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Nemdentro Nemfora PT
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Noz 04
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nem dentro
nem fora
Matemática espontânea.
Placas de acrílico cortadas a laser
(padrões inspirados em elementos de influência mourisca na arquitetura brasileira).
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Observatório Cultural Torre Malakoff. Recife, 2006.
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Lucia Koch nasceu em Porto O interesse que Lucia Koch A experiência a qual Lucia
Alegre e hoje mora e trabalha mantém pela arquitetura, em Koch nos submete vai além da
em São Paulo. É bacharel e sua relação com a arte, fica própria obra, quando modifica
mestre em Artes pela UFRGS e evidente em seus trabalhos, nosso olhar enquanto espec-
doutora em Poéticas Visuais que não são tão perenes quan- tador. Nos interessamos pelo
pela USP. Atualmente leciona to a arquitetura e precisam ser caráter de intermédio do seu tra-
no curso de Artes Plásticas da temporários para tornar percep- balho que, ao lidar com o limite
FAAP. Já realizou exposições tível ao observador o ‘‘estado entre o dentro e o fora, se coloca
em várias cidades brasileiras e alterado” que a artista propõe entre a arte e a arquitetura.
também na Turquia, Alemanha, no espaço construído.
Áustria, Coreia do Sul, O trabalho da artista sugere
Inglaterra, entre outros países. mudanças na percepção do es-
A conversa foi em uma paço. Por mais que, na maioria
tarde em Botafogo, quando dos casos, não os construa, in-
falamos sobre seus trabalhos terfere na sua atmosfera – por
mais recentes durante mais exemplo, quando aplica filtros
ou menos uma hora. Enquanto de luz nas janelas de uma gale-
Nem dentro nem fora: conversa com Lucia Koch
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trabalhos? interesse da arte pelo espaço passou a ser
Lucia Koch: A arquitetura me interessa por- muito forte?
que eu respondo a um espaço que já foi pensado, LK Essa aproximação dos artistas com o
não só pelo arquiteto que o desenhou, mas por universo da arquitetura, tão frequente hoje, apa-
quem o habita, quem vai transformando o espaço rece já no começo do século XX, com os objetos
no que ele é. E pensar sobre o espaço é pensar de arte postos no mundo como coisas reais, ou
também sobre arquitetura. objetos ordinários deslocados de contexto para
Acho que os artistas, em geral, deixaram museus e galerias. A apresentação no lugar da
de ver o espaço como neutro, algo sobre o representação. E também com uma importância
qual se pode fazer qualquer coisa, como se ele cada vez maior da dimensão da experiência na
não imprimisse ou definisse nada, e passou- arte. A ideia de uma arte ambiental, como foi
se a pensar as relações que se dão no espaço formulada pelo Hélio Oiticica, já vê a situação e
também como pensamento e produção da arte. o espaço como uma coisa só. É natural que os
Há também uma condição mimética no meu tra- artistas que operam no mundo construído se in-
balho, dada pelo meu fascínio pela arquitetura, teressem pela estrutura deste mundo, e a vejam
uma vontade de assimilação pelo meio que o faz como invenção plástica.
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sempre na prática. Se coleciono imagens de LK Você fala das fotografias de interiores
azulejos e penso em usá-las em um trabalho, de pequenas caixas ou embalagens vazias,
preciso pesquisar o sentido daquele elemento no que são ampliadas a uma escala de espaços
seu contexto original, os usos já experimentados, arquitetônicos. Este trabalho é mesmo inscrito
a história deles etc. numa tradição da arte, de representação e de
Na fruição da arquitetura, como da arte, você ilusão, mas é atualizado pelo fato do dispo-
não pode substituir o contato direto pela imagem, sitivo estar todo exposto ali. Os trabalhos se
embora os dois acabem sendo complementares. chamam Tetrapak, Spaghetti, Açúcar orgânico
Sempre que viajo procuro visitar as obras que etc. Além disso, o espectador logo irá perceber
“conheci” por livros ou revistas, para vê-las em que é uma fotografia de uma caixa, então acho
uso. Fiquei hospedada por uns dias num pequeno que a diferença está em tratar o espectador de Açúcar Orgânico (série Fundos).
quarto de hotel que existe na Unité d’Habitation outra maneira. É uma caixa qualquer, transfor- Impressão em Lambda sobre papel fotográfico, 4.15 x 7.20m.
