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RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Trad. Alain François.

Campinas, SP:
Editora da Unicamp, 2007.

Paul Ricouer remete a dois textos de Freud: “Rememoração, repetição, perlaboração”

Interpretação do analisando  obstáculo (resistências do recalque) quando tenta se lembrar de


situações traumáticas

obstáculo (resistências do recalque) = compulsão de repetição. Passagem ao ato, o que substitui


a lembrança

vinculo entre compulsão de repetição e resistência e a substituição da lembrança por esse duplo
fenômeno

Pede-se ao paciente para olhar com coragem para a sua doença não mais de um modo
desprezível, mas como um inimigo digno de estima.  reconciliação do enfermo com o recalcado
(p. 84)

Per labore; Pelo trabalho; através do trabalho; Perlaboration = working through, remanejamento, =
trabalho, enfatiza não somente o caráter dinâmico do processo inteiro, mas a colaboração do
analisando nesse trabalho.

“É em relação com essa noção de trabalho, enunciada em sua forma verbal, que se torna
possível falar da própria lembrança, assim liberada, como de um trabalho, o ‘trabalho de
rememoração’ “ (Erinnerungarbeit) (p. 85)

“Assim, trabalho é a palavra repetida varias vezes, e simetricamente oposta à compulsõ: trabalho
de rememoração contra compulsão de repetição, assim se poderia resumir o tema desse precioso
pequeno ensaio. [rememoração, repetição, perlaboração” (p. 85)

Sobre o segundo ensaio: Luto e melancolia

Passar do plano privado da relação analítica para o plano publico da memoria coletiva e da
história

Luto/melancolia deve ser tomado em conjunto, é a propensão do luto à melancolia e a dificuldade


do luto de escapar dessa tremenda neurose que devem suscitar nossas reflexões ulteriores sobre
a patologia da memoria coletiva e sobre as perspectivas terapêuticas asism abertas

Comparação entre esses dois ensaios: lembrança  ato; luto  melancolia

Diminuicao do ‘sentimento de si’ na melancolia

Então, qual é o trabalho fornecido no luto? “Resposta: ‘o teste da realidade revelou que o objeto
amado deixou de existir, passando a exigir que toda a libido renuncie ao vínculo que a liga àquele
objeto. É contra isso que se produz uma revolta compreensível’. Segue uma descrição cuidados
dos ‘grandes custos de tempo e de energia de investimento’ que essa obediência da libido às
ordens da realidade requer. Por que esse custo elevado? Porque a ‘existência do objeto
perdido continua psiquicamente’. Assim, é ao sobre-investimento das lembranças e
expectativas, pelas quais a libido permanece ligada ao objeto perdido, que se deve o preço tão
alto a ser pago por essa liquidação: ‘A realização em detalhe de cada uma das ordens ditadas
pela realidade é o trabalho de luto’.” (p. 86)
Trabalho de Luto e trabalho de lembrança são comparáveis

“Retomando nossa reflexão inicial a respeito da diminuição do Ichgefuhl na melancolia, é preciso


dizer que, diferentemente do luto, no qual é o universo que parece empobrecido e vazio, na
melancolia é o próprio ego que está propriamente desolado: ele cai vítima da própria
desvalorização, da própria acusação, da própria condenação, do próprio rebaixamento.” (p. 86)

As recriminações a si mesmo não substituiriam, assim, as recriminações visando o objeto de


amor?

A acusação enfraquece o investimento objetal, facilitando o retraimento no ego.

“Limitar-nos-emos a essa citação: ‘A melancolia, portanto, empresta do luto alguns dos seus
traços, e outros do processo da regressão desde a escolha objetal narcisista até o narcisismo’.”
(p. 87)

O que a melancolia ensina sobre o luto? Voltar ao Ichgefuhl. ‘reconhecimento de nós mesmos’ 
“à ele pertence a vergonha diante de outrem que o melancólico ignora, tão ocupado ele está
consigo mesmo. Auto-estima e vergonha seriam assim componentes conjuntos do luto. É o que
nota Freud: a ‘censura do consciente [superego] – expressão da instancia geralmente chamada
de consciência moral – caminha junto com o ‘teste da realidade em meio às grandes instituições
do ego. Essa observação converge para o que foi dito no ensaio anterior a respeito da
responsabilidade do analisando na renuncia à passagem ao ato e ao próprio trabalho de
memória.” (p. 87)

