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Ciências & Cognição 2008; Vol 13 (1): 72-81 <http://www.cienciasecognicao.

org> © Ciências & Cognição


Submetido em 29/02/2008 | Aceito em 28/03/2008 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 31 de março de 2008

Artigo Científico

Jogo didático Ludo Químico para o ensino de nomenclatura dos


compostos orgânicos: projeto, produção, aplicação e avaliação
Ludo Chemical didactic game in the teaching of organic compositions nomenclature: project, pro-
duction, application, and evaluation

Dulcimeire Aparecida Volante Zanona, , Manoel Augusto da Silva Guerreirob e Robson Cal-
das de Oliveirab
a
Departamento de Didática, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP),
Campus Araraquara, São Paulo, Brasil; bInstituto de Química, UNESP, Campus Araraquara, São
Paulo, Brasil

Resumo
Os materiais didáticos são ferramentas fundamentais para o processo de ensino-aprendizagem e o jogo
didático pode ser uma alternativa viável para auxiliar em tal processo. Neste artigo discutimos as eta-
pas de projeto, produção, aplicação e avaliação da proposta do jogo Ludo Químico para o ensino de
nomenclatura dos compostos orgânicos. A função educativa do jogo foi facilmente observada durante
sua aplicação ao verificarmos o favorecimento da aquisição de conhecimento em clima de alegria e
prazer. Os aspectos lúdico e cognitivo presentes no jogo são importantes estratégias para o ensino e a
aprendizagem de conceitos ao favorecer a motivação, o raciocínio, a argumentação e a interação entre
os alunos e com o professor. © Cien. Cogn. 2008; Vol. 13 (1): 72-81.

Palavras-chave: química; jogo didático; nomenclatura; compostos orgânicos.

Abstract

The didactic materials are fundamental tools for the teaching-learning process and the didactic game
can be a feasible alternative to make easier such process. The project, the production, the application
and the proposal evaluation of the game Chemical Ludo in the teaching of the organic compositions
nomenclature are discussed in this article. We realized that the nomenclature rules’ understanding
was obtained more quickly than usual in a friendly environment. Therefore, this fact shows the educa-
tional function of the game. The playful and cognitive aspects of the game are important strategies for
the teaching and the concepts learning since it instigated the motivation, the reasoning, the argument
and the interaction among the students and their teacher. © Cien. Cogn. 2008; Vol. 13 (1): 72-81.

Key words: chemistry; didactic game; organic compositions; nomenclature.

Introdução produção, por parte dos alunos, de conheci-


mentos significativos não só sobre o conteúdo
Nos últimos anos a pesquisa em Ensi- das disciplinas científicas como também sobre
no de Química vem produzindo conhecimento o processo de construção da própria Ciência.
e dando suporte ao planejamento de cursos – Nesse contexto, as práticas pedagógicas se
inclusive universitários – que favoreçam a efetivam, em sala de aula e nos laboratórios

