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Recife
2019
A imagem de Proust
No texto A imagem de Proust, Walter Benjamim, tece inúmeros elegios à obra
de Marcel Proust que deixa o leitor que nunca leu os escritos do autor francês, no
mínimo, curioso. Para Benjamin, os volumes de A la recherce du temps perdu são o
“resultado de uma síntese impossível, em que Proust, absorvendo e condensando o
místico, a arte do prosador, a verve do autor satírico e o saber erudito em uma obra
autobiográfica, a torna excepcional” p.37. A imagem de Proust, segundo Benjamim,
“é a mais alta fisionomia que a crescente discrepância entre poesia e vida poderia
assumir”. p.37.
Benjamin explica que Proust não descreveu em sua obra a vida como de fato foi,
mas sim uma vida rememorada por quem a viveu. Assim, o autor alemão analisa o texto
de Proust observando a relação das camadas da memória sobre a linguagem e como isso
se reflete na estrutura discursiva da obra. Temos acesso então a diversas reflexões
cheias de metáforas que nos deslocam do debate engessado de autores que possuem
uma escrita mais densa, para a dimensão benjaminiana que nos leva a refletir, a partir da
obra literária de Proust, sobre conceitos científicos que discutimos na academia. O autor
alemão levanta questões como os métodos de rememoração, os tipos de memória
envolvidas no ato de rememorar (voluntária e involuntária), assim como analisa os
conceitos de lembrança e esquecimento.
Experiência e pobreza
Um ponto importante do texto trata da volta dos soldados que lutaram nas
trincheiras da primeira guerra mundial: “que os combatentes tinham voltado silenciosos
do campo de batalha. Mais pobres em experiências comunicáveis, e não mais ricos”. O
mutismo dos soldados pertencentes a uma geração que fora a escola em carroças
puxadas por cavalos pode estar ligado às vivências que tiveram das forças bélicas em
um avanço técnico em que nunca tinham sequer imaginado, além dos traumas e horrores
vivenciados em que a sua linguagem não dava conta de expressar todo o sofrimento e
transformá-lo em experiência. A guerra acabou com a ideia de que existia um acumulo
de experiência que poderia ser transmitida para gerações seguintes. Essas experiências
se materializavam em pequenos ensinamentos, recomendações provérbios que serviam
para as pessoas pensarem o seu lugar no mundo.
O autor parte do trabalho do escritor Nikolai Leskov para defender a tese de que
a arte de narrar histórias está em extinção. Benjamin observa na guerra o processo
manifesto de que a transmissão de experiência encontra-se em baixa ao constatar que os
soldados voltavam mudos do campo de batalha, mais pobres em experiência
comunicável. O autor afirma que as melhores narrativas escritas são “as que menos se
distinguem das histórias orais contadas pelos inúmeros narradores anônimos”. (p.
214). Os narradores que o autor se refere podem ser encontrados em dois grupos: o
narrador que vem de longe presente na figura do marinheiro comerciante e o narrador
que vive sem sair de seu país e conhece bem a tradição, o qual Benjamin define como a
figura do camponês sedentário.
Benjamin tece uma narrativa em que analisa as obras de Leskov e fala a respeito
da arte de narrar. Para ele, existe um senso prático nos bons narradores como Leskov: a
capacidade de saber dar conselhos que pode consistir em ensinamentos morais, num
provérbio ou norma de vida. Benjamin deixa mais claro: “Aconselhar é menos
responder a uma pergunta do que fazer uma sugestão sobre a continuação de uma
história que está se desenrolando”