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História da Paraíba Professor Welton

HISTÓRIA DA PARAÍBA - PROFESSOR WELTON terror entre seus colonos. O cerco durou um mês ate que
invadiram Igaraçu para o massacre geral. Depois disso
Resistência e Conquista da Paraíba. durante alguns anos acalmaram-se potiguaras e portugueses.
Ficou limitada à ilha a ocupação de Itamaracá. A próspera
1. Antecedentes capitania de Pernambuco sentia perigo dessa aliança
As expedições para guardar a costa e a colonizadora de poderosa, que devia ser dominada.
Martim Afonso de Souza, não eram suficientes para varrer Um mameluco conquistou a confiança dos potiguaras
do nosso imenso litoral as investidas dos aventureiros que de tal forma que se casou com a filha de 15 anos do chefe
partilhavam nossa costa. Os intrusos especialmente Inigaçu (Rede Grande), e pouco tempo depois fugiu para
franceses, procuraram se fixar na costa com base no uti- Olinda. Iniguaçu mandou dois de seus filhos à Olinda que
possidetis, que assegurava a posse da terra a quem falaram com Antônio Salema (governador geral de passagem
efetivamente ocupasse. Para piorar, os franceses fizeram pela capitania) que mandou entregar a cunhã.
amizade com os índios e os instigaram contra os Em regresso passaram pelo engenho de Diogo Dias, um
portugueses. Eles não vinham para ficar e pouco se rico mercador de Pernambuco que tinha resolvido montar
interessavam pela colonização do Brasil, ou melhor fizeram um engenho às margens do Tracunhaém (nas proximidades
tudo para impedi-la. da atual cidade de Goiana), encantado com a beleza moça,
Além de bugigangas, ferramentas e outros presentes resolveu rapta-la. Iniguaçu mandou dois representantes para
mais baratos, eles conscientizavam os índios para não o resgate e estes foram enganados tanto por Diogo quanto
aceitarem os “perós” (portugueses) que vinham para cá, pelo seu amigo o capitão-mor de Itamaracá. Acontecimento
tomar suas mulheres e suas terras. E mais ainda, deram aos esse que teria passado sem maiores conseqüências se não
índios armas e os ensinaram a usá-las. Quando os fossem os franceses atiçando uma reação violenta por tal
portugueses aqui chegaram, já encontraram milhares de ultraje.
inimigos. Na Paraíba há indícios que os franceses haviam se Em princípio de 1574 milhares de potiguaras desceram
fixado na Baía da Traição desde 1519, para contrabando do a serra e de madrugada puseram cerco ao engenho de Diogo
pau-brasil. Dias, de manha os potiguaras atraíram o inimigo para o
O rei de Portugal chegou a conclusão de que devia campo aberto e cercando-os iniciaram a matança, em torno
povoar a costa brasileira, para conter os contrabandistas de 600 pessoas entre escravos, índios “domesticados” e
estrangeiros e, para isto criou o Sistema de Capitanias colonos foram mortos, escapando apenas dois filhos de
Hereditárias, e doou-as a fidalgos da sua corte, passando Diogo que não estavam no engenho. No ano seguinte um
assim para a iniciativa particular os custos e a deles o Boaventura Dias tenta reconstruir o engenho que é
responsabilidade da colonização, a exemplo do que já havia novamente tomado pela fúria dos potiguaras. Boaventura
feito em outras colônias. provavelmente escapou por não estar lá.
Foram 15 capitanias para doze donatários, entre elas a Após a tragédia de Tracunhaém, em 1574, o rei de
capitania de Itamaracá datada de 1534, que ia da foz do rio Portugal ordena de imediato o desmembramento de
Santa Cruz (depois chamado de Igaraçu), até a Baía da Itamaracá na época ocupada por apenas 32 pessoas, surge
Traição, sendo doado a Pero Lopes de Sousa. Quando ele assim a Capitania Real do rio Paraíba que começava no rio
esteve em Itamaracá, desalojou uns franceses, deixou Goiana até a Baía da Traição. Sendo esta a terceira depois de
Francisco Braga como administrador. Este porém, nada pode Rio de Janeiro e Bahia Com isso a ocupação da paraíba
fazer, não dispunha de recursos e além disso, como vizinha passava para a empresa da coroa.
de Pernambuco, Itamaracá estava datada a não prosperar. Muito sangue e sacrifício custaria a dominação da terra
Houve incidentes entre Duarte Coelho e Francisco Braga, rebelde, que contra o braço dos pernambucanos resistiria
tendo este último, abandonado a capitania já em decadência. bravamente onze anos a conquista e por mais quatorze se
Pero Lopes de Souza havia morrido em 1539, D. Isabel de tornaria palco de sanguinolentas lutas. Porém a ganância
Gamboa (sua viúva), envia João Gonçalves para governar mantinha o desejo colonizado que devia continuar a sua
Itamaracá. marcha e se estender para as demais capitanias do norte.
O novo governador, encontrou a capitania numa
situação deplorável. Contudo, conseguiu fundar na ilha, a Expedições para a Conquista
Vila de Conceição e conseguiu construir alguns engenhos à D. Luís de Brito Governador Geral do Brasil, recebe a
margens do Tracunhaém principal braço do rio Goiana. Uma ordem do rei de Portugal, D. Sebastião, para castigar os
grande seca assola a região em 1545, por isso os potiguaras índios pela tragédia de Tracunhaém, expulsar os franceses e
desciam constantemente da serra da Capaoba (atual Serra da erguer uma cidade às margens do rio Paraíba. Não podendo
Raiz) para Itamaracá e Pernambuco atacando as vilas a vir pessoalmente, D. Luís enviou o Ouvidor Geral D. Fernão
procura de mantimentos. João Gonçalves morre após esse da Silva. Quatro expedições foram feitas durante onze anos,
período, Itamaracá entra novamente em declínio e se torna somente a quinta vingou depois de acordo estabelecido entre
um refúgio de malfeitores. Tabajaras e portugueses contra franceses e potiguaras. Em
Os potiguaras aliados aos franceses, continuaram nas meio a este período ocorre a união das coroas ibéricas.
tropelias e devastações. Diante do trabalho escravo no qual
eram submetidos, 8 mil deles puseram cerco à Igaraçu, de tal 1.2.1. A primeira em 1574.
modo que ninguém entrava nem saia de Itamaracá, gerando
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Comandante: D. Fernão da Silva (Ouvidor Geral). A forte na margem esquerda do Paraíba. Porém os planos são
expedição veio com muita gente, a cavalo e a pé. D. Fernão fracassados mediante os constantes ataques dos potiguaras
aqui chegando não encontrou nenhuma resistência e tomou resolveram então se retirar diante da força nativa.
posse da terra em nome do rei de Portugal. Os índios porém Os conquistadores estavam mais desanimados e os
estavam à espreita nos matos e investiram contra a índios, mais revigorados com suas vitórias o que alimentou
expedição que voltou às pressas para Pernambuco. mais ataques sitiando os colonos na ilha de Itamaracá.
Em 1583, chega ao Brasil, o primeiro Governador Geral
1.2.2. A segunda em 1582. do Brasil nomeado pelo rei da Espanha, Manoel Teles
Inicialmente ressalva-se que houveram algumas Barreto. O novo governador trouxe como missão especial,
tentativas antes da chegada de uma segunda expedição à expulsar os franceses do rio Paraíba e atender os clamores
Paraíba. Sabendo do fracasso da primeira expedição, em dos colonos de Itamaracá. A questão da conquista tomava
1975 o Governador Geral, D Luís de Brito preparou uma novos rumos. Os indígenas se sentiam mais reforçados, após
para juntamente com seu sobrinho Berrando Pimentel d’ tantas vitórias. Os franceses continuavam a agir por trás dos
Almeida, vir à Paraíba e conquistá-la. Porém os ventos Potiguaras. O rei espanhol toma o seu encargo a conquista
foram desfavoráveis e o governador voltou à Bahia sem dessa região que começava a temer ficando definitivamente
conseguir seu intento, não chegando sequer, a solo com os franceses.
Paraibano.
Em 1578, chega o novo Governador Geral do Brasil, 1.2.3. A terceira em 1584.
Lourenço da Veiga, que deu ordens ao Ouvidor Geral, O general Diogo Flores Valdez (espanhol) chegara a
Cosme Rangel de Macêdo e Cristóvão de Barros, Provedor- Bahia. Vinha de uma viagem mal sucedida ao Estreito de
mor, para organizarem uma expedição para conquistar a Magalhães. Manoel Teles Barreto o encarrega da conquista
Paraíba. Os moradores de Itamaracá estavam recolhidos à do rio Paraíba. Veio nessa expedição o ouvidor-mor Martim
ilha, por causa dos ataques dos índios, não havendo portanto Leitão a quem o governador confiou a chefia da nova
condições de aproximação ao rio Paraíba, não havendo expedição, este organizou gente e armas, mas ficou em
portanto o cumprimento da missão. Pernambuco enquanto Valdez veio por mar juntamente com
Em 1578, morre D. Sebastião rei de Portugal na batalha Frutuoso Barbosa. Felipe de Moura, indicado de Martim
contra os mouros em Alcácer-Quibir, na África, sem deixar Leitão chefiou uma outra que veio por terra.
herdeiros para o trono. Assume seu tio octogenário o cardeal Flores de Valdez aqui chegando, encontrou
D. Henrique, o mesmo acabou morrendo em 1580. A franceses, destruindo-os. Logo desembarcou e tomou posse
dinastia dos Ávis é extinta. E na falta de um herdeiro da terra. A expedição por terra chegou. Começando os
legítimo em Portugal, o rei da Espanha ocupa o trono, planos para fortificação da região e as discussões, quanto ao
reunindo as duas coroas ibéricas. Havia acontecido o que os local do forte. Valdez queria construí-lo à margem esquerda
portugueses sempre temeram, desde a fundação gloriosa do do rio Paraíba. Frutuoso queria na foz do rio, no mesmo
seu pequeno reino. lugar onde se encontra hoje a Fortaleza de Santa Catarina em
Antes da União Ibérica, Frutuoso Barbosa, um rico Cabedelo. A partir disso, as desavenças entre eles só iriam
comerciante português, se comprometia a conquistar o rio aumentar, Frutuoso queria seu direito de autoridade
Paraíba às suas custas, em favor de sua nomeação de concedido pelo rei se conquistasse a Paraíba, Valdez
capitão-mor em 1579 por dez anos. O rei de Portugal D. argumentava que nada ele teria feito para ocupar a região.
Henrique, lhe fez essa concessão. Frutuoso achou que seria Venceu a opinião do espanhol e o forte foi construído,
fácil já que ele mesmo já teria vindo mais de uma vez a recebendo a denominação de São Tiago e São Felipe
Paraíba e manteve relações amigáveis com os potiguaras em (primeiro de maio de 1584), em bajulação à Felipe II.
épocas de paz.. O general Castelhano Valdez, antes de partir para a
Depois de chegar à Pernambuco, uma tormenta Espanha deixou Francisco Castejon como capitão do forte e
acontece e sua esquadra teria chegado às Índias de Castela dos soldados espanhóis e Frutuoso Barbosa, chefe dos
(Antilhas). Não conseguiu pois a expedição chegar a soldados portugueses. Mas se a união das coroas ibéricas a
Paraíba. Barbosa perdeu quase toda a esquadra e ainda a estava empreendida pela conquista, essa união não se
esposa. Voltando em seguida para Portugal. estendia aos súditos de Felipe II, os portugueses jamais se
Frutuoso Barbosa já refeito dos prejuízos, tenta mais conformariam com a dominação espanhola, os espanhóis
uma vez tenta conquistar a região paraibana. Havia exigiam para si todos os privilégios por conta de ser o seu
conseguido de D. Felipe II (rei da Espanha), a mesma rei, o rei também de Portugal, dificultando, assim, o bom
concessão que lhe fizera o rei de Portugal: o governo da andamento da política.
Paraíba por dez anos. Enquanto Frutuoso vem por mar, o Estabelecidos no forte, batem-se em campanha chefiada
sargento - mor, Simão Rodrigues vem por terra. por Felipe Moura para acabar com a ameaça nativa,
Aqui chegando, incendeiam navios franceses que chegando numa campina que chamaram de Campo das
estavam carregados de pau-brasil, e outras madeiras. A Ostras acamparam e no quinto dia foram atacados, de
aparente vitória anima a expedição. Porém são vítimas de maneira que mais de trinta morreram, os sobreviventes
uma cilada dos índios, instigados pelos franceses. No fugiram em desespero tal que “passaram uns por cima dos
combate, morre o filho de Frutuoso. Ao chegar o reforço por outros como se fossem uma mui boa ponte”.
terra, conseguiram algumas vitórias e tentaram construir um
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Os potiguaras encurralaram o forte que se tornou nesse Como nesse encontro os comandados de Martim Leitão
momento todo o limite da ocupação e dentro dele dois não foram massacrados pelos índios de Piragibe, os
chefes, Castejon e Frutuoso que não se entendiam, unidos Potiguaras começaram a desconfiar de seus irmãos de
apenas pelo medo. A situação do cerco tomou tal proporção sangue. Este foi o empasse que Piragibe sofreu, ter que
que na falta de outros recursos comeram todos os cavalos novamente debandar para outra região se entrasse em
deixados no forte. Sabendo disso Martim Leitão mandou conflito com os portugueses ou ser considerado traidor pelos
provisões e armamentos que não duraram muito e a situação potiguaras.
ficou na mesma. Castejon conseguiu fugir e conseguir novos Vendo que as negociações foram frustradas, Martim
recursos, percebendo a presença francesa na Baia da Leitão se empenhou sobre a tribo Tabajara que estava vazia,
Traição, atacaram as naus e de volta para forte os ventos chegando após ao Forte de S. Tiago e S. Felipe,
desviaram a rota acabaram chegando nas Antilhas. encontrando-o em estado deplorável. Além de doenças, fome
e miséria, perdurava a célebre discórdia entre portugueses e
Tabajaras chegam à Paraíba espanhóis. Martim Leitão tenta convencer Frutuoso a ocupar
Pouco tempo antes de 1585, chegara ao solo Paraibano, a região, mas, ele só pensava em sair daquele inferno. Por
o valente cacique Piragibe (Braço de Peixe) com sua tribo isso o substituiu por Pero Lopes de Lobo.
Tabajara. Vinham do Vale do São Francisco, na Bahia. A Dois dias depois de sua chegada, Martim Leitão pensa
situação piorava para os conquistadores, Piragibe estava em voltar com Pero Lopes Lobo para onde iriam edificar a
revoltado com os portugueses havia sofrido uma traição de cidade e ordena João Pais Barreto ir numa campanha com
Francisco das Chagas, no qual em 1573 pediu apoio de 300 homens para a Baia da Traição, pretendendo inclusive ir
Piragibe para aprisionar índios no interior e ainda pretendia também, só que tudo desmantelou quando boa parte de
traiçoeiramente atacar os tabajaras, em represália o matara, contingente adoeceu. Depois de alguma melhora investiram
bem como os que o acompanhavam. Temendo o castigo do novamente contra os potiguaras que abandonaram as aldeias
governador-geral, fugiu para a região do rio Paraíba. que foram queimadas.
Chegando 11 anos depois, os tabajaras estabeleceram Martim Leitão deixou Pero Lopes com bons
acordo com os potiguaras que ficaram onde estavam, no mantimentos e volta para Olinda no mês de Abril, onde foi
leito esquerdo do Paraíba desde sua foz ao sertão da considerado herói da conquista, mas ele próprio reconhecia
Capaoba e os tabajaras na margem oposta alargando-se até que ainda não havia feito muita coisa. A primeira má notícia
Itamaracá e se possível desalojar os colonos. Agora foi que Pero Lopes havia abandonado o forte. As coisas
potiguaras e tabajaras punham cerco ao forte. pioravam, quando soube que Castejon, além de ter
abandonado e destruído o Forte, jogara ao mar toda a
1.2.4. A quarta em 1585. artilharia. Destruíra todo o feito de Valdez, Martim Leitão o
Investido da autoridade real, que lhe foi conferida prendeu e o mandou de volta para a Espanha.
por Felipe II, Martim Leitão preparou um exército com Apesar da aliança, Potiguaras e Tabajaras eram rivais,
homens brancos, índios brancos e escravos. Nessa jornada mesmo pertencendo ao mesmo tronco Tupi. Nesse período
tomou parte Ambrósio Fernandes Brandão, padres da os potiguaras já estavam desconfiando dos tabajaras,
Companhia de Jesus, entre eles os jesuítas Jerônimo chamavam eles de panemas (fracos) pela sua fraca
Machado e Simão Travassos, provavelmente teria sido um resistência, por isso já estavam organizando uma chacina ao
deles ou os dois as testemunhas oculares que escreveram a povo de Piragibe. Sabendo disso, os portugueses instruem
principal fonte documental destes acontecidos o “Sumário um índio Tabajara preso no forte a enviar recados à
das armadas que se fizeram e das guerras que se deram na Piragibe, que ele receberia socorro logo que pedisse.
conquista do rio Paraíba”. Crônica esta feita a mando de
Critovão de Gouveia. 1.2.5. A quinta em 1585.
Depois de vários dias Martim Leitão chega à paraíba o mês de julho quando dois Tabajaras chegaram á
com seu exército. No dia 5 de março, chegam ao Tibirí, ao Olinda com recado de Piragibe, vinham buscar o prometido
cair a noite, e inesperadamente se deparam com uma taba socorro contra os potiguaras que estavam em guerra
indígena. Gerou-se uma grande confusão, principalmente declarada. A boa notícia foi celebrada com festas, Martim
para os índios que, sem defesa, fogem as pressas sendo Leitão escolheu João Tavares para conferenciar com
alguns feitos prisioneiros. No outro dia, ao saber que se Piragibe, seria então um acordo de paz com o branco e de
tratava de índios Tabajara, diplomaticamente, Martim Leitão guerra contra os potiguaras, o célebre encontro deu-se
mandou solta-los, afirmando que não queria lutar com eles, precisamente dia 5 de agosto de 1585, no Varadouro, local
pois o seu intento era os Potiguaras, com os Tabajaras queria onde iniciaria a ocupação. Considerado por muitos como a
paz. data da fundação da cidade paraibana, merece ser revista
Sabia do incidente da Bahia, e que não os condenava com cuidado, visto que sua fundação teria sido no dia 4 de
por aquela matança. Ofereceu sua ajuda caso precisasse. novembro, a data 5 de agosto, dia da padroeira que
Enviou uma mensagem a Piragibe, mas o cacique Tabajara emprestou seu a nome a nova cidade de Nossa Senhora da
não atendeu ao apelo de paz em receio ao que já havia Neves, rememora a chegada de João Tavares e o acordo com
acontecido anos atras, por isso, enfrentou em combate no Piragibe.
qual não houve vencedores nem vencidos. Martim Leitão partiu de Pernambuco para Paraíba no
dia 15 de Outubro de 1585, com alguns amigos, oficiais e
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criados. Com ele vieram pedreiros, carpinteiros e tudo o que A partir daí alguns moradores já iam se estabelecendo
se precisava para sua construção. Da jornada participaram nas margens do Paraíba com roçados e plantação de cana.
também, Manoel Fernandes, mestre de obras de El-rei, Tomadas as providencias, Martim Leitão retorna a
Duarte Gomes da Silveira, Cristóvão Lins (engenheiro) e Pernambuco ainda em fevereiro, deixando João Tavares
outros. como capitão-mor e governante da Paraíba. Tendo sido
Após reconhecerem o local, onde deveria ser fundada “conquistada” em 1585, a Paraíba não viu progresso durante
cidade, os trabalhos começaram, era 4 de novembro de 1585. bom tempo, devido aos atropelos de vários acontecimentos;
A 20 de novembro do mesmo ano Martim Leitão deixa como a usurpação de poder promovido por Morales, as
Cristóvão Lins à frente dos trabalhos e foi até a Bahia da guerras contra os potiguaras e as operações de limpeza do
Traição para desalojar os franceses que lá se concentravam. terreno. Tudo isso gerou a lentidão do processo agrícola e
Era intenção de Martim Leitão, afastar por completo os populacional.
arredores da Paraíba. Encontraram uma tribo potiguar que
foi destruída e continuaram destruindo outras. No terceiro 2. O fim dos conflitos e a consolidação da conquista.
dia de buscas, guiados por índios aprisionados, saíram em
busca de Tijucupapo, um grande chefe feiticeiro potiguar. 2.1. Resistência potiguar e os ataques franceses.
Numa região alagadiça foram atacados em todos os Em 1588, Frutuoso Barbosa reivindicava seu direito
lados por potiguaras, a batalha terminou com vitória dado pelo falecido rei D. Henrique de Portugal em 1579 e
portuguesa. De volta dessa batida, Martim Leitão mandou confirmado em 1581 por Felipe II rei da união ibérica, sobre
apressar as obras da cidade, em pouco tempo estavam a Paraíba. Em sua defesa estava o espanhol D. Pedro de la
construídos: fortes, armazéns, sobrados, bem como casas Cueva, que trazia ordens do rei para João Tavares passar o
para moradores. Antes de regressar para Pernambuco, em 20 cargo para Frutuoso e o de capitão para si. Frutuoso em ato
e janeiro de 1586, Martim Leitão nomeia João Tavares bajulatório ao rei muda o nome da cidade para Filipéia de
Capitão do Forte, deixando-o com 35 homens, providos para Nossa Senhora das Neves. Enquanto isso os potiguaras
quatro meses. retomavam os ataques.
Naquela época chega a Pernambuco o capitão espanhol Frutuoso pede ao capitão para tomar alguma atitude
Francisco Morales, tinha como missão recolher seus militar frente aos ataques dos nativos, argumentando Cueva
conterrâneos no forte paraibano, chegando destituiu João alega que nada poderia fazer sem autorização do rei, gerando
Tavares da função de capitão, passando de comandante para novas discórdias entre portugueses e espanhóis. Os
comandado. Esta fato gerou descontentamento entre os potiguaras atacavam constantemente os moradores de
tabajaras que se amotinaram nas aldeias. capitania e principalmente as aldeias tabajaras. Frutuoso
Os potiguaras investiram contra a tribo de Assento de então pede ajuda a Olinda que em 1590 envia uma nova
Pássaro (primo de Piragibe), localizada no Tibirí (hoje Santa expedição comandada pelo antigo Governador João Tavares
Rita), foram mais de 80 mortos, novamente ameaçando o que morre em batalha contra o gentio.
recente núcleo colonial. Observando o perigo Morales Com sua morte assume o comando da expedição o
abandonou o forte em outubro, passando para Olinda e capitão-mor de Itamaracá Pero Lopes Lobo a pedido de
depois para o reino. Felipe Cavalcante, capitão-mor de Pernambuco. Aqui
Martim Leitão sabendo das más notícias, organiza sua chegando, trata de fazer as pazes entre Frutuoso e La Cueva
terceira visita a Paraíba, e depois de alguns problemas que chegaram a se abraçar, e voltaram a deixar a capitania
chegam em dezembro e logo promovem a caça aos inimigos, em paz. Porém essa trégua não durou muito e logo
partiu-se para o sertão da Capaoba, um exercito composto recomeçam os ataques. O rei espanhol mandou chamar os
por mais de 140 brancos e mamelucos e mais de 500 índios dois, em 1591 Frutuoso deixava o governo da capitania por
tabajaras liderados por Piragibe. Depois de encontrarem vontade própria e foi substituído por André de Albuquerque
tantas aldeias e promoverem a chacina, portugueses e que governou provisoriamente de 1591 à 1592, sendo
tabajaras seguiram em busca do famoso feiticeiro substituído por Feliciano Coelho de Carvalho .
Tijucupapo que teria debandado para o norte. Com grande empenho Feliciano Coelho de Carvalho
Depois de dois dias de viajem rumo ao norte, conseguiu consolidar a conquista da Paraíba. O seu governo
encontram a mais poderosa tribo inimiga, onde houve a foi longo e nossa terra logo logrou com sua administração.
maior briga, do lado dos atacantes morrem 3 e 47 feridos, Juntamente com Pedro Lopes Lobo Capitão-mor de
inclusive Martim Leitão. Não se sabe quantas baixas teve o Itamaracá, organizou ataques indígenas porque os índios não
gentio potiguar, já que costumavam carregar seus mortos e deixavam de investir contra a cidade, instigados ainda pelos
feridos. Depois desta companha, permanecem algum tempo franceses que em 1596, chefiados por Rijjaut, atacaram a
para recuperação dos feridos e retornam ao forte da Paraíba. paraíba com uma esquadra de treze navios com 350
Pouco tempo depois retornam ao interior com soldados. Para defesa de cidade Frutuoso teria iniciado a
propósito maior de limpar o terreno da ameaça inimiga. construção do forte de Cabedelo, que na época destes
Martim Leitão foi ao rio Tibirí a duas léguas da cidade onde ataques provia apenas de 20 homens que apesar de grande
deveria ativar as obras do forte que iriam proteger um inferioridade numérica, conseguiram obrigar os envasares a
engenho real e a tribo de Assento de Pássaro que ficava nas voltarem para o rio grande, mostrando sua importância na
imediações. Forte que teve o nome de São Sebastião em defesa da cidade..
homenagem ao santo do dia de sua fundação 20/02/1587.
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O comandante francês ainda se preparou para atacar a catequese contribuíram para esse fenômeno decisivo para o
Paraíba mas Desistiu da empresa. Devido a esses ataques progresso da capitania.
estrangeiros o soberano espanhol recomendou a ocupação do A cidade progredia, especialmente a lavoura. No ano de
Rio Grande. A conquista da Paraíba garantia a segurança de 1600, terminou o governo de Feleciano Coelho, a quem a
Pernambuco. Agora se fazia necessário ocupar o Rio grande Paraíba muito ficou devendo pelos grandes serviços
para que a Paraíba pudesse progredir sem o perigo de prestados. Após 15 anos de sua fundação, à frente da
ataques da França franco-indigena. Paraíba, em se tratando de progresso, só havia Pernambuco e
Bahia. Feliciano de Souza Pereira, substituiu Feliciano
2.2. A conquista do Rio Grande do Norte e a paz com Coelho de Carvalho de 1600 a 1603.
os potiguaras em 19/04/1599. A Paraíba teve mais de doze capitães-mores, até cair
Para essa ocupação uniram-se Feliciano Coelho e o nas mãos dos holandeses. Seguiu seu ritmo de progresso
capitão-mor de Pernambuco, Manuel Mascarenhas, regendo com a lavoura açucararia, e juntamente com Bahia e
ordens do rei. Em 1997 chegou a Paraíba uma esquadra de Pernambuco tornou-se o maior centro comercial do mundo
seis navios e cinco caravelas enviadas da Bahia pelo ocidental, atraindo assim a cobiça dos aventureiros
Governador geral Francisco de Souza. De Olinda Manoel flamengos.
Mascarenhas veio por terra , com quatro companheiros
capitaneados por Jerônimo e Jorge de Albuquerque, Antônio 3. Administração de Filipéia de Nossa Senhora das Neves
Leitão Mirim e Manoel Leitão. Em1634 a cidade de Filipéia já tinha alcançado
Feliciano seguiu por terra com essas Companhias , considerável desenvolvimento, contando com mais de mil
levando uma da Paraíba, além dos índios Tabajaras, habitantes na área urbana onde existiam, como construção os
chefiados pelo Piragibe Assento de Pássaro, Caldo Grande e conventos de Santo Antônio, Carmo e São Bento e igreja de
Pedra Verde. Ao chegarem na fronteira do Rio Grande Nossa Senhora das Neves, além das igrejas de São Gonçalo
tiveram de acampar porque a expedição foi atacada por e da Misericórdia. O vale do Paraíba e os terrenos banhados
varíola, morreram muitos. Feliciano regressa à Paraíba como por seus tributários, achavam-se densamente povoados e
também os capitães de Pernambuco, com exceção de vestido os seus solos pelos imensos canaviais que forneciam
Jerônimo, que prosseguiu por mar ao encontro de a matéria-prima, para a movimentação de dezoito moinhos
Mascarenhas. de açúcar, todos servidos de moradores da escravatura
No Rio Grande houve muitas batalhas e a situação africana e silvícolas domesticados. Elevado para o
torna-se ainda mais grave quando Feliciano chega com o contingente de indígenas fixados nas aldeias de Jaraguaçu,
socorro tardio. O forte norte riograndense já havia sido Yapoão, Pontal, Taboá, Inacoca e outros.
começado e o capitão-mor da Paraíba reservou parte de seus As defesas da capitania repousavam sobre os fortes de
comandados para ajudar na sua construção e a outra parte Cabedelo e Santo Antônio, situados nas duas margens do rio,
para ajudar nas batidas contra os Potiguaras. Por ter sido em posição tal que podiam varrer com seus tiros o canal de
principiado no dia 6 de janeiro o Forte recebeu o nome de acesso ao porto de Filipéia, sem falar na bateria montada na
Reis Magos. No dia 24 de junho de 1598, Manuel ponta da restinga e no forte Varadouro, e no sistema de
Mascarenhas entregou-o a Jerônimo de Albuquerque . O trincheiras constituídos na previsão de um ataque de grande
retorno a Paraíba foi coroado de êxito e de muitas vitorias envergadura.
sobre os índios inimigos.
O fato mais importante do governo de Feliciano Coelho 4. NOSSOS ÍNDIOS
foi a paz com, os Potiguaras em 1599. Os índios potiguaras Quando Pedro Álvares Cabral “descobriu” o Brasil no
cansaram de tanta luta e não tinham mais a grande ajuda dos dia 22 de abril de 1500, encontrou aqui uma gente que vivia
franceses que haviam se fixado no Maranhão. O Rio Grande com costumes diferentes e falava uma língua estranha.
estava conquistado após tudo acertado o capitão-mor de Tratava-se dos primeiros habitantes da Terra: os silvícolas.
Pernambuco foi dormir na aldeia do índio Poti, onde já se Na região em que mais tarde se fundaria a Paraíba,
encontrava Feliciano. Como foi acertada a paz entre viviam a princípio os Cariris ou Tapuias, mas chegaram os
portugueses potiguaras e tabajaras, pouco se sabe, porque o Potiguaras, em número bem maior e os expulsaram para o
principal relato destes acordos é um discurso apaixonado e interior onde se fixaram. Em 1585 nas lutas pela conquista
patriótico de um missionário. chegaram os Tabajaras e se fixaram à margem direita do
Sabe-se que esse acordo foi celebrado quando a varíola Paraíba, entre o rio e o mar. Os Potiguaras já ocupavam a
havia matado milhares deles, tanto de um lado quanto de margem esquerda do rio até o interior nas proximidades da
outro, teria sido feita nas proximidades do forte dos Reis atual Serra da Raiz.
Magos, por Pau-seco irmão do grande chefe potiguar Na época da fundação da Paraíba, os Tabajaras
Zorobabé, juntamente com um delegado de nome Ilha formavam um grupo de aproximadamente 5 mil pessoas.