27ª Bienal de Arte de São Paulo, 2006.
em Marselha [Le Corbusier], (superbarato!) e mada por uma operação que pode ser aplicada
tomava sol no terraço assistindo os moradores a qualquer outra. No fim, é algo encontrado,
fazendo ginástica, visitava apartamentos, fre- qualquer um pode pegar uma caixa e olhar para
quentava o restaurante. Queria poder fazer isto dentro, perceber o interior como espaço. Isso de
no Park Hotel [Lucio Costa]... Mas não são só as que o sujeito que vê pode refazer o caminho do
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passar a olhar de outra forma para as coisas outra, uma abertura circular que lembrava um
ordinárias e os espaços familiares. moongate chinês (parte das “amostras” são
de arquiteturas tradicionais). Por isso achei
Na Bienal de São Paulo, em 2006, mostrei a fo- que fazia sentido assumir que a imagem tinha
tografia Açúcar orgânico. Escolhi a imagem por autonomia. Não vejo as caixas como maquetes,
uma certa semelhança com o prédio da Bienal: porque é só com a fotografia que elas passam
espaço amplo, branco, luz zenital, parecendo a parecer modelos em escala, mas usei essa
um museu de arte moderna. A imagem também ideia de um espaço ser primeiro pensado em
foi adaptada ao tamanho da parede, e a posição escala reduzida. Talvez mais por isso se reco-
pensada para uma primeira visão frontal, na en- nheça, ali, arquitetura.
trada da sala climatizada. Há tanto uma relação
com o contexto quanto com o tipo de ambiente Noz E aí continua uma pesquisa sobre espa-
que ela sugere. Que imagem faria sentido em ços possivelmente arquitetônicos modifica-
determinado espaço e também como adequá-la dos pela luz...
em termos de forma. LK Quando comecei a série Fundos, em
2001, meu trabalho já estava completamente
Noz No caso dessa série de fotos de cai- envolvido com a arquitetura, criando situações
xas, a obra não é tão informada pelo pró- e alterando a luz dos lugares. Não produzia ob-
prio lugar onde vai ser instalada, como na jetos ou imagens, e era difícil pra mim entender
maioria dos seus trabalhos, apesar de você o porquê de fazer aqueles trabalhos. Quando
pensar no contexto na hora de escolher comecei a fotografar, percebi que só se transfor-
determinada fotografia para instalar no mavam em arquitetura aqueles espaços (caixas)
espaço que você tem. que recebiam luz natural, onde a luz entrava e
LK E agora estou fazendo umas coisas se refletia nas “paredes” e no “piso”, se com- Série Amostras ou Arquitetura.
que são novas, bem menos relacionadas com portando como numa sala. Esta foi a chave que
o espaço de exposição, que eu estou cha- me mostrou o sentido das fotos em relação aos
mando de Amostras de arquitetura. Coleciono outros trabalhos. Vi que também ali eu estava
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caixas para as fotos de Fundos desde 2001. Na procurando entender o que transforma um espa-
época, percebi que em algumas imagens de ço em um ambiente.
caixas era difícil reconhecer um espaço arqui-
tetônico, como um corredor, uma sala grande Nessa mesma Bienal fiz um trabalho que
ou pequena, então achava que elas não po- chamei de Sala de exposição, que era uma
deriam me servir. Recentemente fui fazer uma sala temporária, construída com estrutura de
limpeza no estúdio e reencontrei essas caixas madeira e revestida de painéis Eucatex per-
que tinha deixado de lado, por serem muito furados e pintados de branco. Marta Bogéa, a
singulares, e algumas me pareceram exemplos arquiteta daquela edição da Bienal, não tinha
de arquitetura de autor, outras de arquitetura desenhado uma sala-tipo para exposição,
tradicional. Comecei a fotografá-las, mas ago- todas tinham dimensões diferentes. E a ideia
ra imprimindo em um tamanho pequeno, sem era construir uma sala que fosse “como as
a intenção de criar uma extensão do espaço. outras”, mas vazia de objetos. Então acaba-
É mais como se fossem imagens de pesquisa mos desenhando juntas uma sala que tinha a
sobre arquitetura. entrada igual à da sala vizinha e com dimen-
sões iguais às da sala que ficava do outro
Noz Nesse caso, fica assumido o caráter lado. Uma sala “sem nada”, só com aquela
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cria, um caráter questionador do próprio aparentemente estável, mas em poucos instan-
espaço de exposição, da galeria? tes as paredes começariam a se mover criando
LK Quando me convidaram para a Bienal, aberturas, deslizando uma sobre a outra ou
achei que já havia tensão suficiente naquele am- dobrando-se. E com a sobreposição das chapas
biente que seria instaurado temporariamente pela perfuradas os padrões se multiplicavam, sem-
exposição: na relação dos artistas com a institui- pre em movimento.