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de ensino, com o uso de diferentes recursos delas diz respeito à função lúdica, que está
didáticos como textos escritos dos mais varia- ligada a diversão, ao prazer e até o desprazer.
dos gêneros, imagens e softwares. A outra, a função educativa, que objetiva a
Segundo os Parâmetros Curriculares ampliação dos conhecimentos dos educandos.
Nacionais – Ensino Médio (Brasil, 1998), a Segundo a autora,
Química, como disciplina escolar, é um ins-
trumento de formação humana, um meio para
interpretar o mundo e interagir com a realida-
de. A compreensão dos conteúdos da Química
está relacionada com uma nova visão da ciên-
cia e de conhecimento científico que não se
configura num corpo de teorias e procedimen-
tos de caráter positivista, e, sim, como mode-
los teóricos social e historicamente produzi-
dos. Esses modelos, que constituem uma den-
tre outras formas de se explicar a realidade Figura 1 - Esquema comparativo dos jogos
complexa e diversa, se expressam em códigos de entretenimento e jogos pedagógicos ou di-
e símbolos da Química que, apesar de ter um dáticos.
potencial explicativo, também têm suas limi-
tações.
Quando nos referimos ao ensino de “o desequilíbrio entre estas funções
Química Orgânica no Ensino Médio notamos provoca duas situações: não há mais en-
que a prática comumente efetivada em sala de sino, há apenas jogo, quando a função
aula consiste na transmissão-recepção de co- lúdica predomina ou, o contrário, quan-
nhecimentos que, muitas vezes, deixa lacunas do a função educativa elimina todo he-
no processo. Ao reconhecermos as dificulda- donismo, resta apenas o ensino.” (ki-
des que permeiam o trabalho do professor shimoto, 1998: 19)
nesse nível de ensino optamos por estudar
uma forma de contribuir para os processos de Segundo Cunha (1998), Gomes e Fri-
ensino e aprendizagem de nomenclatura dos edrich (2001), Kishimoto (1996) o jogo peda-
compostos orgânicos. Assim surgiu a idéia de gógico ou didático tem como objetivo propor-
elaborarmos um jogo didático com esse pro- cionar determinadas aprendizagens, diferenci-
pósito de forma motivante e divertida. ando-se do material pedagógico, por conter o
Os jogos podem ser considerados edu- aspecto lúdico e por ser utilizado para atingir
cativos se desenvolverem habilidades cogniti- determinados objetivos pedagógicos, sendo
vas importantes para o processo de aprendi- uma alternativa para melhorar o desempenho
zagem - resolução de problemas, percepção, dos estudantes em alguns conteúdos de difícil
criatividade, raciocínio rápido, dentre outras aprendizagem. Nessa perspectiva, o jogo não
habilidades. Se o jogo, desde seu planejamen- é o fim, mas o eixo que conduz a um conteú-
to, for elaborado com o objetivo de atingir do didático específico, resultando em um em-
conteúdos específicos e para ser utilizado no préstimo da ação lúdica para a aquisição de
âmbito escolar denominamos tal jogo de didá- informações (kishimoto, 1996).
tico. Por outro lado, se o jogo não possuir ob- Gomes e Friedrich (2001) salientam
jetivos pedagógicos explícitos e sim ênfase ao que o jogo no ambiente educacional nem
entretenimento, então os caracterizamos de sempre foi visto como didático, pois como a
entretenimento. A figura 1 a seguir representa idéia de jogo encontra-se associada ao prazer,
tal distinção: ele assumia pouca importância para a forma-
De acordo com Kishimoto (1998, ção do estudante. Sua utilização como meio
2002) o jogo educativo possui duas funções educativo demorou a ser aceita. E ainda hoje é
que devem estar em constante equilíbrio. Uma

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pouco utilizado nas escolas e seus benefícios de Licenciatura em Química. Essa disciplina
são desconhecidos por muitos professores. (anual de 16 créditos) visa, dentre seus objeti-
Segundo Miranda (2001) vários obje- vos, atuar como instrumento de integração
tivos podem ser atingidos a partir da utiliza- desses estudantes com a realidade social e e-
ção dos jogos didáticos, como os relacionados ducacional de escolas públicas do ensino mé-
à cognição (desenvolvimento da inteligência dio ou outros ambientes educacionais nas ati-
e da personalidade, fundamentais para a cons- vidades de observação, análise e intervenção.
trução de conhecimentos); à afeição (desen- Além disso, nos estágios curriculares, os futu-
volvimento da sensibilidade e da estima e atu- ros professores colocam-se a serviço da esco-
ação no sentido de estreitar laços de amizade la no sentido de oferecerem atividades de en-
e afetividade); à socialização (simulação de sino que permitem um maior entendimento da
vida em grupo); à motivação (envolvimento dinâmica escolar e da aprendizagem da do-
da ação, do desfio e mobilização da curiosi- cência tanto diante das dificuldades quanto
dade) e à criatividade. das experiências bem sucedidas.
Nesse sentido, o jogo ganha espaço Do planejamento à execução do jogo
como ferramenta de aprendizagem na medida didático compreenderam diversas etapas:
em que estimula o interesse do aluno, desen-
volve níveis diferentes de experiência pessoal 1. Os futuros professores (identificados neste
e social, ajuda a construir novas descobertas, artigo com as letras b e c) buscaram in-
desenvolve e enriquece sua personalidade, e formações relevantes para o tema escolhi-
simboliza um instrumento pedagógico que do – nomenclatura dos compostos orgâni-
leva o professor à condição de condutor, es- cos – para possibilitar a contínua atualiza-
timulador e avaliador da aprendizagem. Além ção técnica, científica, humanística e pe-
disso, o professor pode auxiliar o aluno na dagógica.
tarefa de formulação e de reformulação de 2. A seguir, ocorreu a apresentação da con-
conceitos ativando seus conhecimentos pré- cepção do jogo na Universidade, na pre-
vios e articulando esses conhecimentos a uma sença do professor responsável pela disci-
nova informação que está sendo apresentada plina e do restante da turma. Esse momen-
(Pozo, 1998). to favoreceu uma reflexão crítica e possi-
Acreditamos, então, que o jogo didáti- bilitou a troca de idéias e sugestões.
co no Ensino Médio pode constituir-se em um 3. Foi feito um estudo exploratório com 30
importante recurso para o professor ao desen- alunos de 3ª série do Ensino Médio de
volver a habilidade de resolução de proble- uma escola pública, do período noturno.
mas, favorecer a apropriação de conceitos e Esse momento foi muito importante, pois
atender às características da adolescência. permitiu identificar pequenos ajustes ne-
Neste artigo discutimos as etapas de cessários para facilitar a aprendizagem da
projeto, produção, aplicação e avaliação da nomenclatura de compostos orgânicos e,
proposta do jogo Ludo Químico para o ensino consequentemente favorecer a dinâmica
de nomenclatura dos compostos orgânicos. do jogo (como exemplo, eliminamos mo-
Por fim, promovemos uma discussão sobre a léculas e/ou estruturas de compostos or-
idealização do jogo e seu impacto entre os gânicos mais complexas).
alunos. 4. Por fim, o jogo foi aplicado com 100 alu-
nos de 3as séries dessa mesma escola, po-
O Jogo: sua concepção e regras rém, do período diurno e avaliado, por
meio de questionário.
A idéia da proposição do jogo Ludo
Químico originou-se durante o desenvolvi- Essas duas últimas etapas serão mais
mento de atividades da disciplina “Prática de bem explicitadas no tópico avaliação do jogo
Ensino e Estágio Supervisionado em Química (resultados).
II” oferecida a alunos do 5° ano de um curso