Grande em 19 de abril de 1599. Depois disso Feliciano Eles eram pacíficos e ocupavam o litoral, onde fundaram as
Coelho impôs a paz pela força aos potiguaras, bem parecido aldeias de Alhanda e Taquara. Já os Potiguaras eram mais
com o que ocorreu com os tabajaras, esses índios ficaram numerosos que os Tabajaras e ocupavam uma pequena
agrupados em aldeias militarmente fiscalizadas pela coroa, região entre o rio Grande do Norte e a Paraíba. Esses índios
com o andar da carruagem da história esses índios perderiam locomoviam-se constantemente, deixando aldeias para trás e
pouco a pouco a sua identidade cultural. Esses fatos e a
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formando outras. Com esta constante locomoção os índios - Braço Preto – filho de Piragibe e Pedra Verde (mulher
ocuparam áreas antes desabitadas. de Piragibe), presentes na festa que se deu na Paraíba,
Os índios Cariris se encontravam em maior número que celebrando as pazes com os Potiguaras.
os Tupis e ocupavam uma área que se estendia desde o
Planalto da Borborema até os limites do Ceará, Rio Grande 4.2. Potiguara (comedores de camarão).
do Norte e Pernambuco. Os Cariris eram índios que se
diziam ter vindo de um grande lago. Estudiosos acreditam A sua agricultura não era das mais atrasadas. Viviam
que eles tenham vindo do Amazonas ou da Lagoa dos frutos que aqui eram abundantes: caju, umbu, goiaba,
Maracaibo, na Venezuela. pitomba, maracujá. Cultivavam o fumo e o algodão. A base
Tabajaras e Potiguaras pertenciam a mesma nação Tupi. da sua alimentação, porém, era a caça e a farinha de
Sendo os primeiros tupiniquins e os segundos, tupinambás. mandioca. Cabiam aos homens a fabricação das armas, o
Falavam a mesma língua, “a língua geral”. Apesar de preparo dos roçados, a caça, a pesca e a guerra. Às mulheres,
descenderem de um mesmo tronco, o Tupi, eram rivais. a plantação, a colheita e fabricação da farinha juntamente
Segundo autores avalizados essa inimizade ocorrera, quando com as bebidas. Cuidavam da casa, teciam redes grandes,
nos movimentos migratórios, a grande contenda, em época etipós (redes pequenas), para os meninos. As suas casas
remota, a mulher de um cacique se negara a dar o papagaio eram grandes mas não eram repartidas. Tinham cobertura de
de outra pessoa. Também, dizia-se que a contenda teria sido palhas e eram cercadas.
motivada porque numa festa, uma índia embriagada gerara Como na maioria dos grupos indígenas localizados
grande confusão. no Nordeste, os potiguaras realizam o toré, que é uma
importante prática ritual, capaz de balizar as diferenças
4.1.Tabajara – (Senhor da aldeia) internas, projetando os grupos nas situações de contato.
Essa tribo chegou a Paraíba na época da conquista, Atualmente realizado nas comemorações do Dia do Índio
proveniente das margens do São Francisco, na Bahia. Aqui (19 de abril), sendo pensado como um “ritual sagrado” que
chegando, aliou-se aos Potiguaras, apesar de inimigos de celebra a amizade entre as distintas aldeias, realçando o
longa data para juntos impedirem a colonização portuguesa. sentimento de grupo e de nação. É uma dança que está na
Os índios Tabajaras eram amigos dos portugueses e muito própria percepção e representação da tradição coletiva,
auxiliaram na colonização baiana porém depois do incidente sendo, portanto, um elemento essencial para eles se
entre Piragibe e os portugueses Francisco de Caldas e pensarem enquanto possuidores de um passado histórico
Gaspar de Freitas, os Tabajaras tornaram-se inimigos dos comum.
lusos. Ainda hoje, encontram-se tribos indígenas
Emigrando da Bahia para a Paraíba, penetraram na Potiguaras localizadas na Baía da Traição, mas em apenas
região onde hoje se ergue a cidade de Monteiro, ou segundo uma aldeia, a São Francisco, onde não há miscigenados, pois
alguns teria Piragibe penetrado pela serra do Teixeira. a tribo não aceita a presença de caboclos, termo que eles
Fugiam assim do castigo dos portugueses porque no utilizavam para com as pessoas que não pertencem a tribo. O
incidente referido Piragibe e sua gente mataram Francisco de Cacique dessa aldeia chama-se Djalma Domingos, aos
Caldas, Gaspar de Freitas e seus companheiros de poucos, a aldeia vai se civilizando, um exemplo disso é um
expedição, com exceção de um deles. posto telefônico
A diplomacia de Martim Leitão perdoando a matança Atualmente, na Baía da Traição foi iniciado um projeto
da Bahia e assegurando aos Tabajaras sua permanência na que tenta resgatar a cultura indígena dos descendentes dos
Paraíba conseguiu reatar a amizade entre os governadores e bravos potiguaras, esta sendo feito um projeto que coloca
Piragibe. Esses índios ajudaram não só na conquista, mas alunos em sala de aula para aprender o Tupi Guarani, língua
continuaram garantindo essa conquista. original dos indígenas aqui estabelecidos.
Dentro de poucos anos a aculturação se processou de tal Os Potiguaras mais destacados:
maneira que já não se distinguia mais entre um índio - Índio Poti (Camarão) – Herói das guerras holandesas,
Tabajara e um luso colonizador. Toma um lugar de destaque aliado dos portugueses.
na história da Paraíba, os Tabajaras: - Zorobabé – O mais temido chefe Potiguara, mesmo
- Piragibe – chefe Tabajara, temido e respeitado, que já depois da pacificação. Só não o temeu o valente cacique
centenário sem se levantar mais de sua rede, ainda se Piragibe. Como Zorobabé representava um perigo na
impunha a todos, inclusive a seus inimigos. A aldeia do pacificação com os Potiguaras em 1608, foi enviado preso
famoso morubiraba (chefe) era situada no lado sul da cidade para o reino de onde não mais voltou.
(hoje Ilha do Bispo). Mais tarde, Feliciano Coelho, - Pau Seco – Irmão de Zorobabé foi um chefe muito
transferiu-os para um aldeamento no interior para melhor famoso representou sua gente na festa da paz com os
defender a cidade. Dividiu a aldeia em duas: uma ficou no portugueses e Potiguaras pois Zorobabé estava ausente,
Inhobim, e a outra, em Livramento. talvez sendo uma grande liderança, não quis se arriscar no
- Assento de Pássaro – primo de Piragibe e grande encontro.
defensor da Capitania. A sua aldeia ficava em Tibiú de - Tavira ou Tabira - Em torno deste nome criaram-se
Lima (hoje Santa Rita). Esse valente Tabajara, após seu lendas. Cantavam em poema seu nome e suas glorias. A sua
batismo recebeu o nome de D. Francisco. presença numa batalha significava ameaça fatal para o
inimigo que o temia. Era um chefe guerreiro que só por
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amor à guerra dava o devido valor à sua vida. Conta-se que REFERÊNCIAS:
era só dizer seu nome que os inimigos fugiam. ALMEIDA, Horácio de. História da Paraíba. João Pessoa.
Editora Universitária / UFPB, Conselho Estadual de Cultura,
4.3.Cariris ou Tapuias (estranho ou língua travada). 1997.
Ramo dos Tapuias. Ao serem expulsos do litoral, e MELO, José Octávio de Arruda. História da Paraíba: lutas
ao fixarem no interior e nos sertões dividiam-se em várias e resistência. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB,
tribos: Sucurus, Butius, Ariús ou Árias, Pegas, Panatis, 1995.
Coremas e etc., eram atrasadas e viviam da caça e pesca. Cópia do “Sumário das armadas que se fizeram e das
Eram mais altos que os Potiguaras e Tabajaras. Quando guerras que se deram na conquista do rio Paraíba”.
conquistados foram denominados cariris velhos e cariris
novos em relação a ordem de dominação. 5. As Ordens Religiosas da Capitania da PB e Seus
Como os Potiguara,s furavam também os lábios Mosteiros
inferiores, as bochechas e as orelhas. Colocaram nos furos
pedras bonitas, osso ou madeira. Dormiam também em redes A obra missionária no Brasil foi de grande alcance,
enormes. Andavam nus. As mulheres eram muito bonitas e auxiliando consideravelmente na colonização, especialmente
obedientes aos seus maridos. nos seus primeiros tempos. No contexto histórico dos
Eram ferozes não tinham nenhuma noção de Deus, primórdios da colonização, não podemos deixar de citar os
entretanto possuíam seus feiticeiros que invocavam um nomes de Manoel da Nóbrega e José de Anchieta, cujas as
espirito Tapuia e resolvia com ele os problemas da tribo. vidas expressaram a vocação sacerdotal que a levou a
Cada tribo tinha seu rei. Jandeú era o rei da nação Cariri e perseguir os elevados objetivos de evangelizar os povos
ainda existia os reis Carapatos e Carcará seus irmãos que se nativos. Na Paraíba, a obra dos missionários teve grande
destinguiam dos demais por ter os cabelos cortados em participação nos acontecimentos históricos da Paraíba,
forma de coroa e só eles podiam deixar crescer as unhas dos embora vez por outra surgissem desentendimentos entre os
polegares. poderes secular e temporal, decorrente de atribuições
Seus costumes eram mais exóticos do que os Potiguaras assumidas pelos jesuítas, confundindo, dessa forma a
e Tabajaras. Praticavam a eutanásia e o morto era guardado jurisdição do poder constituído, para enfrentar a ofensiva
entre seus companheiros. Se o rei morresse só os seus protestante.
parentes e os principais da tribo podiam come-lo e
choravam, como forma de carinho para com o morto. 5.1. Os Jesuítas
Os jesuítas foram os primeiros missionários que
- OBS: O nome Paraíba tem origem tupi, seu chegaram à Capitania da Paraíba, acompanhando todas as
significado ainda é discutido, alguns defendem que vem de suas lutas de colonização, Um deles, devemos a “Certidão de
pará mar ou rio e íba braço, no caso então seria Braço de Batismo”, da Paraíba documento histórico, “Sumário das
Rio ou Braço de Mar, e geograficamente existe esta Armadas”, no qual estão relatados todos os acontecimentos
característica. Porém o seu significado deve ser encarado de 1585, no Rio Paraíba.. Ao mando de Frutuoso Barbosa,
com cautela, visto que a maioria dos autores explica o os jesuítas se puseram a construir um colégio na Felipéia. Os
significado como Rio Ruim, intransitável. Este se deve a sua missionários jesuítas tornaram seu encargo a catequese dos
impossibilidade de navegação por grandes barcos, por ser índios de Piragibe (tabajaras). Para isso, instalaram-se perto
raso. da aldeia desse chefe indígena, no passeio geral, depois
- Acejutibiró, era o nome primitivo da Baia da Traição, conhecido como Ilha do Bispo. Constituíram uma capela, a
começou a ser chamado assim, por causa de uma emboscada de São Gonçalo no Varadouro às margens do Sanhauá.
que alguns índios teriam promovido aos viajantes da O zelo excessivo dos padres e seu misticismo, iriam por
primeira expedição de reconhecimento realizada nestas em choque os poderes temporal e espiritual, isto é, capitães-
terras em 1501. Nessa expedição estava presente Américo mores e o clero. A nossa capitania ainda precisava muito de
Vespúcio, que teria narrado com certas doses de exagero o uma defesa constante e os jesuítas pregando o perdão e a
ocorrido, onde foram conduzidos para o contato com o paz, não consentiam que os índios guerreassem, causando
gentio dois dos tripulantes da nau, que após cinco dias não isso vários vexames pois o caso era do conhecimento dos
tinham retornado. Preocupados, enviam outro que foi franceses que ainda insistiam em seus assaltos por trás dos
atacado e feito como refeição pelos nativos ali na frente de Potiguaras.
todos, sem saber o que fazer os tripulantes foram embora e Essa influência dos jesuítas que se indispunham com o
espalharam tal acontecido que ficou cartograficamente Capitão-mor e seus colonos agravava-se, por outro lado,
documentado a partir disso. com os desentendimentos entre aquela ordem e os
- A ordem cronológica de batismo de nossa capital é: franciscanos. Porém, devido a desavenças com os
Cidade de Nossa Senhora das Neves; 1585. fransciscanos, que não usavam métodos de educação tão
Cidade Filipéia de Nossa Senhora das Neves; 1588. rígidos como os jesuítas, a idéia foi interrompida.
Frederica; 1635. Aproveitando esses desentendimentos, o rei que andava
Paraíba do Norte; 1654. descontente com os jesuítas pelo fato de estes não
João Pessoa; 1930. permitirem a escravização dos índios, culpou os jesuítas pela

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rivalidade com os fransciscanos e expulsou-os da capitania À margem esquerda do Rio Paraíba constituíram a
em 1593. Igreja Nossa Senhora da Guia, um belo templo barroco,
Cento e quinze anos depois, os jesuítas voltaram à constituindo um dos melhores exemplos desse estilo no
Paraíba fundando um colégio onde ensinavam latim, Brasil. Na cidade construíram o Convento do Carmo (hoje
filosofia e letras. Passado algum tempo, fundaram um Palácio do Bispo) e ao lado, a Igreja da Ordem Terceira.
Seminário junto à igreja de Nossa Senhora da Conceição.
Atualmente essa área corresponde ao jardim Palácio do Foram essas ordens religiosas que promoveram não só a
Governo. evangelização dos índios mas também a construção e
Em 1728, os jesuítas foram novamente expulsos. Em desenvolvimento da Paraíba. Não se sabe se foi coincidência
1774 com a permissão do Papa Clemente XIV, os bens dos ou proposital, o fato é que a disposição desses templos
jesuítas foram dados a Fazenda Real. E o Convento passou a formam uma cruz:
ser residência oficial dos capitães-mores (Palácio da
Redenção). - Convento de São Francisco no Norte;
- Convento e Colégio dos Jesuítas, ao Sul;
5.2. Os Franciscanos - Mosteiro de São Bento, ao Oeste;
Atendendo a Frutuoso Barbosa, chegaram os padres - Convento do Carmo, ao Leste.
franciscanos, com o objetivo de catequizar os índios. O Frei
Antônio do Campo Maior chegou com o objetivo de fundar 6. Antecedentes e Invasão holandesa.
o primeiro convento da capitania. Seu trabalho se concentrou
em várias aldeias, o que o tornou importante. No governo de Em 1578 o jovem rei de Portugal, D. Sebastião, foi
Feliciano Coelho, começaram alguns desentendimentos, pois morto na batalha de Alcácer-Quibir, na África, deixando o
os franciscanos, assim como os jesuítas, não escravizavam trono português para seu tio, o cardeal D. Henrique, o qual
os índios. A igreja e o convento dos franciscanos foram devido à sua avançada idade acabou morrendo em 1579, sem
construídos em um sítio muito grande, onde atualmente se deixar herdeiros. O Rei da Espanha, Felipe II, que se dizia
encontra a praça São Francisco. primo dos reis portugueses, com a colaboração da nobreza
espanhola e do seu exército, conseguiu em 1580 o trono
5.3. Os Beneditinos português.
Após a saída dos jesuítas contava com poucos A passagem do trono português à coroa espanhola
religiosos para a catequese dos índios. Em 1599 Feliciano prejudicou os interesses neerlandeses (holandeses), pois eles
Coelho solicitou ao abade de Olinda a vinda dos beneditinos estavam travando uma luta contra a Espanha pela sua
para o serviço religioso. Não sendo uma ordem mendicante, independência que depois de quase dez anos libertam-se da
o terreno para a construção do Convento A condição imposta Espanha formando as Províncias Unidas dos Países Baixos,
pelo governador era que o convento fosse construído em até dessa forma, rivais dos espanhóis, os holandeses foram
2 anos. O mosteiro não foi construído em dois anos, mesmo proibidos de aportarem em terras portuguesas, o que lhes
assim, Feliciano manteve a doação do sítio. Outras doações trouxe grande prejuízo.
que pudessem fazer com que os missionários tivessem Interessados em recuperar seus lucrativos negócios com
condições de se manterem e de se dedicarem também a sua as colônias portuguesas, o governo e companhias privadas
missão de catequese. holandesas formaram em 1621 a Companhia das Índias
O Convento foi constituído aos poucos. Na época da Ocidentais, para invadir as colônias e manter as atividades
ocupação holandesa todos os missionários da Paraíba foram comerciais. A primeira tentativa de invasão holandesa no
requeridos pelos flamengos, e em conseqüência seus Brasil ocorreu em 1624, em Salvador. O governador da
trabalhos paralisados. Em 1666, os frades beneditinos Bahia, Diogo de Mendonça Furtado, havia se preparado para
conseguem terminar a restauração do seu Convento. o combate, porém com o atraso da esquadrilha holandesa, os
Reorganizaram a livraria e recomeçaram as aulas de latim, o brasileiros não mais acreditavam na invasão quando foram
que foi motivo de grande alegria para a população. O antigo pegos de surpresa.
Convento beneditino, onde atualmente funciona a Faculdade Durante o ataque o governador foi preso. Mas
Autônoma (IPE), localizada nas proximidades da catedral, orientadas por Marcos Teixeira, as forças brasileiras
com o passar do tempo passou a denominar-se o “Calvário”. mataram vários chefes batavos, enfraquecendo as tropas
holandesas. Em maio de 1625, eles foram expulsos da Bahia
5.4. Os Missionários Carmelitas pela esquadra de D. Fradique de Toledo Osório.
Os carmelitas vieram à Paraíba a pedido do cardeal D.
Henrique, em 1580. Mas devido a um incidente na chegada 6.1. Investidas na Paraíba.
que colheu os missionários para diferentes direções, a vinda Ao se retirarem de Salvador, os holandeses,
dos carmelitas demorou oito anos. Os carmelitas chegaram à comandados por Hendrikordoon, seguiram para Baía da
Paraíba quando o Brasil estava sob domínio espanhol. Os Traição, onde desembarcaram e se fortificaram, queriam
carmelitas chegaram, fundaram um convento e iniciaram “fazer guarda e refazer-se de mantimentos”. Tropas
trabalhos missionários. A história dos carmelitas aqui é paraibanas, pernambucanas e índios se uniram a mando do
incompleta, uma vez que vários documentos históricos governador Antônio de Albuquerque para expulsar os
foram perdidos nas invasões holandesas. holandeses. A derrota batava veio em agosto de 1625. Após
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esse conflito ao holandeses seguiram para Pernambuco, onde O clima da Capitania foi de muita tensão, toda a
o governador Matias de Albuquerque, objetivando deixá-los população vivia assombrada, esperando um desastre. O rei
sem suprimentos, incendiou os armazéns do porto e prometia auxílio, mas tudo era demorado na Corte Ibérica e
entrincheirou-se. quando algum socorro partia, não raro se desarticulava pelo
Temendo novos ataques, a Fortaleza de Santa Catarina, caminho ou a chegada frente aos combates com os
em Cabedelo, foi reconstruída e guarnecida e a sua frente, na holandeses, a essa altura já dominando a faixa oceânica entre
margem oposta do Rio Paraíba, foi construído o Forte de as Capitanias de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do
Santo Antônio. Norte.
Em 1630, após restabelecer suas forças os neerlandes Os moradores da Paraíba sofriam lentidão em todos os
invadem Pernambuco, e o governador Matias Albuquerque negócios; nos engenhos, escravos e colonos aprendiam a
forma o principal foco de resistência no interior o Arraial de manejar armas de fogo e o trabalho rendia menos, dados e
Bom Jesus. O mestiço Domingos Fernandes Calabar, receios das rápidas sortidas que os holandeses também
conhecedor das terras interioranas, apoia os holandeses na preparavam por terra.
investida contra o arraial que é derrotado e força a fuga do
governador para Alagoas. Depois de conquistar uma das 6.3. A Capitania da Paraíba na época da Invasão
mais ricas e prosperas capitanias da colônia, decidem Holandesa.
ampliam seus domínios e estabelecer sua dominação na Depois de da submissão da Paraíba os holandeses
região açucareira. resolveram ocupar todo o território até Recife. Assim, Rio
Aos cinco dias de dezembro de 1632, comandados por grande, Paraíba e Pernambuco estavam em mãos
Callenfels, 1600 batavos desembarcaram na Paraíba. neerlandesas. A preocupação inicial dos holandeses consistiu
Ocorreu um tiroteio, os holandeses construíram uma em montar defesas para estabilizar a conquista e atrair a
trincheira em frente a fortaleza de Santa Catarina, mas foram simpatia dos habitantes da Paraíba. Ao tomar conta da então
derrotados com a chegada de 600 homens vindos de Felipéia Cidade de Filipéia de Nossa Senhora das Neves (nome dado
de Nossa Senhora das Neves a mando do governador. durante o domínio espanhol) mudaram seu nome para
Os holandeses decidem atacar o Rio Grande do Norte, Frederica (ou Frederickstadt ) em homenagem ao príncipe
mas Matias de Albuquerque, 200 índios e 3 companhias de Orange .
paraibanas os impediram de desembarcar. Depois da As primeiras providências de organização do poder
deserção das forças inimigas avançam e conquistam holandês na Paraíba, foram tomadas pelos comandantes que
melhores posições (Rio Grande do Norte), satisfeitos com a a venceram: Sigimendt Van Schoppe, Artichau Areizeswski,
tomada do rio grande os holandeses voltam à Paraíba em e Lincharlt. Na época da invasão holandesa, a população era
março de 1634 para atacar o Forte de Santo Antônio, mas ao dividida em dois grupos: os homens livres (holandeses,
desembarcarem percebam a trincheira levantada pelos portugueses e brasileiros) e os escravos (de procedência
paraibanos, fazendo com que eles desistissem da invasão, brasileira ou africana).
observam os pontos fracos da defesa e voltam ao Cabo de
Santo Agostinho em Pernambuco. 6.2 Política administrativa holandesa na Paraíba.
Durante seu domínio houve alguns governadores
6.2. Ocupação holandesa na Paraíba. holandeses:
Após um tempo os holandeses resolvem tentar invadir a - Servaes Carpentier: foi o primeiro Conselheiro
Paraíba novamente. Dessa vez, em 25 de novembro de 1634 Político designado para a direção da capitania também
conduzidos pelo almirante Lichthardt sob as ordens do governou o Rio Grande do Norte, e sua residência oficial foi
coronel Segismundo Van Schkoppe partiu uma esquadra de no Convento São Francisco.; cronista holandês de renome,
29 navios para a Paraíba. Aos quatro dias de dezembro de escreveu um minucioso relatório sobre a Paraíba;
1634, bem preparados os soldados holandeses chegam ao - Ippo Eyssens: foi um administrador violento e
Norte do Jaguaribe, onde desembarcaram distribuidos em desonesto. Apoderou-se dos melhores engenhos da
várias colunas, uma delas tomou o fortim de da ilha da Capitania, governou menos de um ano, sendo assassinado
Restinga enquanto outras se delocaram por via fluvial em pelas forças rebeldes comandadas por Rebelinho, a 14 de
lanchas, o plano era isolar de munições e mantimentos a outubro de 1636.
fortaleza de Santa Catarina que então após intensa - Elias Herckman: homem de grande cultura, escritor e
resistência se rendem. poeta dos mais considerados em seu tempo, governou a
No caminho por terra para Cabedelo os batavos Paraíba até 1639. Durante sua permanência na Paraíba,
receberam mais reforços e tomam a sua Fortaleza no dia 19 elaborou uma Descrição Geral da Capitania da Paraíba e que
de dezembro, quatro dias depois o Forte de Santo Antonio. hoje constitui precioso documento histórico.
Os holandeses chegaram com seus exércitos na Felipéia de Sebastian Von Hogoveen: Governaria no lugar de Elias
Nossa Senhora das Neves em 24 de dezembro de 1634, e a H., mas morreu antes de assumir o cargo.
encontraram vazia. Alguns dos proprietários pressentindo a - Daniel Alberti, conselheiro político, respondeu pelo
derrota queimaram os canaviais, inutilizaram seus engenhos governo da Paraíba, substituto do anterior depois da saída de
(André Vital de Negreiros foi o primeiro) e retiraram-se da Herckman;
capitania. Os que não se submeteram ao domínio holandês
foram se juntar a Matias de Albuquerque, em Alagoas.
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- Paulo de Linge dirigia a Paraíba, em 1641 quando clero prestasse obediência ao bispo da Bahia. Os moradores,
Elias Herckman empreendeu uma expedição exploradora até para celebrarem os seus cultos, tinham que pagar aos
a serra de Capaoba, a pedido de Maurício de Nassau; sacerdotes.
- Eisbert de With governou até os anos de 43 e 44, foi o Governava a Paraíba o holandês Elias Herckman
melhor governador holandês, pois era honesto, trabalhador e quando Maurício de Nassau aqui esteve, viajando até Areia.
humano. De volta, mandou reparar o forte e ordenou que trocasse o
- Paulo de Linge: foi em maio de 1645, perdendo a nome de Santa Catarina para Margareth. Segundo uns
cidade de Frederica a 2 de setembro, refugiando-se na historiadores em homenagem a sua mãe, segundo outros a
Fortaleza de Santa Catarina. sua irmã.
Os holandeses reconheceram a desvantagem de ver a Na administração das capitanias além dos ouvidores,
terra desamparada então se prestaram a fazer com os haviam as câmaras em cada cidade ou vila, onde em média
moradores uma espécie de pacto lavrado e concedido aos tinham 19 representantes de Portugal e Holanda chamados
senhores de engenhos, lavradores e moradores da Paraíba, de escabinos ( administradores da justiça ) além dos
pelos governadores gerais em nome de D’ Orange, servindo almotacéis ( espécie de fiscal que regulamentava o comércio
como norma para as capitulações que foram emanadas para e as obras), mas como o escolteto (executor de sentenças e
submeter outros moradores. Os artigos foram publicados nos ordens do governo) era presidido por um holandês, os
principais portos da cidade fazendo com que muitos dominadores sempre ficavam com a maioria.
moradores capitulassem.
6.3. Resistências a dominação holandesa e a restauração
RESUMO DOS PRINCIPAIS ARTIGOS do trono Português.
PUBLICADOS: O domínio holandês da Paraíba foi agitado, eles
- O financiamento da liberdade de consciência e do governavam durante 20 anos, de 1634 a 1654, mas não
serviço de culto como anteriormente , com a divida dominaram, estavam sendo sempre atacados pelos
notificação às margens da e sacerdotes. moradores. O movimento de libertação se tornava cada dia
- Garantia de paz, de justiça e de proteção contra mais concreto em todas as capitanias dominadas. Os
quaisquer inimigos. moradores há muito estavam descontentes porque viam os
- Segurança da propriedade , mediante a continuação seus templos dia a dia serem reduzidos a templos
dos mesmos direitos e aliados, não se impondo novos protestantes, religião dos invasores.
tributos. Aqui na Paraíba, o governador holandês, Ippo Eysens,
- Concessão de toda proteção aos tratos e negócios. foi assassinado por Francisco Rabello (Rabelinho). Os
- Franquia de passaportes aos que para seus negócios se holandeses culparam os frades do acontecimento. Antes já
quisessem ausentar-se por mar ou por terra. tinham tomado o Convento de São Francisco, pois
- Isenção dos moradores e seus filhos serem obrigados a desconfiaram de correspondência entre o Superior dos
tomar armas contra forças vindas da metrópole, permitindo franciscanos e Matias de Albuquerque (que continuava
retirarem–se a tempo os que não quisessem ficar na terra, se sempre que podia, a atacar os inimigos na esperança de
ela estivesse em risco de ser recuperada. restaurar as capitanias invadidas).
- Direito de recorrerem aos tribunais do pais contra a Haviam também ocupado o Mosteiro de São Bento por
próprios governantes, nos casos contenciosos. ser um ponto estratégico. Com a morte do governador
- Deterem juizes seus nas questões entre uns e outros, holandês os missionários foram fortemente perseguidos,
que se que sentenciassem segundo as leis portuguesas. tiveram que deixar a Capitania por algum tempo. Só
- Finalmente poderiam trazer consigo armas, voltaram depois da Restauração do governo português. Por
exclusivamente para se defender dos salteadores e causa da perseguição sofrida pelos holandeses, grande parte
levantados. dos documentos dos missionários foi queimada.
Em 1640, Portugal restaurou o seu trono, isto é, ficava
Para garantir sua conquista no Brasil, a direção da separado da Espanha, acontecimento comemorado com
Companhia das Índias Ocidentais enviou como governador festas no Brasil. Os Holandeses também celebraram o
de seus novos domínios o Conde Maurício de Nassau , que acontecimento porque eram inimigos da Espanha e o que
chegou no Brasil em 1637. Os seus primeiros atos foram de fosse ruim para o reino espanhol estava bem para eles.
um dirigente bem intencionado, praticou justiça, ajudou aos Houve um armistício entre Portugal e Holanda por dez anos.
que tinham necessidade, devolveu as autoridades e a nossa A notícia porém ainda não tinha sido ratificada, e esta se
religião o devido respeito. Reorganizou os hospitais e pôs demorando, Nassau aproveitou-se e mandou invadir o
em leilão os engenhos abandonados por seus senhores, Maranhão e Luanda, na África. Pensaram os holandeses que
restaurou os danificados embora com dupla vantagem; os seu ato de invadir o domínio agora Português, iria acelerar as
engenhos foram restaurados e coube ao fisco o valor das negociações, uma vez que o pacto não tinha sido ainda
vendas. Medidas que ainda hoje, não se percebe o prejuízo ratificado.
(se houve) que tivemos com a ocupação holandesa. Os paraibanos continuavam com a idéia de querer
Objetivando criar homogeneidade no estado ordenou expulsar os holandeses, buscaram forças para isso,
que tudo seria decidido de acordo com as leis holandesas. Os arranjaram homens no Engenho São João e contaram com o
pesos e medidas eram os de Amsterdã, e não consentiu que o apoio de André Vidal de Negreiros. Quando os holandeses
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descobriram, também se prepararam para o combate. Os se espalhava. Os holandeses não acreditavam, entretanto
paraibanos reuniram-se em Timbiri, e depois seguiram para enviaram avisos para as capitanias por eles dominadas. Ao
o Engenho Santo André, onde foram atacados por Paulo tomarem conhecimento de que o rei de Portugal era
Linge que dirigia a Paraíba, em 1641 quando Elias cúmplice com os sublevados já era tarde demais. Os nossos
Herckman empreendeu uma expedição exploradora até a estavam em pleno levante.
serra de Capaoba, a pedido de Maurício de Nassau. Paulo de Linge foi novamente nomeado governador “ou
Vidal de Negreiros foi duramente perseguido por diretor, como chamavam os holandeses aos seus prespostos”.
