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ABORDAGEM CONSTITUCIONAL DOS

DIREITOS

PROFESSOR: ALEXSANDRO DA SILVA MSc


DIREITO CONSTITUCIONAL

Conceito: ramo do saber que se debruça sobre o estudo da constituição.

É importante entendermos que a constituição é, por excelência, o


instrumento que disciplina o poder do Estado, visto que cria os próprios
elementos constitutivos deste, assim como dispõe sobre os limites e
obrigações estatais.
Sendo assim, vemos que a constituição é o elemento central do estudo do
direito público, pois este nada mais é do que o ramo de estudo que aborda a
relação de poder soberano que o Estado exerce tanto no sentido vertical (em
relação aos cidadãos, aos particulares), quanto no sentido horizontal (em
relação a outros Estados). Assim, podemos dizer que estudar a constituição é
estudar o próprio Estado, pois será ela, repete-se, quem dará os contornos e
as possibilidades de exercício do poder estatal.
Devemos notar que a função constitucional de dar os contornos ao poder
estatal representa a dimensão constitucional que se realiza no presente,
enquanto a função de expor todas as possibilidades de exercício do poder
do Estado representa uma dimensão que se projeta para o futuro,
tornando, assim, a constituição também um documento programático no
que tange à evolução do povo, da nação e do próprio Estado.
Da perspectiva didática do ensino do direito, o direito constitucional se
conceitual como um ramo do direito público. Devemos ter em mente que
não é tarefa das mais simples, como pensam alguns, separar o que é direito
público do que é direito privado. Enquanto de forma superficial se diz que o
direito público é aquele em que se verifica a predominância do poder
soberano do Estado, vê-se que de forma crescente áreas tidas como
essencialmente privadas, a exemplo do direito civil, passam a apresentar
interferência gradativa do poder publico, mesmo que como vetor regulador
das relações entre particulares.
Como essa discussão passa ao largo do nosso objetivo neste estudo,
contentamo-nos em afirmar que o direito constitucional é um ramo do
direito público nos limites impostos pelo interesse estritamente didático do
ensino jurídico, mas sempre nos lembrando de que é defensável a tese de
que não há e nem mesmo é possível a distinção entre público e privado no
direito, pois ele é um só.
Conceito de Constituição

O termo constituição significa o ato de constituir, estabelecer, firmar. É o


modo pelo qual se constitui alguma coisa, um ser vivo, um agrupamento.

Em termos jurídicos, a Constituição é uma norma de ordem superior a qual


expressa a forma, o regime, a estrutura, a organização do Estado, a
separação dos Poderes, os direitos e garantias individuais e outros assuntos
de relevante interesse social.
Nas palavras de Alexandre de Moraes:

"Lei fundamental e suprema de um Estado, que contem normas referentes à


estruturação do estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e
aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias
e deveres dos cidadãos."
José Afonso da Silva, assim conceitua o que seja uma Constituição:

"Constituição é lei fundamental de um Estado, a qual organiza os seus


elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras,
que regula a forma do Estado, a forma do seu governo, o modo de aquisição e o
exercício do poder, os estabelecimentos de seus
órgãos e limites de sua ação."
Objeto da Constituição

O objeto da Constituição foi evoluindo de acordo com as evoluções


sociais, políticas e econômicas, de modo que atualmente, em princípio o
objeto das Constituições estão estruturados da seguinte forma:

- Estruturação do estado;

- Organização dos Poderes e seus órgãos;


- Disposição sobre o modo de aquisição de poder e a forma de seu exercício;

- Limitação da atuação do poder;


- Proteção aos direitos e garantias dos indivíduos;
- Fixação do regime político;

- Fixação e disciplina das finalidades sociais e econômicas do Estado;

- Determinação dos fundamentos dos direitos econômicos, sociais e


culturais do Estado.
2 - CONCEPÇÕES SOBRE AS CONSTITUIÇÕES

A Teoria da Constituição como conhecimento jurídico, político e filosófico


deve-se à doutrina alemã. Sua formação e autonomia decorreram da

preocupação de se chegar a um conceito substantivo de Constituição. Ela


examina, identifica e critica os limites, as possibilidades e a força normativa
do Direito Constitucional, ocupando-se em estudar os diversos conceitos de
Constituição, o Poder Constituinte e a legitimidade da Constituição; reforma
constitucional; direitos fundamentais e separação de poderes, como
elementos característicos do Estado de Direito etc.
O vocábulo “Constituição” tem muitos significados, mas há um sentido
primário: a Constituição é Lei Fundamental ao Estado e ao seu povo,
ditando ao primeiro os limites de atuação como forma de proteger ou tutelar
o segundo.
1 Sentido Sociológico

