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Esforço Transverso

Luciano Jacinto

Setembro de 2015

O presente documento não deve ser encarado como um documento completo


e cabal, mas como um documento sı́ntese. As ideias são apresentadas em
ordem lógica, mas de forma resumida e sucinta. Prevê-se cerca de 6 aulas
para cobrir a matéria aqui apresentada.

Conteúdo
1 Introdução 1

2 Elementos com armadura especı́fica de esforço transverso 2

3 Elementos sem armadura especı́fica de esforço transverso 4

4 Vigas de altura variável 6

5 Corte na ligação banzo-alma 8

6 Interrupção da armadura longitudinal 11

7 Aspectos particulares de dimensionamento 15


7.1 Secção para o cálculo do esforço transverso actuante . . . . . . . . . . . . . . . . 15
7.2 Cargas concentradas próximas dos apoios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
7.3 Cargas suspensas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

8 Disposições construtivas do EC2 relativas ao esforço transverso 17


8.1 Amarração de armaduras inferiores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
8.2 Armaduras de esforço transverso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

1 Introdução
É aceite em geral que as vigas resistem ao esforço transverso segundo um mecanismo de treliça,
vulgarmente conhecida como treliça de Morsch—Figura 1. As barras traccionadas estão repre-
sentadas a traço contı́nuo e as barras comprimidas a traço interrompido.
As forças nas barras verticais serão resistidas por estribos e as forças na barras inclinadas
por bielas (ou escoras) de betão (Figura 2).
O modelo de treliça sugere que o EL último de esforço transverso pode ser atingido de dois
modos distintos:

1. Cedência dos estribos;


2. Esmagamento das bileas de betão.

1
Figura 1: Idealização de uma treliça no interior de
uma viga de betão—treliça de Morsch.

Figura 2: Esquema geral da armadura de uma viga de betão.

O EC2 denota o esforço transverso associado à cedência dos estribos por VRd,s e o esforço
transverso associado ao esmagamento de betão por VRd,max .
Critério de verificação de segurança:

VEd ≤ VRd , (1)

com,
(
VRd,s
VRd = min
VRd,max

2 Elementos com armadura especı́fica de esforço trans-


verso
Considere-se o troço de viga indicado na Figura 3. Determine-se em primeiro lugar o esforço
transverso associado à cedência dos estribos, VRd,s . De acordo com a Figura 3 tem-se:

VRd = Fb sin θ. (2)

Figura 3: Troço genérico de uma treliça de Morsch—Viga de altura constante.

2
Mas, por equilı́brio do nó 1, Fb sin θ = Fsw sin α, pelo que,

VRd = Fsw sin α. (3)

Seja, Asw /s a área distribuı́da dos estribos, expressa por exemplo em cm2 /m. Considerando
que o comprimento de influência de cada tirante é de z(cot θ + cot α), a área dos estribos nesse
comprimento é de Asw /s z(cot θ + cot α). Assim, o esforço transverso associado à cedência dos
estribos é dado por VRd,s = Fsw sin α = fyd (Asw /s) z(cot θ + cot α) sin α, e portanto

Asw
VRd,s = fyd z(cot θ + cot α) sin α (4)
s

Acabamos de deduzir a expressão (6.13) do EC2.

Observação: No caso de aço em estribos, o EC2 representa o valor de cálculo da tensão de


cedência do aço, fyd , por fywd . Nos presentes apontamentos usaremos a notação habitual fyd
porque de facto não há distinção entre as duas variáveis.

A Tabela 1 mostra os valores de fyd para as duas classes de aço utilizadas em Portugal.

Tabela 1: Tensão de cálculo das


armaduras ordinárias.

Aço fyk [MPa] fyd [MPa]


A400 400 348
A500 500 435

Determinemos agora o esforço transverso associado ao esmagamento das bielas de betão. A


força na biela associada ao esmagamento do betão, Fb , é igual à resistência à compressão do
betão, fcd , vezes a área da biela. A área da biela é igual a db bw = z(cot θ + cot α) sin θ bw . De
acordo com o EC2, a resistência do betão para efeitos de resistência ao esforço transverso é dada
por αcw νfcd . os factores αcw e ν serão explicados mais à frente. Tem-se pois:

VRd,max = Fb sin θ = αcw νfcd z(cot θ + cot α) sin2 θ bw ⇔

cot θ + cot α
VRd,max = αcw νfcd bw z (5)
1 + cot2 θ

Acabamos de deduzir a Expressão (6.14) do EC2.