Nassau que chegou a por sua cabeça a preço oferendo por Aqui chegando iniciou uma série de atitudes violêntas para
ela mil florins, ao que respondeu Vidal com editais em que amedrontar os moradores. Reuniu índios aliados sob a chefia
prometia seis mil cruzados pela cabeça do conde de Nassau. de Pêro Poti. Essa gente tomou de surpresa as forças de
A retomada do Maranhão foi o início de tudo. resistência que estavam numa igreja m Cunhaú à hora da
Aconteceu quando Nassau ainda se encontrava no Brasil missa e caíram sobre eles com grande ferocidade.
mas de malas prontas de regresso para a Europa depois de Pêro Poti era aliado dos holandeses, revoltado pelo
uma série de contrariedades com a Companhia das Índias massacre sofrido por sua gente no episódio de 1625 quando
Ocidentais que exigia de Nassau atitudes mais enérgicas foram usados para lutar contra os índios que resistiam a
quanto ao pagamento dos financiamentos, cogitando-se até o conquista do interior na Bahia e foram abandonados, jamais
confisco das terras dos inadimplentes. Diante disso ele perdoou aos portugueses e enquanto viveu os combateu. Na
renunciou e embarcou da Paraíba no dia 22 de maio de 1644, Holanda recebeu instruções e lutou ao lado dos Holandeses.
deixando o governo em mãos de três conselheiros antes da Foi preso pelos portugueses na 2° Batalha dos Guararapes,
chegada de seu sucessor. em 1649), nas quais contou com a participação de André
Vidal.
6.4. “Libertação” da Paraíba. Após a carnificina de Cunhaú, foi fácil convencer os
Restaurado o Maranhão, haviam também de retomar as moradores para aderirem à rebelião. As tropas de Felipe
outras capitanias. O rei de Portugal nomeou André Vidal de Camarão e Henrique Dias foram reforçadas. Travaram lutas
Negreiros governador do Maranhão, cumprindo a promessa com Paulo de Linge. A guerra continuava árdua. Vidal de
que lhe fizera caso aquela capitania fosse restaurada. André Negreiros veio com suas tropas socorrer à Paraíba. Após
Vidal de Negreiros, paraibano, filho de proprietários vários combates Paulo de Linge retirou-se para o Recife,
portugueses, participou da resistência anti-holandesa em deixando o coronel Hautin capitão do Forte, único reduto
1624 na Bahia, em 1630 encontrava-se em Olinda quando inimigo que restava na Paraíba. A cidade estava livre dos
foi invadida, de 1636 a 1644 permaneceu em Portugal onde holandeses desde 1645. A partir daí, houve a restauração das
tentou mobilizar forças, sem conseguir. Antes de ter demais capitanias. Os holandeses finalmente capitularam.
conhecimento da sua nomeação para governador do O comandante holandês, no Forte de Cabedelo foi
Maranhão, Vidal de Negreiros, obteve aprovação do avisado da capitulação em Recife e fugiu. Não chegou a
Governador da Bahia, Antônio Teles, para ir a Pernambuco e receber a circular que lhe foi enviada pelos diretores
de lá, à Paraíba para por em prática o seu plano. Não foi ele holandeses:
o autor da idéia da expulsão dos holandeses mas foi o “Nobre e honrado bravo! Pela convenção que
cérebro do movimento. assinamos e vai adjunta, podereis saber quanto, com o
Para vir à Paraíba usou o pretexto de visitar o seu pai maior sentimento, nos cumpre informa-vos. Com ela vos
que aqui morava. Pediu salvo conduto, no que foi atendido. conformais entregando a ordem do Senhor Mestre de
Muito combatido e perseguido anteriormente pelos Campo general, todas as fortalezas aí existentes. Para esse
holandeses, depois do armistício, as perseguições cessaram e fim vão a essa os Srs. Van de Wall e Brest, que vos darão
assim o paraibano pode traçar seu plano de ação. Veio à todas as explicações, na conformidade das quais vos
Paraíba com o alferes Nicolau Aranha para ajudá-lo no conduzireis. Terminando rogo a Deus que vos proteja.”
plano. O motivo de Aranha para o salvo conduto era que O senhor Mestre de Campo general, que se referia a
devia pegar duas irmãs suas que iriam para um Convento em circular, era o Mestre de Campo Francisco de Figueirôa, que
Portugal. Tudo aceito. foi nomeado para tomar posse da capitania da Paraíba. O
No entanto, Vidal precisava saber das condições do comandante Hautjin escapara mas antes soltara os
Forte de Cabedelo e, com o pretexto de visitar o comandante prisioneiros e a eles entregara a Fortaleza. No Rio Grande
do mesmo, sendo recebido com honrarias. Voltando para havia acontecido o mesmo. André Vidal de Negreiros foi o
Recife com o Aranha conduzindo as embarcações cheias de escolhido para dar a boa notícia ao rei de Portugal.
víveres não teve porém licença para o desembarque dos Do lado dos insurretos, a resistência se fez com a
gêneros, foi necessário a estratégia de escondê-los em participação de índios e negros, porém se tratavam de
qualquer canto do litoral pernambucano. Vivia André Vidal nativos aculturados e de escravos, alguns alforriados, que
às correrias entre Pernambuco e Bahia. Em Pernambuco viam neste movimento uma oportunidade de conquistarem
hospedava-se na casa de João Fernandes Vieira, governador alguns direitos com a retomada dos domínios portugueses.
de Pernambuco. Para a elite colonial se torna o meio de manter a
Os holandeses souberam das intenções de Vidal, propriedade e os lucros, no qual após os conflitos assim se
entretanto sem provas concretas não tomaram nenhuma fez ao retomar a antiga “ordem natural das coisas”, ou seja,
decisão, ficaram porém atentos. A notícia da sublevação já monocultura, agro-exportação e escravidão. Por tanto a
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chamada Insurreição Pernambucana se fez muito mais por destinou para a Bahia e Pernambuco, e estes foram portanto,
interesses do que propriamente um sentimento nativista, ou os principais focos de penetração para o interior.
pior ainda nacionalista, já que o Brasil só será uma nação em
1822. 7.1. Vias de Penetração da Paraíba
A penetração na Paraíba deu-se na metade do século
7. Frentes de ocupação territorial na Paraíba. XVII, por três vias distantes e opostas;
- pela subida do rio Paraíba
Ao escrever em 1627, a primeira História do Brasil, o - pelas nascentes desse rio
Frei Vicente do Salvador comentou que os portugueses - ao longo do Rio Piancó.
ficavam “arranhando as costas litorâneas como O rio Piancó tem suas cabeceiras no divisor de águas
caranguejos”, isso se deve pela insistente ocupação com o Pageú, afluente do médio São Francisco, também
litorânea, onde a maior preocupação era explorar e exportar. chamado de Rio dos Currais, pela sua grande quantidade de
Essas eram as características da colonização portuguesa, criações em suas margens. O Pageú foi o caminho para o
onde as atividades que gerassem maior lucro e tivessem povoamento da parte ocidental da capitania, comunicando a
maior mercado, seriam adotadas em suas posses. Nesse região do São Francisco com a parte do Piranhas.
período as maiores fontes de riqueza na colônia ainda eram a Transpondo os colonizadores, rumo ao norte as nascentes do
extração de pau-brasil e a produção de açúcar nos engenhos. Pageú, caiam no vale do Piancó e estavam na região do
Disse um desses produtores “não deixo de plantar um só pé Piranhas.
de cana, no perigo de renegar a melhor fonte de lucros da Marchando pela Borborema, partindo do Moxotó,
colônia,” depoimento esse que reflete a ação típica de uma alcançavam as cabeceiras do Paraíba, entravam nos Carirís
colônia de exploração. Velhos. Seguindo de leste a oeste pelo curso do Paraíba, em
Porém a ocupação do interior e dos sertões se deu pela sentido inverso, entravam na mesma zona dos Carirís
necessidade de buscar outras fontes de riqueza e pela efetiva Velhos. Portanto, vindo do interior baiano e pernambucano
ocupação do território, constantemente ameaçada por subiram para a Paraíba.
estrangeiros e pelos indígenas que resistiam a ocupação de
suas terras. Além disso, o incentivo do governo português 7.2. Primeiros Desbravadores
concedendo sesmarias (lotes de terras) a quem desbravasse o Os Oliveira Ledo;
interior, atraia um grande número de aventureiros. Com esse Os Garcia d’Avila (Casa da Torre);
propósito, frentes de ocupação foram criadas, entre elas Manoel de Araújo Carvalho.
distingue-se as entradas, bandeiras, missões e criação de
gado. 7.2.1. Os Oliveira Ledo
Antônio De Oliveira Ledo – penetrando no território
De uma maneira geral as causas das investidas sobre o pelo rio Paraíba, Antônio de Oliveira Ledo fundou o
interior do Brasil foram: primeiro núcleo de colonização do nosso Estado, numa
- a busca de ouro e metais preciosos; fenda da Serra de Carnoió, hoje a cidade de Boqueirão.
- a preação do índio para substituir o negro que se Seguindo Antônio de Oliveira o curso do rio Paraíba, deste
tornava peça cada vez mais cara; passou para o Taperoá e descendo a Borborema, seguindo o
- o espírito aventureiro do português que se sentia rio da Farinha, entrou nas Espinharas. Estacionou “no lugar
atraído pelo desconhecido e pela possivel riqueza que onde hoje se encontra a cidade de Patos e aí fundou “as
poderiam encontrar, uma idéia bem explicada pelo mito do sesmarias”. Seguindo o rio Espinharas, Antônio de Oliveira
“El Dourado”. Prestando serviços ao seu rei, sabiam que Ledo foi até o Rio Grande (do Norte). Daí regressou para
seriam bem recompensados; Boqueirão. Quando o capitão-mor da Paraíba soube do
- a facilidade em se obter sesmarias (terras incultas, não grande feito de Antônio, convidou-o a fazer uma entrada
povoadas que o rei concedia a quem quisesse e pudesse Leste-Oeste. E ao chegar no oeste paraibano, Oliveira Ledo
desbravá-las e povoá-las à sua custa); encontrou entradistas da Casa da Torre, sem que a capital
- a criação do gado. tivesse conhecimento do fato. Pelo grande feito Antônio de
- Missões de catequização dos nativos: Oliveira Ledo recebeu, em 1682, a Patente de Capitão, de
Na Paraíba essas quatro últimas causas foram Infantaria da Ordenança do Sertão da Capitania da Paraíba.
responsáveis pelo desbravamento do seu interior sendo a
criação do gado a principal, o que destaca o papel Constantino De Oliveira Ledo – continuou o trabalho
fundamental dos vaqueiros e tropeiros. Na Paraíba como em do seu tio Antônio. Já o tinha acompanhado desde sua
todo o Brasil, desenvolveu-se no litoral, a lavoura do açúcar primeira entrada, como também na viagem empreendida de
tinha enriquecido tanto essa região que os seus moradores leste para o oeste. Recebeu a alta patente de Capitão-Mor
não manifestavam o menor interesse em se fixarem em terras das Fronteiras das Piranhas, Carirís e Piancós. Quando
distantes do mar. Os limites da Paraíba até 1650, para o Constantino recebeu essa alta patente, os tapuias estavam
Oeste, não iam além da montanha de Copaoba, hoje Serra da sublevados. Enfrentou os índios em guerra e arriscou várias
Raiz. Reforçando esta prática a Carta Régia de 1701, proibia vezes sua própria vida. Faleceu em 1694. O posto foi
a criação de gado a menos de 10 léguas da costa. O gado foi ocupado pelo seu irmão Teodósio.
introduzido no Brasil por Tomé de Sousa em 1530 que o
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Teodósio De Oliveira Ledo – é considerado o mais tapuias que, aliados aos holandeses, lutaram contra
cruel dos desbravadores. Foi incansável na sua luta para a portugueses que puseram a ferro dois filhos do principal dos
dominação dos Tapuias. Em 1697, aldeiou os ariús numa Tapuias. E os índios jamais iriam esquecer tamanha afronta.
grande campina, local onde hoje é Campina Grande. Em Começou a guerra no Rio Grande do Norte, contra os
1698, percorreu pleno território selvagem. Penetrou nos fazendeiros criadores que tinham as suas propriedades
sertões de Piancó e em Pau Ferrado, acampou. Daí marchou assaltadas e devastadas pelos tapuias, que assassinavam os
na direção Oeste e chegou até o Rio Grande do Norte seus moradores e incendiavam as fazendas.
(Apodi). Voltou para as Piranhas, fundou um Arraial para Em 1687, o Governador Geral, Matias da Cunha,
segurança dos seus moradores, que criavam gado na região. enviou recursos para debelar a luta: vieram os bandeirantes
A linha de Penetração de Teodósio teve seu ponto paulistas, já afeitos às lutas contra índios. Foram eles: Matias
terminal, no lugar onde hoje se ergue a cidade de Pombal, Cardoso e Domingos Jorge Velho. Conflito que foi
cujo local chamava-se antigamente de Povoação de Nossa amenizado em 1692. Aliás, caso inesperado, a mais
Senhora do Bom Sucesso de Piancó. A povoação de Bom imprevista das reconciliações: Um português, João Pais
Sucesso de Piancó compreendia a região. Piancó, não se Florião, apaixonou-se por uma índia, filha do maioral
refere ao rio mas a toda região. Nhongue, cunhado do “rei Canindé” e, com palavras amigas,
Cem torno dessa figura se criou o mito do grande herói conseguiu que os índios pedissem a paz. Enviaram
desbravador, civilizador e cristianizador do que teria embaixadas à Bahia dirigida pelo dito Florião. O governador
fundado Campina Grande, esse mito está presente na recebeu com festas, em abril de 1692, e como entre
narrativa de alguns escritores que acabam perpetuando essa potências, pactuaram a paz perpétua. Enquanto o rei Canindé
idéia, exemplo disso é o trecho de um trabalho dos alunos de viveu, honrou a sua palavra mas após a sua morte a luta se
uma escola de Campina Grande que diz: reascenderia.
“Assim podemos observar que Teodósio de Oliveira No Ceará a conflito teve continuidade a partir de 1694
Ledo consolidou a Conquista do Sertão. Pagou um preço após à morte do rei Canindé, onde os nativos juntaram-se às
muito alto porque para muitos ele foi cruel no extermínio outras tribos e recomeçaram a luta que se estendeu por todas
dos tapuias. Na época porém, havia outra solução? Os as capitanias, isto é, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba.
índios amavam demais à sua terra e por ela matavam ou Em 1704, o Rio Grande do Norte foi pacificado. No Ceará
morriam e é muito fácil fazermos uma idéia do que seja mil ainda houve lutas mas após 1713 considerou-se encerrada a
ou milhares de tapuias sublevados.” Guerra dos Bárbaros ou Confederação dos Carirí, ou ainda, a
Guerra do Açu.
7.2.2. Os Garcia D’avila (Casa da Torre).
Francisco Dias d’Avila – era sucessor de Pe. Antônio Povoamento do Sertão:
Pereira e Senhor da Torre, protegido de Tomé de Sousa, “Pacificando” os índios (era essa a missão dos
estabeleceu, de início, os seus currais na Bahia. Depois suas desbravadores, aprisionar e aculturar), os sertanistas
fazendas de gado se espalharam pelo rio São Francisco e puderam continuar a fundar as suas fazendas de gado, que se
chegaram até o Piauí. Talvez o maior dos latifundiário do tornariam mais tarde núcleos de povoação. A princípio
Brasil. Os senhores da Torre, foram os pioneiros na parte criando o gado para abastecer as regiões vizinhas, depois as
ocidental da nossa capitania, mas não se fixaram nessa feiras, as pousadas foram progredindo a ponto de irem se
região, arrendaram ou doaram suas terras nas ribeiras dos tornando em povoamento, vilas e hoje cidades.
Rios Piancó, Peixe e Piranhas de Cima. A pecuária no período colonial foi uma atividade
econômica secundária em função da cana-de-açúcar e da
Manoel De Araújo Carvalho - veio pelo Pageú e após mineração mas ela foi de grande importância no
um ano de combate aos índios, passou para o Rio das desbravamento do nosso sertão e no povoamento das
Piranhas, encontrando aí Teodósio de Oliveira Ledo, que caatingas do nordeste. Além de contribuir para nossa
estava em guerra com os índios panatís. Vencidos esses economia, além de ser o grande auxílio do engenho foi um
indígenas, Manoel de Araújo encaminhou-se para os sertões dos gêneros fundamentais do consumo.
do Rio do Peixe e Piancó. Essa empresa custou três anos. Os subprodutos de carne, especialmente o couro foi de
Depois de várias lutas e com grande diplomacia o coronel grande relevância e era largamente exportado nos portos do
Araújo vence os índios, tornando-se assim o grande nordeste; couro salgado, curtido, sola e vaquestas. Foi esse
responsável pela Conquista do Piancó. Foi nomeado Juiz período denominado de “ciclo do couro”. Não teve a
para essa região e exerceu o cargo durante nove anos. exuberância dos ciclos do açúcar e da mineração mas ele
bem reflete uma época que ficou para sempre no nosso
7.3. Conseqüências do Desbravamento do Sertão folclore. O couro substituiu os tecidos. Era preferido por
vaqueiros e peões “que deviam suportar sol e chuva vigiando
Guerra dos Carirís as boiadas”. Também nas pobres habitações, o teto, os
Os índios sempre travaram lutas com os portugueses e bancos, móveis, camas, tudo era de couro. A produção do
por diferentes causas no período colonial. A guerra dos produto era tão grande que o fumo e o açúcar eram
Carirí foi a mais longa. A guerra começou declaradamente exportados embrulhados em couro.
em 1687, porém de longa data. Desde que João Fernandes O povoamento do sertão se deu de maneira diferente da
Vieira em 1657, governava a Paraíba, para se vingar dos do litoral que foi uma colonização aristocrata, feita por
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senhores de engenho poderosos, que ostentavam muito luxo Sousa: Hoje a sexta cidade mais populosa do Estado e
e poder. O símbolo dessa época é a “Casa Grande”. No dona de um dos mais importantes sítios arqueológicos do
sertão, a vida era simples e dura. Bem cedo aprenderam a país (Vale dos Dinossauros), Sousa era um povoado
enfrentar o trabalho estafante, o sol ardente e a seca que conhecido por "Jardim do Rio do Peixe". A terra da região
apavora. Foi uma sociedade pobre diferente daquela do era bastante fértil, o que acelerou rapidamente o processo de
açúcar. Os empreendedores da atividade do couro povoamento e progresso do local. Em 1730, já viviam
pertenciam a um tipo humano, responsáveis mais tarde pela aproximadamente no vale 1468 pessoas. Sousa foi elevada à
formação da classe média. vila com o nome atual em homenagem ao seu benfeitor,
Diz Caio Prado Júnior ( um dos maiores historiadores Bento Freire de Sousa, em 22 de julho de 1766. Sua
da linha marxista que o Brasil teve) que o povoamento do emancipação política se deu em 10 de julho de 1854.
sertão é responsável pela formação de uma sociedade livre e
tipicamente brasileira. A fixação do sertão teve bases São João do Cariri: Tendo sida povoada em meados
populares e liberais. Era formada por criadores descendentes do século XVII pela enorme família Cariri que povoava o
dos corajosos desbravadores. Gente simples e rude. A sítio São João, entre outros, esta cidade que atualmente não
mistura do índio com o colonizador branco deu o “sertanejo” se destaca muito à nível estadual, mas em tempos de outrora
que ainda hoje apresenta traços inerentes, do homem que foi Campina Grande Já foi seu distrito. Sendo elevada à vila em
criado no meio rude e hostil. 22 de março de 1800, sua emancipação política é datada de
A Casa Grande foi o símbolo da fixação do litoral, na 15 de novembro de 1831.
do sertão foi o vaqueiro que se tornou a figura mais
importante da história pastoril. Tinham as tarefas de Pombal: No final do século XVII, Teodósio de Oliveira
amansar, ferrar e cruzar o gado. Queimavam os campos, Ledo realizou uma entrada através do rio Piranhas. Nesta
abriam caminhos e bebedouros, além de tudo vigiavam. venceu o confronto com os índios Pegas e fundou ali uma
Após trabalharem quatro ou cinco anos, recebiam de quatro aldeia que inicialmente recebeu o nome do rio (Piranhas).
nascimentos uma cria, o que lhes permitia mais tarde, Devido ao seu sucesso da entrada não demorou muito até
montarem seus próprios currais, arrendando terras aos que passaram a chamar o local de Nossa Senhora do Bom
latifundiários. Haviam, os privilegiados que conseguiam Sucesso, em homenagem a uma santa. Em 1721 foi
sesmarias e estabeleciam suas fazendas. construída no local a Igreja do Rosário, em homenagem à
Desta forma a ocupação do interior e dos sertões se padroeira da cidade considerada uma relíquia história nos
mostram como uma alternativa para aqueles que não tinham dias atuais. Sob força de uma Carta Régia datada de 22 de
tantos recursos para investir em dispendiosos engenhos, junho de 1766, o município passou a se chamar Pombal, em
aumentando as esperança de enriquecer e de ter terras. E homenagem ao famoso Marquês de Pombal. Foi elevada à
para o branco pobre, uma oportunidade de trabalho, já que as vila em 4 de maio de 1772, data hoje considerada como
atividades que envolviam a criação de gado não podiam sendo também a da criação do município.
sustentar o risco de utilizar mão-de-obra escrava para cuidar
de “bichos soltos” nos pastos Areia: Conhecida antigamente pelo nome de Bruxaxá,
A partir destas ocupações, o Tratado de Tordesilhas Areia foi elevada à freguesia com o nome de Nossa Senhora
(acordo firmado em 1498 que dividia as terras americanas da Conceição pelo Alvará Régio de 18 de maio de 1815.
entre portugueses e espanhóis) foi violado, fazendo-se Esta data é considerada também como a de sua elevação à
necessário a assinatura de novos acordos e iniciando o vila. Sua emancipação política se deu em 18 de maio de
processo de incorporação de novas áreas ao território 1846, pela lei de criação número 2. Hoje, Areia se destaca
brasileiro, até os limites atuais. como uma das principais cidades do interior da Paraíba,
principalmente por possuir um dos mais importantes centro
7.5. Principais povoados da Paraíba arquitetónicos do período colonial, e de ter cido nessa cidade
Através de entradas, Missões de Catequese e bandeiras, fundado o primeiro teatro da Paraíba, o Teatro Minerva,
o interior da Paraíba foi conquistado. E foram as Missões de além de um passado histórico muito atraente.
Catequese as primeiras formas de conquista do interior da
Paraíba. Após elas foram executadas bandeiras com a Campina Grande: O capitão-mor Teodósio de
finalidade de capturar índios, onde depois eram formadas Oliveira Ledo depois de aprisionar vários índios da tribo
pequenas vilas. A seguir temos algumas informações sobre Ariús (originários do leito do Piranhas), trouxe-os para um
as primeiras vilas da Paraíba: planalto com uma campina verde e um clima agradável.
Logo após convocou missionários para o trabalho de
Pilar: O início de seu povoamento aconteceu no final catequização e construção de um aldeamento, deram-lhe o
do século XVI, hoje uma cidade sem muito destaque na nome de Campina Grande. O capitão-mor Teodósio de
Paraíba, foi elevada à vila em 5 de janeiro de 1765. Pilar Oliveira Ledo instalou na região um povoado, e iniciou sua
originou-se a partir da Missão do Padre Martim Nantes colonização no início em 1697. Os indígenas formaram uma
naquela região. Pilar foi elevada à município em 1985, aldeia. Em volta dessa aldeia surgiu uma feira nas ruas por
quando o cultivo da cana-de-açúcar se tornou na principal onde passavam camponeses. Percebe-se então que as
atividade da região. características comerciais de Campina Grande nasceram
desde sua origem. Campina foi elevada à freguesia em 1769,
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sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição ( hoje São José César de Menezes, que “o título de governador da
João do Cariri). Sua elevação à vila com o nome de Vila Paraíba era apenas honorário e concedido para condecorar a
Nova da Rainha se deu em 20 de abril de 1790. Foi pessoa do seu Capitão-mor”. Os governadores e os Capitães-
municipalizada em 11/11/1864, e hoje, Campina Grande é a mores da época, não cansavam de alertar ao rei sobre as
maior cidade do interior do Nordeste. desvantagens da anexação.
Percebe-se então que as sucessivas frentes de ocupação
territorial ocuparam e colonizaram o estado, formando 8.1. Fim da subordinação comercial a Pernambuco.
importantes centros urbanos e comercias no decorrer de sua Com a morte do rei D. José I, sua esposa D. Maria I
história. O destaque no início de nossa história esta nas assume o trono, e Portugal entra num caos. A corte nomeou
bandeiras em caráter prisional, onde a brava resistência em 1798 Fernando Delgado de Castilho de S. Bento de Aviz
indígena causou o massacre de todo um povo e sua cultura, como governador da Paraíba. Suas primeiras atividades
somando a isso o papel dos aldeamentos missionários e a foram para atender as ordens recebidas pela rainha e
ambição dos homens. começou a redigir os relatórios dentro dos itens exigidos.
Logo em seguida envia um importante documento que
8. A Cobiça externa – Crise Comercial e anexação a relatava a situação da capitania.
Pernambuco (1756-1799). Com tais documentos a rainha D. Maria I, e o Conselho
Ultramarino são convencidos que a anexação a Pernambuco
A Capitania Real da Paraíba após a guerra holandesa não rendeu os resultados esperados, com isso foi assinada
encontrou dificuldades, não apenas internas, em função da pela rainha a Carta Régia de 17 de janeiro de 1799,
decadência em que estava, mas também externas restaurando a autonomia da capitania paraibana.
relacionadas com a depressão da economia européia do A Autonomia não se concretizou imediatamente em
século XVII. Assim, o declínio econômico da capitania função da citada Carta Régia. A restauração foi lenta. Os
ultrapassou esse período, prolongando se de tal forma até longos anos da dependência exigiam naturalmente cautelas
meados do século XVIII. que atendessem aos interesses e ao processo colonial
Para remediar os males, concorda o rei com o parecer português.
do Concelho Ultramarino de anexar a Paraíba a Pernambuco,
para que os produtos desta capitania fossem remetidos ao REBELIA NO NORDESTE EM 1817: A REPÚBLICA DE
Recife. Ficando essa anexação consumada pela Ordem Real QUASE TODAS AS CLASSES.
de 1º de janeiro de 1756. A metrópole, ao se omitir Adaptado de: Leonília Maria de Amorim
transferiu o problema para outra capitania, e essa medida
não surtiu o resultado esperado, já que Pernambuco também A Transferência da Corte Portuguesa para a Brasil-
estava em crise e esta não recuperaria a situação econômica colônia acarretou graves conseqüências para o Nordeste,
da Paraíba. porque o regente D. João concebeu a idéia que a região era
O Marquês de Pombal para restabelecer as finanças uma fonte inesgotável de recursos que dariam para sustentar
portuguesas teve a idéia de monopolizar ainda mais o sua política dispendiosa nas construções suntuosas no Rio de
comércio colonial e decide criar as companhias de comércio Janeiro, nos faustos da corte e em guerras inconseqüente.
em 1759, a Companhia Geral de Comercio de Pernambuco e Para cobrir tanta despesa, resolveu taxar pesadamente o
Paraíba e a Companhia Geral de Comércio do Maranhão e comércio das províncias que mais importavam produtos
Pará, que tinham como metas vender os produtos europeus e tropicais.
comprar os coloniais nestas regiões. Em 1816-1817, o Nordeste estava sufocado pela seca
Entre outros inconvenientes, a falta de comércio direto devastadora, pelos impostos altos e pelo monopólio imposto
com a metrópole, aumentava ainda mais a crise econômica, por Portugal. Para completar, o açúcar e o algodão, produtos
visto que mesmo estando o porto de Cabedelo com tradicionais nordestinos, estavam passando por momentos de
condições de fazer o escoamento da produção, quase toda baixa em suas cotações nos centros europeus. A situação era
ela era levada para Recife. Alguns dos principais produtores precária não só para grandes proprietários e comerciantes
da província sentiam-se prejudicados pelo fato de que ligados à exportação. Mas também para a massa da
raramente navios metropolitanos ancoravam em Cabedelo, população que sentia o peso da carestia sob produtos de
preferindo assim que sua produção seguisse para subsistência, atingidos pela seca de 1816.
Pernambuco, que mantinha regularmente o escoamento da Os adeptos do liberalismo político – restauração,
produção. patriotismo – pregavam a “lusofobia” e a “descolonização”,
Dessa maneira ficava inviável o desenvolvimento da fermentando idéias que se alastraram em pontos estratégicos
Paraíba, que via seus lucros serem arrecadados na província de Pernambuco. A crise, o descontentamento, e alguns ideais
vizinha que inclusive, não tinha nenhum interesse em presentes no Nordeste, formaram o cenário para a primeira
desenvolver sua subordinada. Era necessário, então, não só Revolta emancipacionista que deu “certo” no Brasil, ou seja
precatórias, mas, ordens régias para o repasse do dinheiro que passou do ato conspiratório e assumiu o poder por 75
que, por direito era arrecadação paraibana. dias. Outras províncias também aderiram ao movimento,
A jurisdição que Pernambuco tivera sobre a Paraíba, como Paraíba, Alagoas e Rio Grande do Norte. Alguns
exercera-se não somente no plano econômico, mas também historiadores taxam esse movimento de Revolução dos
militar e político, como fica bem claro numa declaração de
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Padres, devido ao grande número de religiosos que A REVOLUÇÃO DE 1824
integraram. Adaptado de: Horácio de Almeida
Com a tomada das ruas do Recife pelos revoltosos,
entre ele juizes, padres, militares, comerciantes, Entra agora em 1824, como ano de exacerbação
proprietários, etc, o governador fugiu e foi organizado um patriótica no nordeste que leva a Paraíba a envolver-se na
governo provisório, “revolucionário de todas as classes” nos temerária Confederação do Equador. Esse movimento
moldes do Diretório francês de 1795. Muitos aceitaram o revolucionário, irradiado em Pernambuco em cujo esfera de
governo provisório, mas os revolucionários de “Todas as influência gravitava a Paraíba, trazia em seu bojo idéias
Classes” não incluíram os escravos e seus propósitos, não republicanas e separatistas.
planejaram a libertação dos mesmos. A constituição D. Pedro, monarca de formação absolutista, dissolveu a
revolucionária garantia o “direito de propriedade”, inclusive Assembléia a 12 de novembro de 1823, por motivos que a
de escravos, importavam-se com as idéias liberais, não com nação conhece. Um mês depois os deputados por
os anseios populares, mas não se pode negar algumas Pernambuco, Paraíba, e Ceará, de volta a seus lares
características populares no movimento. desembarcaram no Recife. Oito deles lançaram um
O entusiasmo logo se estendeu à Paraíba, através de manifesto contra o ato do Imperador.