Ferdinand Lassalle leciona que a Constituição corresponde ao somatório dos


fatores reais de poder que vigoram em um país. Segundo o mestre alemão:
“De nada serve o que se escreve numa folha de papel se não se ajusta à
realidade, aos fatores reais de poder”.
Esses fatores reais de poder, entre nós, estão identificados na força dos
produtores rurais e dos movimentos de sem terra, no sistema financeiro e nas
federações empresariais, nos sindicatos e nas centrais sindicais, nas
corporações militares e civis, dentre outras forças que impõem a forma e o
conteúdo da Constituição.
“Os fatores reais de poder que atuam no seio de cada sociedade são essa
força ativa e eficaz que informa todas as leis e instituições jurídicas
vigentes, determinando que não possam ser, em substância, a não ser tal
como elas são”.
A doutrina de Lassalle é concebida como sociológica por Jorge de Miranda,
que ao analisar a concordância das normas constitucionais com a realidade do
processo de poder destaca a existência de Constituições normativas,
Constituições nominais e Constituições semânticas.
Constituição normativa é aquela que efetivamente submete o processo de
poder às suas regras. Ou seja, é respeitada e cumprida, pois reflete os
princípios fundamentais do constitucionalismo sendo, assim, legítima.
A Constituição nominal é aquela que embora tenha por pretensão representar
os valores fundamentais da sociedade, não possui regras que representem a
dinâmica do processo político, pelo que ficam sem realidade existencial.
Por fim, a Constituição semântica (ou de fachada para Canotilho), serve apenas
para beneficiar os detentores do poder de fato, instrumentalizando sua
dominação sobre a sociedade.
3. Sentido Político

Carl Schmitt concebe a Constituição no sentido político, pois para ele


Constituição é fruto da “decisão política fundamental” tomada em certo
momento.

Para Schmitt há diferença entre Constituição e lei constitucional; é conteúdo


próprio da Constituição aquilo que diz respeito à forma de Estado, à forma de
governo, aos órgãos do poder e à declaração dos direitos individuais. Outros
assuntos, embora escritos na Constituição, tratam-se de lei constitucional
(observe-se que essas ideias estão próximas as de Constituição material e
formal).
4. Sentido Jurídico

Segundo Hans Kelsen (sentido lógico-jurídico ou formal) – a Constituição


consiste na norma fundamental hipotética, pressuposta e não posta pela
autoridade, concebe o Direito como estrutura normativa, cuja unidade se
assenta na norma fundamental, já́ que o fundamento de validade de
qualquer norma jurídica é a validade de outra norma, ou seja, uma norma
superior. O ordenamento jurídico é representado por uma pirâmide.
De acordo com a Teoria Pura do Direito, Kelsen destaca vários significados de
constituição:

Material – é o conjunto de normas que regulam a criação dos preceitos


jurídicos gerais e prescrevem o processo que deve ser seguido em sua
elaboração.

Formal – consiste no conjunto de normas jurídicas que só́ podem ser


modificadas mediante a observância de prescrições especiais, que têm por
objetivo dificultar a modificação destas normas.

Sentido amplo – compreende as normas que estabelecem as relações dos


súditos com o poder estatal.
3 - CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

Quanto ao Conteúdo

Constituição material ou substancial: conjunto de regras jurídicas


materialmente constitucionais, que regulam a estrutura do Estado, a
organização de seus órgãos e os direitos fundamentais. Tais regras podem ou
não estar na Constituição e justamente por isso é mais abrangente que a
Constituição Formal. Há, por exemplo, regras materialmente constitucionais
disciplinadas em lei ordinária, como o Estatuto dos Estrangeiros.
Constituição formal: conjunto de regras jurídicas, inseridas no texto unitário da
Constituição escrita, diga ou não respeito à matéria constitucional. Exemplo: o
art. 14, § 4.º 9, da Constituição Federal, que trata da inelegibilidade, é regra
formal e materialmente constitucional porque delineia o modo de aquisição e
exercício do poder. Mas os casos de inelegibilidade não são apenas os previstos
nesse dispositivo; a Lei Complementar n. 64, de 18.5.1990 disciplina outras
hipóteses, em consonância com o prescrito no § 9. º 10 do próprio art. 14.
Instrumentais (instrument of government): é aquela lei fundamental
entendida, essencialmente, como lei processual e não como lei material.
Estabelece competências, regula o processo e define os limites da ação política.
Como instrumento de governo, contém as regulamentações necessárias para a
vida política de uma comunidade.
Quanto à Forma

Escritas: suas normas se acham expressas em um ou vários documentos


escritos.