O factor αcw pretende ter em conta o estado de tensão no banzo comprimido e é tomado
igua a 1 no caso do betão não pré-esforçado (Cl. 6.2.3(3)). O factor ν é um factor menor que 1
e pretende ter em conta a redução de fcd por se tratar de betão que apresenta fissuras de esforço
transverso. É dado por:
 
fck
ν = 0.60 1 − , (6)
250

em que fck é a resistência caracterı́stica do betão aos 28 dias, medida em provetes cilı́ndricos,
expressa em MPa.

3
Relativamente ao braço z das forças internas, o EC2 (Cl. 6.2.3(1)) refere que, não existindo
esforço axial, poderá em geral utilizar-se:

z = 0.90 d (7)

Em relação à inclinação das bielas, θ, o EC2 (Cl. 6.2.3(2)) refere que 1 ≤ cot θ ≤ 2.5, que é
equivalente a:

21.8o ≤ θ ≤ 45o (8)

Na prática é usual adoptar-se θ = 30o .


Um caso particular importante das expressões acima consiste na adopção de estribos verticais
(ou, melhor, perpendiculares ao eixo da viga), ou seja o caso α = 90o . Para este caso particular
tem-se:

Asw Asw VEd


VRd,s = fyd z cot θ ⇔ = (9)
s s z fyd cot θ

αcw ν fcd bw z
VRd,max = (10)
tan θ + cot θ

I Exemplo 1 Verifique a segurança ao EL de esforço transverso de uma secção rectangular


com b = 0.30 m e d = 0.55 m, sujeita a um esforço transverso VEd = 300 kN. Considere estribos
verticais e bielas a 30o . Materiais: C25/30 e A500.

Resolução

Verificação do esmagamento do betão:


 
25
ν = 0.60 1 − = 0.54; fcd = 25/1.5 = 16.7 MPa.
250

(1.00)(0.54)(16.7 × 103 )(0.30)(0.495)


VRd,max = = 580 kN> VED ;
tan 30o + cot 30o
Área de estribos necessária:
Asw 300
= = 8 cm2 /m;
s 0.495 × 43.5 × cot 30o
Considerando estribos de 2 ramos tem-se Asw /s = 4 cm2 /m/ramo. Adopta-se φ8//0.10. J

3 Elementos sem armadura especı́fica de esforço trans-


verso
É possı́vel conceber elementos estruturais sem armadura especı́fica de esforço transverso (estri-
bos). É o caso das lajes e das sapatas. O mecanismo de resistência ao esforço transverso destes
elementos é naturalmente diferente.
Considere-se a secção rectangular de largura bw e altura útil d indicada na Figura 4 e admita-
se que se trata de um elemento sem estribos. De acordo com a Cl. 6.2.2(1) do EC, o valor do

4
Figura 4: Secção transversal de um elemento
sem armadura especı́fica de esforço transverso.

esforço transverso resistente de cálculo de elementos sem estribos (ou que não tenham a armadura
mı́nima de estribos), representado por VRd,c , é dado por:
 
0.18 1/3
VRd,c = k (100 ρl fck ) + 0.15 σcp bw d; (11)
γc

com um mı́nimo de:

VRd,c = (νmin + 0.15 σcp ) bw d (12)

onde:

fck deve ser expresso em MPa;


p
k = 1 + 200/d ≤ 2 (d em mm);
Asl
ρl = ≤ 0.02;
bw d
Asl é a área da armadura de tracção prolongada para além da secção considerada de um
comprimento maior ou igual a lbd + d;

σcp = NEd /Ac < 0.20 fcd , expresso em MPa;

NEd é o esforço normal na secção devido às acções aplicadas ou ao pré-esforço (N Ed > 0
para compressão). Para efeitos de cálculo de NEd a influência das deformações impostas
poderá ser ignorada.

γc é o factor de segurança, em geral 1.50.


1/2
νmin = 0.035 k 3/2 fck .

I Exemplo 2 Determine o valor de cálculo do esforço transverso resistente de uma secção


com as seguintes caracterı́sticas. Considere que não existem estribos e que a compressão na laje
é desprezável.