Itabaiana, Pilar e Vila Nova da Rainha (hoje Campina Alastrou-se a agitação em Pernambuco, ora soprada
Grande). Os líderes paraibanos forneceram armas e munição pelos artigos de Frei Caneca, no Tiphis Pernambucano, ora
ao povo que os seguia e marcham para a capital. No pelos rompantes de Paes de Andrade contra o poder central.
percurso, encontraram proprietários e homens amados que Paes de Andrade trouxera da América do Norte onde
os seguiam como voluntários. estivera exilado por força da Revolta de 1817, a idéia de
Os revolucionários proclamaram a República na implantar uma República Confederada. Sonhou ser o chefe
Paraíba em março e elegeram uma junta constituída de supremo dessa república, com seu centro de ação no Recife,
quatro de seus membros. Medidas de caráter revolucionárias onde campava de pequeno ditador.
foram logo adotadas: aboliu-se as Ouvidorias e Câmaras A lei de 20 de setembro de 1823, que aboliu as juntas
portuguesas; os tributos sobre a carne verde; suprimiram-se governativas, autorizava o monarca a nomear presidente e
as insígnias reais; proibiu-se a remoção do gado para o secretário de cada província. O presidente por sua vez,
interior, determinou-se a criação de novas sesmarias, promovia a eleição do conselho provincial pelo voto dos
regulou-se a administração dos índios e adotou-se a bandeira eleitores das paróquias, de modo a conciliar os interesses
da República na Paraíba. (hoje a bandeira Pernambucana) A locais, pois esse conselho tinha voto nas deliberações
revolta se alastrou com focos espalhados no interior e no administrativas e foi o núcleo inicial das Assembléias
litoral da Paraíba e das províncias que aderiram. Legislativas.
O governo provisório “republicano” criou uma “lei Com base nessa lei foi nomeado o Presidente da Paraíba
orgânica” para vigorar até que se fizesse e implantasse a Filipe Néri que tomou posse a 9 de Abril de 1824. Contudo
nova constituição. O texto da lei se norteou em princípios foi suspeito de lusitanismo. Tanta desconfiança provinha de
básicos como: liberdade de imprensa e consciência; a nomeação ser feita pelo Imperador. A dissolução da
tolerância religiosa; abolição de impostos; direito de Assembléia serviu de pretexto para a insubmissão. Ao tomar
propriedade; uma nova bandeira; preferir mandioca a pão, e posse do governo da Paraíba, convocou para que as câmaras
beber cachaça em vez de vinho. realizassem eleições dos membros do conselho. Somente a
A reação joanina não foi diferente de outros câmara da capital atendeu ao apelo elegendo seis
movimentos acontecidos no Brasil. Perseguições foram conselheiros. As vilas do interior aguardavam em silêncio.
organizadas por terra e opor mar, chegando em Recife a Eis que a Vila Real do Brejo de Areia assume uma
carnificina foi geral. O saldo da revolta foi mais de 100 atitude de guerra contra o governo, declara que não conhece
mortes, 150 feridos, 400 degradados, 26 mortes e 2 suicidas. a autoridade do Presidente da província, por tanto nenhum
A república foi então sufocada, Depois da repressão, conselho para o seu governo. Ao ato de insubordinação,
lojas maçônicas foram fechada, os seminários ameaçados. O consubstanciado na ata de 3 de Abril aderiram as câmaras de
governo republicano na Paraíba implantado em 15 de março Vila Nova da Rainha, Pilar, Monte-Mor e São João do
foi deposto em 05 de maio, face capitulações dos Cariri, abrangendo a grande proporção da província.
revolucionários sob promessas de não retaliações. Todavia Areia foi o centro da agitação. A 5 de Maio, o povo e a
logo líderes paraibanos como Amaro Gomes Coutinho, tropa, em pé de guerra, aclamaram um governo temporário,
Peregrino de Carvalho, Padre Antônio Pereira , Francisco sob a presidência de Félix A. Ferreira de Albuquerque, genro
José da Silva e Inácio Maranhão tornaram-se mártires, do capitão-mor da Vila, no qual parte à frente das tropas
quando foram sumariamente e “exemplarmente” executados, para Itabaiana, onde espera receber o reforço prometido de
tendo seus cadáveres retalhados e expostos em lugares Pernambuco.
públicos. A fim de contornar o perigo, o governo da Paraíba
procurou chamar os revolucionários à razão. Mandou ao seu
encontro uma missão de paz que nada conseguiu, pois os
chefes rebeldes exigiam a renúncia do Presidente Filipe
Néri, ou isso ou a decisão por armas.

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Diante disso, foi enviada a Pilar um forte contingente (datada de 1814) o Museu Histórico de Campina Grande,
das forças de linha. Em 24 de Maio referiu-se a batalha em localizado na avenida Marechal Floriano Peixoto.
Itabaiana. Foi a maior já travada em solo paraibano, talvez a
mais importante da Confederação do Equador, Os dois REBELIÃO PRAIEIRA: 1848.
exércitos se defrontaram com ânimo, o da legalidade mais Adaptado de: Elpidio de Almeida.
numeroso, com 2.000 homens, o da oposição com apenas
1.500. Sobre o resultado, é certo que não houve vencedores O movimento que irrompeu em Pernambuco em fins de
nem vencidos. 1848, conhecido como Rebelião Praieira, resultou como
Após quatro horas de luta, a coluna do governo recuou disse Amaro Quintas, aparentemente da substituição do
para Pilar, com 90 mortos e muitos feridos, a da revolução gabinete liberal pelo conservado, mas “as suas raízes se
recolhe-se para a povoação de Serrinha, com 23 mortos e encontram na insatisfação reinante na massa pela opressão
130 soldados aprisionados. Em Serrinha, os revolucionários exercida pela “feudalidade” territorial, aliada ao elemento
receberam reforços de Pernambuco e marcharam sobre Pilar, estrangeiro”.
que encontraram desocupada, permanecendo muitos dias em Era uma insurreição de elevados propósitos, mas
Feira Velha. As forças do governo já haviam se recolhido à essencialmente pernambucana, sem possibilidade de
Capital. Félix Antônio presidente temporário da Paraíba, erradicar em províncias vizinhas, que não sentiam a opressão
ameaça tomar a Capital e prender o presidente Filipe Néri. de grupos familiares e não haviam feridas abertas pela
Em Pernambuco as coisas se tornavam mais graves. prepotência do governo imperial. A Paraíba e outra
Manuel Paes de Andrade insurgiu-se em, a 2 de julho contra províncias não estavam envolvidas pelos mesmos ideais,
o governo de D. Pedro e proclamou a CONFEDERAÇÃO nem nos atritos partidários do povo pernambucano.
DO EQUADOR, composta de “seis províncias do Norte” Mas, depois da derrota dos recifenses e a morte do
destinada a implantar uma República sob o modelo da dos chefe Nunes Machado, viu-se a Paraíba envolvida sem
Estados Unidos da América do Norte. maiores propósitos no levante. Os rebeldes que nada
“Mas os fatos não lhe foram favoráveis. Uma esquadra conseguiam, resolvem se retirar para o interior na esperança
sob as ordens do almirante Cochrane bloqueou o porto do de apoio e recursos.
Recife, enquanto o exército imperial, avançando pelo sul Em Goiana, em torno de 600 homens apoderaram-se da
tomou a Capital, pondo em debandada os rebeldes, após guarnição e tomaram armas e munição, logo as forças do
duros combates”. (ALMEIDA, Almeida. Histórias de governo e os praieiros tiveram um confronto, os
Campina Grande. Campina Grande. Sd. Epgraf.) sobreviventes seguem para a Paraíba e chegam em Pedras de
Os revolucionários retiraram-se para o interior, visando Fogo, linha divisória das duas províncias. Acamparam em
chegarem ao Ceará, onde pretendiam juntar-se as forças de Itabaina sem resistências. Daí seguiram para Areia, que era
José Pereira Filgueiras, que assumiria o governo da governada por representantes liberais, e poderiam ter bom
província e aderira a causa. Em Goiana unem-se as forças da acolhimento.
Paraíba. Penetram na Paraíba por Monteiro, passaram por Os correligionários areienses, não hesitaram em acudir
Carnoió, Cabaceiras, Pedra Lavrada, seguindo para o Rio seus colegas. Tomaram providências para defender a cidade,
Grande do Norte, passando por Caicó, retornaram a colocando barreiras e piquetes onde provavelmente
província ao atravessar São João do Rio do Peixe e chegam passariam as forças do governo. Poderiam vencer ou no
em Umari no Ceará, onde encontraram 150 cadáveres do mínimo provocar baixas se não fossem prejudicados por um
destacamento de Folgueiras no combate contra as forças conservador, Sebastião Guedes Alcoforato, conhecedor da
legais. região, servindo de guia para a tropa governista de Feliciano
No Ceará receberam a notícia do trucidamento de Antônio de Falcão.
Tristão do Araripe ( presidente temporário do Ceará ) e a Na manhã de 21 de Janeiro de 1849, guiados por
deserção de Filgueiras. Perdidas as ultimas esperanças e Sebastião, penetraram as forças governistas sem maiores
cercados, em 28 de Novembro tiveram que se render-se ao baixas, havendo a retirada dos liberais. Feliciano Falcão ao
coronel Bento José Lamenha Lins, comandante e chefe das invés de seguir os praieiros, permanece na cidade praticando
forças de Pernambuco que há tempos os persegue. violências e saqueando casas, principalmente dos liberais
Entregaram-se entre outros, o major Agostinho Bezerra locais.
Cavalcante, o capitão Lázaro de Sousa Fontes e o Frei Os praieiros viajando a noite com sentido à estrada do
Joaquim do Amor Divino Caneca ( o Frei Caneca ), sertão passam por Pocinhos (antigo município de Campina
considerado como o principal cabeça pensante do Grande), reunidos em conselho decidem liberar os
movimento. companheiros paraibanos. Os remanescentes das forças
Levados para Recife onde seriam executados, passam revoltosas decidem voltar à Pernambuco desfaçados. Assim
por algumas das localidades que haviam notoriamente termina a Rebelião Praieira e a participação paraibana no
simpatizantes ao movimento liberal. Uma dessas foi a Vila movimento. Depois alguns envolvidos foram presos e outros
Nova da Rainha ( Campina Grande ), no qual serviu de deportados. Os destaques paraibanos cabem aos liberais
parada de descanso das forças legais. Os sublevados ficaram Antônio Borges da Fonseca e Maximiliano Lopes Machado
encarcerados na antiga cadeia pública e Câmara, onde hoje
se encontra a mais antiga construção de nossa cidade,

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HOMENS POBRES E “LIVRES” REBELAM-SE: recenseamento da população, e o segundo, o decreto 789,
MOVIMENTOS SOCIAIS NO SÉCULO XIX tratava do Registro Civil no caso de nascimento e óbito,
Damião de Lima anteriormente feito pela Igreja e que agora, passaria à
responsabilidade de funcionários do estado. O primeiro
A historiografia tradicional ao descrever o século XIX decreto relacionado ao censo deveria entrar em vigor no dia
enfatiza a região Sudeste esquece, quase que completamente, 15 de julho de 1852 e o decreto que versava sobre o registro
a região Nordeste. É como se esta região ao perder a civil de nascimento e óbitos no dia 1º de janeiro de 1852.
supremacia econômica com a crise do açúcar, tivesse Declarando-se contrárias ao que chamavam de “Lei do
deixado de existir. No entanto, sua história continua se Cativeiro”, as populações dos citados municípios, armados
desenvolvendo em todos os seus aspectos e os movimentos de cacetes, pedras, espingardas e mais o que estivesse ao
sociais até se intensificam na medida em que a crise alcance das mãos e pudesse ser utilizado como arma,
econômica aumenta os conflitos. partiram para arrebatar das autoridades, os livros de
Ao tratar dos movimentos sociais do século XIX no registros, para que os mesmos fossem examinados pelos
Nordeste, a historiografia enfoca apenas dois movimentos; a padres. Tal procedimento leva alguns historiadores a verem
Revolução Pernambucana de 1817 e a Confederação do neste movimento, bem como no movimento Quebra-Quilos
Equador em 1824, isto no início do século, depois passa apenas o aspecto religioso.
apresentar os movimentos do período regencial com a Aparentemente, esses decretos nada teriam a
Sabinada, Balaiada e Cabanagem e a Farroupilha ocorrida no acrescentar que pudessem ser considerados como motivo
Sul. Ao abordar a segunda metade do século, a historiografia para tamanha revolta da população. Para entender o que
não trata de nenhum movimento social. É como se o aconteceu ou porque aconteceu, vamos ter que analisar o
crescimento da economia nacional, com o fortalecimento quadro mais geral da região.
dos cafeicultores, tivesse resolvido todos os problemas Como já foi colocado desde o século anterior, a
nacionais e reinasse a paz nas demais regiões do país. economia nordestina não estava bem, com muitas oscilações
No entanto está analise é equivocada. Diversos no seu principal produto de exportação, ou seja, o açúcar. Na
movimentos eclodiram em todo o país. Só para relacionar a verdade em meados do século XIX esta situação agrava-se,
região Nordeste, ocorreram insurreições importantes como a principalmente com o aumento das dívidas dos grandes
revolta de 1878 e o movimento conhecido como “Carne sem proprietários de terra que, perdendo seu poderio econômico,
osso farinha sem caroço” ocorridos em Salvador, sem falar perdiam também poder político junto ao poder central.
no grande massacre de CANUDOS. Com o endividamento, os grandes proprietários se
Na segunda metade do século XIX ocorreram alguns viram obrigados a desfazerem-se de parte do seu capital
levantes importantes na Paraíba. O Ronco da Abelha apesar “móvel”, no caso os escravos, que foram vendidos para a
de ter sido iniciado nos Estados vizinhos acabou se região Sudeste; gerando aqui, outro problema, a falta de
difundindo na Paraíba e o movimento de Quebra-Quilos que mão-de-obra para a manutenção da grande lavoura de
se iniciou na Paraíba e espalhou-se para os estados vizinhos. exportação, principalmente o algodão, que neste período,
É preciso ficar claro que estes movimentos têm suas estava com preços em ascensão. Se fazia necessário retirar
especificidades, mas também têm dois fatores em comum: mão-de-obra da agricultura de subsistência e desvia-la para
serem movimentos que envolveram, principalmente, homens as plantações de algodão. Era comum a reclamação dos
e mulheres pobres e livres, de área em que a concentração de grandes proprietários contra o que os mesmos consideravam
escravos era pequena tendendo a diminuir e, estes como preguiça, “era preciso obrigar estes vadios a
movimentos terem ocorrido em um período de profunda trabalhar”.
crise econômica e de descaso por parte da monarquia e seus Justamente um ano antes dos decretos é assinada a Lei
representantes, que nada faziam para responder aos que proíbe o tráfico externo de escravos, aumentando o
problemas gerados pela crise na região. tráfico interno de escravos, e deixando ainda eram livres e
queriam assim permanecer.
O Ronco da Abelha (1851 – 1852) As dimensões em torno dos motivos que contribuíram
O movimento conhecido como Ronco da Abelha, para este movimento são inúmeras. O historiador Marc
ocorrido entre dezembro de 1851 e fevereiro de 1852, Hoffnagel, por exemplo, destaca como motivo para o
envolveu vilas e cidades de cinco províncias do Nordeste: movimento, principalmente, a questão econômica com a
Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Ceará e Sergipe, sendo mais ascensão do preço do algodão. Hamilton Monteiro,
forte nas duas primeiras províncias. contrariando Geraldo Joffily, aborda o movimento a partir de
Na Paraíba levantaram-se as vilas de Ingá, Campina fatores externos, como a participação de elementos do
Grande, Fagundes, Areia, Alagoa Nova, Alagoa Grande e partido de oposição, enquanto Geraldo Joffly, aborda os
Guarabira. Durante os levantes, os engenhos e vilas foram aspectos internos dando relevância a organização interna e a
saqueados e os grandes proprietários, bem como as visão dos pequenos proprietários que, segundo o mesmo,
autoridades locais, tiveram que se refugiar para não serem percebiam claramente as mudanças ocorridas no período e as
linchados pela multidão. perdas que estas mudanças estavam acarretando para eles.
Mas o que significava essa revolta? Por que começou? Na verdade houve influência do partido de oposição ao
O estopim da revolta foi o lançamento de dois decretos em governo no movimento, bem como de diversos outros
junho de 1851, o primeiro decreto, 0 797, tratava do
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fatores, porém o encadeamento das idéias torna-se lógico Isto não significa dizer que foi um movimento único e
para o trabalhador livre da época. coeso. Ao contrário, poderia se dizer que o mesmo se
Basta fazer a ligação entre a escassez de escravos e o espalhou dentro da lógica do chamado efeito dominó, pois
discurso dos grandes proprietários exigindo leis que pusesse em cada semana o movimento se dava em um determinado
fim a resistência ao trabalho e acabasse com a vadiagem local e a participação da população no mesmo também foi
além do aparecimento dos “famosos” decretos. Estava bastante diversificada.
armado o palco para a transformação dos trabalhadores e dos Para alguns historiadores, este movimento teve como
seus filhos em escravos. Foi com este pensamento que o principal motivo, a ignorância e o fanatismo religioso.
povo se levantou contra os seus inimigos imediatos, os Embora não haja um consenso sobre o motivo que
grandes proprietários e as autoridades locais, representantes propiciou o surgimento deste movimento, podemos afirmar
diretos do estado que, segundo o pensamento reinante no que não houve um motivo específico e sem uma conjugação
movimento, tencionavam transforma-los em escravos. de fatores que acabaram por desencadear o mesmo.
Embora esse não fosse o objetivo do Império, ficava Entre estes fatores podemos citar: a) A centralização
difícil convencer o trabalhador do contrário devido as administrativa promovida pelo Império que aumentou os
experiências anteriores. Principalmente após a Guerra do impostos já existentes e criou novos impostos; b) A adoção
Paraguai, onde a população pobre foi extremamente do sistema métrico decimal uma “novidade” que era vista
sacrificada. Com isto, o movimento foi se espalhando, pelos trabalhadores pobres como nociva na medida em que
“obrigando” o governo a utilizar um de seus principais era aproveitada pelos comerciantes para diminuir a
mecanismos de “convencimento” “a população pobre: a quantidade de produtos comprados por estes trabalhadores;
Repressão. c) A mudança na lei do recrutamento militar. Estes fatores
Para reprimir o movimento, o governo mobilizou mais conjugados com a grande crise por que passava o Nordeste
de mil soldados da polícia, alem da convocação da Guarda foram o estopim para a revolta.
Nacional e da utilização de padres Capuchinhos para Como eram crescentes as insatisfações, quase todas as
prometerem a salvação a quem desistisse do movimento e o camadas sociais da região acabaram se envolvendo no
fogo do inferno a quem não se submetesse. movimento, uma mais ativa que outras, dependendo do local
Apesar da ação enérgica do governo, ficava difícil a e dos interesses envolvidos. Participaram do movimento os
repressão porque não se identificavam os líderes, com isso o grandes proprietários, os políticos da oposição, parte do
governo resolve “criar” os líderes. Muitas pessoas são clero e os trabalhadores pobres. Obviamente que cada
acusadas, porém não se conseguem provar. Por fim, em 29 camada social tinha os seus motivos e seus objetivos, porém
de janeiro de 1852, o governo imperial edita o decreto 907 uma participação tão ampla fez com que o movimento
que suspende o decreto 797. a realização do censo só irá tivesse maior repercussão que o movimento tratado
ocorrer vinte anos depois e o registro civil só é implantado anteriormente.
com o advento da república, quando ocorre a separação Vejamos os interesses de cada camada social envolvida:
oficial entre Esta e Igreja. Os grandes proprietários, quando não participaram
diretamente do movimento, omitiram-se no apoio à
Quebra-Quilos (1874-1875) repressão do mesmo, isto porque estavam revoltados com o
No dia 31 de outubro de 1874, tem início na Vila de descaso do governo imperial para com a região, bem como
Fagundes, comarca de Ingá, na Paraíba, durante a feira, uma discordavam da nova lei de recrutamento. A republica dos
discussão entre o arrematante de impostos que cobrava o “coronéis” e das oligarquias, conforme visto militar que não
chamado imposto de chão (que consistia em uma taxa de permitia a substituição do convocado para o serviço militar,
100 mil réis, cobrada aos comerciantes, sobre qualquer por alguém indicado por este.
mercadoria exposta no pátio das feiras), e os feirantes. Desta Os políticos da oposição utilizavam-se de todas as
discussão partiu-se para a violência e estava iniciado o armas para desestabilizar os conservadores que estavam no
movimento que ficou conhecido como Quebra-Quilos. poder. Neste período já havia sido lançado o Manifesto
Devido as instalações de quase todos os setores sociais republicano, e este movimento poderia muito bem ser
da região Nordeste, o movimento cresce e espalha-se pela utilizado para enfraquecer o governo.
Paraíba, sendo muito forte nas cidades de Campina Grande e O clero estava atravessando uma fase de turbulência
areia e ramifica-se para os Estados vizinhos, ou seja, com o governo, devido ao avanço da maçonaria e a prisão do
Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Norte. bispo D. Vital.
Em Campina Grande, o movimento tem início na feira Os trabalhadores pobre que compunham a imensa
do sábado 21 de setembro de 1874, onde os revoltosos, maioria dos rebeldes lutavam contra a cobrança exagerada
receberam as autoridades policiais a pedradas. Neste cenário, de impostos, o que dificultava ainda mais a sua
“Tomam os sediciosos conta da feira, passam sobrevivência.
livremente a quebrar as medidas arrebatadas aos A cobrança dos impostos era realmente abusiva, pois,
comerciantes, a despedaçar as cuias encontradas em mão dos além dos impostos criados pela coroa, existiam os impostos
vendedores retalhistas, a recolher os pesos de todos os criados pela administração provincial, os da administração
tamanhos, atirados em seguida no Açude Velho”. municipal e os abusos cometidos pelos cobradores, com o
(ALMEIDA, 1962, p.147-148). objetivo de aumentar o seu “salário”. Para se ter uma idéia,
muitas vezes os impostos cobrados eram maiores que o valor
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das mercadorias, e cada vez que o vendedor mudasse de outro jornal Verdade, em março de 1888, dois meses antes
lugar, teria que pagar novo imposto. da Lei Áurea o qual, além de desenvolver a propaganda
Em quase todos os locais ocorrem fatos semelhantes, ou abolicionista tentou pressionar os proprietários de escravos a
seja, a invasão das feiras com quebra de pesos e medidas do libertar seus cativos, divulgando os nomes dos senhores que
novo sistema métrico decimal, destruição dos arquivos das ainda os possuíam.
câmaras municipais, coletorias, cartórios civis e criminais, e A “Emancipadora Areiense”, como os outros
até os papéis dos correios. abolicionistas da década de 1880, adotou medidas radicais
Embora, como já foi citado, diversos setores da para apressar a extinção da escravidão. Seus agentes agiram
sociedade tenham participado do movimento, a repressão, diretamente nas senzalas, estimulando fuga de cativos. Os
como sempre, acabou caindo sobre os trabalhadores pobres. escravos fugidos geralmente, se refugiavam no sítio de S.
É interessante perceber as contradições no discurso do José, pertencente a Simão Patrício da Costa Senior, membro
historiador Elpídio de Almeida, facilitando a identificação dessa Sociedade. Lá os fugitivos ocupavam as casas dos
de sua posição de classe. No início do seu texto sobre o moradores, estribarias, estábulos, e até a própria casa do
movimento o historiador declara que “[...] foi um proprietário. Por várias vezes, a propriedade foi cercada e
movimento sem chefes descobertos e responsáveis [...]”. ameaçada por tropas policiais.
Para acabar com o movimento, o governo da Paraíba, já A Igreja em Areia não permaneceu indiferente ao
que não conta com o auxílio dos grandes proprietários de movimento abolicionista. Foi o Pe. Sebastião Bastos de
terras, pede auxílio do Império e também dos governos Almeida Pessoa, vigário interino do município e sócio da
vizinhos, Pernambuco e Rio Grande do Norte, no que é “Emancipadora” trabalhou a favor da extinção da
atendido. A colaboração do Presidente da Província de escravidão. Convocou em uma circular seus paroquianos,
Pernambuco Henrique Pereira de Lucena causa revolta na inclusive proprietários de escravos a comparecerem a
oposição liberal que o acusa de traidor do povo, já que o reunião na Igreja Matriz no dia 10 de julho de 1887, quando
mesmo lutara na Revolta Praeira, reprimida pelos segundo o Padre seriam abordados assuntos relativos à
conservadores e agora enviava tropas para reprimir o conciliação de interesses dos senhores com os escravos.
movimento de Quebra-Quilos aliando-se aos conservadores. De início o Padre Bastos leu uma carta pastoral do
A repressão ao movimento foi violenta, a ação das Bispo Diocesano, a qual afirmava estar a escravidão em
tropas foi de verdadeira selvageria, aplicada cegamente desacordo com os princípios da religião, além de constituir
contra culpados ou inocentes como mostra José Américo e um entrave ao processo econômico e desacreditar o Brasil
Almeida no seu livro A Paraíba e seus Problemas como Nação civilizada.
A repressão aos movimentos populares de forma Em seguida discursou o advogado João Lopes Pessoa
violenta, nunca foi novidade na região. A novidade desta da Costa que, após enaltecer a iniciativa do vigário, declarou
feita ficou por conta da invenção de um novo instrumento de livre seus escravos. Mas foi o pronunciamento do educador
tortura que, segundo consta, fora inventado pelo Capitão Francisco Xavier Camelo Júnior, que mais chamou atenção.
Longuinho, comandante de uma das colunas que seguiu para Enfocando o histórico da escravidão e as vantagens do
combater o movimento no interior: o colete de couro. trabalho livre para o bem estar público e progresso
O colete de couro, que levou à morte Carga d’água, econômico, porque tinha o estimulo da remuneração,
“Consistia em costura-se ao tórax dos presos,, muitos destacando a aceleração do progresso nos EUA pós a
inculpados, uma faixa de couro cru, previamente milhada libertação e o aumento das rendas no Ceará depois de
durante horas. A medida que o couro secava ia comprimindo declarada extinta a instituição servil.
o peito da vítima, causando-lhe muitas vezes morte Por fim Padre Bastos apelou para que os presentes
torturante por asfixia.” (ALMEIDA, 1962, p. 157) alforriassem seus escravos. A partir de então, algumas cartas
Durante todo o império e até os dias atuais, de alforria fizeram alusão a pastoral do Bispo, difundida
continuaram e continuam ocorrendo conflitos relacionados pelo padre Bastos, mostrando o efeito daquela reunião sobre
aos problemas centrais que originaram estes movimentos ou os senhores areienses. Os dados mostram o êxito do
seja, descaso das autoridades e privação de qualquer forma movimento abolicionista, já que, revelam uma aceleração de
de interferência das camadas populares na vida do país. Só libertações nessa década.
utilizando a Repressão é que os governantes conseguiram e
vem conseguindo manter a população à margem das HISTÓRIAS DA ESCRAVIDÃO EM
decisões políticas e econômicas do Brasil. CAMPINA GRANDE.
Luciano Mendonça de Lima
DA CRISE DO ESCRAVISMO À ABOLIÇÃO
Adaptado de: Diana Soares de Galiza A historiografia brasileira sofreu nessas últimas décadas
profundas transformações, em termos de fontes, temas e
OS abolicionistas também usaram da imprensa para abordagens. Nesse contexto, se destacam os novos estudos
estimular a concessão de alforrias e apressar a extinção da sobre a escravidão, tanto em termos quantitativos, como
escravidão em Areia. Desenvolveram a propaganda qualitativos. Porém, estes trabalhos ainda estão concentrados
abolicionista pelas colunas do Areiense, jornal que começou em certas áreas do Brasil, especialmente a região centro-sul.
a circular em 1887 e que aderira ao movimento. Contudo, Com isso se perde muito da riqueza e da multiplicidade do
para melhor ativar a campanha, Manuel da Silva fundou
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que foi a experiência do cativeiro no Brasil, durante os mais época, documentação essa preservada, mesmo que
de três séculos em que ele perdurou em nosso país. Este precariamente, em algumas instituições públicas. Nesse
artigo se dispõe a discutir uma dessas muitas experiências, contexto, se destaca a série de inventários post-mortem
passada em Campina Grande, município do interior da atualmente depositada no Arquivo Geral do Fórum Afonso
Paraíba, recuperando o papel dos escravos não apenas como Campos, abrangendo o marco temporal entre os anos de
mão-de-obra, mas também como sujeitos da sociedade em 1785 e 1888. A análise dos dados aí contidos permite ao
que viveram. pesquisador traçar um rico e variado painel da gênese,
Comecemos constatando um silêncio: um dos capítulos desenvolvimento e transformações da instituição do
esquecidas da história de Campina Grande certamente foi o cativeiro em nosso município.
da escravidão. Tanto numa produção historiográfica local Na maioria dos mais de 900 inventários pesquisados
mais tradicional, e até em textos de cunho acadêmico mais consta a presença de cativos, dentre os bens deixados pelo
recente, a história do cativeiro figura nessas obras (com as defunto para os seus herdeiros. Isso pelo menos até 1850,
exceções que confirmam a regra), como uma mera nota de quando a oferta proveniente do tráfico negreiro internacional
rodapé. No entanto, a exemplo de todo o Brasil, a história do permitia que uma boa parte dos homens livres proprietários
antigo município de Campina Grande teve na instituição pudesse aspirar à posse de escravos.
escravista, particularmente aquela de matriz africana, um de Os dados confirmam que os indivíduos pertencentes às
seus fundamentos, isso pelo menos até a segunda metade do famílias tradicionais de Campina Grande, membros por
século XIX. Nesse sentido, podemos afirmar que o tão assim dizer de sua elite econômica e política, possuíam, para
decantado “progresso” da Rainha da Borborema, ainda hoje os padrões locais, expressivos contingentes de escravos, a
propagado em prosa e verso por suas elites, se fez em exemplo dos Nunes Viana, Alves Viana, Costa Agra, Pereira
“costas negras”, ou seja, como resultado de um intenso Luna, Vila Seca, Vaz Ribeiro, Pereira de Araújo, Lourenço
processo de exploração de gerações e mais gerações de Porto, Cavalcante de Albuquerque etc. Estes clãs, não por
trabalhadores escravizados. acaso, procuravam estimular o casamento entre seus
A história da escravidão em Campina Grande está membros, numa clara estratégia de manutenção do status
vinculada ao processo de conquista e ocupação de seu quo. O caso mais notório de todos é o do capitão-mor Bento
território original, quando grupos de sertanistas vindos da José Alves Viana, português de nascimento que migrou para
Bahia devassaram não só o interior da antiga capitania da o Brasil em fins do século XVIII e aqui fixou residência, se
Paraíba, mas também as de Pernambuco, Rio Grande do transformando num dos homens mais poderosos do lugar.