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O Ludo Químico para o ensino de sulta rápida durante o jogo e também para não
nomenclatura dos compostos orgânicos foi comprometer o interesse dos alunos nos desa-
concebido para ser utilizado com alunos de 3ª fios (vide anexo A).
série do Ensino Médio ou no momento em O jogo é composto por 01 tabuleiro
que o professor decidir iniciar o estudo de (dimensões 50 cm x 50 cm); 04 peões de co-
Química Orgânica. Além disso, foi idealizado res distintas; 01 dado numerado de um a seis;
para favorecer o cooperativismo, isto é, dis- 100 cartas de perguntas; 20 cartas desafio; 20
tribuição dos alunos em grupos, onde um aju- cartas coringa e caderno, lápis ou caneta, para
da o outro (do mesmo grupo) a vencer. anotações que podem ser substituídos pela
Além da construção das regras do jogo lousa ou quadro branco.

sentimos a necessidade de elaborar um quadro Apesar de inicialmente ser idealizado


com um conteúdo teórico básico sobre a no- para ser realizado entre grupos, o jogo tam-
menclatura de compostos orgânicos com o bém poderá ser utilizado com adversários in-
objetivo de funcionar como suporte de con- dividuais de acordo com a figura 2.

Figura 2 – Disposição dos jogadores com adversários em grupos e individuais.

O jogo é iniciado com o lançamento efetuadas perguntas quando o(s) participan-


do dado por cada grupo. O maior número ob- te(s) estiver(em) nessa situação. As casas es-
tido dará ao grupo a 1ª posição, seguido pelos curas (cinzas) representam desafios aos joga-
demais. O objetivo do jogo consiste em atin- dores. Quando um jogador (grupo) estiver so-
gir o Final do tabuleiro, conforme ilustra a bre uma casa escura, o adversário que jogará
Figura 3. na seqüência deverá retirar uma carta e sub-
As casas claras (amarelas) do jogo re- meter ao grupo anterior uma questão ou desa-
presentam passagem livre, ou seja, não serão fio, conforme a carta, tirada do conjunto.

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Figura 3 – Representação do jogo.

Haverá dois grupos de cartas no jogo: Segundo Capecchi e Carvalho (2003),


questões e desafio. Nesses grupos, também as trocas de idéias entre os alunos e a elabora-
constarão cartas coringa. As figuras 4, 5 e 6 a ção de explicações coletivas possibilitam o
seguir representam tal caracterização: contato com um aspecto importante para a
formação de uma visão da Ciência como uma
construção de uma comunidade, cujas teorias
estão em constante processo de avaliação. Pa-
ra as autoras,

Figura 5 – Cartas presentes no jogo: desafios.

Figura 4 – Cartas presentes no jogo: ques-


tões.