5
Figura 5: Viga de altura variável.

Resolução
r
200
k =1+ = 2.29 → 2;
120
7.9
ρl = = 0.0066 (< 0.02);
100 × 12
0.18
ν= × 2.0 (100 × 0.0066 × 25)1/3 = 0.61 MPa;
1.5
νmin = 0.035 × 23/2 × 251/2 = 0.5 MPa;

VRd,c = 0.61 × 103 (1.00 × 0.12) = 73 kN;



J

4 Vigas de altura variável


No caso de vigas de altura variável, as forças nos banzos são inclinadas, possuindo assim uma
componente vertical, que pode ser favorável ou desfavorável. Considere-se a viga representada
na Figura 5 com ambos os banzos inclinados. De acordo com a Figura, o esforço transverso
actuante é dado pela Equação:

VEd = Fc sin βc + Fb sin θ + Fs sin βs , (13)

que se pode reescrever como:

VEd − Fc sin βc − Fs sin βs = Fb sin θ. (14)

Comparando esta última Equação com a Eq. (2), podemos concluir que uma forma de
abordar as vigas de altura variável consiste em corrigir o esforço transverso actuante como
segue:
0
VEd = VEd − Fc sin βc − Fs sin βs , (15)

e aplicar a condição de segurança habitual:


0
VEd ≤ VRd , (16)

com VRd calculado para vigas de altura constante.


A Eq. (15) mostra que a componente vertical da força no banzo é favorável (isto é, reduz o
esforço transverso actuante) quando possui o mesmo sentido do esforço transverso actuante.

6
Admitindo que as componentes horizontais das forças nos banzos, Fc cos βc e Fs cos βs , são
ambas iguais a MEd /z (hipótese aceitável se não existir esforço axial), vem:

0 MEd
VEd = VEd − (tan βc + tan βs ) . (17)
z
No caso de apenas um banzo possuir inclinação, a expressão acima simplifica-se, vindo:

0 MEd
VEd = VEd − tan β (18)
z

onde β é o ângulo que o banzo faz com o eixo da viga.


Na aplicação desta equação deve-se ter cuidado com os sinais. As diferentes grandezas
intervenientes (VEd , MEd e β) devem ser aplicadas com o verdadeiro sinal. (Para a convenção
de sinais do ângulo β, ver a Fig. 5.) É importante ter presente que, independentemente dos
sinais, se a inclinação do banzo for favorável, VEd diminiu (em módulo) e aumenta, caso contrário.

I Exemplo 3 Considere a consola representada na Figura junta. Verifique a segurança em


relação ao El de esforço transverso na secção de encastramento.

Resolução

g1 = 25 (0.40 × 0.80) = 8 kN/m;

g2 = 25 (0.40 × 0.40) = 4 KN/m;


82
Mg = 170.7 kNm; Mq = 10 = 320 kNm;
2
MEd = 1.35 × 170.7 + 1.50 × 320 = 710.4 kNm;
8+4
VEd = 1.35 8 + 1.5 × 10 × 8 = 184.4 kN;
2
Tirando partido da inclinação do banzo, que é favorável no presente caso (porquê?), vem:

0 710.4 0.80 − 0.40


VEd = 184.4 − × = 132.2 kN;
|0.9 × 0.75 {z 8 }
52.6

7
Adoptando estribos verticais e bielas a 30o , a área de estribos necessária é de:
Asw 132.2
= = 2.6 cm2 /m;
s (0.90 × 0.75) 43.5 cot 30o
Verificação da segurança ao esmagamento das bielas de betão:
 
25
ν = 0.60 1 − = 0.54
250

1.00 (0.54) (16.7 × 103 ) (0.40) (0.90 × 0.75)


VRd,max = = 1054 kN. J
tan 30o + cot 30o

5 Corte na ligação banzo-alma


Em vigas constituı́das por banzos e almas (secções T, I, L, U, etc.), sempre que o momento flector
varia na direcção longitudinal, ou, por outras palavaras, sempre que existir esforço transverso,
aparecem fluxos de corte na ligação entre os banzos e as almas, como se ilustra na Figura 6 para
o caso de uma viga T.
Estes fluxos são transmitidos aos banzos através de bielas inclinadas (força fc na Figura),
originando tracções transversais (força fs ), para as quais é necessário prever armadura— co-
nhecida como armadura de costura. Se esta armadura for insuficiente, vão aparecer fissuras na
ligação banzo-alma, como representado na Figura 7.
Uma forma alternativa de compreender o aparecimnento das tracções transversais no banzo,
consiste em recorrer a um modelo de treliça espacial, como o indicado na Figura 8 para o caso
de uma viga T.
Designando o fluxo de corte na interface banzo-alma por vEd e efctuando o equilı́brio na

Figura 6: Secção T com os banzos destacados, pondo en evidência os fluxos de


corte nas inter-faces banzo-alma.