Norte e Ceará, a partir da segunda metade do século XVII. Quando da abertura de seu inventário, em 1844, sua riqueza
Nesse cenário histórico de intensos conflitos, os primeiros orçava em quase 78 contos de réis, uma fortuna para os
escravos locais foram os grupos indígenas da grande nação padrões da época. Dentre os muitos bens que deixou para
tapuia que escaparam à sanha destruidora dos Oliveira Ledo, sua descendência, constavam cinqüenta e sete escravos,
um dos mais destacados clãs da região e tido por alguns entre africanos de diversas etnias e crioulos, números esses
como verdadeiros heróis civilizadores. Porém, logo em que o transformaram no maior escravocrata da primeira
seguida foram chegando os primeiros africanos, em função metade do século XIX.
da existência prévia do tráfico África/Brasil e a expansão das Contudo, ao lado de nomes hoje famosos e poderosos
atividades sócio-econômicas do povoado, depois Vila Nova da época, havia também um considerável número de
da Rainha (1790) e finalmente cidade de Campina Grande, pequenos proprietários, a exibir de um ou dois escravos em
em 1864. Com o tempo, eles foram se tornando a maior seu espólio, cuja posse era objeto de disputas entre os
parte da força de trabalho local. Ao lado de outros tipos de herdeiros. Este foi o caso de Ana Tereza de Jesus, falecida
trabalhadores “livres” (a exemplo dos jornaleiros, em 1826, cujo inventário feito no ano seguinte por seu
moradores, meeiros e agregados), foram os principais marido João da Rocha Júnior, acusava a existência de uma
responsáveis pela produção da riqueza material e cultural do única escrava, a africana Maria, de 40 anos, avaliada em 100
município. mil réis. Ao final, no processo de partilha ela foi dividida
A maioria dos escravos de Campina Grande era de entre o viúvo meeiro e os nove filhos co-herdeiros.
origem banta, povo esse proveniente da área territorial onde Apesar de sua posse representar prestígio para quem os
hoje se situa o país de Angola, na África centro-ocidental. possuía, a aquisição de escravos por parte dos proprietários
Estes eram desembarcados no porto do Recife e daí se dava, principalmente, pelas possibilidades de produção de
redistribuído para diferentes localidades, tanto de riqueza que a exploração sistemática de seu trabalho
Pernambuco como da Paraíba. No caso em tela, eles representava. Nesse aspecto, podemos afirmar que não
viajavam por Goiana, vila que ficava na fronteira entre as houve uma atividade sócio-econômica do antigo município
duas capitanias, no sentido norte/sul. Dentre os muitos de Campina Grande em que os africanos e seus descendentes
africanos que fizeram essa longa e dolorosa viagem para não estivessem empregados. Lá estavam eles nos algodoais,
terras “campinenses”, podemos citar os casos de Manoel, preparando a terra, plantando a semente, colhendo e
Inácia e Domingos, todos naturais do “gentio de Angola”, beneficiando a planta, ensacando e transportando o seu
périplo esse feito no ano de Nosso Senhor Jesus Cristo de produto final, o chamado “ouro branco”; nas fazendas e
1785. currais, cuidando de todo tipo de animais, na condição de
O estudo da escravidão em Campina Grande pode ser auxiliar ou mesmo vaqueiro; plantando e colhendo o feijão,
feito a partir das evidências históricas da documentação de milho e a mandioca, esta última matéria-prima da farinha,
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um dos principais componentes da dieta local; extraindo da conjuntura favorável para ganhar uns bons contos de réis.
cana de açúcar a aguardente e a rapadura nas engenhocas, Porém, nem sempre as coisas corriam conforme seus
produtos esses também de largo consumo entre a população; pragmáticos cálculos. Nesse sentido, os escravos, tanto em
desempenhando as mais variadas funções domésticas, no uma ponta como na outra do processo, se recusavam a
interior de modestos casebres de pau-a-pique ou então de desempenhar o papel passivo que, aparentemente, o destino
casas-grandes construídas de materiais mais nobres, como lhes reservava. Os que de fato embarcaram e chegaram a
tijolo, telha, pedra e cal; trabalhando como ferreiros, seus destinos, os temidos “negros maus vindos do norte”,
sapateiros, marceneiros, pedreiros e demais ofícios contribuíram para o aceleramento da crise da escravidão, ao
artesanais; marcando presença no pequeno comércio, feito minaram o domínio senhorial com o aumento da
principalmente nas feiras, realizadas semanalmente nas criminalidade e das fugas em massa. Igualmente, os que
quintas-feiras e sábados, onde compravam, vendiam e conseguiram ficar, de alguma maneira, redefiniram as
trocavam os mais diversos tipos de mercadorias e bens, relações cotidianas com os senhores.
resultante de seu próprio trabalho autônomo, suas roças ou É o que parece revelar, nesse último caso, uma história
então de pequenos furtos. protagonizada pelos escravos Antônio e Firmino, ambos
Porém, nem só da dureza do trabalho e das marcas da pertencentes ao coronel Alexandrino Cavalcante de
violência era feita a existência dos escravos. Por mais que Albuquerque, um dos maiores escravocratas de Campina
seus donos tentassem transformá-los em coisas, os cativos Grande. Ao saberem que iam ser vendidos para “o sul”,
locais procuraram preservar a sua dignidade humana, ao tramaram a morte de Antônio Freire de Andrade,
frearem os aspectos mais terríveis do sistema, impondo encarregado pelo senhor de vendê-los. Na noite de sete de
limites à exploração econômica e a opressão social. Para isso outubro de 1872, aproveitando a ocasião em que o seu
utilizaram-se dos mais diferentes expedientes e estratégias, senhor estava deitado em uma rede, deram-lhe duas facadas,
condicionados pelas particularidades históricas dos sendo que uma atingiu o braço e a outra a coxa do ofendido,
contextos em que estiveram inseridos ao longo do tempo. que escapou por pouco. Mais do que ninguém, os
Esse complexo processo, feito de embates, conflitos, mencionados escravos sabiam o que estava em jogo: velhas
alianças e negociações estabelecidas no cotidiano, gestava-se relações de amizade, parentesco e trabalho pacientemente
no mundo do trabalho e se estendia para todas as dimensões tecidas no tempo podiam ser desfeitas de uma hora para
da vida social. A história da Campina escravista está outra. Em compensação, caso a negociação se consumasse, o
pontilhada de muitos desses episódios, feitos de muita dor e futuro que os aguardava era pouco alvissareiro: as novas e
sofrimento, mas também de altivez e coragem, expressando incertas condições de vida em alguma fazenda de café do
lutas individuais e coletivas pela liberdade e o direito a uma Rio de Janeiro, São Paulo ou Minas Gerais. Nessa
vida menos opressiva, mesmo que no contexto do cativeiro. encruzilhada que a história os colocou, fizeram uma opção
Desse modo, fugiram aos estereótipos de vítimas inertes ou de risco, é verdade, porém em nome de direitos que eles
de heróis da resistência. consideravam perigosamente ameaçados naquele momento.
A fuga foi uma das maneiras mais recorrentes que os Por outro lado, em conjunturas de comoção social, em
escravos usaram para conquistar a liberdade, definitiva ou que a comunidade dos homens livres quase sempre ficava
provisória. Entretanto, elas podiam adquirir diferentes dividida, os escravos aproveitavam para reivindicar
significados e objetivos. Quando da destruição de Palmares, coletivamente. Foi o que aconteceu em Campina, pelo
alguns de seus remanescentes fundaram um novo quilombo, menos em duas ocasiões. Entre dezembro de 1851 e janeiro
chamado Cumbe, em território paraibano, em inícios do de 1852 eclodiu em algumas cidades e vilas do Norte, entre
século XVIII. A presença do termo Cumbe na toponímia da elas a Vila Nova da Rainha, a revolta do Ronco da abelha.
região, pode ser um indício de que o mesmo se localizava No curso dos acontecimentos apareceram alguns escravos
nas imediações de Campina Grande, se transformado em amotinados em meio à multidão, cuja luta era contra as
refúgio para alguns escravos locais. Outros, porém, novas decisões emanadas autoritariamente do governo
trilhavam outros caminhos, tentando reatar vínculos sociais e imperial, referentes ao registro civil e o censo,
afetivos que a escravidão teimava em romper. Este parece sintomaticamente interpretadas como “papéis do cativeiro”.
ter sido o caso de um escravo chamado Manoel, que ao fugir Eventos semelhantes, desta vez com intensidade redobrada,
em 1866 levou consigo um cavalo furtado. Segundo seu voltariam a ocorrer mais de vinte anos depois, em fins de
proprietário, ele teria rumado para “o sertão da província do 1874, quando da sedição do Quebra-Quilos, que teve em
Ceará”, talvez em busca de algum parceiro que ficara para Campina Grande o seu epicentro. Enquanto os populares
trás. Para isso chegou até a mudar de nome, certamente para saíram às ruas para queimarem os papéis dos cartórios,
dificultar uma possível captura. hostilizarem autoridades e quebrarem pesos e medidas do
No Brasil de meados do século XIX estava em pleno novo sistema métrico-decimal, um contingente de negros
vigor o tráfico interprovincial de escravos das províncias do entrou em cena alguns dias depois, só que com objetivos
norte para as do sul. Em questão de anos, levas e mais levas próprios. Subdivididos em pequenos grupos, liderados pelos
de cativos, preferencialmente homens e jovens, foram escravos Firmino e Manuel do Carmo e o liberto Benedito,
transferidos de áreas decadentes para as prósperas regiões eles procuraram negociar com as autoridades civis e
cafeeiras. Como muitas outras vilas e cidades da região, eclesiásticas da cidade, exigindo, na lei ou na marra, a
Campina Grande esteve conectada a essa trama histórica liberdade. Ao assim agirem, colocaram em pânico senhores
mais ampla, tendo os seus proprietários se aproveitado da e autoridades, que comandados pelo coronel Alexandrino
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Cavalcante de Albuquerque, conseguiram reprimir, a ferro e localidades no Estado mereciam, visto que em nenhum outro
a fogo, a insurreição negra em curso. lugar no interior haviam famílias que se destacavam pelas
Os arquivos de Campina Grande também preservam maneiras afidalgadas de viver, de sua área urbana e de seus
documentos que testemunham um tipo de luta priorizada filhos ilustres que mantinham tanto apreço pelas letras,
pelos escravos, especialmente nas últimas décadas do século portanto eram cidades de destaque político, econômico,
XIX, quando a instituição escravista se deslegitimava social, intelectual e comercial.
paulatinamente, em função de transformações internas e “Na primeira fase de sua história, embora tenha
externas. Trata-se das ações cíveis, uma possibilidade legal alcançado sucessivamente os foros de vila em 1790 e os de
aberta aos escravos para litigar a liberdade junto aos seus cidade em 1864, Campina Grande, não desfrutava ainda de
senhores. Uma dessas histórias foi protagonizada pela preta real projeção no panorama urbano da capitania. Eram
Joana, filha da escrava Alexandra, irmã das também cativas outras outra as aglomerações que ocupavam os primeiros
Benedita, Maria e Ana e mãe do escravinho Damião. Tendo lugares como Areia, que se tornara o grande centro do brejo
obtido “por seus esforços” um pecúlio, ela tentou negociar a no decorrer do século XIX e como Mamanguape, que
sua liberdade por meios pacíficos, apresentando ao seu durante algum tempo foi o entreposto comercial do brejo...”
senhor, o capitão Jerônimo Paz Barbosa Júnior, a quantia de (CARDOSO, 1964: 33)
500 mil réis, valor pelo qual havia sido avaliada. Como este Enfrentando o orgulho das principais cidades, Campina
se recusasse a alforriá-la, alegando que a mesma valia mais, Grande convenceu ao parlamento provincial sobre a
Joana procurou um curador, através do qual levou seu elevação de sua condição de vila para cidade, que não se
senhor as barras dos tribunais locais em 1876, contando para deve a sua formação urbana e influência política, mas pela
isso com uma extensa rede subterrânea de solidariedade, seu destaque em suas atividades comerciais e pela sua
formada por seus parentes e outros companheiros de localização privilegiada, na rota dos tropeiros que seguiam
cativeiro. do Sertão para o Litoral, servindo de ponto de parada e de
Sabe-se que a violência, seja física, seja simbólica, era apoio aos comboios que então intensificavam suas relações
parte constitutiva do regime escravista, cabendo aos comerciais principalmente em dias de feira na cidade.
senhores uma grande margem de manobra na repressão aos A cidade também era parada de descanso dos viajantes
escravos. Contudo, mesmo nesse campo, os senhores não que transportavam produtos que seriam vendidos em outras
podiam fazer o que bem entendessem, pois, além das leis regiões, de modo que saindo do sertão e do Carirí, passavam
positivas, havia um conjunto de práticas costumeiras por Campina, seja de ida para Cabedelo ou para o porto de
estabelecidas no cotidiano, que, caso fossem rompidas Recife, um entreposto comercial muito importante devido a
unilateralmente, poderiam implicar em sérias conseqüências sua localização. Por tanto, Campina Grande mantinha com
políticas. Foi o que aconteceu com Cosme Rodrigues de sua área de influência uma intensa atividade comercial, de
Souza Campos, senhor do escravo de nome Vicente. Este, modo que, tornava-se o principal centro de compras da
depois de retornar de uma festa de São João (realizada na região, com o mercado e a feira.
noite de 24 de junho de 1883 numa fazenda próxima da que “Conquanto atraísse para a sua feira o seu comércio
ele e seus parceiros trabalhavam) foi violentamente grande número de tropeiros, como já foi visto, os
espancado pelo senhor, às vistas de seu pai e seu irmão, os fazendeiros das vizinhanças mantiveram-se por longo tempo
também escravos Inocêncio e Lucas, tudo isso sob o pretexto arredios, confinados nos seus domínios e não se animavam
de “um moderado castigo”. Por esse gesto o senhor pagou a construir na vila e frequenta-la.” (CARDOSO, 1964: 32)
um preço alto: alguns dias depois Vicente matou, com um Em 1880 estava sendo construída em solo paraibano a
certeiro golpe de foice, ao seu senhor, o dito Cosme primeira estrada de ferro, a “Conde D’Eu Railway” pela
Rodrigues. empresa “Wilson Son e Co”, ligando a Capital à Mulungu.
Todas essas lutas e experiências, aqui sumariamente Mais tarde em 1901 foi concluída sua ampliação até Alagoa
apresentadas, contribuíram para o desmonte da escravidão Grande, o que gerou maior atividade comercial a cidade. No
em Campina Grande, antes que a Lei de 13 de maio de 1888 sudeste do agreste paraibano também estava sendo
sacramentasse esse processo, o que transforma os escravos e construída outra linha férrea, vinda da cidade de Timbaúba
seus descendentes em importantes personagens de sua em Pernambuco passando por Pilar chegando em Itabaiana
história, tanto no passado como no presente, não se pela empresa “The Great Western Brazil Railway”, na qual
justificando o silêncio político e historiográfico imposto por foi concluída em 1901.
uma memória histórica que se fez vencedora. As construções destas duas estradas de ferro geraram
movimentação por parte dos políticos campinenses, que
A CAMPINA QUE CHEGA DE TREM propunham a ampliação destas linhas subindo a Serra da
Welton Souto Fontes Borborema. A grande discussão seria o ponto de partida
dessa extensão com sentido a Campina Grande. Havia
A então Vila de Campina Grande foi elevada a grande interesse por parte dos comerciantes, empresários e
categoria de cidade em 11 de outubro de 1864, políticos da capital que este empreendimento tivesse
acontecimento este que feriu a vaidade dos habitantes de continuidade a partir da linha férrea de Alagoa Grande, desta
cidades mais importantes como Areia, Mamanguape e forma poderiam manter estreitas relações comerciais com os
Sousa, que tinham maior importância política, familiar e fornecedores de matéria-prima produzida no Estado,
cultural, sendo esta categoria um privilégio que poucas favorecendo a arrecadação e os impostos com as
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exportações. Pelo contrário aconteceria se fosse feita a partir ratificando o contrato com a Great Western Brazil Railway
de Pilar que destinaria a produção ao porto de Recife. “O para a construção da ferrovia Itabaiana - Campina Grande”.
comércio da capital temendo a concorrência com Recife (Anuário de Campina Grande, 1980: 54) com isso a empresa
fechou a questão a favor do trajeto por Alagoa Grande, sem inglesa tratou de iniciar as obras imediatamente, já que seria
levar em conta as despesas, a natureza do terreno; a ela a mais beneficiada com os lucros e com os incentivos do
exigência das obras de arte.” (ALMEIDA, 1989: 341) Governo Federal.
Esta obra era defendida independente de onde seria sua Sobre os investimentos ingleses, cometa José Joffily:
origem, por Pilar ou por Alagoa Nova. O então presidente do “O investimento em ferrovias – subvencionado pelo governo
conselho de intendência o deputado Cristiano Lauritzen, foi brasileiro – garantia lucro extraordinário aos ingleses, mas
um dos que defendiam este empreendimento para Campina vinha acelerar o escoamento da produção, impulsionando
Grande, por várias vezes buscou iniciativa particular ou as economias regionais. (...) Nesse ponto o projeto
estatal a feitoria desta obra, depois de várias análises chegou imperialista coincidia dialeticamente com o interesse
a conclusão que seria menos dispendiosos e mais viável o nacional. Passada a lua-de-mel com o novo sistema de
trajeto por Itabaiana. transporte, começaria a comunidade a sofrer com os males
“Em carta na pública na “Gazeta da Paraíba”, em típicos do casamento putativo.”( JOFFILY. 1982: 127)
julho daquele ano, reconheceu ser muito maior a distância Isso ficava refletido das exorbitantes taxas cobradas
de Itabaiana à Campina Grande, justamente o dobro, mais pela GWBR no transporte de cargas e de pessoas, no qual
haviam vantagens que compensavam. O traçado por Alagoa favoreciam ainda mais aos ingleses investir nesse país, já
Grande era curto mas exigiam obras dispendiosas que que o governo também dava grandes incentivos e isenção de
encareciam e retardavam a construção. Argumentava: (...) impostos, ao povo restava a exploração.
“se o traçado de Alagoa Grande atravessa os Brejos de Em Campina Grande, o alvo de várias críticas era a
Alagoa Nova e Serra Redonda, por sua vez o de Itabaiana localização do prédio da estação ferroviária, diante dos
atravessava os centros algodoeiros de Mogeiro, Ingá limites da área urbana na época, colocava esta um pouco
Fagundes; se no de Itabaiana se tem de construir uma ponte distante do centro comercial da cidade, argumento este que
sobre o rio Paraíba, no de Alagoa Grande se tem de foi bastante usado pela ala opositora dos que conseguiram tal
construir um túnel ou viaduto, com a grande desvantagem empreendimento na região. Mas as condições topográficas
para o tráfego, de ser o declive em toda a distância de impossibilitavam elevar-se a estação até o centro urbano.
2%.”(ALMEIDA, 1962: 344 e 345) A inauguração da malha ferroviária foi no dia dois de
As dificuldades geográficas no traçado com sentido a outubro de 1907, sendo programado para chegar ao meio dia
Campina Grande por Alagoa Grande, dificultavam e na estação ferroviária, onde já estava sendo esperada por
impediam a locomoção do trem em sua direção, mas, os populares, políticos e comerciantes, com muita festa, música
interesses de ampliação de mercados e de fornecedores que e folguedos. “(...) ninguém de pensar que essa gente
também iriam usufruir da estrada de ferro para o transporte, importante tenha ido “receber” o trem saindo da cidade a
tornava o sentido por Itabaiana bem mais vantajoso. pé. Nada disso, para que o povo visse e muita gente ficasse
Com isso fica claro o jogo de interesses existente desde com inveja, estavam mais de dez cabriolés, os tilburís
aberta a possibilidade de implantação da via férrea nesta daquelas famílias importantes. A banda de música, Banda
região, onde os custos com toda a obra, os benefícios que Bacurau, regido pelo professor Balbino, estava a postos.”
poderia trazer e o favorecimento de algumas regiões (Anuário de Campina Grande, 1980: 54)
potencialmente mais lucrativas, fez com que o trajeto para a De fato o trem chegou, mas com quase cinco horas de
capital fosse deixado de lado, de modo que os interesses da atraso, o que não foi necessário para diminuir a ansiedade de
capital nesse sentido foram prejudicados, já que limitava as todos com a chegada daquela máquina “extremamente veloz
atividades destes nessa região e dos tributos com a e curiosa”, “E como se tudo aquilo tivesse sido ensaiado
exportação que seriam efetuados em Recife. com muita antecipação, a máquina n.º 3 da GWBR, toda
Em 1903 novamente Lauritzen foi ao governo federal enfeitada com folhas de palmeira e na frente com duas
com apoio dos representantes da Paraíba no Congresso bandeiras do Brasil...” (Anuário de Campina Grande, 1980:
Nacional, já que o assunto desta obra não atendia apenas aos 55) Empreendimento este que foi festejado até a madrugada
interesses campinenses, mas de todo o Estado. Antes mesmo com música e discursos dos políticos.
deste encontro ele já havia enviado um memorando com as Em Pedaços da História de Campina Grande, relembra
vantagens do prolongamento da via férrea para Campina Cristino Pimentel, quando chegou o vapor à cidade: Houve
Grande. Neste memorando ficava exposto a localização da música, e vivas ao “gringo” Cristiano Lauritzen, a quem se
cidade e de sua vantagem como ponto estratégico dos devia aquela iniciativa. (...) Diante Daquele “animal
sertões, além de ser esta cidade naturalmente um entreposto enorme”, lotado de gente a matutada prorrompeu em vozes
comercial de gados e de outros produtos como também de alegria por ver realizada uma aspiração de meio século.
potencialmente um centro de abastecimento nas periódicas (...) Disse-me um deles, grisalho, de camisa aberta ao peito
secas. de faces encardidas e mãos espinhentas: “Tava sem fé, seu
O então Presidente da República Rodrigues Alves, moço, mais Deus me sustentou a vida inté êsse momento prá
compreendeu os benefícios que trariam a região tão nós vê a chegada do bicho e tá lá ele butando fumaça do
empreendimento, de modo que “no dia 26 de julho de 1904 cano de riba e o povo saindo de dentro cuma furmiga atrás
o Diário Oficial publicava o Decreto Federal n.º 5237 da outa.” (...) Sorri e apertei aquela mão acostumada a assar
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xiquexique para alimentar o gado em tempo de seca.”( Recife com a maior parte de nossa zona pastoril e
PIMENTEL, 1958: 108) algodoeira.”(ALMEIDA, 1980).
A inauguração da nova linha férrea, já mostrava sua Entre as transformações no qual referimos, inclui as que
importância trazendo importantes comerciantes e a maioria dos centros urbanos configuram, principalmente
exportadores que pretendiam investir na cidade, prevendo o cidades que se destacam pelas suas atividades comerciais, ou
impulso que tal obra traria. “Quando o trem parou saltaram seja, o cotidiano muda em decorrência das necessidades
dois jovens cidadãos, Olegário Azevedo, que vinha daquela área urbana, e envolvem em grande medida, a
gerenciar a firma exportadora de algodão do “seo” Zumba divisão de classes e a relação de produção, observa-se que
Monteiro, e Manoel Elias Pareira de Araújo comerciante, diferentemente do campo com o latifúndio, o que segrega as
em visita à cidade. Dois anos depois “seo” Neco Elias classes nestes casos é a posse dos meios de produção e dos
fixava residência aqui em Campina Grande. (...)” (Anuário recursos financeiros para o investimento, de modo que, aos
de Campina Grande, 1980: 55) desafortunados resta a incessante labuta, tendo como opção
Porém, o que pode ser observado é que a já o trabalho assalariado ou o trabalho autônomo, onde a
municipalizada Campina Grande a quarenta e três anos, prestação de serviços seria uma alternativa para os que não
ainda mantinha aspectos de Vila em 1907. De fato as possuíam recursos, possibilitando renda para balaieros,
transformações ocorrida na cidade foram feitas carroceiros, barracas de lanches, e etc.
gradativamente a partir da linha férrea, trazendo alguns O empresário aparece neste meio basicamente sob duas
investidores, imigrantes em busca de trabalho e um novo maneiras, ou ele constrói seu patrimônio gradativamente, de
cotidiano urbano, com o surgimento de melhor estrutura para forma que sua trajetória se confunde com a própria história
o comércio e uma ligação com o grande centro da cidade, ou ele já possui estes recursos e decide investir
pernambucano o que contribuiu para as mudanças no em determinado empreendimento, estes comerciantes que na
cotidiano, com tudo isso o “matuto” campinense também maioria dos casos eram provenientes de outras regiões, e que
absorvia esta influência. haviam se estabelecido em Campina Grande, pretendem
A respeito disso, Epaminondas Câmara em Datas então reproduzir na cidade um modo de vida tão apreciado
Campinenses comenta: “A não ser o aumento de casas e em outras regiões, envolvendo desde o lazer e os modismos
alguns prédios construídos com especial finalidade – Cadeia até as parafernálias do conforto como luz elétrica e bondes,
Nova, Casa de Caridade, Grêmio de Instrução, Paço investimentos estes que tinham também caráter estritamente
Municipal, etc. – a cidade apresentava pequena diferença financeiro, já que era uma cidade com plenas possibilidades
em 1907 comparada com 1864. As mesmas Igrejas embora de lucro sendo um mercado em plena expansão.
remodeladas, as mesmas casas de mercado, os mesmos Sobre estas relações cita-se: “(...) o que caracterizou
açudes, os mesmos comboios de almocreve, o mesmo esse desenvolvimento econômico do município, do ponto de
movimento de boiadas, o mesmo modus vivendi, a mesma vista das relações sociais engendrados em seu interior, foi
rotina, os mesmos costumes. E tudo renovou com a ferrovia justamente a concentração privada da riqueza e os efeitos
que influiu sobremodo para integrar sua gente e suas cousas causados por essa concentração em termos de
a um sentido mais moderno, ou menos antiquado se miserabilidade social. Estas relações eram pois,
quisermos falar com mais franqueza.”(CÂMARA. 1998: extremamente contraditórias e, por isso mesmo, elas tinham
50) um conteúdo de classe.”(ARANHA, 1991: 183)
Nos anos seguintes pós ferrovia, aconteceram Por tanto começa a surgir um cotidiano antagônico,
mudanças significativas na cidade, de modo que, além de baseado em divisão de classes, estas mudanças estão
uma nova estrutura, necessária para um centro urbano com intimamente ligadas aos anseios que a elite comercial
intensas relações comerciais e do crescimento populacional pretende ter ou manter, um específico padrão de vida que se
realizado pelos imigrantes e trabalhadores de outras tem em outros grandes centros, baseados em valores e gostos
localidades que buscavam oportunidades melhores na burgueses, que representam o privilégio que poucos com
crescente cidade, houve por demais uma transformação no posição social favorável podem ter, sendo também uma
modo de vida dos habitantes desta então pacata cidade. questão de status social, de modo que, as atividades e os
investimentos feitos na cidade não se restringem ao
Uma Nova Cidade. comércio algodoeiro, mas também ao que pudesse
Lembrando que, antes da chegada do trem, Campina proporcionar mordomia e uma estrutura para as práticas
Grande era de um bucolismo e provincianismo quase artísticas, filosóficas, sociais e políticas, nesta então
medievais, por isso tem que se pensar este marco da História crescente cidade que estava saindo da “barbárie” em suas
campinense não apenas como o que teria promovido o novas ações e práticas, impulsionadas pelo comércio e pela
impulso econômico da cidade, mas como um grande fator de via férrea com suas influências externas.
influência no modo de vida do campinense, seja do “matuto” Era prática comum nas famílias mais bem favorecidas
ou do “forasteiro”, que tinha na via férrea, como uma forma das cidades interioranas que não possuíam uma estrutura
de comunicação e de aculturamento em suas relações com os educacional, enviar seus filhos para estudar em centros
grandes centros. A respeito disso discorre José Américo de urbanos mais avançados, e este foi o destino de muitos
Almeida em A Paraíba e seus Problemas: “(...) Campina campinenses que se tornaram ilustres no âmbito das letras e
Grande passou a ser uma cidade social e comercialmente conhecidos nacionalmente. Em alguns casos retornavam,
pernambucana como empório das transações da praça do contribuindo demasiadamente para nossa história em vários
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aspectos, em outros se estabeleciam no então centro urbano reúnem para o projeto de construção de um teatro em
onde estudava e continuava lá. Entre estes destinos estavam Campina Grande.
o Rio Grande do Norte, a então capital da República o Rio O primeiro teatro da cidade, localizado na atual rua
de Janeiro, e principalmente Recife, e foi nesta cidade que Maciel Pinheiro no prédio do então Cinema Apolo, surgiu
alguns destaques da história paraibana habitaram por alguns em um amplo salão com fundos para a rua Barão do Abiaí
anos e se formaram. sendo inaugurado em 31 de maio de 1925, era o “Cine-teatro
De fato, a contribuição destes que foram estudar e Apolo” composto pelo “Corpo Cênico” do Grêmio
voltaram, ou até mesmo dos que eram natural de outras Renascença, sendo este o primeiro grupo teatral campinense,
regiões, mas que vieram para Campina Grande seus integrantes eram intelectuais e jovens da alta sociedade
estabelecendo residência, coloca-se como um ponto a mais campinense. Este empreendimento artístico-cultural foi
de análise da influência cultural destes na formação da nossa construído pelos senhores, Probo da Silva Câmara, Lino
memória. Foi através destes que obtiveram o conhecimento, Fernandes de Azevedo, Adalto Belo e Antônio da Silva
absorveram a influência destes centros urbanos e de suas Câmara, que eram grande conhecedores da dramaturgia,
atividades voltadas à manutenção de seus ideais e valores, surgindo já em caráter profissional, representando o luxo e o
que houve o desenvolvimento de determinadas práticas e gosto burguês, de uma cultura nobre em solo campinense.
pensamentos no cotidiano campinense, de modo que fez Sobre o teatro “Apolo” acompanha-se as citações:
surgir uma variedade de inovações à esta cidade, portanto “O elenco para cada espetáculo era escolhido
sendo estes, de grande influência na formação intelectual e cuidadosamente, os cenários rigorosamente caprichados, o
cultural. guarda-roupas estudado em seus mínimos detalhes. A parte
musical ficava sob responsabilidade do talento do maestro
A Cultura em Campina Grande. Adalto Belo. O grande teatrólogo Lino Fernandes de
Não se pode pensar que, a cultura burguesa em Azevedo era responsável pela produção de maior parte dos
Campina Grande só apareceu com a influência de pessoas de textos encenados, ficando também ao seu cargo a seleção de
outras regiões, o “Grêmio de Instrução, que funcionou a obras dramáticas de autores brasileiros e estrangeiros.”