ção, ou entre si, entre obra e público, entre espaço
e intervenções. Enfim, não eram só relações de Noz: Nesse trabalho há, além de uma certa
poder e produção de conhecimento, mas havia tensão entre o interior e o exterior devido
a dimensão concreta destas relações dada pelo à movimentação das portas e os diferentes
uso do espaço (entre outras coisas). Por isso, não padrões que você usa, um caráter de estran-
quis comentar outras situações fora da própria geiro do objeto que é instalado, acoplado ao
Bienal, a partir do conceito/interrogação que ela edifício moderno da Bienal, e que você define
propunha – “Como viver junto”. Minhas interven- também como um ‘‘puxadinho”...
ções eram respostas que não queriam resolver a LK: O puxadinho é um raciocínio muito mais
questão, talvez até criassem mais problemas... da arquitetura popular brasileira do que de arqui-
tetos modernos. Tem a ver com a ideia de que o
Noz: Como a arte pode, atualmente, discutir e edificio nunca está terminado, é sempre possível
questionar o espaço arquitetônico, propor no- continuar a construção. A palavra obra também
vos usos e questões para esse espaço? De que pode ser lida como algo inacabado. Eu adoro
forma você vê o seu trabalho inscrito nisso? isso, porque é um modo de formular na prática a
LK: Posso responder do meu lugar de artista, ideia de que o lugar é um organismo vivo. E tudo
não teoricamente. O que faço existe temporaria- o que você fizer se inscreve na vida do lugar.
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SP-ARTE. Pavilhão da Bienal, 2007.
fazem imaginar para além do que está dado. um degradê, de cinza chumbo para azul, como
Transformar é pôr em questão pela ação, e a o que se vê no horizonte de São Paulo nos dias
minha sugere outras tantas possibilidades. poluídos e secos de inverno. Uma imagem pela
qual eu era obcecada desde que mudei para
Noz: O papel do artista contemporâneo parece São Paulo, em 1992. Fiquei anos pensando em
ser esse, de tensionar as relações que aconte- como usá-la, como reproduzir o efeito atmosfé-
cem no espaço e mesmo reconduzir a atenção, rico, a luz. A lona vedava quase completamente
provocar o olhar de quem se relaciona com a a entrada do Paço e os visitantes precisavam
obra pra algo. Isso acontece também em obras desviar, passando pelo jardim pra entrar na
no espaço público hoje, e é interessante como galeria. Durante o dia a luz (natural) vinha de
pensar isso também no espaço interno... fora, e criava um ambiente azulado na entrada.
LK: John Cage escreveu, em Cage for the À noite o degradê era iluminado por dentro,
birds, que “O mundo se transforma em função ficando visível como um “recorte de céu” ao final
do lugar onde fixamos a nossa atenção; esse da escadaria, para quem passasse por ali.
processo é aditivo e energético”. Em seguida, participei de uma exposição
sobre a presença da antropofagia na arte bra-
Fui convidada em seguida pra fazer outro traba- sileira atual, na Kunstlerhaus de Stuttgart, com
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chamei o trabalho de Stand. Era uma espécie feito para um local específico, usando a mesma
de “puxadinho” acoplado ao edifício, feito com lona do Paço das Artes num outro contexto. O
portas de garagem metálicas que se abriam trabalho foi adaptado às dimensões do novo es-
e fechavam lentamente a cada dois minutos, paço e, apesar de também ter sido colocado na
automaticamente. Eu programei a velocidade entrada da exposição, o resultado foi completa-
com que elas se moviam, mas as combinações mente diferente, pois ali ele estava montado no
Degradês POA
Gradientes impressos em jato de tinta sobre lona translúcida.
