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CPGEI - Tópicos Especiais em Informática Industrial IIIC

Dinâmica Não-Linear e Caos

[ M.S. Freitas / UTFPR ]


Prof. Mário Sérgio T. de Freitas, Dr. - UTFPR/DAFIS
http://www.pessoal.utfpr.edu.br/msergio/caos_disc.htm
msergio58@yahoo.com.br
Ementa
1 – EQUAÇÕES A DIFERENÇAS FINITAS ( “MAPAS” )
2 – REDES BOOLEANAS E AUTÔMATOS CELULARES
3 – AUTOSSIMILARIDADE E GEOMETRIA FRACTAL
4 – EQUAÇÕES DIFERENCIAIS UNIDIMENSIONAIS
5 – EQUAÇÕES DIFERENCIAIS BIDIMENSIONAIS

texto-base: D.Kaplan, L.Glass


Understanding Nonlinear Dynamics
(Springer, N.Y, 1995).
CAP 4
[ M.S. Freitas / UTFPR ]
EQUAÇÕES DIFERENCIAIS UNIDIMENSIONAIS
4.1. Definições Básicas

* exemplo para motivação:


experiência com amostras radioativas

mesma substância (ATP)


[fig. 4.1]

1a amostra: 24μL a –20oC


2a amostra: 1μL a –70oC

→ conclusão falsa:
* decaimento mais rápido para temperatura mais alta

→ conclusão correta:
* decaimento mais rápido para amostra de maior massa

[ http://staff.jccc.net/pdecell/cellresp/atp1.gif ]
seja x(t) a quantidade do isótopo P32 a cada instante

→ taxa de variação temporal de x num dado instante:


* depende do valor de x no mesmo instante

no caso → dx/dt é diretamente proporcional a x

dx
= −bx
dt
sinal negativo: taxa de decaimento
http://www.lon-capa.org/~mmp/applist/decay/decay.htm
http://www.pessoal.utfpr.edu.br/msergio/cap4/1TaxaDecaimento/index.html

objetivo deste capítulo:

“eqs. difs. de uma única variável, ordinárias, de 1a ordem”

→ não envolve derivadas parciais; só totais

→ envolve só derivadas primeiras


duas abordagens alternativas:

* resolução analítica:
encontrar expressão geral x=x(t)

* abordagem geométrica:
localizar pontos fixos estáveis e instáveis

4.2. Crescimento e Decaimento

seja a quantidade variável com o tempo x (t)

* nos valores de x para os quais x aumenta: dx/dt > 0


* nos valores de x para os quais x diminui: dx/dt < 0
* nos valores de x em que x permanece constante: dx/dt = 0
“ESTADO ESTACIONÁRIO” ou “PONTO FIXO”

(estado análogo ao das eqs. a diferenças finitas – Cap. 1)


CRESCIMENTO E
DECAIMENTO CONSTANTE

exemplo:
* piscina esvaziada por
uma bomba de vazão w

volume da água: x(t)

equação diferencial:
dx/dt = − w

* para obter x(t) → integração


x (t ) t
∫ ∫ − wdt
dx = - w dt
dx =
x(0) 0
x(t) – x(0) = - w t ∴ x(t) = x(0) – w t [fig. 4.2]
(neste caso, válido para x>0)

crescimento constante:
dx/dt = w ∴ x(t) = x(0) + w t [fig. 4.3]
CRESCIMENTO E DECAIMENTO EXPONENCIAL
exemplos:
* rendimento de uma conta bancária

[ http://onlymoments.wordpress.com/2008/09/ ]
* tráfego na internet [fig. pg. 156]
* reprodução de bactérias
http://www.pessoal.utfpr.edu.br/msergio/cap4/2CurvaCrescimentoCacterias/index.html

* diluição de um contaminante, etc.


[ http://mediaenvironment.wordpress.com/author/bryand09/]
modelo matemático: dx/dt = a x
( equação diferencial linear )

resolução analítica: integração

dx
x (t ) t
∫x (0) x = a ∫0 dt
ln x(t) – ln x(0) = a t

∴ x(t) = x(0) e a t

x(0) : condição inicial


[ M.S. Freitas / UTFPR ]

a > 0 : crescimento exponencial

a < 0 : decaimento exponencial


LIMITES PARA O CRESCIMENTO EXPONENCIAL

→ dois tipos de modificação no modelo matemático:

a) crescimento de Verhulst
ou crescimento logístico

exemplo: população de moscas num bosque


(CAP 1)

dx/dt = k x − α x2
k (> 0) e α (> 0) constantes

* justificativa:
análoga à do mapa logístico
* dinâmica: muito menos rica!