8
Figura 7: Armadura de costura na ligação banzo-alma e esquema de fissuração
caso a armadura seja insuficiente.

Figura 8: Treliça espacial de uma viga T pondo em


evidências barras transversais traccionadas no banzo.

Figura 9: Valor máximo de ∆x para efeitos de cálculo


do fluxo de corte (Eq. 19).

9
direcção longitudinal (ver Figura 6.), tem-se:
∆Fd
Fd + vEd ∆x − Fd − ∆Fd = 0 ⇔ vEd = . (19)
∆x
A força de tracção fs obtém-se facilmente por equilı́brio, vindo fs = vEd / cot θ (ver Figura 6).
Assim, a armadura de costura necessária é dada por:
Asf fs vEd
= = . (20)
s fyd fyd cot θ
O problema da determinação das armaduras na ligação banzo-alma resume-se assim à deter-
minação do fluxo vEd .
Relativamente ao comprimento ∆x, o EC2 refere que se poderá considerar, no máximo,
metade da distância entre as secções de momento nulo e momento máximo, o que equivale a
afirmar que se pode calcular a armadura de costura usando o fluxo de corte médio entre as
secções de momento nulo e momento máximo (Figura 9).
É necessário verificar ainda a segurança ao esmagamento das bielas de betão nos banzos, o
que equivale a verificar a seguinte condição:
ν fcd hf
vEd ≤ , (21)
tan θ + cot θ
onde hf é a espessura do banzo. Se esta condição não for satisfeita, aumenta-se a espessura do
banzo (ou então aumenta-se a classe do betão).
Relativamente ao ângulo das bielas nos banzos, o EC2 (Cl. 6.2.4(4)) dá as seguintes in-
dicações:
1. Banzos comprimidos: 26.5◦ ≤ θ ≤ 45◦ ;
2. Banzos traccionados: 38.6◦ ≤ θ ≤ 45◦
De um ponto de vista prático, é possı́vel realizar algumas transformações nas equações acima
e tirar algumas conclusões úteis. Considere-se a secção representada na Figura 10 e admita-se
que a viga é de altura constante. Seja Fc a força no banzo, e admita-se que a linha neutra, em
estado limite último, está no banzo, como acontece na grande maioria das situações. A parcela
desta força que vai para uma das partes do banzo pode ser calculada por:
Fc 0 ∆Fc 0
Fd = b ⇒ ∆Fd = b (22)
b b
Sabemos que em cada secção a força Fc no banzo é dada por Fc = MEd /z (estamos a admitir
que não existe esforço axial). Assim, uma vez que a viga é de altura constante, ∆Fc = ∆MEd /z.
Tem-se pois:
∆Fd ∆Fc b0 ∆MEd b0 VEd b0
vEd = = = = . (23)
∆x ∆x b z ∆x b z b
Aplicando agora a Eq. (20) Tem-se finalmente:

Asf VEd b0 Asf Asw b0


= ⇔ = (24)
s z fyd cot θ b s s b

Esta equação permite determinar a armadura a dispor no banzo a partir da armadura da


alma. Para uma viga de banzos simétricos, se se adoptar no banzo uma armadura igual a
metade da armadura da alma, a verificação da segurança fica automaticamente satisfeita. Em
vigas L, se se adoptar no banzo uma armadura idêntica à da alma, também a segurança fica
automaticamente satisfeita.

10
Figura 10: Secção T pondo em
evidência a largura da aba, b0 .

6 Interrupção da armadura longitudinal


A formação de bielas de betão provoca uma aumento da força de tracção nas armaduras de
flexão.
Considere-se o troço de viga representado na Figura 11. Como indicado, a distância entre
dois nós consecutivos da treliça é igual a z (cot θ + cot α). Considere-se uma “fatia” de viga
exactamente a meio desse troço, como indicado. Efectuando o equilı́brio de momentos em torno
do ponto 2, vem
z
cot θ + z2 cot α − z cot α − M = 0

ΣM2 = 0 ⇔ Fs z − V 2

M 1 (25)
⇔ Fs = + V (cot θ − cot α)
z 2

Assim, para que a nossa análise seja coerente com o modelo de treliça empregue, a força a
considerar na armadura longitudinal deve ser a que resulta da flexão, M/z, acrescida da que
resulta da contribuição do esforço transverso, ∆F = (1/2) V (cot θ − cot α). A Cl. 6.2.3(7) do
EC2 (p. 102), refere o seguinte:

Figura 11: Treliça de Morsch. Obtenção do incremento da força, Fs ,


na armadura devida ao esforço transverso.