As respostas às questões poderão ser


dadas tanto pelo nome, como pela estrutura.
Essa opção será decidida pelo grupo adversá-
rio que poderá desenhar a estrutura e nesse
caso, a resposta será a nomenclatura do com- “os alunos devem conhecer esta faceta
posto, ou mencionará o nome do composto, do conhecimento científico, identifican-
sendo então a estrutura, a resposta solicitada. do-o como o resultado de interações en-
Caso um grupo caia na mesma casa de tre idéias diferentes, como a réplica a
um oponente (que já está numa casa escura) e outros enunciados e também sujeito a
acertar a resposta, então o segundo transporta novas réplicas”. (p.2)
o primeiro para o inicio do jogo.

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Figura 6 – Cartas presentes no jogo: coringas.

Durante o jogo, o professor assume a sor de Química responsável por ministrar essa
função de mediador entre os grupos, esclare- disciplina.
cendo possíveis dúvidas e também incenti- Os depoimentos indicaram que a vali-
vando a cooperação, a discussão e a manifes- dação de conteúdo deu-se de forma satisfató-
tação de diferentes pontos de vista na realiza- ria, com exceção de algumas cartas que exigi-
ção de tarefas entre os membros dos grupos. am conhecimentos específicos mais aprofun-
Acreditamos que o processo de cons- dados sobre a nomenclatura de certos com-
trução do conhecimento é de certa forma, algo postos, como o retinol e o heptaleno.
sem um fim muito definido. Ou seja, no de- Além disso, os alunos destacaram que,
correr desse processo as fronteiras do saber com o jogo, sentiram-se mais motivados e
são alteradas e, conseqüentemente, aspectos ativos na aprendizagem de nomenclatura dos
da realidade que sequer se imaginava podem compostos orgânicos por envolver memoriza-
ser pensados. Da mesma forma, coisas a res- ção de regras.
peito das quais não ocorriam indagações O professor da turma destacou que o
constituem temas de interrogações e alvo de “jogo pelo jogo” nem sempre traz resultados
novas investigações. positivos para o processo educativo, pois de-
terminados jogos promovem algumas atitudes
Aplicação e avaliação do jogo: resultados não desejadas, como a competitividade exces-
siva. No caso do Ludo Químico – jogo didáti-
Conforme explicado anteriormente foi co que estamos retratando – a cooperação foi
feito um estudo exploratório (etapa 3) a fim um dos fatores positivos apontado por esse
de validarmos o jogo com relação aos objeti- professor. Nesse caso, a vitória passa a ser
vos pretendidos: estimular a criatividade e as alcançada quando um jogador ajuda o outro a
relações cognitivas, afetivas, e sociais dos e- vencer, sendo ambos pertencentes a um mes-
ducandos; trabalhar a socialização e favorecer mo grupo.
o processo ensino-aprendizagem de nomen- Após essa etapa, o jogo foi realizado
clatura dos compostos orgânicos. com 100 alunos (4 turmas) de 3ª série dessa
Uma das turmas do período noturno de mesma escola, do período diurno. Foram en-
3ª série do Ensino Médio da escola pública tregues aos alunos dois questionários: um an-
estudada avaliou o jogo assim como o profes- tes da aplicação do jogo e outro, ao final. Inte-
ressou-nos saber inicialmente se os alunos já

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tinham um conhecimento prévio sobre Quí- Analisando os resultados obtidos por