É o próprio texto escrito da Constituição, ou seja, é o conceito formal de


Constituição, cuida-se de um texto redigido em um momento de reflexão do
constituinte originário, podendo ser:
Analítica (expansiva, abrangente ou prolixa) – quando o texto constitucional,
além de dispor de normas materialmente constitucionais, trata de matérias que
não deveriam ser tratadas pela Constituição. É, por exemplo, a Constituição
brasileira, que possui 250 artigos, ADCT, várias emendas etc.
Tais constituições são instáveis, haja vista que necessitam de reiteradas
modificações.

Sintética (concisa ou negativa) – traz apenas normas materialmente


constitucionais, como a norte-americana, que possuía inicialmente sete artigos
e, após dois séculos de existência, foi modificada apenas 27 vezes. São sumárias,
breves, principiológicas e de grande estabilidade.
Não escritas (costumeiras ou históricas): as normas constitucionais não
constam de um documento único e solene, são textos esparsos, elaborados em
épocas distintas sendo formadas por usos e costumes válidos como fontes de
direito.

Com efeito, ainda que não seja escrita, esta Constituição terá parte do seu
sistema necessariamente escrito. A rigor a diferença dos Estados que adotam
esta forma para a escrita, é fonte, isto é, a existência ou não de apenas uma
única fonte. Portanto, devemos fixar que a Constituição não escrita possui várias
fontes (costumes, decisões dos tribunais, práticas administrativas e textos
escritos).
Quanto ao Modo de Elaboração

Constituição dogmática: reflete a aceitação de certos dogmas, ideais vigentes


no momento de sua elaboração, reputados verdadeiros pela ciência política.
Dogma: ponto mais importante que caracteriza um sistema, um determinado
modelo, corporifica as opções daquele que elaborou o texto constitucional.

Constituição histórica: é a Constituição não escrita, resultante de lenta


formação histórica. Não reflete um trabalho materializado em um único
momento.
Quanto à Ideologia

Eclética, pluralista, complexa ou compromissória: possui uma linha política


indefinida, equilibrando diversos princípios ideológicos.

Ortodoxa ou simples: possui linha política bem definida, traduzindo apenas


uma ideologia.
Quanto à Origem ou ao Processo de Positivação

Constituição outorgada: são aquelas impostas por um grupo ou por uma


pessoa, sem um processo regular de escolha dos constituintes. Nesse ponto
podemos traçar a diferença entre Carta Constitucional, expressão reservada às
constituições outorgadas, e Constituição que objetiva designar as promulgadas.

Constituição promulgada (democrática ou popular): são aquelas elaboradas


por representantes eleitos pelo povo, de forma livre e consciente, para exercer o
poder constituinte.
Constituição cesarista (plebiscitária, referendaria ou bonapartista): trata-se
da Constituição que, não obstante elaborada sem a participação do povo ou dos
seus representantes, é submetida a um referendo popular antes de ganhar
vigência. Recebe esse nome por ter sido um método utilizado por Napoleão
Bonaparte nos denominados plebiscitos napoleônicos.
Constituição mista (pactuada, positivada por convenção ou dualista): nessas
constituições o diploma fundamental não é já uma Carta doada pela vontade do
soberano, mas um pacto entre o soberano e a representação nacional, em regra
entre o monarca e o Poder Legislativo.
Parte da doutrina classifica a Constituição, quanto ao modo de positivação, da
seguinte forma:
a) Por convenção ou votada – os representantes do povo, mediante
assembleia convocada especificamente para tal fim, votam uma nova
Constituição; e
b) Por outorga ou outorgada – quando uma nova Constituição é imposta ao
povo. Nesse caso, é comum a utilização da expressão Carta Constitucional.
Quanto à Estabilidade, à Mutabilidade ou à Alterabilidade

Rígida (ou condicional): demandam processo especial, mais solene e difícil para
sua alteração do que o da formação das leis ordinárias. Não devemos associar
rigidez constitucional com estabilidade constitucional, pois a CFRB, apesar de
rígida, não possui estabilidade (constituição escrita, analítica).