[ http://www.pbase.com/k_amj/image/63870791 ]
* solução:

k x (0 )
x (t ) =
[ k − α x ( 0 )] e − k t + α x ( 0 )

para t → ∞ : x(t) = k / α
* estado assintótico estacionário:
independe da condição inicial

se x(0) < k/α →


crescimento monotônico até k/α
[fig. 4.8]
se x(0) > k/α →
decaimento monotônico até k/α

* nunca ocorre aproximação oscilatória, como num mapa!

[ http://respeitoanatureza.blogspot.com/2008/08/borboletas-azuis.html ]
b) equação de Gompertz

* exemplo:
crescimento de um organismo vivo

dx/dt = k e - α t x

constantes
k (> 0) e α (> 0)

* solução: x(t) = x(0) exp[ (k/α) ( 1 – e − α t ) ]

para t → ∞: x(t) = x(0) e ( k / α ) (estado assintótico estacionário)

* o estado final depende da condição inicial (e é sempre maior!)


[fig. pg. 164]
4.3. Múltiplos Pontos Fixos

exemplo: altura V(t) do capim em um pasto com H vacas

[ Nerival Rodrigues, “Vaquinhas no Pasto”, 30x40 cm]


1o caso: valor inicial do capim V(0) alto

* as vacas se alimentam de uma parte do capim e engordam


* o capim restante cresce e passa a ser consumido
lentamente
* capim e vacas atingem um estado estacionário “bom”

2o caso: valor inicial do capim V(0) baixo, começando a brotar

* as vacas consomem rapidamente


os poucos brotos que nascem

* o capim não se desenvolve e


as vacas não engordam

* capim e vacas atingem um


estado estacionário “ruim”

[ http://zecanet.com/2009/02/a-eterna-crise/ ]
conclusão → a condição inicial afeta o estado final

variável da equação diferencial : quantidade de capim V(t)


condição inicial V(0)

equação diferencial:
taxa temporal de V = taxa de crescimento – taxa de consumo

* taxa de crescimento logístico G :


G(V) = r V [ 1 – ( V/K ) ] ; r (>0) e K (>0) constantes

* taxa de consumo: no de vacas × taxa de consumo por vaca


número de vacas H
taxa de consumo por vaca c :
depende de V → curva sigmoidal
c(V) = β V2 / ( V02 + V 2 ) ; β e V0 constantes

então: dV/dt = G(V) – H c(V)

estado estacionário → dV/dt = 0 ∴ H c(V) = G (V)


* graficamente: está na interseção das curvas H c(V) e G(V) [fig. 4.9]

→ para H = 10 : duas interseções

V = 0 (sem capim; vacas morrendo de inanição)


V = 22 (capim crescido; vacas gordas comendo lentamente)

→ para H = 30 : duas interseções

V=0
V = 1 (capim raso; vacas devorando o que crescer)

→ para H = 20 : quatro interseções

V = 0 ; V ≈ 2 (estados estacionários desfavoráveis)


V ≈ 7.5 ; V ≈ 16 (estados estacionários favoráveis)

* para ter uma noção geral da dinâmica:


(ex: em qual dos estados possíveis o sistema se estabiliza?)
→ análise geométrica!
4.4. Análise Geométrica de Equações Diferenciais Não-Lineares

* fornece informações importantes sobre a dinâmica do sistema


* pesquisa os pontos fixos e sua estabilidade
* dispensa a integração (analítica ou numérica)
* analogia completa com os mapas unidimensionais – Cap. 1
* características em comum com o método da “teia de aranha”
* dinâmica muito menos rica!

equação diferencial unidimensional genérica:


dx/dt = f(x)

gráfico de dx/dt em função de x [fig. 4.10]


intervalos nos quais dx/dt > 0 → x está aumentando
intervalos nos quais dx/dt < 0 → x está diminuindo
pontos de transição: dx/dt = 0 → x permanece constante
(pontos fixos)
no exemplo das vacas: gráfico de dV/dt em função de V
dV/dt = G(V) – H c(V) [fig. 4.11]

caso H = 30

ponto fixo estável : V=1


V>1 → dV/dt < 0 ∴ V diminui aproximando de 1
V<1 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta aproximando de 1
ponto fixo instável : V=0
V>0 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta se afastando de 0

caso H = 10

ponto fixo estável : V=22


V>22 → dV/dt < 0 ∴ V diminui aproximando de 22
V<22 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta aproximando de 22
ponto fixo instável : V=0
V>0 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta afastando de 0
caso H = 20

pontos fixos estáveis : V=2 e V=16


pontos fixos instáveis : V=0 e V=7.5

0<V<2 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta aproximando de 2


2<V<7.5 → dV/dt < 0 ∴ V diminui aproximando de 2
7.5<V<16 → dV/dt > 0 ∴ V aumenta aproximando de 16
V>16 → dV/dt < 0 ∴ V diminui aproximando de 16

o estado final depende da condição inicial!