mica Orgânica e após o jogo, identificarmos meio do questionário, percebemos que os alu-
se o Ludo Químico atingiu seus objetivos. nos gostaram do jogo, aprenderam sobre o
A análise revelou-nos que esses alunos tema e foram estimulados pelo jogo, pois du-
começaram a estudar Química Orgânica uma rante a aplicação com turmas diferentes, veri-
semana antes da aplicação do jogo e, por isso, ficamos entusiasmo e interesse em jogar,
88% deles responderam que conheciam o as- mesmo entre aqueles que só observaram. A-
sunto. lém disso, ao ser apresentado o Ludo Quími-
A identificação dos conhecimentos co, o mesmo causou interesse e curiosidade.
prévios dos alunos é de extrema importância,
pois facilita a explicação das regras do jogo Considerações finais
bem como o quadro teórico sobre nomencla-
tura elaborado para consulta. Dentre os co- A função educativa do jogo Ludo
nhecimentos prévios destacados pelos alunos Químico foi facilmente observada durante sua
podemos citar os que relacionam Química aplicação ao verificarmos o favorecimento da
Orgânica com plantas, ligações covalentes, aquisição de conhecimento em clima de ale-
poluição atmosférica, efeito estufa, remédios, gria e prazer.
petróleo, plásticos, alimentos, produtos agrí- Acreditamos assim como Campos e
colas, dentre outros. colaboradores (2002) que os aspectos lúdico e
Já que o Ludo Químico tem como fo- cognitivo presentes no jogo são importantes
co de interesse o estudo da nomenclatura de estratégias para o ensino e a aprendizagem de
compostos orgânicos perguntamos aos alunos conceitos abstratos e complexos, favorecendo
se sabiam as regras gerais. Do total, 68% a- a motivação interna, o raciocínio, a argumen-
firmaram positivamente sendo exemplificados tação, a interação entre os alunos e com o pro-
compostos como metano, butano, propano, fessor. Dessa forma, o jogo desenvolve além
eteno, meteno, propeno, octano, butino. da cognição, outras habilidades, como a cons-
Após a aplicação do jogo, interessou- trução de representações mentais, a afetivida-
nos conhecer as opiniões dos alunos sobre as de e a área social (relação entre os alunos e a
regras do jogo (fácil ou difícil entendimento), percepção de regras).
aprendizagens adquiridas, sugestões de me- Diante do exposto defendemos a idéia
lhoria, se gostaram ou não do jogo e a melhor de que os jogos poderiam merecer um espaço
forma de participação (individual ou em gru- na prática pedagógica dos professores por ser
pos). uma estratégia motivante e que agrega apren-
Sobre as regras do jogo, a maioria dos dizagem de conteúdo ao desenvolvimento de
alunos disse não sentir dificuldades para en- aspectos comportamentais saudáveis.
tendê-las e que o jogo é ótimo, pois houve Cabe ressaltar que os jogos pedagógi-
oportunidade para ampliar seus conhecimen- cos não são substitutos de outros métodos de
tos sobre a nomenclatura de alcanos e de radi- ensino. São suportes para o professor e pode-
cais e também para identificar as ligações rosos motivadores para os alunos que usufru-
químicas presentes em cada molécula. em, dos mesmos, como recurso didático para
As sugestões de melhorias estavam re- a sua aprendizagem.
lacionadas à premiação (material) ao grupo Por outro lado, os professores preci-
vencedor e ao uso de um dado com maior sam estar atentos aos objetivos da utilização
pontuação. de um jogo em sala de aula e saber como dar
Apesar de idealizarmos a aplicação do encaminhamento ao trabalho, após o seu uso.
Ludo Químico em grupos, nossa suposição Além disso, deve dispor de subsídios que os
era a de que os alunos responderiam que seria auxiliem a explorar as possibilidades do jogo
mais interessante o jogo com adversários in- e avaliar os seus efeitos em relação ao proces-
dividuais. Porém, surpreendeu-nos saber que so ensino-aprendizagem.
85% deles preferem adversários em grupos.