5ª Bienal do Mercosul. Porto Alegre, 2005.
acabavam sendo imprecisas e aleatórias. interior de um prédio, sem comunicação direta
com a rua. Queria experimentar esse desloca- Noz Gostaria que você falasse também sobre
mento, ver se faria sentido. como você relaciona suas intervenções com o
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No ano seguinte, fiz os Degradês Porto espaço em si e sobre como se dá a sua apro-
Alegre, para a Bienal do Mercosul. O trabalho ximação com esse espaço para a intevenção.
foi implantado nos portões dos galpões do cais LK Para responder a um lugar, é preciso
do porto, que foram mantidos abertos, onde ter alguma experiência nele, ou a partir dele.
instalei as lonas tensionadas, com três gradien- Normalmente eu visito os espaços disponíveis e
tes diferentes impressos. Com a luz natural e a outros não previstos também, antes de começar
passagem do dia, as cores não paravam de mu- um projeto (nem sempre quero ocupar o espaço
dar. Durante o dia os degradês eram iluminados que me oferecem e, neste caso, tenho que propor
pelo sol, e vistos de dentro do espaço como outra alternativa). Observo a dinâmica e os usos
grandes quadros de luz cambiante; à noite as correntes, e como circulam ar e luz. Às vezes eu
cores acesas pela iluminação do interior dos fico impressionada com a falta ou o excesso de
galpões eram também visíveis de fora. algo, e muitas vezes com a relação entre o que foi
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em propagandas de ônibus e táxis – em cada ma, que alteram a temperatura de cor da luz,
um dos vidros das portas. A sobreposição de mas não têm uma cor tão evidente ou impositi-
várias camadas de vinil perfurado gera graus de va. O efeito pode ser mais subliminar.
densidade variável e também diversos padrões Em Light corrections, por exemplo, filtrei toda
dependendo do ângulo da rotação do material a luz de uma exposição, incluindo as salas onde
aplicado. Duas ou quatro camadas de furos os outros artistas mostravam seus trabalhos.
regulares redondos sobrepostos podem resultar Era uma bienal pequena (Göteborg, Suécia,
em hexágonos ou efeitos ópticos de volume. 2005), com doze artistas, e propunham que nos
A face exterior era branca e a interna preta, conhecêssemos em um encontro seis meses an-
mas como a transparência mudava com as tes da abertura, apresentássemos a todos nos-
condições de iluminação de dentro e fora, isto sos trabalhos anteriores e projetos, e visitásse-
também se invertia conforme a hora do dia. mos, juntos, os espaços de exposição do Museu.
Isso era totalmente inesperado no contexto de
Noz Em várias das suas descrições sobre uma bienal internacional, onde habitualmente
as obras, você fala que, de dia, a obra é vista cada artista está concentrado exclusivamente
por dentro de um jeito e por fora de outro e, à em seu próprio trabalho e não discutem entre si
noite, isso se inverte, isto é, ocorre uma trans- conceito e formato da exposição, e muito menos
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enormes em quase todas as salas de exposição, gem. O que me atraiu nesta galeria é que ela
e grandes paredes de vidro também. Enfim, se confunde com seu entorno, é uma caixa
a arquitetura do lugar já indicava possíveis de vidro transparente e meio refletiva situada
relações entre dentro e fora, mas as aberturas numa área de fluxo intenso e constante de
estavam cobertas, desativadas, para evitar a pessoas, através da qual se pode ver a calçada
indesejada instabilidade da luz natural. Outra da avenida lá fora.
