge, Mass.: MIT Press, 2001.


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Notas sobre os autores:

LOPES, Renata Perim; Mestre; Título provisório da Tese: Modos de ver em
exposições interativas; Orientador: Marcos Martins; Ano previsto para defesa:
2019; Link para Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5767718973920005
reperim10@gmail.com

CARVALHO, Ricardo Artur; Doutor; Link para Currículo Lattes
http://lattes.cnpq.br/1009961010621143
rickartur@gmail.com


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