princípio na sacristia da Igreja-matriz de N. Senhora da (Anuário de Campina Grande, 1980: 57) “(...) o teatro
Conceição desta paróquia, e que mais tarde foram campinense nasceu adulto, em forma de Teatro de Revistas
transferidas as aulas do educandário para o prédio Musicais, com grande zelo nas interpretações, figurinos e
municipal...” (RIBEIRO, 1979: 140) surgiu pela iniciativa de cenários opulentos, exibindo textos que caracterizavam a
alguns intelectuais da cidade em 1900, com propósito de moral burguesa de então, sem “pernas de fora” e sem
formar os filhos da cidade com alto nível de qualidade aqui piadas picantes, visto que nos elencos figuravam as
mesmo na cidade, prédio este que serviu como escola, mais senhoritas da alta sociedade.”(Livro do Município de
tarde cinema, depósito e colégio, teve entre seus alunos Campina Grande, 1984: 113)
grandes nomes da História paraibana como Hortêncio de
Sousa, Cândido de Melo Leitão, Mauro Luna e etc. “O Teatro Apolo teve sua fase áurea durante toda a
(ALMEIDA,1979) década de 1920, atraindo a sociedade campinense, à
Além dos propósitos escolares era incluído em seu prestigiar tanto o grupo teatral local, como a promoção da
estatuto atividades complementares, no qual, “Haverá vinda de grandes companhias, como a de Itália Fausta em
também um grêmio recreio dramático, constituído entre os 1921, e em 1925 a Companhia de Operetas com Vicente
sócios”, como explicita Elpídio de Almeida em História de Celestino, companhias estas que vieram da capital pela via
Campina Grande, comentando: “Era uma sociedade, pelo férrea. As apresentações do grupo local não eram menos
simples enunciado de duas emendas, de fins educativos, prestigiadas, promovendo críticas e chocando a sociedade
destinada ao melhoramento e aperfeiçoamento do meio da época, fatos esses que marcaram a história da
social campinense, não só preparando jovens para os cursos dramaturgia na cidade, como sita o Livro do Município de
superiores, senão também excitando vocações para algumas Campina Grande: “a atriz Brígida Santos, que fazendo o
artes consideradas nobres.” (ALMEIDA, 1979: 327) papel principal de um moleque de rua, na peça “REVISTA”
Então O Grêmio de Instrução desenvolveu atividades em 1925, causou espanto por haver-se apresentando de
dramáticas da cidade mantendo um corpo cênico formada calças compridas – vestimenta até então exclusivamente
pelos filhos da elite campinense, portanto este lugar também masculina.” (Livro do Município de Campina Grande,
foi palco das primeiras atividades teatrais da cidade, além 1984: 113)
cinema e de outras diversas funções. Em seus últimos anos explorou a comédia, conseguindo
Havia na região do brejo paraibano duas cidades superlotar e arrancar grandes aplausos da platéia. O Teatro
com teatros, Alagoa Grande e Areia com seu histórico Apolo concluiu suas atividades em 1936, transformando-se
Teatro Minerva de 1859, o primeiro da Paraíba. Assim as mais tarde em cinema. A partir daí, o teatro campinense
companhias teatrais itinerantes que se apresentavam nestes ficou estaguinado, até que na década de cinqüenta a
teatros, ao concluírem sua temporada partiam para a capital, implantação do Rádio-Teatro Borborema pelo cearense
sem que Campina Grande pudesse assisti-las, pois não havia Fernando Silveira reativou as atividades cênicas na cidade.
um prédio com toda a estrutura profissional para tal Mas o fato de grande significação à história do Teatro
finalidade. Apenas em 1914 que alguns representantes se campinense é o dia 30 de novembro de 1963, quando o então
prefeito Severino Cabral entrega o majestoso Teatro
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Municipal, espaço esse que iria ressurgir grupos teatrais No crescente centro urbano campinense, cada vez mais,
antigos e formar novos. havia espaço para a aceitação de novas idéias,
Entre os novos empreendimentos feitos na cidade principalmente para um centro com intenso antagonismo
depois da ferrovia, citamos também o advento do cinema, social, onde de um lado estava o espírito capitalista da elite,
um negócio que se prolifera naquele momento histórico em e de outro o sofrimento e a luta dos humildes. Por isso ao se
todas as localidades, e que usava de alta tecnologia, época falar nas mudanças ocorridas na cidade sob o olhar da
do então cinema mudo em branco e preto. Em Campina cultura, não podemos deixar de falar do que não pode ser
Grande o primeiro cinema da cidade, surge com o “Cinema palpável, mas que é um grande agente de transformações, o
Brasil”, em 1909 localizado no edifício do Grêmio de pensamento. De ante mão vamos abordar o que envolve a
Instrução, instalações estas que em sua gênese serviram filosofia, que pode propor embasamento à questões
como a principal instituição voltada a formação educacional religiosas, político-sociais e até mesmo as duas coisas.
dos campinenses e atualmente se encontra o Colégio Alfredo Diante deste crescimento, Campina Grande era um terreno
Dantas. fértil para a proliferação de uma estrutura que tinha por
A sala do Grêmio em um ano fecha suas portas, mas finalidade concretizar neste solo campinense ideais
abre uma nova possibilidade de investimentos neste setor, de religiosos com as Igrejas, Batista, Gongregacional,
modo que tantos outros apareceram depois dele. Em 1910 é Assembléia de Deus e os centros Espírita, e os ideais
inaugurado o cinema “Popular” na rua da Feira, em 1912 o político-sociais que surgiram com o Comunismo, a
“Apolo”, que foi o primeiro à instalar o aparelho sonoro na Maçonaria, e as entidades sociais.
cidade em 1933, mudou seu nome para “Cine Para Todos” Os movimentos protestantes iniciaram sua trajetória na
em 1935, e foi fechando em 1943, “Cine Fox” em 1918 à cidade a partir da fundação da “Igreja Evangélica” em 1912,
1933, “Capitólio em 1934, “Cinema Babilônia” em 1939, e mais tarde foi inaugurado seu Templo o Evangélico
os cinemas “Avenida” localizado na Prata e “São José” no Congregacional em novembro de 1920, localizado na rua do
bairro de São José, ambos em 1945. (CÂMARA, 1998). Açude Novo atual rua 13 de Maio. A primeira Igreja Batista
Os cinemas “Apolo” e “Fox” eram localizados na atual surgiu em 1922, tendo seu Templo inaugurado em janeiro de
rua Maciel Pinheiro, seus proprietários eram adversários 1934 nas proximidades da então Praça da Luz e da rua do
políticos e usavam de seus negócios na campanha partidária. Silvestre, hoje ___________ . A Igreja Pentecostal
Além destes citados acima, haviam também cinemas (Assembléia de Deus) em janeiro de 1924 na rua das Areias,
localizados em outros bairros, como era o caso dos cinemas atual rua João Pessoa. ”(CÂMARA, 1998) O fato de
“Um” em José Pinheiro e o “Imperial” na Liberdade. Na enfatizarmos cada denominação, vem das diferentes
época áurea do Cinema, formavam-se grandes filas tanto de doutrinas de cada uma, todas são protestantes, mas ímpares
apreciadores da sétima arte, principalmente “nos dias de em sua essência.
seção popular, no qual eram exibidos dois filmes e duas No dia 25 de março de 1926, “é fundada a primeira
séries ao preço de Cr$ 0,80 (oitenta centavos) antigos, o sociedade espírita da cidade, o Centro Espírita Solon de
ingresso,” (Livro do Município de Campina Grande, 1984: Lucena, meses depois é fundado outro o Centro Santo
113) atraindo aqueles menos favorecidos que iam conhecer a Agostinho”(CÂMARA, 1998: 50). Em fevereiro de 1933,
“geringonça tecnológica”. Hoje nenhum destes cinemas estes dois núcleos se fundem formando a União Espírita
continuam em funcionamento, o que por ultimo resistiu foi o Cristã.
“Babilônia” que fechou suas portas em 2000, tragado pela Historicamente a maçonaria participa e influência
concorrência com as salas de cinema abertas no Shopping várias atividades e ações nos aspectos políticos, sociais e
Iguatemi. financeiros do país. Uma das principais características desta
Estes tipos de empreendimentos comerciais surgiam em instituição e o nível social dos seus integrantes, que em
uma cidade com possibilidades mercado cada vez mais muitos casos são comerciantes, banqueiros, médicos
crescente, e os dados a respeito do aumento populacional de empresários etc. Campina Grande, que naquele momento
Campina Grande, principalmente a partir do advento da apresentava um número considerável de pessoas ligadas a
ferrovia, estão distribuídos na obra Datas Campinenses de estas atividades, fazia-se necessário a fundação
Epaminondas Câmara, e de fato são consideráveis, representativa desta na cidade, de modo que surge em
mostrando que em torno de trinta anos houve o aumento agosto de 1923 com a loja Regeneração Campinense,
habitacional e populacional que deixaram a demografia da instalando seu templo no sobrado da família Ivo Macaxeira
capital em números inferiores por muitos anos. Observa-se na Praça Epitácio Pessoa , foi regularizada em janeiro de
que em 1907, enquanto João Pessoa (então Nossa Senhora 1925, e em 1927 instalou-se em prédio próprio na rua Vidal
das Neves) tinha pouco mais de 40.000 habitantes, Campina de Negreiros.
Grande contava com em torno de 17.000. Mas os atrativos O professor Clementino Procópio doou a esta entidade,
propiciados pela malha ferroviária, fizeram com que um terreno no bairro de São José, no qual em 1926 iniciou-
Campina aumentasse sua população de tal modo que em se a construção do Hospital Pedro I, que foi inaugurado no
1930 já estava mais populosa que a própria capital que tinha dia sete de setembro de 1932, onde no mesmo edifício foi
79.755 habitantes, enquanto Campina Grande já contava estabelecido o Centro de Saúde do Estado e o Posto Médico
com quase 100.000, e esses números são ascendentes até do Município. Como é exposto em Pedaços da História de
meados da década de sessenta. Campina Grande: “o terreno ocupado pelo Hospital dos
maçons foi doação sua, exigindo apenas que dessem ao
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nosocômio o nome de D. Pedro Primeiro, é o que foi feito.” ( Entre estas ramificações do pensamento marxista
PIMENTEL, 1958: 41) A loja Maçônica Regeneração colocamos o próprio ideal político comunista que estava em
Campinense, ainda “fundou em agosto de 1931 o Banco de plena ascensão em várias partes do mundo, e Campina
Campina Grande, que teve seu fim em março de 1937.” Grande sob a influência de tantos que iam e viam pelo trem,
(CÂMARA, 1998) Esta instituição por tanto formou uma também conheceu este pensamento. Em Datas Campinenses,
estrutura própria e se estabeleceu na cidade. e exposto em rodapé: “O comunismo vem sendo pregado em
Os ideais políticos, presentes no pensamento de Marx, Campina Grande desde 1927. Naquele ano a sociedade
também chegaram à cidade influenciados em grande medida União Geral dos Trabalhadores funcionava numa casa da rua
pela via férrea, pelo visto de que acontecera desde 1859, do progresso e, dirigida por mecânicos e pedreiros do
movimentos de caráter grevista deflagrados pelos operários Recife, era ostensivamente marxista de cujas idéias faziam
da Recife - São Francisco Railway. Este movimento teria aberta propaganda. Em 1934 a Aliança Nacional Libertadora
sido um dos primeiros na região Nordeste, e anos mais tarde teve a sua sede também naquela rua e se compunha de mais
tantos outros houveram, em sua maioria baseava-se em de cem membros, entre os quais algumas pessoas de
aumentos salariais. Durante a segunda metade do século destaque social – advogados, professores intelectuais,
XIX em outras partes do país, principalmente em São Paulo, comerciantes, etc.”(CÂMARA, 1998: 147)
Rio de Janeiro, também aconteciam greves, e a influência Em 1933, as eleições para a constituinte propiciaram
destes movimentos pode ser sentida em âmbito nacional, já uma coligação partidária que envolvia comunistas,
que chegou determinados períodos em que havia a quase que protestantes, espíritas e alguns maçons, era a “Coligação
completa paralisação do trafego de trens em grande parte do pró-Estado Leigo”, mostrando já nesta época o quanto
país. Campina Grande é eclética e ecumênica. Somente em 1945 é
“Mas as greves ferroviárias na 2ª metade do século fundado o diretório do Partido Comunista Brasileiro em
XIX, eram greves localizadas, deflagradas por uma ou outra Campina Grande, já com propósito de ganhar adesão para as
categoria de trabalhadores, no século XX esse quadro eleições federais naquele ano.
muda. (...) Isso ocorre porque passam à envolver os Os ideais socialistas ganham adesão em uma cidade
ferroviários como um todo em todas as regiões alcançadas cada vez mais caracterizada pelos disparidades sociais, onde,
pelos trilhos. (...) Enquanto as anteriores, na prática não a exploração da mão-de-obra tão comum em sociedades
passaram de arremotos de greve, a de 1902 demonstrou um capitalistas, se fazia presente também no agreste em relação
maior nível de organização e consciência operária.” ao “matuto”, tendo, a crescente influência recifense por via
(ARANHA, 1991: 211 e 212) férrea e de seus periódicos informando sobre as
Essas observações são feitas a partir da própria lista de transformações no mundo e no Brasil em contextos tão
reivindicações dos grevistas, que incluem desde aumento similares ao campinense, proporcionaram o aparecimento e a
salarial à recebimento de ordenados em caso de problemas difusão deste pensamento, de modo que não apenas órgãos
de saúde. A partir desse movimento com clareza em seus organizados como o partidário e o sindical, mas também se
anseios e organização trabalhista, outras greves mostrassem presentes na cidade, em rodas de conversas, nas
aconteceram. “Houve greves na Great Western em 1906, 7, atividades literárias da cidade, etc.
8 e 9. Pode-se arriscar a dizer que já frutificavam as palavras Em trecho destacado dos versos de Antônio Moraes,
de ordem tiradas no I Congresso Operário, cuja bandeira com o título de Antigos Costumes da Vida Campinense,
eram as oito horas de trabalho, quando de sua realização em percebe-se que os ideais político-sociais estavam presentes
1906.” (MELO. A UNIÃO, João Pessoa, 23 de Março de no cotidiano da cidade: “Assuntos de poesia / Tinha toda a
1986.) primazia / Dos moços idealistas / Até para os ditadores /
Em 1909, dois anos depois da inauguração da via férrea Havia admiradores / Nas idéias anarquistas.” (MORAES,
em Campina Grande, aconteceu o primeiro movimento s.d.) Outros elementos que fortalecem a presença e a
grevista desta cidade, movimento esse que englobava todos proliferação deste pensamento, incluem em 1934 a
os funcionários da GWBR no Nordeste em reivindicação de circulação do “ jornalzinho diário “A Batalha”, dirigido por
melhores salários. De fato era algo novo para os então Arlindo Correia da Silva, líder comunista local.”, e em
cidadãos campinenses um acontecimento de tal natureza, primeiro de Maio deste mesmo ano surge “Primeiro número
sobre isso Josemir Camilo de Melo discorre em artigo do jornal “A Frente”, de orientação comunista, mantido por
publicado: “(...) Campina pouco poderia prever que dois alguns sindicatos locais.” (CÂMARA, 1998: 120 e 121)
anos depois seria palco de uma coisa estranha no Além destes periódicos, foram criadas instituições com
comportamento matuto campinense: uma greve.” (MELO. princípios socialistas como, a fundação da Caixa Rural e
A UNIÃO, João Pessoa, 23 de Março de 1986.). É bem Operária em dezembro de 1920, a fundação do Banco
verdade que até esse momento os trabalhadores da rede Mercantil (cooperativa) em março de 1937,sob os auspícios
ferroviária, não haviam ainda se organizado em sindicatos, o da União dos Retalhistas fundado em março do ano anterior.
que viria à acontecer em 1925, mas isso mostra o nível de Também foram criadas cooperativas de agricultores como a
consciência operaria que estava se formando depois de Cooperativa dos Beneficiadores de Mandioca em janeiro de
experiência obtida em outros movimentos e de como esta 1936 em Lagoa Seca e a Cooperativa de Produção
influência foi sendo difundida pelo país, em especial em Algodoeira em maio do mesmo ano. (CÂMARA, 1998)
Campina Grande, de maneira que outros dissidentes deste Por tanto, no que diz respeito à difusão do pensamento
pensamento foram sendo absorvidos pelo campinense. marxista em Campina Grande, se inicia, com os que foram
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no trem estudar nos grande centros urbanos e com os desse ano com a “Recreativa Popular”, que desde 1919 não
forasteiros que se fixaram nessa região, ficando este no dava mais festas e passou a denominar-se “Grêmio
aspecto ideológico e político. Efetivamente, a luta de classes Recreativo”. A 2 de Fevereiro de 1933 foi seu nome mudado
contido no movimento grevista de 1909 dos funcionários da para “Éden Clube 31, tendo por sede o pavilhão Epitácio.”
GWBR, trouxe para a cidade uma inovação prática contra a (CÂMARA, 1998: 101). No dia 26 de Dezembro de 1929,
exploração capitalista, fazendo com que o cidadão forme sua houve fundação do grêmio esportivo, literário e dançante
consciência e perceba-se como agente de transformações. “Paulistano Esporte Clube”, no qual por longas décadas
Um dos exemplos desta nova consciência formada promoveu uma diversidade de eventos na cidade, é um dos
aconteceu em maio de 1925, quando “Irrompeu uma grave poucos que permanece até hoje, mas sem tantas atividades.
pacífica contra a alta de preços dos ingressos dos cinemas Em julho de 1933, é fundado a sociedade dançante São José
locais – Apolo e Fox – que deixaram de funcionar durante Clube, na praça da Guia.
dois meses. Foi satisfeita a pretensão dos grevistas.” Portanto, no decorrer de trinta anos surgiram mais de
(CÂMARA, 1998: 102). Pode ser que, simplesmente, as dez clubes sociais e recreativos, que mais tarde tiveram
pessoas acharam caro o ingresso e deixaram de ir ao cinema, alguns que se fundiram e formaram outros, ou até mesmo os
mas o fato plausível neste evento é que a população se nega que se dedicaram mais tarde exclusivamente as atividades
a pagar aquela quantia, durante longos dois meses, (longos desportivas. Contudo o que não passa despercebido é o
para os empresários) mas é ainda mais importante para a caráter político que estas entidades (clubes) e estes
nossa história o desfecho bem sucedido da população. empreendimentos comercias ( cinemas, teatros) possuem, de
modo que, seus fundadores em sua maioria estavam em
O Lazer na Cidade o Ouro Branco. pleno envolvimento político no período de disputas entre
Outros importantes aspectos da cultura campinense, opositores e situacionistas ao governo federal e estadual.
surgidos no período pós-ferrovia, envolvem questões Entre 1908 e 1918 “Os oposicionistas, mais coesos,
sociais, com clubes e associações. De fato o crescimento da mais disciplinados e mais intransigentes, nucleando
cidade, e a formação da elite comercial campinense tão elementos rurais e urbanos, famílias antigas, etc., venciam
influenciada com o padrão social de outras cidades, fazem nas urnas e dispunham de jornais (“15 de Novembro”,
com que se perceba que os clubes sociais e afins, depois “A Razão”), de uma banda musical “Charanga
proporcionariam a socialização da elite e a cristalização do Afonso Campos” e de uma sociedade dançante “Campinense
status social destes em eventos que reunissem esta camada Clube” . Por sua vez, o partido da situação contava com o
social, que neste momento fomentava estes tipos de eventos, “Correio de Campina”, com a Filarmônica “Epitácio Pessoa”
devido a carência destes. e com a “Recreativa Popular”. (CÂMARA, 1998: 90). Entre
Deste modo, em janeiro de 1914 é “fundado o “Clube 1919 e 1930 “Ela não tinha mais o jornal nem banda de
dos Boêmios” que teve curta duração. Primeira sociedade música, mas ainda protegia um cinema – Cine-Fox, e uma
dançante organizada na cidade. Fevereiro, 28 – Fundado sociedade dançante – Campinense Clube. Por outro lado, os
outro clube dançante, a “Recreativa Popular”, que funcionou governistas, além do “Correio de Campina” e da Filarmônica
até 1919. Abril, 12 – Fundado ainda outro clube o “Epitácio Pessoa”, apoiavam, com exclusividade, o Cinema
“Campinense Clube”, que se instalou na sede do “Colégio Apolo e Grêmio Renascença.” (CÂMARA, 1998: 110).
Campinense”, do Dr. Gilberto Leite. (CÂMARA, 1998: 86) O imperialismo inglês no Brasil e em Campina Grande,
e que em fevereiro de 1936, inaugurou sua sede própria na trouxe também um pouco de sua cultura para o solo tropical,
praça Antônio Pessoa. Portanto, dentro de quatro meses especificamente estamos falando do foot ball, abrasileirado
foram fundados três clubes dançantes na cidade. para futebol, que começou a ser praticado com as regras e
Em março de 1923 “o bloco carnavalesco – Bloco dos características que conhecemos na Inglaterra durante o fim
31 – que desde 1921 vinha promovendo bailes no Paço do século XIX. No Brasil foi introduzido por Charles Miller,
Municipal, em virtude de terem os seus componentes e a partir daí se espalhou, talvez pelo seu caráter social, sem
formado a dissidência do Campinense Clube naquele ano, descriminar cor nem classe, é justamente o que mais se pode
transformou-se em sociedade dançante, sob a denominação observar nas fotos da época, a participação de negros (pouco
de Grêmio Renascença, obtendo o apoio imediato dos mais de vinte anos depois da abolição) e de pessoas
elementos governistas. Primeiro presidente – o deputado e humildes
chefe político Ernani Lauritzen. (...) Abril, 1 – Fundando o Em Pedaços da História de Campina Grande, Cristino
Bloco Independente, sociedade dançante que teve curta Pimentel aborda sobre a origem do futebol na cidade,
duração. Tinha sede na rua da Lapa. (...) Agosto, 26 – destacando como o introdutor do esporte o Sr. Antônio
Instalação do Grêmio Renascença no “Pavilhão Epitácio”, Fernandes Bioca, que “Foi pelos meados de 1913 que ele
construído para esse fim, pela viúva do coronel Alexandrino veio da capital do estado passar umas férias na sua terra
Cavalcante, na esquina da praça Epitácio com a rua da natal, trazendo consigo uma bola de futebol, o que lhe valeu
Independência.” (CÂMARA, 1998: 99) O Grêmio para introduzir na cidade o jogo bretão.” (PIMENTEL, 1958
Renascença se dedicou também a outra atividades, como é o - p. 273) Com isso alguns jogos foram sendo realizados, e
caso do grupo de teatro “Corpo Cênico” que atuava no Cine- no decorrer de 1913 e 1914, o esporte foi ganhando mais
teatro Apolo. adeptos, de modo que em 1915 surge a primeira sociedade
Em 28 de Fevereiro, é “fundado na rua Irineu Joffily, o de futebol da cidade, de nome “Hight Life Sporte Club”
“Elite Clube Recreativo”, dançante. Fundiu-se em maio
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tendo como o primeiro presidente provisório o Sr. Bioca, A REPÚBLICA DOS “CORONÉIS”
havendo no decorrer deste ano alguns amistosos . Eliete de Queiroz Gurjão
Em 1916, no sentido de melhor organizar o futebol na
cidade, foi criado um outro clube para disputar com o “Hight Na Paraíba, a notícia da proclamação da República foi
Life”, surgiu neste ano o “Sporte Club América”, este foi o recebida com indiferença pela população, como aliás,
incentivo para que outros entusiasmados criassem novos ocorreu na maior parte das províncias do país. A exemplo
clubes, de modo que no mesmo ano aparece o “Palmeira destas, na Paraíba não existia um partido republicano, em
Sport-club”. O colégio do professor Clementino Procópio mesmo qualquer movimento organizado com este objetivo.
forma também uma equipe “o Colégio São José organizou Alguns paraibanos, como Aristides Lobo, Maciel Pinheiro
sob o comando de José Olasso e Zacarias Ribeiro, uma Albino Meira militavam em fileiras republicanas, porém, em
poderosa equipe que tomou o nome de “União Football províncias onde a campanha republicana era forte. Na então
Club”.” (Anuário de Campina Grande, 1980: 56). província da Parahyba, apenas algumas vozes isoladas
A sociedade dançante Campinense Club surgido em defenderam publicamente os ideais republicanos, e somente
1915, cria também em 1917 um time de futebol com o através da imprensa. Apenas dois jornais locais publicara
mesmo nome. No ano de 1918, “Luiz Gomes da Silva que se matérias favoráveis à república: A GAZETA DO SERTÃO,
retira do “América” fundou com Joaquim Elói, José Faustino em Campina Grande, e a GAZETA DA PARAHYBA, na
Cavalcante, Luiz Dália e Severino Matiaso “Humaitá capital. Os demais jornais eram fracamente monarquistas e
Esporte Clube.”(...) Ascendeu então a rivalidade entre as O JORNAL DA PARAHYBA, órgão oficial do partido
duas agremiações. Até as damas senhoritas da época Conservador, liderava uma acirrada campanha anti-
passaram a assistir as partidas entre os dois rivais, torcendo republicana.
entusiasticamente.” (Anuário de Campina Grande, 1980: 56) Todavia, no dia 16 de novembro quando chegou à
“Com estes quatro clubes tivemos boas tardes Paraíba a notícia da mudança do regime, grupos políticos
desportivas, chegando mesmo o “América” a organizar locais, radicalmente aderiram à república, inclusive, um dos
quatro quadros: 1º e 2º times; 3º Juvenil e 4º Infantil. Em jornais anti-republicanos, neste dia, já se intitulava de “órgão
1918 o nosso “América” bateu-se com o “América Futebol republicano”.
Clube do Ingá, sendo este o primeiro jogo havido na cidade Os representantes dos partidos políticos herdados do
com time de fora. A vitória desse encontro coube ao Império: liberais e conservadores deixam de lado suas
América do Ingá, pelo score de 2 x 0. (...) Em 1919 para um desavenças e unem-se numa junta governativa. Esta foi logo
jogo amistoso com o “América” veio da capital o seu substituída por Venâncio Neiva conhecido monarquista,
afamado “Cabo Branco” que foi o vencedor da peleja pelo indicado, porém, como presidente do estado devido suas
score de 5 x 0.” (PIMENTEL, 1958: 275) estreitas ligações de família e amizade com o grupo militar
Depois destes ocorridos, o futebol campinense passou que liderou a proclamação da república.
por uma fase de marasmo, no qual, apenas o “Palmeira O primeiro presidente republicano da Paraíba governou
Sport-club” mantinha-se com jogos esporádicos. Numa apenas dois anos. Neste curso período, exerceu seu mandato
reunião feita na casa de Bioca em 1925 com os integrantes de forma tipicamente oligárquica, plenamente de acordo
do “América” e demais amigos, surgiu o “13 Futebol com os métodos do coronelismo. Assim, utilizou a máquina
Clube”. “Em 1926 foram fundados mais três clubes: do estado de forma nepotista e clientelista, ocupando os
“Palestra”, “Ipiranga” e “Comercial”. (...) Ainda em 1926 cargos mais importantes com seus familiares, realizando
continuava o intenso gosto pelo futebol, o que deu lugar a negociatas, perseguindo adversários e protegendo
fundação de um órgão controlador dos pebolistas: nasceu a correligionários. Conseguiu estruturar, assim, a oligarquia
“Liga Desportiva Campinense” (LBC), sendo eleito seu venancista.
presidente o Sr. Lino Fernandes de Azevedo.” (PIMENTEL, Com a queda de Deodoro da Fonseca e ascensão de
1958: 276) No dia 26 de Dezembro de 1929 é fundação do Floriano Peixoto, logo se efetivou a substituição dos
grêmio esportivo, literário e dançante “Paulistano Esporte presidentes estaduais. Venâncio Neiva foi deposto e Álvaro
Clube”, com time próprio, se tornou um dos mais fortes Machado , major do exército e sobrinho de um amigo de
adversários no futebol campinense. Em Janeiro de 1937, foi Floriano foi indicado para o governo da Paraíba.
fundado a Associação Desportiva Campinense. Estes Assumindo poder Álvaro Macho, inicia-se o
fizeram o início do futebol em Campina Grande, poucos predomínio da oligarquia alvarista que prolongou-se por
sobrevivem, mas ficaram marcados na história da cidade. vinte anos, até sua morte em 1912. durante este período,
Portanto, o advento da malha ferroviária proporcionou a Álvaro Machado obteve dois mandatos no governo do
maior dinâmica comercial, crescimento populacional, etc., Estado, revezando-se constantemente com seu vice, o
mas também proporcionou o surgimento de práticas monsenhor Walfredo Leal (que, aliás, governou durante
consideradas nobres, o aparecimento de novas ideais e de mais tempo que Álvaro), foi senador e, desde que assumiu a
um novo cotidiano nesta cidade, no qual teve como grande presidência do Estado, fundou o Partido Republicano da
contribuição a influência de Pernambuco e dos que através Paraíba. Enfrentou a oposição do Partido Autonomista,
do trem voltaram ou vieram para cá, contribuindo para criado por Venâncio Neiva que tinha Epitácio Pessoa como
história e a memória de Campina Grande. principal aliado. Demonstrou grande habilidade no jogo da
política oligárquica, através dos cambalachos característicos
da Primeira República (1889-1930) , conseguiu, inclusive,
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conciliar-se com antigos venancistas que se aglutinaram ao de controle da classe subalterna, criando-se, dessa forma, o
alvarismo. mandonismo local, base do poder dos futuros “coronéis”.
No período 1912-1915 ocorre a transição do alvarismo Durante o império, a elite rural foi integrada no poder
para o epitacismo. Nesta fase, Epitácio Pessoa e Walfredo monárquico na condição de comandantes da, então criada,
Leal dividiam a liderança do Partido republicano Guarda Nacional. Nesta, a patente de coronel correspondia
Conservador, através de acordo firmado em 1911. a atuação a uma comando municipal que era concedido, em geral, ao
de Walfredo ficou, assim, restrita ao poder local, enquanto chefe político local. O coronel reunia em seu batalhão
Epitácio, que já gozava de grande prestígio junto ao governo pessoas e sua parentela. Assim, se organizou uma das bases
federal, passou a dominar o partido, cabendo-lhe sempre a de sustentação do poder da elite rural: a solidariedade e a
última palavra. lealdade entre os membros da parentela, mesclada por
Às vésperas da eleição de 1915, quando se disputava o conflitos internos e violência resumidos na expressão:
controle do governo estadual, ocorreu o rompimento entre
Epitácio e Walfredo, dividido o Partido Republicano “Para os amigos, tudo; para os inimigos o rigor da lei.”
Conservador em duas facções: a epitacista e a valfredista.
Apuradas as urnas e eleitos todos os candidatos O poder do “coronel” se afirmou, mais ainda, com o
epitacistas, garantiu-se a consolidação do poder de Epitácio, advento da República. O federalismo, então implantado, deu
Daí, até 1930 todas as decisões da política paraibana ampla liberdade aos estados para procederem de forma
passaram a ser ditadas por ele, estivesse onde estivesse, e de autônoma; o que favoreceu sobretudo, os chefes políticos e
forma absolutamente incontestável. reforçou a dominação dos grupo0s que comandavam a
O epitacismo alcançou o apogeu no período em que a política local, ou seja, das oligarquias.
Paraíba era governada por Sólon de Lucena, devido a Nos municípios, sede do poder local, a autoridade do
presença de epitácio Pessoa na presidência da República que “coronel” se afirma na liderança efetiva por ele exercida
permitiu-lhe aplicar grande quantidade de verbas nas obras como chefe político, na sua capacidade de “arrebanhar” e
contra as secas e na construção do porto do Varadouro, no manter o eleitorado de “cabresto”. A atuação do “coronel”
rio Sanhauá, projeto este tecnicamente inviável. Além disto, é permanente e abrange diversos serviços de assistência,
os recursos do estado aumentaram bastante com o executados como favores que acarretam a penhora do voto.
crescimento das exportações, sobretudo de algodão. A maior ou menor capacidade de fazer favores (dar
Portanto, recursos não faltaram e foram usados emprego, ceder terras, proteção policial, assistência médica,
perdulariamente, beneficiando as oligarquias e reforçando remédios, etc.) e aplicar atos de violência sempre que julgar
seu poder. necessário e ficar impune, determina o grau de prestígio do
Mas, por que as oligarquias tinham tanto poder? Como “coronel”.