11
Figura 12: Viga simplesmente apoiada. Diagrama da força Fs na armadura longi-
tudinal.

Considere-se a viga simplesmente apoidada na Figura 12. Observe-se que na secção onde o
momento é máximo, V = 0, pelo que nesta secção não é necessário considerar força adicional
na armadura. Ou seja, o esforço transverso não afecta a área máxima de armadura longitudinal
(que ocorre no meio vão no presente caso), mas apenas a secção onde se pode efectuar a dispensa
da armadura longitudinal.
Em alternativa à Eq. (25), a determinação do acréscimo da força na armadura devido ao
esforço transverso—e consequentemente a determinação das secções a partir das quais se pode
interromper para da armadura longitudinal—, pode ser efectuada recorrendo à chamada regra
da translação (Cl. 9.2.1.3(2), p. 172). Esta regra consiste em provocar uma translação no
diagrama de forças M/z dada por (Figura 12):

1
al = z (cot θ − cot α) (26)
2

A Eq. (25) mostra ainda que em apoios de extremidade (momento nulo), é necessário prever
uma armadura capaz de resistir a uma força dada por:
1
Fs = V (cot θ − cot α) (27)
2
Para mais pormenores, ver Cl. 9.2.1.4, p. 173.

I Exemplo 4 Para a viga representada na Figura junta:

a) Comece por verificar a segurança ao EL último de flexão na secção de meio vão.

b) Verifique se a dispensa dos 2φ20 pode ou não ser realizada na secção indicada (secção a
1.00 m do apoio). Se não poder, determine a secção onde se pode dispensar os 2φ20.

12
c) Verifique se a armadura no apoio cumpre o disposto na Cl. 9.2.1.4 (p. 173).

d) Determine o comprimento de amarração nos apoios e represente-o.

Resolução

a) pEd = 1.35 × 10 + 1.5 × 15 = 36.0 kN/m; MEd = 36 × 82 /8 = 288 kNm;


MEd 288
µ= 2
= = 0.136;
b d fcd (0.30)(0.652 )(16.7 × 103 )
Para este momento reduzido, as armaduras estão de certeza em cedência, donde:
Fs = fyd As = (43.5)(4 × 3.14) = 546.4 kN;
Fc = 0.8095 x b fcd = 4055.6 x;
Fc = Fs ⇔ x = 0.135 m;
MRd = Fs z = 546.4 (0.65 − 0.416 × 0.135) = 324.5 kNm > 288 kNm, pelo que verifica
a segurança.

b) Determine-se em primeiro lugar os esforços MEd e VEd a 1.00 m do apoio.

REd = 36 × 8/2 = 144 kN;


ΣFy = 0 ⇔ VEd + 36.0 × 1.00 − REd = 0 ⇔ VEd = 108kN ;
ΣM = 0 ⇔ MEd + 36.0 × 1.002 /2 − REd × 1.00 = 0 ⇔ MEd = 126.0 kNm;

13
A força actuante na armadura, incluindo a influência do esforço transverso (ou o efeito
das fendas inclinadas), é dada por:
MEd 1 126.0 1
Fs = + (cot θ − cot α) = + 108.0 × cot 30◦ = 308.9 kN;
z 2 0.90 × 0.65 2
Força disponı́vel:
FRd = 43.5 × 2 × 3.14 = 273.2 kN; < 308.9, pelo que a dispensa de armaduras não pode
ser efectuada na secção indicada.
A determinação da secção a partir da qual os 2φ20 podem ser dispensados pode ser feita
analiticamente, recorrendo à Eq. (25) ou recorrendo a uma construção geométrica baseada
na regra da translacção. Se optássemos por recorrer à Eq. (25), bastaria expressar Fs em
função de x e determinar x de forma a que:

M (x) 1
Fs = FRd ⇔ + V (x) (cot θ − cot α) = 273.2
z 2

Vamos usar a construção geométrica baseada na Regra da Translação. Começa-se por


determinar a translação al , dada por:
1
al = (0.90 × 0.65) cot 30◦ = 0.507 m;
2

na secção de meio vão, a força na armadura é:


MEd 36 × 82 /8
Fs = = kN;
z 0.594
(A força disponı́vel é FRd = 43.5 × 4 × 3.14 = 546.4 kN);
Estimativa do comprimento de amarração de 1φ20:
1.8
fbd = 2.25 η1 η2 fctd = 2.25 × 1.00 × 1.00 × = 2.7 MPa;
1.5
σsd φ 435 × 0.02
lb,rqd = = = 0.80 m;
4 fbd 4 × 2.7
De acordo com a construção geométrica que se apresenta na Figura seguinte, a dispensa
dos 2φ20 pode ser efectuada a 0.85 m do apoio.

14
c) De acordo com a referida Cláusula, a armadura no apoio tem de ser pelo menos 25% da
armadura no vão, o que se verifica no presente caso. Além disso, a armadura deve resistir
à força dada por:

FEd = VEd al /z + NEd ,

que no caso em apreço, onde NEd = 0, é igual a:


1 1
FEd = VEd cot θ = × 144 × cot 30◦ = 124.7 kN;
2 2
Os 2φ20 garantem uma força de 43.5×2×3.14 = 273.2 kN, que é superior à força actuante
FEd , pelo que a armadura no apoio é suficiente.

d) Para o apoio tem-se:


σsd φ 124.7 × 0.02
lb,rqd = = ' 0.40 m;
4 fbd (2 × 3.14 × 10−4 ) 4 (2.7 × 103 )
Vai tirar-se partido da compressão transversal a que a armadura está sujeita devido à
reacção no apoio—parâmetro α5 da Eq. (8.4) do EC2 (p. 152). Recorrendo ao Quadro
8.2, tem-se:
α5 = 1 − 0.04 p ≥ 0.70,
em que p é a pressão transversal em MPa ao longo de lbd . Tem-se:
144
p= = 1.6 MPa;
0.30 × 0.30
α5 = 1 − 0.04 × 1.6 = 0.94;
lbd = 0.94 × lb,rqd = 0.35 m;
De acordo com a Figura 9.3 do EC2, o comprimento de amarração deve ser medido como
se indica na Figura seguinte:

7 Aspectos particulares de dimensionamento


7.1 Secção para o cálculo do esforço transverso actuante
Como ilustrado na Figura 13, o primeiro tirante da treliça de Morsch aparece sensivelmente a
z cot θ do apoio (assumindo estribos verticais), o que sugere que a armadura de esforço transverso
não precisa ser calculada para Vmax , que ocorre nos apoios, mas para V calculado a uma certa

15
Figura 13: Localização do primeiro tirante depois do apoio.

Figura 14: Secção para a determinação


de VEd para efeitos de cálculo da armadura
de esforço transverso.

distância do apoio, por exemplo z cot θ. Para z = 0.90 d e θ = 30◦ , a distância seria 1.56 d.
Sobre este aspecto a C. 6.2.1(8), p. 96, refere:

Assim, para cargas predominantemente distribuı́das, as armaduras de esforço transverso


poderão ser calculadas para VEd calculado a d do apoio. (Ver Figura 14.) Já a verificação do
esmagamento do betão deve ser efectuada para VEd calculado na secção junto ao apoio.

7.2 Cargas concentradas próximas dos apoios


Ver Cl. 6.2.3(8), p. 102.

7.3 Cargas suspensas


As cargas suspensas na face inferior das vigas exigem uma armadura especı́fica, designada ar-
madura de suspensão, destinada a “levar” a carga até à face superior. A Figura 15 mostra
claramente, recorrendo a modelos de bielas e tirantes, a diferença entre aplicar uma carga na
face superior ou suspendê-la na face inferior.
A Cl. 6.2.1(9). p. 96, refere:

16
Figura 15: Diferença entre aplicar uma carga na face supeior ou suspendê-la na
face inferior.

Figura 16: Diferença entre aplicar uma carga na face superior ou suspendê-la na
face inferior.

A Figura 16 esquematiza os dois casos a considerar: força suspensa concentrada e força


suspensa distribuı́da.