“Enfim – e isso talvez seja o mais importante – a proximidade entre Klage e Anklage, entre queixa
e recriminação, que a melancolia exibe, não revela o caráter ambivalente das relações amorosas
que faz amor e ódio coexistirem até no luto?” (p. 87)

A lembrança requer um tempo de luto

“O importante para a espécie de excurso que arrisco além – ou, melhor, aquém – de Freud, é que
o conceito de humor não parou de oscilar entre a idéia de doença e a de caráter ou
temperamento, o equilíbrio resultando do grau de harmonia ou de desarmonia entre os humores.
Ora, é justamente com a melancolia que culmina a ambivalência, que se torna assim o ponto
critico do sistema inteiro. Esse privilégio, por assim dizer, da melancolia, tornou-se mais preciso à
medida que a teoria dos quatro humores se transformou em teoria dos temperamentos, e dos
tipos mentais. Depressão e ansiedade (medo) tornam-se sintomas marcantes da melancolia.
Melancolia, então, torna-se sinônimo de insanidade, de loucura. A junção entre a melancolia da
teoria dos humores e a loucura dos heróis trágicos – Ajax, Héracles, Belerofonte – , que Platão
erigiu em filosofema, está completa desde o mais famoso dos problemas atribuídos a Aristóteles,
o problema XXX, I – ‘uma monografia sobre a bílis negra’, dizem nossas fontes. ‘Por que razão,
pergunta o autor do Problema XXX, os homens mais eminentes em filosofia, em politica, em
poesia ou nas artes manifestamente melancólicos?’ E o texto acrescenta os nomes de
Empédocles, Platão e Sócrates à lista dos espíritos perturbados. Como, então, deixar de evocar a
teoria das múltiplas figuras de mania no próprio Platão e a comparação operada por muitos
diálogos entre exaltação, êxtase, embriagues, e outros estados ‘divinos’? Ora, todos esses
estados são obra da bílis negra! Aqui, o normal e o patológico convivem, o melancólico, vendo-se
enviado do medico ao pedagogo e vice-versa. O melancólico é ‘excepcional’. A teoria romântica
do ‘gênio’ está em germe nessa ambígua descrição do ‘furor’ para retomar a tradução de Cícero
do grego mania)” (p. 88)
“O pólo negativo é simplesmente o que Lessing chamará de ‘voluptuosa melancolia’, herdeira da
acedia dos Medievais, essa pérfida tentação que oscila entre o pecado e a doença. Contudo, o
homem do Renascimento também aposta que a melancolia pode ser ‘melancholia
generosa’(Saturn and Melancholy, p. 241).” (p. 89)

Acídia – idade média

“Isso em que a acídia se compraz não é essa tristeza da memoria meditativa, esse mood
especifico da finitude que se tornou consciente de si mesma? Não é a tristeza sem causa parente
da doença-de-morte de Kierkegaard, essa parenta do desespero ou antes, segundo a sugestão
de Gabriel Marcel, da inesperança?” (p. 90)

Na história do tratamento da melancolia: alegria, humor, esperança, confiança e... trabalho

Jean Starobinski: La Mélancolie au miroir

“O olhar perdido da Melancolia reflete-se no espelho da consciência reflexiva, cuja poesia modula
os reflexos. Um caminho de memória é asism aberto pelo ‘Spleen’: ‘Sou a sinistra memória’,
‘Tenho mais lembranças do que se tivesse mil anos...’. (p. 90) poema O cisne

Sublimação. “o pesar é essa tristeza que não fez o trabalho de luto. Sim, a alegria é a
recompensa da renuncia do objeto perdido e a garantia da reconciliação com seu objeto
interiorizado. E, assim como o trabalho de luto é o caminho obrigatório do trabalho de lembrança,
a alegria também pode coroar com sua graça o trabalho de memória.” (p. 91)

O outro na cura psicanalítica, o outro psicossocial

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