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Dessa forma, é importante que os pro- de material sobre o uso de jogos no ensino,
fessores conheçam/identifiquem as vantagens que possam vir a subsidiar o trabalho docente.
e desvantagens na proposição de jogos no tra- Todas estas considerações enfatizam
balho pedagógico. Autores como Kishimoto que, ao professor assumir uma proposta de
(1996), Grando (2000) e Spigolon (2006) des- trabalho com jogos, significa que deverá estu-
tacam vantagens no uso de jogos no ambiente dá-la como uma opção, apoiada em uma re-
escolar como: facilitar a aprendizagem de flexão com pressupostos metodológicos, pre-
conceitos já aprendidos de uma forma moti- vista em seu plano de ensino (Grando, 2000).
vadora para o aluno; introduzir e desenvolver Nesse sentido, o currículo escolar necessita
conceitos de difícil compreensão; desenvolver ser redimensionado, criando espaços de tem-
estratégias de resolução de problemas (desafio po para os jogos, a fim de que eles sejam res-
dos jogos); favorecer a tomada de decisões e peitados e assumidos como uma possibilidade
saber avaliá-las; dar significados para concei- metodológica ao processo ensino-
tos aparentemente incompreensíveis; propici- aprendizagem de conceitos. Via a ação do jo-
ar o relacionamento de diferentes disciplinas go, o professor não pode se isolar do proces-
(interdisciplinaridade); requer a participação so, mas sim assumir a posição de elemento
ativa do aluno na construção do seu próprio integrante, ora como observador, juiz e orga-
conhecimento; favorece a socialização entre nizador, ora como questionador, enriquecendo
os alunos e a conscientização do trabalho em o jogo.
equipe; fator de motivação para os alunos;
favorece o desenvolvimento da criatividade, Referências bibliográficas
de senso crítico, da participação, da competi-
ção "sadia", da observação, das várias formas Campos, L.M.L; Bortoloto, T.M. e Felício,
de uso da linguagem e do resgate do prazer A.K.C. (2002). A produção de jogos didáticos
em aprender; reforça ou recupera habilidades para o ensino de ciências e biologia: uma
de que os alunos necessitem; útil no trabalho proposta para favorecer a aprendizagem. Re-
com alunos de diferentes níveis; permitem ao tirado em 15/01/2008 no world wide web:
professor diagnosticar alguns erros de apren- http://www.unesp.br/prograd/PDFNE2002/ap
dizagem, as atitudes e as dificuldades dos a- roducaodejogos.pdf.
lunos. Capecchi, M.C.V.M. e Carvalho, A.M.P.
E, quanto às desvantagens dos jogos, (2003). Interações Discursivas na Construção
podemos citar outros exemplos: se mal utili- de Explicações para Fenômenos Físicos em
zados, existe o perigo de dar um caráter pu- Sala de Aula. Anais, VII Encontro de Pesqui-
ramente aleatório, tornando-se um "apêndice" sa em Ensino de Física, Florianópolis.
em sala de aula; os alunos jogam e se sentem Cunha, H.S. (1998). Brinquedo, desafio e
motivados apenas pelo jogo, sem saber por descoberta. 1ª edição. FAE/MEC/RJ.
que jogam; se o professor não estiver prepa- Gomes, R.R. e Friedrich, M.A. (2001). Con-
rado, o tempo utilizado com o jogo pode pre- tribuições dos jogos didáticos na aprendiza-
judicar o planejamento; criar as falsas con- gem de conteúdos de Ciências e Biologia.
cepções de que se devem ensinar todos os Em: Rio de Janeiro, Anais, EREBIO, 1, 389-
conceitos através de jogos; as aulas podem 92.
transformar-se em verdadeiros cassinos, tor- Grando, R.C. (2000). O conhecimento mate-
nando-se sem sentido para o aluno; a perda da mático e o uso de jogos na sala de aula. Tese
"ludicidade" pela interferência constante do de Doutorado, Faculdade de Educação,
professor pode destruir a essência do jogo; a UNICAMP, Campinas, SP.
coerção do professor, exigindo que o aluno Kishimoto, T.M. (1996). Jogo, Brinquedo,
jogue, mesmo que ele não queira, destruindo a Brincadeira e a Educação. São Paulo: Cortez,
voluntariedade pertencente à natureza do jo- 183p.
go; a dificuldade de acesso e disponibilidade Kishimoto, T.M. (1998). O Jogo e a Educa-
ção Infantil. São Paulo: Pioneira.

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Kishimoto, T.M. (2002). O Brincar e suas tros Curriculares Nacionais (1998). Brasília:
teorias. São Paulo: Pioneira Thomson Lear- MEC/SEF..
ning. Pozo, J.I. (1998). Teorias Cognitivas da A-
Miranda, S. (2001). No Fascínio do jogo, a prendizagem. 3ª ed. (Trad. J.A. Llorens). Por-
alegria de aprender. Ciência Hoje, v.28, p. 64- to Alegre: Artes Médicas, 284p.
66. Spigolon, R. (2006). A importância do lúdico
MEC – Ministério da Educação – Secretaria no aprendizado. Trabalho de conclusão de
de Educação Fundamental - PCN’s Parâme- curso (graduação), Faculdade de Educação,
UNICAMP, Campinas, SP.

 - D.A.V. Zanon possui Graduação em Licenciatura em Química (Universidade Federal de São Carlos, UFSCar),
Mestrado, Doutorado em Educação na Área de Metodologia de Ensino (UFSCar) e Pós-doutoramento na Área de Ensi-
no, Avaliação e Formação de Professores (Universiadde Estadual de Campinas, UNICAMP). Atua como Professora do
Departamento de Didática (FCL/UNESP/Araraquara). E-mail para correspondência: cdzanon@uol.com.br. M.A.S.
Guerreiro possui Graduação em Licenciatura em Química (UNESP). R.C. de Oliveira possui Graduação em Licenciatu-
ra e Bacharelado em Química (UNESP).

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Anexo A

Jogo didático para o ensino de nomenclatura de compostos orgânicos: regras gerais.

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