8 Disposições construtivas do EC2 relativas ao es-


forço transverso
8.1 Amarração de armaduras inferiores
Ver Cl. 9.2.1.4, p. 173.

8.2 Armaduras de esforço transverso


As disposições construtivas relativas a armaduras de esforço transverso são tratadas na Cl. 9.2.2,
p. 175. Destacam-se 3 disposições:

1. Armadura mı́mima:
  √
Asw fck
= 0.08 bw sin α
s min fyk

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2. Espaçamento longitudinal máximo: sl,max = 0.75 d (1 + cot α)

3. Espaçamento transversal máximo: st,max = 0.75 d (≤ 600 mm);

Figura 17: Espaçamento longitudinal e trans-


versal da armadura de esforço transverso.

Sequência de cálculo para a verificação da segurança ao EL de esforço transverso (vigas de


altura constante e estribos verticais):

1. Calcula-se VEd

2. Verifica-se a segurança contra o esmagamento das bielas de betão:


αcw ν fcd bw z
VRd,max =
tan θ + cot θ
3. Determina-se a área de armadura necessária:
Asw VEd
=
s z fyd cot θ
4. Determina-se a área de armadura mı́nima da armadura:
  √
Asw fck
= 0.08 bw sin α
s min fyk
5. Determina-se o espaçamento transversal máximo st,max = 0.75 d.
Com base neste espaçamento escolhe-se o número de ramos e determina-se a área Asw /s
por ramo.

6. determina-se o espaçamento longitudinal máximo sl,max = 0.75 d, e em seguida escolhe-


se o espaçamento que se pretende dar aos estribos. Finalmente consulta-se uma tabela
de armaduras e escolhe-se o diâmetro dos estribos por forma a que, com o espaçamento
escolhido, se garanta a área calculada por ramo.

I Exemplo 5 (Adaptado do Exame de 21/1/2013) Considere a viga representada na Figura


seguinte

a) Determine o valor de cálculo do esforço transverso imediatamente à esquerda de B

b) Idem, mas à direita de B

c) Verifique a segurança ao EL de esforço transverso em B e pormenorize as armaduras que


determinou.

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d) Independentemente da escolha de armadura que fez na alı́nea anterior, admita que a
armadura adoptada é de φ6//0.10 – 2R. Determine a distância a partir da secção B a que
essa armadura pode passar para φ6//0.20 – 2R

Resolução

a) VEd (Besq ) = (1.35


| × 15{z
+ 1.5 × 18}) × 2 = 94.5 kN (–);
47.25

b) ΣMC = 0 ⇔ RB × 8 = 243 × 4 + 270 × 5 ⇔ RB = 290.25 kN;


VEd (Bdir ) = −94.5 + 290.25 = 195.8 kN;

c) Obviamente que, para efeitos de dimensionamento:


VEd (B) = max [VEd (Besq ); VEd (Bdir )] = 195.8 kN;
 
25
ν = 0.60 1 − = 0.54; z = 0.90 × 0.55 = 0.495 m;
250
(1.00)(0.54)(16.7 × 103 )(0.30)(0.495)
VRd,max = = 579.9 kN; >> 195.8. Verifica.
tan 30◦ + cot 30◦
Asw 195.8
= = 5.25 cm2 /m;
s 0.495 × 43.5 × cot 30◦
  √
Asw 25
= 0.08 (0.30)(1.00) = 2.4 cm2 /m;
s min 500
st,max = 0.75 d (1 + cot 90◦ ) = 0.75 × 0.55 × 1.00 = 0.41 m;
Adopta-se um espaçamento de 0.10 m. Para este espaçamento, consultando as tabelas de
armaduras distribuı́das, obtém-se φ6//0.10 – 2R.

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c) A área de armadura correspondente a φ6//0.20 – 2R é igaul a 2.8 cm2 /m, que é superior
à armadura mı́nima. A esta armadura corresponde um esforço transverso resistente de:
Asw
VRd,s = fyd z cot θ = 43.5 × 2.8 × 0.495 × cot 30◦ = 104.4 kN;
s
Considerando um sistema de referência com x a começar a partir de B, tem-se:
VEd (x) = 195.8 − 47.25 x;
195.8 − 104.4
VEd (x) = 104.4 ⇔ x= = 1.93 m.
47.25
Portanto a uma distância de 1.93 m da secção B, os estribos podem passar para φ6//0.20
– 2R.

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