Flexível (não condicional): é a Constituição que pode ser modificada livremente


pelo constituinte derivado, utilizando-se do mesmo processo de elaboração das
leis ordinárias. Não devemos associar flexibilidade com instabilidade, já que a
Constituição inglesa, apesar de flexível é bastante estável.
Constituição plástica – de acordo com a doutrina de Pinto Ferreira, Constituição
flexível também é chamada de Constituição plástica. Todavia, na doutrina de
Raul Machado Horta, Constituição plástica possui outro significado, sendo,
portanto, aquela que para ter eficácia necessita de grande regulamentação por
parte do legislador infraconstitucional. Para ele, ainda, Constituição plástica é
aquela suscetível de adaptação a uma nova realidade social, por meio de
integração normativa futura.
Constituição transitoriamente flexível – o texto constitucional é suscetível de
reforma, em determinado período, com base no mesmo rito das leis comuns.
Ultrapassado aquele período, passa a ser rígida.
Semirrígida: contém uma parte rígida, para alteração das regras materialmente
constitucionais e outra flexível, para a modificação das regras formalmente
constitucionais. Foi o caso da Constituição brasileira do império (art. 178).
Quanto à Função

a) Garantia (quadro ou negativa): tem o escopo de assegurar os direitos


fundamentais das pessoas, haja vista que toda vez que se enuncia um direito, há
limitação do poder. Também é conhecida como negativa justamente pelo fato
de impedir o poder arbitrário do Estado. Originou-se a partir da reação popular
ao absolutismo monárquico. É denominada quadro porque há um quadro de
direitos definidos e negativa porque se limita a declarar os direitos e, por
conseguinte, o que não pode ser feito.
b) Dirigente (abrangente, programática ou doutrinal): além de organizar e
limitar o poder, a Constituição também preordena a atuação governamental em
um determinado sentido, por meio de planos de governo, de “programas”
vinculantes (previstos em normas programáticas) seja qual for o Partido, são as
chamadas diretrizes políticas permanentes. É a “Constituição do dever-ser”. A
nossa Constituição Federal inspirou-se no modelo da Constituição portuguesa.
Função prospectiva – está consubstanciada na Constituição dirigente, pois se o
texto constitucional é voltado para o futuro, a sua finalidade é dirigir a ação
política e de toda a sociedade, segundo um modelo proposto, e para a
realização de determinados objetivos, gerais ou específicos, informados pela
ideia de direito nela consignada.
ESCRITA

DIRIGENTE/ CODIFICADA
GARANTISTA

A Constituição da República ANALÍTICA/


COMPROMISSÁRIA Federativa do Brasil de 1988 PROLIXA
classifica-se como:

ECLÉTICA DOGMÁTICA

RÍGIDA/
SUPER
RÍGIDA
4 - TEORIA DO PODER CONSTITUINTE

O poder constituinte pode ser estudado em uma dupla dimensão: originária e


reformadora.
Trata-se do poder que constitui, que faz e que elabora normas constitucionais. O
poder constituinte produz normas constitucionais tanto ao elaborar a
Constituição quanto ao alterá-la.
Na primeira hipótese, diz-se originário, primário, de primeiro grau; na
segunda, tem-se o poder reformador, derivado, instituído, constituído,
secundário, de segundo grau, ou, simplesmente, competência constituinte.
“Entende-se por poder constituinte o poder de elaborar (poder constituinte
originário) ou de modificar (poder constituinte derivado) a Constituição”.
As normas produzidas pelo poder constituinte – seja o originário, seja o
reformador – compõem um texto normativo (a Constituição) localizado em
posição de superioridade, em relação às demais normas do ordenamento
jurídico de um País.
Poder constituinte originário

O poder constituinte originário cria o Estado. Pode fazer isso a partir do nada,
quando cria o Estado e lhe dá a primeira Constituição, ou a partir de uma
ruptura da ordem jurídica existente, quando estabelece um novo tipo de Estado
e lhe dá uma nova Constituição, substituindo a anterior.
Nesse sentido, o poder constituinte originário cria o Estado, dando a este sua
primeira forma, partejando o que não existia. Contudo, ele pode também recriar
o Estado, dando-lhe uma nova forma. Assim, o poder constituinte pode criar ou
recriar o Estado.
A manifestação constituinte, ao produzir uma nova Constituição, faz nascer um
novo tipo de Estado. “Antes dessa manifestação, o Estado, tal como veio
positivado, não existia.