“coronéis” e oligarcas exerciam seus poderes? É claro que Este esquema de dominação beneficia grupos
este poder não foi-lhes dado naturalmente, nem de repente, familiares, ou seja, oligarquias que disputam entre si o
a partir da implantação da República e sim, resultante do controle da política de cada município, destacando-se uma
processo histórico brasileiro, desde seus primórdios. deles, em função de monopolizar os cargos e exercer o
Mediante da necessidade de administrar o imenso empreguismo e o clientelismo em geral. Na Paraíba, durante
território do Brasil, sabemos que o governo português o a Primeira república, as lutas entre famílias foram constantes
dividiu em capitanias hereditárias. Nestas, por sua vez, e marcadas pela corrupção e violência. Em seus municípios,
ocorreu a distribuição de lotes de terra, as chamadas situacionistas e oposicionistas agrediam-se frequentemente .
sesmarias, doadas com objetivo de estimular a produção e era comum “coronéis” mandarem seus “cabras” emboscar e
proporcionar lucros à Portugal. Próximo às áreas produtivas agredir adversários, quando não se articulavam com bandos
(engenhos e fazendas) foram crescendo núcleos de cangaceiros para maior eficiência do “serviço”.
populacionais, transformados em vilas, onde se concentrava Às vésperas e durante as eleições ocorria uma
a administração local,. Mediante as dificuldades e a verdadeira batalha. Recrutamento e alistamento de eleitores
desorganização da máquina administrativa e, tendo em conta realizados clandestinamente, eram completados pelo
que não interessava ao governo português custear a falseamento do voto, uma vez que legislação eleitoral
administração e sim arrecadar o máximo de impostos, permitia aos “coronéis” exercer o controle sobre as eleições.
outorgou poderes a proprietários de sesmarias, senhores de A historiadora Linda Lewin, em seu estudo sobre as
engenho e fazendeiros, para assumirem cargos na parentelas na política da Paraíba, afirma que durante a
administração local. As câmaras municipais foram, assim, o República Velha cerca de três dúzias delas, distribuídas por
maior reduto político dos proprietários rurais, seguidas das vários municípios concentravam o poder. Citando apenas
ordenações. algumas delas temos: os Dantas em Teixeira; os Suassuna
Em cada vila o Senado da Câmara exercia as funções: em Catolé do Rocha; os Cunha Lima em Areias; os Pessoa
executiva, legislativa e judiciária. Era composta pelos em Umbuzeiro, os Sátiro em Patos; os Pereira em princesa;
“homens bons”, identificados, na época pela riqueza. As os Cavalcanti de albuquerque/Lauritzen em Campina
ordenações eram tropas auxiliares comandadas pela elite Grande.
local.
A elite rural, portanto, desde o início de nossa história,
ocupa posições de mando, dispondo, assim, de instrumento
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PERREPISTAS E LIBERAIS DISPUTAM representante dos paulistas: Júlio Prestes, rompendo-se,
O PODER EM 1930 assim o pacto entre paulistas e mineiros, como conseqüência
Eliete de Queiroz Gurjão os mineiros, liderados por Antônio Carlos, unem-se as
lideranças gaúchas e formam o núcleo da Aliança Liberal,
Em outubro de 1930, os referidos opositores tomam o grupo de oposição.
por através do movimento armado que ficou conhecido Esse agrupamento partidário lança como candidato à
como a Revolução de 1930” e anunciam aos quatro cantos presidência da república o gaúcho Getúlio Vargas. Para
do Brasil a instalação de “um novo regime”, “a renovação compor a chapa como candidato a vice-presidente, convidou
completa da política nacional”. Da forma como foi o governador de Pernambuco Estácio Coimbra e o senador
divulgado e as promessas que ele trazia, este discurso foi Paulo Frontim. Mediante a recusa de ambos, após consulta e
recebido como uma nova esperança para muitos daqueles aprovação de Epitácio Pessoa, convidam seu sobrinho, o
que sentiam-se injustiçados e oprimidos. Acredita-se, assim, governador da Paraíba, João Pessoa, que prontamente
na “República Nova” que, estão se iniciava, na sua aceitou a indicação, completando-se, assim, a chapa da
capacidade de acabar com a velha política das oligarquias, Aliança Liberal. Mediante a aceitação de sua candidatura na
conforme alardeavam as novas lideranças políticas. chapa oposicionista, o governador da Paraíba (na época,
No capítulo que segue analisaremos essa “República denominava-se presidente), evidentemente, viu-se o brigado
Nova”, observando até que ponto ela se caracterizou, a romper com a candidatura oficial. Não poderia ser de outra
realmente, como nova. Vejamos, agora, por que e como forma. No dia 19/07/1929, já informado através de
ocorreu a “Revolução de 1930” ma Paraíba. telegramas do seu tio Epitácio, da consulta que lhe fora feita
Para que possamos entender a rebelião de 1930 na por Antônio Carlos e do seu consentimento para inclusão de
Paraíba é necessário situa-la n contexto mais geral do Brasil. seu nome na chapa da Aliança Liberal, João Pessoa reuniu o
No fim da década de vinte, o Brasil passava por uma grande diretório do Partido Republicano da Paraíba (PRP) e expediu
crise, cujas manifestações eram mais visíveis no campo telegrama posicionando-se contra a candidatura
econômico e político. situacionista. Tal fato, divulgado intensamente, passou à
Do ponto de vista econômico, o café que vinha em história como ato de extrema bravura, de heroísmo, como se
ascensão e representava o principal suporte da economia fora o grito de emancipação da Paraíba.
brasileira atingia plena produtividade. Todavia, o mercado Daí porque o dia 29/07/1929, passou a ser denominado
consumidor encontrava-se extremamente reduzido, face à dia do “NEGO”, palavra esta, mais adiante, inscrita na
crise internacional de 1920, a “Grande Depressão”, iniciada bandeira da Paraíba.
a queda da bolsa de valores de Nova York e que repercutiu Durante a campanha para a sucessão presidencial, a
por todo o mundo capitalista. Sobrava, então, grande Paraíba destacou-se não só pela sua participação na Aliança
quantidade de café, que costumeiramente, era absorvido pelo Liberal, mas também pela intensidade dos conflitos político-
mercado exterior, sobretudo pelos Estados Unidos, nosso partidários. Aliás, o clima político neste Estado já vinha em
principal comprador. Tratava-se, assim, do problema da ritmo de crescente efervescência, desde 1928, a partir do
superprodução que acarretava queda do preço e acúmulo de início da administração de João Pessoa.
estoques invendáveis. Mas, o que fizera João Pessoa para provocar tantos
Em outras ocasiões, mediante o risco de tais perdas, o desentendimentos? Afinal de contas, ele era um epitacista,
governo intervinha através da política de “valorização” do um membro da oligarquia dominante, como podemos
café (compra e estocagem da produção excedente, com entender a oposição contra ele na Paraíba?
recursos provenientes de empréstimos ao capital financeiro A administração de João Pessoa concentrou esforços
internacional). Neste momento, porém, face a “Grande em duas metas principais: a tentativa de depurar o
Depressão”, tal política tornou-se inviável. Assim, o coronelismo, impondo-lhe a autoridade governamental e a
presidente em exercício, Washington Luís, não evitou a concentração do comércio paraibano na capital, através de
espetacular queda de preço do café provocando, provocando, ,medidas que desviassem as transações comerciais do porto
portanto, o descontentamento de muitos cafeicultores de de Recife, que praticamente monopolizava o comércio da
São Paulo. Paraíba.
O cenário político da república Velha, embora No que se refere às medidas para controle do
dominado pelo esquema café-com-leite (revezamento nos coronelismo podemos citar: substituição das chefias
principais cargos políticos, de representantes das oligarquias municipais; subordinação dos agentes fiscais, da polícia e da
paulistas e minerais), enfrentava oposição crescente, em justiça diretamente às suas ordens; eliminação do acúmulo
virtude das mudanças pelas quais passava a sociedade de cargos, desarmamento dos “coronéis” e administração
brasileira. Greves operárias, movimentos de esquerda e direta das obras públicas.
rebeliões militares, conhecidas como “tenentismo” Quanto às medidas de caráter comercial, podem ser
marcavam presença, desde 1917 ao fim da década de vinte. agrupadas na chamada reforma tributária. Através da lei 673
A situação se agrava com as articulações realizadas em (de 17/11/1928), João Pessoa criou novo imposto de
prol da sucessão de Washington Luís, que representava a incorporação, chamado de “barreira”, que regulava a saída e
oligarquia paulista. Ora, de acordo com o esquema café- entrada de mercadorias da Paraíba para outros mercados.
com-leite, esperava-se a indicação do mineiro Antônio Impôs taxas diferentes para o comércio através da capital e
Carlos. Só que tal fato não ocorreu. O indicado foi outro do interior.
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Assim as importações (assim chamavam a entrada de Além das lutas armadas, os conflitos também se
mercadorias vindas de outros Estados) feitas na capital manifestaram, através de verdadeiras batalhas na imprensa,
pagavam um imposto que correspondia, em média, a um em linguagem ofensiva, chegando freqüentemente às ofensas
quarto do que era cobrado sobre as mercadorias importadas pessoais, conforme pode-se comprovar pela leitura dos
pelas cidades do interior, diretamente dos Estados Unidos. jornais locais deste período.
Desta forma, os comerciantes das cidades do interior da João Duarte Dantas, perrepista, portanto adversário
Paraíba que compravam e vendiam a comerciantes de político de João Pessoa, contra quem fazia campanha na
Pernambuco através de suas fronteiras pagavam portanto, capital do Estado, teve sua casa invadida pela polícia que,
impostos muito altos. Esta medidas, conhecidas como cumprindo ordens de sua chefia, arrombou o cofre de João
“reforma tributária” visavam, assim, estimular o comércio na Dantas e apreendeu documentos, armas e correspondência.
capital e neutralizar as facilidades comerciais existentes Entre esta encontravam-se cartas “comprometedoras”, que
entre as cidades do interior e os estados vizinhos, sobretudo foram anunciadas pelo jornal oficial de forma
com o porto de Recife. sensacionalista e expostas à observação do público. Em
A “reforma tributária” provocou imediata reação de represália, João Dantas assassinou o presidente João Pessoa
comerciantes do interior da Paraíba, do ceará e, que, na ocasião encontrava-se em Recife, precipitando os
principalmente, de Pernambuco. Houve intensa campanha fatos que impulsionaram a luta armada de 1930.
pela revogação dos novos impostos, apelando-se até apara o
presidente da república. A liderança maior dessa campanha A PARAHYBA ARENOVADA?
coube aos irmãos Pessoa de Queiroz (primos de João Eliete de Queiroz Gurjão
Pessoa), comerciantes radicados em Pernambuco e
proprietários do JORNAL DO COMMÉRCIO. Vitoriosa a rebelião de outubro de 1930, o editorial do
Neste sentido, esse jornal manteve acirrada luta contra o jornal oficial da Paraíba, A UNIÃO, entusiasticamente
governo da Paraíba, cuja defesa se fazia através de A anunciava o raiar dos novos tempos, o início da “renovação
UNIÃO (jornal do governo da Paraíba), travando-se então, a completa da política nacional “.
chamada “guerra tributária”. Será que houve renovação mesmo? Como? O que
O rompimento definitivo da oligarquia epitacista mudou? Tais questões somente a história pode responder.
somente efetivou-se após o golpe dado por João Pessoa Assim, busquemos na história respostas a estas indagações.
durante a escolha dos candidatos a deputados federais, Porém, tenhamos cuidado, pois existem histórias e histórias,
ocasião em que, obedecendo ordem de Epitácio, excluiu da dependendo do olhar do historiador, das questões por ele
chapa um antigo e, tido como certo, candidato (João colocadas e da leitura que ele faz das fontes pesquisadas.
Suassuna) para favorecer uma parente seu. Poucos dias À falta de outros testemunhos, procuremos resposta às
depois, José Pereira (“coronel”, chefe político da cidade de indagações acima em diversas manifestações da própria elite
Princesa) aliado de Suassuna, transferiu-se para a oposição, política local em seus discursos, em suas declarações na
portanto, para o Partido Republicano da Paraíba, iniciando- imprensa, em seus conflitos e confrontos com as camadas
se, a partir de então, a batalha política entre liberais e populares e nos seus conflitos e disputas internas.
perrepistas que evoluiu para a luta armada de Princesa e para Vitorioso o movimento de 1930, a Paraíba passa a ter
o movimento de outro de 1930. prestígio no cenário político nacional. Afinal, foram os
A Revolta da Princesa foi liderada pelo coronel José últimos acontecimentos políticos da Paraíba que deram
Pereira que, comandando um contingente de homens impulso à luta pela tomada do poder. Por conseguinte as
armados, combateu batalhões da polícia militar da Paraíba. lideranças locas participantes desse movimento
Tais confrontos se prolongaram de fevereiro a julho de 1930. permaneceram no controle da política local me,
tudo indica que esse conflito teve como maior impulso as ligeiramente, poder reforçado.
insatisfações acarretadas pela reforma tributária. A cidade de Logo após a vitória do movimento armado, José
Princesa, localizada no sertão da Paraíba, limita-se com Américo de Almeida conhecido escritor,, principal auxiliar
vários municípios pernambucanos. Esta localização da administração de João Pessoa e articulador do movimento
favoreceu-lhe o intercâmbio comercial como Pernambuco, de 1930 na Paraíba) foi nomeado interventor da Paraíba.
enquanto que a longa distância e a ausência de vias de Elevado, assim, ao principal cargo político do estado, como
comunicação dificultavam o comércio com a capital da uma homenagem que os líderes nacionais de 1930 prestavam
Paraíba. à memória de João pessoa, José Américo passou, então, à
Assim, as altas taxas impostas ao comércio realizado condição de herdeiro político do ex-presidente e principal
pelo interior prejudicou o comércio de Princesa, ao mesmo líder político da Paraíba. Após curto espaço de tempo na
tempo que atingia os comerciantes de Pernambuco, cujo interventoria do Estado (04/10 a 25/11/1930), foi nomeado
intercâmbio com Princesa era-lhes favorável, uma vez que ministro da Viação e Obras Públicas.
esta cidade era um centro produtor e distribuidor de algodão Em 1932 o Nordeste foi atingido por uma das piores
e importante mercado consumidor dos produtos por eles secas de sua história e o ministro paraibano teve
trazidos. Alguns historiadores afirmam, inclusive, que os oportunidade, então de aumentar seu prestígio através de sua
irmãos de Pessoa Queiroz instigaram José Pereira a atuação na política de obras contra as secas. Vale salientar a
Rebelião, bem como, contribuíram financeiramente. importância desta política, no sentido de beneficiar os
grandes proprietários de terras e de reforçar o clientismo.
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História da Paraíba Professor Welton
Outro efeito das obras contra as secas deste período, que, bem como de destacamentos provisórios organizados e
aliás, quase não é percebido foi o de garantir os novos enviados por “coronéis” que habitavam nas fronteiras com
ocupantes do poder, de construir para eles uma imagem Natal e Recife.
altamente positiva, que lhes proporcionou crescente Debeladas as rebeliões de Recife e Natal, a ação
prestígio. repressiva na Paraíba efetivou-se de tal forma agressiva,
Desta forma, Getúlio Vargas aparece como o “grande como se a Paraíba tivesse participado também no
benfeitor do Nordeste” e José Américo como “O ministro movimento. Segundo relatório da Delegacia de Ordem
das secas”. Aliás, o papel representado pelas obras contra as Política e Social, havia um plano de participação da Paraíba,
secas, no período inicial do governo de Vergas, foi de contendo, inclusive, os nomes das pessoas a quem caberia
fundamental importância para a legitimação do próprio executa-lo. Com este pretexto, muitos trabalhadores e
movimento de 1930. intelectuais foram presos e alguns prestaram depoimento sob
Na Paraíba, a imagem criada em torno da rebelião de “ameaças, violências espancamentos”, conforme dito por
1930 foi ainda mais forte. Ainda hoje pode-se perceber a Horácio de Almeida em seu requerimento de “hábeas
força desta imagem, cujas manifestações mais evidentes são: corpus”.
o nome da capital, mudado de Parahyba para João Pessoa e a Decretado o estado de guerra, a repressão tornou-se
bandeira do estado, também trocada, cujas cores, preto e mais rigorosa e sistemática.
vermelho e o lema “NEGO” constituem homenagens ao ex- E outubro de 1937 já se encontravam, instalados e em
presidente e a todos que participaram do movimento de 1930 pleno funcionamento na capital do estado, comissões
na Paraíba. Inclusive, é interessante observar que, ao mesmo responsáveis pela fiscalização, propaganda e doutrinação
tempo que se criavam as imagens de “herói” e de “mártir”, anti-comunista, contando com apoio da Assembléia
cria-se também a imagem da “Parahyba pequenina e forte”. Legislativa e a colaboração da Igreja Católica.
Assim, a Paraíba passa a se confundir com o símbolo da Como resultado de todo este aparato repressivo a classe
resistência de sua oligarquias. trabalhadora paraibana foi amordaçada, desde 1935. suas
Enquanto isto , as manifestações de resistência das entidades, tais como associações e sindicatos que vinham
camadas populares são tratadas como fatos estranhos e caminhando no sentido da organização da classe foram
inaceitáveis, conforme ocorreu durante as greves operárias desviadas, passando muito mais a desorganiza-la, atuando
da Paraíba nos períodos de 1917 a 1928 e 1934 a 1936. como legitimadoras da ordem vigente. Consequentemente, a
Mediante o crescimento das lutas operárias, por ocasião presença operária na cena política da Paraíba foi
da Velha como da Nova República as oligarquias no poder redirecionada, limitando-se, por muito tempo, a apoiar os
reagiram imediatamente, em duas frentes. Através da candidatos das oligarquias dominantes.
imprensa, divulgando apelos para o retorno ao trabalho e As disputas entre as oligarquias no poder e aquelas que
alardeando o “despreparo” e a tradição de ”cordura e ficaram fora dele a partir de 1930, são constantes e
patriotismo” dos trabalhadores paraibanos. demonstrativas da continuação da política tradicional, da
Assim, criam a imagem de um trabalhador pacífico, sobrevivência dos velhos métodos de fazer política. Logo
cordial, ordeiro, cuja rebeldia ora manifestada é fruto da após a vitória de 1930, o grupo no poder enfrentou a
influência de “elementos perturbadores da ordem... vindos oposição de ex-correligionários, insatisfeitos com a
de fora”, de “comunistas”. distribuição de cargos e privilégios.
A Igreja católica também atuou neste sentido, Ao mesmo tempo, a ascensão de José Américo passa
utilizando seu jornal, A IMPRENSA, para reforçar essa incomodar. O argumento mais utilizado por ambas as
imagem “Acomodada” do nosso trabalhador. facções era “o sacrifício do grande presidente”, a herança
Ao mesmo tempo, as autoridades governamentais política do assassinato de João Pessoa. Os que assumiram o
reprimem as graves, através da atuação ostensiva da polícia, governo, declaravam-se continuadores da obra de João
no sentido de “manter a ordem”. A repressão foi Pessoa, enquanto seus opositores evocavam a memória de
intensificada após o fracassado levante militar ocorrido em João Pessoa para lamentar os rumos tomados pelo
novembro de 1935. conhecido como “Intentona Comunista”, movimento de 1930.
porque foi organizado pelo Partido Comunista, este
movimento motivou sistemática repressão às lideranças de LIGAS CAMPONESAS
esquerda no Estado. A pretexto da existência de um plano
para eclosão do movimento na Paraíba, inclusive publicado As primeiras Ligas Camponesas surgiram no Brasil, em
na imprensa, desencadeou-se numa verdadeira caçada ao 1945, logo após a redemocratização do país depois da
comunismo e às oposições em geral, acusados todos de ditadura do presidente Getúlio Vargas. Camponeses e
representarem “o perigo vermelho”, “a besta apocalíptica”. trabalhadores rurais se organizaram em associações civis,
A repressão “preventiva” inviabilizou a participação da sob a iniciativa e direção do recém legalizado Partido
Paraíba no levante de 1935. situada em Pernambuco e Rio Comunista Brasileiro – PCB. Foram criadas ligas e
Grande do Norte, Estados cujas capitais se rebelaram, a associações rurais em quase todos os estados do país. Em
Paraíba funcionou como verdadeira barreira à articulação 1948, no entanto, com a proscrição do PCB houve o
entre ambos e provável expansão do movimento. Além desmoronamento das organizações de trabalhadores no
disto, a Paraíba exerceu um papel significativo no combate Brasil.
às rebeliões vizinhas, através do envio de forças militares,
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Entre 1948 e 1954, eram poucas as organizações congregando assim as Ligas Camponesas entre 70 e 80 mil
camponesas que funcionavam e raríssimas as que ainda pessoas na época.
conservavam o nome de Liga, como a Liga Camponesa da A Paraíba antes esquecida, vítima da seca, da miséria,
Iputinga, dirigida por José dos Prazeres, um dos líderes do da fome, de políticos oportunistas, do latifúndio, levanta-se
movimento em Pernambuco e localizada no bairro do exigindo medidas urgentes para a questão agrária, com
mesmo nome, na zona oeste da cidade do Recife. destaque ao Grupo da Várzea. A resposta dos
Em janeiro de 1955, com a criação da Sociedade latifundiários, foi a violência como única forma de calar e
Agrícola de Plantadores e Pecuaristas de Pernambuco, a exercer controle sobre o campesinato.
SAPP, localizada no Engenho Galiléia, em Vitória de Santo A Paraíba assistiu, estarrecida, entre o impacto e a
Antão, Pernambuco, houve o ressurgimento das Ligas revolta ao crime que vitimou a maior liderança do
Camponesas no Nordeste. A partir do seu ressurgimento, as campesinato paraibano na época, João Pedro Teixeira,
Ligas deixaram de ser organizações e passaram a ser um assassinado a 2 de Abril de 1962 com 5 tiros na estrada de
movimento agrário, que contagiou um grande contingente de Sapé-café do Vento, em direção ao sítio Sono das Antas,
trabalhadores rurais e também urbanos. onde morava. Vinte e um anos depois, no dia 12 de agosto
Em agosto de 1955, realizou-se no Recife, o Congresso de 1983, Margarida Maria Alves, líder camponesa,
de Salvação do Nordeste, que teve grande importância para presidenta do Sindicato dos Trabalhadores de Alagoa
o movimento camponês, uma vez que foi a primeira vez no Grande é assassinada com um tiro no rosto.
Brasil, que mais de duas mil pessoas, entre autoridades, As Ligas Camponesas funcionavam com duas seções, a
parlamentares, representantes da indústria, do comércio, de Organização de Massas (0.M.), que reunia moradores da
sindicatos, das Ligas Camponesas, profissionais liberais, cidade (Ligas Urbanas), mulheres (Ligas Femininas),
estudantes, reuniram-se para discutir abertamente os pescadores (Ligas dos Pescadores), Ligas dos
principais problemas socioeconômicos da região. A Desempregados, Ligas dos Sargentos e todas as pessoas que
Comissão de Política da Terra era composta por mais de admitiam a necessidade da reforma agrária e a Organização
duzentos delegados, em sua maioria camponeses Política (O. P.), que aceitava apenas determinados membros
representantes das Ligas. da Organização de Massas, aqueles que se destacavam em
Em setembro de mesmo ano, foi realizado, também no seu trabalho, reunindo qualidades políticas, ideológicas e
Recife, o Primeiro Congresso de Camponeses de morais que justificassem sua condição de militante da
Pernambuco, organizado pelo professor Josué de Castro, que organização.
culminou com um grande desfile de camponeses pelas ruas Com o Golpe Militar de 1964, o movimento foi
da cidade. desarticulado, proscrito, sendo seu principal líder preso e
A partir daí, as Ligas Camponesas expandiram-se para exilado. O movimento funcionou ainda durante algum
diversos municípios de Pernambuco e também para outros tempo, através da Organização Política Clandestina, que
estados brasileiros: Paraíba, onde o núcleo de Sapé foi um possuía uma direção nacional formada por assalariados
dos mais expressivos e importantes, chegando a congregar rurais e camponeses, que se infiltraram em sindicatos
mais de dez mil membros; Rio Grande do Norte, Bahia, Rio agrícolas, passando a ajudar presos e perseguidos políticos.
de Janeiro (na época estado da Guanabara); Minas Gerais, A organização dos camponeses com a morte de seus
São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso, lideres, não foi destruída, ao contrário. As Ligas
Acre e também no Distrito Federal, Brasília. Camponesas representam um importante papel na
O movimento tinha como objetivos básicos lutar pela redefinição da questão agrária e questionou o papel dos
reforma agrária e a posse da terra. No plano nacional o seu latifundiários, o campesinato conquistou seu papel como
principal líder foi o advogado e deputado pelo Partido associação de classe e trouxe a reforma agrária para o debate
Socialista, Francisco Julião, que aglutinou o movimento em público.
torno do seu nome e de sua figura, conseguindo reunir
idealistas, estudantes, alguns intelectuais e projetando-se O GOLPE DE 1964 E A INSTALAÇÃO DA
como presidente de honra das Ligas Camponesas. REPRESSÃO NA PARAÍBA
Em 1962, foi criado o jornal A Liga, veículo de Monique Cittadino
divulgação do movimento. Com a aprovação do Estatuto do
Trabalhador Rural, nesse mesmo ano, muitas Ligas Na Paraíba, o golpe de 1964 encontra as forças políticas
transformaram-se em sindicatos rurais. de direita organizadas e prontas para reagir diante da
No final de 1963 o movimento estava concentrado nos ameaçadora mobilização das forças de esquerda verificada
estados de Pernambuco e Paraíba e o seu apogeu como anteriormente, ao longo dos anos iniciais do governo de
organização de trabalhadores rurais ocorreu no início de Pedro Gondim. Os proprietários rurais organizaram-se na
1964, quando foi organizada a Federação das Ligas Associação dos Proprietários da Paraíba (APRA), que
Camponesas de Pernambuco, da qual faziam parte 40 passou a ser conhecida como LILA (Liga dos
organizações, com cerca de 40 mil filiados no estado. Latifundiários). A PARA exercia uma atividade paramilitar,
Na Paraíba, Rio Grande do Norte, Acre e Distrito voltada para a defesa das propriedades privadas dos seus
Federal (Brasília), onde ainda funcionava o movimento, o associados. Em um artigo das suas memórias publicado no
número de filiados era de aproximadamente 30 mil, Jornal O Norte, Joacil de Brito Pereira, advogado ligado aos
grandes proprietários rurais, assim se referiu ao processo em
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História da Paraíba Professor Welton
curso de organização dos latifundiários contra uma possível vagabundo, pequeno, de saúde, como sendo a maior coisa do
invasão camponesa em suas propriedades: mundo. Quer dizer, quando ele fazia um almoço lá era para
“Nas propriedades, engenhos e na usina de Agnaldo mostrar alguma coisa que ele tinha feito."