bacia de atração do ponto fixo V=2: 0<V<7.5

bacia de atração do ponto fixo V=16: V>7.5


4.5. Análise Algébrica de Pontos Fixos

* análoga à de mapas unidimensionais

para a equação diferencial dx/dt = f(x)

→ condição de ponto fixo x*:


(dx/dt)|x=x* = 0 ∴ x* deve satisfazer à equação f(x*)=0

método algébrico: f(x) é uma função não-linear!


* expande em série de Taylor
→ vale para qualquer x na vizinhança de x*
→ só são considerados os termos até 1a ordem

f(x) = f(x*) + (df/dx)|x=x* (x-x*) + . . .

lembrando que
→ f(x) = dx/dt
→ f(x*) = (dx/dt) )|x=x* = 0

dx/dt = (df/dx) )|x=x* (x – x*)


fazendo:
(df/dx) )|x=x* = m
x - x* = y
dx/dt = d(y+x*)/dt = dy/dt

dy/dt = m y

equação diferencial linear

se m>0 → crescimento exponencial afastando de x* (instável)


se m<0 → decaimento exponencial aproximando de x* (estável)
4.7. Equações Diferenciais versus Equações a Diferenças Finitas

cap. 1 → mapas unidimensionais não-lineares

x t +1 = f ( x t )

tempo discreto : muitos tipos possíveis de dinâmica para mapa

* ponto fixo
* transiente com aproximação ou afastamento monotônico
* transiente com aproximação ou afastamento alternado
* crescimento ilimitado para ±∞
* ciclos periódicos
* caos
* intermitência
* quase-periodicidade
cap. 4 → equações diferenciais unidimensionais não-lineares

dx/dt = f(x)

tempo contínuo :
poucos tipos possíveis de dinâmica para equação diferencial

* ponto fixo
* transiente com aproximação ou afastamento monotônico
* crescimento ilimitado para ±∞

→ nunca podem ser gerados ciclos periódicos, nem caos!

como isso se justifica?


* para haver comportamento alternado, a variável deve:

→ ora aumentar (dx/dt>0) e ora diminuir (dx/dt<0)


→ nas duas situações, deve visitar os mesmos valores de x

* se dx/dt for uma função só de x (equação unidimensional):

→ para cada x, existe um único valor possível de dx/dt

então não pode alternar!


não pode haver ciclos!
não pode haver caos!

* ou decai monotonicamente tendendo para um ponto fixo


* ou cresce monotonicamente tendendo para um ponto fixo
* ou cresce monotonicamente tendendo para ±∞

o que permite outros comportamentos num mapa unidimensional?


→ o tempo não é contínuo

→ a variável pode “pular” de um valor para outro


para comparar matematicamente:
* aproxima a equação diferencial por um mapa equivalente
* variável tempo discretizada em intervalos Δ:
xt ≡ x(t) p/ t = 0, Δ ,2Δ ,3Δ, ...
(Δ é um número arbitrário, mas “pequeno”)
mapa com mesma dinâmica da equação não-linear dx/dt = f(x):
x t +1 = xt + f(xt) . Δ
(valor atual = valor anterior + taxa anterior × tempo)

exemplo: eq. de Verhulst com k=1.2 e α=1.2

estado estacionário → x* = k/α = 1.2/1.2 = 1.0


(independe da condição inicial)

dx/dt = f(x) = 1.2 x – 1.2 x2 [fig. 4.15]


arbitra: Δ=0.5
ex: com x0 = 0.30
x1 = 0.30 + [1.2 × 0.30 – 1.2 × 0.302] × 0.5 = 0.43
x2 = 0.43 + [1.2 × 0.43 – 1.2 × 0.432] × 0.5 = 0.57
...
x8 = 0.98 + [1.2 × 0.98 – 1.2 × 0.982] × 0.5 = 0.99
x9 = 0.99 + [1.2 × 0.99 – 1.2 × 0.992] × 0.5 = 1.00
x10 = 1.00 + [1.2 × 1.00 – 1.2 × 1.002] × 0.5 = 1.00
...
diagrama de teia de aranha: [fig. 4.16]

* o critério para pontos fixos da eq. dif. é mantido no mapa:

dx/dt = 0 ∴ f(x) = 0
x t +1 = x t ∴ x t = x t + f(xt) Δ → f(xt) = 0 confere!
aproximação ou afastamento do ponto fixo num mapa (cap. 1):