O poder constituinte dá uma constituição ao Estado e à sociedade. Trata-se, sob


esta ótica, de uma “vontade política cuja força ou autoridade é capaz de adotar
a concreta decisão de conjunto sobre modo e forma da própria existência
política, determinando assim a existência da unidade política como um todo” .
“Se por ‘poder’ entendemos uma competência, capacidade ou energia para
cumprir um fim, e por ‘constituinte’ o poder que constitui ou dá constituição ao
estado, alcançamos com bastante precisão o conceito global: poder
constituinte é a competência, capacidade ou energia para constituir ou dar
constituição ao estado, é dizer, para organizá-lo”.
Natureza

O poder constituinte originário é compreendido também como um poder de


fato.
Encontra-se vinculado à realidade concreta da vida social em determinado
espaço territorial. Sob esse enfoque, dizer que é um poder de fato equivale a
dizer que é um poder político. “Mais até, estamos a falar de um poder
exclusivamente político, porque originariamente imbricado em toda a polis,
naqueles raros instantes em que a polis se sobrepõe ao Estado para dizer, por
ela mesma, sob que tipo de Direito-Constituição quer viver”.
Titular

A titularidade do poder constituinte tem mudado de acordo com as


circunstâncias históricas.
Primeiro, pertenceu a Deus; depois, ao monarca; mais tarde, à nação;
atualmente, ao povo. No futuro, essa titularidade poderá pertencer a outro.
Agente

O agente do poder constituinte originário é aquele que elabora a Constituição.


O agente não é órgão do Estado ou da Constituição; é órgão da sociedade,
imbuído da tarefa de fazer uma Constituição e (re)criar o Estado. Esse órgão
costuma ser a Assembléia Nacional Constituinte ou a Convenção Constituinte.
Formas de manifestação

Há várias formas de manifestação do poder constituinte originário: a outorga, o


bonapartista e a democrática. As duas primeiras não têm compromisso com a
legitimação democrática do poder e do ordenamento jurídico. Prescindem da
participação popular. Consistem, sob essa ótica, em verdadeira negação do
poder constituinte do povo.
A forma democrática de exercício do poder constituinte pode ser classificada em
quatro modos, conforme o lugar e o momento histórico em que tem sido
utilizada para a elaboração da Constituição:

a) exercício direto do poder constituinte – um grupo de pessoas que assumiu o


poder para governar transitoriamente elabora um projeto de Constituição e
submete-o, diretamente, à apreciação popular. O projeto pode ser aprovado por
referendo ou, pelo menos em tese, por aclamação. Após tal aprovação, a
Constituição é promulgada sem que tenha existido uma Assembléia Nacional
Constituinte;
b) exercício indireto do poder constituinte – o poder constituinte é exercido por
um órgão cujos membros são eleitos pelo povo. Esse órgão – Assembleia
Constituinte ou Convenção Constituinte – elabora a Constituição e a promulga.
Exemplo: Assembleia Nacional Constituinte de 1988;

c) forma mista de exercício do poder constituinte – o poder constituinte é


exercido por um órgão – Assembleia Constituinte ou Convenção Constituinte.
Elaborada a Constituição, esta é submetida à aprovação popular;
d) exercício pactuado do poder constituinte – o poder constituinte é exercido
de forma consensual. O pacto celebrado entre forças antagônicas faz nascer, de
forma consensual, a Constituição. O equilíbrio de forças, embora precário, gera a
Constituição pactuada.
Características

Podem ser apontadas várias características para identificar o poder constituinte


originário. No âmbito desse estudo, entende-se o poder constituinte como
sendo inicial, incondicionado e ilimitado.
Inicial. O poder constituinte originário inicia, instaura, inaugura, implanta
uma nova ordem jurídica. Como já́ afirmado anteriormente, ele pode fazer isso a
partir do nada, quando cria o Estado e lhe dá a primeira Constituição, ou a partir
de uma ruptura da ordem jurídica existente, quando estabelece um novo tipo de
Estado e lhe dá uma nova Constituição, substituindo a anterior. Na primeira
hipótese, ele cria o fundamento de validade do ordenamento jurídico. Na
segunda, ele substitui esse fundamento.
Com a obra do poder constituinte, algo nasce e algo morre, visto que, a um só
tempo, o poder constituinte cria e mata, parteja e sepulta. No instante, em que
o velho e o novo se encontram mortalmente, o poder constituinte realiza o
féretro de uma Constituição e, ao mesmo tempo, o partejamento de outra.
Nesse sentido, ele é, a um só tempo, poder constituinte e poder
desconstituinte.

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