vez a ideia de uma suposta neutralidade, da Fiz uma nova pele (externa) para o lugar, que
necessidade de controle sobre as condições de potencializa essa confusão. Instalei chapas de
apresentação do trabalho de arte. acrílico espelhado recortadas a laser com dese-
A operação inicial era descobrir literalmente nhos de padrões inspirados em cobogós encon-
estas claraboias que estão sempre vedadas à trados em São Paulo. Alguns bastante comuns
luz externa e retirar as paredes brancas mon- e outros menos reconhecíveis. Embora o uso de
tadas em frente às paredes de vidro. Só então superfícies espelhadas seja muito comum nos
o trabalho de ajustar a luz para a atmosfera prédios do entorno, os recortes multiplicavam
proposta, que era pensada para cada trabalho, os efeitos pois alternavam áreas de diferentes
começava a aparecer. graus de reflexão e combinavam padrões muito
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fotos de maquetes, experimentos comparti- cobogós que eu vi na Unitè d’Habitacion em
lhados. Em outros, eram mensagens sinté- Marselha (desenhados por Le Corbusier, outra
ticas como a de Adrian Paci, artista croata raiz). São quadrados com os ângulos arredon-
que apresentou sua Capela Pasolini (Pasolini dados, mas que eu alterei muito para produzir Conjunto Nacional – Casa de espelhos.
Acrílico espelhado cortado à laser sobre vidro.
Chappel), uma cabana feita de restos de uma malha mais estruturada com uma espes- Caixa Cultural, São Paulo, 2009.
madeira abrigando pequenas pinturas de stills sura muito menor (chapas de acrílico de 3mm).
do Evangelho segundo São Mateus. Adrian Acabei encontrando na garagem do Conjunto
me pediu “uma luz quente”. Mas já havíamos Nacional um igual ao que eu desenhei, mas
conversado sobre seu projeto. Revi os filmes de só os vi depois de ter aberto a exposição. As
Pasolini para entender como ele criava a luz. coisas que fazem sentido nem sempre são
Consultei um diretor de fotografia de cinema premeditadas.
para me ajudar a recriar na sala de Adrian
o vermelho-dourado onipresente no filme Noz: Os seus trabalhos lidam, de alguma ma-
Medeia. A mesma luz em ambientes naturais neira, com a ideia de projeto, desde a forma
ou construídos. Construções primitivas em como você intervém no espaço, de maneira a
que o espaço permanecia aberto, permeável controlar as variáveis (luz, cor, dimensão), até
à luz. Achei que faria sentido para a capela de mesmo no desenho de detalhes, por exemplo
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e efeitos imprevistos precisam ser incorporados de Iberê Camargo), a expectativa geral era
sem desfazer o sentido do trabalho, e para isso a de se encontrar um prédio mais transparente,
sua estrutura precisa ser estável. totalmente aberto para a paisagem da cidade e
do Rio Guaíba. E as janelas do prédio instauram
Alguns projetos são mesmo imersões em arqui- paisagens justamente porque elegem enqua-
tetura. Quando estava pensando no trabalho dramentos. Os visitantes tinham dificuldade
para a Fundação Iberê Camargo (projeto de em reconhecer como janelas as aberturas tão
Álvaro Siza construído em Porto Alegre), eu precisamente desenhadas e localizadas pelo
tinha todas as plantas do edifício coladas nas arquiteto, e esta dificuldade foi o partido de um
paredes do estúdio. Ficava olhando obsessiva- dos meus projetos: às janelas modernas e orgâ-
mente pra elas, pensando no espaço e no que nicas de Álvaro Siza acrescentei o desenho de
fazer. Fazia parte de uma exposição chamada janelas mais esquemáticas, que fiz a partir do
“Lugares Desdobrados”, a primeira coletiva de catálogo de janelas de aluminio Sasazaki, bem
artistas contemporâneos [participavam também populares. Não havia substituição de uma pela
Elaine Tedesco e Karen Lambrecht] exibida na outra, porque os desenhos que representavam
nova sede da Fundação, inaugurada em 2008. janelas eram recortados em superficies transpa-
Um dos trabalhos que apresentei lidava rente, assim ambas continuavam operando. E a
diretamente com a ideia de representação, cor nas chapas de acrílico fazia com que a área
que não é muito presente na minha produção, vazada aparecesse como uma nova abertura.
mas respondia a uma circunstância muito Achei que o contraste entre elas deveria ser
específica: a maneira como o público em geral muito evidente, e queria entender se explicitar
reagiu inicialmente ao prédio. Mesmo sendo um esse conflito mudaria a percepção dos visitan-
espaço museológico desenhado principalmente tes que já haviam estado ali.
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