[Veloso Borges] não houve invasão alguma, a despeito das Além do usineiro Renato Ribeiro Coutinho, o esquema
ameaças. Ele se preparou para a defesa de tal modo, que civil pré-revolucionário na Paraíba contou com a
seria uma temeridade tentar invadir seus domínios.” participação de diversos outros integrantes, conforme citação
Outro que se preveniu para uma reação em regra foi nominal de Joacil de Brito Pereira: Antônio Ribeiro Pessoa,
Henrique Vieira de Albuquerque e Melo, do Engenho João Batista de Lima Brandão, Sindulfo Guedes Santiago,
Outeiro. Dele se dizia: Alfredo Pessoa de Lima, cel. Renato Ribeiro de Moraes,
“Quem entrar nas terras de Henrique não sai vivo'. Jocelan Veloso Borges, Fernando Gouveia, Renato Ribeiro
Aliás, ambos passaram a dar cobertura a proprietários, Coutinho, Marcos Odilon Ribeiro Coutinho, Flaviano
vizinhos envoltos com o mesmo problema. E aliciaram Ribeiro Coutinho, Otávio Mariz Maia.
muitos elementos nos sítios, engenhos e fazendas. A Os nomes não se restringiam aos membros da UDN.
arregimentação se fez em grande escala." Diversos integrantes do PSD participavam das conspirações:
Questionado sobre uma possível articulação civil pré- José Afonso Gaioso de Souza, dep. José Fernandes de Lima,
revolucionária na Paraíba, Joacil de Brito Pereira confirmou Aluísio Pereira, Carlos Pessoa Filho. Além destes políticos,
a sua existência e declarou: Joacil de Brito cita ainda alguns jornalistas como Sabiniano
"...alguns deputados estaduais e alguns deputados Maia, José Leal, Antonio Brainer, Otinaldo Lourenço e
federais, alguns líderes dos proprietários, das classes Dulcídio Moreira.
produtoras, da indústria, do comércio, mantinham um Ainda segundo Joacil de Brito Pereira nesse
contato permanente com o Cel. Ednardo d'Ávilla Melo, depoimento, o processo de conspiração incluiu a
depois general, que foi uma espécie de chefe militar da organização, encabeçada pelo cel. Renato Ribeiro de
Revolução na Paraíba. (...) E nós tínhamos esses contatos, Moraes, de falanges de sargentos, cabos e soldados
ele nos informava permanentemente, não a todos, mas a reformados da Polícia Militar e do Exército para uma
alguns. Ele mantinha muito contato comigo, com Agnaldo possível luta armada se necessário fosse. A organização
Veloso Borges, e nós, de qualquer forma, representávamos, dessas falanges simultaneamente ao processo de constituição
naquela hora de luta, o esquema civil. Digamos que de exércitos privados indica que as forças conservadoras
fôssemos assim uma espécie de chefes sem designação, mas estavam prontas para conter qualquer processo de resistência
lideranças da área civil na revolução, ao lado da área militar à implantação da nova ordem.
que era chefiada, liderada pelo Cel. Ednardo d'Ávilla Melo.” Neste contexto, Hélio Zenaide, baseado em declarações
A articulação do golpe de 64 contou com a participação de Joacil de Brito Pereira, esclarece que o recurso às armas
conjunta dos setores civis e militares, conforme salientou era uma das possibilidades aventadas pelos golpistas naquele
Joacil de Brito Pereira nos depoimentos anteriores. As bases momento:
sobre as quais se fundamentavam as vinculações existentes "...Os proprietários rurais a esta altura já estavam
entre esses dois setores são expressas pelo Cel. Ernani armados. Todos eles tinham munições, todos eles tinham
Layme Falcão, que enfatiza as ligações existentes entre o metralhadoras em suas propriedades. Os proprietários rurais
usineiro Renato Ribeiro Coutinho, um dos líderes do Grupo estavam organizados e já tinham um plano de atuação diante
da Várzea e um dos mais destacados integrantes do esquema de qualquer emergência que surgisse (...). Os latifundiários
civil, e a área militar: já tinham um plano inclusive para assaltar o Palácio do
"Aqui, aqui nós fomos muitas vezes obrigados a ir Governo se fosse o caso. (...) Caso houvesse uma luta
assistir ou homenagear Renato Ribeiro Coutinho. Entende armada com os camponeses e Pedro Gondim ficasse ao lado
como é? Não é que a gente tivesse raiva do Dr. Renato. Pelo dos camponeses. Eles estavam preparados para essa
contrário. Era um homem educado, tratava os militares eventualidade."
muito bem. Mas, ele não gostava dos militares porque Quanto à participação concreta do Governo do Estado
gostava dos militares. 'Tá entendendo como é? Ele gostava na conspiração golpista, nada indica que tenha ocorrido,
dos militares naquilo que os militares pudessem servir a ele. apesar da sintonia de interesses e de ação que já vinha se
Porque ele também servia ao militar. Entende como é o manifestando entre o governador e a guarnição federal na
negócio? Quer dizer, ele deu um instrumental da Banda de Paraíba. É extremamente viável, devido ao clima existente
Música lá do 15. Ele fez um pátio do quartel. Essas coisas no país de intensificação dos radicalismos, que se pudesse
que os militares não deviam aceitar, como nós não aceitamos suspeitar e prever um desfecho por fora do estado de direito
nada dele lá. Mas ainda assim mesmo ele arranjou uma e da legalidade à situação crítica vigente no país.
medalha de "Pacificador" no nosso quartel. Por que ele sabia Entretanto, é pouco provável que o Governador Pedro
o dia do meu aniversário... Ele fazia banquetes na Usina, Gondim pudesse estar envolvido, a exemplo dos
convidava a gente, a gente ia lá. Mas, para quê? Para ver as governadores líderes do movimento (Carlos Lacerda,
obrinhas vagabundas que ele fazia lá como sendo obras Magalhães Pinto e outros), nas articulações golpistas.
fantásticas para atendimento daquele pessoal da ... Ele abria Inclusive, a reação imediata de Gondim à emergência do
um centro de saúde com uma salinha e uma balança e uma golpe e a indefinição que se estabelece inicialmente entre ele
mesa de médico, como sendo a coisa mais importante do e seus assessores quanto à posição a ser tomada, são claros
mundo. Querendo fazer a gente engolir um serviço
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indícios de que o governador fora realmente tomado de de segurança constou, posteriormente, que teria ido embora
surpresa. do palácio da Redenção caso o governador tivesse tomado
Em um depoimento, Gondim salienta a surpresa uma posição de apoio à legalidade."
representada pela eclosão do golpe naquele momento A definição da posição de Gondim, contudo, ainda não
preciso, assim como nega que as recentes medidas tomadas seria tomada neste momento, mas apenas na manhã do dia
no seu governo, imprimindo-lhe uma nova orientação, já 10 de abril com a chegada do líder do Governo na
tenham sido adotadas visando ao desfecho de um Assembléia, Antônio Vidal do Rego. A partir daí,
movimento militar de direita: percebendo a irreversibilidade do movimento militar, a
"Raros foram os governadores de estados pequenos que fragilidade das forças janguistas e, sobretudo, a importância
participaram da elaboração revolucionária. (...) A revolução, do momento para a sua sobrevivência política, Pedro
o movimento, surpreendeu o maior número dos Gondim elabora a nota de apoio ao movimento
governadores de pequenos estados. O governador que veio "revolucionário":
dizer que participou, que fez parte da elaboração, que foi "Não posso e não devo, neste instante de tanta
consultado previamente, que teve entrevistas... isso aí não é, inquietação nacional, deixar de definir minha posição, na
não. Eu, pelo menos, fui surpreendido com o movimento da qualidade de Governador dos paraibanos. Reafirmo,
revolução. A própria notícia me foi surpresa. De forma que preliminarmente, todos os pronunciamentos que expandi em
não fiz nada com vistas a prevenir uma posição melhor favor das reformas essenciais, por saber que elas constituem
dentro de qualquer movimento. Tenho a humildade de instrumentos legais de adequação aos novos problemas do
confessar que não estava participando de entendimentos pró- povo. E neste sentido nunca faltei com o meu estímulo e
revolução nem anti-revolução." apreço ao Governo Central. Os últimos acontecimentos,
Ao tomar conhecimento da eclosão do golpe, no início verificados no Estado da Guanabara, envolvendo
da noite de 31 de março, o Governador encontrou-se com os marinheiros e fuzileiros navais, denunciaram, porém,
seus auxiliares mais diretos no Palácio da Redenção, em inequívoca e grave ruptura na disciplina em destacado setor
uma reunião que se prolongou pela madrugada, encerrando- das classes armadas, com desprezo às linhas”
se apenas na manhã seguinte, com a elaboração e leitura na A posição tomada pelo governador Pedro Gondim, após
Rádio Tabajara da nota oficial do Governo posicionando-se a noite de vigília, garantiu-lhe não apenas a sua permanência
frente ao movimento. à frente do Governo do Estado, como a preservação da sua
O desenrolar dos acontecimentos ao longo desta noite liberdade, haja vista que, segundo depoimentos de
são claros indicativos de que o Governo Estadual, além de testemunhas da época, caso a posição tivesse sido outra, ele
ser tomado de surpresa frente ao movimento, também não teria sido deposto e, em seguida, preso, conforme aconteceu
tinha uma posição definida e, muito menos, homogênea a ser com Miguel Arraes. Portanto, essa definição do governo
assumida: parte do seu secretariado defendia o rompimento favorável aos "revolucionários" garantiu-lhe a sobrevivência
com o Governo Federal e a adesão imediata ao golpe, e parte política e a liberdade pessoal.
pretendia a adoção de uma posição em apoio a João Goulart.
O impasse persistiu mesmo com a chegada dos coronéis LAMPEJOS DA CULTURA PARAÍBANA
Ednardo d’Ávilla e Plínio Pitaluga, que exigiam do Damião de Lima
governador uma definição. Joacil de Brito Pereira relata a
pressão então exercida sobre o Governador: Falar de cultura é uma tarefa das mais difíceis devido à
"Contou-me o coronel Pitaluga que teve vontade de complexidade do tema. Vejamos como a cultura está
prender Pedro Gondim, incontinente, após a sua resposta definida em dois tópicos de verbete encontrado no dicionário
evasiva e fugidia. Mas olhou para o seu colega Ednardo e ele de Aurélio Buarque de Holanda: Cultura.
lhe fez um sinal de ponderação e tolerância. Eles trouxeram Conjunto de características humanas que não são
uma intimação, um ultimatum, e Pedro se fez de inatas, e que se criam e se preservam ou aprimoram através
desentendido e se limitou a agradecer a comunicação, da comunicação e cooperação entre indivíduos em
dizendo que ia refletir e reunir o secretariado. Ednardo, pois, sociedade” e ainda “A parte ou aspecto da vida coletiva,
evitou que Gondim fosse deposto e preso naquela relacionados à produção e transmissão de conhecimentos, à
madrugada. Confiou-me, ainda, o coronel Pitaluga outras criação intelectual e artística. (AURÉLIO, 1993, p.318)
missões. A primeira era reunir os líderes dos partidos, para Além desta diversidade ainda temos que nos defrontar
convencermos o governador a definir-se ao lado da com os diversos conceitos de cultura, tais como: cultura
revolução, até a manhã daquele dia, pelas onze horas. Caso popular, cultura erudita, cultura dominante, cultura de
contrário, seria deposto." resistência etc.
O jornalista Nelson Coelho corrobora essa versão Por isso este capítulo que trata da cultura paraibana se
enfatizando a possível situação de abandono de Gondim por constituiu em um dos mais difíceis de elaboração. Por outro
suas forças militares: lado, tornou-se extremamente instigante, porque nos colocou
"A verdade é que o Palácio da Redenção, com o diante de um sem número de manifestações artísticas,
governador nele instalado, funcionou a noite inteira. Pedro inúmeras manifestações de folclore, e um sem número de
tinha trocado o sistema de segurança no Estado, colocou o estilos musicais que são oriundos ou adaptados e
major Macário como secretário e fez o coronel João Gadelha desenvolvidos em nosso Estado. Tal fato mostra o quanto o
de Oliveira, comandante geral da Polícia Militar. Esta equipe nosso povo é criativo e consegue transmitir esta criatividade
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das mais diversas formas e, o mais importante, sem se em nosso estado foram as ordens religiosas: os beneditinos,
preocupar com as diversas rotulações e camisas de força os jesuítas, os franciscanos e os carmelitas. Estas ordens
impostas pela suposta intelectualidade. construíram diversos monumentos arquitetônicos que ainda
Baseados nesta diversidade, ficamos diante de um hoje podem ser apreciados, principalmente na capital do
dilema sobre o que falar que possa retratar a cultura Estado.
paraibana. Como já foi dito, qualquer escolha feita tornaria Entre estas obras destacamos o Mosteiro e a Igreja de
esta análise apenas a ponta de um iceberg da riqueza das São Bento, o conjunto Santo Antônio e São Francisco, a
manifestações culturais de nosso povo. Dito isto, resolvemos Igreja da Misericórdia, as Igrejas conjugadas de Nossa
apenas apresentar um rápido panorama sobre algumas Senhora do Carno e Santa Terezinha, o Palácio da redenção
formas de manifestações artístico-cultural. e a Faculdade de Direito que se originaram de construções
Quando se fala em cultura, a primeira imagem que nos jesuítas e a Igreja de Nossa Senhora da Guia no município
vem à cabeça está relacionada às letras, daí porque iniciamos de Lucena. Vinculados à defesa do território paraibano,
com a questão da imprensa na Paraíba. temos dois importantes monumentos: a Casa da pólvora na
Em relação à imprensa, tivemos na Paraíba diversos parte antiga de João pessoa e a fortaleza de Santa Catarina
jornais desde o início do século XIX. Já em 16 de fevereiro no município de Cabedelo.
de 1826, fundou-se o primeiro jornal denominado: Gazeta do Além destes monumentos de inspiração e estilo
Governo da Paraíba do Norte. definidos, a capital dispõe ainda de alguns monumentos que,
O segundo jornal fundado na Paraíba foi: A Gazeta segundo Chico Pereira: “... são lembranças de vários estilos
Parahybana, este circulou entre 1828 e 1829. durante a de inspiração européia, condensados na paisagem do
monarquia circularam na Paraíba mais de 50 jornais, a cotidiano...”(op. Cit., 11). Entre estes monumentos de vários
maioria deles na capital e, quase todos, defendendo estilos destacamos: o Teatro Santa Rosa, os edifícios que
interesses partidários. abrigam o comando geral e o Batalhão de polícia Militar, o
No campo da imprensa de cunho religioso, destacamos coreto da Praça Pedro Américo, o Palácio da Justiça, o
a existência do jornal. A Imprensa que começou a circular Pavilhão do Chá, o Palácio da arquidiocese e o edifício dos
no dia 27 de maio de 1897 e, como todos os jornais, passou Correios e Telégrafos.
por muitas dificuldades, inclusive o seu fechamento durante Do auge do período açucareiro, podemos observar
o período do estado Novo, por ordem de Ruy Carneiro, alguns engenhos existentes na região do brejo, e que ainda
através do departamento de Imprensa e Propaganda (DEIP). mantém toda sua estrutura, ou seja, o engenho em si, a casa
Este jornal destacou-se por contar com a participação grande e a senzala. E podemos ver ainda as fachadas das
feminina no seu quadro de colaboradores, sob a coordenação residências dos municípios de Areia, Alagoa Grande,
de um grupo de moças da Associação Católica da Capital Bananeiras, Pilões, Serraria, Alagoa Nova, entre outras, que
que escrevem sobre religião, artes, literatura, moda, etc. guardam aspectos originais da arquitetura do século XVII,
entre estas colaboradoras destacaram-se figuras como: Daura XVIII e XIX.
Santiago Rangel, Argentina Pereira Gomes, Eurídice de A partir do século XX percebemos a forte influência
Salles, Eudésia Vieira, Laura Jacobina Laconte, além de francesas na arquitetura urbana, tanto na capital como em
outras que se encobriam por trás de pseudônimos. algumas cidades do interior. Encontramos hoje algumas
fachadas no estilo Art-Nouveau e Art-Decó. Como exemplo
No interior, os jornais começaram a aparecer no final da Art-decó na capital, podemos observar o Prédio do Liceu
do século XIX. Na cidade de Campina Grande destacamos: Paraibano.
A Gazeta do Sertão de 01 de setembro de 1888 e o O Rebate A influência da Art-Decó foi muito forte nas
fundado em 1932 e que circulou até princípios da década de construções das residências do centro da cidade de Campina
60. na cidade de Areia tivemos O Areiense fundado em 1877 Grande, onde está sendo feito um trabalho de revitalização
e A Verdade de 1888; em Guarabira tivemos O Astro, O do centro da cidade quanto à limpeza e a conservação das
Correio Guarabirense, O Correio do Interior, O Jornal da fachadas dos edifícios que guarda estas características.
Luz e O Município. Ainda tivemos jornais em Alagoa Temos que destacar que, embora a influência européia
Grande, Mamanguape, Itabaiana e Monteiro. seja predominante, as Artes Visuais na Paraíba remontam
Hoje temos cinco grande jornais diários circulando no aos primeiros habitantes, pois não podemos esquecer as
Estado, sendo três da capital; o jornal A União fundado em inúmeras pinturas rupestres existentes nas dezenas de sítios
02 de fevereiro de 1892, o Norte de 07 de maio de 1908 e o arqueológicos espalhados por quase todo o estado.
Correio da Paraíba de 05 de agosto de 1953 e dois de A pintura como a conhecemos, só vai tomar corpo a
Campina Grande; o Diário da Borborema fundado em 02 de importância, no estado, no início do século passado. Foi em
outubro de 1957 e o Jornal da Paraíba 05 de setembro de 1913 que se inaugurou o primeiro museu ou galeria de
1971. retratos do pintos Aurélio de Figueiredo, que veio à Paraíba
a convite do então presidente Castro Pinto.
E a Arquitetura?
Como diz o artista Chico Pereira: “As artes plásticas na E as outras Artes?
Paraíba são fruto da mesma árvore cultural européia do Quanto às outras artes como cinema, música e teatro,
legado greco-romano” (A União: 1997,08). Os principais embora tivéssemos inúmeras manifestações, durante todo o
responsáveis pelas primeiras obras no campo da arquitetura século passado, foi só nos anos 60 que estes setores
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tornaram-se verdadeiramente atuantes e organizados no brasileiros e a orquestra sinfônica que sem dúvida é uma das
estado, este boom artístico ocorreu, principalmente, com a melhores do Brasil.
popularização ou massificação do conhecimento, Na música popular brasileira, temos grandes nomes
patrocinado através da federalização da Universidade como Geraldo Vandré, Sivuca, Glorinha Gadelha, Cátia de
Federal da Paraíba e da criação da Universidade Regional do rança, Zé Ramalho, Roberta Miranda, Elba Ramalho, além
Nordeste, hoje UEPB. de novos talentos que começam a despontar como Emerson
A partir de então, tivemos não apenas o aumento das Uray, Adeildo Vieira, Júnior Rangel, Paulinho de Tarso,
diversas manifestações artístico-culturais na capital, como Capilé, Gera Brito, Pedro Osmar, Totonho, Renata Arruda,
também a interiorização deste movimento, com destaque entre outros. Gostaria de destacar, também o grupo
para cidade de Campina Grande. Despontaram, neste Jaguaribe Carne considerado um celeiro de bons músicos
período, na capital, grandes artistas vinculados ao capital. Deste grupo saíram muitos dos novos talentos acima
departamento Cultural da UFPB, ao Grupo Tomás Santa citados, entre eles o cantor e compositor Chico César.
Rosa e ao Centro de Artes Plásticas. Em termos de inovação musical a Paraíba de ao Brasil e
Em Campina Grande, os artistas estavam ligados a ao mundo um dos maiores criadores de ritmos já conhecidos:
diversos movimentos liderados por pessoas vinculadas à o grande Jackson do Pandeiro, figura de difícil classificação
cultura como a equipe 3 (José Analecto, Elido Barbosa e em termos musicais porque passeava por todos os ritmos,
Chinco Pereira), além de outras pessoas que começaram a reinventando-se e adaptando-os às suas músicas. Hoje,
despontar no movimento cultural da cidade como o diretor Jackson tem admiradores no mundo inteiro e seu estilo
do teatro Municipal, o teatrólogo Wilson Mau, além de duas irreverente e ao mesmo tempo profundamente identificado
figuras que ainda hoje podem ser consideradas como com suas origens vem sendo seguido por diversos artistas.
patronas da cultura campinense: Elizabete Marinheiro e No Estado são seguidores do estilo Jackson: Biliu de
Eneida Agra. Os novos artistas congregavam-se em torno do Campina, Fubá de Taperoá, Manuelzinho Silva e as bandas
Teatro Municipal e do recém-criado Museu de Artes Assis Cabruêra e Tocais. Esta reinvenção de ritmos e resgates da
Chateaubrinad, inaugurado em outubro de 1967. Não cultura é hoje um movimento que ganha dimensão nacional.
Podemos esquecer a influência dos programas de auditório
da rádio Borborema que revelou inúmeros talentos. E a Cultura Popular?
No cinema, a Paraíba tem se destacado com diversos No que se convencionou chamar de cultura popular,
filmes e documentários sobre o estado. Embora os mais como sendo a cultura que é feita e difundida pela maioria da
conhecidos destacam-se o filme dirigido por Tizuka população, podemos afirmar que a Paraíba é muito rica e
Yamazaki: Paraíba Mulher Macho, que conta à história do tem revelado inúmeros talentos. Comecemos pela música.
movimento de 30 no estado e a recente produção da rede Conforme já falamos anteriormente, a nossa
globo: O Autor da Compadecida do livro de Ariano contribuição musical é bastante variada e, embora o forró
Suassuna que foi adaptado para o cinema. Tivemos, no seja o estilo mais característico devido ao espaço que
século passado, inúmeros filmes e destacamos cineastas alcançou na mídia ultimamente, temos diversas outras
como Walfredo Rodrigues (considerado o pai do cinema formas e estilos musicais variando de acordo com a região, o
paraibano), que fez o célebre Sob o Céu Nordestino, e clima e a origem dos moradores e de suas atividades
Linduarte Noronha que inaugurou uma nova forma de fazer laborais.
cinema na Paraíba, onde a realidade deixa de ser apenas Assim, no litoral temos o coco de roda e as cirandas,
mostrada e passa a ser estudada. Esta nova forma de fazer estilo de música e dança oriundas do período colonial, que
cinema pode ser apreciada no clássico documentário muda de acordo com o local de origem dos cantores e
produzido no início dos anos 60 com o título de Aruanda e dançarinos. Os pescadores dançam e cantam o coco de um
no documentário que foi interrompido pela ditadura militar e forma, já os cortadores de cana cantam e dançam de outra
só retomado no final desta; Cabra Marcado para Morrer, forma, mudando os temas das músicas e de acordo com a
dirigido por Eduardo Coutinho, que conta a história das ligas realidade de cada categoria e o seu mundo. No agreste e
camponesas no Estado. sertão temos uma grande influência dos violeiros ou
Hoje o cinema e o teatro paraibanos passam por uma repentistas como também são conhecidos e, de um outro tipo
fase de revitalização e, embora os incentivos sejam mínimos, de coco que é conhecido como coco de embolada, estilo este
os artistas estão conseguindo realizar filmes e montar peças bem diferente do coco do litoral. Recentemente, o LEO
interessantes que alcançam destaque na mídia nacional, (Laboratório de estudos da Oralidade) lançou um CD com
como o recente espetáculo teatral: Vou da Sarapalha. Outros cocos de roda, intitulado: COCOS: Alegria e Devoção.
artistas paraibanos também ganham destaque nacional tais Um outro estilo musical muito difundido é o aboio, a
como: Marcélia Cartaxo, que atuou no filme: Nasce uma música entoada pelos aboiadores como são conhecidos os
Estrela, e Soia Lira, que atuou no filme Central do Brasil. cantores deste estilo musical. O aboio é a forma de
Destacamos, ainda, o filme: Eu, Tu, Eles, dirigido por Carlos identificação entre o vaqueiro e “sua” boiada. Em geral, para
Vasconcelos. não deixar que o gado se perdesse nas caatingas, os
No campo musical, a Paraíba tem tido grande destaque vaqueiros soltavam uma espécie de grito que fazia com que
e sempre está presente nos diversos movimentos musicais e os animais se pusessem em marcha acompanhando o
com grandes talentos. É da Paraíba a grande Orquestra restante do rebanho. Como cada vaqueiro tinha um estilo
Tabajara que encantou e encanta gerações de românticos diferente de tocar sua boiada, estes gritos eram apresentados
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História da Paraíba Professor Welton
pelos vaqueiros nas festas de apartação e, posteriormente, sua forma de manifestação não ter sido citada nesta obra.
nas vaquejadas. Aos poucos, os gritos ou toadas como eles Mas, como o próprio título coloca, isto aqui é um pequeno
preferem chamar foram ganhando letra e transformando-se lampejo da cultura paraibana.
em música que, em sua maioria, falam de cavalo, mulher e
gado. Três coisas sagradas para os vaqueiros, principalmente A PARAÍBA NO NOVO MILÊNIO
o gado e o cavalo. Damião de Lima
Outro filão em termos de riqueza cultural é a nossa
poesia. Temos duas vertentes da poesia: uma erudita O Estado da Paraíba, neste início de século e de
encabeçada por Augusto dos Anjos, figura de destaque a milênio, vive uma fase de recuperação econômica em alguns
nível nacional, recentemente eleito como o paraibano do setores da sua economia, embora outros setores ainda
século e que tem seus seguidores no Estado e a poesia apresentem um quadro de crise, sobretudo os setores mais
matuta, conhecida também como literatura de cordel. É nesta tradicionais.
segunda que nos deteremos um pouco. O setor industrial começa a demonstrar claros sinais de
A literatura de cordel é uma adaptação da trova recuperação, com a implantação de algumas grandes fábricas
medieval. Embora não se possa precisar seu surgimento, este nos principais pólos econômicos: Grande João Pessoa (que
estilo presente em toda região Nordeste e, na Paraíba, o inclui Cabedelo, Bayeux, Satã Rita, Conde, além
cordel acabou influenciando outros tipos de manifestações obviamente, da própria capital) e o município de campina
artísticas de caráter mais popular como o coco de embolada, Grande.
a poesia matuta, os cantadores de viola e até o forró. Apesar da cidade de Campina Grande ter recebido
Neste tipo de literatura, tivemos grandes cordelistas e o algumas fábricas, é necessário dizer que o município está
pioneiro desta arte, no Estado, foi Leandro Gomes de muito distante de sair da crise em que se encontra, em
Barros, autor e editor de folhetos no final do século XXI e virtude do desaquecimento do setor industrial na cidade,
início do século passado; paraibano de Pombal migrou para iniciado no final dos anos 60 e agravado durante as décadas
Recife onde editava as obras e veio falecer em 1918. tivemos posteriores, colocou sua economia em uma situação difícil.
também o poeta repórter Apolônio Alves que deixou mais de A cidade passou a contar apenas com o setor informal
300 folhetos de cordel, retratando os acontecimentos de sua ligado à indústria e comércio, como já abordamos em
época. É preciso que se diga que o cordel servia como jornal capítulo anterior , e com o comércio formal que sempre teve
dos acontecimentos para as populações pobres, lidos nas um papel de destaque na economia do município, além de
feiras das mais diversas freguesias. Ainda hoje podemos ter desenvolvido o turismo de eventos com a implementação
encontrar pessoas que sobrevivem da leitura do cordel. E nos do São João e da Micarande. Claro está, que estes elementos
anos 80 um filme fez grande sucesso contando a história de por si só não conseguem dar sustentação econômica a um
um cordelista O Homem que virou suco. município com aproximadamente 400 mil habitantes.
Além do cordel, temos no estado grandes expressões No entanto. Algumas medidas estão sendo tomadas
artísticas nos diversos ramos todos emglobados como poetas visando a recuperação econômica do município de Campina
populares, esta denominação se dá pelo fato de que estes Grande. Ente essas medidas, destacamos a atuação de
artistas em geral passeiam entre um gênero e outro da poesia organismos econômicos e financeiros que resolveram
ou sejam os poetas populares, em geral, recitam e cantam, apostar na economia do município e estão ampliando o seu
outros, tocam e embolam ou tocam, cantam me recitam. campo de atuação.
Dentre os destaques da poesia temos originalmente a É o caso do Banco do Nordeste, do recém instalado
família de Agustinho Nunes da Costa oriundo da região de Banco Rural e da AMDE. Esta última é uma agência de
Teixeira, tanto Agustinho que migrou, como seus filhos que desenvolvimento da Prefeitura Municipal, atua com
já nasceram na região de São João do Sabugi, Hunguinho e financiamento de diversos órgãos financeiros entre eles a
Nicandro são poetas populares. Desta família surgiu ainda Caixa Econômica Federal e tem como objetivo, ampliar a
uma terceira geração de poetas que são os filhos de atuação dos pequenos e médios produtores e comerciantes
Nicandro: Dimas e Batista. do município , bem como, a abertura de novas micros e
No campo da poesia matuta e cantoria de viola temos, pequenas empresas no município.
Pinto de Monteiro, Otacílio Batista, José Laurentino, entre Em relação as demais regiões do Estado, embora a ação
outros tantos. Não podemos esquecer das mulheres violeiras do Governo seja permanente na busca do desenvolvimento,
que fazem sucesso em todo o país: Maria Soledade e existe, na Paraíba, um problema que há séculos perdura sem
Minervina. solução; trata-se da seca e das formas de convivência com
Atualmente, este estilo de cordel está exercendo uma este flagelo natural que assola o semi-árido paraibano. Esta
forte influência no forró e assim podemos ver alguns área ocupa 77% do território estadual e nela vive 40% da
cantores se destacando, mesclando poesia matuta, cordel e população do estado.
forró. Neste campo estão os poetas: Ton Oliveira. Amazan e O semi-árido é a região que sofre a maior escassez de
Francinaldo. recursos naturais e onde as condições econômicas e sociais
Como foi colocado no início do texto, falar sobre são mais difíceis. Encontrar meios de convivência, capazes
cultura é uma tarefa difícil devido à diversidade do tema e a de melhorar as condições de vida da população desta área, é
riqueza da cultura paraibana. Por isso, aproveitamos para o grande desafio colocado para o governo e para toda a
pedir desculpas aos artistas que se sentiram excluídos por sociedade paraibana.
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História da Paraíba Professor Welton
Visando melhorar as condições de vida no Sertão, o O governo do estado também está desenvolvendo um
governo do estado construiu, recentemente, um canal amplo projeto de captação de águas e abastecimento em
ligando o açude de Coremas a Mãe D’ água conhecido como diversos municípios como é o caso da barragem de Acauã
o “Canal da redenção”. Como o nome indica, este canal que visa resolver o problema de abastecimento de Campina
pretende contribuir para a melhoria das condições de vida da Grande e da região circunvizinha a este importante
população que sofre há séculos com os efeitos das secas município do estado. Outro projeto, já em concluído, é a
periódicas que assolam toda a região, destruindo as duplicação a BR 230 que liga Campina Grande a João
plantações e inviabilizando seu desenvolvimento. Pessoa e que contribui para o desenvolvimento do comércio
Embora esta obra tenha grande importância para a entre o Litoral e o Sertão do estado, já que o município de
região do Sertão. , o problema da seca não será resolvido, Campina Grande fica em uma região de entroncamento
pois apenas uma parcela da população será beneficiada. rodoviário e serve de elo de ligação entre as diversas regiões
Esta obra deveria ser o primeiro passo para um projeto de do estado.
maior porte que é o da transposição das águas do rio São Outro destaque, que não poderíamos deixar de citar, é o
Francisco, beneficiando não apenas a Paraíba como outros papel cada vez mais importante da Universidade Estadual da
estados vizinhos. Paraíba, contribuindo nas discussões acerca do
Apesar de parte do orçamento para a transposição do rio desenvolvimento sustentável do estado e, nos últimos anos,
São Francisco já ter sido liberado, a obra encontra vem colocando todos os seus projetos de pesquisa, desde a
resistências dos parlamentares e dos governos dos Estados iniciação científica até os projetos de mestrados, na
nordestinos banhados pelo rio. Eles afirmam que a obra não perspectiva de contribuir com este tão almejado
resolverá o problema dos Estados carentes de água como desenvolvimento. Além da pesquisa, os projetos de extensão
Ceará e Paraíba e ainda criará problemas para os estados que também estão voltados para estes objetivos, sem falar no
hoje utilizam a água deste rio. As resistências são maiores ensino, onde a UEPB presta serviço a toda à Paraíba. Basta
dos governantes e parlamentares de Sergipe e Bahia. ver a quantidade de municípios que enviam seus alunos para
Conforme afirmamos no início do texto, enquanto uns a instituição e observar os números do vestibular, que
problemas são resolvidos ou estão sendo discutidos na busca apontam a importância da UEPB para o estado.
de solução, outros parecem não ter atenção por parte das
autoridades governamentais e a região atingida por estes ANOTAÇÕES
problemas continua em franca desaceleração econômica.
Uma exemplo desta desaceleração pode ser sentido de forma
bastante evidente na região do Curimataú. Esta área, antes
grande produtora de sisal, hoje vive praticamente da
agricultura de subsistência dependendo das intempéries da
natureza e consequentemente, arrasada pela seca, fenômeno
comum na região, já que se encontra localizada no semi-
árido.
Outra região que passa por sérias dificuldades é a Zona
da Mata que depende da produção de açúcar. Nos últimos
anos, o que se ver é o fechamento de inúmeros engenhos
produtores de rapadura, aguardente e outros derivados da
cana de açúcar e até o fechamento de algumas usinas
importantes, diminuindo drasticamente a produção de açúcar
e álcool.
Ainda na Zona da Mata destacava-se o município de
sapé como primeiro no ranking nacional na produção de
abacaxi, passando hoje por uma profunda crise, devido a
problemas naturais como a seca, mas principalmente,.
Devido a falta de apoio dos órgãos governamentais, a alta
taxação das exportações no Estado e a pouca visão
empresarial dos produtores locais que não se modernizaram
e acabaram perdendo essa liderança para outros municípios
sobretudo da região Sudeste.
É preciso salientar que existe uma preocupação por
parte das autoridades governamentais visando a recuperação
das culturas que já obtiveram destaque na economia
paraibana, como o caso do abacaxi e do algodão. O Governo
do estado voltou a incentivar a produção de abacaxi na
região de Sapé e em parceria com a Embrapa está
desenvolvendo o algodão colorido que é ecologicamente
correto e está com grande aceitação no mercado europeu.
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