* comportamento monotônico → (dx t +1 / dx t )|x* > 0

* comportamento alternado → (dx t +1 / dx t )|x* < 0

no caso: x t +1 = xt + f(xt) . Δ

derivando em relação a xt:

(dx t +1 /dx t)|x* = 1 + (df/dx)|x* . Δ

mas Δ é arbitrariamente pequeno!

mesmo com (df/dx)|x* < 0 → (dx t +1 /dx t)|x* > 0


por isso só ocorrem aproximação e afastamento monotônicos
critério de estabilidade de um ponto fixo num mapa (cap. 1):

ponto fixo estável → (dx t +1 / dx t )|x* < 1


ponto fixo instável → (dx t +1 / dx t )|x* > 1

no caso: x t +1 = xt + f(xt) . Δ

a expressão para a derivada é a mesma da análise anterior:

(dx t +1 /dx t)|x* = 1 + (df/dx)|x* . Δ

então

* ponto fixo estável → (df/dx)|x* < 0


* ponto fixo instável → (df/dx)|x* > 0
pesquisa de um ciclo de período 2:
x t +2 = x t sendo x t +1 ≠ x t → é possível?

no caso: x t +1 = xt + f(xt) . Δ
então x t +2 = x t +1 + f(x t + 1 ) . Δ
∴ x t +2 = x t + f(x t) . Δ + f(x t + 1 ) . Δ

para x* satisfazer a condição acima com Δ pequeno:


→ é necessário que satisfaça também x t +1 = xt

* não há ciclo de período 2 ( ou com qualquer outro com n > 1)

justificativa das restrições:


* continuidade da variável tempo ( Δ → 0)

se não for feito Δ suficientemente pequeno:

* o mapa não reproduz a dinâmica da equação diferencial !


4.7. Resposta Dinâmica a Impulsos
“impulsos”:
* termos acrescentados à equação diferencial (“entradas”)
→ mostram dependência explícita do tempo

forma geral:
dx/dt = f ( x, I(t) )

exemplo:
* concentração de uma medicação no organismo humano x
* taxa temporal de eliminação dx/dt
* fator de proporcionalidade α < 0
* ingestão do medicamento:
→ valor I em intervalos regulares de tempo I(t)
→ nula entre dois impulsos isolados sucessivos [fig. 4.17]
[ N. M. M. Coelho; N. BaccanI - Eclet. Quim. vol.29 no.1 Sao Paulo 2004 ]

dx/dt = α x + I(t)
(equação diferencial linear com entrada)
I(t) → obtida por superposição linear de N impulsos isolados I

N
I (t ) = ∑ I i (t )
i =1
[fig. 4.18]
artifício importante: somar um termo extra I0(t) = 0
→ fica representado o decaimento antes do primeiro impulso
( “resposta transiente” )
4.8. Retardos de Tempo e Comportamento Caótico

taxa de variação nos casos anteriores:

→ depende do valor da variável no mesmo instante


outras situações:
→ pode depender também de um valor passado (retardo τ)
dx/dt = P( x (t- τ) ) - α x (t)

* o modelo admite uma dinâmica bem mais rica


* já não se tem uma única variável afetando a taxa de variação
* o estado depende de toda a evolução no intervalo de t - τ a t
* deixa de ter dimensão 1 para ter dimensão infinita
modelos adotados:

função P sigmoidal [fig. 4.23]


→ admite a ocorrência de oscilações periódicas estáveis

função P com uma única corcova [fig. 4.24]


* ocorrem:
→ pontos fixos
→ ciclos periódicos
→ bifurcações por duplicação de período
→ caos [fig. 4.25]
exemplo: modelo de Nicholson
para moscas (“blowflies”)
* tempo contínuo (equação diferencial)
* baseado em argumentos sobre maturação, competição e morte
* condições ambientais mantidas constantes
* observadas intensas flutuações na população [figs. pg. 186]

matematicamente:

→ taxa de variação populacional dx(t)/dt


→ aumento devido aos ovos que chegam à idade adulta A(t - τ)
→ redução devida à mortalidade de adultos R(t)

dx/dt = A – R
* tempo típico para um ovo chegar à idade adulta → τ (retardo)

* probabilidade para um ovo chegar à idade adulta


→ é menor para um grande número de ovos (competição)

* número de ovos postos


→ só depende da população atual de adultos

* taxa de mortalidade → proporcional ao número atual de adultos

R(t) = α x(t)
A(t) = P( x(t - τ) )

dx/dt = P( x (t − τ) ) − α x (t)

integração da equação: confrontada com testes de laboratório


... continua

(CAP 5)

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